Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:05774/12
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:07/10/2012
Relator:PEDRO VERGUEIRO
Descritores:IVA. ACE. ISENÇÃO.
Sumário:I) São incompletas, simples, parciais, todas as isenções do art. 9º CIVA, onde o sujeito passivo beneficiário não liquida imposto nas suas operações activas e não tem o direito a deduzir o IVA suportado para a respectiva realização.

II) A razão de ser dos ACE estar relacionada com a circunstância de estarem em causa serviços do interesse comum das várias entidades que integram o Agrupamento, não havendo lugar a qualquer valor acrescentado, como decorre da exigência estabelecida no n° 23 do art° 9° do CIVA, ou seja, que os serviços sejam directamente necessários ao exercício da actividade e os grupos se limitem a exigir dos seus membros o reembolso exacto da parte que lhes incumbe nas despesas comuns.

III) Com referência à actividade do ACE, às prestações de serviços efectuadas, elemento relevante no domínio do art. 9º nº 23 do CIVA, não se alcança em que termos é que a conduta de um dos membros do agrupamento, a quem não foi prestado qualquer serviço, pode e deve (como pretende a Recorrente) condicionar a posição do ACE e dos demais membros do agrupamento.

IV) Nesta medida, considerando até a decisão do TJCE - Acórdão do Tribunal de Justiça de 11-12-2008, Proc. C-407/2007 - não pode aceitar-se que, perante um membro do ACE com um prorata superior aos 10%, mas que esteve alheado da actividade do ACE, todo o grupo seja tributado, como se tratasse de um sujeito passivo normal para efeitos de IVA, abstraindo das concretas prestações de serviços efectivamente realizadas durante o exercício e do enquadramento das mesmas.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário ( 2ª Secção ) do Tribunal Central Administrativo Sul:

1. RELATÓRIO
A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública, devidamente identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, datada de 15-09-2011, que julgou procedente a pretensão deduzida por “Espírito …………………, ACE” na presente instância de IMPUGNAÇÃO com referência às liquidações de IVA e de juros compensatórios impugnadas, relativas ao ano de 2003, emitidas com os nºs 06245964, 06245966, 06245968, 062459700, 06245972, 06245974, 06245976, 06245978, 06245980, 06245982, 06245984, 06245986, 06245965, 06245967, 06245969, 06245971,06245973, 06245975, 06245977, 06245979, 06245981, 06245983, 06245985 e 06245987, no montante total de € 6.555.884,44, onde se incluem €715.386,08 de juros compensatórios.

Formulou as respectivas alegações ( cfr. fls. 199-217 ) no âmbito das quais enuncia as seguintes conclusões:
“(…)
I - Pelo elenco de fundamentos acima descritos, infere-se que a douta sentença, ora recorrida, julgou procedente a impugnação à margem referenciada com as consequências aí sufragadas, por ter considerado que se o agrupamento presta serviços a membros com percentagem de dedução superior a 10%, o ACE terá que não sujeitar esses serviços a IVA;
II - Se os serviços foram prestados a membros que praticam operações isentas, o agrupamento não sujeita a IVA tais serviços.
III - Nada impede, pois, a prática em simultâneo de operações sujeitas e isentas, o que apenas importa um direito de dedução limitado.
IV - Por outro lado, a renúncia à isenção é admissível desde que um dos membros apure um prorata superior a 10%, mas a Lei do Orçamento de Estado de 2007, no seu art.º 62.º revogou o art.º 12.º n.º 1 al. d) do CIVA, pelo que tal alteração não pode aplicar-se a factos ocorridos a 2003, sob pena de retroactividade da aplicação da lei fiscal.
V - Assim sendo, antes da revogação da al. d) do n.º 1 do art.º 12.º do CIVA e no quadro legal aplicável à data dos factos, era possível a um ACE prestar serviços sujeitos e não sujeitos, com as consequências já vistas em sede de IVA, pelo que a liquidação de IVA sobre as prestações de serviços efectuadas pela impugnante a sujeitos passivos com uma percentagem de dedução não superior a 10%, com base na circunstância de um dos membros, BESI, ter excedido o prata de 10%, não pode manter-se, por tal liquidação traduzir uma violação dos art.ºs 9.º n.º 23 e 23-A e 12.º n.º 1 al. d), ambos do CIVA.
VI - Neste âmbito, o thema decidendum, assenta em determinar se um membro do ACE com um prorata superior aos 10% implica que todo o grupo seja tributado, como se tratasse de um sujeito passivo normal para efeitos de IVA.
VII - A Fazenda Pública considerou que face aos Acórdãos do TJCE, a interpretação da norma nacional ou comunitária, ou seja, a do art.º 13.º da parta A), do n.º 1 al. f) da Sexta Directiva, deve ser declarativa e em sentido estrito.
VIII - Pelo que, se um membro do ACE tiver um pro rata superior à percentagem estabelecida no art.º 9.º n.º 23 A do CIVA, isto é, de 10%, implica que todo o grupo seja tributado, sendo a isenção consignada uma isenção incompleta.
IX - A interpretação proposta não viola nenhum dos princípios elencados pela impugnante, nem viola o direito comunitário, uma vez que tem em conta a sua jurisprudência sobre a matéria.
X - A norma do art.º 9.º n.º 23 do CIVA está condicionada pela necessidade de assumir conteúdo idêntico àquele que decorre da sua norma matriz da Sexta Directiva, só podendo abranger as entidades cujas prestações de serviços são susceptíveis, nas condições estabelecidas de beneficiar de isenção e, estas entidades não são outras para além, dos agrupamentos autónomos em que todos os membros que os integram exerçam actividades isentas.
XI - Pelo exposto, somos de opinião que o douto Tribunal “ad quo”, esteou a sua fundamentação na errónea apreciação das razões de facto e de direito que se encontram subjacentes ao acto de liquidação sindicado, em clara e manifesta violação dos requisitos legalmente consignados no disposto nos art.ºs 9.º n.º 23 e 23-A e 12.º n.º 1 al. d), ambos do CIVA e art.º 13.º parte A), n.º 1 al. f) da Sexta Directiva.
Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que declare a Impugnação improcedente, com as devidas consequências legais.
PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA”

