Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:09140/15
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:11/19/2015
Relator:ANABELA RUSSO
Descritores:RECLAMAÇÃO/ÓRGÃO DE EXECUÇÃO FISCAL/SALDO DE CONTA BANCÁRIA/ SUSPENSÃO.
Sumário:I – Para efeitos do Código de Procedimento e de Processo Tributário, órgão de execução fiscal (“OEF”), é o serviço de administração tributária onde deva legalmente correr a execução (artigo 149.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário).

II - A Administração Tributária tem o direto de constituir, nos termos da lei e para garantia dos créditos tributários, penhor ou hipoteca legal, quando essas garantias se revelem necessárias à cobrança efectiva da dívida ou quando o imposto incida sobre a propriedade dos bens (artigo 50.º da Lei Geral Tributária).

III – A execução fiscal fica suspensa até à decisão do pleito se, tendo havido apresentação de reclamação graciosa, impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objecto a legalidade da dívida exequenda, tiver ainda sido constituída garantia nos termos do artigo 195° ou prestada nos termos do artigo 199° ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido (artigo 169° do Código de Procedimento e de Processo Tributário).

IV – Questionada em juízo a legalidade da dívida exequenda (por qualquer um dos meios processuais referidos em III), sem que tenha sido constituída ou prestada garantia, dispensado o executado da sua prestação ou realizada penhora em bens suficientes a garantir a dívida exequenda e o acrescido devido, deve a Administração Tributária ordenar a notificação do executado para prestar a garantia referida no n° 1 dentro do prazo de 15 dias e, não sendo prestada, proceder de imediato à penhora dos bens do executado que haja identificado e/ou localizado e se mostrem suficientes para pagamento daquela (cfr. artigo 169.º n.ºs. 6, 7 e 8 do Código de Procedimento e de Processo Tributário).

V - Não resultando provado nos autos que a quantia exequenda estivesse assegurada por garantia prestada ou que ainda não tivesse sido decidida e apreciada a idoneidade da garantia oferecida, não estavam verificados os pressupostos de facto e direito determinantes da suspensão da execução fiscal e, consequentemente, não padece de ilegalidade o acto do órgão de execução fiscal que, com esse fundamento, ordenou a penhora do saldo da conta bancária dos executados e indeferiu o levantamento dessa penhora.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acórdão

1. Relatório

Noélia ………………., por si e em representação fiscal de António José Cardoso Rodrigues, veio recorrer da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que, julgando improcedente a reclamação deduzida pela ora recorrente contra o acto do Chefe do Serviço de Finanças de …………………………….., datado de 25-2-2015, indeferiu o pedido de levantamento da penhora do saldo bancário pertencente aos Reclamantes.

Rematou as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões:

«1) Conforme resulta de fls., os aqui Recorrentes, nos termos do artigo 276°, do CPPT, apresentaram Reclamação do ato do despacho do Chefe do Serviço de Finanças .................., que manteve a penhora de saldo bancário pertencente aos Reclamantes, alegando o que acima se transcreveu;

2) Notificada para o efeito, a Ilustre Representante da Fazenda Pública apresentou resposta, alegando o que consta de fls.;

3) Posteriormente veio o Ministério Público apresentar o seu Parecer, promovendo a improcedência da Reclamação;

4) Por Sentença de fls., a Meritíssima Juiz decidiu o acima transcrito;

5) A recorrente, goza da legitimidade que lhe é atribuída a ela própria pelo artigo 15° da Lei Geral Tributária, e, como representante, nos precisos termos do n° 1 do artigo 5° do Código de Procedimento e de Processo Tributário;

6) A recorrente reclamou da decisão do OEF e não da Decisão do CSF Salvaterra de Magos;

7) Entretanto, já depois do pedido de suspensão da execução fiscal, no seu todo, e de terem sido oferecidos os suprimentos, a AT continuou a penhorar outros bens, o que demonstrou a ilegalidade praticada pela AT (algumas das penhoras [de vencimento e estas de saldos de contas bancárias] foram entretanto objeto de reclamação judicial);

