Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2169/05.9BELSB
Secção:CT
Data do Acordão:09/16/2021
Relator:ISABEL FERNANDES
Descritores:IRC;
AMORTIZAÇÃO DE BENS;
FUNDAMENTAÇÃO;
EQUIPAMENTOS INFORMÁTICOS;
TAXA.
Sumário:I – A discordância com a motivação da correcção contende com a validade substancial da mesma e não com o vício formal de falta de fundamentação.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a 1ª Sub-Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

I – RELATÓRIO

S... - S..., S.A deduziu impugnação judicial do acto de liquidação de IRC referente ao exercício de 2002, e correspondente liquidação de juros compensatórios, no montante global de 48.258,10 €.

O Tribunal Tributário de Lisboa, por decisão de 09 de Julho de 2018, julgou parcialmente procedente a impugnação.

Não concordando com a sentença, a S... - S..., S.A veio interpor recurso da mesma, tendo nas suas alegações formulado as seguintes conclusões:

«a) Vem o presente recurso interposto da Sentença proferida em 9 de Julho de 2018 no processo de impugnação judicial n.° 2169/05.9BELSB;

b) O Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento e violou o disposto nos artigos 268.°, n.° 3 da CRP e 77.°, da LGT;

c) Com efeito a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA não expôs, de forma coerente e acessível, os motivos, de facto e de direito, que conduziram à correcção da matéria colectável do exercício e, consequentemente, à prática do acto de liquidação;

d) Pelo contrário, limitou-se a meros juízos conclusivos;

e) Juízos conclusivos esses que, conforme jurisprudência constante, não são nem aptos, nem adequados, a fundamentar actos administrativos de liquidação de imposto;

f) Ao manter o acto de liquidação na ordem jurídica o Tribunal a quo, na Sentença recorrida, incorreu em erro de julgamento e violou as sobreditas disposições legais;

g) A Sentença recorrida violou também o disposto no artigo 5.° do Decreto Regulamentar n.° 2/90;

h) Com efeito, os upgrades realizados tiveram por efeito o aumento da vida útil, em concreto, do bem principal;

i) A Lei não determina que se aumente a vida útil inicialmente prevista ou expectável do bem do activo imobilizado;

j) O que a Lei estabelece é que se o período (real e concreto) de vida útil do bem aumentar o gasto com as reparações e beneficiações deve ser amortizado no período expectável de vida útil das mesmas;

k) No caso concreto os upgrades foram essenciais ao aumento concreto da vida útil do bem principal, sem os quais deixaria de cumprir de forma adequada e eficiente as suas funções logo no exercício em causa;

l) Deste modo, por força do upgrade o período de vida útil foi incrementado em dois anos, como expectável;

m) Logo, a utilização da taxa de 50% para amortização do mesmo upgrade tem integral enquadramento no artigo 5.°, do Decreto Regulamentar n.° 2/90 - disposição legal esta violada pela Sentença recorrida;

n) O Tribunal a quo considerou que a RECORRENTE não fez prova de que determinados bens foram incorporados em bem principal e, bem assim, que tal incorporação aumentou o período de vida útil dos mesmos;

o) Olvida, contudo, o Tribunal a quo que na petição inicial ora Recorrente, arrolou testemunhas cuja inquirição demonstraria todos os factos alegados;

p) Testemunhas essas que o Tribunal a quo ao abrigo dos seus poderes de condução do processo, decidiu unilateralmente não ouvir;

q) É, pois, manifesto o deficit instrutório que caracteriza a Sentença em apreço, o qual redundou em erro de julgamento e violação do disposto no artigo 5.° do Decreto Regulamentar n.° 2/90.

r) De resto, a Sentença recorrida é, igualmente, ilegal por erro de julgamento e violação do disposto nos artigos 35.°, n.° 7 da LGT e 266.°, da CRP;

s) Os juros compensatórios apenas podem ser liquidados até 180 dias após a entrega da declaração de rendimentos respectiva;

t) Qualquer outra interpretação não é conforme à Constituição, designadamente ao artigo 266.°, n.° 2, no sentido da proibição do excesso;

u) Permitir que a AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA liquide juros compensatórios nos termos em que o fez no caso concreto significa premiar a ineficiência administrativa e onerar o sujeito passivo com juros que em nada correspondem ao dano provocado;

v) O excesso de período entre a entrega da declaração e o momento em que a Autoridade Tributária e Aduaneira decide utilizar os seus poderes de controlo apenas a esta podem ser imputado.

w) Deste modo, ao decidir em sentido diverso, a Sentença é, pois, também, ilegal por violação do disposto nos artigos 266.°, n.° 2, da CRP e 35.°, da LGT.

