Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2565/04.9BELSB-A
Secção:CT
Data do Acordão:05/07/2020
Relator:JORGE CORTÊS
Descritores:EXECUÇÃO DE JULGADO.
JUROS INDEMNIZATÓRIOS.
JUROS DE MORA.
IMPUTAÇÃO DE PAGAMENTO PARCIAIS.
Sumário:1. Constitui preterição do prazo de restituição oficiosa do imposto, com vista à outorga de juros indemnizatórios, a recusa de reembolso de IVA suportado indevidamente.
2. As taxas de juros aplicáveis à obrigação de pagamento de juros indemnizatórios são as que resultam do regime legal vigente à data da constituição da obrigação de pagamento de juros.
3. É admissível a atribuição cumulativa de juros indemnizatórios e de juros moratórios, calculados a uma taxa de juros redobrada, sobre a mesma quantia e relativamente ao mesmo período de tempo.
4. O regime de imputação de pagamentos parciais da Lei Geral Tributária é aplicável às dívidas da Administração Tributária para com os contribuintes, pagas em execução de julgado.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
Acórdão

I- Relatório

“T......................”, ao abrigo dos artigos 100.º n.º 1, da LGT e 170.º do CPTA requereu contra a Autoridade Tributária e Aduaneira (ATA) a execução da sentença proferida a 31 de Outubro de 2014, no âmbito da acção administrativa especial nº 2565/04.9BELRS, condenando o Ministério das Finanças na prática dos actos materiais de deferimento do pedido de reembolso de IVA apresentado a 22 de Maio de 1992 e pagamento de valores que aí se fixou. Após a ATA ter informado já ter sido feito o pagamento das verbas devidas, a exequente reitera a necessidade do pagamento dos montantes que permanecem em dívida, acrescido dos respectivos juros vencidos, até efectivo e integral pagamento e, caso se mantenha a sua falta, que a ordene por conta da dotação orçamental inscrita à ordem da dotação orçamental do CSTAF. O Tribunal Tributário de Lisboa, por sentença proferida a fls. 213 e ss. (numeração do processo em SITAF), datada de 06 de Abril de 2019, concedeu provimento parcial à execução condenando a Autoridade Executada a pagar à Exequente juros indemnizatórios calculados com base na taxa de juro de 15% ao ano, fixada na Portaria nº 339/87, de 24.04, no período de 01-12-1992 a 02-04-1993 (123 dias) e a pagar à Exequente as custas suportadas na acção administrativa, no valor total de €185.85.
Desta sentença foi interposto o presente recurso em cujas alegações de fls. 246 e ss. (numeração do processo em SITAF), a recorrente T......................, formulou as conclusões seguintes:
«A) Considera a Recorrente ter legitimidade para interpor o presente recurso nos termos do artigo 141.º, n.º 1, do CPTA, na medida em que do sentido decisório perfilhado pelo Douto Tribunal a quo resulta um prejuízo directo, efectivo, e actual para a sua esfera de EUR 157.702,54, por referência a 20 de Maio de 2019;
B) Delimita-se o objecto do presente recurso à análise das seguintes questões:
i.) Imprecisão da matéria de facto dada como provada no âmbito da sentença recorrida; // ii.) Incorrectas interpretação e aplicação do artigo 24.º do CPT e, bem assim, do artigo 22.º, n.º 8, do CIVA, na redacção do Decreto-Lei n.º 139/92, de 17 de Julho e, bem assim, do Decreto-Lei n.º 7/96, de 7 de Fevereiro; // iii.) Incorrectas interpretação e aplicação do regime ínsito no artigo 43.º, n.º 5, da LGT; // iv.) Incorrectas interpretação e aplicação do regime ínsito no artigo 40.º, n.º 4, da LGT;
C) Entende a Recorrente impor-se a modificação da matéria de facto constante da alínea K) do ponto II («Fundamentação – De facto»), fazendo constar o dia 12 de Fevereiro de 2018 como a data de emissão do cheque pela Administração Tributária;
D) O artigo 24.º, n.º 2, do CPT é uma norma especial face ao n.º 1 da mesma norma, motivo pelo qual é aplicável sempre que a situação em causa configure um atraso dos Serviços na restituição oficiosa de impostos por motivo que lhes seja imputável;
E) Conforme claramente resulta do sentido decisório perfilhado por esse Douto Tribunal a 31 de Outubro de 2014, a ora Exequente tem direito à percepção de juros indemnizatórios por não ter a Administração Tributária dado cumprimento ao regime previsto no artigo 6.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 408/87, de 31 de Dezembro, aplicando-se por isso, no que à contagem dos juros indemnizatórios concerne, e com as devidas adaptações, o regime ínsito no artigo 22.º, n.º 8, do CIVA, na redacção do Decreto-Lei n.º 139/92, de 17 de Julho: «Os juros [são] contados dia a dia pela taxa constante da portaria a que se refere o n.º 3 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 49.168, de 5 de Agosto de 1969, com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 318/80, de 20 de Agosto […]»;
F) Nos termos do artigo 5.º do referido diploma «A taxa de juros de mora é de 2%, se o pagamento se fizer dentro do mês de calendário em que se verificar o início da mora, aumentando de 2% em cada mês, ou fracção, se o pagamento se fizer posteriormente» [n.º 1]; «Sobre os juros de mora não recaem quaisquer adicionais, quer para o Estado quer para outras entidades» [n.º 2]; «A taxa de juros de mora poderá ser alterada por portaria do Ministro das Finanças e do Plano» [n.º 3];
G) Deste modo, ao contrário do que decidiu o Douto Tribunal a quo, no período compreendido entre 1 de Dezembro de 1992 e 11 de Fevereiro de 1996, a ora Exequente tem direito à percepção de juros indemnizatórios, computados à taxa anualizada de 24%, sobre o montante de EUR 209.378,81;
H) Dispõe ainda o artigo 22.º, n.º 8, do CIVA, na redacção do Decreto-Lei n.º 7/96, de 7 de Fevereiro, que os juros indemnizatórios passam a ser computados em conformidade com o artigo 24.º do CPT a partir de 12 de Fevereiro de 1996, pelo que, por força da remissão operada pelo artigo 24.º, n.º 3, do CPT para o regime dos juros compensatórios devidos a favor do Estado, os juros indemnizatórios passam a ser computados de acordo com o disposto no artigo 83.º, n.º 4, do CPT, e, por conseguinte, à taxa fixa «básica de desconto do Banco de Portugal […] acrescida de cinco pontos percentuais»;
I) Assim sendo, ao contrário do que decidiu o Douto Tribunal a quo, no período compreendido entre 12 de Fevereiro de 1996 e 31 de Dezembro de 1998, a ora Exequente tem direito à percepção de juros indemnizatórios, à taxa anual de 13,75%, sobre o montante de EUR 209.378,81.
