Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:5955/12
Secção:CT
Data do Acordão:04/18/2018
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO.
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA.
ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO.
IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE 1ª. INSTÂNCIA RELATIVA À MATÉRIA DE FACTO. ÓNUS DO RECORRENTE.
PRESCRIÇÃO DA DÍVIDA EXEQUENDA.
CONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO EM PROCESSO DE IMPUGNAÇÃO JUDICIAL.
TERMO INICIAL DA CONTAGEM DO PRAZO PRESCRICIONAL. L.G.T. E C.P.T.
DETERMINAÇÃO DO REGIME DE PRESCRIÇÃO A APLICAR AO CASO CONCRETO.
REGIMES DE SUSPENSÃO E INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO.
APLICAÇÃO DE DIFERENTES REGIMES DE PRESCRIÇÃO NO QUE RESPEITA ÀS CAUSAS DE SUSPENSÃO OU INTERRUPÇÃO. ARTº.297, Nº.1, DO C.CIVIL. ARTº.12, Nº.2, DO C.CIVIL.
REGIME DE SUSPENSÃO DA PRESCRIÇÃO PREVISTA NO ARTº.5, Nº.5, DO DEC.LEI 124/96, DE 10/08.
SUSPENSÃO DO PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL EM VIRTUDE DA PRESTAÇÃO DE GARANTIA.
ACTO TRIBUTÁRIO E FACTO TRIBUTÁRIO. NOÇÃO.
ACTIVO IMOBILIZADO DA EMPRESA. NOÇÃO.
ACTIVO CIRCULANTE OU EXISTÊNCIAS. NOÇÃO.
DISTINÇÃO ENTRE O ACTIVO FIXO, OU IMOBILIZADO, E O ACTIVO CIRCULANTE, OU EXISTÊNCIAS, DEVE AFERIR-SE PELA INTENÇÃO QUE PRESIDIU À AQUISIÇÃO DO BEM.
Sumário:1. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
2. Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.
3. O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida.
4. No que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário). Tal ónus rigoroso ainda se pode considerar mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6.
5. A prescrição da dívida exequenda constitui fundamento de oposição à execução (cfr. artº.176, al.d), do C.P.C.Impostos; artº.286, nº.1, al.d), do C.P.Tributário; artº.204, nº.1, al.d), do C.P.P.Tributário), consubstanciando excepção peremptória de conhecimento oficioso no âmbito do processo tributário (cfr.artº.27, §2 e 3, do C.P.C.Impostos; artº.259, do C.P.Tributário; artº.175, do C.P.P.Tributário).
6. No que diz respeito ao processo de impugnação judicial, vem entendendo a jurisprudência dos Tribunais Superiores, à qual se adere, que a prescrição da obrigação tributária pode ser do conhecimento do Tribunal no âmbito da identificada espécie processual, embora para retirar do eventual provimento da mesma excepção não a procedência da impugnação e consequente anulação da liquidação objecto do processo (vertente dos requisitos de validade do acto), mas antes a declaração de extinção da instância devido a inutilidade superveniente da lide, dado que estamos perante acto tributário ineficaz, porque inexigível. Verificando-se a prescrição, a lide impugnatória não tem qualquer utilidade.
7. O termo inicial do prazo de prescrição conta-se em função da ocorrência do facto tributário, sendo computado a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário, nos impostos periódicos, ou a partir da data em que o facto tributário ocorreu, nos impostos de obrigação única, salvo em relação ao I.V.A. em que tal prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que ocorreu a exigibilidade do tributo, se o regime aplicável for o previsto na L.G.T.- cfr.artº.48, nº.1, da L.G.Tributária.
