Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:9/20.8BCLSB
Secção:CA
Data do Acordão:06/18/2020
Relator:LINA COSTA
Descritores:DISCIPLINA DESPORTIVA;
RELATÓRIO;
PROVA;
PRESUNÇÃO JUDICIAL
Sumário:I. Inexistindo dúvida (razoável), mantem-se a presunção efectuada a partir do relatado nos relatórios do árbitro e do delegado da Liga (com valor probatório reforçado, cfr. o disposto na alínea f) do artigo 13º do RD) quanto aos factos assumidos como provados por incumprimento por parte do Clube de Futebol recorrente dos seus deveres de vigilância, controlo e formação, que a terem sido observados deveriam ter impedido todos os comportamentos sociais e desportivos incorrectos evidenciados, incluindo os indicados insultos à equipa de arbitragem e à equipa visitante;

II. A intenção de deflagrar um dispositivo pirotécnico consome a entrada no recinto desportivo com o mesmo, não podendo manter-se a aplicação simultânea das sanções previstas na alínea b) do nº 1 do artigo 187º e no nº 1 do artigo 127º, do RD, por não poder ser aplicada mais de uma sanção disciplinar por cada infracção.

Votação:UNANIMIDADE, COM DECLARAÇÃO DE VOTO
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

F….., Sociedade Anónima Desportiva (F….. SAD ou Recorrente), devidamente identificada na acção arbitral nº 47/2019, veio interpor recurso jurisdicional do acórdão proferido pelo Tribunal Arbitral do Desporto (TAD), em 7.1.2020, que julgou improcedente o recurso que interpôs contra a Federação Portuguesa de Futebol (FPF ou Recorrida) e a Liga Portuguesa de Futebol Profissional (LPFP), na qualidade de contra-interessada, no processo disciplinar nº ….., mantendo a deliberação do Pleno do Conselho de Disciplina, Secção Profissional, da FPF, de 23.7.2019, que, por sua vez, manteve a decisão da Secção Profissional do mesmo Conselho de Disciplina, de 18.6.2019, que a condenou em quatro sanções disciplinares p. e. p. pelos artigos 186º, nº 2 (arremesso de objectos perigosos), 187º, nº 1, alíneas a) e b) (comportamentos incorrectos do público por entoação de expressões grosseiras e ofensivas, e rebentamento de engenhos pirotécnicos) e 127º, nº 1 (inobservância de outros deveres), todos do Regulamento Disciplinar da Liga Portuguesa de Futebol Profissional (RD), e a puniu com diversas multas, no valor total de €12 184,00 e mais decidiu fixar as custas em €4 890,00 a cargo da demandante.
Nas respectivas alegações, a Recorrente formulou as conclusões que seguidamente se reproduzem:
- I -

A. O presente recurso tem por objecto o acórdão de 07/01/2020 do TAD, que confirmou a condenação da recorrente pela prática de quatro infracções disciplinares p. e p. pelos arts. 186.°-2, 127 °- 1 e 187.°-1 a) e b) do RD, punindo-a em multa no valor total de € 12.184,00.

B. Acontece que, o acto punitivo proferido em 18/06/2019, e mantido pela Deliberação emitida em 23/07/2019 pelo Pleno da Secção Profissional do Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol é, desde logo, nulo por violação do direito de defesa da Recorrente, e bem assim por violação dos princípios da culpa e da presunção da inocência.

C. Com efeito, a norma plasmada no art. 13.°, al. f) do RD, na medida em que contém uma presunção inilidível da veracidade dos factos constantes dos relatórios dos árbitros e do delegado da Liga, é materialmente inconstitucional quando aplicada ao procedimento disciplinar sumário, por violação dos princípios da culpa e da presunção da inocência, preceituados no arts. 32.°, n.° 10 e 2 da CRP, bem como por violação dos direitos ao contraditório e ao processo equitativo, previstos no art. 20.°, n.° 4 da mesma Lei Fundamental - o que desde já se argui, para todos os efeitos e consequências legais.


- II -

D. Não se conforma a Recorrente com a decisão condenatória, porquanto desprovidos que são os autos de provas que deponham em favor da sua responsabilização, ou seja, que o clube teve uma actuação culposa na verificação dos factos, mostrava-se necessariamente prejudicada a sua condenação pelas infracções disciplinares imputadas.

E. Em primeiro lugar, a mera circunstância de a bancada na qual teve origem a deflagração de engenhos pirotécnicos estar - por princípio - afecta a adeptos da Recorrente, sem sequer haver prova da exclusividade dessa afectação, não permite concluir - com toda a probabilidade próxima da certeza ou, pelo menos, para além de toda a dúvida razoável - que os autores das deflagrações tenham efectivamente sido sócios ou simpatizantes da recorrente.

F. Assim, não se tendo apurado qual a concreta identificação dos adeptos infractores, não bastava à Recorrida, e agora ao Tribunal a quo, invocar que os factos ocorreram em bancada afecta a adeptos desta para que se pudesse concluir (e levar à matéria assente) que os autores das condutas sub judice eram sócios ou simpatizantes da F…...

G. Autoria essa que deve ser dada como não provada, o que desde já se requer.

H. Considerando as infracções em causa nos autos, era necessário que o Conselho de Disciplina tivesse carreado aos autos prova suficiente de que não só os comportamentos indevidos foram perpetrados por sócio ou simpatizante da –F….. SAD, mas ainda que tais condutas resultaram de um comportamento culposo da –F….. SAD.

I. O ónus da prova em processo disciplinar cabe ao titular do poder disciplinar, pelo que, não tem o arguido de provar que é inocente da acusação que lhe é imputada.

J. Aliado ao ónus da prova que recai sobre o titular da acção disciplinar, vigora ainda o princípio da presunção de inocência, o qual tem como um dos seus principais corolários a proibição de inversão do ónus da prova, não impendendo sobre o arguido - in casu a recorrente - o ónus de reunir as provas da sua inocência.

K. É precisamente o princípio de inocência que exigia ao Tribunal formular um juízo de certeza sobre o cometimento das infracções para condenar a Recorrente.

L. Nem mesmo a presunção de veracidade dos relatórios prevista no art. 13.º, f), do RD, pode contrariar este quadro normativo, dado que, mesmo beneficiando de uma presunção de verdade, não se trata de prova subtraída à livre apreciação do julgador, não se permitindo daí inferir um início de prova ou sequer uma inversão do ónus da prova.

M. A míngua de meios de prova demonstrativos da violação de deveres de cuidado, o Tribunal a quo presumiu que a Recorrente falhou nos seus deveres, entendendo que caberia à Recorrente ilidir a presunção de culpa pela qual o Tribunal se segue.

N. Resulta claro da leitura do acórdão que o Tribunal a quo confirmou a condenação da Recorrente somente com base na prova da primeira aparência e num esquema argumentativo e racional fundado numa distribuição de ónus da prova: à demandada, titular do poder punitivo disciplinar, cabe fazer a prova da primeira aparência; e à demandante, uma vez comprovada essa primeira aparência, compete refutá-la, destruindo essa indiciação.

O. Este critério decisório viola o princípio da presunção de inocência, direito fundamental de que a Recorrente é titular e, do mesmo passo, implica que para a prova dos factos fundamentadores de responsabilidade disciplinar não será necessária uma racional e objectiva convicção da sua verificação, para além de qualquer dúvida razoável, sendo suficiente uma sua simples indiciação.

P. O critério decisório adoptado pelo Tribunal a quo - da prova da primeira aparência, com imposição de ónus da prova ao arguido - contraria aberta e frontalmente a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, jurisprudência que representa uma expressão consolidada do cânone da dogmática do princípio da presunção de inocência, constante de todos os tratados e comentários de processo penal e afirmado vezes sem conta pelos nossos tribunais superiores (TC, STJ, Relações e TCA’s).

Q. Pelo exposto, cumpre repor a legalidade, revogando-se o Acórdão recorrido e impondo-se ao Tribunal a quo que adopte um critério decisório em matéria de valoração da prova consentâneo com o princípio da presunção de inocência, exigindo-se, designadamente, que a prova de todos os elementos constitutivos da infracção corresponda a um convencimento para além de qualquer dúvida razoável, e não numa convicção da verificação decorrente da verificação de simples indícios resultantes de uma prova de primeira aparência,

R. e que não se imponha à Recorrente (arguida no processo disciplinar) o ónus de demonstração da não verificação de qualquer elemento tipicamente relevante,

S. Se assim não se fizer, incorrer-se-á em inconstitucionalidade: pois é inconstitucional, por violação do princípio da presunção de inocência (inerente ao seu direito de defesa, art. 32.°, n.°s 2 e 10 da CRP; ao direito a um processo equitativo, art. 20.°-4 da CRP; e ao princípio do Estado de direito art. 2.° da CRP) e do princípio jurídico-constitucional da culpa (art. 2.° da CRP), a interpretação dos artigos 186 °-2, 127.º-1, 187.º-1, al. a) e b), e 258 °, n.° 1, do RDLPFP, no sentido de que a indiciação, com base em relatórios da equipa de arbitragem ou do delegado da Liga, de que sócios ou simpatizantes de um clube praticaram condutas social ou desportivamente incorrectas é suficiente para, sem mais, dar como provado que essas condutas se ficaram a dever à culposa abstenção de medidas de prevenção de comportamentos dessa natureza por parte desse clube, o que desde já se argui, para todos os efeitos e consequências legais.

T. Mas mais, nem mesmo acolhendo a presunção de verdade prevista no art. 13.°, f) do RD ou jurisprudência recente do Supremo Tribunal Administrativo (processo n.° 297/2018 de 18-11-2018) se alcançaria a condenação da aqui recorrente, porquanto sempre se mostra por preencher pressuposto de imputação e condenação: a actuação culposa da recorrente.

U. Nos relatórios de jogo, prova documental nos autos que beneficia da presunção de verdade, não se descreve um único facto relativamente ao que fez ou não fez o clube, por referência a concretos deveres legais ou regulamentares, nem tão-pouco se descreve por que forma essa actuação do clube facilitou ou permitiu o comportamento que é censurado.

V. Sendo a actuação culposa um dos “demais elementos das infracções” que se impunha à FPF, aqui recorrida, provar, sempre se mostrava prejudicada a condenação do Clube por falta de preenchimento de pressuposto legal exigido pelos arts. 186.°-2, 127 °- 1 e 187.º-1, a) e b) do RD.

W. Como tal, é inconstitucional por violação do princípio da presunção de inocência (inerente ao seu direito de defesa, art. 32.°, n.°s 2 e 10 da CRP; ao direito a um processo equitativo, art. 20.°-4 da CRP; e ao princípio do Estado de direito art. 2.° da CRP) e do princípio jurídico-constitucional da culpa (art. 2º da CRP), a interpretação dos artigos 186.°-2, 187.°, n.° 1, alíneas a) e b), 127.°- 1 e 258.°, n.° 1, do RDLPFP, no sentido de que se dá como provado que o clube violou deveres regulamentares e legais de vigilância, controlo e formação dos seus sócios e simpatizantes quando se prove, com base com base no artigo 13.°, al. f), do RDLFPF, que esses sócios ou simpatizantes adoptaram um comportamento social ou desportivamente incorrecto, cabendo ao clube aportar prova demonstradora do cumprimento desses seus deveres.


- /// -

X. No que concerne à condenação pela infracção p. e p. pelo art. 187.°, n.° 1, a) do RD, sempre se diga que é completamente impossível à recorrente impedir manifestações vocais desse tipo e fica sempre por demonstrar a efectividade de qualquer possível esforço pedagógico nesse sentido.

Y. Responsabilizar disciplinarmente os clubes pelas grosserias ditas pelos seus adeptos significa puni-los por algo que, objectivamente, não estão em condições de prevenir ou evitar, o que equivale a uma responsabilidade objectiva. Pelo que, não podia o Tribunal a quo condenar a recorrente pela violação do art. 187.°-1, a) do RD.


- IV -

Z. Ao condenar a Recorrente simultaneamente pelas infracções tipificadas nos arts. 127.° e 187.° do RD, a decisão do Tribunal a quo viola o princípio do ne bis in idem, plasmado no art. 12.° do RD.

AA. Desde logo porque em ambas as normas se tipificam comportamentos incorrectos do público, qualificando-se e agravando-se uma em função da perigosidade para a integridade pessoal de terceiros, pelo que é óbvio que ao clube que deva responder por tais comportamentos só pode imputar-se a mais grave.


- V -

BB. A modificação do valor da causa promovida pelo Tribunal a quo para €30 000,01 - ao invés do total da multa por que foi a recorrente condenada - foi feita em violação do previsto no art. 33.°, b) do CPTA, pelo que se impõe repor a legalidade, fixando-se o valor da acção no montante de €12 184,00 daí se extraindo as devidas consequências.

CC. As custas fixadas pelo TAD comprometem de forma séria e evidente o princípio da tutela jurisdicional efectiva (arts. 20.º-1 e 268.º-4 da CRP).

DD. Considerando o critério da nossa jurisprudência constitucional, não são compatíveis com o direito fundamental de acesso à justiça (arts. 20.° e 268.°-4 da CRP) soluções normativas de tal modo onerosas que se convertam em obstáculos práticos ao efectivo exercício de um tal direito, como é o caso do TAD.

EE. O artigo 2.°, n.°s 1, 4 e 5 da Portaria n0 301/2015, conjugado com a tabela constante do Anexo I (2.ª linha) dessa mesma Portaria, em acções de arbitragem necessária com o valor de € 12.184,00, é inconstitucional por violação do principio da proporcionalidade (artigo 18.°, n.° 2, da CRP) e do princípio da tutela jurisdicional efectiva (artigo 20.°, n.° 1, da CRP).”

Termina requerendo:

Termos em que se requer a V. Exas. seja o presente recurso julgado procedente, revogando-se a decisão arbitral recorrida e assim também a condenação da recorrente pelas infracções disciplinares p. e p. pelos arts. 186.°- 2, e 187.°, n.° 1, a) e b), e 127.°-1 do RDLPFP, e anulando-se o correspondente acto administrativo do Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol, conforme o alegado em II supra.

