Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul | |
Processo: | 2676/14.2BELRS |
Secção: | CT |
Data do Acordão: | 05/07/2020 |
Relator: | ANABELA RUSSO |
Descritores: | MANDATO JUDICIAL; REGULARIZAÇÃO; ABSOLVIÇÃO DA INSTÂNCIA. |
Sumário: | I – Estando em vigor, na data da propositura da Impugnação Judicial, que é obrigatória a constituição de mandatário nos processos judiciais tributários em que o valor da acção seja superior ao décuplo da alçada do tribunal tributário de 1ª instância, não pode verificado esse valor, a acção prosseguir sem que a Impugnante junte procuração conferindo a mandatário poderes para a representar em juízo.
II – Quando o Tribunal verifica oficiosamente que existia uma situação de irregularidade do mandato, impõe-se-lhe que determine a notificação da parte e da Advogada subscritora da petição inicial para, num determinado prazo, corrigirem a situação, com a advertência de que, não o fazendo, serão dados sem efeito todos os actos praticado pela referida advogada e esta condenada nas custas a que deu causa com a propositura da acção. III – Tendo o Tribunal observado o referido em II, sem que a parte ou a Ilustre advogada tenham junto procuração ou substabelecimento válidos, é inatacável a decisão do Tribunal que, respeitando a cominação antecipada, absolve a Fazenda Pública da instância. |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: |
1 |
Decisão Texto Integral: | Acórdão
1. Relatório O Tribunal Tributário de Lisboa, julgando verificada a excepção dilatória de irregularidade do mandato judicial, absolveu a Fazenda Pública da instância. 1.2. Inconformada, a Impugnante recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo, tendo, nas suas alegações, produzido as seguintes conclusões: «1 - A ora recorrente não se conforma com despacho de fls. .., e é dele que recorre, 2- Em 05/06/2015, na sequência de despacho, foi dada entrada de substabelecimento a favor a mandatária da recorrente. 3- Em 09/09/2015, na sequência de despacho, foi junta procuração forense, assinada pelo legal representante da recorrente, que deu poderes para que fosse outorgado substabelecimento a favor da mandatária da recorrente, 4 - Em 07/01/2016, foi novamente junto substabelecimento a favor da mandatária da recorrente, bem como comunicação da gerência da recorrente, a confirmar o teor da procuração junta ao processo, com referencia que tinha sido o gerente a assinar e com a identificação do código da certidão permanente em que consta a identificação do gerente e não apenas copia autenticada do substabelecimento como refere o despacho que se recorre. 5 - Há, no entanto, especiais exigências de forma quanto ao modo como se confere o mandato judicial em processo civil, constantes do artigo 43° do CPCivil. 6 - Aí se estipula que o mandato judicial pode ser conferido por instrumento público ou por documento particular, nos termos do Código do Notariado e da legislação especial (al. a) ou por declaração verbal da parte no auto de qualquer diligência que se pratique no processo (al. b). Outros modos de exteriorização do mandato judicial não são admissíveis em processo civil. 7 - Dito isto, é enganadora a epígrafe de "falta, insuficiência e irregularidade do mandato" aposta no art°40° do CPCiv., já que o seu n°1 deixa expresso que do que aí se cura é da falta de procuração e da sua insuficiência ou irregularidade. Pressuposto do funcionamento do mecanismo previsto no n°2 do aludido art°40° será, pois, a falta, insuficiência ou irregularidade da procuração, e não um qualquer vício que afecte o contrato de mandato que lhe subjaz, que de resto nem tem que ser junto aos autos. Assim sendo, exista ou não contrato de mandato válido, tenha ou não sido subscrita procuração conferindo poderes forenses ao mandatário, se ela não for junta aos autos, falta, de todo, a procuração, recaindo a hipótese sob a previsão do art°40° do CPCiv. - "quod non est in actis, non est in mundo". 