J) Nestes termos, requer-se a esse Douto Tribunal ad quem que julgue totalmente procedente o presente recurso, revogando a decisão recorrida com fundamento em erro de julgamento por incorrecta aplicação do regime ínsito no artigo 24.º do CPT e, bem assim, do artigo 22.º, n.º 8, do CIVA, na redacção do Decreto-Lei n.º 139/92, de 17 de Julho e, bem assim, do Decreto-Lei n.º 7/96, de 7 de Fevereiro, tudo com as demais consequências legais;
K) Andou mal o Douto Tribunal a quo quando decidiu não haver lugar à atribuição cumulativa de juros indemnizatórios e moratórios entre o termo do prazo de execução voluntária da sentença e a data de restituição integral do imposto, nos termos do artigo 43.º, n.º 5, da LGT;
L) O direito à percepção de juros indemnizatórios previsto nos artigos 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º do CPPT constitui um mecanismo de reposição da legalidade violada, colocando a Recorrente na situação em que se encontraria caso não tivesse ocorrido tal violação, reflectindo por essa via um regime especial de efectivação da responsabilidade extracontratual do Estado prevista no artigo 22.º da CRP;
M) O direito ao pagamento de juros de mora previsto no artigo 43.º, n.º 5, da LGT constitui um regime excepcional, com evidente natureza sancionatória e compulsória, visando compelir a Administração Tributária a executar tempestivamente as decisões transitadas em julgado, o que é reclamado pelo direito à tutela jurisdicional efectiva previsto no artigo 20.º, n.ºs 1 e 4, da CRP;
N) Esta questão já foi aliás objecto de Acórdão de Uniformização de Jurisprudência proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo, a 7 de Junho de 2017, do qual resulta que «face ao preceituado no n.º 5 do art. 43.º da LGT, na redacção dada pela Lei 64-B/2011 de 30 de Dezembro, é admissível a atribuição cumulativa de juros indemnizatórios e de juros moratórios, calculados nos termos deste preceito legal, sobre a mesma quantia e relativamente ao mesmo período de tempo»;
O) Nestes termos, requer-se a esse Douto Tribunal ad quem que julgue totalmente procedente o presente recurso, revogando a decisão recorrida com fundamento em erro de julgamento por incorrecta aplicação do regime ínsito no artigo 43.º, n.º 5, da LGT, tudo com as demais consequências legais;
P) O regime ínsito no artigo 40.º, n.º 4, da LGT determina que os pagamentos parciais efectuados pela Administração Tributária devem ser primeira e sucessivamente imputados aos juros de mora, aos outros encargos legais – nos quais se incluem os juros indemnizatórios e as custas de parte – e só posteriormente ao capital – isto é, ao imposto;
Q) Ou seja, o artigo 40.º, n.º 4, da LGT aplica-se precisamente a situações como a dos presentes autos, em que a Administração Tributária efectua pagamentos parciais cujo montante global é insuficiente para cobrir a totalidade dos quantitativos legalmente devidos, sendo certo que, a entender-se diversamente, esta norma ficaria totalmente esvaziada de sentido, sendo insusceptível de qualquer aplicação prática;
R) Em face do exposto, e aplicado o artigo 40.º, n.º 4, da LGT, a 20 de Maio de 2019 permanece por pagar à Recorrente o montante total de EUR 168.286,21 (EUR 143.424,94 de imposto; EUR 17.599,65 de juros de mora; e EUR 7.261,62 de juros indemnizatórios);
S) Nestes termos, requer-se a esse Douto Tribunal ad quem que julgue totalmente procedente o presente recurso, revogando a decisão recorrida com fundamento em erro de julgamento por não ter aplicado o regime ínsito no artigo 40.º, n.º 4, da LGT, para efeitos de imputação dos pagamentos parciais efectuados pela Administração Tributária, tudo com as demais consequências legais, nomeadamente a condenação da Administração Tributária no pagamento dos quantitativos supra discriminados.
Nestes termos e nos demais de Direito que doutamente se suprirão, requer-se a esse Douto Tribunal ad quem que conceda provimento ao presente recurso, considerando: // i.) Ter a Recorrente legitimidade processual para a sua interposição nos termos do artigo 141.º, n.º 1, do CPTA; // ii.) Enfermar a sentença recorrida de erro de julgamento com fundamento na imprecisão da matéria de facto dada como provada no âmbito da sentença recorrida e, bem assim, na incorrecta interpretação e aplicação (i) do artigo 24.º do CPT e, bem assim, do artigo 22.º, n.º 8, do CIVA, na redacção do Decreto-Lei n.º 139/92, de 17 de Julho e, bem assim, do Decreto-Lei n.º 7/96, de 7 de Fevereiro, (ii) do regime ínsito no artigo 43.º, n.º 5, da LGT, e (iii) do regime ínsito no artigo 40.º, n.º 4, da LGT. // Em consequência, requer-se a esse Douto Tribunal ad quem que condene a Administração Tributária no pagamento à Recorrente de: // i.) Imposto, no montante de EUR 143.424,94; // ii.) Juros indemnizatórios, no montante de EUR 7.261,62, vencidos até 20 de Maio de 2019; // iii.) Juros de mora, no montante de EUR 17.599,65, vencidos até 20 de Maio de 2019 e, bem assim, de // iv.) Juros indemnizatórios e de mora vincendos até integral restituição dos quantitativos legalmente devidos, tudo com as demais consequências legais. // Na medida da procedência do presente recurso, requer-se a esse Douto Tribunal ad quem que condene a Fazenda Pública no pagamento de custas judiciais, tudo com as demais consequências legais.»