TERMOS EM QUE, E NOS MAIS DE DIREITO, SEMPRE COM O DOUTO SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELÊNCIAS, DEVERÁ O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE E REVOGADA A SENTENÇA RECORRIDA (NO SEGMENTO EM QUE JULGA IMPROCEDENTE O PEDIDO FORMULADO PELA ORA RECORRENTE) E, CONSEQUENTEMENTE ANULADO O ACTO DE LIQUIDAÇÃO DE IRC E DE JUROS COMPENSATÓRIOS IMPUGNADO COM AS NECESSÁRIAS CONSEQUÊNCIAS.»


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A recorrida, devidamente notificada para o efeito, optou por não contra-alegar.

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O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo, devidamente notificado para o efeito, ofereceu parecer, renovando o teor do parecer elaborado pelo DMMP junto do STA, no sentido da improcedência do recurso.
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Com dispensa de vistos, vem o processo submetido à conferência desta 1ª Sub-Secção do Contencioso Tributário para decisão.



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II – FUNDAMENTAÇÃO

- De facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

1) A impugnante é uma sociedade anónima que tem como objecto a “a) instalação, montagem e gestão em Portugal de sistemas bancários de pagamento nacionais e ou internacionais; b) emissão, gestão e controle de cartões, que poderão revestir a forma de cartões de débito ou de crédito; c) celebração de contratos com entidades nacionais ou estrangeiras emissoras de cartões de débito ou de crédito; d) prestação de quaisquer serviços de alguma forma ligados a sistemas electrónicos de pagamentos, nomeadamente telecompensação e tratamento informático, e o fornecimento de equipamentos informáticos aos seus sócios, a prestação dos seus serviços ou a terceiros; e) prestação de quaisquer serviços ligados a sistemas electrónicos de transmissão e gestão de informação de dados” - cfr. fls. 139 a 150 dos autos;

2) A Direcção de Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária da Direcção- Geral dos Impostos desencadeou à ora impugnante procedimento de inspecção interno tendo por objecto a Declaração de Rendimentos Modelo 22 (IRC), referente ao exercício de 2002, no âmbito do qual foram efectuadas correcções ao lucro tributável, na parte referente às reintegrações e amortizações, no montante de 63.891,82 €, relativo a despesas com instalações em propriedade alheia e no valor de 74.719,35 €, respeitante a upgrades - cfr. fls. 113 a 121 do Processo Administrativo Tributário apenso;

3) No âmbito da acção inspectiva mencionada no ponto anterior, foi elaborado, em 12/01/2005, o relatório da inspecção tributária, cujo teor se considera aqui integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:







” - cfr. fls. 113 a 121 do PAT apenso;

4) Por ofício datado de 22/02/2005, foi expedida notificação do relatório identificado no ponto antecedente, dirigida à ora impugnante, cujo aviso de recepção foi assinado em 23/02/2005 - cfr. fls. 110 a 112 do PAT apenso;

5) Em 16/03/2005, foi emitida a liquidação de IRC n° 200585100..., referente ao exercício de 2002, no montante de 45.741,69 €, e correspondente liquidação de juros compensatórios n° 2005127799, no montante de 2.516,41 €, calculados durante o período de 30/08/2003 a 12/01/2005 - cfr. fls. 343 a 345 do PAT apenso;

6) Em 06/11/2000 foi emitido o instrumento denominado “SUPLEMENTO ÀS CONDIÇÕES GERAIS DE LOCAÇÃO FINANCEIRA”, subscrito pela ora impugnante na qualidade de locatária, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:


«Imagem no original»


- cfr. doc. n° 1 junto com a p.i., a fls. 42 dos autos;

7) Em 01/10/2002 foi emitido o instrumento denominado “SUPLEMENTO ÀS CONDIÇÕES GERAIS DE LOCAÇÃO FINANCEIRA”, subscrito pela ora impugnante na qualidade de locatária, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido e de que se extrai o seguinte:


«Imagem no original»


- cfr. doc. n° 5 junto com a p.i., a fls. 56 a 68 dos autos;

8) Em 10/03/2002 foi elaborado o instrumento denominado “Estudo Evolução Sistema Central S...”, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido e do qual se extrai, designadamente, o seguinte: “

I - Sumário Executivo

Como ponto de partida do estudo foram efectuadas simulações sobre o actual sistema central, utilizando estimativas de crescimento (ver ponto II), baseadas no comportamento histórico dos sistemas da S..., nomeadamente Multibanco. (...)

