Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1834/10.3BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:04/11/2019
Relator:VITAL LOPES
Descritores:IMPUGNAÇÃO
FACTURAS FALSAS
INSPECÇÃO
VÍCIOS DO PROCEDIMENTO.
Sumário:1. Quando a Administração Tributária desconsidera facturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do artigo 74.º da LGT, competindo à Administração fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da factura não corresponde à realidade. Feita esta prova, passa a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transacção.
2. No que concerne à prova que compete à Administração, o que é imprescindível é que aquela a faça de factos suficientes indiciadores a que o Tribunal possa concluir, “em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência”, pela elevada probabilidade (ou até certeza) de que o negócio declarado por aquelas partes não corresponde à realidade materializada naquela factura”.
3. Nesta tarefa, poderá a Administração Tributária lançar mão de elementos obtidos com recurso à fiscalização cruzada, junto de outros contribuintes, para obter os referidos indícios, pelo que tais indicadores de falsidade das facturas não têm necessariamente que advir de elementos do próprio contribuinte fiscalizado.
4. Se no quadro dos indícios de falsidade das facturas descritos no RIT e validados pelo tribunal, a impugnante não logra fazer prova positiva e concludente de que tais facturas correspondem a reais e efectivas operações económicas, fica afastada a dedutibilidade dos custos representados por tais títulos de despesa.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL


1 – RELATÓRIO

A Exma. Representante da Fazenda Pública, recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou procedente a impugnação judicial apresentada por “B……. Construção Civil, Lda.” contra as liquidações adicionais de IRC e Juros Compensatórios referentes aos exercícios de 2006, 2007 e 2008, no valor total de 193.982,44€.

O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e efeito devolutivo (fls.390).

Nas alegações de recurso, a Recorrente formulou as seguintes Conclusões:

«a) Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença que julgou procedente a impugnação judicial interposta por B……. CONSTRUÇÃO CIVIL, LDA., com o NIF 505……, contra as liquidações adicionais de IRC e de juros compensatórios, referentes aos exercícios de 2006, 2007 e 2008, no valor total de € 193.982,44.

b) As liquidações de IRC impugnadas provêm do facto de não ter sido aceites pela Inspecção tributária, para justificação de custos dos exercícios de 2006 a 2008, os documentos emitidos pelos sujeitos passivos A……. & A……. CONSTRUÇÃO CIVIL, LDA, com o NIF 506….., C…….., LDA, com o NIF 507……, G……., LDA, com o NIF 506…….., S……, LDA, com o NIF 505….., S……., LDA, com o NIF 505….. e W……., LDA, NIF 507…… .

c) O Tribunal a quo determinou a anulação dos actos de liquidação de IRC de 2006, 2007 e 2008, e respectivas liquidações de juros compensatórios, baseado no entendimento de que “…outra conclusão não se alcança que não seja a de que o quadro factual descrito no RIT não suporta a conclusão da AT de que as facturas em causa não representam reais e efectivas operações. E não tendo a AT cumprido, nos termos já assinalados, o ónus da prova que, neste aspecto, lhe cabia, a questão termina logo aí, nenhum ónus se impondo à impugnante de fazer a prova de que adquiriu os serviços descritos nas referidas facturas e que os mesmos lhe foram fornecidos pelos respectivos emitentes.”

d) Não pode a Fazenda Pública, e com o devido respeito, conformar-se com a douta sentença, aqui recorrida, face ao entendimento de que a mesma procede a um desacertado julgamento da matéria de facto, incorrendo em consequente erro de julgamento de direito, com violação do disposto nos artigos 23.º e 42.º n.º 1 al.g) do CIRC, na redacção vigente à data dos factos.

e) Em cumprimento das OI20….., OI20……. e OI20….., foi levada a cabo a acção inspectiva que foi alvo a impugnante, referente aos exercícios de 2006, 2007 e 2008, abrangendo IVA e IRC, em virtude da desconsideração dos custos alegadamente incorridos pela impugnante, referentes a alegadas prestações de serviços tituladas por facturas emitidas pelos sujeitos passivos A….. & A….. CONSTRUÇÃO CIVIL, LDA, com o NIF 506…., C….., LDA, com o NIF 507……, G….., LDA, com o NIF 506……, S……., LDA, com o NIF 505….., S……, LDA, com o NIF 505….. e W……., LDA, NIF 507……, no valor global de € 740.653,03, com o fundamento de que tais entidades não tinham estrutura produtiva capaz de ter prestado à impugnante os serviços que esta declarou ter adquirido daquelas nos anos de 2006 a 2008, o que, aliado ao não pagamento dos mesmos demonstram que estamos em presença de operações simulados, em que tanto o custo como a dedução do IVA não são aceites fiscalmente.

f) E, para tal conclusão, importa considerar os factos a que apelaram os serviços de inspecção tributária e que sustentam o juízo formulado no sentido da existência de indícios fundados susceptíveis de abalar a credibilidade da escrita ou contabilidade organizada da impugnante, a qual, apesar de correctamente organizada, não reflecte a matéria tributável efectiva.

g) Conforme resulta do RIT, da análise conjugada dos elementos contabilísticos com o controlo interno dos fornecedores, designadamente, conta correntes de fornecedores e respectivos documentos de suporte, bem como meios de pagamento, resultou que os cheques emitidos para pagamentos dos alegados serviços prestados ou foram cancelados ou levantados pelos sócios gerentes da impugnante ou por pessoas ao seu serviço, por conseguinte, por pessoas sob as ordens e direcção daqueles.

h) Este facto contrariamente ao entendimento sufragado na douta sentença, constitui-se como índice do juízo formulado pela Administração Tributária, isto é, como indício sério da não prestação dos serviços.

i) A conjugação destes dois tipos de factos, dúvidas sobre a veracidade das facturas emitidas em nome dos fornecedores e a não comprovação do respectivo pagamento permitiu à AT concluir tratar-se de operações simuladas.

j) Tais factos constituem-se como princípio de prova de que as operações em causa tituladas por facturas emitidas pelas entidades acima mencionadas não correspondem a serviços efectivamente prestados por tais sociedades, incumbindo pois à impugnante, e não à Administração Tributária, como parece fazer crer a douta sentença, fazer a prova de tal efectividade.

k) Conforme resulta do RIT, foi verificado existir incoerência entre a actividade reflectida nas vendas e a actividade efectiva dos emitentes das facturas, no caso do sujeito passivo A…… & A……. CONTRUÇÃO CIVIL, LDA, no ano de 2006 nenhum contribuinte declarou fornecimentos ou serviços prestados a este sujeito passivo.

l) Tais factos, ainda que na origem do procedimento inspectivo, consubstanciam-se, desde logo, como factos susceptíveis de suportar o juízo a que chegou a AT para desconsiderar os custos com as prestações de serviços enunciadas, os quais conjugados com os restantes apontados pelos serviços de inspecção, e aqui afirmados, permitem concluir pela existência de indícios sérios da não materialização das operações em apreço.

m) E desta forma se constitui o segundo facto índice, que se impõe constar do probatório, pois do RIT resulta a conclusão, de que efectivamente os fornecedores em causa não possuíam a estrutura produtiva capaz para sustentar os serviços prestados à impugnante, sendo que no caso da G……, LDA, é o próprio representante legal que confirma não ter prestado serviços à “B……., Lda.

n) Daí resultando inequivocamente factos que indiciam a ausência de estrutura empresarial das empresas envolvidas.

o) Assim, dos elementos apontados resultam factos capazes de influir num juízo probabilístico negativo acerca da materialidade das operações alegadamente subjacentes às facturas constantes dos autos.

p) Ao contrário do invocado na douta sentença sob recurso, esses elementos trazidos aos autos pela administração fiscal são elementos probatórios objectivos, porque resultantes das análises à contabilidade e instalações e condições de trabalho dos emitentes envolvidos.

q) A administração tributária provou que seria objectivamente impossível que os emitentes da facturas, que não apresentam quaisquer meios que permitam desenvolver uma actividade económica, tenham emitido facturas com os elevados montantes que foram apurados.