A recorrida “E……….. - ……………………., ACE” apresentou contra-alegações nas quais formula as seguintes conclusões:
“…
1ª) A isenção consagrada no nº 23 do artº 9º do CIVA tem como finalidade tratar, no plano fiscal, de modo igual, as prestações de serviços efectuadas por agrupamentos a favor dos seus membros e os serviços realizados ou obtidos internamente;
2ª) Assim, nos agrupamentos, como os ACE(s), nas prestações de serviços efectuados a favor dos seus membros, não há qualquer valor acrescentado, sendo a contrapartida desses serviços prestados pelo agrupamento o reembolso exacto das despesas incorridas com a efectivação de tais serviços;
3ª) A isenção em causa não pretende, portanto, beneficiar os agrupamentos autónomos, mas antes acautelar a situação dos tomadores dos serviços, isto é, os membros do agrupamento;
4ª) A reforçar esse entendimento, está a circunstância de que no Código do IVA não há isenções subjectivas mas apenas objectivas, isto é, as que são atribuídas tendo em conta a concreta actividade efectuada;
5ª) Nas isenções objectivas é indiferente a natureza ou a qualidade da entidade, relevando, antes, as concretas prestações de serviços;
6ª) Por isso, a circunstância de um dos membros do agrupamento dispor, em certo momento, de uma percentagem de dedução de IVA (“prorata”) superior a 10% não impede, por si só, que continuem isentas as prestações efectuadas em benefício dos membros que estejam isentos ou cuja percentagem de dedução não seja superior aos referidos 10%;
7ª) A interpretação da Administração Fiscal, que fundamentou as liquidações de IVA impugnadas, segundo a qual as circunstâncias referentes a um dos membros do agrupamento, que passou a ter um prorata superior a 10%, afecta a esfera jurídica dos demais membros, além de não ter a mínima adesão no texto da lei, conduz a um resultado absurdo, pondo em causa a lógica do imposto – tanto mais absurdo quanto o ACE, no ano de 2003, não prestou qualquer serviço ao membro cujo prorata era superior a 10%;
8ª) Sendo certo, repete-se, que a razão de ser desta isenção, decorre do princípio da neutralidade, permitindo que os agentes económicos organizem a sua actividade sem que o IVA represente um obstáculo;
9ª) É que, além do mais, deixaria de haver neutralidade em face da tributação dos serviços prestados aos outros membros do ACE e essas prestações de serviços passariam a ter um tratamento fiscal diferenciado, porque tributadas, dos serviços obtidos internamente, porque não tributados, situação que o legislador não quer, razão pela qual estabeleceu a isenção consagrada no nº 23 do artº 9º do CIVA;
10ª) Fazer depender a isenção das prestações de serviços efectuados pelo ACE da situação fiscal de um dos membros desse agrupamento, tornaria a isenção estatuída no nº 23 do artº 9º do CIVA, na prática, inaplicável;
11ª) Como é orientação firmada da jurisprudência do TJCE, por exemplo, no Acórdão de 11/12/2008, Processo C-407/07, a interpretação das normas referentes a isenções, embora deva ser feita de forma restritiva, não pode conduzir à sua quase inaplicabilidade;
12ª) A interpretação feita pela douta sentença recorrida da norma de isenção em causa respeitou, inteiramente, essa orientação da jurisprudência do TJCE, isto é, foi feita de forma restritiva;
13ª) Ao invés, a interpretação da Administração Fiscal da “contaminação global”, isto é, a circunstância de um dos membros do ACE passar a ter um prorata superior a 10% tornaria impossível a isenção das prestações dos serviços aos outros membros do agrupamento, além de que não tem aderência ao texto da lei;
14ª) Para além disso, essa interpretação feita pela Administração Fiscal é tanto mais absurda quanto o prorata é um elemento variável cujo exacto cálculo só tem lugar com o encerramento do exercício;
15ª) Assim, no final do exercício, ao constatar-se que o prorata tinha ultrapassado os 10%, passaria a haver tributação, de forma retroactiva, sobre os serviços prestados ao longo do ano anterior aos restantes membros de agrupamento que nada têm a ver com a situação;
16ª) A alínea d) do nº 1 do artº 12º do CIVA confirma, expressamente, que não há, no funcionamento da isenção estabelecida no nº 23 do artº 9º do CIVA, qualquer “contaminação global”;
17ª) Na verdade, ao permitir a renúncia à isenção “quando a percentagem de dedução de pelo menos um dos seus membros não seja superior” a 10%, o preceito em causa mostra que o regime de isenção se pode manter ainda que apenas um dos membros registe um prorata inferior a 10% e, portanto, os restantes tenham um prorata superior aos referidos 10%;
18ª) Se a existência de um único membro com um prorata superior a 10% conduzisse, como pretende a Administração Fiscal, à perda total da isenção, não faria sentido a existência de uma norma a permitir a renúncia... à isenção;
19ª) Sendo certo que o Orçamento de Estado para 2007 veio revogar a referida alínea d) do nº 1 do artº 12º do CIVA, estabelecendo, no artº 62º, nº 2, que os agrupamentos que tivessem renunciado à isenção poderiam voltar ao regime de isenção;
20ª) Ora, tal quer dizer, obviamente, que o legislador volta a reafirmar o entendimento de que os agrupamentos com membros com um prorata superior a 10% - os agrupamentos que podiam renunciar à isenção - estão isentos de IVA nos serviços prestados aos membros com um prorata não superior a 10%;
21ª) A pretensão de fazer cessar a isenção relativamente a todas as prestações de serviços realizados por um agrupamento autónomo sempre que um só dos seus membros ultrapasse um prorata de 10%, além de contrariar frontalmente a lei, não corresponde a qualquer interesse atendível;
22ª) Na verdade, o interesse de preservar a neutralidade do imposto e a integridade das receitas do Estado basta-se com que seja liquidado imposto ao tomador de serviço que excede aquele limite de 10%;
23ª) A invocação feita pela recorrente de um Acórdão do TJCE, de 15/6/89, que se julga dizer respeito ao processo 348/87, nada tem a ver com a situação da presente impugnação;
24ª) Na verdade, em que tal Acórdão, nunca é dito, ou sequer insinuado, que para o funcionamento da isenção é necessário que os agrupamentos sejam constituídos exclusivamente por membros que exercem actividades isentas, sendo que, no indicado aresto, é apenas analisada a questão da prestação de serviços por uma fundação a outra fundação, sem que uma dessas fundações seja membro da outra;
25ª) Aliás, em tal Acórdão, conclui-se pela exclusão da isenção em relação às prestações em causa e não pela exclusão da isenção da entidade em causa;
26ª) Ao invés, no Acórdão do Tribunal de Justiça de 11/12/2008, Processo C- 407/2007, a propósito da isenção das prestações de serviços feitas por agrupamentos autónomos de pessoas a favor dos seus membros, é dito que cada membro do agrupamento não tem o direito de privar os outros membros desse agrupamento do benefício da isenção do IVA em face de opções por ele tomadas.
27ª) As liquidações impugnadas são, assim, ilegais por violação do artº 9º, nº 23 e 23º-A e do artº 12º, nº 1, d), CIVA, razão pela qual a sentença recorrida não merece qualquer censura;
28ª) As liquidações impugnadas são também ilegais por frontal violação dos princípios da boa fé e da segurança jurídica;
29ª) Na verdade, a Administração Fiscal, em resposta à consulta formulada por um outro ACE, informou que entendia que os débitos efectuados pelo agrupamento aos seus membros beneficiam da isenção de IVA desde que esses membros não tivessem uma percentagem de dedução superior a 10% e que os débitos a membros que tivessem uma percentagem de dedução superior a 10% não beneficiavam de tal isenção;
30ª) Na mesma informação, a Administração Fiscal, expressamente, referia a possibilidade de o ACE ser um sujeito passivo misto, isto é, que prestava serviços isentos e serviços não isentos, o que demonstra, inequivocamente, que não há, portanto, a “contaminação global”;
31ª) A essa resposta da Administração Fiscal não pode deixar de se dar o mesmo tratamento que foi dado no Acórdão do STA de 14/3/2007, Processo nº 01154/06, a propósito de uma brochura emitida pela Administração Fiscal sobre o cumprimento de determinados deveres pelos contribuintes: está a Administração vinculada por ela nos termos da alínea a) do nº 4 do artº 68º da LGT, sendo ilegal, por violação dessa norma, uma actuação posterior em sentido divergente ao informado.
32ª) Sendo certo, que também a jurisprudência comunitária é unânime ao realçar a necessidade de as autoridades nacionais respeitarem o princípio da protecção da confiança legítima dos operadores económicos (cf. entre muitos, Acórdão do Tribunal de Justiça de 14/9/2006, Processos C-181/04, C-182/04 e C-183/04);
33ª) Assim, a Administração Fiscal ao alterar o seu anterior entendimento e a aplicá-lo retroactivamente, violou os princípios da boa e da confiança.
Termos em que o recurso deduzido pela Fazenda Pública deve ser julgado improcedente, como é de Justiça.”

O Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso nos seguintes termos:
“(…)
l - A FAZENDA PÚBLICA vem recorrer da douta sentença proferida a fls. 145 a 162 por com ela se não conformar.
Alega nos termos conclusivos que constam a fls. 124 a 126, pedindo a revogação da decisão e a improcedência da impugnação.
2 - A recorrida contra-alegou pugnando pela manutenção do julgado como decorre de fls.238 a 244.
3 - Analisando os autos, entendemos que o presente recurso deverá proceder, apoiando-nos, aqui, no teor da posição assumida pelo M°. P0., em sede de parecer na 1a instância, que corroboramos para todos os efeitos legais.
Acompanhamos, quanto ao mais, a posição já defendida pela recorrente nas alegações de recurso.
4 – Nestes termos, o recurso deve proceder.
(…)”

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR
A questão suscitada pela Recorrente resume-se, em suma, em saber se um membro do ACE com um prorata superior aos 10% implica que todo o grupo seja tributado, como se tratasse de um sujeito passivo normal para efeitos de IVA.

3. FUNDAMENTOS
3.1. DE FACTO
Nesta matéria, consta da decisão recorrida que:
“…
1 - A Impugnante - E ………… – Empresa …………… ACE – é um agrupamento complementar de empresas, do Grupo ……………, o qual tem como objecto a prestação de serviços informáticos, de aprovisionamento, de conservação e manutenção dos bens móveis, de equipamento e imóveis pertencentes aos membros agrupados e, ainda, a prestação de serviços administrativos e operacionais, acessórios e complementares à actividade desenvolvida por cada um dos membros agrupados – cfr. p.i e relatório de inspecção junto ao PAT;
2 - No exercício de 2003, o universo dos beneficiários do agrupamento e a respectiva proporção da prestação de serviços era a seguinte (cfr. relatório de inspecção junto ao PAT):
Banco E ……….. (B……..) – 89,20%
Banco Internacional ……….. (B………) – 10,70%
Banco E ……. I……………. (B………….) – 0,00%
Banco E …………. A …..(B…) – 0,00%
Banco E ………… Total (B……..T) – 0,03%
3 - A impugnante está enquadrada, em sede de IRC, no regime de transparência fiscal, e em sede de IVA, e desde o início da sua actividade, está enquadrada no regime de isenção, nos termos dos artigos 23 e 23 A do artigo 9º do CIVA - cfr. relatório de inspecção junto ao PAT;
4 – No ano de 2003, a percentagem de imputação de rendimentos relativamente aos membros do ACE era a seguinte (cfr. relatório de inspecção junto ao PAT):
Banco E ………. (B……….) – 80,00%
Banco Internacional ……….. (B……..) – 14,00%
Banco E………… I……….. (B………) – 5,00%
Banco …………… A………. (BAC) – 1,00%
Banco E. ………………. T………. (B…………) – 0,03%
5 – No ano de 2003, o sujeito passivo não procedeu à liquidação do IVA nas prestações de serviços efectuadas aos seus associados, nem entregou qualquer declaração periódica de IVA, considerando que reunia as condições para beneficiar da isenção do IVA de harmonia com o n°s 23 e 23º-A do art° 90º do CIVA - cfr. p.i e relatório de inspecção junto ao PAT.
6 - Durante o ano de 2006, a impugnante foi sujeita a uma acção de fiscalização que incidiu sobre o IVA dos anos de 2003 e 2004 - cfr. relatório de inspecção junto ao PAT;
7 – De acordo com o relatório de inspecção e sob a epígrafe DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA COLECTÁVEL, pode aí ler-se, além do mais, o seguinte (cfr. relatório de inspecção junto ao PAT):
“(…)
Constituindo-se como agrupamentos de pessoas dotadas de personalidade jurídica própria, as prestações de serviços efectuadas pelos ACE, quando estejam directamente relacionadas com as actividades prosseguidas pelos seus membros e lhes sejam debitadas por um valor correspondente ao dos custos incorridos para a realização dos serviços, poderão ser susceptíveis de beneficiar de isenção do IVA.
Contudo, da conjugação do n° 23 e n° 23-A do art° 9° do CIVA resulta que a isenção só é susceptível de abranger o ACE quando a totalidade dos seus membros exerçam actividades não sujeitas a IVA ou actividades dele isentas, considerando-se ainda como tal aqueles membros que, em virtude do conjunto das actividades exercidas, não disponham de uma percentagem de dedução (prorata) superior a 10%.
Nas situações em que os ACE disponham de, pelo menos, um membro com um prorata de dedução superior a 10%, há lugar à tributação das prestações de serviços efectuadas pelo ACE à generalidade dos seus membros, devendo a respectiva facturação e liquidação do IVA ter por base as regras aplicáveis em função da natureza dos serviços efectivamente prestados aos destinatários.