As principais conclusões, contidas no Ponto III, apontam para:

• Necessidade de UPGRADE do CPU actual com mais um processador, de forma a suportar, o corrente ano e possivelmente os dois anos seguintes, dependendo dos crescimentos que se verificarem.

Deverá, desta última conclusão, inferir ser muito arriscado suportar, com o actual Hardware, o ano de 2002, significando estarmos a atingir limiares perigosos e que existe um risco real de sobrecarga dos sistemas no pico de final do ano (...).

(...)

III. Sistema actual

1 - INTRODUÇÃO

A S... tem actualmente o seu sistema de informação, em termos de sistemas centrais, baseado em dois CPUs IBM 9672-Z47 (...)

2 - SIMULAÇÃO NO CENÁRIO BASE

Tendo como base, os dados do Sistema de Produção da S... recolhidos no dia 15 de Julho de 2002, entre as 18,00 e as 19,00 horas, período este considerado de “pico”, aplicou-se inicialmente neste ambiente os factores de crescimento descritos no ponto II, mantendo a actual configuração de Hardware, ou seja, um CPU IBM9672-Z47, com quatro processadores (...)

Como conclusão preliminar do estudo verificamos ser imprescindível assegurar, até ao fim do corrente ano, um novo processador para que o CPU seja capaz de assegurar o correcto desempenho das aplicações, sem grandes degradações dos níveis de serviço de on-line.

IV - Simulação em novo Hardware

1 - ALTERNATIVA

Para efeitos de simulação, considerou-se um equipamento IBM que apresenta características enquadráveis nos objectivos da S... e que é equivalente a fazer um UPGRADE ao CPU actual.

A simulação considerou o seguinte equipamento:





(...)

V - Conclusões Finais

O critério de escolha para simulação da máquina IBM 9672-Z57 foi feita numa óptica de controlo de custos. Com o UPGRADE ao nosso CPU de mais um processador conseguimos rentabilizar a nossa máquina e satisfazemos as nossas necessidades imediatas.

Pela observação detalhada da alternativa estudada, podemos concluir que com o UPGRADE do CPU actual, estamos em condições razoáveis para suportar o próximo final de ano. (...)” - cfr. doc. n° 6 junto com a p.i., a fls. 70 a 80 dos autos.


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Nada mais foi provado com interesse para a decisão a proferir.

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A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos constantes dos autos e do PAT apenso, conforme discriminado em cada um dos pontos do probatório.



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- De Direito

Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo Recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

Foram interpostos recursos por ambas as partes, sendo que iniciaremos a nossa análise pelo recurso deduzido pela Fazenda Pública.

Assim, lidas as conclusões recursivas apresentadas, importa apreciar e decidir se a sentença padece de erro de julgamento de direito, por violação do artigo 5º do DR nº2/90, do artigo 77º da LGT e do nº3 do artigo 268º da CRP.

Vem, por outro lado, invocado déficite instrutório, por se não ter realizado a diligência de inquirição das testemunhas arroladas.

Por fim, relativamente à liquidação de juros compensatórios, entende a Recorrente que a sentença padece de erro de julgamento, por se verificar violação do preceituado no nº7 do artigo 35º da LGT, na medida em que a AT liquidou juros para além do período de seis meses.

Por concordarmos, na íntegra, com o teor do parecer elaborado pelo DMMP junto do STA (que, nos presentes autos, se julgou incompetente em razão da hierarquia), e que foi renovado pelo DMMP junto deste TCAS, recuperamos o seu teor, que expressamente acolhemos, nos seguintes termos:

“(…)II. Fundamentação de facto e de direito da sentença.

