Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:429/17.5BEALM
Secção:CT
Data do Acordão:01/25/2018
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:REGIME DE ANULAÇÃO DA VENDA EM PROCESSO TRIBUTÁRIO.
ARTº.257, Nº.1, AL.A), DO C.P.P.T.
ERRO SOBRE O OBJECTO TRANSMITIDO OU SOBRE AS SUAS QUALIDADES.
ERRO SOBRE O OBJECTO DO NEGÓCIO (ERRO-VÍCIO). ARTº.251, DO C.CIVIL.
ERRO ESSENCIAL E INCIDENTAL.
REGIME DE ANULAÇÃO DE VENDA PREVISTO NO EXAMINADO ARTº.257, Nº.1, AL.A), DO C.P.P.T.
SÓ RELEVA O ERRO QUE DERIVA DE UMA SITUAÇÃO EM QUE O COMPRADOR TERÁ SIDO ENGANADO PELO CONTEÚDO DOS MEIOS DE PUBLICITAÇÃO DA VENDA.
Sumário:1. O regime de anulação da venda em processo tributário encontra-se previsto no artº.257, do C.P.P.Tributário (cfr.artº.328, do anterior C.P.Tributário), preceito que deve ser conjugado com os artºs.838 e 839, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6 (cfr.anteriores artºs.908 e 909, do C.P.Civil), onde se encontram enunciadas as causas de anulação.
2. Nos termos do artº.257, nº.1, al.a), do C.P.P.T., a anulação da venda poderá ser requerida, além do mais, no caso de se fundar na existência de algum erro sobre o objecto transmitido ou sobre as qualidades por falta de conformidade com o que foi anunciado.
3. O erro sobre o objecto transmitido ocorre quando o comprador formulou a sua proposta de compra reportando-se a um objecto julgando estar a fazê-la relativamente a outro objecto. Trata-se de uma situação que, em alguns casos, se reconduz a um erro sobre as qualidades do objecto e que, de qualquer forma, tem um tratamento idêntico. O erro sobre as qualidades que releva para efeitos de anulação tem de se consubstanciar numa divergência entre as qualidades do objecto da venda e o teor dos editais ou anúncios respectivos. Por outro lado, no caso de erro, para justificar a anulação, não será necessário que o mesmo erro seja essencial, bastando o mero erro incidental e será indiferente que o comprador tenha culpa na ocorrência do erro, podendo esta, no entanto, relevar ao nível da indemnização prevista no artº.838, do C.P.C. Por outras palavras, o comprador não tem de alegar, nem de provar, os pressupostos gerais da relevância do erro, designadamente o requisito da essencialidade do mesmo, previsto nos artºs.247, 251 e 252, do C.Civil.
4. Analisando a problemática do erro sobre o objecto do negócio (erro-vício, situação em que existe conformidade entre a vontade real e a vontade declarada, mas a vontade real formou-se em consequência do erro sofrido pelo declarante), matéria à qual é aplicável o regime de anulabilidade previsto no artº.247, do C.Civil, para o erro na declaração, “ex vi” do artº.251, do mesmo diploma. Em sede de erro-vício a essencialidade do erro deriva do mesmo ser causa da celebração do negócio e não apenas dos seus termos. Por outras palavras, o erro é essencial se, sem ele, se não celebraria qualquer negócio ou se celebraria um negócio com outro objecto. Por sua vez, o erro diz-se incidental quando influi apenas nos termos do negócio, pois o errante sempre contrataria, embora noutras condições, assim se mantendo o tipo negocial e o seu objecto (v.g.o preço seria menor). Em sede de regime de anulabilidade do negócio devido a existência de erro-vício, releva tanto o erro essencial, como o mero erro incidental, mais se podendo, neste último caso, utilizar um argumento de analogia a partir do regime previsto para a redução do preço na compra de bens onerados, previsto no artº.911, do C.Civil.
5. Em sede de regime de anulação de venda previsto no examinado artº.257, nº.1, al.a), do C.P.P.T. (norma especial a que não se aplica directamente o regime do erro-vício acabado de resumir e constante do C.Civil) para efeitos de anulação de venda o erro relevante sobre o objecto transmitido há-de ser determinado por falta de conformidade entre a identidade/qualidades do objecto e aquilo que tiver sido anunciado pela A. Fiscal em sede de publicitação da venda (cfr.artº.249, nº.5, do C.P.P.T.), mais irrelevando, para efeitos de anulação, o entendimento subjectivo do comprador incidente sobre o objecto adquirido ou as suas qualidades. Por outras palavras, só releva o erro que deriva de uma situação em que o comprador terá sido enganado pelo conteúdo dos meios de publicitação da venda, já não relevando situações em que o comprador diz que se enganou, equívoco este sem qualquer ligação ao conteúdo dos editais ou anúncios que apregoam a mesma.
Aditamento:
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Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO

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RELATÓRIO

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"E... - INVESTIMENTOS IMOBILIÁRIOS, UNIPESSOAL, L.DA.", com os demais sinais dos autos, deduziu salvatério dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do T.A.F. de Almada, exarada a fls.65 a 71-verso do presente processo e que julgou totalmente improcedente a reclamação de acto do órgão de execução fiscal deduzida pelo recorrente, enquanto comprador de imóvel no âmbito do processo de execução fiscal nº.... e apensos, o qual corre seus termos no Serviço de Finanças do ..., visando despacho que indeferiu o pedido de anulação de venda no espaço da mencionada execução.

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O recorrente termina as alegações (cfr.fls.105 a 113 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:

1-Tendo a proposta de aquisição apresentada sofrido um erro na identificação do processo, a mesma está ferida de erro sobre o objecto, caindo na previsão dos artigos 257, nº. 1, alínea a) do CPPT, 838, nº.1 do CPC e 247 e 251 do CC;

2-Todos determinantes da anulação da venda;

3-O art.247 prevê como requisitos a essencialidade do erro e o conhecimento por parte do declaratário;

4-O primeiro requisito foi dado como provado pela douta sentença recorrida;

5-Quanto ao segundo, atendendo à especificidade da venda executiva e do regime da proposta em carta fechada, o erro sobre o objecto não requer que o declaratário, no caso, a AT, conhecesse ou devesse conhecer da essencialidade para declaratário aqui recorrente, nos precisos moldes enquadrados pelo acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 17/04/2012 supra citado;

6-E mesmo que assim não se entenda, estando-se em face de erro essencial que nem sequer constitui requisito, bastando a verificação de erro incidental;

7-A decisão recorrida, salvo melhor opinião, viola os comandos legais assinalados nas presentes conclusões de recurso;

8-Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a sentença recorrida, com as legais consequências, por ser de JUSTIÇA!


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Não foram produzidas contra-alegações.

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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no qual pugna pelo provimento do recurso (cfr.fls.132 a 134 dos autos).

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Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo (cfr.artº.657, nº.4, do C.P.Civil; artº. 278, nº.5, do C.P.P.T.), vêm os autos à conferência para deliberação.

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FUNDAMENTAÇÃO

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DE FACTO

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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.66 e 67 dos autos):

1-Em 27/05/2007, foi autuado o processo de execução fiscal nº ... no qual é executada P... - Cabeça de Casal, por dívidas de IMI de 2006 no montante de € 211,56 (cfr.doc. junto a fls. 1 da cópia do processo executivo junto aos autos);

2-Ao processo executivo identificado no ponto anterior foram apensos os processos executivos nºs. ... (cfr.doc. junto a fls. 16 da cópia do processo executivo junto aos autos);