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A recorrida Fazenda Pública, devidamente notificada para o efeito, contra-alegou, expendendo conclusivamente o seguinte:
«I. Apesar de a Recorrente considerar que a douta sentença proferida padece de vícios como sejam a imprecisão da matéria de facto dada como provada, ou incorrecta interpretação e aplicação de diferentes normas da LGT, do CPT e do Código do IVA,
II. entende a Recorrida que, salvo o devido respeito, e após a leitura das observações de direito constantes da sentença, sobressai evidente que andou bem o Tribunal a quo ao decidir como decidiu.
III. No que diz respeito à alegação de que o cheque no montante de € 79.509,50 foi emitido mais tarde do que a data indicada pela AT, e dada como provada na sentença recorrida, pode facilmente comprovar-se pelo doc.2 junto aos autos com o requerimento de Dezembro de 2018, que os serviços da AT procederam ao pedido para emissão do valor a 05.02.2018, sendo esta a data a considerar como aquela a que corresponde a emissão da nota de crédito, para efeitos do disposto no artigo 61º do CPPT.
IV. Atenta a natureza de não residente da entidade Recorrente, o pagamento apenas pode ser concretizado por cheque passado pelo Instituto de Gestão do Crédito Público, entidade distinta da AT, pelo que, sob pena de nunca se conseguir apurar efectivamente qual a data que constitui o terminus do prazo para efeitos de cálculo de juros, a data relevante apenas poderá ser aquela em que a AT emite a autorização para pagamento ao contribuinte.
V. Por outro lado, também não estamos perante uma situação de restituição oficiosa de tributos, como pretende a Recorrente, pois esses casos reconduzem-se àqueles em que a AT, independentemente de qualquer pedido formulado pelo contribuinte, devolve o imposto que foi entregue em excesso, após ter sido feito o cálculo da diferença entre os adiantamentos de imposto e o valor efectivamente devido.
VI. Uma vez que no caso em apreço está apenas um pedido de devolução de IVA, realizado pelo contribuinte, o qual foi erradamente apreciado pela AT, estamos perante uma situação de erro imputável aos serviços, como bem entendeu a sentença recorrida, a qual se subsume no nº1 do artigo 24º do CPT, aplicável à data dos factos.
VII. No que concerne a alegação de que não foi feita a imputação das diferentes parcelas relativamente aos pagamentos parciais que lhe foram sendo feitos, tendo por base legal o disposto no artigo 40º nº4 da LGT, resulta claro o contrário da Informação que ora se junta como documento nº3.
VIII. Quanto à inclusão do valor alegadamente em falta, relativo a custas de parte, nas diferentes rubricas indicadas no artigo 40º nº4 da LGT, sempre se dirá não ser este o meio próprio para se ver ressarcido daquele montante.
IX. Com efeito, as custas de parte são uma despesa que deve ser suportada pela parte vencida, mas que não está abrangida pelo conceito de “encargos legais”, uma vez que estes são os encargos do processo e não os da parte, pelo que é destituída de fundamento a inclusão daquele montante na rubrica de “encargos legais” a imputar aos pagamentos parciais já efectuados. // Pelo que, nestes termos e nos mais de Direito, que V.ªs Exas. doutamente suprirão, deve a presente acção ser julgada totalmente improcedente, como é de Direito e Justiça mantendo na ordem jurídica a decisão do Tribunal a quo
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A Digna Magistrada do M. P. junto deste Tribunal, notificada para o efeito, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir, considerando que a tal nada obsta.
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II- Fundamentação.
2.1. De Facto.
A sentença recorrida considerou provados os factos seguintes.
A) Em 27-10-2004 a T...................... (ora exequente) intentou acção administrativa especial de condenação á prática de acto administrativo devido, que correu termos no TT de Lisboa, sob o nº 2565/04.9BELRS e que, por sentença de 31-10-2014 foi julgada procedente constando do dispositivo (doc nº 1 e 2, da pi de execução):
“(…) julgo procedente a presente acção administrativa especial e, em consequência, condeno o Réu a apreciar afirmativamente o requerimento da Autora, relativamente ao reembolso do IVA suportado em Portugal e constante da factura n.º 901232, emitida pela T...................... SA., em 30/04/1992, deferindo tal pedido, com todas as legais consequências.
Condeno o R. pelo pagamento das custas (art.º 527.º do actual CPC aplicável ex vi art. 1.º do CPTA e art .5.º n.º 1 da Lei 41/2013 de 26/06). // (…)”.
B) Consta da fundamentação da sentença, nomeadamente (doc nº 2, da pi de execução):
A situação sub judice apresenta-nos uma situação fáctica consensual no que respeita à verificação dos pressupostos de que depende o reembolso o IVA, já que não se questiona que, à data, a Autora seja uma sociedade de direito Inglês, com sede em Inglaterra (England), sem estabelecimento em território nacional e que tenha prestado serviços de intermediação de fornecimento de informação em serviços de reservas de viagens.
Situação que, de resto, se encontra documentada nos autos.
Na verdade, decorre do probatório que em 30/04/1992, foi emitida, pela T......................SA., à Autora (G..............), uma fatura referente a IVA não considerado em facturas anteriores com respeito a serviços de intermediação de fornecimento de informação em serviços de reservas de viagens, em Portugal.