8) Para garantia da dívida, ofereceu os suprimentos, suprimentos, estes que haviam sido apurados em ação de inspeção, que serviu para a derrogação do sigilo bancário. O contrato de suprimento encontra enquadramento no artigo 243° do Código das Sociedades Comerciais;

9) O despacho de não consideração da garantia oferecida, foi alvo de sindicância judicial, ainda não decidida;

10) Continuamos a entender que a garantia oferecida é idónea, e que garante a dívida exequenda e acrescido;

11) É verdade que o OEF não aceitou a garantia. Porém, tendo sido questionada a posição da AT, que exorbitou os seus poderes, a sindicância da penhora dos saldos bancários, tinha de ter por base precisamente os argumentos da não aceitação da garantia;

12) A petição inicial, embora imperfeita, é suficientemente explícita para permitir compreender os contornos da relação material controvertida, mesmo que esses contornos não se encontrem claramente definidos;

13) Na verdade, sendo a função constitucional dos Juízes administrar a Justiça em nome do povo (n° 1 do artigo 202° da CRP) têm os mesmos que, dentro dos limites da lei e obedecendo às regras previstas nos 3 números do artigo 9° do Código Civil, mas dando particular ênfase ao n° 3 que faz apelo às soluções mais acertadas tudo fazer para dirimir/eliminar os conflitos que são submetidos ao seu julgamento, nomeadamente interpretando os normativos que consagram os direitos das partes e a validade dos seus atos, sempre no sentido do alargamento desses direitos e nunca da sua restrição;

14) É, isso que se estipula no n° 4 do artigo 20° da CRP de que resulta que o acesso dos cidadãos e demais entidades que interagem no comércio jurídico do Direito deve ser sempre facilitado e não dificultado ou restringido;

15) Primeiro, era a caducidade do direito de ação, depois, nada dizendo quanto ao indeferimento do levantamento da penhora dos saldos das contas bancárias;

16) Na p. i. o objeto era o da revogação do indeferimento do levantamento da penhora, mas as causas continuam a ser relacionadas com a não aceitação da garantia oferecida, que está questionada judicialmente, tão simples como isto;

17) Pede a anulação do despacho de indeferimento de levantamento da penhora efetuada sobre saldos das contas bancárias;

18) Foi prestada garantia bastante para solver a dívida exequenda e acrescido;

19) A garantia foi oferecida em suprimentos foram considerados em relatório da inspeção tributária, para efeitos de derrogação do sigilo bancário;

20) Foi pedida a suspensão da execução;

21) Não foi substituída a garantia oferecido por entender-mos que a oferecida é idónea;

22) Entendemos que continuar a penhorar sem aguardar a decisão final sobre a decisão de não aceitação do recurso da garantia, é uma decisão que ofende os direitos dos aqui alegantes/recorrentes;

23) Entendemos que, houve erro de julgamento do TAF Leiria, especificamente quando diz (a págs. 8/8 da Sentença): "... bem andou a AT não podendo o ato reclamado ser merecedor de censura..., julga-se a presente reclamação improcedente por não provada...” e que o Reclamante apenas questiona o indeferimento da garantia.,.;

24) E requeremos a substituição da decisão da sentença por outra que anule a decisão de indeferimento do levantamento da penhora;

25) Dúvidas não existem de que deverá ser revogada a Sentença recorrida, em virtude do Tribunal "aquo" não ter interpretado e aplicado corretamente as normas legais aplicáveis ao caso em concreto, nomeadamente as acima mencionadas;

26) Os Recorrentes não podem ser prejudicados com o comportamento ilegal da Administração Fiscal e Tribunal;

27) Ora, o interesse dos Recorrentes é legalmente protegido, o que faz com que a decisão recorrida, seja Inconstitucional;