A aplicação da isenção prevista no n° 23 do art° 9° do CIVA está ainda dependente da verificação de alguns condicionalismos que a seguir se enunciam. As operações em causa devem ser qualificadas como prestações de serviços efectuadas por agrupamentos autónomos de pessoas aos seus membros. Essas prestações de serviços devem ser necessárias para a prossecução das actividades isentas dos membros dos agrupamentos e terem como contraprestação o reembolso exacto da parte das despesas comuns correspondente a cada um dos membros. A aplicação da isenção não deve ser susceptível de provocar distorções de concorrência.
8 – Nos anos de 2002, 2003 e 2004, as empresas que integravam o ACE apuraram os seguintes prorata definitivos (cfr. relatório de inspecção junto ao PAT):
EMPRESAS BENEFICIÁRIAS DO ACE
% Prorata 2002 % Prorata 2003 % Prorata 2004

Banco …………… (B……..) 10% 10% 10%

Banco …………… (B…….) 4% 3% 5%

Banco ………………………. (B……….) 7% 4% 10%

Banco …………….. Açores (B……..) 6% 3% 3%

Banco …………… I…………… (BESI) 19% 37% 15%
9 – Com base no entendimento espelhado no ponto 7 supra e considerando as percentagens dos prorata apuradas, os serviços de inspecção concluíram que, uma vez que em 2002, 2003 e 2004 um dos membros (BESI) apurou um prorata definitivo superior a 10%, ultrapassando o limite previsto no n° 23-A do art° 9 do CIVA, o ACE não poder beneficiar da isenção, ficando obrigatoriamente num regime de plena tributação – cfr. relatório de inspecção junto ao PAT;
10 - Em consequência de tal entendimento, e no que respeita ao ano de 2003, foi apurado IVA em falta nos montantes seguintes (cfr. relatório de inspecção junto ao PAT):
Janeiro – € 469.356,03
Fevereiro – € 462.256,99
Março – € 481.275,63
Abril - € 478.876,27
Maio – € 508.956,80
Junho – € 485.279,80
Julho – € 477.624,78
Agosto - € 455.676,08
Setembro – € 504.500,97
Outubro – € 485.262,17
Novembro – € 483.548,47
Dezembro - € 547.884,55, num total de € 5.840.498,37;
11 – Em consequência foram emitidas as liquidações adicionais de IVA de 2003, com os nºs 06245964, 06245966, 06245968, 062459700, 06245972, 06245974, 06245976, 06245978, 06245980, 06245982, 06245984, 06245986 e, bem assim, as liquidações adicionais nºs 06245965, 06245967, 06245969, 06245971,06245973, 06245975, 06245977, 06245979, 06245981, 06245983, 06245985 e 06245987, relativas aos juros compensatórios correspondentes, no montante total de € 6.555.884,44, onde se incluem € 715.386,08 de juros compensatórios – cfr. fls. 33 a 56 dos autos.
12 – Em resposta a um pedido de informação, dirigido ao Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, pela Caixa ………….., SA, pelo Banco ………………., SA e pela Companhia de ……………., SA, em 18/01/99, relativo enquadramento, em sede de IVA, das actividades desenvolvidas por um ACE, a Administração Tributária, através da Subdirectora Geral do IVA (despacho de 5/12/10), comunicou à requerente que (cfr. doc° n° 3 junto à p.i):
- “os débitos a efectuar pelo ACE aos seus membros beneficiarão da isenção prevista no n° 23 do CIVA, desde que estes exerçam uma actividade cuja percentagem de dedução não exceda os 10%” e que “caso essa percentagem de dedução seja ultrapassada não serão considerados sujeitos passivos isentos, não se aplicando por isso aos débitos a isenção prevista no n° 23”.
*
A decisão sobre a matéria de facto assentou na análise crítica dos documentos juntos aos autos e ao PAT, tudo conforme referido a propósito de cada alínea do probatório.
*
Inexistem factos não provados com relevância para a decisão da causa.”
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3.2. DE DIREITO
Assente a factualidade apurada cumpre, agora, entrar na análise da realidade que envolve o presente recurso jurisdicional, impondo-se, desde logo, notar que a decisão recorrida julgou a presente impugnação procedente ponderando que a liquidação de IVA sobre as prestações de serviços efectuadas pelo impugnante a sujeitos passivos com uma percentagem de dedução não superior a 10%, com base na circunstância de um dos membros (BESI) ter excedido o prorata de 10%, não pode manter-se, por tal liquidação traduzir uma violação dos artigos 9º, nºs 23 e 23°-A e 12°, n° 1, d), do CIVA (este último em vigor e aplicável à data dos factos).