8 - No último despacho, este notificado à parte foi determinado: 9 - Tendo a mandatária procedido à junção de cópia autenticada do documento de fls. 29 e de documento onde constava a identificação e os poderes de representação da pessoa que subscreveu a procuração. 10- Logo, não podia o Mmo. Juiz avançar como avançou, ordenando o desentranhamento da Petição. 11 - O desentranhamento da petição de impugnação, no momento e nos termos em que foi ordenado, é indevido, não podendo manter-se. 12 - Ao decidir como decidiu o douto despacho ora em crise violou o disposto nos artigos, 43°, 48° do CPC. Nestes termos, e nos melhores de direito e com o suprimento de V. Exas., deve ser concedido total provimento ao presente recurso e, em consequência, revogar-se o despacho proferido Assim se Fazendo a Costumada Justiça». 1.3. A Recorrida, Fazenda Pública, notificada da admissão do recurso interposto, optou por não contra-alegar. 1.4. Por despacho do Exmo. Conselheiro a quem os autos foram atribuídos em distribuição no Supremo Tribunal Administrativo, foi declarada a incompetência hierárquica daquele Tribunal Superior para apreciar do mérito do recurso e competente para esse efeito este Tribunal Central Administrativo Sul. 1.5. Recebidos os autos neste Tribunal Central e apresentados à Exma. Procuradora-Geral Adjunta, foi emitido parecer no sentido de improcedência do recurso. 1.6. Colhidos os «Vistos» dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir. 2. Objecto do recurso Como é sabido, sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que o recorrente remata a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida: artigo 639.º, n°1, do Código de Processo Civil) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal de recurso. Assim, e pese embora na falta de especificação no requerimento de interposição se deva entender que este abrange tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (artigo 635.°, n°2 do Código de Processo Civil) esse objecto, assim delimitado, pode, expressa ou tacitamente, ser restringido nas conclusões da alegação (n.°3 do mesmo artigo 635.°). Pelo que, todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, devem considerar-se definitivamente decididas e, consequentemente, delas não pode conhecer o Tribunal ad quem. Acresce que, constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo a já mencionada situação de questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo. 2.1. Atento o exposto, e tendo presentes as conclusões de recurso apresentadas, importa decidir, desde logo, se o despacho recorrido deve ser revogado porque: (i) dos documentos juntos aos autos resulta que a Ilustre Advogada subscritora da petição inicial juntou substabelecimento que lhe confere poderes para, enquanto advogada, representar a Impugnante em juízo? (ii) O Tribunal a quo omitiu a notificação da Impugnante imposta pelo artigo 40.º, n.º 2 do Código de Processo Civil? 3. Fundamentação de facto 3.1. O despacho recorrido possui o seguinte teor: “V... - Aluguer de Veículos e Transporte de Mercadorias, Lda., com os demais sinais identificados nos autos, veio deduzir impugnação judicial relativamente aos processos de reclamação graciosa n°s3..., 3…, 2…, 3…, 3…, 3…, 3…, 3.., 3…, 3.., 3…, 3…, 3…, 3…, 3…, 3…, 3…, 3…, 3…, 3…, 3…, 3…, 3…, 3…, por discordar dos valores de liquidação apurados referentes ao imposto de circulação dos anos de 2009, 2010, 2011 e 2012 relativos a diversas viaturas, invocando não ser a proprietária das mesmas desde 2009, no montante de €28.000,00. Em sede de apreciação liminar constatou este Tribunal que o mandato não se encontrava regularmente constituído, tendo sido determinada por despacho de fls. 14 a junção aos autos de procuração forense constituída em favor da Ilustre Advogada subscritora da petição inicial, Dra. H…, com ratificação do processado, se fosse o caso, bem como para juntar aos autos ao documentação que protestou juntar aquando da propositura da acção. Por requerimento apresentado neste Tribunal no dia 05/06/2015, veio a Ilustre Advogada subscritora do articulado