Sempre subsidiariamente, caso se entenda não haver motivo para, de imediato, absolver a recorrente, requer-se a revogação do acórdão recorrido e o reenvio do processo ao TAD para que reaprecie a matéria de facto com base em critérios de valoração da prova consentâneos com o princípio da presunção de inocência do arguido, exigindo-se, nomeadamente, a formação de uma convicção para além de toda a dúvida razoável e a não imposição de um ónus da prova à demandante.

Face à relação de subsidiariedade existente entre os arts. 187.° e 127.° do RD, deve ser revogada a condenação pela infracção p. e p. pelo art. 127.°- 1 do RD, sob pena de violação do princípio do ne bis in idem (art. 12.º do RD).

Sem prescindir, e uma vez mais subsidiariamente, requer-se a V. Exas. se dignem julgar inconstitucional o artigo 2.°, n.°s 1, 4 e 5 da Portaria n.° 301/2015, conjugado com a tabela constante do Anexo I (2.ª linha) dessa mesma Portaria, em acções de arbitragem necessária com o valor de €12 184,00, por violação do princípio da proporcionalidade (artigo 18.°, n.° 2, da CRP) e do princípio da tutela jurisdicional efectiva (artigo 20.°, n.° 1, da CRP).”

A FPF contra-alegou, requerendo que seja negado provimento ao recurso e, consequentemente, seja mantido o Acórdão Arbitral recorrido.

O Ministério Público, junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto nos artigos 146º e 147°, do CPTA, não emitiu parecer.

Foi proferida decisão sumária pelo relator que concedeu provimento parcial ao recurso, revogando o acórdão do TAD recorrido na parte que condena a Recorrente pela prática de infracção punível pelo nº 1 do artigo 127º do RD e fixando o valor da acção em €12 184,00.

A Recorrente apresentou reclamação para a conferência.
Para o efeito, para além de manter os fundamentos do recurso, alegou e concluiu:
“(…)
I – Da Inadmissibilidade da Decisão Sumária Proferida
1. A ora reclamante vem requerer que sobre o recurso apresentado recaia uma decisão do Colectivo de Juízes, por entender que, nos termos do n.º 3, do artigo 652.º do CPC, é parte prejudicada pelo despacho da Exma. Sra. Juíza Relatora, que não se reflecte num despacho de mero expediente, visto que decide negar provimento ao recurso interposto pelo aqui reclamante.
2. Entendeu a Exma. Sra. Juíza Relatora estar perante uma questão de simples apreciação, socorrendo-se do disposto nos artigos 625.º, n.º 1, al. c) e 656.º do CPC para decidir sumariamente
3. Acontece que, pese embora as questões sub judice já tenham, efectivamente, sido judicialmente apreciadas, de modo uniforme e reiterado, facto é que a decisão proferida se estriba em jurisprudência desajustada e insuficiente que não permite dar cabal e satisfatória resposta às questões submetidas a apreciação pela Recorrente.
4. Mostrando-se, além do mais, contrária à, abundante e mais recente, Jurisprudência que vem sendo proferida por este Tribunal Central Administrativo nesta matéria – veja-se, com especial relevo, os acórdãos proferidos no âmbito dos seguintes processos: proc. n.º 2/19.3BCLSB (TAD 63/2017), proc. n.º 72/19.4BCLSB (TAD 43/2018), proc. n.º 147/19.0BCLSB (TAD 88/2018), proc. n.º 49/19.0BCLSB (TAD 75/2017), proc. n.º 148/19.8BCLSB (TAD 87/2018), proc. 14/20.4BCLSB (TAD 72/2018), 4/19.0BCLSB (TAD 65/2017), proc. 35/19.0BCLSB (TAD 24/2018), 146/19.0BCLSB (TAD 81/2018), proc. 147/19.0BCLSB (TAD 88/2018), proc. 14/20.4BCLSB (TAD 72/2018) e proc. 48/19.8BCLSB (TAD 74/2017).
5. O acórdão do Supremo Tribunal Administrativo datado de 12.12.2019 (proc. n.º 48/19.1BCLSB) de que se socorre a Exma. Sra. Juíza Relatora, aí fundamentando a sua decisão, não versa sobre matéria essencial à boa decisão da causa devidamente alegada pela Recorrente em sede de recurso (concretamente nos pontos B e C das conclusões),
6. e que se prende com a nulidade da decisão sumária proferida pelo Conselho de Disciplina da FPF.
7. Efectivamente, um dos fundamentos invocados pela Recorrente, aqui Reclamante, para a revogação da decisão condenatória proferida, em 07.01.2020, pelo Tribunal Arbitral do Desporto foi a circunstância do acto punitivo proferido em 18.06.2019 (e mantido pela Deliberação emitida em 23.07.2019 pelo Pleno da Secção Profissional do Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol) ser, desde logo, nulo por violação do direito de defesa da Recorrente, e bem assim por violação dos princípios da culpa e da presunção da inocência.
8. Questão prévia e essencial que influi, necessariamente, no julgamento da conformidade constitucional da presunção de veracidade contida no art. 13.º, al. f) do RD.
9. Ao tratar-se de factualidade inquestionavelmente relevante para a defesa e sentido da decisão, a sentença proferida tinha de expressamente pronunciar-se sobre esta alegação,
10. não podendo, como tal, admitir-se o decidido por simples remissão para a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo vertida no acórdão datado de 12.12.2019 (proc. n.º 48/19.1BCLSB) – a qual é indubitavelmente omissa quanto à questão em apreço.
11. Aliás, ao não apreciar e julgar matéria essencial submetida ao seu conhecimento, a decisão proferida mostra-se inquinada de vicio de nulidade nos termos do art. 615.º-1, al. d) do CPC e art. 95.º-1 do CPTA, a qual desde já se argui, para os devidos e legais efeitos.
Por ser assim,
12. não se encontrando reunidos todos os pressupostos legalmente exigidos para que o recurso interposto pela aqui Reclamante seja decidido singularmente por Relator, deverá ser desconsiderada a decisão sumária, agora reclamada, e substituída por outra, proferida por este Tribunal em Conferência, o que desde já se requer, com as legais consequências.
(…)”.

A Recorrida FPF apresentou reclamação para a conferência da parte da decisão sumária que revogou o Acórdão Arbitral relativamente às sanções aplicadas a coberto do artigo 127º do RD da LPFP e por o valor da causa dever corresponder à soma aritmética do valor das sanções pecuniárias aplicadas e não ao valor de € 30 000,01, fixado pelo TAD.
Para o efeito, para além de manter os fundamentos vertidos nas contra-alegações de recurso, alegou que:
“(…)
A) DA ALEGADA VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO NE BIS IN IDEM, DECORRENTE DA ALEGADA RELAÇÃO DE SUBSIDIARIEDADE ENTRE AS NORMAS 187º E 127º DO RD DA LPFP
(…)
A decisão de que ora se recorre dá por provados todos os factos em crise, validando toda a prova produzida, decidindo que não se verifica a alegada violação do princípio ne bis in idem, mas sim a aplicação de mais do que uma sanção disciplinar por cada infracção. Nesse sentido, afirma a decisão de que ora se reclama que “(…) deve manter-se apenas a aplicação da sanção prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 187.º do RD, nos termos referidos, não por violação do princípio ne bis in idem mas por não poder ser aplicada mais de uma sanção disciplinar por cada infracção, ou seja, a intenção de deflagrar um dispositivo pirotécnico consome a entrada no recinto desportivo com o mesmo.”
Nesta sede, sempre se dirá que a decisão de que ora se reclama vai para além do objecto do alegado pela Recorrente, e nessa medida, vai para além do objecto do Recurso, pelo que, não poderia a decisão de que ora se reclama decidir com base em fundamentação jurídica que não a que se encontrava em crise nos autos e relativamente à qual, a ora Reclamante não pôde pronunciar-se.
Ainda assim, sem prescindir, sempre se dirá que não se verificou nem a violação do princípio ne bis in idem, invocado pela Recorrente, nem a aplicação de uma sanção disciplinar por cada infracção, na tese perfilhada na decisão de que ora se reclama.
Senão vejamos,
Não se verificou qualquer dupla penalização por parte do Conselho de Disciplina ao punir a Recorrente por não ter impedido os seus adeptos de entrarem e permanecerem no estádio do Dragão com objetos proibidos e também por os terem utilizado.
Com efeito, foram praticados vários e distintos factos aos quais correspondem várias e distintas infrações disciplinares, previstas em normas com finalidades de proteção de bens jurídicos distintos.
Para haver violação do princípio da dupla punição ter-se-ia de verificar o duplo sancionamento do mesmo facto.
Porém, veremos que estão em causa diferentes condutas. A saber:
- Entraram no estádio espetadores afetos à Recorrente com objetos proibidos, quando cabia à Recorrente impedir que esses objetos fossem introduzidos dentro do recinto desportivo.
- Permaneceram no estádio, esses mesmos adeptos com esses mesmos objetos proibidos, quando cabia à Recorrente verificar no decurso do jogo se esses adeptos tinham consigo algum objeto não autorizado e consequentemente apreendê-los.
- Tais adeptos usaram/deflagraram tais objetos.
A estas condutas correspondem normas disciplinares distintas.
E a tais normas disciplinares distintas corresponde a proteção de valores jurídicos também eles distintos.
Com efeito, a adoção de medidas de segurança e o cumprimento de deveres que assegurem essa prevenção visam a tutela de bens jurídicos específicos e autónomos, em especial a segurança e a confiança da “comunidade desportiva” e da comunidade em geral na realização de espetáculos desportivos pelo que a tutela destes bens não pode ficar dependente nem ser consumida pela eventual ocorrência de outras circunstâncias, sob pena de se estar a desonerar as entidades organizadoras do específico cumprimento de deveres de prevenção de violência no desporto, a que, precisamente, alude o referido n.º 2 do artigo 79.º da Constituição.
Para além disso, as duas normas (o artigo 127.º e o artigo 187.º) visam punir comportamentos diferentes e que podem originar consequências também elas diversas.
Pelo que, verificando-se os diferentes factos típicos aí elencados não há qualquer concurso de infrações.
(…)
Parece-nos assim claro, com o devido respeito, que se verificaram preenchidos os elementos objetivo e subjetivo de cada uma das infrações em causa - artigos 127.º, n.º 1, e 187.°, n.º 1, na medida em que, factos diversos geraram autonomamente diversas infracções disciplinares, às quais correspondem as respectivas sanções, igualmente previstas. Da prova produzida, verificou-se a violação por parte da Recorrente do disposto nos artigos 35º, nº 1, alíneas b), c), f) e o) do RCLPFP; no artigo 6º, alínea g) e artigo 9º, nº 1, alínea m), subalínea 6) do Anexo VI do RC e, ainda, do artigo 8º, nº 1, alínea g) e artigo 22º, alínea d) e no artigo 23º, nº1, alínea i) da Lei nº 39/2009 de 30 de julho, republicada em anexo à lei nº 52/2013 de 15 de julho, que estabelece o regime jurídico do combate à violência, ao racismo e à xenofobia e à intolerância nos espetáculos desportivos, de forma a possibilitar a realização dos mesmos com segurança, porquanto haverá que distinguir entre o acesso a recintos desportivos com objectos proibidos, da utilização dos referidos objectos.
Outro entendimento, com o devido respeito, desonera os promotores de espectáculos desportivos e os clubes de futebol. Em tese, a partir do momento que um adepto faz uso de objecto ou engenho proibido, deixaria de haver sanção pelo facto de o referido adepto ter entrado num recinto desportivo com o referido objecto, sendo que, o dever em concreto de não permitir que os adeptos entrem nos recintos desportivos com os referidos engenhos, deixaria de ser sancionado, apesar de ser uma responsabilidade dos clubes, sendo que, não terá sido essa a vontade do legislador, inclusivamente constitucional (artigo 79º, n.º 2 da CRP), e não será certamente essa solução que melhor protege o valor da ética no desporto e combate o fenómeno da violência no desporto.
A este propósito decidiu, e bem, o Tribunal Arbitral do Desporto, ficando, deste modo, cabalmente demonstrado que o Acórdão proferido não merece qualquer censura e deve ser mantido na íntegra, ao contrário do entendimento da decisão de que ora se reclama.
B) DO VALOR ATRIBUÍDO À CAUSA
Entendeu a decisão de que ora se reclama que o tribunal a quo incorreu em erro na modificação do valor da causa para € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo) violando o regime estabelecido no art. 33.º, alínea b), do CPTA, e, consequentemente, os princípios constitucionais da proporcionalidade e da tutela jurisdicional efetiva, quanto às custas processuais devidas em sede dos processos de arbitragem necessária no TAD.
No entanto, não merece nenhuma censura a decisão do TAD ao atribuir à causa o valor de € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo), não obstante o valor conjunto das sanções resultar em valor inferior, até porque, conforme ficou supra exposto, existem questões de valor constitucional em discussão, pelo que, o valor da causa não se poderá resumir à simples soma aritmética das multas aplicadas à Recorrente.
(…)”.

A reclamação para a conferência constitui o meio adjectivo próprio ao dispor da(s) parte(s) que se sinta(m) prejudicada(m) pela decisão individual e sumária do relator sobre o objecto do recurso, fazendo retroagir o conhecimento em conferência do mérito da apelação ao momento anterior àquela decisão sumária (cfr. os artigos 652º, nº 1, alínea c) e nº 3, e 656º, do CPC, ex vi nº 3 do artigo 140º do CPTA).

Cumpre, pois, reapreciar as questões suscitadas pela Recorrente em sede de conclusões do recurso, por, não obstante as deduzidas reclamações para a conferência, são as conclusões da alegação de recurso que fixam o thema decidendum, não podendo o reclamante ampliar o objecto na reclamação (cfr. o artigo 635º, nº 4 do CPC).