E que em 22/05/1992 a Autora dirigiu ao Serviço de Administração do IVA, em impresso próprio (Mod. N.º 278 – Exclusivo da INCM, E.P) um pedido de reembolso do IVA.
Materialidade que encontra confirmação na informação subjacente ao despacho de que se recorre e que aqui se transcreve:
“Quanto ao terceiro pedido, no montante de 209 378,80 (41 976 682$00), o mesmo respeita a facturas emitidas entre 30.11.1991 e 23.03.1992, emissão essa confirmada pelos Serviços de Fiscalização Tributária, os quais não puseram igualmente em causa ter a mesma ocorrido dentro do prazo legal. Sendo assim, uma vez que o pedido de reembolso se verificou em 05.06.1992, o mesmo foi formulado dentro do prazo estabelecido no n.º 4 do art. 4.º do decreto-lei n.º 408/87, afigurando-se reunidas as condições para o deferimento.”
Aqui chegados e ao arrepio do que foi decidido pelo Diretor Geral dos Impostos, forçoso se torna concluir pela no sentido de se verificarem reunidos os pressupostos que conduzem ao deferimento do reembolso requerido.
Nota final:
Acresce referir que a decisão administrativa proferida se encontra em perfeita contradição com o que vem informado e não apresenta a devida fundamentação ou justificação quanto ao seu conteúdo.
Na verdade o despacho proferido pelo Diretor Geral dos Impostos, aqui contestado, estende de forma genérica „a impossibilidade de realizar verificações contabilísticas e a existência de facturas que evidenciam NIF’s errados e falta de discriminação de quantidades e valores‟, a tudo o que vem informado, sem cuidar de especificar ou individualizar os casos concretos que ali discriminadamente foram observados, sendo certo que, como supra ficou esclarecido, no que à situação em apreço diz respeito, a própria informação dos serviços vai no sentido do deferimento pela verificação dos pressuposto de que o mesmo depende, sem pôr em causa nenhum dos elementos da factura, até porque ela existe e consta dos autos.
C) Resulta ainda da decisão proferida na acção administrativa especial que o pedido de reembolso do IVA foi formulado em 22-05-1992 (facto assente em 5);
D) A exequente pagou, em 25-10-2004, a quantia de 89,00 a título de custas (doc nº 3, da pi de execução e consulta no SITAF da acção identificada em A);
E) Em 10-11-2014 foi a sentença proferida na acção administrativa especial, identificada em A) notificada à ora exequente;
F) Em 15-12-2014 a exequente apresentou nota discriminativa e justificativa das custas de parte onde peticiona o montante de €185,85 (doc nº 3, da pi de execução);
G) Em 03-02-2015 a sentença proferida na acção administrativa especial identificada em A), transitou em julgado, conforme certidão constante do SITAF;
H) Em 28-09-2015 foi emitido o cheque nº…………, no valor de €209.378,81 (fls 106, dos autos);
I) Em 09-11-2018, foi emitido o cheque n.º…………., no montante de €249.200,18 (fls. 107 dos autos).
J) Em 09.11.2018, foi emitido o cheque n.º…………, no montante de €12.187,32 (fls. 108 dos autos).
K) Em 05.02.2018, foi emitido o cheque n.º………., no montante de €79.509,50.
L) As taxas dos juros indemnizatórios foram apuradas do seguinte modo:

*- dia que corresponde ao dia seguinte àquele que o A indica na pi da acção administrativa especial não contrariada pela AT.
M) Os juros moratórios foram calculados entre o período de 06-03-2015 (dia seguinte ao termo do prazo de execução espontânea) e 15-09-2015 (data da emissão da nota de crédito, nos termos do aviso 130/2015, de 07-01 (209.378,81 x 194 x 10.952% /365= 12.188,07).»
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Ao abrigo do disposto no artigo 662.º, n.º 1, do CPC, adita-se a seguinte matéria de facto:
N) Em 05.02.2018, a Direcção de Serviços de Reembolsos da DGI emitiu informação na qual reconhece a existência de montantes em dívida à exequente – doc. 3 junto com as contra-alegações.
O) A nota discriminativa e justificativa das custas de parte não foi objecto de reclamação por parte da notificada.
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2.2. De Direito
2.2.1. Nos presentes autos, é sindicada a sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que, no apenso de execução do julgado obtido na acção administrativa especial, que correu termos com o n.º 2656/04.9BELSB, decidiu condenar a executada a pagar à exequente o seguinte:
a) juros indemnizatórios, calculados com base na taxa de juro de 15% ao ano, fixada na Portaria n.º 339/87, de 24.04, no período de 01.12.1992 a 02.04.1993 (123 dias).
b) custas judiciais suportadas na acção administrativa, no valor de €185,85.
O pedido formulado pela exequente é o seguinte:
i) Dar execução à sentença proferida por esse Tribunal, em 31.10.2014, no âmbito da acção administrativa especial n.º 2565/04.9BELSB, condenando o Ministério das Finanças aos actos materiais de deferimento do pedido de reembolso de IVA apresentado em 22.05.1992 e, consequentemente, ao pagamento à exequente de:
a) €209.378,81, a título de imposto cujo reembolso foi ilegalmente recusado;
b) €411.063, a título de juros indemnizatórios vencidos e, bem assim, dos juros indemnizatórios vincendos, até integral restituição do imposto acima referido, nos termos dos artigos 6.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 408/87, de 31 de Dezembro, 22.º, n.º 8 do CIVA, nas redacções dos Decretos-Lei n.º 139/92, de 17 de Junho, 7/96, de 7 de Fevereiro, e 472/99, de 8 de Novembro; e 43.º n.º 3, alínea a) e 4 da LGT.
c) €10.366,14, a título de juros de mora vencidos e, bem assim, dos juros de mora vincendos até integral pagamento do montante de €209.378,81, nos termos dos artigos 43.º, n.º 5, 102, n.º2, da LGT e do Aviso n.º 130/2015, de 7 de Janeiro.