1. Na sentença recorrida deu-se como assente que a impugnante foi objecto de uma ação de inspeção no âmbito da qual foram realizadas correções à matéria tributável em sede de IRC do ano de 2002, na parte referente a amortizações e reintegrações, no valor global de € 63.891,82 euros 

Tais correções assentaram no argumento de que o sujeito passivo utilizou taxas de amortização superiores às permitidas.

Na sequência de tais correções foi emitida a liquidação adicional de IRC do ano de 2002, no valor de € 45.741,69 euros, acrescida de juros compensatórios, no valor de € 2.516,41 euros, contabilizados no período de 30/08/2003 a 12/01/2005.

2. Para se decidir pela procedência da ação, considerou o tribunal "a quo" que as correções da AT não padeciam de falta de fundamentação, por serem facilmente apreensíveis as razões pelas quais a AT considerou não serem aplicáveis as quotas de amortização utilizadas pela impugnante, facto que se depreende igualmente da petição inicial.

E no que respeita ao período de vida útil de 5 anos atribuído pelo sujeito passivo, a AT não o tinha posto em causa, pelo que a opção efetuada pela impugnante estava enquadrada na previsão da norma do n°2 do artigo 5a do Decreto Regulamentar n° 2/90. E considerando que do regime consagrado no Aviso do Banco de Portugal n° 9/94 resulta que "as despesas de investimento, não são passíveis de recuperação, realizadas em edifícios que não sejam propriedade da instituição devem ser amortizadas em prazo compatível com a da sua utilidade esperada", embora com o limite de 10 anos, pelo que não tendo o prazo considerado pela impugnante excedido esse prazo, o mesmo mostra-se conforme ao regime aplicável (art. 5°, n°2, do Dec. Reg. n° 2/90, e art. 2° do Aviso n° 9/94, do Banco de Portugal).

Concluiu, assim, o tribunal "a quo" que a correção ao lucro tributável referente a reintegrações e amortizações não aceites como custos, na parte relativa a obras em edifícios alheiros padecia de erro sobre os pressupostos de direito.

Já no que respeita à parte das correções referentes a "upgrades", o tribunal "a quo" confirmou o juízo formulado pela AT no que respeita às amortizações no valor de € 884,10, no sentido de que a impugnante não tinha carreado elementos que contrariassem o entendimento sustentado pelos Serviços de Inspeção. E quanto à correção no montante de € 73.835,25 euros, referente ao "upgrade" do equipamento IBM 9672-Z47 considerou o tribunal "a quo" que «dimana da factualidade dada como provada nos autos que a realização do upgrade através da aquisição de um novo processador não conduziu a um aumento da vida útil do bem que a impugnante identifica como sendo o bem principal - o CPU -, ou seja, não proporcionou um prolongamento da sua normal duração.

Assim, resultou demonstrado nos autos que o processador em questão contribuiu para um aumento da capacidade de suporte e desempenho do sistema no geral, não tendo a impugnante, todavia, logrado demonstrar que se tenha verificado uma extensão da vida útil do CPU IBM modelo 9672-Z47. (...) Por outro lado, .. .a impugnante não alegou e .. ..também não demonstrou a existência de um aumento do valor real do elemento subjacente ao processador». E nessa medida concluiu o tribunal "a quo" que não se verificavam os requisitos de a que a lei faz depender a ocorrência de uma "grande reparação ou beneficiação", nos termos e para os efeitos do disposto no art. 5°, n°2, do Decreto Regulamentar n° 2/90.

No que respeita à questão dos juros compensatórios considerou o tribunal "a quo" que tendo a liquidação adicional resultado de ação inspetiva, mostra-se aplicável o disposto no n°7 do artigo 35a da LGT, pelo que os juros compensatórios são devidos até aos 90 dias posteriores à conclusão do procedimento de inspeção.

III. A Recorrente suscita no essencial a apreciação de três questões: (i) A primeira saber se o tribunal "a quo" apreciou corretamente a questão da falta de fundamentação das correções; (ii) a segunda saber se o tribunal "a quo" incorreu em erro de julgamento ao considerar não estarem reunidos os pressupostos de aplicação do disposto na alínea c) do n°2 do artigo 5° do Decreto Regulamentar n° 2/90, de 12 de janeiro; (iii) A terceira a de saber se os juros compensatórios só são devidos pelo período máximo de 6 meses (180 dias).