28) A Decisão que deu causa a este recurso, não está fundamentada como exigem as normas referidas, tendo por esse facto de ser Revogada;

29) O Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo, na decisão, sob recurso viola o disposto nas alíneas b), e d) do artigo 615° do Código do Processo Civil, uma vez que não apreciou a totalidade das questões como o deveria ter feito, sendo por esse facto nulo;

30) O (Venerando Tribunal) com a decisão recorrida, não assegurou a defesa dos direitos dos Alegantes, ao não fundamentar exaustivamente a sua decisão, e nem se quer aplicar as normas legais aplicáveis ao caso em concreto;

31) O Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo limitou-se apenas e tão só, a emitir uma decisão "economicista", isto é, uma decisão onde apenas de uma forma simples e sintética foram apreciadas algumas das questões, deficientemente e sem qualquer cabimento, conforme acima já se alegou e explicou;

32) Deixando o Venerando Juiz do Tribunal a quo de se pronunciar sobre algumas questões que são essenciais à boa decisão da causa, nomeadamente as acima expostas;

33) A Sentença recorrida viola:

a) O disposto nos artigos 21°, 120°, alíneas a), c) e d) e 125°, do CPT;

b) O disposto nos artigos 124° e 125° do CPA;

c) O disposto no artigo 243, do CSC;

d) O disposto nas alíneas b), c) e d) do atual 615° do CPC;

e) O disposto no Decreto-Lei n° 256-A/77, de 17 de Junho;

f) O disposto nos artigos 13°, 20°, 202°, 204°, 205°, 266°, n° 2 e 268°, nºs l, 2 e 3 da CRP.

Termos em que, nos melhores de direito, e com o sempre mui douto suprimento de V. Exas., deve a Sentença recorrida ser REVOGADA, por ser de: LEI, DIREITO, E JUSTIÇA.».

A Recorrida, notificada da admissão do recurso, não contra-alegou.

Neste Tribunal Central a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer no qual se pronunciou, a final, no sentido da improcedência do recurso.

Com dispensa dos vistos legais, atenta a natureza do processo (artigo 707º do CPC e artigo 278º, nº5 do CPPT), cumpre agora decidir.

2. Objecto do Recurso

Como é sabido, sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que o recorrente remate a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida: artigo 639.°, n°1, do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem.

Assim, e pese embora na falta de especificação no requerimento de interposição se deva entender que este abrange tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (artigo 635.°, n°2, do C.P.C.), esse objecto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (n.°3 do mesmo artigo 635.°). Pelo que, todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, devem considerar-se definitivamente decididas e, consequentemente, delas não pode conhecer o Tribunal de recurso.

Acresce que, constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo a já mencionada situação de questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo.

Atento o exposto e as conclusões das alegações do recurso interposto, importa, assim, decidir as seguintes questões:

- Saber se a sentença é nula por não ter fundamentado factual e juridicamente a decisão, esta estar em contradição com os seus fundamentos e nela não terem sido apreciadas questões que deviam ter sido conhecidas e decididas;

- Saber se o Tribunal ao quo errou no julgamento realizado ao ter decidid que não havia fundamento de facto e direito para anular o acto de penhora objecto de reclamação.

3. Fundamentação de Facto

Em 1ª instância foram considerados como relevantes e provados para a apreciação e decisão da causa os seguintes factos:

A) Em 31-07-2014, a ora Reclamante (em seu nome e na qualidade de representante fiscal de António …………..) ofereceu, para efeitos de constituição de garantia de integral pagamento da dívida executiva por dívidas de IRS, no âmbito dos PEF n.ºs …………………., …………………. e …………….., suprimentos efectuados por António …………. à sociedade "Meia ……………………….., Lda", ao longo dos anos de 2007 a 2011 [cf. facto que se extrai da informação constante de fls. 151/verso dos autos);

