Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:05020/09
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:01/29/2015
Relator:CRISTINA DOS SANTOS
Descritores:AULAS DE SUBSTITUIÇÃO - SERVIÇO DOCENTE EXTRAORDINÁRIO
Sumário:1.São dois os conceitos operatórios de referência para delimitação do serviço docente extraordinário: um de natureza subjectiva centrado no docente; outro de natureza objectiva centrado na actividade prestada – artº 83º nºs. 1 e 2 ECD.

2. A referência operatória de natureza subjectiva, considera como serviço docente extraordinário o “prestado além do número de horas da componente lectiva a cujo cumprimento o docente está obrigado”, na dimensão do horário de trabalho correspondente à distribuição das horas de serviço docente lectivo ao longo do dia, respeitando os limites máximos relativos a este período normal de trabalho - art° 83° n° l ECD.

3. A referência operatória de natureza objectiva, considera o tipo de actividade que constitui serviço docente extraordinário recorrendo a uma dupla remissão normativa: primeiro do nº 2 art° 83° para o nº 3 al. e) do art° 82° seguida para o n° 2 al. m) e n° 3 do art° 10°, todos do ECD.

4.O ECD integra expressamente na “componente não lectiva do pessoal docente”, a título de trabalho compreendido na “substituição de outros docentes” para “suprir a ausência imprevista e de curta duração do respectivo docente” e, consequentemente, impõe a respectiva remuneração no quadro do “serviço docente extraordinário”, tudo conforme as disposições conjugadas dos artºs. 10° nº 2 m) e n° 3, ex vi 82° nº 3 e) ex vi 83° n° 2, do ECD.

5. O despacho ministerial n° 17 387/2005 de 12.08 é inidóneo para introduzir, modificar ou extinguir os requisitos fixados por fonte normativa de natureza superior, v.g. o Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensino Básico e Secundário (ECD), aprovado pelo DL 139-A/90 de 28.04, com as alterações introduzidas pelo DL 1/98 de 02.01.

6. O artº 2º nº 5 d) do despacho ministerial n° 17 387/2005 de 12.08 ao determinar que o acompanhamento de alunos em caso de ausência do respectivo docente integra a componente lectiva, acarreta como consequência a aplicabilidade às aulas de substituição da escala remuneratória do valor /hora normal.

7. O artº 2º nº 5 d) do despacho ministerial n° 17 387/2005 configura disposição contra legem, no confronto com o regime do ECD, por degradar a base de incidência do dever retributivo no tocante à amplitude do serviço docente extraordinário, na medida da desqualificação da natureza jurídica do trabalho prestado em aulas de substituição por ausência do respectivo docentes.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:O Ministério da Educação inconformado com o o acórdão proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada dele vem recorrer, concluindo como segue:

1. Nos presentes autos, ao arrepio do entendimento do TAF de Almada, o Autor tem marcado no seu horário desde o início do ano, horas da componente não lectiva para determinado fim, em obediência a um plano que visa a integral ocupação dos alunos;
2. As funções desempenhadas em regime de substituição não se enquadram no regime do artigo 10°, n°2, alínea m) do ECD;

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O Recorrido contra-alegou concluindo como segue:

1. A douta sentença fez correcta aplicação da lei à materialidade assente vertida nos autos.
2. Não foram violadas as normas do n° 2 do artigo 83° que remete para a alínea e) do artigo 82°, que por sua vez remete para a alínea m) do 2) e do 3) do artigo 10 do E.C.D. - D.L. 139-A/90, de 28/04, com alterações do D.L. n° 105/97, de 29/04 e Lei 1/98, de 2/01 e D.L. 15/97, de 19/01/07. 3a- Tendo de ser confirmada no acórdão a prolatar.


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Colhidos os vistos legais e entregues as competentes cópias aos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem para decisão em conferência.

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Nos termos do regime do artº 663º nº 6 CPC remete-se para o probatório nos termos da decisão em 1ª Instância.



DO DIREITO


Pela Ilustre Magistrada do Ministério Público foi exarado parecer cujo teor se transcreve na parte julgada útil ao objecto do recurso.