As questões suscitadas pela Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, consistem, no essencial, em saber se o acórdão do Tribunal Arbitral padece de erro de julgamento:
i) por ter confirmado a condenação da Recorrente pela prática de quatro infracções disciplinares, p. e p. pelos artigos 186º, nº 2, 127º, nº 1 e 187º, alíneas a) e b) do RD, em multa total de €12 174,00, em violação dos seus direitos de defesa e dos princípios da culpa e da presunção de inocência;
ii) por ter aplicado as penas previstas nos artigos 187º e 127º do RD, quando entre elas existe uma relação de subsidiariedade, violando o princípio ne bis in idem;
iii) por ter fixado o valor da causa em €30 000,01, em violação do disposto nos artigos 33º, alínea b) e 34º, nº 1 do CPTA;
iv) na fixação inconstitucional do valor das custas processuais, por violação dos princípios da proporcionalidade e da tutela jurisdicional efectiva.

O Acórdão do Plenário do Conselho de Disciplina da FPF considerou provados os seguintes factos:

a) No dia 18 de maio de 2019, no Estádio do Dragão, no Porto, realizou-se o jogo n.º ….. (203.01.306) disputado entre a "F…..' e a "–S….., SAD", a contar para a 34ª jornada da "Liga NOS" (cfr. Relatório de Árbitro, Relatório de Delegado e Relatório Policiamento Desportivo - fls 22 a 34 e 41 a 43 dos autos);

b) No jogo em questão os adeptos e simpatizantes da Recorrente, pertencentes ao Grupo Organizado de Adeptos (GOA) designado por "…..", ficaram localizados na Bancada Sul, sectores …… (cfr. Relatórios dos Delegados, a fls. 29 e 30, Relatório de Policiamento Desportivo de fls. 41 a 43 dos autos e respetivos esclarecimentos de fls. 47 a 52, 158 e 159);

c) No decorrer do jogo em causa os adeptos, simpatizantes e espetadores pertencentes ao Grupo Organizado de Adeptos GOA (…..), localizados na Bancada referida em b), devidamente identificados por cachecóis, camisolas e bandeiras alusivas ao clube, deflagraram 4 (quatro) potes de fumo - um, cerca do minuto 51 e três cerca do minuto 86, da segunda parte - e ainda fizeram rebentar 2 (dois) petardos aos 88 e 89 minutos da segunda parte (cfr. Relatório dos Delegados a fls. 29 e 30 dos autos e Relatório de Policiamento Desportivo de fls. 41 a 43 dos autos e respetivos esclarecimentos de fls. 47 a 52,158 e 159);

d) Os mesmos adeptos, simpatizantes e espectadores indicados em c), durante o jogo, proferiram as expressões "filhos da puta" e "cabrões filhos da puta" dirigidos à equipa de arbitragem e à equipa visitante (cfr. relatório de Arbitro de fls. 23 a 26, Relatório dos Delegados a fls. 29 e 30 dos autos e Relatório de Policiamento Desportivo de fls. 41 a 43 dos autos e respetivos esclarecimentos de fls. 47 a 52,158 e 159);

e) Antes do início do jogo e do respectivo pontapé de saída, adeptos, simpatizantes e espectadores da Recorrente, identificados por camisolas e cachecóis alusivos ao clube, situados na bancada central/bancada poente, apontaram um laser à cara do árbitro do jogo, não provocando qualquer lesão, mas tendo encadeado o mesmo por alguns momentos (cfr. relatório de Arbitro de fls. 23 a 26, Relatório dos Delegados a fls. 29 e 30 dos autos e Relatório de Policiamento Desportivo de fls. 41 a 43 dos autos e respetivos esclarecimentos de fls. 47 a 52, 158 e 159);

f) Aos 86 minutos de jogo, adeptos afectos à Recorrente, identificados por camisolas e cachecóis alusivos ao clube e situados na bancada sul, atrás da baliza da equipa visitante, arremessaram para o terreno de jogo vários isqueiros (cfr. relatório de Arbitro de fls. 23 a 26, Relatório dos Delegados a fls. 29 e 30 dos autos e respetivos esclarecimentos de fls. 47 a 52,158 e 159);

g) A Recorrente não impediu que os seus adeptos e simpatizantes entrassem com objetos não autorizados, designadamente os referidos materiais pirotécnicos (potes de fumo e petardos) e isqueiros, que foram arremessadas para o terreno de jogo;

h) A F….., SAD não adotou as medidas preventivas adequadas e necessárias a impedir os acontecimentos protagonizados pelos seus adeptos, descritos nos factos provados em c), d), e), f) e g) (convicção fundada nas regras de experiência e segundo juízos de normalidade e razoabilidade, de acordo com os padrões normais);

i) A F….., SAD agiu de forma livre, consciente e voluntária, bem sabendo que ao não evitar a ocorrência dos referidos factos perpetrados pelos seus adeptos e simpatizantes, incumpriu deveres legais e regulamentares de segurança e de prevenção da violência que sobre si impendiam, enquanto clube participante no dito jogo de futebol (convicção fundada nas regras de experiência e segundo juízos de normalidade e razoabilidade, de acordo com os padrões normais);

j) À data dos factos e na época desportiva, a Recorrente F….., SAD já havia sido sancionada, por decisão definitiva na ordem jurídica desportiva, pelo cometimento de diversas infrações disciplinares (cfr. Cadastro disciplinar do F….., a fls. 74 a 91 dos autos).”

E estes tiveram como motivação a que se transcreve:

§3 - Motivação quanto à matéria de facto
22. No caso vertente, para a formação da nossa convicção, foi tido em consideração todo o acervo probatório carreado para os autos - documentos juntos e esclarecimentos prestados pelo Árbitro, pelos Delegados da Liga e pela PSP, os quais foram objeto de uma análise crítica e de adequada ponderação à luz de regras da experiência comum e segundo juízos de normalidade e razoabítidade.
23. Neste particular, importa realçar que o procedimento disciplinar obedece a um conjunto de princípios fundamentais, estatuídos no artigo 13.º do RDLPFP, sendo que um deles é o de presunção de veracidade dos factos constantes das declarações e relatórios da equipa de arbitragem e do delegado da Liga, e por eles percecionados no exercício das suas funções, enquanto a veracidade do seu conteúdo não for fundadamente posta em causa (alínea f)).
24. Acresce dizer que também o Relatório de Policiamento Desportivo goza de um valor probatório especial e reforçado, consubstanciado numa presunção de veracidade dos factos nele relatados pelas autoridades policiais (cf. artigos 169.º e 243º do Código de Processo Penal e artigos 363.º, n.º 2 e 371.º, n.º 1, do Código Civil).
Trata-se, por isso, "em todo o caso de uma verdade aproximativa ou probabilística, como acontece com a toda a verdade empírica, submetida a limitações inerentes ao conhecimento humano e adicionalmente condicionada por limites temporais, legais e constitucionais, traduzindo-se num tão alto grau de probabilidade que faça desaparecer toda a dúvida e imponha uma convicçõo." [Ac. do TRL de 04.07.2012, Processo 679/06.0GDTVD.L1 -3 (disponível em http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/).]
De resto, como é pacifico na doutrina e jurisprudência, a prova segura dos factos relevantes pode igualmente resultar de um raciocínio lógico e indutivo com base em factos ou acontecimentos "instrumentais" ou "circunstanciais", mediante a aplicação de regras gerais empíricas ou de máximas da experiência” [Cfr. Artigos 124a 3 127a do CPP e os artigos 349a e 351a do Código Civil, quanto à utilização de presunções como meios lógicos ou mentais para a descoberta dos factos.]
Como se sabe, os factos base não deixam de ser indícios que são alcançados a partir de provas directas (testemunhais, periciais, documentais, etc.) e sob plena observância dos requisitos de validade do procedimento probatório.
E a partir de factos-base, por meio de um raciocínio lógico e dedutivo, estabelece-se um juízo de inferência razoável com o facto ou factos a provar.
E revelando-se este juízo de inferência conforme com as regras de vida e de experiência comum - ou seja de normas de comportamento humano extraídas a partir da generalização de casos semelhantes - teremos como resultado uma conclusão segura e sólida da probabilidade de ocorrência do facto a provar.
25. Ora, não tendo a Recorrente apresentado qualquer prova da não verificação dos factos provados, nem sequer tendo logrado colocá-los em dúvida ou demonstrar que os mesmos não foram cometidos pelos seus adeptos, sócios ou simpatizantes e que não tiveram origem nas bancadas onde estes se encontravam, tais factos resultaram necessariamente provados, por assentarem em provas consistentes que permitem a sua responsabilização.”

Do acórdão recorrido consta ainda que:
“A Demandante recorreu com o intuito de ver revogada as condenações pelas infracções pp pelos artigos 127.° - I; 186 - 2; 187 - 1 a) e 187.° - 1b), todos do RD, com o fundamento em nulidade decorrente da violação da proibição da alteração substancial dos factos.

Realizou-se a audiência de partes, na qual a Demandante prescindiu da prova testemunhal que havia indicado, pelo que produziram de imediato as partes, as suas alegações orais.

Concluídas que estavam as diligências e os articulados, o Colégio ponderou o conteúdo de todas as peças e alegações finais, (…)”.

Considerada a factualidade assente, importa, agora, entrar na análise dos fundamentos do recurso.

As questões em apreciação nos presentes autos não são novas e têm vindo a ser apreciadas e decididas de forma uniforme e reiterada pelo Supremo Tribunal Administrativo (STA) designadamente nos acórdãos de 18.10.2018 - Proc. nº 0144/17.0BCLSB, de 20.12.2018 - Proc. nº 08/18.0BCLSB, de 21.2.2019 - Proc. nº 033/18.0BCLSB, de 21.3.2019 - Proc. nº 075/18.6BCLSB, de 4.4.2019 - Procs. nºs 040/18.3BCLSB e 030/18.6BCLSB, de 2.5.2019 - Proc. nº 073/18.0BCLSB, de 19.6.2019 - Proc. nº 01/18.2BCLSB, de 5.9.2019 - Procs. nºs 058/18.6BCLSB e 065/18.9BCLSB, de 26.9.2019 – Proc. 076/18.4BCLSB, de 3.10.2019 – Proc. 034/18.9BCLSB, de 12.12.2019 – Proc. nº 048/19.1BCLSB, todos consultáveis in www.dgsi.pt.