inicial juntar aos autos procuração forense, com poderes para representar a Impugnante em substabelecimento de um outro Ilustre Advogado (P…) - cfr. fls. 22 e fls. 23 dos autos. Não constando dos autos qualquer mandato ou procuração constituída pela Impugnante em favor nem da Ilustre Advogada subscritora da petição inicial, nem do Ilustre Advogado subscritor do substabelecimento, foi proferido novo despacho determinando a regularização da situação, nomeadamente a junção aos autos de procuração forense constituída em favor da Ilustre Advogada subscritora da petição inicial ou do Ilustre Advogado subscritor do substabelecimento - cfr. fls. 25 dos autos. No dia 09/09/2015 deu entrada neste Tribunal requerimento por telecópia, em anexo ao qual se encontrava uma procuração forense subscrita em favor do Dr. P… (ilustre Advogado subscritor do substabelecimento) — cfr. fls. 29 dos autos. Não obstante, continua a verificar-se uma situação de anormalidade dado que do documento ora junto não consta a identificação do subscritor, deixando consequentemente o tribunal no desconhecimento relativamente à respectiva identidade, condição subscrevia e poderes de representação do representante legal da Impugnante. Face ao exposto, foi proferido novo despacho (a fls. 32 dos autos), solicitando a junção aos autos do original da procuração forense junta a fls. 29 dos autos, bem como documento de que conste a identificação, condição e poderes de representação do subscritor daquele documento, sob cominação expressa de serem tidos por sem efeito todos os actos praticados pela Ilustre Advogada subscritora da petição inicial, com as consequências previstas no n°2 do Art.° 48° do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi da al. e) do Art°2° do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT) — advertência que já havia sido feita anteriormente. Em resposta, veio a Ilustre Advogada subscritora da petição inicial, de novo, juntar cópia autenticada do substabelecimento que lhe foi conferido. Aqui chegando, constato que, apesar das diversas insistências do Tribunal continua a não constar nos autos procuração forense regularmente outorgada a favor da signatária da petição inicial, pelo que subsiste a irregularidade na constituição do mandato. Ora e conforme decorre do art.48.° do Código de Processo Civil (CPC)[na sistematização da lei n°41/2013 de 26/06). O sublinhado é nosso. Assim e nos termos da norma supra citada, aqui aplicável por força da al. e) do artº2° do CPPT, só nos resta sem efeito todos os atos praticados pela Ilustre Advogada subscritora da petição inicial, a Dra. H…. Acresce referir que atento o valor indicado na petição inicial como sendo o valor do processo, nos autos, sempre seria obrigatória a constituição de mandatário, conforme prescreve o n°1 do Art°6° do CPPT, o que significa que também por esta via a falta ou irregularidade na sua constituição obsta ao conhecimento do mérito da acção e tem como cominação absolvição do réu da instância, nos termos da al. d) do n°1 do Art°278° do CPC aplicável ex vi da al. e) do Art°2° do CPPT. DECISÃO: Termos em que se impõe, sem mais, declarar sem efeito tudo o que foi praticado pelo aparente mandatário nos termos do actual n°2 do artº48° do Código de Processo Civil. E absolvo a Fazenda Publica da instância.» 4. Fundamentação de direito As duas questões colocadas em recurso prendem-se, ambas, com uma mesma realidade, qual seja, a do patrocínio judiciário no âmbito do processo judicial tributário, especialmente com as situações em que é exigível e, sendo-o, como deve ser prestado e as consequências da falta ou insuficiência da sua prestação.
5. Decisão Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul, negando provimento ao recurso jurisdicional, em manter integralmente na ordem jurídica o despacho recorrido. Custas pela Exma. Sra. Advogada subscritora da petição inicial que se fixa no mínimo legal. Registe e notifique. Lisboa, 7 de Maio de 2020 (Anabela Russo) (Vital Lopes) (Luísa Soares) |