“(..) III - A questão em apreciação reconduz - se a saber se o acompanhamento de alunos em actividades educativas em substituição de outro docente na ausência imprevista e de curta duração deste, se enquadram no regime do art. 10° n° 2 ai. m) do ECD e como tal se encontram abrangidas pelo art. 82° n° 3 ai. e) e 83° n° 2 do ECD (aprovado pelo DL n° 139-A/90 de 28/04, com as alterações do DL n° 1/98 de 02/01) considerando - se trabalho extraordinário com direito à retribuição respectiva.
A alínea m), do n° 2, do art° 10°, subordinado ao título " deveres profissionais" estipula que cumpre aos docentes "assegurar a realização, na educação pré-escolar e no ensino básico, de actividades educativas de acompanhamento de alunos, destinadas a suprir a ausência imprevista e de curta duração do respectivo docente".
Por sua vez, o n° 3 do mesmo artigo refere que " para os efeitos do disposto na alínea m) do número anterior, considera-se ausência de curta duração a que não for superior a 5 dias lectivos na educação pré-escolar e no 1. ° ciclo do ensino básico ou a 10 dias lectivos nos 2. ° e 3. ° ciclos do ensino básico ".
De acordo com o artigo 76° do ECD o pessoal docente em exercício de funções é obrigado à prestação de trinta e cinco horas semanais de serviço (n°l) sendo que este horário semanal, nos termos do n° 2 do mesmo art. integra uma componente lectiva e uma componente não lectiva e desenvolve-se em cinco dias de trabalho.
A duração da componente lectiva é a determinada no artigo 77° do ECD, a qual, porém, para os docentes do ensino básico e secundário, é reduzida nos termos do art. 79° do mesmo diploma.
Por sua vez, a componente não lectiva é determinada no artigo 82° que a estipula nos termos seguintes:
"l- A componente não lectiva do pessoal docente abrange a realização de trabalho a nível individual e a prestação de trabalho a nível do estabelecimento de educação ou de ensino.
2- O trabalho a nível individual pode compreender, apara além da preparação das aulas e da avaliação do processo ensino -- aprendizagem, a elaboração de estudos e de trabalhos de investigação de natureza pedagógica ou científico -pedagógica.
3- O trabalho a nível do estabelecimento de educação ou de ensino deve integrar - se nas respectivas estruturas pedagógicas com o objectivo de contribuir para a realização do projecto educativo da escola, podendo compreender: a)...b)...c)...d)...
e) A substituição de outros docentes do mesmo estabelecimento de educação ou de ensino, nos termos da alínea m) do n°2 e do n°3 do artigo 10° do presente Estatuto.
Por fim, e para o que aqui nos interessa, o artigo 83° do ECD prescreve que se considera serviço docente extraordinário aquele que, por determinação do órgão de administração e gestão do estabelecimento de educação ou de ensino, for prestado além do número de horas da componente lectiva a cujo cumprimento o docente está obrigado (n°l).
Considerando ainda o n° 2 do mesmo artigo e diploma legal serviço docente extraordinário o que for prestado nos termos da alínea e) do n°3 do artigo anterior.
Mais estipula o n° 3 deste artigo que o docente não pode recusar-se ao cumprimento do serviço extraordinário que lhe for distribuído resultante de situações ocorridas no decurso do ano lectivo, podendo no entanto solicitar dispensa da respectiva prestação por motivos atendíveis.
Da conjugação destas disposições legais resulta que as aulas de substituição, quer se considerem na componente lectiva, quer se considerem na componente não lectiva, sempre a lei integra essas funções como serviço docente extraordinário.
Com efeito, como se pode ler no Ac. do TCAN de 21/02/2008, Rec. 00721/06.4BEVIS, que acompanhamos, « Segundo o recorrente, esse serviço que o autor foi chamado afazer enquadra-se na componente não lectiva do respectivo horário de serviço, nomeadamente a título de acompanhamento de alunos na ausência do docente [AAAD], e não na sua componente lectiva ou equiparada, pelo que não poderá ser qualificado de serviço docente extraordinário.
Cremos, todavia, em face das normas legais aplicáveis, que não lhe assiste razão.
Como decorre do referido artigo 83°, o conceito legal de serviço docente extraordinário não respeita a serviço prestado além da carga horária semanal global [artigo 76° n°l], mas a serviço prestado além da duração especialmente contemplada para uma das componentes em que se subdivide essa carga horária global.
Extraordinário será o serviço docente realizado além do número de horas da componente lectiva a cujo cumprimento o docente está obrigado [artigo 83° n°l]. Assim, uma vez que é a carga horária da componente lectiva que permite dizer se o serviço prestado é extraordinário, cremos ser legítimo concluir que o serviço docente extraordinário é, afinal, a componente lectiva prestada pelo docente para além da sua duração normal e obrigatória.
Neste contexto, para que o serviço prestado pelo docente possa relevar como serviço docente extraordinário tem de ser de natureza semelhante àquele que integra a sua componente lectiva obrigatória, pois pensar doutro modo significaria, no fundo, entender que todo o serviço integrado na componente não lectiva seria extraordinário, o que está em completa ruptura com o sistema instituído no ECD.
Não obstante ser esta uma verdadeira matriz jurídica vertida no ECD, ela não impede que o legislador decida tratar, também, como serviço extraordinário, situações especialmente previstas.
É o caso do n°2 do artigo 83° acima referido, segundo o qual se considera ainda como serviço docente extraordinário o que for prestado nos termos da alínea e) do n°3 do artigo anterior, alínea esta que inclui na componente não lectiva do pessoal docente [no âmbito de prestação de trabalho a nível do estabelecimento] a substituição de outros docentes do mesmo estabelecimento de educação ou de ensino, nos termos da alínea m) do n°2 e do n°3 do artigo 10° do ECD, alínea esta que, por sua vez, inclui nos deveres profissionais específicos do pessoal docente o de assegurar a realização, na educação pré-escolar e no ensino básico, de actividades educativas de acompanhamento de alunos, destinadas a suprir a ausência imprevista e de curta duração do respectivo docente [segundo o n°3 do artigo 10° do ECD, e para efeitos da sua alínea m), considera-se ausência de curta duração a que não for superior a 5 dias lectivos na educação pré-escolar e no l ° ciclo do ensino básico ou a 10 dias lectivos nos 2°e 3°ciclos do ensino básico].
Temos, assim, que o n°2 do artigo 83° equipara especialmente a serviço docente extraordinário determinado serviço integrado na componente não lectiva, desde que esse serviço consista em suprir ausências imprevistas e de curta duração de docentes do mesmo estabelecimento de ensino ou de educação.
Como vemos, esta equiparação não significa que a actividade prevista no n°2 do artigo 83° do ECD [constante, por sucessiva remissão, da alínea m) do n°2 do artigo 10o] seja uma actividade substancialmente lectiva, apenas significa que é uma actividade tida como serviço extraordinário por efeito dessa equiparação, e não por uma questão de natureza.
Importa concluir, pois, que o conceito legal de serviço docente extraordinário integra não só a prestação de serviço da componente lectiva para além da concreta carga horária prevista, mas também a prestação que, não obstante integrar a componente não lectiva, lhe é especialmente equiparada nos termos do n°2 do artigo 83° do ECD.» (bola nosso).
Ainda no que se refere ao Despacho Ministerial n° 17387/05 de 28/07, invocado pelo recorrente na parte alegatória do recurso, passamos a citar o Ac. deste TCAS de 30/04/08, Rec. 03077/07, atrás mencionado, o qual quanto a tal questão refere:
« No domínio da boa gestão, nada impede que a direcção executiva das escolas, aquando da elaboração do plano anual de organização do serviço docente, nele integre uma previsão numérica ou percentual sobre faltas de professores e igual previsão de aulas de substituição para colmatar a estimativa de faltas de professores às aulas, tal como estabelece o art° 5° n°s. l e 2 do Despacho n° 17 387/2005 de 12.08.
O que este Despacho n° 17 387/2005 de 12.08 não pode é proceder a uma degradação da base de incidência do dever retributivo no tocante à amplitude do serviço docente extraordinário, através do expediente da desqualificação da natureza jurídica do trabalho prestado em aulas de substituição por ausência às aulas de outros docentes, que o ECD expressamente integra na "componente não lectiva do pessoal docente", a título de trabalho compreendido na "substituição de outros docentes " para "suprir a ausência imprevista e de curta duração do respectivo docente" e, por isso, impondo a respectiva remuneração no quadro do "serviço docente extraordinário", tudo conforme as disposições conjugadas dos art°s. 10° n°2 m) e n° 3, ex vi 82° n"3 e) ex vi 83° n° 2 ECD;
Concretizando, o citado Despacho n° 17 387/2005 de 12.08 dispõe contra legem no art°2° n° 5 d), na medida em que ao determinar que o "acompanhamento de alunos em caso de ausência do respectivo docente" integra, em termos de tempo de trabalho, a componente lectiva, tal acarreta por consequência a aplicabilidade aos tempos de aulas de substituição por faltas lectivas do respectivo docente a escala remuneratória do valor/hora normal. ».
No mesmo sentido, tem vindo a jurisprudência do STA a ser unânime, podendo conferir - se a propósito os recentes Acórdãos de 10/12/08, Rec. 0447/08; de 29/01/09, rec. 0779/08; de 08/01/09, Rec. 0515/08; de 28/01/09, Recs. 0652/08 e 0516/08; de 25/02/09, Recs.0818/08, 0905/08 e 0581/08.
Ainda no mesmo sentido, cfr., Acs. do TC AN de 21/02/08, Rec. 00787/06.7 BEVIS e de 24/01/08, Rec. 00466/06.5 BEVIS, Ac. deste TCAS de 30/04/08, Rec. 03077/07 e Ac. do STA de 03/12/02, Rec. 0426/02.
Assim, tendo sido este também o sentido da sentença ora em recurso e atenta a matéria de facto nela dada como provada, a qual não foi posta em causa, que a mesma não nos mereça qualquer censura, não enfermando do vício que lhe é apontado.
IV - Pelo que, em face do exposto e em conclusão, emito parecer no sentido do presente recurso jurisdicional ser considerado improcedente, mantendo - se a sentença recorrida. (..)”