B) Na sequência da decisão de indeferimento da garantia prestada para suspensão dos PEFs identificados na alínea que antecede, foi interposta Reclamação do ato do órgão de execução fiscal, tendo-lhe sido atribuído o processo n.º 256/15.4BELRA (cf. petição inicial constante do Processo n.° 256/15.4BELRA, retirada do Sitaf, que se anexa aos presentes autos nos termos do artigo 412.º, n.º 2 do CPC, aplicável ex vi artigo 2.° do CPPT, não tendo transitado em julgado);

C) Em 13-2-2015 deu entrada junto do Serviço de Finanças ............... um requerimento emitido pelos ora Reclamantes a solicitar o levantamento da penhora de saldos bancários (cf.fls.246/verso);

D) Em 25-2-2015 foi elaborada a seguinte Informação pelo Serviço de Finanças .......................: "(...)

“ Texto no original

(cf. fls. 248/verso)

E) Em 25-2-2015 foi proferido despacho pelo Chefe do Serviço de Finanças ......................... do qual se extrai o seguinte "Até ao presente não foi constituída garantia, nos termos do artigo 195.º ou prestada nos termos do art 199.º do CPPT, para efeitos de suspensão dos autos, em conformidade com o determinado no art 169.º.

A garantia nomeada para o efeito não foi aceite, conforme despacho do senhor Director de Finanças de Santarém, de 2014-12-17 (fls. 284 dos autos), da qual foram notificados os executados em 2014-12-23.

Não foi proposta qualquer outra garantia em substituição e o prazo previsto no art 169.º n.º 7 do CPPT já havia ultrapassado à data da penhora em análise.

Mantenha-se a penhora em causa tendo em conta que a mesma foi efectuada em cumprimento do determinado no mesmo artigo 169.º, n.° 7 do CFPT." (cf. fls. 249 dos autos).

Mais ficou consignado, a título de «Factos não provados» que «Inexistem factos não provados com relevância para a decisão da causa.» e, em sede de «Motivação da decisão de facto» que « A decisão da matéria de facto provada fundou-se na análise crítica de toda a prova produzida nos autos, designadamente nos documentos, não impugnados, juntos aos autos, conforme remissão feita a propósito de cada alínea do probatório.»

4. Fundamentação de Direito

A presente reclamação tem por objecto (após esclarecimentos/rectificações realizados pela Reclamante) o despacho do Chefe de Serviço de Finanças de ...................... que indeferiu o pedido de levantamento da penhora realizado no âmbito da execução fiscal.

Na sentença recorrida a Reclamação foi julgada integralmente improcedente, decisão com que a Recorrente se não conforma, e à qual, para além de imputar o vício fulminante de nulidade com diversos fundamentos, assaca erro de julgamento.

Importa, pois, de per si, analisar cada um dos vícios imputados à sentença.

Antes, porém, importa tecer algumas considerações quanto à forma como o recurso vem interposto e quanto à própria terminologia específica da área jurídica em que nos movemos.

Começando por esta última, deixemos já claro algo que, pelo menos aparentemente, a Reclamante e ora Recorrente não tem por certo: o órgão de execução fiscal é o serviço de administração tributária onde deva legalmente correr a execução (artigo 149.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário).

Daí que, quando a Meritíssima Juíza na sentença afirma que a Reclamante veio reclamar do acto do órgão de execução fiscal (OEF) tal significa, logicamente, que está a afirmar que aquela reclamou do acto do Chefe de Serviço de Finanças, in casu de ................................, que é, insiste-se, o órgão de execução fiscal.

Carece, pois, de qualquer sentido a conclusão 6), deste recurso, na parte em que salienta que não reclamou do “OEF” (órgão de execução fiscal) mas sim do acto do Chefe de Serviço de Finanças ......................... que, por esta razão, isto é, porque destituída de qualquer aptidão para sustentar a revogação da sentença recorrida, se julga irrelevante.