Assim, sobre i) o alegado erro de julgamento na confirmação da condenação da Recorrente pelo TAD pela prática de infracções disciplinares, p. e p. pelos artigos 186º, nº 2, 127º, nº 1 e 187, alíneas a) e n) do RD, em violação dos direitos de defesa e dos princípios da culpa e da presunção de inocência, dos direitos ao contraditório e ao processo equitativo, foi decidido no acórdão de 12.12.2019 – Proc. nº 048/19.1BCLSB o seguinte: “(…)
«a prova dos factos conducentes à condenação do arguido em processo disciplinar não exige uma certeza absoluta da sua verificação, dado a verdade a atingir não ser a verdade ontológica, mas a verdade prática, bastando que a fixação dos factos provados, sendo resultado de um juízo de livre convicção sobre a sua verificação, se encontre estribada, para além de uma dúvida razoável, nos elementos probatórios coligidos que a demonstrem ainda que fazendo apelo, se necessário, às circunstâncias normais e práticas da vida e das regras da experiência», que «a presunção de veracidade dos factos constantes dos relatórios dos jogos elaborados pelos delegados da Liga Portuguesa Futebol Profissional [LPFP] que tenham sido por eles percecionados, estabelecida pelo art. 13.º, al. f), do Regulamento Disciplinar da LPFP [RD/LPFP], conferindo ao arguido a possibilidade de abalar os fundamentos em que ela se sustenta mediante a mera contraprova dos factos presumidos, não infringe os comandos constitucionais insertos nos arts. 02.º, 20.º, n.º 4, e 32.º, n.ºs 2 e 10, da CRP e os princípios da presunção de inocência e do in dubio pro reo» e que «a responsabilidade disciplinar dos clubes e sociedades desportivas prevista no art. 187.º do referido RD/LPFP pelas condutas ou os comportamentos social ou desportivamente incorretos que nele se mostram descritos e que foram tidos pelos sócios ou simpatizantes de um clube ou de uma sociedade desportiva e pelos quais estes respondem não constitui uma responsabilidade objetiva violadora dos princípios da culpa e da presunção de inocência», tratando-se, antes, “in casu”, de uma responsabilidade desportiva disciplinar subjectiva «já que estribada numa violação dos deveres legais e regulamentares que sobre clubes e sociedades desportivas impendem neste domínio e em que o critério de delimitação da autoria do ilícito surge recortado com apelo não ao do domínio do facto, mas sim ao da titularidade do dever que foi omitido ou preterido».
(…)
19. Assim, e quanto ao erro de julgamento por incorreta interpretação e aplicação do art. 13º al. f) do RD/LPFP, extrai-se, no que releva dos pontos 22 a 29 e 33 a 45 da fundamentação expendida no supra citado acórdão deste Supremo de 21/2/2019 (Proc. nº 033/18.0BCLSB), o seguinte:
«(…) 22. No processo disciplinar, à semelhança do que sucede no processo penal, o ónus da prova dos factos constitutivos da infração cabe ao titular do poder disciplinar, não sendo o arguido que tem de provar que é inocente da acusação que lhe é imputada, pelo que perante um non liquet em matéria de prova o mesmo terá de ser resolvido em favor do arguido por efeito da aplicação dos princípios da presunção de inocência do arguido e do in dubio pro reo.
23. E na fixação dos factos que funcionam como pressupostos de aplicação das penas disciplinares a Administração não detém um poder insindicável em sede contenciosa, porquanto nada obsta a que o julgador administrativo sobreponha o seu juízo de avaliação àquele que foi adotado pela Administração, mormente por reputar existir uma situação de insuficiência probatória [cfr., entre outros, os Acs. deste Supremo de 24.01.2002 - Proc. n.º 048147, de 18.04.2002 (Pleno) Proc. n.º 033881, de 07.10.2004 - Proc. n.º 0148/03, de 07.06.2005 - Proc. n.º 0374/05, de 14.04.2010 - Proc. n.º 0803/09, de 28.06.2011 - Proc. n.º 0900/10, de 13.07.2016 - Proc. n.º 0516/14].
24. Temos, ainda, que a condenação em pena disciplinar deve assentar ou estribar-se em provas que permitam um juízo de certeza, ou seja, uma convicção segura, que esteja para além de toda a dúvida razoável, de que o arguido praticou os factos que lhe são imputados [cfr., entre outros, Acs. deste Supremo de 07.10.2004 - Proc. n.º 0148/03, 28.04.2005 - Proc. n.º 0333/05, de 21.10.2010 - Proc. n.º 0607/10, de 28.06.2011 - Proc. n.º 0900/10, de 15.03.2012 - Proc. n.º 0426/10, de 23.01.2013 (Pleno) - Proc. n.º 0772/10, de 14.01.2016 - Proc. n.º 01546/14, de 28.01.2016 - Proc. n.º 0404/14, de 13.07.2016 - Proc. n.º 0516/14].
25. É que no processo sancionador a prova da prática da infração que é exigida deve ser conclusiva e inequívoca no sentido de que o sancionado é o autor responsável, não podendo impor-se uma sanção disciplinar com base em simples indícios ou conjeturas subjetivas.
26. Na verdade, como afirmado no acórdão deste STA de 07.06.2005 [Proc. n.º 0374/05] a «“prova dos factos integrantes da infracção disciplinar cujo ónus impende sobre a entidade administrativa que exerce o poder disciplinar, através do instrutor do processo, tem de atingir um grau de certeza que permita desferir um juízo de censura baseado em provas convincentes para um apreciador arguto e experiente, de modo a ficar garantida a segurança na aplicação do direito sancionatório”», segurança essa que não se encontra garantida se «a prova coligida no processo disciplinar não legitimar uma convicção segura da materialidade dos factos imputados ao arguido».
27. Note-se, todavia, que a condenação do arguido em processo disciplinar não exige que a certeza tenha de ser «absoluta, férrea ou apodítica da sua responsabilidade» [cfr., entre outros, os Acs. deste Supremo de 21.10.2010 - Proc. n.º 0607/10, de 15.03.2012 - Proc. n.º 0426/10, de 07.01.2016 - Proc. n.º 0131/13], dado o preenchimento do grau de certeza exigido se bastar com existência de elementos probatórios coligidos no processo e que o «demonstrem segundo as normais circunstâncias práticas da vida e para além de uma dúvida razoável». [negrito meu].
28. Com efeito, a prova dos factos não exige uma certeza absoluta da sua verificação, dado «a verdade a atingir não ser a verdade ontológica, mas a verdade prática» [cfr. o citado Ac. deste Supremo de 07.01.2016 - Proc. n.º 0131/13], uma «verdade histórico-prática e, sobretudo, não uma verdade obtida a todo o preço, mas processualmente válida» [cfr. J. Figueiredo Dias, in: «Direito Processual Penal», I, 1981, pág. 194], bastando, por isso, que a fixação dos factos provados, sendo resultado de um juízo de livre convicção sobre a sua verificação, se encontre estribada, para além de uma dúvida razoável, nos elementos probatórios coligidos que a demonstrem ainda que fazendo apelo, se necessário, às circunstâncias normais e práticas da vida e das regras da experiência [negrito meu].
29. É que «nos juízos de facto a emitir num processo disciplinar, é lícito à Administração, e até obrigatório, usar das presunções naturais que se mostrem adequadas», porquanto «é legítimo, e obrigatório, usar de presunções naturais na realização dos julgamentos de facto. Esse é, aliás, um exercício quotidiano nos tribunais, permitido pelo art. 351º do Código Civil; e de igual metodologia se serve a Administração nos juízos que emita sobre a prova produzida» [cfr. o citado Ac. deste Supremo de 21.10.2010 - Proc. n.º 0607/10].
(…)
33. Em apreciação da matéria objeto de discussão nos autos afirmou este Supremo nos acórdãos citados, em linha, como vimos, com o que constitui entendimento deste Tribunal, que aqui se secunda e reitera, que «no domínio do direito disciplinar, a que se aplicam subsidiariamente os princípios do direito penal, é lícito o uso das presunções judiciais» [negrito meu].
34. E que aliada a tal afirmação importa ter, ainda, como «indubitável que, no domínio do direito disciplinar desportivo, vigora o princípio geral da “presunção de veracidade dos factos constantes das declarações e relatórios da equipa de arbitragem e dos delegados da Liga, e por eles percecionado no exercício das suas funções, enquanto a veracidade do seu conteúdo não for fundadamente posto em causa” [art. 13.º, al. f), do RD]», sendo que «[e]sta presunção de veracidade, que se inscreve nos princípios fundamentais do procedimento disciplinar, confere, assim, um valor probatório reforçado aos relatórios dos jogos elaborados pelos delegados da LPFP relativamente aos factos deles constantes que estes tenham percecionado» [negrito meu].
35. Ora, ao invés do que se sustenta no acórdão do «TCA/S» aqui objeto de impugnação, a decisão do «TAD» não incorreu em erro de julgamento ao haver mantido incólume o quadro factual que havia sido fixado como provado na decisão disciplinar punitiva.
36. O juízo na mesma firmado nessa sede louvou-se ou socorreu-se não apenas do princípio da presunção de veracidade dos factos nos termos que se mostram previstos na al. f) do art. 13.º do RD/LPFP-2017, mas, também, de presunções naturais radicadas em circunstâncias normais e práticas da vida e das regras da experiência [cfr. art. 349.º do CC] (…) [negrito meu].
37. Esta não viu radicar, pois, o juízo punitivo numa qualquer presunção de culpa da «F….., SAD», antes se mostrando o mesmo juízo alicerçado, ao invés, naquilo que foi a prova lograda coligir e produzir no processo disciplinar e o uso de presunções, considerando e fazendo apelo, inclusive, daquilo que são decorrências do cumprimento das obrigações que impendem sobre os clubes no decurso e participação nas competições em que estão envolvidos [cfr., nomeadamente, os arts. 34.º a 36.º do RC/LPFP-2017, e arts. 06.º, 07.º 08.º, 09.º, 10.º e 11.º do RPV/RC/LPFP-2017] e em que a designada «bancada topo Sul» do Estádio do Dragão, indicada expressis verbis no relatório como local onde os ilícitos ocorreram, é consabidamente um local ocupado por adeptos, sócios, apoiantes ou simpatizantes afetos ao clube «F…..»/«F….., SAD», (…) [negrito meu].
38. A aqui recorrida, «F….., SAD», verdadeiramente não nega ou põe efetivamente em causa a ocorrência dos factos registados no «relatório do delegado» da LPFP ao jogo, já que a impugnação, ou a discussão se centra, no fundo, que tenham sido adeptos seus os autores dos factos em causa nos presentes autos.
39. Ocorre, contudo, que pese embora a mesma teça diversas considerações sobre hipotéticas possibilidades no que respeita à autoria das sobreditas «ocorrências», a aqui recorrida, nem no processo disciplinar, nem na impugnação deduzida quanto à decisão disciplinar punitiva, não conseguiu infirmar, com plausibilidade, o que foi redigido no referido relatório, mediante a alegação de factos perfeitamente ao seu alcance e a produção de meios probatórios que, fazendo a contraprova [cfr. art. 346.º do CC], permitissem ilidir a mera presunção de veracidade de que o mesmo relatório goza [cfr. al. f) do art. 13.º do RD/LPFP-2017], presunção esta que não corresponde a uma qualquer presunção legal, ou a uma regra de dispensa, liberação ou de inversão do ónus da prova [cfr. art. 344.º do CC], que seria, aliás, inadmissível no plano constitucional e legal no âmbito de matéria sancionatória [negrito meu].
40. O considerar-se que a aqui recorrida não conseguiu destruir os factos que lhe foram imputados mediante a alegação de factos e a apresentação de provas apenas significa que a prova coligida durante a instrução do processo não foi infirmada na subsequente fase de defesa de que a mesma dispôs, não sendo possível inferir de uma tal afirmação a conclusão de que era àquela que, enquanto arguida, competia fazer a prova a inexistência dos factos e da sua não culpa, não ocorrendo, por conseguinte, uma qualquer infração ao princípio de presunção de inocência do arguido [cfr., entre outros, o Ac. do STA de 10.03.1998 - Proc. n.º 040528], nem sequer a situação, no contexto apurado de efetiva existência de culpa da arguida, permite o operar do princípio do in dubio por reo [negrito meu].
41. De referir ainda que do facto de nem as autoridades policiais, nem os delegados da «LPFP», ou o árbitro, terem identificado pessoalmente quem, em concreto, fez uso dos engenhos pirotécnicos ou proferiu as expressões/cânticos reportados, tal não invalida ou impossibilita a fixação da factualidade nos termos que se mostram realizados [negrito meu].
42. É que para o que constitui o objeto de incriminação e tendo em conta as circunstâncias em que os factos ocorreram [no decurso de um jogo de futebol e em que os adeptos e simpatizantes estavam numa bancada afeta a adeptos do «F…..», mostrando-se portadores de sinais inequívocos da sua ligação ao respetivo clube, nomeadamente, as referidas bandeiras, cachecóis e camisolas] a circunstância de, no meio daquela imensa mole humana, não ter sido efetuada a identificação pessoal dum concreto sujeito ou dos concretos sujeitos, tem-se como de todo em todo desnecessária, já que a imputação não é feita aos concretos adeptos, mas ao clube de que os mesmos são apoiantes ou simpatizantes, adeptos esses que, refira-se, não estão sequer sujeitos ou abrangidos pelo âmbito do «RD/LPFP» [cfr., nomeadamente, seus arts. 03.º, 04.º, n.º 1, al. b), e 187.º] [negrito meu].
43. Ressuma do exposto que o juízo posto em crise mostra-se, assim, em consonância com o entendimento e jurisprudência convocada, não padecendo, como tal, de qualquer erro de julgamento, nem das apontadas inconstitucionalidades.
44. Como afirmado por este Supremo nos seus acórdãos de 18.10.2018 e de 20.12.2018, supra citados, o estabelecimento e previsão de uma tal presunção de veracidade «não se vê que … seja inconstitucional, quando o Tribunal Constitucional, no Ac. n.º 391/2015, de 12/8 (…), considerou que, mesmo em matéria penal, são admissíveis presunções legais, desde que seja conferida ao arguido a possibilidade de abalar os fundamentos em que a presunção se sustente e desde que para tal baste a contraprova dos factos presumidos, não se exigindo a prova do contrário» e de que como o mesmo TC entendeu «para a situação idêntica da fé em juízo dos autos de notícia (…) cremos que a presunção de veracidade em causa - que incide sobre um puro facto e que pode ser ilidida mediante a criação, pelo arguido, de uma mera situação de incerteza - não acarreta qualquer presunção de culpabilidade suscetível de violar o princípio da presunção de inocência ou de colidir com as garantias de defesa do arguido constitucionalmente protegidas (art. 32.º, n.ºs 2 e 10, da CRP)», já que «o valor probatório dos relatórios dos jogos, além de só respeitarem, como vimos, aos factos que nele são descritos como percecionados pelos delegados e não aos demais elementos da infração, não prejudicando a valoração jurídico-disciplinar desses factos, não é definitiva, mas só prima facie ou de interim, podendo ser questionado pelo arguido e se, em face dessa contestação, houver uma “incerteza razoável” quanto à verdade dos factos deles constantes, impõe-se, para salvaguarda do princípio in dubio pro reo, a sua absolvição» [negrito meu].
45. A decisão disciplinar punitiva não radicou, pois, numa qualquer presunção de culpa da «F….., SAD», decorrente duma inversão do ónus probatório [cfr. art. 344.º do CC] estribado no art. 13.º, al. f) do RD/LPFP-2017, antes se mostrando alicerçada naquilo que, levando a consideração em matéria desportiva os princípios enformadores do processo disciplinar, foi a prova coligida no mesmo processo e o uso lícito e legítimo das aludidas presunções [cfr. art. 349.º do CC], tudo em observância e sem entorses aos princípios e comandos normativos [constitucionais e legais] convocados [cfr. arts. 02.º, 20.º, n.º 4, e 32.º, n.ºs 2 e 10, da CRP, 13.º al. f), 127.º, 187.º e 258.º do RD/LPFP-2017] …».
(…)
21. Insurge-se, ainda, a Recorrente contra o juízo de não preenchimento “in casu” do ilícito disciplinar previsto e punido nos arts. 127º, 172º, 187º nº 1 als. a) e b) e 258º do RD/LPFP, que veio a ser firmado no acórdão do TCAS sob recurso, juízo esse fundado na inexistência de prova pela Recorrente da efetiva culpa da aqui recorrida dada a ausência de demonstração da ocorrência de conduta ou comportamento de incumprimento de um qualquer dever que sobre a mesma impendesse, e que, como tal, mostravam-se violados aquele quadro normativo e, como sustenta a Recorrida, os princípios da culpa (art. 2º da CRP) - dada a inexistência de responsabilidade objetiva por facto de outrem e de não se haver avaliado a concreta conduta da mesma enquanto agente desportivo, tanto mais que não resulta em evidência qualquer ato ou omissão que possa ter contribuído para os acontecimentos - e da presunção da inocência (e inerente direito de defesa) e do “in dubio pro reo” (art. 32º nºs 2 e 10 da CRP), bem como do direito a um processo equitativo (art. 20º nº 4 da CRP), ocorrendo inconstitucionalidade.
22. Analisando o apontado erro de julgamento por incorreta interpretação e aplicação dos arts. 127º, 172º, 187º nº 1 als. a) e b) e 258º do RD/LPFP, extrai-se, no que releva, dos pontos 48 a 74 da fundamentação expendida no aludido acórdão deste Supremo de 21/2/2019 (Proc. nº 033/18.0BCLSB), o seguinte:
«(…) 48. Constitui uma incumbência do Estado, em colaboração, nomeadamente, com as associações e colectividades desportivas [in casu, os clubes de futebol] a prevenção e combate à violência no desporto [cfr., no quadro internacional a «Convenção Europeia sobre a Violência e os Excessos dos Espectadores por Ocasião das Manifestações Desportivas e nomeadamente de Jogos de Futebol» vulgo «Convenção ETS n.º 120» (aprovada, por ratificação, pela Resolução da Assembleia da República n.º 11/87, de 10.03, e que cessou a sua vigência em 01.01.2019 - cfr. Aviso n.º 90/2018 publicado DR 26.07.2018) e a «Convenção sobre uma Abordagem Integrada da Segurança, Proteção e Serviços por Ocasião de Jogos de Futebol e Outras Manifestações Desportivas» (ETS n.º 218 - vigente na nossa ordem jurídica desde 01.08.2018 - cfr. Aviso n.º 91/2018 publicado DR 26.07.2018); no quadro normativo interno, nomeadamente, os arts. 79.º, n.º 2, da CRP, 03.º, n.º 2, 05.º da Lei n.º 5/2007, de 16.01 (Lei de Bases da Atividade Física e do Desporto - doravante LBAFD), 01.º, 05.º, 07.º, 08.º, 09.º, 16.º a 18.º, 23.º a 25.º, da Lei n.º 39/2009, de 30.07 (diploma que veio estabelecer o regime jurídico do combate à violência, ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espetáculos desportivos, de forma a possibilitar a realização dos mesmos com segurança - com as alterações introduzidas pela Lei n.º 52/2013, de 25.07)], pugnando-se para que a actividade desportiva seja «desenvolvida em observância dos princípios da ética, da defesa do espírito desportivo, da verdade desportiva e da formação integral de todos os participantes» [cfr. o art. 03.º, n.º 1, da LBAFD] [negrito meu].
49. Em decorrência do que neste domínio constituem as obrigações e deveres legais enunciados no referido quadro normativo, que impendem, também, sobre os clubes e as sociedades desportivas, vieram, entretanto, a ser aprovados e publicitados pelas entidades responsáveis e organizadores das competições desportivas diversos regulamentos internos em matéria não apenas da organização daquelas competições, mas, também, de prevenção e punição das manifestações de violência, racismo, xenofobia e intolerância nos espetáculos desportivos, e, bem assim, de disciplina, nomeadamente, dos clubes de futebol e sociedades desportivas e dos agentes desportivos [cfr., no que aqui releva, o RD/LPFP-2017 - seus arts. 04.º, n.º 1, als. a) e b) 19.º, 66.º, 80.º, 94.º a 96.º, 105.º, 113.º, 131.º, 132.º, 145.º, 151.º a 154.º, 157.º a 159.º, 173.º, 178.º a 187.º - e o RC/LPFP-2017 - seus arts. 03.º, als. a) e d), 34.º, 35.º, 36.º e Anexo VI ao mesmo Regulamento].
50. Assim, no contexto do futebol, extrai-se do art. 06.º do RD/LPFP-2017 que o regime disciplinar desportivo é autónomo e independente da «responsabilidade civil ou penal, assim como do regime emergente das relações laborais ou estatuto profissional, os quais serão regidos pelas respetivas normas em vigor» [n.º 1], bem como da «responsabilidade disciplinar de natureza associativa decorrente da qualidade de associado da Liga Portuguesa de Futebol Profissional» [n.º 2], sendo que a «aplicação de sanções criminais, contraordenacionais, administrativas, cíveis ou associativas não constitui impedimento, atento o seu distinto fundamento, à investigação e punição das infracções disciplinares de natureza desportiva» [n.º 3], prevendo-se, no que releva, quanto ao âmbito subjetivo de aplicação das normas disciplinares que os «clubes são responsáveis pelas infrações cometidas nas épocas desportivas em que participarem nas competições organizadas pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional e no âmbito dessas competições» [cfr. art. 07.º, n.º 2] [negrito meu].
51. O conceito de «infracção disciplinar» mostra-se definido no n.º 1 do art. 17.º do referido RD ali se preceituando que se considera «infracção disciplinar o facto voluntário, por ação ou omissão, e ainda que meramente culposo, que viole os deveres gerais ou especiais previstos nos regulamentos desportivos e demais legislação aplicável», elencando-se nos seus arts. 29.º e 30.º o leque de sanções disciplinares [principais e acessórias] e quais aquelas que são aplicáveis aos clubes [negrito meu].
52. Resulta, por sua vez, do capítulo IV do RD/LPFP-2017 o elenco de infracções disciplinares, prevendo-se na sua secção I as «infrações específicas dos clubes», as quais podem ser «muito graves» [cfr. subsecção I, arts. 62.º a 83.º], «graves» [cfr. subsecção II, arts. 84.º a 118.º] e «leves» [cfr. subsecção III, arts. 119.º a 127.º], seguindo-se depois as infrações de dirigentes, de jogadores, de delegados dos clubes e dos treinadores, e na secção VI o regime das «infrações dos espectadores», resultando enunciado no art. 172.º, como princípio geral, o de que os «clubes são responsáveis pelas alterações da ordem e da disciplina provocadas pelos seus sócios ou simpatizantes nos complexos, recintos desportivos e áreas de competição, por ocasião de qualquer jogo oficial» [n.º 1] e de que «[s]em prejuízo do acima estabelecido, no que concerne única e exclusivamente ao autocarro oficial da equipa visitante, o clube visitado será responsabilizado pelos danos causados em consequência dos atos dos seus sócios e simpatizantes praticados nas vias públicas de acesso ao complexo desportivo» [n.º 2] [negrito meu].