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Vem assacada a sentença de incorrer em violação primária de direito substantivo por erro de julgamento em matéria de:
1. subsunção das aulas de substituição na componente lectiva
2. conceito de trabalho extraordinário

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O objecto do presente recurso centra-se sobre o elemento "tempo de trabalho", facto jurídico fundamental de toda a relação jurídica de emprego subordinado, importando especificamente o tempo de trabalho docente em "aulas de substituição" que, na tese da Recorrente, são recondutíveis à previsão legal do serviço docente extraordinário, discriminadas por dias e horas levadas ao probatório nos itens F a J, reportadas a Novembro de 2005.
No tocante ao conceito jurídico de "aulas de substituição de professores ausentes" o Recorrente suscita duas questões:
1. as funções desempenhadas em regime de substituição não integram a componente lectiva;
2. as horas prestadas em regime de substituição configuram trabalho extraordinário.

O que, previamente, implica reconduzir os conceitos de "aulas de substituição", "componente lectiva e componente não lectiva" e "trabalho extraordinário" ao quadro legal da relação jurídica de emprego público docente tal como estatuída no Estatuto da Carreira Docente (ECD), designação abreviada do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensino Básico e Secundário, aprovado pelo DL 139-A/90 de 28.04, com as alterações introduzidas pelo DL 1/98 de 02.01.

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Curiosamente, a controvérsia do caso é quase um revisitar da que correu no domínio do contrato de trabalho privado a propósito dos conceitos operativos no sistema da LCT, a que o actual Código do Trabalho pôs cobro, tanto quanto parece, ao clarificar de vez a situação que persistia algo nublada no domínio da LTS.
Efectivamente, a LCT distinguia entre o trabalho prestado para além do "horário de trabalho" mas ainda dentro do "período normal de trabalho semanal", o que gerava não poucos atritos e confusões na medida em que um e outro são conceitos operativos distintos no que tange ao tempo de trabalho: o "horário de trabalho" tem por referência a distribuição das horas de trabalho ao longo do dia; o "período normal de trabalho", seja diário seja semanal, tem a ver com o número que constitui o limite máximo de horas de trabalho, por ex., 8 e 40 horas na actividade privada, 7 e 35 no sector público.
Todavia, a prestação de trabalho fora do "horário de trabalho" de um concreto trabalhador num dado estabelecimento, por vezes não era seguida do pagamento pelo valor/hora extraordinária constante do CCT com base em que não se tinha ultrapassado o limite das horas do "período normal de trabalho diário", o que estava claramente em desconformidade com o regime legal, mas a que este dava azo atenta a ambiguidade do conceito "período normal de trabalho" que constituía, à data, o conceito de referência neste domínio. (1)