2.2.2. A presente intenção recursória centra-se sobre os seguintes erros de julgamento em que terá incorrido a sentença recorrida:
i) Incorrecção quanto à fixação da matéria de facto [conclusão C)].
ii) Erro de julgamento quanto à aplicação do regime regulador da obrigação de pagamento de juros indemnizatórios.
iii) Erro na aplicação do disposto no preceito do artigo 43.º/5, da LGT.
iv) Erro na aplicação do regime ínsito no artigo 40.º/4, da LGT.
2.2.3. No que respeita ao erro de julgamento quanto à fixação da matéria de facto, a recorrente considera que a data da emissão do cheque corresponde a 12.02.2018, pelo que existe incorrecção na alínea k), do probatório.
Por seu turno, a recorrida alega que a data inscrita no probatório é a correcta, dado que corresponde à data da emissão da nota de crédito.
Compulsados os autos, verifica-se que assiste razão à recorrente, dado que a data que releva é a data da emissão do cheque. Pelo que se impõe rectificar o probatório em conformidade, no local próprio.
A alínea K), passa a ter a redacção seguinte:
«Em 12.02.2018, foi emitido o cheque n.º………….., no montante de €79.508,75».
Termos em que se julga procedente a presente imputação.
2.2.4. No que respeita ao esteio de recurso referido em ii), a recorrente invoca que a sentença incorreu em erro, porquanto, no período compreendido entre 1 de Dezembro de 1992 e 11 de Fevereiro de 1996, a ora Exequente tem direito à percepção de juros indemnizatórios, computados à taxa anualizada de 24%, sobre o montante de EUR 209.378,81; e que, no período compreendido entre 12 de Fevereiro de 1996 e 31 de Dezembro de 1998, a ora Exequente tem direito à percepção de juros indemnizatórios, à taxa anual de 13,75%, sobre o montante de EUR 209.378,81.
A este propósito, escreveu-se, em síntese, na sentença recorrida o seguinte:
«No caso estamos perante erro imputável aos serviços, não tendo aqui aplicação as taxas invocadas pela exequente que respeitam às situações previstas no nº 2 da norma [do artigo 24.º do CPT] que têm a ver com as situações de atraso na restituição oficiosa dos impostos, que não é o caso».
Apreciação. A questão que se suscita consiste em saber qual o regime jurídico a ter em conta com vista à determinação da obrigação de juros indemnizatórios a aplicar ao caso em apreço.
Está em causa acção de execução de julgado relativo a sentença que, na acção de condenação à prática de acto administrativo devido, intentada pela ora exequente, «julgo[u] procedente a presente acção administrativa especial e, em consequência, condeno[u] o Réu a apreciar afirmativamente o requerimento da Autora, relativamente ao reembolso do IVA suportado em Portugal e constante da factura n.º 901232, emitida pela T...................... SA., em 30/04/1992, deferindo tal pedido, com todas as legais consequências»(1).
A execução das sentenças dos tribunais tributários e aduaneiros segue o regime previsto para a execução das sentenças dos tribunais administrativos (artigo 102.º, n.º 1, da LGT). Atendendo ao dispositivo e à fundamentação da sentença(2), verifica-se que a mesma condenou a executada no deferimento e pagamento do pedido de reembolso do IVA suportado, no montante de €209.378,80. Quando uma sentença não fixa prazo específico, as sentenças que condenem a Administração ao pagamento de quantia certa devem ser executadas pela própria Administração, no máximo, no prazo de 30 dias (artigo 170.º/1, do CPTA).
Os reembolsos devidos do imposto devem «ser efectuados pelo Serviço de Administração do IVA até ao fim do sexto mês seguinte ao da apresentação do pedido (artigo 6.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 408/87, de 31 de Dezembro, que estabelece o regime do reembolso do IVA). A inobservância do prazo de restituição de imposto suportado em excesso - prazo de reembolso do imposto - (também previsto no preceito do artigo 22.º, n.º 8, do CIVA(3)), configura uma situação de preterição do prazo de restituição oficiosa do imposto, cujo regime, no que se reporta aos juros indemnizatórios, decorre do disposto no artigo 24.º, n.º 2, do CPT e do disposto no artigo 43.º/3/a), da LGT. Por imposição do preceito do artigo 24.º, n.º 2, do CPT, há «direito aos juros indemnizatórios quando, por motivo imputável aos serviços, não seja cumprido o prazo legal da restituição oficiosa dos impostos». No mesmo sentido depõe o disposto no artigo 43.º/3/a), da LGT(4).