53. Também as «infrações dos espectadores» se mostram qualificadas como podendo ser «muito graves» [cfr. subsecção II, arts. 173.º a 178.º], «graves» [cfr. subsecção III, arts. 179.º a 184.º] e «leves» [cfr. subsecção IV, arts. 185.º a 187.º], estipulando-se, no que releva para o litígio, no seu art. 187.º, respeitante a «comportamento incorreto do público», que «[f]ora dos casos previstos nos artigos anteriores, o clube cujos sócios ou simpatizantes adotem comportamento social ou desportivamente incorreto, designadamente através do arremesso de objetos para o terreno de jogo, de insultos ou de atuação da qual resultem danos patrimoniais ou pratiquem comportamentos não previstos nos artigos anteriores que perturbem ou ameacem perturbar a ordem e a disciplina é punido nos seguintes termos: a) o simples comportamento social ou desportivamente incorreto, com a sanção de multa a fixar entre o mínimo de 5 UC e o máximo de 15 UC; b) o comportamento não previsto nos artigos anteriores que perturbe ou ameace a ordem e a disciplina, designadamente mediante o arremesso de petardos e tochas, é punido com a sanção de multa a fixar entre o mínimo de 15 UC e o máximo de 75 UC» [n.º 1] [negrito meu].
54. Decorre, por outro lado, do art. 34.º do RC/LPFP-2017, relativo à segurança e utilização dos espaços de acesso público, que os «clubes estão obrigados a elaborar um regulamento de segurança e utilização dos espaços de acesso ao público relativo ao estádio por cada um utilizado na condição de visitado e cuja execução deve ser concertada com as forças de segurança, a ANPC e os serviços de emergência médica e a Liga» [n.º 1], e que tal regulamento deverá conter, designadamente, medidas relativas à «a) separação física dos adeptos, reservando-lhes zonas distintas, nas competições desportivas consideradas de risco elevado; … d) instalação ou montagem de anéis de segurança e adoção obrigatória de sistemas de controlo de acesso, de modo a impedir a introdução de objetos ou substâncias proibidas ou suscetíveis de possibilitar ou gerar atos de violência, nos termos previstos na lei» [n.º 2] [negrito meu].
55. Resulta do art. 35.º do mesmo RC que «[e]m matéria de prevenção de violência e promoção do fair-play, são deveres dos clubes: a) assumir a responsabilidade pela segurança do recinto desportivo e anéis de segurança; b) incentivar o espírito ético e desportivo dos seus adeptos, especialmente junto dos grupos organizados; c) aplicar medidas sancionatórias aos seus associados envolvidos em perturbações da ordem pública, impedindo o acesso aos recintos desportivos nos termos e condições do respetivo regulamento ou promovendo a sua expulsão do recinto; (…) f) garantir que são cumpridas todas as regras e condições de acesso e de permanência de espetadores no recinto desportivo; (…) k) não apoiar, sob qualquer forma, grupos organizados de adeptos, em violação dos princípios e regras definidos na Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, com a redação dada pela Lei n.º 52/2013, de 25 de julho; l) zelar por que os grupos organizados de adeptos apoiados pelo clube participem do espetáculo desportivo sem recurso a práticas violentas, racistas, xenófobas, ofensivas ou que perturbem a ordem pública ou o curso normal, pacífico e seguro da competição e de toda a sua envolvência, nomeadamente, no curso das suas deslocações e nas manifestações que realizem dentro e fora de recintos; (…) o) desenvolver ações de prevenção socioeducativa, nos termos da lei; (…) s) reservar, nos recintos desportivos que lhe são afetos, uma ou mais áreas específicas para os filiados dos grupos organizados de adeptos» [n.º 1], e que «[p]ara efeito do disposto na alínea f) do número anterior, e sem prejuízo do estabelecido no artigo 24.º da Lei n.º 39/2009 (…) e no Regulamento de prevenção da violência constante do Anexo VI, são considerados proibidos todos os objetos, substâncias e materiais suscetíveis de possibilitar atos de violência, designadamente: (…) f) substâncias corrosivas ou inflamáveis, explosivas ou pirotécnicas, líquidos e gases, fogo-de-artifício, foguetes luminosos (very-lights), tintas, bombas de fumo ou outros materiais pirotécnicos; g) latas de gases aerossóis, substâncias corrosivas ou inflamáveis, tintas ou recipientes que contenham substâncias prejudiciais à saúde ou que sejam altamente inflamáveis» [n.º 2], sendo que «[p]ara além do disposto nos números anteriores, os clubes visitados, ou considerados como tal, devem proceder à colocação, em todas as entradas do estádio, de um mapa-aviso, de dimensões adequadas, com a descrição de todos os objetos ou comportamentos proibidos no recinto ou complexo desportivo, nomeadamente invasões do terreno de jogo, arremesso de objetos, uso de linguagem ou cânticos injuriosos ou que incitem à violência, racismo ou xenofobia, bem como a introdução (…) material produtor de fogo-de-artifício ou objetos similares, e quaisquer outros suscetíveis de possibilitar a prática de atos de violência» [n.º 6] [sublinhados nossos].
56. E quanto aos regulamentos de prevenção da violência [cfr. art. 36.º daquele RC] a matéria surge regulada nos referidos RD/LPFP e no anexo VI ao RC/LPFP [o RPV/RC/LPFP - adotado ao abrigo do disposto no n.º 1 do art. 05.º da Lei n.º 39/2009 (cfr. art. 02.º do mesmo RPV - «norma habilitante»)], extraindo-se do seu art. 04.º que «[c]ompete à Liga e aos seus associados, incentivar o respeito pelos princípios éticos inerentes ao desporto e implementar procedimentos e medidas destinados a prevenir e reprimir fenómenos de violência, racismo, xenofobia e intolerância nas competições e nos jogos que lhes compete organizar», constituindo deveres do «promotor do espetáculo desportivo» [no caso os «clubes» - cfr. art. 05.º, al. h), do referido RPV], no que aqui ora releva, os de «(…) b) assumir a responsabilidade pela segurança do recinto desportivo e anéis de segurança; c) incentivar o espírito ético e desportivo dos seus adeptos, especialmente junto dos grupos organizados; (…) l) não apoiar, sob qualquer forma, grupos organizados de adeptos, em violação dos princípios e regras definidos na Lei n.º 39/2009 (…); m) zelar por que os grupos organizados de adeptos apoiados pelo clube, associação ou sociedade desportiva participem do espetáculo desportivo sem recurso a práticas violentas, racistas xenófobas, ofensivas ou que perturbem a ordem pública ou o curso normal, pacífico e seguro da competição e de toda a sua envolvência, nomeadamente, no curso das suas deslocações e nas manifestações que realizem dentro e fora de recintos; p) desenvolver ações de prevenção socioeducativa, nos termos da lei; (…) t) reservar, nos recintos desportivos que lhe são afetos, uma ou mais áreas específicas para os filiados dos grupos organizados de adeptos; u) instalar e manter em funcionamento um sistema de videovigilância, de acordo com o preceituado nas leis aplicáveis» [cfr. art. 06.º do mesmo Regulamento] [negrito meu].
57. Constituem, por último, condições de acesso dos espetadores ao recinto desportivo definidas no art. 09.º do referido Regulamento, nomeadamente, o: «f) não entoar cânticos racistas ou xenófobos ou que incitem à violência; (…) l) consentir na revista pessoal e de bens, de prevenção e segurança, com o objetivo de detetar e/ou impedir a entrada ou existência de objetos ou substâncias proibidos ou suscetíveis de possibilitar atos de violência; m) não transportar ou trazer consigo objetos, materiais ou substâncias suscetíveis de constituir uma ameaça à segurança, perturbar o processo do jogo, impedir ou dificultar a visibilidade dos outros espetadores, causar danos a pessoas ou bens e/ou gerar ou possibilitar atos de violência, nomeadamente: (…) vi. substâncias corrosivas ou inflamáveis, explosivas ou pirotécnicas, líquidos e gases, fogo-de-artifício, foguetes luminosos (very-lights), tintas, bombas de fumo ou outros materiais pirotécnicos; vii. latas de gases aerossóis, substâncias corrosivas ou inflamáveis, tintas ou recipientes que contenham substâncias prejudiciais à saúde ou que sejam altamente inflamáveis», sendo que o acesso e permanência dos grupos organizados de adeptos [cfr. art. 11.º] se mostra disciplinado pelo estabelecido, nomeadamente, no art. 09.º, sendo sempre obrigatória a revista pessoal aos mesmos e seus bens.
58. Encerrando-se aqui o elencar do quadro normativo tido por pertinente para a análise do litígio temos que a previsão do ilícito desportivo disciplinar em questão, no caso o inserto no art. 187.º do RD/LPFP-2017, mostra-se clara e perfeitamente integrada naquilo que, por um lado, são os deveres legais e regulamentares atrás aludidos e que nesta matéria impendem, nomeadamente, sobre os clubes e sociedades desportivas, e, por outro lado, no que, mais vastamente, constituem os objetivos e os fins da política de combate à violência, ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espetáculos desportivos, de forma a possibilitar a realização dos mesmos com segurança e desportivismo, prevenindo a eclosão e reprimindo a existência ou a manifestação de tais fenómenos [negrito meu].
59. Através da previsão do referido ilícito desportivo disciplinar visa-se a prossecução e realização daqueles objetivos e fins, prevenindo e reprimindo os comportamentos e as condutas que nele se mostram tipificados e que são atentatórios e desconformes com aqueles objetivos e fins, fazendo responder clubes e sociedades desportivas por tais condutas e comportamentos incorretos, tidos pelo público aos mesmos afeto ou simpatizante, enquanto reveladores da inobservância por estes, por ação ou por omissão, do que constituem os seus deveres legais e regulamentares gerais e especiais constantes dos comandos normativos atrás convocados.
60. Na formulação do que constitui o tipo de ilícito disciplinar inserto no art. 187.º do RD/LPFP-2017 e do que, em decorrência, se exige para o seu preenchimento em concreto, estão subjacentes, tão-só, as condutas ou os comportamentos social ou desportivamente incorretos que nele se mostram descritos e que foram tidos pelos sócios ou simpatizantes de um clube/sociedade desportiva e pelos quais os mesmos respondem, porquanto decorrentes ou fruto do que constitui o incumprimento pelos mesmos, por ação ou omissão, do dever in vigilando que têm sobre as suas claques e adeptos, nomeadamente e no que releva para a discussão objeto dos autos sub specie, de que houve alguma falha no dever de revista dos adeptos, no dever de revista do estádio, no dever de controlar os adeptos dentro do estádio, no dever de demover os adeptos de praticarem ou desenvolverem tal tipo de comportamentos e condutas [negrito meu].
61. Ora no caso vertente inexiste, por não aportado aos autos, um qualquer elemento densificador e revelador do cumprimento por parte da demandante dos deveres a que está subordinada no que respeita aos deveres de formação, controlo e vigilância do comportamento dos seus adeptos e espectadores, bem sabendo que estava obrigada a cuidar dos mesmos e que eram os seus adeptos que ocupavam a denominada «bancada sul», onde se verificaram as ocorrências registadas no Relatório [negrito meu].
62. Sobre os clubes de futebol e as respetivas sociedades desportivas, como é o caso da demandante aqui recorrida, recaem especiais deveres na assunção, tomada e implementação de efetivas medidas não apenas dissuasoras e preventivas, mas, também, repressoras, dos fenómenos de violência associada ao desporto e de falta de desportivismo, de molde a criar as condições indispensáveis para que a ordem e a segurança nos estádios de futebol português sejam uma realidade [negrito meu].
63. Neste contexto, ao invés do sustentado pela demandante na sua impugnação e que veio a ter acolhimento no acórdão recorrido, não estamos em face de uma qualquer situação de responsabilidade disciplinar objetiva violadora dos princípios e comandos constitucionais [negrito meu].
64. Com efeito, mostra-se ser in casu subjetiva a responsabilidade desportiva na vertente disciplinar da demandante aqui recorrida, já que estribada naquilo que foi uma violação dos deveres legais e regulamentares que sobre a mesma impendiam neste domínio e em que o critério de delimitação da autoria do ilícito surge recortado com apelo não ao do domínio do facto, mas sim ao da titularidade do dever que foi omitido ou preterido [negrito meu].
65. É que se no domínio da prevenção da violência associada ao fenómeno desportivo o quadro normativo impõe deveres a um leque alargado de destinatários, nomeadamente, aos clubes de futebol e respetivas sociedades desportivas, é porque lhes reconhece capacidade para os cumprir e também para os violar, pelo que apurando-se a violação de deveres legalmente estabelecidos os destinatários dos mesmos serão responsáveis por essa violação [negrito meu].
66. Socorrendo-nos e transpondo para o caso vertente a jurisprudência do TC expendida no acórdão n.º 730/95 [consultável in: «www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/» e que foi firmada no quadro da apreciação da conformidade constitucional da sanção de interdição dos estádios por comportamentos dos adeptos dos clubes prevista nos arts. 03.º a 06.º do DL n.º 270/89, de 18.08 (diploma no qual se continham medidas preventivas e punitivas de violência associada ao desporto) e 106.º do Regulamento Disciplinar da FPF], temos que os ilícitos disciplinares ou disciplinares desportivos imputados e pelos quais a demandante aqui recorrida foi sancionada resultam de «condutas ilícitas e culposas das respetivas claques desportivas (assim chamadas e que são os sócios, adeptos ou simpatizantes, como tal reconhecidos) - condutas que se imputam aos clubes, em virtude de sobre eles impenderem deveres de formação e de vigilância que a lei lhes impõe e que eles não cumpriram de forma capaz», «[d]everes que consubstanciam verdadeiros e novos deveres in vigilando e informando», presente que cabe a cada clube desportivo o «dever de colaborar com a Administração na manutenção da segurança nos recintos desportivos, de prevenir a violência no desporto, tomando as medidas adequadas», concluindo-se no sentido de que «[n]ão é, pois, (…) uma ideia de responsabilidade objetiva que vinga in casu, mas de responsabilidade por violação de deveres» [negrito meu].
67. É, por conseguinte, neste ambiente de proteção, salvaguarda e prevenção da ética desportiva, bem como do combate a manifestações de violência associada ao desporto, que incidem ou recaem sobre vários entes e entidades envolvidos, designadamente sobre os clubes de futebol e respetivas sociedades desportivas, um conjunto de novos deveres in vigilando e in formando e em que a inobservância destes deveres assenta não necessariamente numa valoração social, moral ou cultural da conduta do infrator, mas antes no incumprimento de uma imposição legal, sancionando-se aqueles por via da contribuição omissiva, causal ou co causal que tenha conduzido a um comportamento ou conduta dos seus adeptos [negrito meu].
68. Na verdade, não estamos in casu, pois, perante uma responsabilidade objetiva já que o regime previsto nos arts. 17.º, 19.º, 20.º, 127.º, 187.º, n.º 1, als. a) e b), do RD/LPFP-2017 em articulação, nomeadamente, com os arts. 06.º, al. g), e 09.º, n.º 1, al. m), do RPV/RC/LPFP-2017 e com o que resulta do demais quadro normativo atrás convocado, observa o princípio da culpa, tanto mais que em sua decorrência apenas se sancionam os clubes de futebol ou as suas sociedades desportivas pelos comportamentos incorretos do seu público havidos em violação por aqueles dos deveres que sobre os mesmos impendiam [negrito meu].
69. Daí que, no contexto, o princípio constitucional da culpa, enquanto servindo, igualmente, de elemento conformador e basilar ao Estado de direito democrático, e tendo como pressuposto o de que qualquer sanção configura a reação à violação culposa de um dever de conduta, considerado socialmente relevante e que foi prévia e legalmente imposto ao agente, não se mostra minimamente infringido, tanto mais que será no quadro do processo disciplinar a instaurar [cfr. arts. 212.º e segs., 225.º e segs., do RD/LPFP-2017] que se terão de averiguar e apurar todos os elementos da infracção disciplinar, permitindo, como se refere no citado acórdão do TC, que «por esta via, a prova de primeira aparência pode vir a ser destruída pelo clube responsável (por exemplo, através da prova de que o espectador em causa não é sócio, simpatizante ou adepto do clube)» [negrito meu].
70. Frise-se que é na e da inobservância dos deveres de assunção da responsabilidade pela segurança do que se passe no recinto desportivo e do desenvolvimento de efetivas ações de prevenção socioeducativa que radica ou deriva a responsabilidade disciplinar desportiva em questão, dado ter sido essa conduta que permitiu ou facilitou a prática pelos seus adeptos dos atos ou comportamentos proibidos ou incorretos.
71. E que cabe aos clubes de futebol/sociedades desportivas a demonstração da realização por parte dos mesmos junto dos seus adeptos das ações e dos concretos atos destinados à observância daqueles deveres e, assim, prevenirem e eliminarem a violência, e isso sejam esses atos e ações desenvolvidos em momento anterior ao evento, sejam, especialmente, imediatamente antes ou durante a sua realização [negrito meu].
72. Para o efeito, aportando prova demonstradora, designadamente, de um razoável esforço no cumprimento dos deveres de formação dos adeptos ou da montagem de um sistema de segurança que, ainda que não sendo imune a falhas, conduza a que estas ocorrências e condutas sejam tendencialmente banidas dos espetáculos desportivos, assumindo ou constituindo realidades de carácter excepcional [negrito meu].
73. A previsão no quadro disciplinar do ilícito desportivo em crise mostra-se, assim, devidamente legitimada já que encontra, ou vê radicar, repousar os seus fundamentos não apenas naquilo que é a necessária prevenção, mas, também, na culpa, sancionando-se o que constitui um negligente cumprimento dos deveres supra enunciados, sem que, de harmonia com o exposto, um tal entendimento atente ou enferme de violação dos princípios da culpa e do Estado de direito, ou constitua um entorse aos direitos de defesa e a um processo equitativo, dado que assegurados e garantidos em consonância e adequação com o entendimento e interpretação fixados [negrito meu].
74. E também não vemos que tal entendimento e interpretação possam envolver uma pretensa violação dos princípios da presunção da inocência e do in dubio pro reo, pois, não estamos em face da assunção duma presunção de culpa da arguida ou de regra que dispense, libere ou inverta o ónus probatório que colida com o primeiro princípio, nem, como atrás referido, no caso em presença somos confrontados com uma situação de inexistência de prova relevante de que foi cometido ilícito e de quem é o sujeito responsável à luz da prova produzida para, mercê da existência de legítima dúvida, fazer apelo ao segundo princípio».” [negrito meu].
(…)
25. Por outro lado, tem-se como igualmente insubsistente a alegação da aqui Recorrida de pretensa infração ao disposto no art. 20º nº 4 da CRP, por alegada violação do seu direito a um processo equitativo caso viesse a ser revogado, como foi, o juízo firmado no acórdão recorrido de procedência da impugnação da decisão disciplinar punitiva.
26. Com efeito, se é certo que a CRP consagra nos seus arts. 20º e 268º nº 4, o direito a um processo justo, imparcial e equitativo, o qual postula, designadamente, que a «todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos», temos que a definição dos meios de tutela jurisdicional desses direitos e interesses, daquilo que são as suas regras de tramitação, os poderes e os ónus que recaem sobre as partes e poderes do julgador, carecem de consagração e concretização legal, não resultando dos direitos em referência a atribuição aos cidadãos, na defesa e tutela de seus direitos e interesses, de um direito a livremente poderem socorrer-se de todo e qualquer meio processual ou probatório que considerem adequado, nem que estejam isentos ou desonerados do respeito de regras contendo deveres e ónus/faculdades processuais e/ou das consequências que derivem do seu incumprimento ou da sujeição às decorrências resultantes dos comportamentos desenvolvidos no ou fazendo uso de ónus/faculdades.
27. Na verdade, atendendo a outros bens e valores jurídicos que importa que sejam igualmente considerados, o legislador procede à definição dos meios ao dispor dos cidadãos para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, disciplina as suas regras e pressupostos, institui deveres, poderes e ónus para as partes, cientes de que o direito a um processo equitativo só se considera violado quando for impossível o estabelecimento de uma relação mínima de equilíbrio ou proporção entre a justificação da exigência em causa e a gravidade das consequências ligadas ao incumprimento de tal exigência.
28. No caso vertente não se vislumbra uma qualquer ofensa ao comando constitucional em crise e ao direito convocado, porquanto à Recorrida mostrou-se e mostra-se assegurado, em pleno, o direito a um processo equitativo na e com tramitação e decisão dos vários meios impugnatórios de que dispôs e deduziu em várias sedes e instâncias, feitas segundo as regras disciplinadoras dos mesmos e que se mostram equilibradas/proporcionais aos valores e direitos a tutelar - cfr., também, em idêntico sentido o ponto 2.4 do Ac. deste STA de 5/9/2019 (Proc. n.º 058/18.6BCLSB) [negrito meu].
(…)”.