Comecemos, então, pelo conceito de trabalho extraordinário.


a) trabalho extraordinário - conceito operatório de referência - período normal de trabalho diário - art° 25° nº l a) DL 259/98, 18.08

Nos termos gerais de direito, em ordem a saber qual o regime que enquadra a retribuição paga ao trabalhador pela prestação de trabalho extraordinário a favor da entidade patronal, cumpre ter presente que a definição de "trabalho extraordinário" configura um conceito relativo.
Qualificar algo como de "extraordinário" convoca implicitamente um raciocínio de conteúdo comparativo entre realidades à partida tidas por diversas, em que uma delas é colocada no patamar do ordinário, do comum, do que vulgarmente ocorre, isto é, no patamar de metro padrão para efeitos de confronto com a outra ou outras realidades que, pelas diferenças evidenciadas, admitem a qualificação de "extraordinárias".
Donde, a definição conceptual de "trabalho extraordinário" no tocante à relação jurídica de emprego público necessita de ser posta em confronto com os conceitos legais de "duração semanal de trabalho", art° 7° n° l do DL 259/98 de 18.08 e de "período normal de trabalho diário", artº 8° n° l do mesmo diploma, no máximo de 35 e 7 horas, respectivamente, corolários em sede de lei ordinária da consagração constitucional do "limite máximo da jornada de trabalho" inserto do art° 59° n° l d) da CRP.
É exactamente de acordo com estes pressupostos e sem prejuízo das delimitações especificas em sede de horário flexível que não vêm ao caso, que o direito positivo em sede de regime geral delimita este conceito considerando o "trabalho extraordinário" como aquele que, em cumprimento de determinação originária da respectiva cadeira hierárquica, é prestado fora do período normal de trabalho diário do trabalhador em concreto - cfr. artº 25° n° l a), DL 259/98, de 18.08. (2)

b) serviço docente extraordinário:
a. prestado para além da componente lectiva obrigatória pelo docente em concreto – artº 83º n° l, ECD
b. em componente não lectiva - substituição por ausência imprevista e de curta duração do respectivo docente -art°s. 10° n° 2 m) e n° 3, ex vi 82° nº 3 e) ex vi 83° nº 2, ECD

No domínio específico do serviço docente temos, à cabeça, a determinação de um regime jurídico próprio, conforme estatuído no art° 75° do ECD, DL 139-A/90 de 28.04, com as alterações introduzidas pelo DL 1/98 de 02.01 - "O pessoal docente rege-se em matéria de duração de trabalho, férias, faltas e licenças pelas disposições constantes dos sub-capítulos seguintes."
Evidentemente que funcionam aqui as regras gerais de direito no tocante à aplicação à actividade do pessoal docente "dos princípios fundamentais consagrados na CRP e no quadro dos princípios gerais e específicos constantes dos art°s. 2° e 3° da Lei de Bases do Sistema Educativo" - cfr. art° 3º ECD.

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Na específica relação jurídica de emprego público o "serviço docente extraordinário" terminologia a que corresponde no contrato de trabalho privado a designação de "trabalho suplementar" (CT, artº 197° n° l), sucedânea da velha terminologia do "trabalho extraordinário" da LCT (artºs. 46° e 47°) -, tem o seu regime condensado no art° 83° ECD.
Trata-se de um conceito jurídico complexo na medida em que para delimitar o respectivo conteúdo a lei recorre a dois conceitos operatórios de referência, um de natureza subjectiva, centrado no docente e outro de natureza objectiva, centrado na actividade prestada, a saber:
(i) o serviço “prestado além do número de horas da componente lectiva a cujo cumprimento o docente está obrigado" - conceito operatório de natureza subjectiva - art° 83° n° l ECD;
(ii) e serviço prestado "nos termos do art° 82° n° 3 e) do ECD" - conceito operatório de natureza objectiva - art° 83° n° 2 ECD;
i. em "substituição de outros docentes do mesmo estabelecimento (..) nos termos do artº 10º nº 2 m) e nº 3 ECD”;
ii. no dever profissional de "assegurar a realização (..) de actividades educativas de acompanhamento de alunos, destinadas a suprir a ausência imprevista e de curta duração do respectivo docente" - art° 10º n° 2 m) ECD;
iii. "considera-se ausência de curta duração a que não for superior a 5 dias lectivos na educação pré-escolar e no 1° ciclo do ensino básico ou a 10 dias lectivos nos 2° e 3° ciclos do ensino básico" - art° 83° n° 3 ECD.


c) conceito operatório de referência de natureza subjectiva – artº 83º n° l ECD - o docente;