No caso em exame, o reembolso do montante de €209.378, 51 é devido até ao fim do sexto mês seguinte ao da apresentação do pedido de reembolso, ou seja, seis meses após 22.05.1992 (alínea B), do probatório), pelo que o mesmo é devido até à data de 22.11.1992. Ao não proceder à devolução do montante em causa à contribuinte, a partir desta data, a AT originou a constituição na esfera jurídica daquela do direito a juros indemnizatórios, sobre a quantia em referência, desde 23.11.1992, dado que não observou o prazo de restituição oficiosa do imposto em causa. Em face do exposto, assiste à exequente direito a juros indemnizatórios, sobre a quantia em causa, desde 23.11.1992, até à devolução da mesma. Dos normativos legais referidos extrai-se a obrigação da executada de pagamento à exequente de juros indemnizatórios, incidentes sobre o montante de €209.378, 51 (imposto a devolver), a partir da data em que o montante devido está em falta [23.11.1992], ou seja, calculados a partir de 23.11.1992 até à data do seu efectivo pagamento à contribuinte [28.09.2015(5)]. Seja do disposto no artigo 24.º, n.º 2, do CPT, seja do disposto no artigo 43.º/3/a), da LGT, decorre a necessidade do pagamento de juros indemnizatórios nos casos de falta de cumprimento do prazo de restituição oficiosa dos impostos, como sucede no caso em exame. Havendo sucessão de regimes legais (artigo 24.º/2, do Código de Processo Tributário(6) e artigo 43.º/3/a), da LGT(7)) sobre a constituição da obrigação de pagamento de juros indemnizatórios, importa determinar qual o regime aplicável ao caso em exame. A este propósito, cumpre referir que «[a] consequência jurídica da atribuição do direito a juros indemnizatórios não representa uma nova valoração do facto ilícito, gerador da obrigação de indemnizar, pois os efeitos desse facto continuam a ser definidos pelas leis constitucional e civil vigentes no momento em que ele ocorreu, isto é, a obrigação de indemnizar todos os danos com ele conexionados, numa relação de causalidade adequada. O que se estabelece é apenas uma nova forma de determinar o valor desses danos, baseado numa presunção de que o prejuízo resultante da indisponibilidade da quantia paga coincide com o montante legal dos juros. Sendo assim, regulando aquele art.º 43.º da LGT o conteúdo da obrigação de indemnização abstraindo do facto que lhe deu origem (não atribuindo novos efeitos a tal facto) ela será de aplicação imediata às relações jurídicas já constituídas, subsistentes à data da sua entrada em vigor, nos termos da parte final do n.º 2 do artigo 12.º»(8).
Pelo que o regime da presente obrigação de pagamento de juros indemnizatórios decorre do disposto no artigo 43.º/3/a), da LGT, ou seja, a obrigação de pagamento de juros em causa, vencida desde a data de 23.11.1992 até à data do pagamento do reembolso à contribuinte [28.09.2015(9)], rege-se pelo disposto no artigo 43.º/3/a), da LGT.
Sem embargo, no que respeita ao cômputo dos juros indemnizatórios, cumpre referir que, na tese da recorrente, a mesma «tem direito à percepção de juros indemnizatórios por não ter a Administração Tributária dado cumprimento ao regime previsto no artigo 6.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 408/87, de 31 de Dezembro, aplicando-se por isso, no que à contagem dos juros indemnizatórios concerne, e com as devidas adaptações, o regime ínsito no artigo 22.º, n.º 8, do CIVA, na redacção do Decreto-Lei n.º 139/92, de 17 de Julho: «Os juros [são] contados dia a dia pela taxa constante da portaria a que se refere o n.º 3 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 49.168, de 5 de Agosto de 1969, com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 318/80, de 20 de Agosto […]».
Apreciação. «Se o facto tributário for de formação sucessiva, a lei nova só se aplica ao período decorrido a partir da sua entrada em vigor»(10). Na falta de norma como a do artigo 83.º/4, do CPT, que fixava uma taxa de juro fixa para todo o período em que vigorava a obrigação de juros, importa aplicar as várias taxas de juros vigentes ao longo do período de referência da obrigação indemnizatória(11). No caso, há que ter em conta o disposto no artigo 22.º, n.º 8, do CIVA (versão conferida pelo Decreto-Lei n.º 139/92, de 17 de Julho), que determinava que «[uma vez decorrido o prazo de reembolso] acrescerão à quantia a restituir juros contados dia a dia pela taxa constante da portaria a que se refere o n.º 3 do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 49168, de 5 de Agosto de 1969, com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 318/80, de 20 de Agosto, desde o termo do prazo para o pagamento do reembolso até à data da emissão do respectivo meio de pagamento ou da efectivação da competente transferência bancária, quando o atraso for imputável à administração fiscal». Por seu turno, o artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 49168, de 5 de Agosto de 1969 (versão conferida pelo Decreto-lei n.º 118/80, de 20 de Agosto), determinava o seguinte:
«1 - A taxa de juros de mora é de 2%, se o pagamento se fizer dentro do mês do calendário em que se verificar o início da mora, aumentando de 2% em cada mês, ou fracção, se o pagamento se fizer posteriormente.
2 - Sobre os juros de mora não recaem quaisquer adicionais, quer para o Estado quer para outras entidades.
3 - A taxa de juros de mora poderá ser alterada por portaria do Ministro das Finanças e do Plano».
A partir de 12.02.1996, o artigo 22.º/8, do CIVA (versão conferida pelo Decreto-Lei n.º 7/96, de 7 de Fevereiro), determinava que «[uma vez decorrido o prazo de reembolso] poderão os sujeitos passivos solicitar a liquidação de juros indemnizatórios nos termos do artigo 24.º do Código de Processo Tributário. Por seu turno, estatuía o artigo 24.º/3, do CPT: «O montante dos juros referidos no número anterior será calculado, para cada imposto, nos termos dos juros compensatórios devidos a favor do Estado, de acordo com as leis tributárias». «A taxa de juros compensatórios corresponde à taxa básica de desconto do Banco de Portugal em vigor na data em que se tiver iniciado o retardamento da liquidação, da entrega do imposto retido, ou do que deveria ter sido ou da entrega do imposto que autonomamente deva ser liquidado e entregue nos cofres do Estado, acrescido de cinco pontos percentuais»(12).
Assim, no período compreendido entre 01.12.1992 e 11.02.1996, a exequente tem direito a juros indemnizatórios, computados à taxa de juros a que se refere o disposto no artigo 5.º/3, do Decreto-Lei n.º 49168, de 5 de Agosto de 1969 (versão conferida pelo Decreto-lei n.º 118/80, de 20 de Agosto).
No período entre 12.02.1996 e 31.12.1998, a exequente tem direito a juros indemnizatórios fixados à taxa fixa básica de desconto do Banco de Portugal, acrescida de cinco pontos percentuais (artigo 83.º/5, do CPT, ex vi artigo 24.º/3, do CPT, ex vi artigo 22.º/8, do CIVA (versão conferida pelo Decreto-Lei n.º 7/96, de 7 de Fevereiro).