1. No que respeita à questão da falta de fundamentação afigura-se-nos que o entendimento vertido na sentença não merece censura.

Alega a Recorrente que o relatório dos Serviços de Inspeção contém apenas juízos conclusivos e raciocínios intervalados, o que obsta ao exercício do seu direito de defesa. E que o ato de liquidação não faz qualquer remissão para qualquer outro documento donde conste a respetiva fundamentação.

Afigura-se-nos, contudo, que não lhe assiste razão.

Desde logo porque na petição inicial a impugnante não invocou a alegada falta de remissão do ato de liquidação para outro documento, motivo pelo qual o tribunal "a quo" também não se pronunciou sobre essa questão, na perspetiva agora enunciada pela Recorrente. Ora, dado que os recursos se destinam a sindicar a bondade da decisão recorrida e não a apreciar questões novas, salvo de conhecimento oficioso, o que não é o caso, não pode agora o tribunal "ad quem" debruçar-se sobre essa questão.

Por outro lado e como se deixou vertido na sentença recorrida, no relatório dos Serviços de Inspeção é feita uma exposição das razões de facto e de direito que conduziram às correções propostas e posteriormente aprovadas, assentes no entendimento de que o sujeito passivo aplicou taxas de amortização superiores às legalmente permitidas em relação a determinados bens que estão identificados e em razão das normas legais aplicáveis, que foram igualmente discriminadas. E que por outro lado sobressai da petição inicial que a impugnante apreendeu a motivação subjacente a essas correções. Ora o que resulta do discurso da impugnante e aqui Recorrente é uma discordância com essa motivação, o que já contende com a validade substancial da mesma e não com o vício formal de falta de fundamentação, que se destaca num plano distinto, como se deixou exarado na sentença recorrida.

Entendemos, assim, que a sentença recorrida fez uma correta apreciação desta questão, motivo pelo qual se impõe a sua confirmação.

2. No que respeita aos requisitos de aplicação do disposto no artigo 5°, n°2, alínea c) do Decreto Regulamentar n° 2/90, de 12 de Janeiro.

Dispõe o n°1 do artigo 5° do Decreto Regulamentar n° 2/90 que «no caso de utilização do método de quotas constantes, a quota anual de reintegração e amortização que pode ser aceite como custo de exercício determina-se aplicando aos valores mencionados no n°1 do artigo 2° as taxas fixadas nas tabelas anexas...»; Por sua vez o n°2 do mesmo preceito legal prevê exceções a essa regra nos casos de "grandes reparações ou beneficiações", entendendo-se como tal os casos de "aumento do valor real ou da duração provável dos elementos a que respeitem" (al. a) do n°5 do artigo 5°)2. E nestes casos as taxas de reintegração e amortização são calculadas com base no correspondente período de utilidade esperada (corpo do n°2 do artigo 5°).

Ora, a Recorrente alega a este propósito que a aquisição de mais um processador teve por finalidade o aumento da capacidade da unidade central de processamento (CPU, nas siglas anglosaxónicas), de modo a fazer face a eventual "pico" de transações na época de Natal. E que esse aumento de capacidade de processamento do sistema instalado conduziu ao aumento da vida útil do bem, já que se esperava que com esse aumento de capacidade de processamento de dados a unidade desse resposta às situações de maior número de transações expetável na época natalícia. Concluiu ainda a Recorrente que sem esse aumento de capacidade de processamento de dados o sistema instalado "tornar-se-ia naquele ano inapto e desadequado para as funções que desempenha".

Considera ainda que as testemunhas arroladas e oferecidas na petição inicial se destinavam a fazer prova de toda essa situação e que ao ser dispensada a sua inquirição o tribunal "a quo" incorreu em "déficit instrutório", com repercussão no apuramento da factualidade pertinente.

Entende, assim, a Recorrente que o bem adquirido e integrado em equipamento principal é subsumível no n°5, alínea a) do artigo 5° do Decreto Regulamentar n°2/90, e que a sentença recorrida ao assim não entender incorreu em erro de julgamento.