r) Contrariamente ao entendimento sufragado na douta sentença, constituindo-se os factos enunciados, conjugados entre si, como factos dos quais decorre estarmos na presença de sérios indícios da não materialidade das operações, verificamos não resultar dos autos o nexo de causalidade necessário entre as facturas em causa nos autos emitidas pelas concretas sociedades A…… & A…… CONSTRUÇÃO CIVIL, LDA, com o NIF 506….., C……, LDA, com o NIF 507……, G……, LDA, com o NIF 506….., S……., LDA, com o NIF 505….., S……., LDA, com o NIF 505…… e W……, LDA. com o NIF 507….., de forma a poder afirmar-se a materialidade das operações comerciais que a impugnante afirma ter realizado.

s) Pelo que é nosso entendimento que a douta sentença a quo não fez um correcto julgamento da matéria de facto ao desconsiderar cada um desses factos-índice.

t) Os indícios recolhidos, e supra enunciados, pela Administração Tributária são de molde a alicerçar um juízo adequado de probabilidade séria da inexistência material das operações comerciais tal como constantes das facturas em apreço nos autos, sendo que a Impugnante não logrou fazer a prova, nos termos do disposto no artigo 74.º da LGT, de que as facturas titulam efectivamente os serviços delas constantes, uma vez que os documentos apresentados se configuram, como referido, insusceptíveis de sustentar tal a factualidade alegada pela impugnante.

u) A jurisprudência tem entendido que são “indícios suficientes” os que correspondem a elementos de facto juridicamente relevantes, que segundo as regras de experiência comum demonstrem de forma clara, adequada e inequívoca, que existe uma probabilidade séria de existência e quantificação do facto tributário como facto positivo que legitima o direito da Administração Fiscal de tributar.

v) A Lei basta-se assim com um juízo administrativo de valoração da adequação dos factos em que a Administração Fiscal diz formalmente suportar a sua decisão, factos esses que deverão levar à conclusão de existir uma probabilidade séria sobre a existência e quantificação do acto tributário.

w) O ónus da prova que recaía sobre a AT consubstancia-se na prova de indícios sólidos e consistentes de que as operações não representam operações reais, mas não se lhe exige a prova plena de que as transacções existiram.

x) Desta forma, mostrando-se suficientemente indiciada a inexistência das operações em análise, de acordo com o disposto nos artigos 23.º e 42.º n.º 1 al.g) do CIRC (na redacção à data dos factos), e não tendo a recorrida feito a prova correspondente à demonstração da tese por si abraçada, de modo a comprovar a invocada realidade, não podem ser admitidos para efeitos de dedução do custo, mostrando-se legitimada a correcção decorrente do procedimento inspectivo.

y) A douta sentença incorreu, pois, em erro de julgamento de facto, por ter desconsiderado os factos supra enunciados, em pontos 6 a 40, como factos índice que se constituem como prova produzida nos presentes autos legitimadora da actuação da Administração Tributária e Aduaneira, mais desconsiderando factos de que decorre não ter a impugnante feito, como lhe incumbia, prova da materialidade das operações comerciais, com violação subsequente do normativo contido no 23.º e 42.º n.º 1 al.g) do CIRC (na redacção à data dos factos).

z) Por conseguinte a decisão do Tribunal a quo pode e deve ser alterada, considerando-se que os indícios apontados pela Administrações Fiscal são suficientes para suportar o seu juízo sobre a simulação das operações.

aa) Assim, a impugnação judicial nunca pode proceder com fundamento na ilegítima actuação da AT ao corrigir o lucro tributável declarado dos anos de 2006, 2007 e 2008.

bb) A douta sentença sob recurso fez uma incorrecta apreciação a prova e violou os artigos 23.º e 42.º n.º 1 al.g) do CIRC (na redacção à data dos factos) e art.º 74.º nº1 da LGT.

cc) Pelo que, deverá a decisão proferida nos autos ser revogada e substituída por decisão que julgue totalmente improcedente a impugnação, mantendo-se, por legais as liquidações adicionais de IRC do ano de 2006, 2007 e 2008, e correspondentes juros compensatórios.

Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas., concedendo-se provimento ao recurso, deverá a douta sentença recorrida ser revogada e substituída por acórdão que julgue a impugnação totalmente improcedente.
Sendo que, V. Exas. Decidindo, farão a Costumada Justiça.»

Contra- alegou a Recorrida, culminando com as seguintes Conclusões:

«a) Não merece qualquer tipo de censura a douta sentença proferida pelo tribunal a quo, mostrando-se a mesma plenamente válida e correta quer do ponto de vista formal quer substancial.

b) A fundamentação da sentença encontra-se plenamente cumprida expondo-se claramente a motivação da matéria de facto e de direito, que se mostra coerente, lógica, compressível e devidamente suportada.

c) A fundamentação da sentença expõem, de forma completa e concisa, os motivos de facto e de direito que fundamentam a decisão, explicando o exame crítico das provas que serviram para a fundar encontrando-se indicados os meios de prova que serviram para formar a convicção do tribunal, e bem assim os elementos que, em razão das regras da experiência ou de critérios lógicos, constituem o substrato racional que conduziu a que a convicção do Tribunal se formasse no sentido manifestado.

d) Ao contrário do sustentado pela recorrente não se verifica na sentença qualquer desacerto no julgamento da matéria de facto, nem qualquer consequente erro de julgamento de direito, com violação do disposto no artigo 23.º e na alínea g) do n.º 1 do artigo 42.º do CIRC, na redacção vigente à data dos factos

e) Efetivamente, conforme se decidiu em primeira instância, não se mostra suficientemente indiciada a simulação das operações em análise,

f) Não se mostrando legitimada a correção decorrente do procedimento inspetivo.

g) Tendo a recorrida feito a prova correspondente à demonstração da tese por si abraçada, de modo a comprovar a invocada realidade das operações materiais tituladas pelas facturas não consideradas pela AT devendo os respetivos custos ai suportados ser considerados para efeitos da respectiva dedução relativamente ao IRC liquidado com referência aos períodos em causa nos autos.

h) Nenhum dos dois factos índice alegados pela recorrente nas suas alegações de recurso efetivamente se demonstraram ou provaram em qualquer momento dos autos de inspeção ou depois.

i) A este respeito a sentença bem decidiu ao considerar que neste caso, analisando articuladamente os factos índice apontados pela recorrente, é forçoso concluir que a actividade instrutória realizada foi claramente deficitária, não revertendo para o contribuinte o ónus de comprovar a materialidade das operações.

j) Pois a inversão do ónus do probatório só opera verdadeiramente depois de a Administração Tributária ter reunido e invocado indícios sólidos e coerentes capazes de permitir, com razoável certeza, abalar a credibilidade das declarações do contribuinte.

k) Decorre da douta sentença ora recorrida que em relação á hipotética falta de estrutura empresarial dos fornecedores a consideração de tal indício é meramente conclusivo, não tendo sido concretizado em nenhum facto ou dado, objetivo e concreto, que permita sustentar o juízo de valor que a fiscalização faz.

l) Aqui a Administração Tributária tinha, para cumprir o seu ónus de alegação, de indicar os factos que as referidas acções de inspeção estranhas à recorrida, recolheram para chegar à conclusão de que as referidas sociedades não tinham estrutura empresarial.

m) E ligar tais factos em concreto às facturas e respectivos serviços desconsiderados no âmbito da acção inspetiva à impugnante.

n) O facto de os referidos fornecedores serem referenciados em outros processo de inspeção como não detendo estrutura empresarial apta a prestar os serviços facturados à Impugnante, não permite ilidir a presunção de veracidade de que goza a contabilidade dessa mesma Impugnante, desde logo porque não ficou demonstrado que as referidas sociedades não exerciam a actividade para a qual foram constituídas ou que, neste caso concreto, não tenham efetivamente executado os serviços descritos nas facturas.

o) Finalmente quanto à circunstancia de a AT sustentar que os cheques entregues para pagamento das facturas terem sido levantados pelos gerentes da Impugnante, seus funcionários ou cancelados, a sentença ora recorrida, acompanhou e bem a argumentação sempre sustentada pela aqui recorrida, quando esta sempre afirmou que o modo de pagamento descrito, visava documentar tal pagamento que necessariamente teria afinal de ser concretizado em numerário/ dinheiro sendo essa a forma mais corrente neste sector de actividade, nomeadamente nos anos em questão.