Como é evidenciado no texto do art° 83° nº l ECD, a lei é muito precisa ao determinar o que entende por serviço extraordinário, por reporte ao sujeito, considerando como tal,
"aquele que, por determinação do órgão de administração e gestão do estabelecimento de educação ou de ensino, for prestado para além do número de horas da componente lectiva a cujo cumprimento o docente está obrigado".
De que número de horas se fala na lei através do pronome relativo "cujo" ao referir a obrigação de cumprimento do docente é, naturalmente, do número de horas da componente lectiva concretamente atribuído ao docente para esse ano; o mesmo é dizer que estamos a falar do concreto horário de trabalho da componente lectiva que lhe corresponde.
Como já se fez menção, não são passíveis de se confundirem os conceitos de “horário de trabalho” da componente lectiva - que corresponde à distribuição das horas de trabalho ao longo do dia, respeitando os limites máximos relativos a este período normal de trabalho -, e “período normal de trabalho” da componente lectiva - que será de 25, 22 ou 20_horas, consoante se trate de docentes do pré-escolar e 1° ciclo do ensino básico (77° n° 1), 2° e 3° ciclos (77° n" 2) ou secundário e ensino especial (77° n°s 3 e 4).
Ou seja, o período normal de trabalho semanal, no limite máximo de 35 horas, constituído pelas duas componentes lectiva e não lectiva distribuídas por 5 dias consecutivos (76° n°s. l e 2), decompõe-se em períodos normais de componente lectiva de trabalho semanal de 25.horas, 22 horas ou 20 horas consoante o tipo de função docente que esteja em causa (77º n°s. l a 4) no respeito, ainda, do limite diário de 5 horas consecutivas de aulas (78° n° 2).
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Concluindo, no tocante ao conceito operatório de referência, de natureza subjectiva: - todas as horas e serviço docente da componente lectiva - dar aulas, ensinar matéria, transmitir conhecimento aos alunos para memorizar e ficar a saber como referente de cultura geral - que excedam o horário de trabalho da componente lectiva concretamente atribuído ao docente para esse ano lectivo, são horas configuradas por lei como constituindo serviço extraordinário, embora limitado, por regra, a 5 horas semanais por docente - cfr. artº 83° n°s l e 4 ECD;


d) conceito operatório de referência de natureza objectiva - art°s. 10° n° 2 m) e n° 3, ex vi 82° n° 3 e) ex vi 83° n° 2, ECD - tipo de actividade prestada;

Nesta parte que directamente interessa ao caso dos autos, a lei determina o serviço docente extraordinário por referência ao tipo de actividade prestada e não ao docente como na circunstância atrás referida do nº l do art° 83º.
Para especificação do tipo de actividade que constitui serviço docente extraordinário, o ECD recorre à técnica legislativa da remissão de norma a norma, no caso, uma dupla remissão, primeiro do art° 83° n° 2 para o art° 82° nº 3 e) e, depois, deste último para o art° 10° n° 2 m) e n° 3, todos do DL 139-A/90 de 28.04 na versão introduzida pelo DL 1/98 de 02.01.
Da conjugação dos citados normativos decorre que a lei considera como serviço docente extraordinário a actividade destinada a suprir a ausência imprevista e de curta duração de um docente, esclarecendo a lei, ainda, que se considera ausência de curta duração a que não for superior a 5 dias lectivos no pré-escolar e 1° ciclo do ensino básico ou a 10 dias lectivos do 2° e 3º ciclos do ensino básico -cfr. cit. art° 10° n° 3 ECD.
Estamos, pois, em sede de actividade de substituição de docentes que faltaram ao serviço no horário lectivo – ou seja, faltaram à aula -, sendo que, além de terem de ser faltas dadas na componente lectiva esta substituição pressupõe que seja feita por outros docentes do mesmo estabelecimento de educação ou de ensino cfr. arfs 82° n° 3 e) ECD.
Como já mencionado supra, o serviço extraordinário docente na componente lectiva está, por via de regra, subjectivamente limitado a 5 horas semanais, cfr. art° 83° n° 4 ECD.
Todavia, na circunstância particular das horas dadas em substituição da componente lectiva de colega que tenha faltado à aula, não se aplica por expressa determinação legal o limite das 5 horas semanais – cfr. art° 83° n°5 ECD.
O que se explica em função do relevo atribuído pelo legislador ao interesse público de, na falta do professor, não deixar os alunos sem nenhum acompanhamento escolar durante aquela hora de intervalo imprevisto e, por isso, forçado - é exactamente esta a expressão da lei no art° 10° n° 2 m) ECD, “acompanhamento de alunos”; donde, a substituição de docente por ausência imprevista e de curta duração em dia lectivo, ou seja, ausência às aulas, é sempre considerado serviço docente extraordinário sem qualquer limite temporal - cfr. art° 83° n° 5 ECD.
Interesse público que está patente quer no Despacho n° 17 387/2005 de 12.08, quer na Informação n° 133/JM/SEE/2005.

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Uma coisa é o "acompanhamento de alunos" na veste de dever profissional específico do pessoal docente, actividade passível de ser antecipadamente prevista e integrada nos horários elaborados para o ano escolar dos docentes, na componente não lectiva, cfr. artºs. 10° n° 2 d) e 82° nº 3 a), ECD, cujo teor é o seguinte:
- artº 10º n° 2 d) ECD - Deveres profissionais "(..) são deveres profissionais específicos dos docentes (..) -Participar na organização e assegurar a realização das actividades educativas.";
- art° 82° n° 3 a) ECD -Componente não lectiva "(..) O trabalho a nível do estabelecimento deve integrar nas respectivas estruturas pedagógicas com o objectivo de contribuir para a realização do projecto educativo da escola, podendo compreender: - A colaboração em actividades de complemento curricular que visem promover o enriquecimento cultural e a inserção dos educandos na comunidade."
Outra coisa, completamente diferente, é a lei prever, especificamente, o modo de colmatar as faltas às aulas de professores, os chamados "furos” (no horário) expressão pela qual eram denominadas as (raras) faltas de professores, pelos alunos do tempo em que havia Liceos.