Nas suas alegações, a Recorrente aponta que o thema decidendum, assenta em determinar se um membro do ACE com um prorata superior aos 10% implica que todo o grupo seja tributado, como se tratasse de um sujeito passivo normal para efeitos de IVA, sendo que a Fazenda Pública considerou que face aos Acórdãos do TJCE, a interpretação da norma nacional ou comunitária, ou seja, a do art.º 13.º da parta A), do n.º 1 al. f) da Sexta Directiva, deve ser declarativa e em sentido estrito, pelo que, se um membro do ACE tiver um pro rata superior à percentagem estabelecida no art.º 9.º n.º 23 A do CIVA, isto é, de 10%, implica que todo o grupo seja tributado, sendo a isenção consignada uma isenção incompleta, verificando-se que a interpretação proposta não viola nenhum dos princípios elencados pela impugnante, nem viola o direito comunitário, uma vez que tem em conta a sua jurisprudência sobre a matéria, pois que a norma do art.º 9.º n.º 23 do CIVA está condicionada pela necessidade de assumir conteúdo idêntico àquele que decorre da sua norma matriz da Sexta Directiva, só podendo abranger as entidades cujas prestações de serviços são susceptíveis, nas condições estabelecidas de beneficiar de isenção e, estas entidades não são outras para além, dos agrupamentos autónomos em que todos os membros que os integram exerçam actividades isentas, o que significa que o douto Tribunal “ad quo”, esteou a sua fundamentação na errónea apreciação das razões de facto e de direito que se encontram subjacentes ao acto de liquidação sindicado, em clara e manifesta violação dos requisitos legalmente consignados no disposto nos art.ºs 9.º n.º 23 e 23-A e 12.º n.º 1 al. d), ambos do CIVA e art.º 13.º parte A), n.º 1 al. f) da Sexta Directiva.

Neste domínio, cabe notar que o IVA é comummente caracterizado como um imposto sobre o consumo, plurifásico, de valor acrescentado, e que opera através do método subtractivo indirecto.
É, desde logo, um imposto geral sobre o consumo, uma vez que tributa tendencialmente a generalidade dos actos de consumo ou de despesa. Na acepção do artigo 1.º n.º 1 do CIVA, estão sujeitas a este imposto as transmissões de bens, as prestações de serviços, as importações e as aquisições intracomunitárias de bens.
É, também, um imposto plurifásico, que incide sobre as diversas fases de um circuito económico, desde o momento da sua produção até à venda ao seu consumidor final.
Por outro lado, a sua característica de valor acrescentado, que opera através do método subtractivo indirecto (das facturas, do crédito de imposto ou dos pagamentos fraccionados), dita que, em cada fase do circuito económico, apenas se tribute o valor que resulta da diferença entre o IVA suportado nas operações realizadas a montante (inputs) e o IVA liquidado nas operações realizadas a jusante (outputs). Por outras palavras, a tributação incide exclusivamente no valor acrescentado obtido por cada agente económico até ao último estádio do processo económico, que é a apropriação por parte do consumidor final que, enquanto elemento sobre o qual o ónus do IVA incidirá, não poderá proceder à dedução do imposto suportado a montante.
A incidência efectiva do IVA, diferentemente do que acontece nos restantes impostos, é determinada não pela natureza formal do imposto, mas pelas características do mercado (v.g. a elasticidade da procura e a concorrência entre fornecedores), uma vez que sem consumo, não haverá IVA. Por outro lado, contanto que o IVA incida sobre o consumo e não sobre as transacções realizadas entre os diferentes operadores económicos, tem como objectivo fomentar a neutralidade e evitar a distorção de preços que poderia existir pelo facto de os produtores e outros agentes adquirirem produtos uns aos outros, visto que não é sobre estes que incide a tributação mas sobre os consumidores finais.
Diga-se ainda que um imposto é considerado neutro quando não tem impacto nas decisões dos agentes económicos, quer no plano interno quer no plano internacional.
De facto, o IVA, enquanto imposto que incide sobre as diversas fases do circuito económico e às quais é aplicada a mesma carga fiscal, consegue cumprir o objectivo da neutralidade uma vez que os operadores – independentemente da fase do circuito em que se encontrem – nunca são movidos por motivações fiscais, diferentemente do que se verifica com os impostos cumulativos sobre as transacções, que variam consoante a fase do processo ou o tipo de bens em causa.
Assim, e em cumprimento deste princípio da neutralidade, os bens e serviços semelhantes deverão ser sujeitos ao mesmo enquadramento fiscal e às mesmas taxas, independentemente do número de transacções ocorridas no processo de produção e distribuição.

Considerando ainda a matéria em equação nos autos, crê-se pertinente ter em consideração o exposto no Ac. deste Tribunal de 22-05-2012, Proc. nº 05235/11, www.dgsi.pt, onde se aponta que “Como dá apontamento Clotilde Celorico Palma (1), no IVA, considerando a possibilidade do exercício do direito à dedução (2), encontramos duas modalidades de isenções; por um lado, as completas, totais, plenas ou que conferem o exercício do direito à dedução do IVA suportado e, por outro, as isenções incompletas, simples, parciais, entre as quais se encontram todas as do art. 9.º CIVA, onde o sujeito passivo beneficiário não liquida imposto nas suas operações ativas e não tem o direito a deduzir o IVA suportado para a respectiva realização. Ora, na medida em que esta dual impossibilidade, nomeadamente no que concerne à dedução do imposto pago para que se possa efetivar a atividade, pode resultar deveras penalizante, prejudicial, para o agente económico, a lei (art. 12.º CIVA), em moldes nitidamente excecionais e para situações específicas, faculta o direito à renúncia à isenção; esta concedida de forma automática, unicamente, por efeito do sujeito passivo exercer alguma das atividades, taxativamente, inscritas nos diversos números daquele art. 9.º. …”.
Por outro lado, considerando a natureza excepcional ou anti-sistema das normas de isenção de IVA o Tribunal de Justiça da União Europeia tem defendido que as mesmas estão sujeitas ao princípio da interpretação “estrita” ou “declarativa”, vazada, entre outros, no Acórdão SUFA, de 1989. Aí se pode ler que “os termos utilizados para designar as isenções [então] visadas pelo artigo 13º da Sexta Directiva devem ser interpretados restritivamente dado que constituem derrogações ao princípio geral de acordo com o qual o imposto sobre o volume de negócios é cobrado sobre qualquer prestação de serviços efectuada a título oneroso sobre um sujeito passivo.