Avançando agora para os termos em que este recurso vem sustentando, adiantamos que, salvo o devido respeito, as conclusões apresentadas, pela forma como se mostram formuladas, não só revelam a dificuldade que a Recorrente teve para encontrar fundamento para a pretensão revogatória que aduz como, elas próprias, constituem a confirmação do juízo fundamentador da sentença.

Dificuldades porque embora qualifique de nula a sentença recorrida, com fundamento em quase todas as alíneas do artigo 615.º, do Código de Processo Civil, não logrou minimamente substanciar qualquer uma das nulidades arguidas..

Assim, quanto à nulidade da sentença por falta de fundamentos de facto e direito, não conseguiu a Recorrente alegar um único facto que se mostre omisso ou afirmar que a decisão tenha desconsiderado em absoluto qualquer enquadramento jurídico da questão suscitada e apreciada.

Quanto à contradição, não concretizou minimamente em que é que essa contradição entre os fundamentos de facto e direito (alegadamente inexistentes) consistia.

E, por último, quanto à omissão de pronúncia, sustentou-a na mesma argumentação aduzida na petição inicial, isto é, na convocação de questões relativas a um indeferimento de prestação de garantia – que teve em vista a suspensão de execução fiscal - apreciado num outro processo, matéria ou questão apreciada na sentença, como amplamente por si reconhecido neste recurso, tendo-se aí entendido que com o objecto desta reclamação não contendia.

Como bem afirmou a Meritíssima Juiz a quo no despacho em que sustentou a sua decisão e refutou as nulidades que lhe vinham imputadas:

«(…)

De acordo com o disposto no artigo 615.º/1/b) do Código de Processo Civil, é nula a sentença quando «[n]ão especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão». Compulsada a sentença, vê-se que a mesma fixou a factualidade de modo autónomo (cfr. o seu ponto 3.1) e apresentou os fundamentos fáctico-jurídicos no seu ponto 3.2.

Efectivamente, não se deve confundir a eventual sumariedade ou erro da fundamentação de facto e de direito com a sua falta absoluta, pois, só a esta última se reporta a alínea em questão e quanto a esta nulidade a mesma só ocorre, como se referiu, quando a decisão omita por completo a operação de julgamento da matéria de facto/direito essencial para a apreciação da questão/pretensão analisada e decidida. Razão pela qual, não se vê, portanto, que a mesma padeça do vício invocado.
Por outro lado, de acordo com o disposto no artigo 615.º/1/c) do Código de Processo Civil, é nula a sentença quando «os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível». Compulsada a sentença, não se vê, no entanto, qual será essa contradição e obscuridade. Na verdade, toda a alegação dos ora Recorrentes, se bem a compreendemos, corresponde a um eventual erro de julgamento e não à nulidade invocada.
De facto, a contradição localiza-se no plano da sua expressão formal, redundando num vício insanável do chamado “silogismo judiciário”, ou seja, é uma contradição de ordem formal que se refere aos fundamentos estabelecidos e utilizados na sentença e não aos que resultam do processo. Com efeito, o inciso decisório decorreu da conclusão lógica da conjugação das normas legais com os factos constantes no ponto 3.1. da sentença, não contendo nenhum passo cujo sentido seja ininteligível e ambíguo, e consequentemente, não se vislumbra a existência de qualquer contradição e obscuridade no discurso expendido.

Decorre do disposto no artigo 615.º nº 1, 1ª parte, alínea d) do Código de Processo Civil (CPC), que é nula a sentença quando «o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento ».