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O "acompanhamento de alunos" como actividade pré-ordenada no horário docente anual não é juridicamente recondutivel ao "acompanhamento de alunos" para preencher um "furo" dum colega docente que faltou à aula e é preciso não deixar os discentes à solta, mas tê-los com as mentes serenas e em sossego na sala de aula, pelo menos em tese.
E tanto que não se trata de actividades recondutíveis a idêntica natureza jurídica, que a própria lei, embora inclua ambas as actividades na componente não lectiva, uma na alínea a) e a outra na alínea e) do n° 3 do art° 82° citado, dá-lhes um tratamento jurídico diferente ao nível da natureza de tempo de trabalho e respectivo tratamento remuneratório, sendo uma, a da alínea a), remunerada nos termos do tempo de trabalho normal e a outra, a da alínea e), nos termos do trabalho extraordinário cfr. artº 83° n° 2 e 10º nº 2 m) ECD.
Na medida em que a lei através do ECD, distingue estas actividades de "acompanhamento de alunos" quer em termos de conteúdo e finalidade substantivas quer em termos remuneratórios, à Administração não é admitido, seja por via regulamentar seja por via de acto administrativo, que opte por não observar os pressupostos legais, nomeadamente, para o caso que importa, os pressupostos remuneratórios do tempo de trabalho em caso de verificação dos requisitos definidos na lei para a delimitação do conceito de "serviço docente extraordinário".
O mesmo é dizer que a questão trazida a recurso integra o domínio dos requisitos de dever retributivo do trabalho “segundo a quantidade, natureza e qualidade” a cargo da entidade empregadora, imposto pelo art° 59° n° l a) CRP.

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Concluindo, no tocante ao conceito operatório de referência, de natureza objectiva: - a substituição de docente por ausência imprevista e de curta duração em horário da componente lectiva (observado o limite de 5/10 dias de falta) é sempre considerado serviço docente extraordinário sem qualquer limite temporal - fr. art°s. 10° n° 2 m) e n° 3, ex vi 82° n° 3 e) ex vi 83° n°s 2 e 5 ECD.


e) limites constitucionais do poder regulamentar - art° 199°/c) e g) CRP; preeminência, reserva e precedência de lei - art° 112° n°s. 6 e 8 CRP;
Despacho n° 17 387/2005 de 12.08 - regulamento ministerial;

Em nosso critério o Despacho nº 17 387/2005 de 12.08 é um regulamento ministerial, pois embora identifique os destinatários - as escolas públicas - a verdade é que institui de forma geral e abstracta um acervo de "regras e princípios orientadores" a observar pelas entidades administrativas competentes "em cada ano lectivo, na organização do horário semanal do pessoal docente em exercício de funções nos estabelecimentos públicos de educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário" e ainda "para a organização e programação das actividades educativas que proporcionem aos alunos do ensino básico o aproveitamento pleno dos tempos decorrentes de ausência imprevista do respectivo docente." - art° 1° n°s. l e do citado despacho - decorre dos seus próprios termos que a operacionalidade do comando nele expressamente definido se mostra apto a produzir efeitos de forma reiterada no tempo, isto é, num quadro de vigência sucessiva em função do objecto nele definido.
Recusamos-lhe, assim, a natureza de acto administrativo geral, nomeadamente, a título de circular ou instrução de serviços.

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Nos termos gerais de direito o regulamento configura um acto normativo emanado de órgão da Administração, no exercício da função administrativa e sobre matéria própria da sua competência, com carácter executivo e/ou complementar da lei. (3)
De modo que, "(..) os regulamentos não constituem uma manifestação da função legislativa, antes se revelam como expressões normativas da função administrativa, cfr. art° 199ºc) e g) [da Constituição].
Devido ao facto de se tratar de uma norma jurídica secundária, condicionada por lei, o regulamento está, por um lado, submetido ao princípio da legalidade da administração; por outro lado, o poder regulamentar, ou seja, o poder de a administração criar normas jurídicas, deve ter um fundamento jurídico-constitucional (..)
Isto significa que a administração está vinculada à lei não apenas num sentido negativo (a administração pode fazer não apenas aquilo que a lei expressamente autorize, rnas tudo aquilo que a lei não proíbe), mas num sentido positivo, pois a administração só pode actuar com base na lei, não havendo qualquer espaço livre da lei onde a administração possa actuar como um poder jurídico livre.
É este o entendimento que transparece do art° 266°/2: "Os órgãos e agentes administrativos estão subordinados à constituição e à lei" (..)
(..) A lei tem absoluta prioridade sobre os regulamentos, proibindo-se expressamente os regulamentos modificativos, suspensivos ou revogatórios das leis (cfr. art° 112°/6).
O princípio da preeminência da lei significa a inadmissibilidade, no direito constitucional português vigente, de "regulamentos delegados" ou "autónomos" em qualquer das suas manifestações típicas; (i) os regulamentos derrogatórios (..), (ii) os regulamentos modificativos (..), (iii) os regulamentos suspensivos (..), (iiii) os regulamentos revogatórios (..)"(4)