A partir de 01.01.1999, entrou em vigor a LGT, pelo que o regime de cômputo dos juros indemnizatórios decorre do disposto no artigo 43.º, n.º 4 da LGT. Assim, «[a] taxa dos juros indemnizatórios é igual à taxa dos juros compensatórios»(13). A partir desta data a taxa de juros indemnizatórios é a que decorre do disposto no artigo 559.º, n.º 1, do Código Civil(14), ou seja, a taxa de juro é que decorre do regime legal fixado através de portaria. Em síntese, a partir de 01.01.1999, a exequente tem direito a juros indemnizatórios fixados à taxa de juro legal, calculada nos termos do artigo 559.º/1, do CC, até à data da restituição do imposto objecto do pedido de reembolso, ou seja, até 28.09.2015.
Do exposto resulta que assiste razão à recorrente quando afirma que existe erro no cômputo das taxas de juros aplicáveis à obrigação de pagamento de juros indemnizatórios, as quais são as que resultam do regime legal supra referido. Pelo que se impõe proferir decisão dando cumprimento ao referido.
Ao julgar em sentido discrepante, a sentença recorrida incorreu em erro, pelo que não se pode manter nesta parte.
Termos em que se julgam procedentes as presentes conclusões de recurso.
2.2.5. No que respeita ao erro de julgamento, quanto à questão da cumulação dos juros indemnizatórios com os juros de mora, a recorrente assaca à sentença recorrida erro de julgamento, porquanto a mesma seguiu entendimento erróneo de que não havia lugar a aplicação cumulativa de juros de mora (previstos no artigo 43.º, n.º 5, da LGT), com juros indemnizatórios.
Apreciação. Está em causa a aplicação ao caso do disposto no artigo 43.º/5, da LGT, o qual estabelece que, «[n]o período que decorre entre a data do termo do prazo de execução espontânea de decisão judicial transitada em julgado e a data da emissão da nota de crédito, relativamente ao imposto que deveria ter sido restituído por decisão judicial transitada em julgado, são devidos juros de mora a uma taxa equivalente ao dobro da taxa dos juros de mora definida na lei geral para as dívidas ao Estado e outras entidades públicas». A este propósito, o STA, através do Acórdão do Pleno da Secção Tributária, de 07.06.2017, P. 0279/17 fixou o entendimento de que «[f]ace ao preceituado no n.º 5 do art. 43.º da LGT, na redacção dada pela Lei 64-B/2011 de 30 de Dezembro, é admissível a atribuição cumulativa de juros indemnizatórios e de juros moratórios, calculados nos termos deste preceito legal, sobre a mesma quantia e relativamente ao mesmo período de tempo». A presente norma deve ser aplicada ao caso em exame.
A sentença exequenda transitou em julgado em 03.02.2015 (alínea G), do probatório). «…[A]s sentenças dos tribunais administrativos que condenem a Administração ao pagamento de quantia certa devem ser espontaneamente executadas pela própria Administração, no prazo máximo de 30 dias» (artigo 170.º/1, do CPTA, versão resultante da Lei n.º 15/2002, de 22 de Fevereiro). A sua contagem é realizada com base no disposto no artigo 72.º do CPA, ou seja, o prazo suspende-se nos sábados, domingos e feriados. Iniciando-se em 04.02.2015, terminava em 17.03.2015. Pelo que são devidos juros de mora, à taxa agravada, prevista no artigo 43.º, n.º 5, da LGT, desde 18.03.2015 até à data do efectivo pagamento à contribuinte da quantia em causa, ou seja até 28.09.2015(15).
Ao julgar em sentido discrepante, a sentença recorrida incorreu em erro, pelo que não se pode manter nesta parte.
Termos em que se julgam procedentes as presentes conclusões de recurso.
2.2.6. No que respeita ao erro de julgamento, quanto à aplicação do regime previsto no artigo 40.º/4, da LGT. A recorrente invoca que «[o] regime ínsito no artigo 40.º, n.º 4, da LGT determina que os pagamentos parciais efectuados pela Administração Tributária devem ser primeira e sucessivamente imputados aos juros de mora, aos outros encargos legais – nos quais se incluem os juros indemnizatórios e as custas de parte – e só posteriormente ao capital – isto é, ao imposto»; que «o artigo 40.º, n.º 4, da LGT aplica-se precisamente a situações como a dos presentes autos, em que a Administração Tributária efectua pagamentos parciais cujo montante global é insuficiente para cobrir a totalidade dos quantitativos legalmente devidos, sendo certo que, a entender-se diversamente, esta norma ficaria totalmente esvaziada de sentido, sendo insusceptível de qualquer aplicação prática».
Apreciação.
Dispõe o artigo 40.º, n. 4, da LGT, que «[e]m caso de o montante a pagar ser inferior ao devido, o pagamento é sucessivamente imputado pela seguinte ordem a: // a) Juros moratórios; // b) Outros encargos legais; // c) Dívida tributária, incluindo juros compensatórios; //d) Coimas». A este propósito, o STA teve ocasião de sublinhar que «[o] regime de imputação de pagamentos previsto no art. 40.º, n.º 4, da Lei Geral Tributária é aplicável às dívidas da administração tributária para com os contribuintes, pagas em execução de julgado». O STA esclarece que «… sendo relevante a ordem de imputação dos pagamentos para determinar os direitos dos contribuintes (…), não será aceitável uma interpretação no sentido de que os pagamentos insuficientes que a administração tributária efectuar são imputáveis nos créditos do contribuinte pela forma que a administração tributária entender. Por outro lado, não seria compreensível uma solução deste tipo, num contexto de um diploma, como é a LGT, que visou promover «uma maior justiça fiscal entre a Administração e os contribuintes», particularmente em matéria do regime de juros a favor da administração tributária e dos contribuintes (…). // Assim, a solução mais razoável, que se tem de presumir ter sido legislativamente adoptada (art. 9.º, n.º 3, do Código Civil), é a de que naquele n.º 4 do art. 40.º da LGT se regulou, de forma igualitária e justa, o regime de imputação de pagamentos insuficientes tanto das dívidas do contribuinte para com a administração tributária como as desta para com os contribuintes».