Assim, a norma contida na alínea f) do artigo 13º do RD contém uma presunção da veracidade dos factos constantes dos relatórios dos árbitros e do delegado da Liga ilidível por o clube ou SAD demandada poder demonstrar que assim não aconteceu alegando e provando, por exemplo, que quem proferiu os insultos ou remeteu objectos perigosos para o campo não era sócio, adepto ou simpatizante do clube ou que adoptou antes e imediatamente antes do jogo, em questão, todos os procedimentos adequados a obstar à entrada desses objectos para o estádio ou prestou a informação/formação adequada a prevenir qualquer comportamento inadequado, perigoso ou violento, não lhe podendo ser imputada culpa pela actuação objecto da sanção disciplinar. Tal norma não é inconstitucional por não violar os princípios da culpa e da presunção de inocência, nem os direitos do contraditório e ao processo equitativo, nos termos e pelos fundamentos expostos no acórdão reproduzido, aos quais adiro na íntegra.

No caso em apreciação resulta da factualidade considerada provada que no decorrer do jogo de futebol que se realizou no dia 18.5.2019, no Estádio do Dragão, entre o F….. e o S….., os adeptos e simpatizantes do primeiro, pertencentes aos GOA (grupo organizado de adeptos, designado por ……), que ficaram localizados na bancada sul, sectores 9 e 10, devidamente identificados por cachecóis, camisolas e bandeiras alusivas ao clube, deflagraram 4 potes de fumo - 1 cerca do minuto 51 e 3 cerca do minuto 86 – e ainda fizeram rebentar 2 petardos aos 88 e 89 minutos, e proferiram as expressões “filhos da puta” e “cabrões de filhos da puta”, dirigidos à equipa de arbitragem e à equipa visitante, e aos 86 minutos, os que se encontravam atrás da baliza visitante, arremessaram para o terreno de jogo vários isqueiros, e, antes do início do jogo, outros adeptos, simpatizantes e espectadores da Recorrente, identificados por camisolas e cascóis do clube, situados na bancada central poente, apontaram um laser à cara do árbitro, não lhe provocando lesão, mas encadeando-o por alguns momentos – cfr. factos a) a f) com remissão em cada um para as correspondentes folhas do Relatório do Árbitro, do Relatório dos Delegados da Liga e do Relatório de Policiamento Desportivo e ainda para os respectivos esclarecimentos prestados.
A aqui Recorrente quer na acção que decorreu no TAD – onde, realizada a audiência de partes, prescindiu da prova testemunhal que havia indicado – quer nos presentes autos, admitindo a prática dos factos provados, limitou-se a levantar dúvidas sobre se os respectivos autores, que não foram pessoalmente identificados, são seus sócios ou simpatizantes sem juntar qualquer prova dessa sua convicção ou de que adoptou todas as medidas preventivas que lhe eram legalmente exigidas adequadas e necessárias a obstar ao sucedido.
No Acórdão recorrido foi, a este propósito, expendida a seguinte argumentação:
“Aqui chegados importa circunscrever as questões de direito sobre as quais nos iremos debruçar na nossa decisão, sendo por certo conhecido pelas partes, que este colectivo, com esta constituição, é a primeira vez que reúne, pelo que não tem antecedentes decisórios, porém, naturalmente acabará por cair numa das duas posições já defendidas em anteriores decisões do TAD.
Assim, a Demandante suscitou no âmbito do presente recurso às seguintes questões:
a) Nulidade da decisão decorrente da alteração substancial dos factos:
b) Da existência da falta de fundamentação das vertentes objectivas e subjectivas do tipo;
c) (…)