Tratam-se, aqui, dos casos de omissão ou excesso de pronúncia, por violação do artigo 608.º, n.º 2 do CPC, segundo o qual o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e não se deve ocupar senão das questões suscitadas pelas partes.
E quanto a esta questão considera-se, salvo o devido respeito por opinião contrária, decorrer de toda a apreciação factual e jurídica efectuada na sentença que não ocorreu qualquer omissão de pronúncia que seja relevante para a decisão final proferida.
Efectivamente, nos presentes autos a questão a decidir prendia-se com a apreciação da legalidade do despacho proferido pelo Chefe de Finanças de ..................datado de 25-2-2015 que manteve a penhora dos saldos bancários junto da Caixa de ………….……………, e essa foi apreciada conforme decorre do teor da sentença.
Quanto à apreciação da idoneidade da garantia oferecida (penhor dos suprimentos efectuados por António ……….. à sociedade “Meia ……………………, Lda”), já o órgão de execução fiscal se tinha pronunciado no sentido do seu indeferimento, tendo inclusive, no âmbito do processo n.º 256/15.4.4BELRA que correu termos neste Tribunal se ter decidido pela manutenção daquela decisão. Aliás, a sentença proferida no âmbito deste processo, foi confirmada através do Acórdão proferido a 10-9- 2015, por esse Venerando Tribunal, no âmbito do processo n.º 08874/15.».

Improcedem, pois, com os fundamentos ora expostos, as nulidades por falta de fundamentação de facto e direito, contradição entre os fundamentos de facto e direito e a decisão e por omissão de pronúncia, previstas no artigo 125.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário e, com esta decisão, o recurso jurisdicional na parte em que nelas se fundou.

4.2. Posto isto, analisemos agora o erro de julgamento que igualmente vem assacado à decisão.

A Meritíssima Juíza do Tribunal a quo, após esclarecer, muito bem, que «Antes de mais, importa elucidar que, a questão a decidir nos presentes autos prende-se com a legalidade do despacho proferido pelo Chefe de Finanças de.................... datado de 25-2-2015 que manteve a penhora dos saldos bancários junto da Caixa …….. ……………… e não, a "penhora sobre o vencimento que a Reclamante recebe de Fronteiras ......................, Lda" identificado pelos Reclamantes na sua douta petição», julgou improcedente a reclamação, nuclearmente, com o seguinte fundamento: da conjugação dos artigos 50.º da Lei Geral Tributária, 149.º 169.º, 195.º, 197.º e 199.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, resulta que a ilegalidade da penhora nos presentes autos pressupõe que a quantia exequenda estivesse assegurada pela garantia prestada ou que ainda não tivesse sido decidida e apreciada a idoneidade da garantia oferecida.

Depois, ressalvando que para a Recorrente o acto era ilegal «porquanto dívida está garantida pelo penhor oferecido" mormente o penhor dos suprimentos efectuados por António ……………. à sociedade "Meia ………….., Lda" como garantia para suster os processos de execução fiscal, explicitou que sobre a idoneidade da garantia oferecida já o órgão de execução fiscal se pronunciara no sentido do seu indeferimento, tendo, inclusive, sido apreciada aquela decisão no âmbito do processo n.º 256/15.4.4BELRA que correu termos neste Tribunal razão pela qual, tal fundamento era indiscutível nos presentes autos.

Por fim, salientou que o órgão de execução fiscal só procedeu à penhora de outros bens conhecidos dos executados, nomeadamente a penhora dos saldos bancários junto da Caixa ………………. de ................................ por não ter sido constituída garantia após a anteriormente oferecida não ter sido aceite e que os executados não tinham oferecido garantia idónea susceptível de assegurar os créditos do exequente.

E que sendo estes os fundamentos do acto objecto de reclamação na petição inicial nada lhe era apontado directamente, limitando-se os Reclamantes a reiterar que os suprimentos efectuados podem ser objecto de penhor, isto é, permaneciam questionando o indeferimento da garantia (matéria sobre a qual o concreto acto reclamado se não pronuncia), nada dizendo quanto ao motivo do indeferimento do levantamento penhora em causa e, em consequência, nada apontando a esse indeferimento, que é elemento concreto do despacho reclamado, sobre o qual poderia reclamar.

Tudo, pois, para concluir que «bem andou a Administração Tributária não podendo o acto reclamado ser merecedor de censura e, em consequência, deve manter-se na ordem jurídica, por legal, o que, a final, se determinará.».