Com referência à situação em análise nos autos, a sentença recorrida começa por estabelecer a posição assumida por ambas as partes, referindo que a impugnante defende que a circunstância de um dos membros do agrupamento dispor, em certo momento, de um prorata superior a 10% não impede, por si só, que continuem isentas as prestações efectuadas em benefício dos membros cuja percentagem de dedução seja inferior àquele valor, sendo que a interpretação contrária, por banda da AT, não tendo a mínima adesão no texto da lei, conduz a um resultado absurdo, pondo em causa a lógica do imposto, sendo que a FP sustenta, apoiando-se no parecer do Centro de Estudos Fiscais (CEF), nº 96/2005, cuja conclusão foi vertida no ofício-circulado nº 300/84/2005, da DSIVA, que as prestações de serviços em causa poderão beneficiar da isenção do imposto prevista nos n.°s 23º e 23º-A do artigo 9.° do CIVA, desde que se mostrem satisfeitas determinadas condições, desde logo, que os ACE sejam constituídos por membros que exerçam actividades isentas e/ou não sujeitas a IVA, sendo que, face ao disposto no n.°23 do artigo 9° do CIVA, a isenção está condicionada ao facto de os ACE serem constituídos exclusivamente por membros que exerçam actividades isentas ou não sujeitas a IVA. Por sua vez, o n.° 23-A do mesmo artigo considera ainda abrangido pela isenção, os ACE cujos membros, no conjunto das actividades exercidas, não disponham de um percentagem de dedução (prorata) superior a 10%.
Em conclusão, e como se aponta na decisão recorrida, na perspectiva da FP, caso um dos membros do agrupamento detenha uma percentagem de dedução superior a 10%, a questão da renúncia à isenção já nem sequer se coloca. Se a percentagem de dedução de pelo menos um dos membros for superior à estabelecida, o agrupamento está, obrigatoriamente, num regime de plena tributação, não havendo portanto, regime pelo qual optar.
Antes do mais, e ainda à boleia da decisão recorrida, importa deixar um breve nota para esclarecer que, embora a actual numeração das disposições do CIVA tenha sido alterada (cujos nºs 23 e 23-A do artigo 9º, passaram a nºs 21 e 22, respectivamente), por uma questão de maior facilidade na exposição continuaremos a usar a numeração em vigor à data dos factos.
Dispõe o artigo 9º, nº 23 do CIVA, inserido na secção relativa às isenções nas operações internas, nos termos seguintes: “Estão isentas de imposto as prestações de serviço fornecidas aos seus membros por grupos autónomos de pessoas que exerçam uma actividade isenta, desde que tais serviços sejam directamente necessários ao exercício da actividade e os grupos se limitem a exigir dos seus membros o reembolso exacto da parte que lhes incumbe nas despesas comuns, desde que porém esta isenção não seja susceptível de provocar distorções na concorrência”.
Diga-se ainda que a Lei Orçamento de Estado para 1999, que aditou ao art° 9° do CIVA o n° 23-A, o qual passou a prever que, para efeitos de aplicação do n° 23, “considera-se que os membros do grupo autónomo ainda exercem uma actividade isenta, desde que a percentagem de dedução determinada nos termos do artigo 23.º não seja superior a 10 %”.
Por outro lado, entende-se pertinente a referência feita na decisão recorrida quanto ao facto de a razão de ser dos ACE estar relacionada com a circunstância de estarem em causa serviços do interesse comum das várias entidades que integram o Agrupamento, não havendo lugar a qualquer valor acrescentado, como decorre da exigência estabelecida no n° 23 do art° 9° do CIVA, ou seja, que os serviços sejam directamente necessários ao exercício da actividade e os grupos se limitem a exigir dos seus membros o reembolso exacto da parte que lhes incumbe nas despesas comuns.
Aliás, a sua actividade não tem um escopo lucrativo (só a título meramente acessório e quando autorizado expressamente pelo respectivo acto constitutivo o ACE pode ter por fim a realização e partilha de lucros), pois o objectivo principal é o da melhoria das condições de exercício ou de resultado das actividades das empresas agrupadas, ou seja, o de aproveitamento de sinergias entre as empresas.
Na prática, os ACE têm sido constituídos, também, com o fim do exercício de uma actividade, ou de uma obra, de difícil ou impossível concretização individual por cada membro do ACE, dado que cada um de per se não tem os meios financeiros, humanos, técnicos e materiais exigidos para a sua execução.
É o que acontece nas grandes obras públicas, em que as condições do concurso público são extremamente exigentes.