Como bem sabe a Demandante, o processo está sujeito aos princípios e regras dos art.°s 258.°, n.° 1 e art.° 13.°, alínea f), ambos do RD da LPFP, pelo que, face aos elementos probatórios careados para o processo disciplinar, foi possível subsumir os factos concretos às normas aplicáveis e consequentes sanções aplicáveis. Analisado todo o conteúdo do processo disciplinar, resulta para este Tribunal inequívoco que embora o mesmo tenha traduzido um procedimento célere, como importa neste tipo de matéria, a verdade é que esse facto não constituiu nenhum entrave à total garantia de defesa do arguido, já que, foram praticadas todas as diligências que foram consideradas necessárias à boa decisão da causa, e nem se assistiu a qualquer indeferimento a requerimentos de prova solicitados pela Demandante. Naturalmente que nesta sede a defesa dos direitos do arguido não são tão vastas, como no âmbito criminal, mas ainda assim não se vislumbrou nada que diminuísse a garantia de defesa do arguido.
Por outro lado, também não vislumbramos qualquer situação ou decisão que nos levasse a pensar que existiu alteração substancial dos factos, na medida em que os fundamentos que constam da decisão do Plenário do Conselho de Disciplina são os mesmos da decisão do Conselho de Disciplina em formação estrita, embora esta fosse mais resumida e por remissão, o que não se nos afigura como suficiente para concluirmos da forma como conclui a Demandante.

Com efeito, e ao contrário do que deveria ter sido a preocupação da Demandante, esta preocupou-se em atacar a argumentação apresentada pela Demandada, numa lógica estritamente de defesa criminal, pois, a quem acusa cabe fazer a prova, mas não se preocupou em demonstrar de forma cabal, exaustiva e elucidativamente todas as acções que têm sido tomadas para contrariar a condenação pelos factos negativos. Na verdade, os ilícitos aqui em apreço são preenchidos, na sua maioria, por omissão, e, impendia sobre a Demandante contrariar a teoria da Demandada demonstrando tudo o que tem feito para levar a que o juízo de valor fosse diferente. Aliás, estávamos à espera que em sede de julgamento a Demandante tivesse vindo demonstrar isso mesmo, porém, tal não aconteceu. Alegou ainda a Demandante, que a Demandada foi conclusiva. Porém, da leitura da peça inicial da Demandante resulta que esta é que foi conclusiva.
"52. A demandante não só não contribuiu para a prática dos comportamentos aqui em discussão, como tudo faz para evitá-los.
53. No que respeita ao jogo em apreço nestes autos, a demandante não adoptou um comportamento inadimplente, antes adoptando actos concretos junto dos seus adeptos e destinados à prevenção da violência, os quais obstam à responsabilização disciplinar do Clube nesta matéria.”
Competia pois à Demandante, porque os relatórios da equipa de arbitragem e dos delegados da LPFP não constituem uma prova inatacável, gozam apenas de presunção de veracidade, afastar essa presunção, o que não fez.
E nem se venha defender que tal contraprova colide com o princípio da inocência, pois, o princípio da inocência aparece em paralelo com o da presunção da veracidade dos factos provados por relatórios elaborados por intervenientes que têm força pública e equiparados a documentos autênticos, pelo que, perante dois princípios de força semelhante, necessário será ao julgador perceber qual a relação de força de um e de outro e decidir, pendendo necessariamente para um ou para o outro. Naturalmente que se a Demandante nenhuma prova apresenta que faça frente à força probatória dos Relatórios apresentados e foram vários, todos no mesmo sentido, então não restam dúvidas ao julgador para que lado vai pender.
Mas ainda poderão levantar-se dúvidas sobre a prova dos factos omissivos da Demandante e essa acaba também provada, por falta de nenhum elemento probatório apresentado pela Demandante, pois aqui pesa também a prova que os próprios relatórios apresentam. Era necessário aqui que a Demandante demonstrasse cabal e suficientemente tudo o que tem feito preventivamente e de forma antecipada aos acontecimentos, nomeadamente a nível da formação e vigilância, para que a prova dos factos omissivos ficasse abalada ou pelo menos desse mais força ao princípio do in dúbio pro reu, o que também não sucedeu de forma alguma, de modo a que a balança pendesse mais para este último principio do que para o da presunção da veracidade da prova conferida pelos Relatórios.
Veja-se a esse propósito, entre outros, o Acórdão do STA, de 21/03/2019, processo 075/18.6BCLRS, bem elucidativo sobre a relação entre a presunção da veracidade dos factos constantes dos relatórios e do poder que é conferido ao arguido de fazer contraprova, sem que isso colida com os princípios constitucionais dos art.°s 2.°, 20.°, n.° 4 e 32.°, n.°s 2 e 10 da CRP e dos princípios da presunção de inocência e do in dubio pro Reo.

Resulta pois inequívoco que nem os factos dados como provados são contrariados, nem a prova de que foram cumpridos os deveres que impendem sobre a Demandante foram igualmente por esta provados, donde resulta que nada na decisão recorrida é atacável.

Com efeito, entendemos que estes acórdãos devem ter uma vertente educacional e orientador e não só apenas formalista. Podemos discutir inúmeros conceitos jurídicos de uma boa ou má técnica judicial e se existem ou não todos os conceitos jurídicos de que necessitamos para resolver esta questão, mas o facto é que os Clubes continuam a ter uma atitude de conivência passiva com tais actos reprováveis, contaminando outros e levando os demais a pensar que é possível porque nada acontece, pois os adeptos, simpatizantes, público em geral entende que podem fazê-lo, já que os clubes pouco ou nada fazem para contrariar os mesmos. Assiste-se a uma passividade crescente dos clubes em contraponto com um crescendo da violência contra os agentes desportivos, que é intolerável numa sociedade de princípios democráticos e que se rege por princípios de justiça.

Também no que concerne à falta de fundamentação nos elementos subjectivos e objectivos do tipo, entende a Demandante que não estão os mesmos provados.
Dita o art.° 187.° do RD da LPFP
1. Fora dos casos previstos nos artigos anteriores, o clube cujos sócios ou simpatizantes adotem comportamento social ou desportivamente incorreto, designadamente através do arremesso de objetos para o terreno de jogo, de insultos ou de atuação da qual resultem danos patrimoniais ou pratiquem comportamentos não previstos nos artigos anteriores que perturbem ou ameacem perturbar a ordem e a disciplina é punido nos seguintes termos: a) o simples comportamento social ou desportivamente incorreto, com a sanção de multa a fixar entre o mínimo de 5 UC e o máximo de 15 UC; b) o comportamento não previsto nos artigos anteriores que perturbe ou ameace a ordem e a disciplina, designadamente mediante o arremesso de petardos e tochas, é punido com a sanção de multa a fixar entre o mínimo de 15 UC e o máximo de 75 UC.
Ora, no que concerne a este normativo, a Demandante foi condenada por uma infracção p. p. no n.° 1 a), outra pelo n.° 1 b), e uma pelo n.° 2 do art.° 186.° do RD, uma vez que foram identificados adeptos e simpatizantes, pertencentes ao GOA designado "…..", localizados na bancada sul, sectores 9 e 10, os quais estavam devidamente identificados por cachecóis, camisolas, bandeiras alusivas ao clube da casa, e partir de onde deflagraram 4 (quatro) potes de fumo, um cerca do minuto 51 e três cerca do minuto 86 da segunda parte, e ainda fizeram rebentar 2 (dois) petardos aos 88 e 89 minutos de jogo da segunda parte, tendo estes ainda proferidos, durante o decurso do jogo, expressões tais corno "filhos da puta", "cabrões filhos da puta", dirigidos quer à equipa de arbitragem, quer à equipa visitante; Os adeptos, simpatizantes e espectadores igualmente identificados com camisolas e cachecóis alusivos ao clube da Demandante, localizados na bancada central/bancada poente, antes do jogo se iniciar, apontaram um laser à cara do árbitro de jogo, não causando qualquer lesão, mas tendo provocado o encadeamento do mesmo durante alguns momentos e finalmente, e aos 86 minutos de jogo, os adeptos, simpatizantes e espectadores, localizados na bancada sul, por de trás da baliza da equipa visitante, igualmente identificados com os mesmos adereços do Clube Demandante, arremessaram para o terreno de jogo vários isqueiros.
Estes foram os factos observados e relatados nos diversos relatórios já referenciados e, a partir dos quais concluiu aquele órgão disciplinar que, de acordo com as regras da experiência comum e que, pelo menos a título de negligência, a Demandante não havia cumprido os seus deveres de vigilância e de formação.
Recordamos que os clubes contribuíram e votaram favoravelmente as regras a que se auto sujeitaram, pelo que as conhecem bem, nomeadamente os termos do art.° 172.° do RD da LPFP, bem como os artigos 34.° a 36.° do Regulamento de competições da LPFP e o art.° 6.° do Anexo VI do Regulamento de competições (Regulamento de Prevenção da Violência), pelo que não resultou provado que a Demandante tivesse actuado conforme lhe competia. Assim, estando nós perante factos omissivos e sendo esses punidos nos termos do art.° 17.° do RD da LFPF, dúvidas não parecem existir acerca do preenchimento dos fundamentos objectivos e subjectivos do tipo.
Tal como já atrás deixámos exposto, recaia sobre a Demandante fazer a demonstração da realização de actos concretos, persistentes e sérios, junto dos seus adeptos, simpatizantes ou espectadores, destinados à prevenção da violência, da consciencialização da necessidade de um melhor e correcto comportamento nos recintos desportivos, podendo assim desse modo afastar a sua responsabilização disciplinar, não sendo o bastante afirmar que se fez, sem concretamente se dizer o que se fez, com que frequência e de que modo.
(…)”.

O decidido encontra-se, portanto, em consonância com a referida Jurisprudência do STA e do Tribunal Constitucional, não tendo a Recorrente abalado a presunção em que aquele se sustentou, o que era suficiente já que não lhe era exigido que provasse o contrário.
Inexistindo dúvida (razoável), mantem-se a presunção efectuada a partir do relatado nos relatórios do árbitro e do delegado da Liga (com valor probatório reforçado) quanto aos factos assumidos como provados por incumprimento por parte da Recorrente dos seus deveres de vigilância, controlo e formação, que a terem sido observados deveriam ter impedido todos os comportamentos sociais e desportivos incorrectos evidenciados, incluindo os indicados insultos à equipa de arbitragem e à equipa visitante.
Em face do que não procede este fundamento do recurso.

ii) Do erro de julgamento por ter aplicado as penas previstas nos artigos 187º e 127º do RD, quando entre elas existe uma relação de subsidiariedade, violando o princípio ne bis in idem:

Do Acórdão recorrido extrai-se o seguinte:

“No que diz respeito à subsidiariedade entre os art.°s 127.° e 187.° ambos do RD da LPFP, é nosso entendimento que tal subsidiariedade não existe, antes existindo uma relação de complementaridade, uma vez que ambos os dispositivos visam acautelar valores distintos, senão vejamos: O art.° 127.° insere-se no capítulo das infracções disciplinares, específicas dos clubes (secção I), as quais são depois divididas por grau de gravidade, culminando essa secção com o art.° 127.°, o qual encerra em si todos e quaisquer outros deveres, que não tenham sido previstos especificamente anteriormente ou que estejam previstos em regulamentos e demais legislação desportiva.
Por outro lado, o art.° 187.° do RD da LPFP, insere-se na Secção VI, das infracções dos espectadores, na subsecção das infracções disciplinares leves.
Ora, desde logo a forma corno os artigos estão inseridos no diploma visa acautelar situações e princípios diversos. Depois, os mesmos são preenchidos de forma diversa também, na medida em que o art.°187.° é preenchido com os actos concretos dos sócios ou simpatizantes, enquanto que os do art.° 127.° são preenchidos pelos actos activos ou passivos dos clubes, pelo que não se aceita que exista tal relação de subsidiariedade, mas antes de relação de complementaridade, pelo que entendemos que bem andou a decisão em aplicar ambas punições.”