3-Em 08/01/2016 foi registada a penhora, no âmbito do processo de execução fiscal identificado no ponto anterior e apensos, sobre a fracção autónoma designada pela letra M, correspondente ao 4º andar direito, destinado a habitação, sito na Rua 8, lote 40, ..., freguesia de ..., concelho do ..., inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 1407, e descrito na Conservatória do Registo Predial do ... sob o nº ... no montante de € 1.922,95 (cfr.doc. junto a fls. 8 a 10 da cópia do processo executivo junto aos autos);

4-Por despacho de 20/01/2017 foi determinada a venda do imóvel identificado no ponto anterior sendo a primeira tentativa de venda efectuada por leilão electrónico com o valor base de € 39.551,21, caso esse leilão ficasse deserto a venda seria efectuada através de proposta em carta fechada sendo a base no montante de € 28.250,87 e inexistindo novamente propostas voltaria a ser efectuado novo leilão electrónico sendo o bem adjudicado à proposta com maior valor (cfr. doc. junto a fls. 31 a 32 da cópia do processo executivo junto aos autos);

5-O primeiro leilão ficou deserto (cfr.doc. junto a fls. 49 da cópia do processo de execução fiscal junto aos autos);

6-A reclamante apresentou uma proposta com o nº 2160.2017.174.2012/679681 através de carta fechada no montante de € 29.000,01 para a aquisição do imóvel melhor identificado em 3 para a venda identificada com o número 2160.2017.174 (cfr. doc. junto a fls. 51 da cópia do processo de execução fiscal junto aos autos);

7-Em 19/04/2017 deu entrada no Serviço de Finanças do ... um articulado no qual a reclamante solicita que a venda seja dada sem efeito uma vez que a proposta que pretendia fazer era para outro imóvel e não para o imóvel em causa nos autos, afirmando não ter o mínimo interesse neste imóvel (cfr.doc. junto a fls. 52 da cópia do processo de execução fiscal junto aos autos);

8-Por despacho de 08/05/2017 o Chefe do Serviço de Finanças afirmou não existir qualquer fundamento para anular a venda pelo que indeferiu o requerimento (cfr.doc. junto a fls. 53 da cópia do processo de execução fiscal junto aos autos);

9-A reclamante pretendia apresentar a sua proposta noutro bem diferente do adquirido (depoimento da testemunha inquirida e do depoimento do gerente da sociedade).


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A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Não ficou provado que a Fazenda Pública tivesse conhecimento que a Reclamante pretendia adquirir um imóvel diferente.
Dos  factos  constantes  da  reclamação,  todos  objectos  de  análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita…”.

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A fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A decisão da matéria de facto com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos constam, todos objecto de análise concreta, conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório, bem como do depoimento da testemunha inquirida e do depoimento do gerente da sociedade.
Desde logo pelo gerente foi afirmado apenas que não sabe explicar como licitou um bem que não pretendia.

Já a testemunha arrolada afirmou também que sabia que o bem que a Reclamante pretendia adquirir era outro bem, no entanto, sem que se encontre explicação foi apresentada proposta para aquele bem. Também afirmou que não estava presente no momento da apresentação da proposta e o que sabe foi o que o gerente da sociedade lhe transmitiu dias depois. O depoimento desta testemunha não é considerado pelo tribunal desde logo por ela não ter tido conhecimento directo sobre os factos a que depôs…”.


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Este Tribunal, ao abrigo do disposto no artº.662, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6, "ex vi" do artº.281, do C.P.P.Tributário, tal como das regras do direito probatório material, tudo em virtude do exame da prova documental, constante do presente processo e apenso, mais se levando em consideração os princípios da aquisição processual e da livre apreciação das provas (cfr.artºs.413 e 607, nº.5, ambos do C.P.Civil; António Santos Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 4ª. Edição, Almedina, 2017, pág.270 e seg.), altera e adita o probatório estruturado em 1ª. Instância, nos termos que passamos a explanar.