Avançando, cabe notar que é necessário que a actividade dos membros do agrupamento esteja isenta, considerando-se como tal as situações que os membros do agrupamento não têm um prorata superior a 10%.
Neste ponto, com referência ao teor da lei e da própria razão de ser da constituição dos ACE, tem de conceder-se que em sede de IVA, não há isenções subjectivas, já que a lei não retira a nenhuma entidade, por causa da sua natureza, a qualidade de sujeito passivo, o que significa que a isenção relacionada com as prestações de serviço fornecidas aos seus membros por grupos autónomos de pessoas que exerçam uma actividade isenta tem de ser enquadrada em função da actividade dos membros do Agrupamento.
Como é sabido, na situação em apreço, em 2003, o BESI (Banco Espírito Santo Investimento) apresentou um prorata de 37%, o que determinou a actuação da AT que desembocou no afastamento da isenção prevista no artigo 9º, nº23 e, consequentemente, nas liquidações de IVA aqui impugnadas, impondo-se ainda anotar que, em 2003, a impugnante não prestou serviços ao BESI, como claramente consta do relatório de fiscalização.
A partir daqui, e como se nota na decisão recorrida, apesar de o ACE não ter prestado serviços ao BESI, a solução proposta pela AT levaria a que, ainda assim, o ACE passasse a liquidar imposto em todas as restantes operações, com isso penalizando os restantes membros do grupo que, em todos os caso, têm um prorata inferior a 10%, em concreto de 10%, 3%, 4% e e de 3%. Tal interpretação, como bem refere a sentença recorrida, não é aceitável.
Com efeito, considerando o exercício em apreço - 2003 - com referência à actividade do ACE, às prestações de serviços efectuadas, elemento relevante no domínio do art. 9º nº 23 do CIVA, não se alcança em que termos é que a conduta de um dos membros do agrupamento, a quem não foi prestado qualquer serviço, pode e deve (como pretende a Recorrente) condicionar a posição do ACE e dos demais membros do agrupamento.
Neste âmbito, e de forma decisiva, importa ter presente o exposto no Acórdão do Tribunal de Justiça de 11-12-2008, Proc. C-407/2007, onde se aponta, além do mais, que:
“…
30. Acresce que é jurisprudência assente que os termos usados para designar as isenções previstas no artigo 13.° da Sexta Directiva são de interpretação estrita, dado que constituem excepções ao princípio geral segundo o qual o IVA é cobrado sobre cada prestação de serviços efectuada a título oneroso por um sujeito passivo (acórdãos Stichting Uitvoering Financiële Acties, já referido, n.° 13; Taksatorringen, já referido, n.° 36; e de 14 de Junho de 2007, Horizon College, C-434/05, Colect., p. I-4793, n.° 16). Todavia, a interpretação desses termos deve ser feita em conformidade com os objectivos prosseguidos pelas referidas isenções e respeitar as exigências do princípio da neutralidade fiscal inerente ao sistema comum do IVA. Assim, esta regra da interpretação estrita não significa que os termos utilizados para definir as isenções previstas no referido artigo 13.° devam ser interpretados de maneira a privá-las dos seus efeitos (acórdão Horizon College, já referido, n.° 16). A jurisprudência do Tribunal de Justiça não tem por objectivo impor uma interpretação que tornaria as isenções visadas quase inaplicáveis na prática (acórdão Taksatorringen, já referido, n.° 62).
31. Relativamente ao artigo 13.°, A, n.° 1, alínea f), da Sexta Directiva, cabe salientar que não resulta da sua redacção que a isenção aí prevista só deve beneficiar as prestações de serviços fornecidas por agrupamentos autónomos a todos os seus membros.
32. Segundo esta redacção, o legislador comunitário previu unicamente que são visadas pela isenção do IVA as prestações de serviços efectuadas por agrupamentos autónomos, quando estes se limitem a exigir dos seus membros o reembolso exacto da parte que lhes corresponde nas despesas comuns.
33. O Governo neerlandês considera que se o artigo 13.°, A, n.° 1, alínea f), da Sexta Directiva prevê que aos membros de um agrupamento autónomo deve ser exigido o reembolso exacto da parte que lhes corresponde nas despesas comuns, isto significa que só os serviços prestados a todos os membros deste agrupamento podem beneficiar da isenção do IVA. O conceito de «despesas comuns» cobre o de «despesas colectivas», o qual remete para os serviços fornecidos a todos os membros do referido agrupamento, e não a um seu membro isolado.
34. A este respeito, importa realçar, como salientou a advogada-geral no n.° 18 das suas conclusões, que as necessidades dos membros de um agrupamento autónomo podem variar de um exercício fiscal para o outro, pelo que, consoante o exercício em causa, certas prestações podem ser fornecidas por este agrupamento a todos os membros, outros a alguns membros e outros ainda a apenas um membro.
35. De igual modo, quando um agrupamento autónomo é formado por numerosos membros com diferentes necessidades, é perfeitamente possível que as prestações que lhes são fornecidas por este agrupamento não sejam sistematicamente as mesmas.
36. A interpretação preconizada pelo Governo neerlandês teria, pois, por efeito limitar o âmbito de aplicação do artigo 13.°, A, n.° 1, alínea f), da Sexta Directiva, excluindo do benefício da isenção do IVA as prestações fornecidas pelos agrupamentos autónomos aos seus membros, nomeadamente num contexto em que as necessidades dos referidos membros sejam diferentes.
37. Ora, tal limitação do âmbito de aplicação desta disposição não é confirmada pela finalidade desta última, que é instituir uma isenção do IVA para evitar que a pessoa que oferece certos serviços seja sujeita ao pagamento do referido imposto quando tenha sido levada a colaborar com outros profissionais através de uma estrutura comum encarregue das actividades necessárias à realização dos referidos serviços.
38. Há que realçar que, mesmo quando as prestações são fornecidas a um único ou a alguns dos membros de um agrupamento autónomo, o custo do fornecimento destas prestações continua a ser uma despesa comum do agrupamento constituído para esse fim, cabendo indicar que os métodos de contabilidade analítica são perfeitamente susceptíveis de permitir identificar a parte precisa da despesa imputável a cada um dos serviços considerados individualmente.
39. De igual modo, as referidas prestações não deixam de ser fornecidas no quadro dos objectivos para os quais foi instituído um agrupamento autónomo e são, pois, oferecidas em conformidade com o objecto deste último.
40. Conclui-se, portanto, que não é possível interpretar o artigo 13.°, A, n.° 1, alínea f), da Sexta Directiva no sentido de que sujeita a isenção do IVA ao requisito de as prestações serem fornecidas a todos os membros do agrupamento autónomo em causa.