p) Tal é uma evidência que decorre das regras da experiência comum, pelo que o referido indício, visto isoladamente, também não permite concluir que os serviços em causa não foram realizados e pagos.

q) Assim e por todo o anteriormente exposto, temos certo que a inversão do ónus do probatório só opera verdadeiramente depois de a Administração Tributária ter reunido e invocado indícios sólidos e coerentes capazes de permitir, com razoável certeza, abalar a credibilidade das declarações do contribuinte.

r) Neste caso, como bem se refere na sentença “…a factualidade descrita não suporta objectivamente a conclusão de que as facturas emitidas pelas referidas empresas não titulam reais e efectivas operações económicas.”

s) Nos presentes autos de impugnação, mas também nos autos de inspeção e de reclamação administrativa, a AT sempre interpretou mal a necessidade que lhe cabia de provar a verificação dos indícios que lhe permitam abalar a credibilidade da contabilidade do SP,

t) E interpretou também mal as regras de valoração da prova, valorando de forma completamente parcial a prova e meios de prova que lhe aproveitavam, desconsiderando os meios de prova e a prova que aproveitavam ao SP, violando desta forma os princípios constitucionais a que esta obrigada no que se refere a uma actuação com um tratamento igualitário e imparcial na sua relação com os particulares.

u) A aqui recorrente foi ao longo destes três processos (Inspetivo/ Reclamação/ Impugnação) torcendo a realidade inicial que esteve na base da inversão do ónus da prova que lhe permitiu atuar, forçando artificialmente a verificação dos dois factos índice que supostamente legitimaram a sua actuação,

v) Não tendo a AT cumprido com o ónus da prova que lhe cabia.

Deve assim, em face do exposto, manter-se in totum a douta decisão a quo com a fundamentação e nos exatos termos em que foi proferida,
Termos em deverá ser negado provimento ao recurso a que ora se responde, com todas as consequências legais, fazendo-se assim JUSTIÇA.»

O Exmo. Senhor Procurador-Geral-Adjunto emitiu mui douto parecer em que conclui pelo provimento do recurso, devendo a decisão recorrida ser revista.

Colhidos os vistos legais, e nada mais obstando, cumpre decidir.

2 – DO OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação do Recorrente (cf. artigos 634.º, n.º4 e 639.º, n.º1 do CPC), a questão central que importa resolver reconduz-se a indagar se a sentença incorreu em erro de julgamento ao concluir que a factualidade relatada não suporta o juízo da AT quanto à falsidade das operações tituladas pelas facturas contabilizadas dos emitentes “A…… & A…… Construção Civil, Lda.”, “C….., Lda.”, “G……, Lda.”, “S……, Lda.”, “S……., Lda.” e “W……, Lda.”, que estão na base dos custos não aceites.

3 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Em 1ª instância deixou-se factualmente consignado:

«…provada a seguinte matéria de facto:
a) A Impugnante, B……, Construção Civil, Lda., encontra-se inscrita para o exercício da actividade de construção de edifícios, com o CAE 041…., executando, essencialmente, trabalhos de pintura – Cfr. relatório de inspecção tributária a fls. 143 a 192 do PAT apenso, que se dá por integralmente reproduzido;

b) Em cumprimento das Ordens de Serviço n.ºs OI20……, OI20….. e OI 20….., foi levada a cabo uma acção inspectiva à Impugnante referente aos exercícios de 2006, 2007 e 2008, abrangendo IVA e IRC – Cfr. idem;

c) A acção de inspecção referida na alínea antecedente foi desencadeada para dar resposta à Proposta de Inspecção nº PIP200……., datada de 27 de Janeiro de 2009, instaurada com base numa informação, prestada no DSIFAE, em Novembro de 2008, no sentido de se promover inspecção ao Sujeito Passivo “B……., Ldª”, por se verificarem irregularidades na sua situação tributária, na sequência de uma acção inspectiva – Cfr. idem;

c) Na sequência da acção inspectiva referida em b), foi elaborado Relatório de Acção Inspectiva do qual consta designadamente o seguinte: “(…) Pela análise aos cheques disponibilizados, pela referida Instituição bancária e apreciação das operações subjacentes aos mesmos, verificou-se, relativamente aos Fornecedores a seguir referenciados, o seguinte:
A…….. & A……… CONSTRUÇÃO CIVIL, LDA - NIPC 506…….
ANO DE 2006
Relativamente a este Fornecedor, verificou-se apenas uma transacção, no ano de 2006, documentada pela factura nº 16…, de 31 de Janeiro de 2006, cujo pagamento foi, formalmente, efectuado, pelo cheque Nº 552……, no montante de 9.904,00 €; todavia este cheque foi cancelado, de acordo com o pedido recebido, no B…., em 21 de Abril de 2008, através do Serviço B….. Net, comprovado pela Declaração enviada pelo B….. (ANEXO – Pags. 1 e 2), o que significa que esta factura não foi paga.

C…….., LDA – NIPC 507…….
ANOS DE 2006, 2007 E 2008
Relativamente a este Fornecedor, todos os pagamentos, formalmente efectuados por cheque foram cancelados ou levantados pelos sócios gerentes da “B….., LDA”, senhores A……, NIF 190……. e J………, NIF 115 …….. ou pelos senhores R………., NIF 242…….. e A….., pessoas estranhas à empresa C……., LDA.
É importante referir que:
• O Sr. R………., NIF 242…….., foi empregado da “B……, LDA” todos os meses dos anos de 2006, 2007 e 2008, sendo incluído na listagem mensal enviada pelo Sujeito Passivo para a Segurança Social, na qual tinha a identificação NIISS PS 111……… .
• O Sr. A………….. foi empregado da “B…….., LDA” nos meses de Dezembro de 2006 e Janeiro a Maio de 2007, sendo incluído na listagem mensal enviada pelo Sujeito Passivo para a Segurança Social, na qual tinha a identificação NIISS PS 118…….. .
ANO DE 2006
Em 2006, este fornecedor emitiu 2 facturas:
• A factura Nº …., de 30 de Novembro de 2006, cujo pagamento foi formalmente efectuado pelo cheque Nº 13……., no montante de 22.081,36 €, foi levantado pelo sócio-gerente da “B………,LDA”, senhor A………., NIF 190…… .
• A factura nº …, de 30 de Novembro de 2006, foi formalmente paga pelo cheque Nº 28….., no montante de 15.273,83 €; todavia este cheque foi cancelado de acordo com o pedido recebido no B….. em 21 de Abril de 2008, através do Serviço B….. Net, comprovado pela Declaração enviada pelo B….. .
ANO DE 2007
Em 2007 este Fornecedor emitiu 17 facturas no montante de 258.346,97 €, cujos pagamentos foram formalmente efectuados por 15 cheques, por vezes de montantes distintos dos das facturas, que totalizaram o montante de 246.860,87 € e mais 3 pagamentos por Caixa, documentados apenas através de Documento Interno, no montante de 11.486,10 €, totalizando o valor de 258.346,97 € (valor igual ao total das facturas).
(…)
NOTA:
De acordo com o que tem vindo a ser relatado relativamente ao Fornecedor C……, LDA concluímos que TODAS as facturas emitidas pelo mesmo nos anos de 2006, 2007 e 2008 não foram pagas.

G……, LDA – NIPC 506…….
ANO DE 2006
Em 2006 este Fornecedor emitiu 5 facturas, no montante de 66.100,30 €, cujos pagamentos foram, formalmente, efectuados por 5 cheques, de montantes iguais aos das facturas.
(…)
NOTA:
De acordo com o que tem vindo a ser relatado, relativamente ao Fornecedor G……., LDA, concluímos que TODAS as facturas emitidas pelo mesmo, no ano de 2006, não foram pagas.

S………, LDA – NIPC 505…….
ANO DE 2006
Relativamente a este Fornecedor, verificou-se apenas uma transacção, no ano de 2006, documentada pela factura Nº …., de 28 de Abril de 2006, no valor de 9.901,48 €, cujo pagamento foi formalmente efectuado pelo cheque nº 203….., no montante de 9.901,48 €; todavia este cheque foi cancelado, de acordo com o pedido recebido no B….., em 21 de Abril de 2008, através do Serviço B…… Net, conforme Declaração enviada pelo B….., o que significa que esta factura não foi paga.