Na sentença recorrida o tribunal "a quo" faz as seguintes considerações a este propósito:

«Assim, resultou demonstrado nos autos que o processador em questão contribuiu para um aumento da capacidade de suporte e desempenho do sistema no geral, não tendo a impugnante, todavia, logrado demonstrar que se tenha verificado uma extensão da vida útil do CPU IBM modelo 9672-Z47. Dito de outro modo, não logrou demonstrar que o processador adquirido consubstanciou um contributo necessário ao prolongamento da vida normal do bem indicado como bem principal, designadamente, por o mesmo já não estar em condições de funcionamento no período de vida útil que lhe foi atribuído, à luz dos critérios legalmente previstos.

Por outro lado, cumpre ressalvar que a impugnante não alegou e, consequentemente, também não demonstrou a existência de um aumento do valor real do elemento subjacente ao processador».

E afigura-se-nos que o entendimento vertido na sentença recorrida está correto e não padece do vício de erro de julgamento que lhe é assacado pela Recorrente. Com efeito e se atendermos à argumentação aduzida pela Recorrente na sua petição inicial e ao documento interno levado ao ponto 8) do probatório e denominado "Estudo Evolução Sistema Central S...", constatamos que a Recorrente nunca invocou que a aquisição do novo processador e a consequente beneficiação do sistema conduzisse a um prolongamento da vida útil do equipamento já utilizado. Na verdade, tendo o equipamento beneficiado sido adquirido no ano de 2000 - ponto 6) do probatório -, o que a Recorrente invocou é que ao novo processador adquirido em 2002 devia ser atribuído o período de via útil correspondente ao primeiro, ou seja, na prática os restantes dois anos. E é com base nesse entendimento que foi utilizada a taxa de amortização de 50%.

Aliás é o que resulta do relatório dos SIT, pois aquando do exercício do direito de audição o sujeito passivo alegou que no caso dos "upgrade’s" «não sendo de manutenção e/ou reparação, acrescentam capacidade de processamento e níveis de performance tecnológica sem aumentar a sua vida útil, pelo que não conduzem a um aumento da sua vida útil, fazendo parte de um bem principal» e é ressaltado nos pontos 103° e 128° da petição inicial.

Não tendo a Recorrente alegado na sua petição inicial que sem esse aumento de capacidade de processamento de dados o sistema instalado "tornar-se-ia naquele ano inapto e desadequado para as funções que desempenha", não podia o tribunal "a quo" produzir prova sobre esse facto. Não há, assim, défice instrutório, sobre essa factualidade, a qual só em fase de recurso é invocada pela impugnante.

Na verdade, na petição inicial a Recorrente insurgiu-se contra o entendimento adotado pelos Serviços de Inspeção no sentido de que «o sujeito passivo não demonstrou, documentalmente, que os bens objecto de correção faziam parte de outros bens principais» e que «só se poderia aplicar uma taxa de reintegração e amortização superior à permitida se o imobilizado corpóreo objeto de reintegração e/ou amortização fossem os constantes das alíneas a) a d) do art. 5° do Decreto Regulamentar n° 2/90, de 12701, facto não aplicável ao caso em apreço» . E para contrariar tal entendimento a impugnante e aqui Recorrente juntou os documentos relativos aos contratos de locação financeira e ao "estudo do Sistema Central S...", de modo a comprovar a relação entre a aquisição do processador e os benefícios resultantes da sua integração no sistema já instalado. Tendo concluído nos artigos 125 e 127 da sua petição que «deve a inerente amortização ser efetuada no período em que se esperam obter benefícios económicos com tais benfeitorias, in casu, no período de 2002 e 2003, e portanto a uma taxa de 50%» e que a" taxa de amortização concretizada visou acompanhar o bem principal» ou que «a sua amortização deve ser determinada de acordo com o respetivo período de desgaste ou de utilidade esperada do bem que ela visou beneficiar no seu todo» (artigo 131° da petição inicial).

Ou seja, na petição inicial a impugnante e aqui Recorrente alegou apenas factos e fez referência a documentação que juntou com vista a comprovar que o processador adquirido em 2002 se destinava a integrar o equipamento já instalado (e adquirido no ano de 2000) com vista a obter um melhor desempenho do mesmo face às necessidades que eram esperadas nas situações de "pico" das transações (época natalícia). Mas não alegou quaisquer factos no sentido de que a aquisição do novo processador e a consequente beneficiação do sistema conduzisse a um prolongamento da vida útil do equipamento já utilizado (bem pelo contrário) ou que sem esse aumento de capacidade de processamento de dados o sistema instalado "tornar-se-ia naquele ano inapto e desadequado para as funções que desempenha".