O nº.1 do probatório supra passa a ter a seguinte redacção, consentânea com o teor dos documentos em que se baseia:

1-Em 29/05/2009, foi autuado o processo de execução fiscal nº...., o qual corre seus termos no Serviço de Finanças do ..., neste figurando como executada P... - Cabeça de Casal da Herança de, visando a cobrança de dívidas de IMI, do ano de 2008 e no montante de € 211,56 e acrescidos (cfr. documentos juntos a fls.2 e 3 da cópia do processo executivo apenso).

Aditam-se ao probatório vindo da 1ª. Instância os seguintes números, atenta a prova documental constante do processo e apenso:

10-O primeiro leilão que ficou deserto, identificado no nº.5 supra do probatório, ocorreu em 22/03/2017 (cfr.documento junto a fls.49 da cópia do processo executivo apenso);

11-A proposta apresentada pela sociedade reclamante, "E... - Investimentos Imobiliários, Unipessoal, L.da.", e identificada no nº.6 supra, foi aceite e adjudicada à proponente em 12/04/2017 (cfr.documento junto a fls.51 da cópia do processo executivo apenso);

12-Do despacho de indeferimento identificado no nº.8 do probatório supra consta, além do mais, o seguinte:

“(…)

Nenhum dos argumentos da sociedade proponente colhe, nem tem enquadramento legal, quer no artigo 257 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), quer no artigo 838 e seguintes do Código de Processo Civil (CPC).

Acresce que tendo a venda sido efectuada na modalidade de “Proposta em Carta Fechada”, nos termos do nº.3 do artigo 248 do CPPT, e de conformidade e especificações definidos na portaria 219/2011, de 1 de Junho (referida no nº.6 do citado artigo 248), as propostas/licitações são apresentadas no “portal das finanças” na opção “venda electrónica de bens” na funcionalidade “leilão electrónico”, o qual disponibiliza nos separadores “Ajuda” e “Legislação” toda a informação legal aplicável, pelo que não procedem os argumentos invocados.

Por último referir, que na referida funcionalidade constam diversos alertas que é necessário confirmar para que as licitações sejam validades - conforme transcrição/cópia de folha que se anexa.

Não se constatando nenhum fundamento para a anulação da venda, nem a situação referida no nº.4 do artigo 820 do CPC, indefiro o pedido.

(…)

(cfr.documentos juntos a fls.53 e 54 da cópia do processo executivo apenso).


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Alicerçou-se a convicção do Tribunal, no que diz respeito à matéria de facto alterada e aditada supra, no teor dos documentos mencionados em cada um dos números da factualidade provada, tal como nas regras do direito probatório material.

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ENQUADRAMENTO JURÍDICO

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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida ponderou, em síntese, julgar totalmente improcedente a reclamação deduzida pelo recorrente, mais mantendo o acto reclamado identificado nos nºs.8 e 12 do probatório.

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Antes de mais, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).

Alega o apelante, em síntese, que tendo a proposta de aquisição de imóvel apresentada padecido de um erro na identificação do processo em causa, a mesma está ferida de erro sobre o objecto, caindo na previsão dos artºs.257, nº.1, al.a), do C.P.P.T., 838, nº.1, do C.P.Civil, e 247 e 251, do C.Civil, todos determinantes da anulação da venda. Que o regime em causa se basta com a verificação de erro incidental. Que a decisão recorrida viola os comandos legais assinalados (cfr.conclusões 1 a 7 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo concretizar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.

Apuremos se a decisão objecto do presente recurso comporta tal vício.

Constituindo o acervo normativo jurídico-tributário um ramo próprio do direito público, o legislador previu um processo de execução fiscal primordialmente direccionado à cobrança dos créditos tributários de qualquer natureza, estruturado em termos mais simples do que o processo de execução comum, com o objectivo de conseguir uma maior celeridade na cobrança dos créditos, recomendada pelas finalidades de interesse público das receitas que através dele são cobradas (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 8/08/2012, proc.5859/12; Jorge Lopes de Sousa, Código do Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 6ª. edição, III Volume, Áreas Editora, 2011, pág.28).