S…….., LDA – NIPC 505……….
ANO DE 2006
Em 2006 este Fornecedor emitiu 7 facturas cujos pagamentos foram, formalmente efectuados por 7 cheques de montantes iguais aos das facturas, no montante de 59.307,12 €.
(…)
NOTA:
De acordo com o que tem vindo a ser relatado, relativamente ao Fornecedor S……., LDA, concluímos que TODAS as facturas emitidas pelo mesmo, no ano de 2006, não foram pagas.

W………, LDA – NIPC 507…….
Anos de 2006 e 2007
Relativamente a este Fornecedor todos os pagamentos formalmente efectuados por cheque foram cancelados ou levantados pelo sócio gerente da “B………, LDA”, senhor A………, NIF 190…….. ou pelos senhores S………., pessoas estranhas à empresa W…….., LDA.
É importante referir que:
O Sr. A………. foi empregado da “B………, LDA” nos meses de Dezembro de 2006 e Janeiro a Maio de 2007, sendo incluído na listagem mensal enviada pelo Sujeito Passivo para a Segurança Social, na qual tinha a identificação NIISS PS 118…… .
ANO DE 2006
Em 2006, este Fornecedor emitiu 14 facturas, no montante de 188.474,82 €, cujos pagamentos foram, formalmente, efectuados por 12 cheques, por vezes de montantes distintos dos das facturas, que totalizaram o montante de 181.197,13 €, e mais um pagamento por Caixa, no montante de 7.277,69 € (relativo a parte da factura Nº …., de 28 de Setembro de 2006, com o valor total de 11.664,63 €), totalizando, assim, o valor de 188.474,82 (valor igual ao total das facturas).
(…)
ANO DE 2007
Em 2007 este Fornecedor emitiu 6 facturas cujos pagamentos foram, formalmente, efectuados por 6 cheques, de montantes iguais aos das facturas no valor total de 80.944,22 €.
(…)
NOTA:
De acordo com o que tem vindo a ser relatado relativamente ao fornecedor W……., LDA, concluímos que TODAS as facturas emitidas pelo mesmo nos anos de 2006 e 2007 não foram pagas.
(…)

III DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA COLECTÁVEL
IDENTIFICAÇÃO DOS FACTOS JUSTIFICATIVOS DAS CORRECÇÕES CUSTOS E IVA INDEVIDAMENTE CONTABILIZADOS
Foram analisados os elementos contabilísticos, nomeadamente os registos efectuados nas contas de Fornecedores, Custos e IVA dedutível e os respectivos documentos de suporte assim como a informação prestada pelos Fornecedores, notificados ao abrigo do dever de colaboração previsto nos termos do nº4 do art. 59º da LGT.
O Sujeito Passivo “B……., LDA”, na sua contabilidade registou formalmente o pagamento das facturas de fornecedores através de cheques do B……, da conta da empresa Nº 241…… .
(…)
CONCLUSÃO:
Os factos descritos levam à conclusão que a empresa “A……. & A……. Construção Civil, Ldª” não tinha estrutura produtiva capaz de ter prestado à “B……., Ldª” o serviço que esta declarou ter adquirido no ano de 2006, o que, aliado ao não pagamento do mesmo pela “B…….., Ldª” demonstra que estamos em presença de operação simulada, em que tanto o custo como a dedução de IVA não são aceites fiscalmente, pelo que se irá proceder à sua correcção, no caso específico do IVA, por infracção ao disposto no artº 19º, nº3, do CIVA.
Em sede de IRC, pelos factos descritos e atendendo a que foi contabilizado um custo que não corresponde à realidade da actividade e que, por isso, é considerado dispensável à obtenção dos proveitos, por se tratar de operação materialmente inexistente, o sujeito passivo infringiu o disposto nos artºs 23º e 42º (actual 45º), Nº1, alínea g), todos do IRC. (…)
CONCLUSÃO:
Os factos descritos levam à conclusão que a empresa “C........, LDA”, não tinha estrutura produtiva capaz de ter prestado à “B........, LDA” os serviços que esta declarou ter adquirido nos anos de 2006 e 2007, o que, aliado ao não pagamento dos mesmos pela “B........, LDA”, demonstram que estamos em presença de operações simuladas, em que tanto o custo como a dedução de IVA não são aceites fiscalmente, pelo que se irá proceder à sua correcção, no caso específico do IVA, por infracção ao disposto no artº 19º, nº3, do CIVA.
Em sede de IRC, pelos factos descritos e atendendo a que, nos anos de 2006, 2007 e 2008, foram contabilizados custos que não correspondem à realidade da actividade e que, por isso, são considerados dispensáveis à obtenção dos proveitos, por se tratarem de operações materialmente inexistentes, o sujeito passivo infringiu o disposto nos artºs 23º e 42º (actual 45º), nº1, alínea g), todos do IRC. (…)
CONCLUSÃO:
Os factos descritos levam à conclusão que a empresa “G........, LDA”, não tinha estrutura produtiva capaz de ter prestado à “B........, LDA” os serviços que esta declarou ter adquirido no ano de 2006, o que, aliado ao não pagamento dos mesmos pela “B........, LDA”, demonstram que estamos em presença de operações simuladas, em que tanto o custo como a dedução de IVA não são aceites fiscalmente, pelo que se irá proceder à sua correcção, no caso específico do IVA, por infracção ao disposto no artº 19º, nº3, do CIVA.
Em sede de IRC, pelos factos descritos e atendendo a que foram contabilizados custos que não correspondem à realidade da actividade e que, por isso, são considerados dispensáveis à obtenção dos proveitos, por se tratarem de operações materialmente inexistentes, o Sujeito Passivo infringiu o disposto nos artºs 23º e 42º (actual 45º), nº1, alínea g), todos do CIRC.
(…)
CONCLUSÃO:
Os factos descritos levam à conclusão que a empresa “S........, LDA”, não tinha estrutura produtiva capaz de ter prestado à “B........, LDA” os serviços que esta declarou ter adquirido nos anos de 2006 e 2007, o que, aliado ao não pagamento dos mesmos pela “B........, LDA”, demonstram que estamos em presença de operações simuladas, em que tanto o custo como a dedução de IVA não são aceites fiscalmente, pelo que se irá proceder à sua correcção, no caso específico do IVA, por infracção ao disposto no artº 19º, nº3, do CIVA.
Em sede de IRC, pelos factos descritos e atendendo a que foi contabilizado um custo que não corresponde à realidade da actividade e que, por isso, é considerado dispensável à obtenção dos proveitos, por se tratar de operação materialmente inexistente, o Sujeito Passivo infringiu o disposto nos artºs 23º e 42º (actual 45º), nº1, alínea g), todos do CIRC.
(…)
CONCLUSÃO:
Os factos descritos levam à conclusão que a empresa “S........, LDA”, não tinha estrutura produtiva capaz de ter prestado à “B........, LDA” os serviços que esta declarou ter adquirido nos anos de 2006 e 2007, o que, aliado ao não pagamento dos mesmos pela “B........, LDA”, demonstram que estamos em presença de operações simuladas, em que tanto o custo como a dedução de IVA não são aceites fiscalmente, pelo que se irá proceder à sua correcção, no caso específico do IVA, por infracção ao disposto no artº 19º, nº3, do CIVA.
Em sede de IRC, pelos factos descritos e atendendo a que foram contabilizados custos que não correspondem à realidade da actividade e que, por isso, são considerados dispensáveis à obtenção dos proveitos, por se tratarem de operações materialmente inexistentes, o Sujeito Passivo infringiu o disposto nos artºs 23º e 42º (actual 45º), nº1, alínea g), todos do CIRC.
(…)
CONCLUSÃO:
Os factos descritos levam à conclusão que a empresa “W........, LDA”, não tinha estrutura produtiva capaz de ter prestado à “B........, LDA” os serviços que esta declarou ter adquirido nos anos de 2006 e 2007, o que, aliado ao não pagamento dos mesmos pela “B........, LDA”, demonstram que estamos em presença de operações simuladas, em que tanto o custo como a dedução de IVA não são aceites fiscalmente, pelo que se irá proceder à sua correcção, no caso específico do IVA, por infracção ao disposto no artº 19º, nº3, do CIVA.
Em sede de IRC, pelos factos descritos e atendendo a que foram contabilizados custos que não correspondem à realidade da actividade e que, por isso, são considerados dispensáveis à obtenção dos proveitos, por se tratarem de operações materialmente inexistentes, o Sujeito Passivo infringiu o disposto nos artºs 23º e 42º (actual 45º), nº1, alínea g), todos do CIRC.
(…)
IRC
Dado que os factos descritos evidenciam que o Sujeito Passivo, nos exercícios de 2006, 2007 e 2008, contabilizou como custo do exercício, em sede de IRC, facturas que, dada a sua natureza e modo de pagamento, correspondem a negócios não existentes, não está comprovado que os respectivos montantes sejam necessários para a realização dos proveitos, logo não podem ser aceites como custo do exercício, ao abrigo dos artºs 23º e 42º (actual 45º), nº1, alínea g), todos do CIRC.
O montante corrigido corresponde à soma das facturas contabilizadas, alegadamente emitidas pelos fornecedores atrás referidos (…)
CORRECÇÃO DOS SUBCONTRATOS
Dado que a correcção efectuada aos exercícios de 2006, 2007 e 2008 foi resultado da não aceitação de Custos (Subcontratos) declarados pelo Sujeito Passivo, demonstram- se, de seguida, as respectivas correcções, no seguinte Quadro:

ANOS SUBCONTRATOS
Custos declarados Correcções Custos corrigidos
2006 479.835,13 € 306.647,01 € 173.188,12 €
2007 429.778,24 € 314.683,31 € 115.094,93 €
2008 131.454,95 € 30.321,00 € 10.133,95 €

APURAMENTO DO LUCRO TRIBUTÁVEL DE IRC

Relativamente aos exercícios de 2006, 2007 e 2008, o Sujeito Passivo declarou, no Quadro 7 das Declarações de rendimentos de IRC, Lucro Tributável, nos valores referidos no Quadro a seguir apresentado, que acrescido das correcções efectuadas, perfaz lucro tributável corrigido, conforme cálculos a seguir apresentados no Quadro:

ANOS Lucro tributável declarado Correcções Lucro tributável corrigido
2006 100.546,50 € 306.647,07 € 407.193,51 €
2007 126.905,29 € 314.683,31 € 441.588,60 €
2008 165.344,33 € 30.321,0 € 195.665,33 €
(…)

Conforme exposto anteriormente, considera-se que as correcções propostas no Projecto de Conclusões de Relatório, relativamente aos exercícios de 2006, 2007 e 2008 se deverão manter porque o Sujeito Passivo não apresentou factos concretos, no exercício do Direito de Audição, que demonstrassem ser incorrecta a respectiva fundamentação.(…)” – Cfr. relatório de inspecção tributária a fls. 143 a 192 do PAT apenso, o qual se dá, aqui, por integralmente reproduzido;

d) Na sequência da acção inspectiva mencionada na alínea antecedente foram emitidas as liquidações adicionais de IRC e de juros compensatórios relativas aos exercícios de 2006, 2007 e 2008 com os números, respectivamente, 2010 831…….., 2010 831….. e 2010 831….. – Cfr. documentos a fls. 94 a 102, os quais se dão, aqui, por integralmente reproduzidos;

e) No exercício da sua actividade a Impugnante recorria à contratação de pessoal externo – Cfr. depoimentos das testemunhas R………., chefe de equipa de pintura, e da testemunha D…….., engenheiro civil, cujos depoimentos se revelaram assertivos, coerentes e reveladores de um conhecimento directo dos factos;

f) O pagamento aos trabalhadores externos era, com frequência, efectuado em numerário – Cfr. depoimento da testemunha R…….., chefe de equipa de pintura, cujo depoimento se revelou assertivo, coerente e revelador de um conhecimento directo dos factos;

g) Em sede de audiência prévia, relativamente ao projecto de relatório de inspecção, a Impugnante apresentou pronúncia, tendo, com a mesma, junto 260 documentos – Cfr. documentos a fls. 252 a 388, os quais se dão, aqui, por integralmente reproduzidos;

h) No decorrer da execução das obras executadas pela Impugnante era frequente serem emitidos cheques bancários para pagamento das facturas correspondentes à mão- de-obra subcontratada, os quais vinham a ser levantados por forma a ser efectuado o pagamento em numerário aos referidos trabalhadores, por funcionários da Impugnante – Cfr. depoimento da testemunha D……, engenheiro civil, cujo depoimento se revelou assertivo, coerente e revelador de um conhecimento directo dos factos;

i) No decurso das obras efectuadas pela Impugnante era frequente fazerem-se adiantamentos ao pessoal em numerário, os quais eram anotados e no fim do mês era feito o acerto de contas – Cfr. depoimento da testemunha R……., chefe de equipa de pintura, cujo depoimento se revelou assertivo, coerente e revelador de um conhecimento directo dos factos.

*
Factos não provados
Dos factos com interesse para a decisão da causa e constantes da impugnação, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.

Motivação da decisão de facto
A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório, bem como nos depoimentos das testemunhas inquiridas, que se revelaram esclarecedores e coerentes, revelando um conhecimento directo do modus operandi da Impugnante, nomeadamente no que diz respeito ao modo de pagamento aos trabalhadores em obra.
Resulta dos depoimentos das testemunhas e da conjugação destes com a prova documental existente nos autos que as obras foram feitas e os pagamentos efectuados em numerário aos trabalhadores, depois de efectuados os autos de medição. Os serviços de inspecção tributária não questionaram a realização das obras em causa. Os restantes factos alegados não foram julgados provados ou não provados, por constituírem considerações pessoais ou conclusões de facto ou de direito e por não terem relevância para a decisão da causa.»

Ao abrigo do disposto no art.º662/1 do CPC, adita-se ao probatório o seguinte facto, documentalmente provado como se indica:

j) O S.P. impugnante foi notificado do início da acção inspectiva reportada ao ano de 2006 em 23/02/2010 e reportada aos anos de 2007 e 2008, em 19/03/2010, datas estas em que assinou as Ordens de Serviço n.º200…… e 200….. e 200….., que determinaram o procedimento com referência àqueles aludidos anos (cf. fls.137 a 139 do PA).

Reformula-se o probatório quanto aos factos «não provados», passando a ter a seguinte redacção:

Dos factos com interesse para a decisão da causa e constantes da impugnação, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita, nomeadamente, não se provou que a AT tenha recusado à impugnante o acesso à consulta do processo em que é visado o próprio S.P. (inexiste qualquer elemento de prova).

4 – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Mostram os autos e o probatório que a impugnante foi sujeita a uma acção inspectiva de que resultaram, entre outras, correcções à matéria tributável do IRC referenciado aos anos de 2006, 2007 e 2008, pela desconsideração dos custos contabilizados com base em facturas emitidas pelos sujeitos passivos “ Construção Civil, Lda.”, “C........, Lda.”, “G........, Lda.”, “S........s, Lda.”, “S........, Lda.” e “W........, Lda.”.

A ver da Administração tributária, a factualidade apurada e relatada suporta o juízo extraído de que as facturas daqueles emitentes não representam reais e efectivas operações económicas.

A sentença, todavia, não validou o juízo fáctico formulado pela AT, com o que se não conforma a Recorrente. Vejamos.

Como tem sido realçado, reiterada e uniformemente, pela jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores, nomeadamente por este Tribunal Central Administrativo Sul (vd. Ac. de 07/06/2018, tirado no proc.º813/11.8 BELRA (09855/16)) quando a Administração tributária desconsidera as facturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do art.º74.º da LGT, competindo à Administração fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que as operações constantes das facturas não correspondem à realidade. Feita esta prova, passa a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transacção – vd., entre muitos outros, os acórdãos do STA, de 20/11/2002, proc.º01483/02 e do TCA Norte de 24-01-2008, processo n.º 01834/04 Viseu, de 24-01-2008, processo n.º 2887/04 Viseu, de 27-01-2011, processo n.º 455/05.7BEPNF e de 18-03-2011, processo n.º 456/05BEPNF.