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Continuando a seguir de perto a lição do Autor citado, atenta a trilogia constitucional em matéria de poder regulamentar da Administração Central temos que, particularmente em domínios sob reserva de lei ou decreto-lei constitucionalmente imposta, como é o caso, - cfr. artº 165° n° l n) CRP - os princípios da reserva e precedência de lei, cfr. art° 112°/8 CRP, impõem, à evidência, que a competência exclusiva dada ao legislador para fixar os requisitos e condições do dever retributivo imposto pelo artº 59° nº l a) CRP aplicável, como e evidente, em sede de "relação jurídica de emprego público, afasta, de todo, a hipótese de regulamentação primária e essencial nestas matérias (reserva de lei em sentido estrito) e obriga à precedência de lei habilitante para qualquer intervenção administrativa regulamentar.
Uma vez que determinada matéria seja regulada por acto legislativo, o grau hierárquico do acto normativo fica congelado, o que significa que "(..) só um outro acto legislativo poderá incidir sobre a mesma matéria, interpretando, alterando, revogando ou integrando a lei anterior. Os princípios da tipicidade e preeminência de lei justificam logicamente o princípio do congelamento do grau hierárquico: uma norma legislativa nova, substitutiva, modificativa ou revogatória de outra, deve ter uma hierarquia normativa pelo menos igual à da norma que se pretende alterar, revogar, modificar ou substituir.
Este princípio não impede, rigorosamente, a possibilidade de deslegalizacão ou de degradação do grau hierárquico. (..)
(..) A função da lei deslegalizadora é clara: (i) função de abaixamento de grau, pois sem a existência da lei deslegalizadora tornam-se inconstitucionais os actos regulamentares com disciplina inovadora ou contrária a uma norma legal; (ii) função autorizante, dado a lei deslegalizante ser simultâneamente uma lei autorizante de disciplina material através de regulamentos. (..)
(..) Sempre que a lei autoriza ou habilita a administração a complementar ou executar os seus preceitos, isso não significa a elevação dos regulamentos ao estalão legislativo, pois tal é expressamente proibido pelo princípio da tipicidade das leis (cfr. art° 112º/6).
Daí que: (a) a norma regulamentar executora ou complementar continue a ser uma norma separada e qualitativamente diferente da norma legal, pois a norma legal reenviante não incorpora o conteúdo regulamentar nem lhe pode atribuir força legal; (b) ambas as normas mantenham a natureza e hierarquia respectivas, não se verificando qualquer fenómeno de integração. É uma prática incorrecta e inconstitucional do legislador quando certas leis consideram os regulamentos executivos ou complementares como "parte integrante da ler] (..)".

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Na medida em que estamos perante um despacho normativo, conjugando os princípios em matéria de poder regulamentar referidos na Doutrina supra exposta com o disposto na CRP, artº 201º nº 2, no sentido de que “compete aos Ministros: a) executar a política definida para os seus Ministérios; b) assegurar as relações de carácter geral entre o Governo e os demais órgãos do Estado, no âmbito dos respectivos Ministérios”, tal significa que a iniciativa regulamentar do Ministro, enquanto órgão simples integrante do Governo, é limitada à matéria das atribuições que lhe incumbe prosseguir, e que são as do seu ministério, dependendo de expressa permissão por lei em sentido formal. (5)


f) aulas de substituição - componente não lectiva - serviço docente extraordinário - art°s. 10° n° 2 m) e n° 3, ex vi 82° n° 3 e) ex vi 83° n°2,ECD;

Como já afirmado supra, o "acompanhamento de alunos" como actividade pré-ordenada no horário docente anual não é juridicamente recondutível ao "acompanhamento de alunos" para preencher o tempo lectivo na circunstância de falta do docente, isto é, no domínio das aulas de substituição.
E tanto que não se trata de actividades recondutíveis a idêntica natureza jurídica, que a própria lei, embora inclua ambas as actividades na componente não lectiva, uma na alínea a) e a outra na alínea e) do nº 3 do atº 82° citado, dá-lhes um tratamento jurídico diferenciado ao nível da natureza de tempo de trabalho e respectivo tratamento remuneratório, sendo uma, a da alínea a), remunerada nos termos do tempo de trabalho normal e a outra, a da alínea e), nos termos do trabalho extraordinário - cfr. art° 83° n° 2 e 10° n° 2 m), ECD.
De modo que, repetindo, na medida em que a lei através do ECD, distingue estas actividades de "acompanhamento de alunos" quer em termos de conteúdo e finalidade substantivas quer em termos remuneratórios, à Administração não é admitida, seja por via regulamentar seja por via de acto administrativo, a não observância dos pressupostos legais em sede remuneratória do tempo de trabalho em caso de verificação dos requisitos definidos na lei para a delimitação do conceito de "serviço docente extraordinário".
E não é admitida por imperativo constitucional em sede de elenco de actos normativos e vinculação da actividade administrativa ao princípio da legalidade, incluso a actividade administrativa governamental, segundo o qual a relação de conformidade exigível é a do acto ou do regulamento administrativos com a Lei e não o contrário, ou seja, da Lei com o acto ou o regulamento - cfr. artºs. 112° n° l, 199° c) e g) e 266° n° 2 da CRP.
No domínio da boa gestão, nada impede que a direcção executiva das escolas, aquando da elaboração do plano anual de organização do serviço docente, nele integre uma previsão numérica ou percentual sobre faltas de professores e igual previsão de aulas de substituição para colmatar a estimativa de faltas de professores às aulas, tal como estabelece o artº 5° n°s. l e 2 do Despacho n° 17 387/2005 de 12.08.
O que este Despacho n° 17 387/2005 de 12.08 não pode é proceder a uma degradação da base de incidência do dever retributivo no tocante à amplitude do serviço docente extraordinário, através do expediente da desqualificação da natureza jurídica do trabalho prestado em aulas de substituição por ausência às aulas de outros docentes, que o ECD expressamente integra na “componente não lectiva do pessoal docente”, a título de trabalho compreendido na “substituição de outros docentes” para “suprir a ausência imprevista e de curta duração do respectivo docente” e, por isso, impondo a respectiva remuneração no quadro do “serviço docente extraordinário”, tudo conforme as disposições conjugadas dos artºs. 10° nº 2 m) e n° 3, ex vi 82° nº 3 e) ex vi 83° n° 2 ECD;
Concretizando, o citado Despacho n° 17 387/2005 de 12.08 dispõe contra legem no artº 2º nº 5 d), na medida em que ao determinar que o “acompanhamento de alunos em caso de ausência do respectivo docente” integra, em termos de tempo de trabalho, a componente lectiva, tal acarreta por consequência a aplicabilidade aos tempos de aulas de substituição por faltas lectivas do respectivo docente a escala remuneratória do valor /hora normal.
Nesta medida, também o Despacho n° 17 387/2005 de 12.08 não se mostra apto a sustentar de forma válida e eficaz o efeito jurídico declarado por despacho de 06.03.06 do Secretário de Estado da Educação fundamentado na Informação n° 133/JM/SEE/2005, cfr. item P do probatório.