O regime de anulação da venda em processo tributário encontra-se previsto no artº.257, do C.P.P.Tributário (cfr.artº.328, do anterior C.P.Tributário), preceito que deve ser conjugado com os artºs.838 e 839, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6 (cfr.anteriores artºs.908 e 909, do C.P.Civil), onde se encontram enunciadas as causas de anulação.

No exame do presente recurso devemos levar em consideração o regime constante do artº.257, do C.P.P.T., na redacção actual, resultante da Lei 64-B/2011, de 30/12 (O.E.2012):

Artigo 257.º
Anulação da venda

1 - A anulação da venda só poderá ser requerida dentro dos prazos seguintes:
a) De 90 dias, no caso de a anulação se fundar na existência de algum ónus real que não tenha sido tomado em consideração e não haja caducado ou em erro sobre o objecto transmitido ou sobre as qualidades por falta de conformidade com o que foi anunciado;
b) De 30 dias, quando for invocado fundamento de oposição à execução que o executado não tenha podido apresentar no prazo da alínea a) do n.º 1 do artigo 203.º;
c) De 15 dias, nos restantes casos previstos no Código de Processo Civil.

2
- O prazo contar-se-á da data da venda ou da que o requerente tome conhecimento do facto que servir de fundamento à anulação, competindo-lhe provar a data desse conhecimento, ou do trânsito em julgado da acção referida no n.º 3.
3
- Se o motivo da anulação da venda couber nos fundamentos da oposição à execução, a anulação depende do reconhecimento do respectivo direito nos termos do presente Código, suspendendo-se o prazo referido na alínea c) do n.º 1 no período entre a acção e a decisão.
4
- O pedido de anulação da venda deve ser dirigido ao órgão periférico regional da administração tributária que, no prazo máximo de 45 dias, pode deferir ou indeferir o pedido, ouvidos todos os interessados na venda, no prazo previsto no artigo 60.º da lei geral tributária.
5
- Decorrido o prazo previsto no número anterior sem qualquer decisão expressa, o pedido de anulação da venda é considerado indeferido.
6
- Havendo decisão expressa, deve esta ser notificada a todos os interessados no prazo de 10 dias.
7
- Da decisão, expressa ou tácita, sobre o pedido de anulação da venda cabe reclamação nos termos do artigo 276.º
8
- A anulação da venda não prejudica os direitos que possam assistir ao adquirente em virtude da aplicação das normas sobre enriquecimento sem causa.

Nos termos do artº.257, nº.1, al.a), do C.P.P.T., a anulação da venda poderá ser requerida, além do mais, no caso de se fundar na existência de algum erro sobre o objecto transmitido ou sobre as qualidades por falta de conformidade com o que foi anunciado.

O erro sobre o objecto transmitido ocorre quando o comprador formulou a sua proposta de compra reportando-se a um objecto julgando estar a fazê-la relativamente a outro objecto. Trata-se de uma situação que, em alguns casos, se reconduz a um erro sobre as qualidades do objecto e que, de qualquer forma, tem um tratamento idêntico. O erro sobre as qualidades que releva para efeitos de anulação tem de se consubstanciar numa divergência entre as qualidades do objecto da venda e o teor dos editais ou anúncios respectivos. Por outro lado, no caso de erro, para justificar a anulação, não será necessário que o mesmo erro seja essencial, bastando o mero erro incidental e será indiferente que o comprador tenha culpa na ocorrência do erro, podendo esta, no entanto, relevar ao nível da indemnização prevista no artº.838, do C.P.C([1]). Por outras palavras, o comprador não tem de alegar, nem de provar, os pressupostos gerais da relevância do erro, designadamente o requisito da essencialidade do mesmo, previsto nos artºs.247, 251 e 252, do C.Civil (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 26/06/2014, proc.7628/14; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, IV volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.179; Fernando Amâncio Ferreira, Curso de Processo de Execução, Almedina, 13ª. edição, 2010, pág.404 e seg.).