Assim sendo, importa analisar se a Administração tributária fez a prova que lhe competia na recolha de factos que permitem concluir que às facturas contabilizadas pela Impugnante, ora Recorrida, não subjazem as operações que, alegadamente, teriam implicado a respectiva emissão.

Tenha-se em conta, como também é pacífico na jurisprudência, que não é imperioso que a Administração efectue uma prova directa da simulação. Como em muitos outros casos, haverá que recorrer à prova indirecta, a “factos indiciantes, dos quais se procurará extrair, com o auxílio das regras de experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém directamente, mas indirectamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova” – cf. Alberto Xavier, “Conceito e Natureza do Acto Tributário”, pág. 154; também neste sentido, entre outros, o acórdão do TCAN, de 26/04/12, proc.º 00964/06.0 BEPRT.

Ou seja, a Administração Tributária não tem que demonstrar a falsidade das facturas, bastando-lhe evidenciar a consistência desse juízo (Acórdão do STA de 27/10/04, Proc.º810/04), invocando factos que traduzem uma probabilidade elevada de as operações referidas nas facturas serem simuladas, probabilidade elevada capaz de abalar a presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes e dos dados constantes da sua contabilidade – art.º75º da LGT.

Os indícios são definidos por J……. como aqueles factos que “permitem concluir pela verificação ou não verificação de outros factos, em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência” – cit. por Saldanha Sanches, “A Quantificação da Obrigação Tributária”, 2ª edição, pág. 311.

Nesta tarefa e como é salientado no citado Acórdão deste TCA Sul de 07/06/2018, tirado no proc.º 813/11.8 BELRA (09855/16) e do TCAN, de 28/02/2013, proferido no proc.º00383/08.4BEBRG, poderá a Administração Tributária lançar mão de elementos obtidos com recurso à fiscalização cruzada, junto de outros contribuintes, para obter os referidos indícios, pelo que tais indicadores de falsidade das facturas não têm, necessariamente, que advir de elementos do próprio contribuinte fiscalizado, revelando-se até a fiscalização cruzada um procedimento crucial no combate à fraude e evasão fiscais.

Salienta-se, ainda, quanto à questão do ónus da prova e do seu cumprimento pela AT quando esteja em causa a não-aceitação como custo fiscal do exercício do valor reflectido em facturas contabilizadas e reputadas falsas, o recente acórdão do Pleno da Secção do CT do STA, de 17/02/2016, tirado no proc.º0591/15 – embora aí estivesse concretamente em causa a dedutibilidade do IVA, mas cujas considerações valem para o presente - , em que se deixou consignado o seguinte: «Para que a AT, ao abrigo do disposto no nº 3 do art. 19º do CIVA, obste à dedução do IVA mencionado em facturas existentes na escrita do contribuinte e relativamente às quais considera não se terem efectivamente realizado as operações nelas consubstanciadas, não tem de fazer prova da existência de acordo simulatório (existência de divergência entre a declaração e a vontade negocial das partes por força de acordo entre o declarante e o declaratário, no intuito de enganar terceiros – cfr. art. 240º do CCivil) para satisfazer o ónus de prova que sobre si impende»; «Basta à AT provar a factualidade que a levou a não aceitar a respectiva dedução de imposto, factualidade essa que tem de ser susceptível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte, só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova do direito de que se arroga (o de exercer o direito à dedução do IVA) e que não é reconhecido pela AT, ou seja, o ónus de prova de que as operações se realizaram efectivamente e ocorrem os pressupostos de que depende o seu direito àquela dedução».

Regressando aos autos, vejamos que indicadores seguros, credíveis e consistentes da falsidade das facturas a AT recolheu e aportou ao procedimento e aos autos e o que resultou da prova produzida pelas partes em tribunal.

De banda dos emitentes:

“A………. & J………. CONSTRUÇÃO CIVIL, LDA”.

Não foi possível estabelecer qualquer contacto com os responsáveis da empresa ou o TOC; no ano em causa de 2006, nenhum contribuinte declarou fornecimentos ou serviços prestados a este emitente; a sede da empresa não existe; as facturas não foram emitidas sequencialmente e, existe sobreposição de numeração das que foram requisitadas às gráficas; verificou-se impossibilidade de realização dos serviços facturados, por inexistência de estrutura produtiva (cf. RIT, fls.163 PA);

“C............, LDA.”

Falta de colaboração com a AT no envio dos elementos solicitados; do relatório de fiscalização ao S.P. emitente resultou que: “Com o pessoal que declarou ter ao seu serviço, o sujeito passivo não tinha capacidade para executar todos os serviços facturados aos seus clientes”; “Para o cliente B........, LDA não foi possível aferir a identidade dos fornecedores que prestaram os serviços, sendo certo que a C........ não tinha capacidade para os prestar” (cf. RIT, fls. 166 do PA).

“G............., LDA.”

Falta de colaboração com a AT no envio dos elementos solicitados; Do relatório da fiscalização levada a efeito ao emitente em 2006, consta que, “ouvido o representante legal do sujeito passivo, M…….., em termo declarações, afirmou: no exercício de 2006 desenvolveu a actividade de construção civil, nomeadamente, nas áreas de alvenarias, ladrilho, demolições; confrontado com a listagem de clientes obtida do sistema informático…referente ao ano de 2006, confirma não ter prestado serviços à “B........, LDA.”; não requisitou livros de facturas nas tipografias denominadas S…….., SRL., G……, Lda. e Tipografia M…… e P…….., Lda. (cf. RIT, fls.169 PA).

“S........, LDA.”

O sujeito passivo emitente foi objecto de fiscalização ao ano de 2006, cujo relatório apresentou as seguintes conclusões: “Apesar das diligências efectuadas no sentido de se contactar o sujeito passivo, não foi possível concretizar tal situação”; “…tudo se conjuga para a conclusão de que não existe nem provavelmente existiu uma estrutura associada que prestasse todos os trabalhos descritos nas facturas ou que os mesmos tivessem sido efectivamente realizados, pelo que ponderando todos os dados explanados se conclui existirem indícios fundados de que grande parte da facturação emitida é falsa”.

“S........, LDA”

Falta de colaboração com a AT no envio dos elementos solicitados; o sujeito passivo encontra-se em fase de fiscalização relativamente ao exercício de 2006, tendo-se apurado, das diligências já efectuadas, que a autorização/ alvará para o exercício da actividade de construção civil se encontrava cancelado desde 31/12/2006; as facturas não obedecem a uma ordem cronológica e há facturas com o mesmo número para clientes diferentes, com valores diferentes e em períodos diferentes; não foi possível contactar o TOC que consta do sistema informático e a morada da sede corresponde a uma morada residencial.

“W........, LDA.”

Falta de colaboração com a AT no envio dos elementos solicitados; do relatório da acção de fiscalização aos anos de 2006 e 2007 a que este contribuinte foi sujeito, resultou a seguinte conclusão: “Da análise que efectuamos à contabilidade da empresa e seus documentos de suporte, verificamos que a mesma não merece qualquer crédito. A despesa não tem documentos de suporte e a facturação não obedece a uma numeração sequencial nem cronológica, apesar de faltarem várias facturas em cada um dos exercícios”; “Notificada a empresa para regularizar a contabilidade, não cumpriu”.

De banda do utilizador, ou da relação dos emitentes com o utilizador é referido que os cheques alegadamente destinados ao pagamento das facturas dos emitentes foram levantados por sócios da “B........, LDA.” ou por terceiros com ela relacionados, ou foram cancelados.

Os indícios recolhidos com relação à pessoa dos emitentes apontam prima facie para a falta de credibilidade dos mesmos como reais e efectivos fornecedores/ prestadores dos serviços facturados, pois e, em suma, não apresentam estrutura empresarial para os trabalhos facturados; não emitem facturas de forma sequencial e existe sobreposição de numeração das que foram requisitadas às gráficas; no caso particular da G........, LDA., o responsável legal dela confirma não ter prestado à impugnante quaisquer serviços no ano em casa de 2006 (a que respeita a facturação); a sede das empresas emitentes inexiste ou corresponde a uma morada residencial; a respectiva contabilidade não está devidamente documentada tanto do ponto de vista dos custos como dos proveitos registados.