41. Importa ainda realçar que a necessidade de interpretar de modo estrito a referida disposição não pode levar a que seja conferido a cada membro de um agrupamento autónomo o direito de privar os outros membros desse agrupamento do benefício da isenção do IVA, decidindo, a todo o momento, não recorrer a tal ou tal prestação fornecida pelo agrupamento, do qual, não obstante, escolheu inicialmente fazer parte. Nem a redacção nem a finalidade do artigo 13.°, A, n.° 1, alínea f), da Sexta Directiva permitem concluir que cada membro de um agrupamento autónomo dispõe individualmente de tal direito.
42. As prestações fornecidas por um agrupamento autónomo aos seus membros ao longo de diferentes exercícios fiscais, ou mesmo fornecidas a um único ou a alguns dos seus membros durante um mesmo exercício fiscal, devem, pois, poder beneficiar da isenção prevista na referida disposição.
43. Resulta de todas as precedentes considerações que importa responder à questão submetida que o artigo 13.°, A, n.° 1, alínea f), da Sexta Directiva deve ser interpretado no sentido de que, desde que estejam preenchidos os outros requisitos impostos por esta disposição, as prestações de serviços fornecidas aos seus membros por agrupamentos autónomos beneficiam da isenção prevista na referida disposição, mesmo quando estas prestações sejam fornecidas a um único ou a alguns dos referidos membros. …”.
Assim, como se retira do aresto agora apontado, mesmo considerando o que ficou exposto quanto à análise das questões em sede de isenção, tem de concluir-se que a conduta de um dos membros do agrupamento, que no fundo, traduz-se no seu alheamento em relação à actividade do ACE não pode colocar em crise o direito dos demais beneficiarem da isenção, questionando o Tribunal de Justiça a virtualidade de cada membro do agrupamento dispor de tal direito individualmente, o que nos remete para a prestação de serviços a considerar em função dos seus exactos contornos, matéria que confere total virtualidade à posição da aqui Recorrida.
Com efeito, e como se retira do probatório, o exercício em apreço é susceptível de integrar a isenção prevista na lei, desconsiderada a situação de um dos membros do agrupamento que passou a ter um prorata superior a 10%, mas que não beneficiou da actividade do ACE no exercício em apreço.
Finalmente, importa ainda atender que, à data a que os factos se reportam (2003) vigorava a alínea d) do nº1 do artigo 12º do CIVA, nos termos da qual se previa que poderão “renunciar à isenção, optando pela aplicação do imposto às suas operações (…) os grupos autónomos de pessoas que exerçam uma actividade isenta nos termos do nº 23 do artigo 9º, quando a percentagem de dedução de pelo menos um dos seus membros não seja superior à prevista no nº 23-A do mesmo artigo”.
Neste ponto, a sentença recorrida ponderou que “daqui resulta precisamente a possibilidade de os grupos autónomos, referidos no artigo 9º, nº23, não serem unicamente constituídos por pessoas cuja actividade é isenta de imposto. Quer isto dizer, pois, que, nos termos desta disposição legal, não só a inclusão de um membro com prorata superior a 10% não põe em causa a isenção quanto aos serviços prestados a outros membros isentos, como é indiferente para estes saber se os membros sujeitos contratam, ou não, os serviços do agrupamento.
Neste entendimento, e como bem refere a sentença recorrida, não se alcança a perspectiva da AT segundo a qual, a propósito da alínea d) do nº1 do artigo 12º do CIVA, se refere que “Muito embora a formulação utilizada não se afigure a mais feliz, a boa interpretação do seu trecho final só pode apontar no sentido de que, caso um dos membros do agrupamento detivesse uma percentagem de dedução superior a 10%, a questão da renúncia à isenção já nem sequer se colocaria. Se a percentagem de dedução de pelo menos um dos membros for superior à estabelecida, o agrupamento está obrigatoriamente num regime de plena tributação, não havendo portanto tributação por que optar”.
Neste ponto, embora não seja decisivo na apreciação da matéria dos autos, tem de concordar-se com a decisão recorrida quando aponta que “a renúncia à isenção a que se aludiu é, pois, admissível desde que um dos membros apure um prorata superior a 10%; de outro passo, o regime de isenção pode manter-se ainda que só um dos membros do ACE registe um prorata inferior a 10%, sendo que, embora a Lei do Orçamento de Estado para 2007, concretamente o seu artigo 62°, tenha revogado a referida alínea d) do n° 1 do art° 12°, do CIVA, tal alteração não pode, sob pena de flagrante retroactividade da aplicação da lei fiscal (que a Constituição Portuguesa impede, nos termos do artigo 103º, nº3), aplicar-se a factos ocorridos, como é o caso, em 2003.
Assim sendo, como é, a liquidação de IVA sobre as prestações de serviços efectuadas pelo impugnante a sujeitos passivos com uma percentagem de dedução não superior a 10%, com base na circunstância de um dos membros (BESI) ter excedido o prorata de 10%, não pode manter-se, pois que, com referência à actividade do ACE, às prestações de serviços efectuadas, elemento relevante no domínio do art. 9º nº 23 do CIVA, não existe suporte legal para tal liquidação, na medida em que não existiu qualquer prestação de serviços relacionada com o membro do ACE cuja situação serve de suporte à alegação da Recorrente, sendo claro, face à decisão do TJCE que a matéria relevante a considerar é da prestação de serviços em causa, o enquadramento da mesma e das entidades envolvidas, recusando uma solução como a proposta pela Recorrente, o que significa que não pode aceitar-se que, perante um membro do ACE com um prorata superior aos 10%, mas que esteve alheado da actividade do ACE, todo o grupo seja tributado, como se tratasse de um sujeito passivo normal para efeitos de IVA, abstraindo das concretas prestações de serviços efectivamente realizadas durante o exercício e do enquadramento das mesmas.
Daí que na improcedência das conclusões da alegação da recorrente, se impõe, nos termos acima expostos, confirmar a decisão aqui sindicada, com todas as legais consequências.
Improcede, por conseguinte, o presente recurso jurisdicional.


4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.
Custas pela Recorrente.
Notifique-se. D.N..

Lisboa, 12 de Junho de 2012

Pedro Vergueiro
Pereira Gameiro
Joaquim Condesso
(1) Introdução ao Imposto Sobre o Valor Acrescentado, Cadernos IDEFF, n.º I - 2.ª Edição, Almedina, pág. 122 segs.
(2)Este direito consubstancia uma das principais características do IVA, íntima e intrinsecamente, ligado ao chamado “método subtractivo indirecto, das facturas, do crédito de imposto ou sistema dos pagamentos fraccionados”, pelo qual se assegura e concretiza a incidência do imposto sobre todas as fases do processo produtivo.