Em face do exposto entendemos que a sentença recorrida não padece do vício que lhe é assacado pela Recorrente, motivo pelo qual se impõe a sua confirmação.

4. No que respeita à questão do período em que são devidos os juros compensatórios.

Resulta da sentença recorrida que AT liquidou juros compensatórios no período de 30/08/2003 a 12/01/2005 (ponto 5 do probatório), ou seja, durante 499 dias, situação que é contestada pela Recorrente, por no seu entender o período máximo de juros ser de 180 dias, sob pena de violação do disposto no n°7 do artigo 35° da LGT.

O tribunal "a quo" entendeu que a situação dos autos era subsumível no segmento final do n°7 do artigo 35° da LGT, ou seja, que os juros compensatórios são devidos até aos 90 dias posteriores à conclusão do procedimento de inspeção, e como o relatório desse procedimento havia sido elaborado em 12/01/2005 e notificado ao sujeito passivo em 23/02/2005, mostrava-se correta a liquidação dos juros até 12/01/2005. Entendimento este contestado pela Recorrente que considera que em nenhuma das situações a liquidação pode ultrapassar o período de 180 dias.

A redação do artigo 35° da LGT não prima pela clareza. De todas as formas, nos termos das disposições conjugadas dos n°s 1, 3 e 4 do artigo 35° da LGT, resulta que os juros compensatórios são devidos desde o termo do prazo de apresentação da declaração até à deteção da falta que motivou o retardamento da liquidação, ou seja, no caso concreto até à elaboração do auto de notícia. Todavia, o n°7 do artigo 35° da LGT estabelece dois prazos máximos, distinguindo entre as situações de "erro evidenciado na declaração" e "falta apurada em ação de fiscalização". No caso concreto dos autos estamos perante a segunda hipótese, ou seja, perante falta apurada em ação de fiscalização, pelo que o prazo limite a atender é o do segmento final da norma, isto é, o prazo de 90 dias posteriores à conclusão da ação de inspeção. Segundo Jorge Lopes de Sousa, «o alcance da norma é evitar que a Administração Tributária atrase indefinidamente a elaboração do relatório com que deve concluir a ação de inspeção », ação esta que ela própria está sujeita a prazos (seis meses, prorrogáveis por dois períodos de três meses - art. 36°, n°2 e 3 do RCPIT).

Na sentença recorrida deu-se como assente que o relatório da ação inspetiva foi elaborado em 12/01/2005 e que o mesmo foi notificado ao sujeito passivo em 23/02/2005, considerando-se esta última data como a data da conclusão do procedimento inspetivo, nos termos do n°2 do artigo 62° do RCPIT.

Dado que não está em causa a ultrapassagem dos prazos do procedimento de inspeção e não há igualmente notícia de que tenha sido elaborado auto de notícia em momento anterior, há que atender à data da sua conclusão para aferir da ultrapassagem do prazo de 90 dias. E como se concluiu na sentença recorrida, é evidente que isso não ocorreu, uma vez que os juros compensatórios foram liquidados até 12/01/2005.

Assim sendo, entendemos que nada há a censurar à sentença recorrida, que assim o entendeu, motivo pelo qual se impõe igualmente nesta parte a sua confirmação.

IV. Em conclusão: A sentença recorrida fez uma correta interpretação e aplicação das normas legais aplicáveis ao caso concreto e não padece dos vícios que lhe são assacados pela Recorrente, motivo pelo qual se impõe a sua confirmação, julgando-se improcedente o recurso.(…)”

Face ao exposto, não logra provimento o presente recurso, sendo de manter a sentença recorrida.


III- Decisão

Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da 1ª Sub-Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso, assim se mantendo a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente.

Registe e Notifique.

Lisboa, 16 de Setembro de 2021

A Relatora consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13/03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01/05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Desembargadores integrantes da formação de julgamento, os Desembargadores Jorge Cortês e Hélia Gameiro Silva.


(Isabel Fernandes)

(Jorge Cortês)

(Hélia Gameiro Silva)