A recorrente argumenta que «aplicando o artigo 40.º, n.º 4, da LGT, a 20 de Maio de 2019 permanece por pagar à Recorrente o montante total de EUR 168.286,21 (EUR 143.424,94 de imposto; EUR 17.599,65 de juros de mora; e EUR 7.261,62 de juros indemnizatórios)».
Vejamos. As partes não dissidem sobre a ocorrência in casu de pagamento parcial pela executada da dívida exequenda (alínea N), do probatório).
A regra de imputação do pagamento parcial que se extrai do n.º 4 do artigo 40.º da LGT é a seguinte(16):
1) Em primeiro lugar no pagamento dos juros de mora.
2) Em segundo lugar no pagamento de outros encargos legais, como é o caso das custas processuais.
3) Em terceiro lugar na própria dívida tributária.
4) Por último no pagamento das coimas.
Cumpre referir que o pagamento das custas de parte é objecto de reclamação nos termos dos preceitos dos artigos 30.º a 33.º do regime que regula a elaboração, contabilização, liquidação, pagamento, processamento e destino das custas processuais, multas e outras penalidades, aprovado pela Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de Abril. No entanto, no caso em apreço, a nota discriminativa e justificativa foi remetida à contraparte em 15.12.2014(17), sem que tenha havido reclamação da mesma(18), pelo que se formou título executivo, no que respeita às custas de parte peticionadas, cujo pedido é deduzido, em cumulação com os demais, na presente execução.
Quanto ao mais, cabe referir que do probatório resulta que a executada realizou vários pagamentos à exequente(19), verificando-se, no entanto, que a dívida em execução não se mostra totalmente paga(20). Em face do exposto, impõe-se determinar à executada o pagamento das quantias em dívida, observando-se a regra de imputação do artigo 40.º, n.º 4, da LGT.
Ao julgar em sentido discrepante, a sentença recorrida não se pode manter, pelo que deve ser substituída por decisão que proceda em conformidade.
Termos em que se julga procedentes as presentes conclusões de recurso.
Dispositivo
Face ao exposto, acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida e condenar a executada no seguinte:
a) No pagamento à exequente dos juros indemnizatórios, no período compreendido entre 01.12.1992 e 11.02.1996, computados à taxa de juros a que se refere o disposto no artigo 5.º/3, do Decreto-Lei n.º 49168, de 5 de Agosto de 1969 (versão conferida pelo Decreto-lei n.º 118/80, de 20 de Agosto).
b) No pagamento à exequente dos juros indemnizatórios, no período entre 12.02.1996 e 31.12.1998, à taxa fixa básica de desconto do Banco de Portugal, acrescida de cinco pontos percentuais (artigo 83.º/5, do CPT, ex vi artigo 24.º/3, do CPT, ex vi artigo 22.º/8, do CIVA (versão conferida pelo Decreto-Lei n.º 7/96, de 7 de Fevereiro).
c) No pagamento à exequente de juros indemnizatórios, a partir de 01.01.1999, à taxa de juro legal, calculada nos termos do artigo 559.º/1, do CC, até à data da restituição do imposto objecto do pedido de reembolso, ou seja, até 28.09.2015.
d) No pagamento à exequente dos juros de mora, à taxa agravada, prevista no artigo 43.º, n.º 5, da LGT, desde 18.03.2015 até à data do efectivo pagamento à contribuinte da quantia em causa, ou seja, até 28.09.2015.
e) No pagamento à exequente das quantias em dívida, observando a regra de imputação do artigo 40.º, n.º 4, da LGT.

Custas pela recorrida.
Registe.
Notifique.
(Jorge Cortês - Relator)

(1ª. Adjunta)
(2ª. Adjunta)


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(1) Alínea A) do probatório.
(2) Alíneas A) e B), do probatório.
(3) Preceito que estabelece que «[findo o prazo de reembolso], poderão os sujeitos passivos solicitar a liquidação de juros indemnizatórios nos termos do artigo 43.º da Lei Geral Tributária».
(4) «São também devidos juros indemnizatórios nas seguintes circunstâncias: // a) Quando não seja cumprido o prazo legal de restituição oficiosa dos tributos»;
(5) Alínea h), do probatório.
(6) «Haverá também direito aos juros indemnizatórios quando, por motivo imputável aos serviços, não seja cumprido o prazo legal da restituição oficiosa dos impostos».
(7) «São também devidos juros indemnizatórios nas seguintes circunstâncias: // Quando não seja cumprido o prazo legal de restituição oficiosa dos tributos».
(8) Jorge Lopes de Sousa, Sobre a responsabilidade tributária por actos ilegais, Áreas Editora, 2010, p. 77.
(9) Alínea h), do probatório.
(10) Artigo 12.º, n.º 2 da LGT.
(11) Neste sentido, V. Jorge Lopes de Sousa, Sobre a responsabilidade tributária por actos ilegais, Áreas Editora, 2010, p. 77/78.
(12) Artigo 83.º, n.º 5, do CPT (versão conferida pelo Decreto-Lei n.º 7/96, de 7 de Fevereiro).
(13) Artigo 43.º, n.º 4, da LGT.
(14)«Os juros legais e os estipulados sem determinação de taxa ou quantitativo são os fixados em portaria conjunta dos Ministros da Justiça e das Finanças e do Plano».
(15) Alínea H), do probatório.
(16) V. J. M. Fernandes Pires, LGT, anotada, 2015, p. 338.
(17) Alínea F), do probatório.
(18) Alínea O), do probatório.
(19) Alíneas H) a K), do probatório.
(20) Alínea N) do probatório.