Analisando a problemática do erro sobre o objecto do negócio (erro-vício, situação em que existe conformidade entre a vontade real e a vontade declarada, mas a vontade real formou-se em consequência do erro sofrido pelo declarante), matéria à qual é aplicável o regime de anulabilidade previsto no artº.247, do C.Civil, para o erro na declaração, “ex vi” do artº.251, do mesmo diploma. Em sede de erro-vício a essencialidade do erro deriva do mesmo ser causa da celebração do negócio e não apenas dos seus termos. Por outras palavras, o erro é essencial se, sem ele, se não celebraria qualquer negócio ou se celebraria um negócio com outro objecto. Por sua vez, o erro diz-se incidental quando influi apenas nos termos do negócio, pois o errante sempre contrataria, embora noutras condições, assim se mantendo o tipo negocial e o seu objecto (v.g.o preço seria menor). Em sede de regime de anulabilidade do negócio devido a existência de erro-vício, releva tanto o erro essencial, como o mero erro incidental, mais se podendo, neste último caso, utilizar um argumento de analogia a partir do regime previsto para a redução do preço na compra de bens onerados, previsto no artº.911, do C.Civil (cfr.Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, I Volume, 3ª.edição, Coimbra Editora, 1982, pág.234 e seg.; Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3ª.edição, Coimbra Editora, 1989, pág.507 e seg.).  

Voltando ao regime de anulação de venda previsto no examinado artº.257, nº.1, al.a), do C.P.P.T. (norma especial a que não se aplica directamente o regime do erro-vício acabado de resumir e constante do C.Civil) para efeitos de anulação de venda o erro relevante sobre o objecto transmitido há-de ser determinado por falta de conformidade entre a identidade/qualidades do objecto e aquilo que tiver sido anunciado pela A. Fiscal em sede de publicitação da venda (cfr.artº.249, nº.5, do C.P.P.T.), mais irrelevando, para efeitos de anulação, o entendimento subjectivo do comprador incidente sobre o objecto adquirido ou as suas qualidades. Por outras palavras, só releva o erro que deriva de uma situação em que o comprador terá sido enganado pelo conteúdo dos meios de publicitação da venda, já não relevando situações em que o comprador diz que se enganou, equívoco este sem qualquer ligação ao conteúdo dos editais ou anúncios que apregoam a mesma (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 21/06/2011, proc.4683/11).

“In casu”, é inequívoco, como patenteia o probatório, que não se comprova nos autos qualquer desconformidade da coisa transmitida com o que foi anunciado, imputável à A. Fiscal. De resto, nem o recorrente o alega, sequer. Este apenas se limita a defender que a proposta de aquisição de imóvel por si apresentada e que foi objecto de adjudicação, padece de um erro na identificação do respectivo processo.

A pretensão anulatória da venda está, pois, votada ao insucesso, por falta de prova dos elementos constitutivos do invocado erro relevante sobre o imóvel adquirido, erro esse que não é, sequer, fácil de se verificar em sede de leilão electrónico, como foi o caso, e ao abrigo do regime previsto na Portaria 219/2011, de 1/6 (cfr.nº.12 do probatório).  

Por último, sempre se dirá que a decisão recorrida não violou qualquer dos preceitos alegados pelo recorrente, quais sejam, os artºs.257, nº.1, al.a), do C.P.P.T., 838, nº.1, do C.P.Civil, e 247 e 251, do C.Civil.  

Rematando, sem necessidade de mais amplas ponderações, julga-se improcedente o presente recurso e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida, embora com a presente fundamentação, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.  


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DISPOSITIVO

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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.

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Condena-se o recorrente em custas.

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Registe.

Notifique.


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Lisboa, 25 de Janeiro de 2018

(Joaquim Condesso - Relator)



(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)

(Lurdes Toscano - 2º. Adjunto)



[1] (sem prejuízo do disposto no artº.257, nº.8, do C.P.P.T.).