Todavia e como já se tem salientado em anteriores arestos, nomeadamente no Acórdão do TCAN, de 21/12/2016, tirado no proc.º00477/09.9BEPNF, em que o relator é o mesmo deste, «da circunstância de um sujeito passivo se dedicar à emissão de facturas falsas, não pode concluir-se, sem mais, que não exerça simultaneamente a actividade para que está colectado (no caso dos emitentes, a de construção). Daí a necessidade, também, da recolha de indícios, seguros e credíveis, centrados na relação concreta por ele estabelecida com o utilizador, de modo a poder estabelecer-se algum nexo entre a actividade ilícita do emitente e as operações facturadas ao utilizador. Porque, o que verdadeiramente importa apurar é se os serviços facturados foram efectivamente prestados pelo emitente, independentemente do incumprimento generalizado das obrigações legais e fiscais (art.º31.º, n.ºs 1 e 2 da LGT) a que ele está vinculado no exercício da actividade prestadora.

Serve isto para dizer que um sujeito passivo pode não ter assalariados inscritos na segurança social, não reter e/ ou não entregar ao Estado o imposto sobre remunerações pagas, nem declarar à AT operações com terceiros fornecedores de bens e serviços (…), sem que isso represente de per si um indício forte da irrealidade das operações facturadas, sendo certo que a capacidade empresarial do emitente nem sempre poderá ser apreendida e medida a partir da sua estrutura de custos declarada (com assalariados e operações com terceiros), bastando pensar, no sector da construção civil, na recorrente situação de alocação de trabalho indiferenciado com recurso a mão-de-obra clandestina.

De resto, nem a AT é tão temerária que conclua pela falsidade das facturas só porque emitidas por sujeito passivo sem adequada estrutura de custos declarada para a realização dos serviços facturados, e/ou por se tratar de sujeito passivo que não cumpre as obrigações fiscais a que está vinculado e nisso esgote a sua actividade investigatória» (fim de citação).

Tanto assim, que (também) no caso dos autos foi à procura do rastro do dinheiro, sendo este um dos indicadores mais seguros da falsidade das operações facturadas.

E neste âmbito, apurou-se que os cheques destinados ao pagamento das facturas foram levantados por sócio da impugnante ou por terceiro com ela, impugnante, relacionado, ou foram cancelados.

A explicação ensaiada pela impugnante de que o cancelamento dos cheques se justificaria pela ocorrência de adiantamentos ao pessoal alocado e subsequente acerto de contas pela diferença e o levantamento dos cheques por representante da impugnante se justificaria com o facto de os pagamentos se fazerem em dinheiro vivo ao pessoal alocado a obras suas, embora se apresente consistente e tenha convencido a Mma. juiz recorrida, a verdade é que peca por insuficiente na medida em que não há qualquer suporte probatório que permita afirmar que assim foi no que se refere às concretas operações com os emitentes.

De resto, se atentarmos nos pontos f), g) e h) da matéria assente, a sentença limita-se a dar como provado “ser frequente” aquele modo de actuação da impugnante no que se refere a pagamentos em numerário e adiantamentos ao pessoal, mas não que assim tenha sido na relação com os concretos emitentes.

E era isso que importava à impugnante demonstrar para retirar relevância, como indicador de falsidade das operações facturadas, à situação descrita de que os cheques destinados ao pagamento das questionadas facturas ou eram levantados por representante da impugnante, ou eram cancelados (anulados).

Dito de outro modo, não constam dos autos quaisquer documentados adiantamentos, nem quitação dos montantes entregues em dinheiro aos emitentes ou trabalhadores por eles alocados, parecendo estranho, num juízo de normalidade, que fosse a impugnante a assegurar directamente o pagamento/ adiantamento ao pessoal alocado a obras suas pelos emitentes.

Nesta linha de entendimento, há que dizer que a AT demonstrou os pressupostos da sua actuação, cumprindo, nos termos já expostos, o ónus da prova que, neste ponto e quanto aos fornecedores/ prestadores identificados, lhe competia.

Por conseguinte, foram evidenciados factos objectivos que, no entendimento deste Tribunal, são de molde a concluir fundadamente por um quadro de enorme probabilidade de as operações alegadamente ocorridas entre as partes não corresponderem (materialmente) à realidade pressuposta nas facturas desconsideradas.

Todos esses “factos-índice”, repete-se, numa análise concatenada e ponderados à luz da experiência, são suficientes para permitir à AT, como sucedeu, desconsiderar os custos que têm as apontadas facturas como suporte documental, com o fundamento de que as operações referidas nessas facturas são simuladas.

Note-se que a circunstância de obras a que estão referenciadas as facturas terem sido efectivamente realizadas pela impugnante e para a sua execução ela ter tido necessidade de recorrer à contratação de mão-de-obra externa, assim como a impossibilidade de obter os proveitos declarados sem o concurso dos encargos reflectidos nas questionadas facturas, não se apresentam como argumentos decisivos.

Com efeito, a realização das obras não é questionada pela Administração tributária. O que a AT questiona é que tenham sido aqueles emitentes a realizar as operações descritas nas facturas que emitiram. É que, como se sabe, se as facturas falsas se destinam, por um lado, à obtenção de vantagens económicas que se prendem com o empolamento indevido dos custos incorridos, por outro e o mais das vezes, destinam-se à cobertura de reais e efectivas operações com sujeitos passivos não emitentes.

Assim sendo, como se entende que é, há que concluir que a AT demonstrou os pressupostos da sua actuação, cumprindo, nos termos já expostos, o ónus da prova que, neste ponto, lhe competia – cf. artigo 74º da LGT.

Nessa medida, tendo a Administração cumprido o ónus probatório que sobre si impendia, competia à impugnante demonstrar, através de prova positiva e concludente, que não obstante os indícios de falsidade recolhidos pela AT, as operações facturadas têm subjacente reais e efectivas operações económicas com os emitentes.

Ora, tal prova não foi conseguida, não se alcançando no probatório nem nos autos quaisquer elementos que permitam afirmar a realidade das operações facturadas pelos referidos emitentes, “A........ & A..........Construção Civil, Lda.”, “C........, Lda.”, “G........, Lda.”, “S.........., Lda.”, “S........, Lda.” e “W........, Lda.”.

A sentença recorrida, ao não validar o juízo conclusivo da AT quanto à falsidade das operações representadas pelas facturas daqueles seis emitentes incorreu em erro de julgamento, não podendo manter-se na ordem jurídica, assim se concedendo provimento ao recurso.

Passando ao conhecimento em substituição das questões que a sentença não conheceu por prejudicadas em virtude da solução jurídica dada ao litígio (art.º665.º, n.º2 do CPC) – e depois de ouvidas ambas as partes nos termos do preceituado no n.º3 daquele artigo 665.º do CPC, sendo que apenas a Recorrida respondeu nada tendo trazido de novo sobre as questões da impugnação a conhecer – invocava a impugnante na douta P.I., os seguintes vícios formais do procedimento:
i. Não foram entregues no inicio do procedimento ao S.P. quaisquer credenciais, despachos ou ordens de serviço, só o tendo sido em momento muito posterior, apesar de logo no primeiro dia, crê-se a 22.02.2010, terem sido solicitados tais documentos à Sra. Inspectora, em clara violação do disposto no art.º46.º e 51.º do RCPIT;
ii. Violação dos prazos de conclusão do procedimento por via desse facto;
iii. A presente acção inspectiva tem os mesmos fins, âmbito e extensão de uma outra já realizada, com os despachos/ Ordens de Serviço n.ºDI200……. .
iv. Impossibilidade de consulta do processo previamente à audição prévia no procedimento de inspecção.

Apreciando:

Como se alcança dos autos e do aditado probatório, o S.P. impugnante foi notificado do início da acção inspectiva reportada ao ano de 2006 em 23/02/2010 e reportada aos anos de 2007 e 2008, em 19/03/2010, datas em que assinou as Ordens de Serviço n.º2009….. e 2009…… e 2009….., que determinaram o procedimento com referência àqueles aludidos anos.