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Sintetizando o acima exposto,
§ São dois os conceitos operatórios de referência para delimitação do serviço docente extraordinário: um de natureza subjectiva centrado no docente; outro de natureza objectiva centrado na actividade prestada – artº 83º nºs. 1 e 2 ECD;
§ A referência operatória de natureza subjectiva, considera como serviço docente extraordinário o “prestado além do número de horas da componente lectiva a cujo cumprimento o docente está obrigado”, na dimensão do horário de trabalho correspondente à distribuição das horas de serviço docente lectivo ao longo do dia, respeitando os limites máximos relativos a este período normal de trabalho - art° 83° n° l ECD;
§ A referência operatória de natureza objectiva, considera o tipo de actividade que constitui serviço docente extraordinário recorrendo a uma dupla remissão normativa: primeiro do nº 2 art° 83° para o nº 3 al. e) do art° 82° seguida para o n° 2 al. m) e n° 3 do art° 10°, todos do ECD;
§ O ECD integra expressamente na “componente não lectiva do pessoal docente”, a título de trabalho compreendido na “substituição de outros docentes” para “suprir a ausência imprevista e de curta duração do respectivo docente” e, consequentemente, impõe a respectiva remuneração no quadro do “serviço docente extraordinário”, tudo conforme as disposições conjugadas dos artºs. 10° nº 2 m) e n° 3, ex vi 82° nº 3 e) ex vi 83° n° 2, do ECD;
§ O despacho ministerial n° 17 387/2005 de 12.08 é inidóneo para introduzir, modificar ou extinguir os requisitos fixados por fonte normativa de natureza superior, v.g. o Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensino Básico e Secundário (ECD), aprovado pelo DL 139-A/90 de 28.04, com as alterações introduzidas pelo DL 1/98 de 02.01;
§ O artº 2º nº 5 d) do despacho ministerial n° 17 387/2005 de 12.08 ao determinar que o acompanhamento de alunos em caso de ausência do respectivo docente integra a componente lectiva, acarreta como consequência a aplicabilidade às aulas de substituição da escala remuneratória do valor /hora normal.

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No sentido supra se fundamentou no acórdão deste TCAS de que fomos Relatora, proferido no rec. nº 3077/08 de 30.04.2008.

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Pelo que vem dito, não assiste razão ao Recorrente no tocante às questões suscitadas nas conclusões de recurso, na medida em que o despacho de 03.07.2006 do Secretário de Estado da Educação, no sentido de indeferimento do recurso hierárquico interposto contra o despacho datado datados de 12.04.2006 da Presidente do Conselho Executivo da EB 2/3 do ……………., se mostra eivado de vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos de facto e de direito porque, no tocante à qualificação jurídica e efeitos remuneratórios, retira do domínio do serviço docente extraordinário o tempo de serviço docente na componente não lectiva prestado em aulas de substituição do respectivo docente em falta, tempo de serviço que, no caso concreto vem discriminado por dias e horas conforme item 4º do probatório.

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Ou seja, conforme acórdão do Tribunal a quo, no domínio do reexercício da competência administrativa cabe proceder à emissão de novo acto administrativo sobre a concreta matéria suscitada em sede de aulas de substituição e com observância das vinculações decorrentes,
(i) das disposições conjugadas dos artºs. 10° nº 2 m) e n° 3, ex vi 82° nº 3 e) ex vi 83° n° 2, todos do ECD,
(ii) no domínio do serviço docente extraordinário prestado na “componente não lectiva do pessoal docente” a título de trabalho compreendido na “substituição de outros docentes” para “suprir a ausência imprevista e de curta duração do respectivo docente”;
(iii) segundo os pressupostos estatuídos nos citados artºs. 10° nº 2 m) e n° 3, ex vi 82° nº 3 e) ex vi 83° n° 2, todos do ECD;
(iv) em ordem a decidir sobre a natureza de serviço docente extraordinário no tocante ao tempo de serviço da ora Recorrente Daniela ………….. discriminado por dias e horas levadas ao probatório nas alíneas F a J, reportadas a Novembro de 2005, do presente acórdão.


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Termos em que acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em julgar improcedente o recurso.

Custas a cargo do Recorrente.

Lisboa, 29.JAN.2015


(Cristina dos Santos ) …………………………………………………………………………

(Paulo Gouveia ) ……………………………………………………………………………..

(Nuno Coutinho) ……………………………………………………………………………





(1) Maria do Rosário P. Ramalho, Direito do Trabalho, Parte II - Situações laborais individuais, Almedina pág.471.
(2) Paulo Veiga e Moura, Função pública, 2a ed. , Coimbra Editora, págs.316/317.
(3) Mário Esteves de Oliveira, Lições de direito administrativo, Almedina, 1980, págs.144 e ss.; Sérvulo Correia, Noções de direito administrativo, Editora Danúbio, 1982, págs. 95 e ss.
(4) Gomes Canotilho, Direito constitucional e teoria da constituição, Almedina, 7a edição, págs.833/842.
(5) Sérvulo Correia, Noções de direito administrativo, Editora Danúbio, 1982, págs. 102/103; Marcelo Rebelo de Sousa, Lições de direito administrativo, Vol. I, Lex, 1999, pág. 252.