Diga-se, desde já, que também para nós bem andou a Administração Fiscal e o Tribunal a quo que confirmou como válido o acto pelo órgão de execução fiscal praticado.

Na verdade, e começando pelo erro de interpretação da petição inicial (na parte que extravasa a qualidade do autor do acto já supra analisada), não cremos que assista razão aos Recorrentes: a única questão suscitada foi a que foi apreciada, a saber, se é ou não válido o acto do órgão de execução fiscal que indeferiu o pedido de levantamento da penhora do saldo bancário de conta dos Reclamantes.

Foi esta a única questão suscitada e, insiste-se, a única questão decidida.

Questão distinta é a de saber se os fundamentos convocados pelos Reclamantes, e em que assentam a ilegalidade que lhe imputam, são ou não bastantes a determinar a procedência da reclamação.

Mas, também nesta parte, a sentença se pronunciou. E fê-lo, salvo o devido respeito, com total acerto, quer quando enquadra juridicamente a questão, quer quando afasta como fundamento possível da almejada ilegalidade a questão da idoneidade de uma garanta oferecida pelos Reclamantes.

Quanto ao enquadramento jurídico, centrado, como vimos, nos artigos 50.º da Lei Geral Tributária (LGT) e 169.º, 195.º, 149.º, 197.º e 199.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), mostra-se o mesmo irrepreensível.

Senão, vejamos.

Nos termos do artigo 50° da LGT, a Administração Tributária tem o direto de constituir, nos termos da lei e para garantia dos créditos tributários, penhor ou hipoteca legal, quando essas garantias se revelem necessárias à cobrança efectiva da dívida ou quando o imposto incida sobre a propriedade dos bens.

Por sua vez, dispõe o artigo 169° do CPPT, que a execução fica suspensa até à decisão do pleito em caso, além do mais, de reclamação graciosa, impugnação judicial ou recurso judicial que tenham por objecto a legalidade da dívida exequenda, desde que tenha sido constituída garantia nos termos do artigo 195° ou prestada nos termos do artigo 199° ou a penhora garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido.

Estabelecem ainda os n°s. 6, 7 e 8 desse mesmo artigo 169° do CPPT, que se não houver garantia constituída ou prestada, nem penhora, ou os bens penhorados não garantirem a dívida exequenda e acrescido, é ordenada a notificação do executado para prestar a garantia referida no n° 1 dentro do prazo de 15 dias e se esta não for prestada se procederá de imediato à penhora.

Por fim, sobre a idoneidade e suficiência da garantia prestada, e conforme se alcança dos arts. 149.º, 197.º n.° 1 e 199.° n.º 8 do CPPT, esta será apreciada pelo órgão de execução fiscal, com a categoria de órgão periférico local ou órgão periférico regional, consoante o valor da dívida exequenda.

Ora, não resultando provado nos autos que a quantia exequenda estivesse assegurada por garantia prestada ou que ainda não tivesse sido decidida e apreciada a idoneidade da garantia oferecida – pelo contrário, à data da prolação da sentença tinha já sido confirmada a decisão do órgão de execução fiscal que decidira da inidoneidade da garantia oferecida e, adiantamos nós, à data da interposição deste recurso, até já proferido acórdão deste Tribunal Central confirmando essa decisão – não havia fundamento algum para julgar ilegal o acto reclamado que, de resto, como bem se afirmou, nem verdadeiramente chegou a ser atacado.

Improcede, pois, com os fundamentos expostos, também nesta parte o recurso interposto que, nessa medida, deve ser julgado integralmente improcedente.

V- DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes que integram a Secção de Contencioso do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e, consequentemente, em manter integralmente na ordem jurídica a sentença recorrida.

Custas pelos Recorrentes.

Notifique e registe.


Lisboa, 19-11-2015



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[Anabela Russo]

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[Lurdes Toscano]

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[Ana Pinhol]