Alega a impugnante que não foi notificada das Ordens de Serviço n.ºs 2009……. e 2009…… no início do procedimento mas só muito depois, após iniciados os actos de inspecção.

Dispõe o n.º1 do art.º46.º do RCPIT, aprovado pelo DL n.º413/98, de 31 de Dezembro, que «O início do procedimento externo de inspecção depende da credenciação dos funcionários e do porte do cartão profissional ou outra identificação passada pelos serviços a que pertençam».

Estabelece o seu n.º2 que «Consideram-se credenciados os funcionários da Direcção-Geral dos Impostos munidos de ordem de serviço emitida pelo serviço competente para o procedimento ou para a prática do ato de inspeção ou, no caso de não ser necessária ordem de serviço, de cópia do despacho do superior hierárquico que determinou a realização do procedimento ou a prática do ato.».

Por outro lado, estabelece o n.º1 do art.º51.º do mesmo diploma que «Da ordem de serviço ou do despacho que determinou o procedimento de inspecção será, no início deste, entregue uma cópia ao sujeito passivo ou obrigado tributário, excepto nas situações previstas no n.º 6 do artigo 46.º».

Estatui o seu n.º2 que «O sujeito passivo ou obrigado tributário ou o seu representante deve assinar a ordem de serviço indicando a data da notificação, a qual, para todos os efeitos, determina o início do procedimento externo de inspecção».

E o art.º47.º do RCPIT estatui que «É legítima a oposição aos actos de inspecção com fundamento na falta de credenciação dos funcionários incumbidos da sua execução.».

O acervo normativo citado permite concluir que não estando o funcionário munido da ordem de serviço que determina o procedimento externo, o inspeccionado pode opor-se legitimamente aos actos de inspecção (cf. artigos 10.º, 32.º e 59.º do RCPIT). Todavia, não alcançamos nos autos qualquer prova da ocorrência do incidente de oposição, pelo que só pode entender-se que o inspeccionado se conformou com os actos de inspecção levados a efeito com anterioridade à data em que assinou a Ordem de Serviço. E há que concordar com a AT quando refere que a eventual preterição de formalidade decorrente da falta de entrega ao S.P. inspeccionado da Ordem de Serviço no inicio da acção inspectiva, não se reflecte na validade da liquidação, só assim não sendo, acrescentamos nós, se por via do direito de resistência defensiva à acção inspectiva (art.º47.º do RCPIT) fossem retiradas consequências desfavoráveis para o contribuinte, nomeadamente, o recurso a métodos indirectos no apuramento da sua situação tributária, por aplicação do disposto nos artigos 10.º do RCPIT e 63.º, n.º4 e 88.º b), da LGT, que não foi o caso.

Por outro lado, note-se, no que respeita à violação dos prazos de conclusão do procedimento, para efeitos de caducidade, não vemos como tal possa legalmente ocorrer por falta de entrega da O. S. logo no início da acção inspectiva, pois a lei é clara: «O sujeito passivo ou obrigado tributário ou o seu representante deve assinar a ordem de serviço indicando a data da notificação, a qual, para todos os efeitos, determina o início do procedimento externo de inspecção» (art.º51/2 RCPIT).

Ou seja, e para efeitos do disposto nos artigos 45.º e 46.ºda LGT, o dies a quo da suspensão do prazo de caducidade do direito à liquidação só ocorre na data de assinatura da ordem de serviço; e o prazo máximo de seis meses de duração da inspecção externa encontra o seu termo inicial a partir dessa mesma data.

Não há portanto qualquer situação de incerteza, por virtude da falta de entrega ao contribuinte da O.S. no início da acção inspectiva, quanto aos prazos de início e duração da suspensão da caducidade do direito de liquidação por virtude da inspecção externa.

Por outro lado e no que respeita à alegação de que a acção inspectiva visa os mesmos fins, âmbito e extensão de uma outra já realizada, com os despachos/ Ordens de Serviço n.ºDI2008….., vejamos.

Na redacção então vigente, dispunha o n.º4 do art.º63.º da LGT: «O procedimento da inspecção e os deveres de cooperação são os adequados e proporcionais aos objectivos a prosseguir, só podendo haver mais de um procedimento externo de fiscalização respeitante ao mesmo sujeito passivo ou obrigado tributário, imposto e período de tributação mediante decisão, fundamentada com base em factos novos, do dirigente máximo do serviço, salvo se a fiscalização visar apenas a confirmação dos pressupostos de direitos que o contribuinte invoque perante a administração tributária e sem prejuízo do apuramento da situação tributária do sujeito passivo por meio de inspecção ou inspecções dirigidas a terceiros com quem mantenha relações económicas».

A violação do preceituado naquele artigo apenas ocorre na medida em que sejam realizados mais do que um procedimento inspectivo externo em relação ao mesmo sujeito passivo, imposto e período de tributação – vd. Acórdão deste TCA Sul, de 29/06/2016, tirado no proc.º09297/16.

Pois bem, quanto ao lugar de realização, o procedimento é externo «quando os actos de inspecção se efectuem, total ou parcialmente, em instalações ou dependências dos sujeitos passivos ou demais obrigados tributários, de terceiros com quem mantenham relações económicas ou em qualquer outro local a que a administração tenha acesso» -art.º13.º, alínea b), do RCPIT.

Diz a impugnante que foi objecto de anterior inspecção externa àquela que se concretizou ao abrigo das Ordens de Serviço OI200……, OI200…… e OI 200…….

Mas não é assim, pois como se deixou consignado no RIT (fls.146 do PA), «A acção de inspecção é de âmbito parcial, nos termos da alínea b) do n.º1 do art.º14.º do RCPIT, com incidência em IRC e IVA, relativamente aos exercícios de 2006, 2007 e 2008 e foi desencadeada para dar resposta à Proposta de Inspecção n.ºPIP200……, datada de 27 de Janeiro de 2009, instaurada com base numa informação prestada no DSIFAE, em Novembro de 2008, no sentido de se promover inspecção ao sujeito passivo “B........, LDA.”, por se verificarem irregularidades na sua situação tributária, na sequência de uma acção inspectiva»

Ora, como resulta do exposto e melhor é explicado na informação da Direcção de Finanças de 20/12/2011, que constitui fls.365/383 do PA, «o procedimento inspectivo ordenado pelo DSIFAE, ao abrigo do artigo 46.º/4 e 5 do RCPIT não necessita de qualquer ordem de serviço, pois visou apenas a “consulta, recolha e cruzamento de elementos”. Nessa medida, recolhida a informação pretendida, não se pretende verificar o cumprimento das obrigações dos sujeitos passivos no domínio de qualquer imposto».

E de facto, como decorre do disposto no art.º46.º, n.º4, do RCPIT, «Não será emitida ordem de serviço quando as acções de inspecção tenham por objectivo:
a) A consulta, recolha e cruzamento de elementos;
b) (…)».

Pois bem, tendo sido “a consulta, recolha e cruzamento de elementos” o escopo do procedimento determinado pelo Despacho n.ºDI200…., não pode ter-se por violado o disposto no art.º63.º, n.º4, da LGT por duplicação de procedimento, pois falece o pressuposto de duas acções inspectiva externas visando o cumprimento de obrigações tributárias do sujeito passivo em sede de IVA e IRC dos exercícios de 2006, 2007 e 2008.

Por fim, no que respeita à alegada recusa da AT no acesso ao processo previamente à audição prévia, como se deixou consignado no reformulado probatório, tal não resultou evidenciado nos autos e, por conseguinte, do alegado não se pode extrair qualquer consequência jurídica por ilegal restrição ao exercício do direito de participação.

Assim, improcedem in totum os vícios formais invocados na P.I. com relação às liquidações impugnadas de IRC.

5 - DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em:
i. Conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida;
ii. Conhecendo em substituição, julgar a impugnação judicial totalmente improcedente.

Custas a cargo da Recorrida em ambas as instâncias.

Lisboa, 11 de Abril de 2019



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Vital Lopes








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Joaquim Condesso





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Tânia Meireles da Cunha