Sobre esta questão pronunciou-se o STA no já referido acórdão de 5.9.2019, no Proc. nº 058/18.6BCLSB nos seguintes termos: “(…)
2.5. Por último, e a título subsidiário, a recorrida F….., SAD, defende que foi violado o princípio ne bis in idem. Neste sentido, afirma o seguinte: “O art. 127.º-1 do RD e o art. 187.º-1, b) do RD encontram-se numa relação de especialidade, consumpção e subsidiariedade, pelo que a recorrida – a entender-se que deve ser condenada – só pode ser condenada pela prática da infracção disciplinar p. e p. pelo art. 187.º-1 b) do RD, sob pena de violação do princípio ne bis in idem, previsto no art. 29.º-5 da CRP e 12.º do RD” (…).
(…)
O n.º 1 do artigo 127.º (Inobservância de outros deveres) respeita a infracções específicas dos clubes, e dispõe do seguinte modo: “Em todos os outros casos não expressamente previstos em que os clubes deixem de cumprir os deveres que lhes são impostos pelos regulamentos e demais legislação desportiva aplicável são punidos com a sanção de multa de montante a fixar entre o mínimo de 10 UC e o máximo de 50 UC”.
A al. b) do n.º 1 do artigo 187.º (Comportamento incorrecto do público) respeita a infracções específicas dos espectadores, e dispõe do seguinte modo: “1. Fora dos casos previstos nos artigos anteriores, o clube cujos sócios ou simpatizantes adotem comportamento social ou desportivamente incorreto, designadamente através do arremesso de objetos para o terreno de jogo, de insultos ou de atuação da qual resultem danos patrimoniais ou pratiquem comportamentos não previstos nos artigos anteriores que perturbem ou ameacem perturbar a ordem e a disciplina é punido nos seguintes termos: (…) b) o comportamento não previsto nos artigos anteriores que perturbe ou ameace a ordem e a disciplina, designadamente mediante o arremesso de petardos e tochas, é punido com a sanção de multa a fixar entre o mínimo de 15 UC e o máximo de 75 UC”.
(…)
Nos preceitos acima reproduzidos, não obstante a sua distinta inserção sistemática, prevê-se a responsabilização do clube por violação dos deveres legais e regulamentares a que tem de obedecer, cada um deles lhe impondo a respectiva sanção disciplinar. No primeiro preceito, relativo a infracções específicas dos clubes, prevê-se essa responsabilização de forma genérica. No segundo preceito, relativo a infracções específicas dos espectadores, a responsabilização é prevista de forma mais específica, nomeadamente por via da menção do arremesso de objectos pirotécnicos, como petardos e tochas, para o terreno de jogo por parte de sócios ou simpatizantes do clube. Como é bom de ver, este tipo de conduta, a acontecer, materializa uma situação em que o clube não foi capaz de cumprir deveres de formação e de vigilância desses mesmos sócios ou simpatizantes, deveres que sobre ele impendem (negrito meu).
Quanto às condutas dos sócios ou simpatizantes – entrar com objectos pirotécnicos e fazê-los rebentar durante o jogo –, há que dar razão à F….., SAD, quando afirma que a última consome a primeira. Efectivamente, o propósito de introduzir objectos pirotécnicos no recinto desportivo é o de os fazer deflagrar (já a posse ilegal de arma [exemplo trazido pela FPF] pode obedecer a vários desideratos, sendo possível autonomizar aquela conduta em termos sancionatórios). Com isto, quando se sanciona o deflagramento de objectos pirotécnicos em recinto desportivo (e o seu arremesso para o campo de jogo) está-se implicitamente a sancionar o seu transporte para dentro dos mesmos, sendo que o bem jurídico protegido é apenas um: de forma genérica, evitar a violência nos espectáculos desportivos (negrito meu).
Com isto, temos que se a recorrida F….., SAD, for condenada com base nos dois preceitos em apreço – sendo certo que o artigo 127.º, n.º 1, não sanciona em concreto o transporte de objectos pirotécnicos para dentro dos estádios ou de outros recintos desportivos – haverá uma cumulação de sanções a aplicar no mesmo procedimento, ao mesmo autor, pelo mesmo objecto e, de forma geral ou mais específica, pelos mesmos fundamentos (violação de deveres legais e/ou regulamentares). Sem embargo, ainda que assim seja, não estamos propriamente perante uma situação de violação do princípio ne bis in idem, uma vez que foram destacadas, e dadas como provadas, duas condutas distintas: entrar no recinto desportivo com objectos pirotécnicos e arremessá-los e fazê-los deflagrar durante o jogo. Seja como for, estamos certamente em face de uma violação do n.º 3 do artigo 180.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aplicável enquanto direito subsidiário e em virtude da remissão contida no artigo 16.º do RD da LPFP [com a devida adaptação no que respeita à referência, neste último preceito, ao Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas], preceito segundo o qual “Não pode ser aplicada mais de uma sanção disciplinar por cada infração, pelas infrações acumuladas que sejam apreciadas num único processo ou pelas infrações apreciadas em processos apensados”. Como se disse, no caso vertente estão em causa duas infracções, a segunda consumindo a primeira, tudo redundando no incumprimento, pela F….., SAD, de deveres de formação e vigilância que impendem sobre si.
Diferentes seriam as coisas se as sanções em causa visassem, cada uma delas, proteger distintos bens jurídicos, v.g., bens relacionados com a boa prática desportiva (sanção desportiva) e bens tutelados pelo Direito Penal (sanção penal). Mas não é esse o caso com que presentemente nos deparamos.”

Estando em causa nos presentes autos situação absolutamente idêntica à apreciada e decidida neste acórdão do STA e concordando com os fundamentos aí expendido, deve manter-se apenas a aplicação da sanção prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 187.º do RD, nos termos referidos, não por violação do princípio ne bis in idem mas por não poder ser aplicada mais de uma sanção disciplinar por cada infracção, ou seja, a intenção de deflagrar um dispositivo pirotécnico consome a entrada no recinto desportivo com o mesmo.
Pelo que procede este fundamento do recurso.

iii) Do erro de julgamento por ter fixado o valor da causa em €30 000,01, em violação do disposto nos artigos 33º, alínea b) e 34º, nº 1 do CPTA:

No Acórdão Recorrido o TAD justificou o valor fixado nos seguintes termos:
“A demandante indicou como valor da causa o de 12.184,00€ (doze mil cento e oitenta e quatro euros), por corresponder à soma das coimas aplicadas, enquanto a Demandada pugnou pelo entendimento de que à causa deveria ser atribuído o valor de 30.000,01 € (trinta mil euros e um cêntimo). Foi também o entendimento deste colégio, já expressado no Despacho Saneaclor, fixar nos presentes autos o valor de 30.000,01 €, (trinta mil euros e um cêntimos) por dever considerar-se estarmos em presença de uma causa de valor indeterminável, nos termos dos artigos 34.°, n.° 1 e 2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), conjugado com o artigo 6.°, n.° 4 do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, e o art.° 44.°, n.° 1, da Lei da Organização do Sistema Judiciário, aplicáveis ex vi o artigo 77°, n.° 1 da Lei do TAD e artigo 2.°, n.° 2, da Portaria 301/2015, de 22 de Setembro, alterada pela Portaria 314/2017 de 24 de Outubro, pois, entendemos que o subjaz à pretensão da Demandante é um interesse imaterial, não se esgota na simples revogação da decisão disciplinar e eliminação da sanção.
Com efeito, não deixa de se atender ao facto da Demandante recorrer da aplicação de coimas, cujo valor está bem determinado, porém, subjaz a essa aplicação de coimas, bens superiores de dimensão imaterial, como sejam a defesa e preservação do bem saúde, bem-estar e, em último grau, protecção da vida, pelo que não se poderá deixar de lançar mão do critério definido pelo art.° 34.°, n.° 1 do CPTA, como supra referimos.”

Sobre esta questão este Tribunal já se pronunciou de forma reiterada e uniforme no sentido de que o valor da causa corresponde ao montante da sanção de conteúdo pecuniário aplicada, nos termos do disposto na alínea d) do artigo 33º do CPTA – v., entre outros, os acórdãos de 7.11.2019, proc. nº 2/19.3BCLSB, de 10.12.209, proc.s nº 49/19.0BCLSB e 133/1.0BCSLB, de 16.1.2020, proc. 48/19.1BCLSB.

“(…)
Estatui o art.º 33.º, al. b) do CPTA que: “nos processos relativos a actos administrativos, atende-se ao conteúdo económico do acto, designadamente por apelo aos seguintes critérios, para além daqueles que resultam do disposto no artigo anterior: (…) b) Quando esteja em causa a aplicação de sanções de conteúdo pecuniário, o valor da causa é determinado pelo montante da sanção aplicada;”.
A sanção disciplinar aplicada no presente processo tem natureza pecuniária, pelo que cai no âmbito de previsão da referida norma.
O conteúdo económico do acto coincide, nestas situações, com o montante da sanção aplicada - cfr. Aroso de Almeida e Carlos Cadilha, in Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2017, 4ª Edição, p. 232.
Não há, assim, que atender ao critério previsto no art.º 34.º do CPTA, dado que não estamos perante um processo que tenha por objecto bens imateriais ou normas administrativas.
Impõe-se, por isso, fixar o valor da causa em …€, que corresponde ao montante da sanção disciplinar aplicada e revogar, nessa parte, o acórdão recorrido.
Na jurisprudência deste TCAS veja-se, neste sentido e entre outros, o ac. proferido em 08/11/2018, proc.º n.º 70/18.5 BCLSB, o ac. de 07/11/2019, proc. n.º 2/19.3BCLSB, o ac. de 10/12/2019, proc.º n.º 4/19.0BCLSB.” (v. o referido acórdão de 16.1.2020, proc. 48/19.1BCLSB, in www.dgsi.pt.).
Concordando com o entendimento reproduzido, procede este fundamento de recurso, devendo o valor da acção ser fixado em €12 184,00, por corresponder à soma das multas aplicadas à Recorrente.

iv) Do erro de julgamento na fixação inconstitucional do valor das custas processuais, por violação do princípios da proporcionalidade e da tutela jurisdicional efectiva:
Considerando que o valor das custas é influenciado pelo valor da acção e este pelo valor das multas aplicáveis.
Considerando que pela presente decisão se entendeu não manter o decidido no acórdão recorrido quer na parte da condenação da infracção punível pelo artigo 127º do RD quer na fixação do valor da acção.
Entendo estar prejudicada apreciação deste fundamento do recurso.

Por tudo quanto vem exposto acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal em indeferir as reclamações apresentadas e confirmar a decisão sumária do relator [que concedeu provimento parcial ao recurso, revogando o acórdão do TAD recorrido na parte que condena a Recorrente pela prática de infracção punível pelo nº 1 do artigo 127º do RD e fixando o valor da acção em €12 184,00].

Custas pela Recorrente.

Registe e Notifique.

Lisboa, 18 de Junho de 2020.

Declaração de voto da 2ª Adjunta, Juíza Desembargadora Sra. Dra. Sofia David
“Proc. n.º 9/20.8BCLSB
Discordo do julgamento relativo à condenação do Recorrente pela prática de quatro infracções disciplinares, p. e p. pelos artigos 186.º, nº 2, 127.º, nº 1 e 187.º, alíneas a) e b) do RD, por entender que existe aqui um delito de omissão e que que a imputação (funcional) à pessoa colectiva – ao Clube de futebol – da autoria dos correspondentes ilícitos, por violação do dever jurídico de garante, exige a concreta identificação da pessoa singular que corresponde ao sócio ou simpatizante que executou o ilícito disciplinar, não se podendo presumir a indicada qualidade de sócio ou simpatizante apenas com base na respectiva “localização” no Estádio e por naquela zona se envergarem “cachecóis, camisolas e bandeiras alusivas ao clube”, como se faz no Acórdão do TAD. Ou seja, não se aceita que possa ser imputado um ilícito disciplinar ao Clube apenas com a prova de que uma pessoa singular desconhecida, que executou materialmente a infracção - que estava a assistir ao jogo na zona dos sócios e adeptos do Clube, onde se envergavam “cachecóis, camisolas e bandeiras alusivas ao clube” - é necessária e obrigatoriamente um sócio ou um simpatizante do respectivo Clube. A punição do Clube pela violação do dever de garantir os comportamentos sociais e desportivamente correctos dos seus sócios e simpatizantes, exige a prova de que o executor material da infracção é sócio ou simpatizante do referido Clube e essa prova não pode ser feita por mera presunção, a partir de uma dada localização no Estádio e a existência de uma massa de pessoas que ostentam “cachecóis, camisolas e bandeiras alusivas ao clube”.
Estas razões já foram aduzidas nos Acs. do TCAS n.º 147/19.0BCLSB, de 30/01/2020, n.º 82/18.9BCLSB, de 21/11/2019, n.º 102/19.0BCLSB, de 21/11/2019, n.º 144/17.0BCLSB, de 21/11/2019, n. º 2/19.3BCLSB, de 07/11/2019, n.º 72/19.4BCLSB, de 07/11/2019, n.º 89/19.9BCLSB, de 07/11/2019, n.º 17/19.1BCLSB, de 10/10/2019, para as quais remeto.
Mais assinalo, que os factos aduzidos nas als. h) e i) do Acórdão do TAD, não se reconduzem uma realidade fáctica, mas são meras afirmações conclusivas e juízos de valor, que não podem ser atendidos enquanto realidades existentes, da vida. As afirmações contidas em tais segmentos do julgamento de facto incluem, também, desde logo, a solução da questão jurídica que se dirime nos presentes autos e que é o objecto do litígio ou thema decidendum, a saber, acerca do dever jurídico de vigilância e cuidado.
Portanto, considero que o vem vertido nesses pontos deve ser expurgado do julgamento de facto e dado por não escrito, pois não se reconduz a realidades da vida mas a conclusões e a juízos de valor, genéricos e conclusivos sobre que encerram matéria de Direito ou subsunções jurídicas.
Razões porque determinaria a revogação do segmento decisório do Ac. do TAD que condenou o F….. pela prática de quatro infracções disciplinares, p. e p. pelos artigos 186º, nº 2, 127º, nº 1 e 187º, alíneas a) e b) do RD. No mais, acompanha-se a decisão recorrida.”