8. Já quanto ao C.P.Tributário, o prazo de prescrição conta-se desde o início do ano seguinte àquele em que tiver ocorrido o facto tributário, independentemente da natureza periódica ou de obrigação única do tributo em causa (cfr.artº.34, nº.2, do C.P.T.). A instauração de processo de execução fiscal contra o devedor principal, consubstancia facto interruptivo da prescrição, quer quanto ao mesmo devedor principal, quer quanto aos responsáveis subsidiários, independentemente do momento em que estes vierem a ser citados para a execução ou em que se vier a operar a reversão (cfr.artº.34, nº.3, do C.P.Tributário). Cessa, no entanto, o efeito interruptivo da prescrição a que se alude, o qual se transforma em efeito suspensivo, quando o processo (v.g.execução fiscal) estiver parado durante mais de um ano devido a facto não imputável ao sujeito passivo, caso em que se soma o prazo decorrido após esse período de um ano ao que se tiver verificado até à autuação dos autos (cfr.artº.34, nº.3, do C.P.Tributário).
9. A determinação do regime de prescrição a aplicar ao caso concreto faz-se no momento da entrada em vigor da nova lei (cfr.artº.297, nº.1, do C.Civil).
10. Como se retira do preceituado nos artºs.318 a 320, do C.Civil, a suspensão da prescrição tem como efeito que esta não comece a correr ou não corra, depois de iniciado o prazo, enquanto se verificar o facto, de natureza duradoura, a que é atribuído efeito suspensivo. Os factos suspensivos são de natureza duradoura, obstando ao começo e ao decurso do prazo de prescrição enquanto perdurarem, como se infere dos citados artºs. 318, 319 e 320, do C.Civil. Nas leis tributárias prevêem-se factos especiais a que é atribuído efeito suspensivo, pelo que serão essas as regras a aplicar em matéria de prescrição da obrigação tributária (cfr.v.g.artº.49, nº.4, da L.G.Tributária). Concluindo, para além da especificidade dos factos a que é atribuído efeito suspensivo, o regime da suspensão da prescrição da obrigação tributária não tem especialidades no domínio do direito tributário, pelo que, face a qualquer facto com natureza suspensiva, enquanto este surtir efeitos, a prescrição não começa nem corre.
11. Por sua vez, a interrupção da prescrição tem sempre como efeito a inutilização para o respectivo regime de toda o tempo decorrido anteriormente, sendo esse efeito instantâneo o único próprio da interrupção, presente em todas as situações (cfr.artº.326, nº.1, do C.Civil). Porém, em certos casos, designadamente quando a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (cfr.artº.327, nº.1, do C.Civil).
12. A aplicação de diferentes regimes no tocante aos prazos prescricionais, em resultado da previsão normativa do artº.297, nº.1, do C.Civil, não impõe a aplicação de um ou outro regime em bloco, pois só se refere tal normativo à lei que altere o prazo e não aos termos em que se conta, nem a tudo o que releva para o seu curso. O texto do artigo e a respectiva epígrafe revelam que se tem em vista apenas as leis que alteram prazos e não as que alteram os efeitos das causas interruptivas ou suspensivas da prescrição. Por isso, as leis que alteram causas de suspensão ou interrupção não sendo leis sobre “alteração de prazos”, não estão abrangidas na previsão do referido artº.297, do C.Civil. Estas leis seguem a regra de aplicação no tempo do artº.12, nº.2, do mesmo diploma. Nos termos do disposto no artº.12, nº.2, do C.Civil, a lei aplicável aos factos interruptivos e suspensivos do prazo de prescrição será, portanto, a vigente no momento em que os mesmos ocorreram.
13. De acordo com a jurisprudência dos Tribunais Superiores, a suspensão da prescrição prevista no artº.5, nº.5, do dec.lei 124/96, de 10/08, mantém-se desde o despacho de adesão ao regime e até à data de exclusão do mesmo, sendo irrelevante o facto das prestações de pagamento, inicialmente acordadas, não terem sido efectivamente pagas.
14. "In casu", da factualidade provada se retira, como vector suspensivo do prazo de prescrição, o decretamento da suspensão do processo de execução fiscal, o qual se verificou em virtude da prestação de garantia por parte do impugnante/executado. Tal factualidade é motivo de suspensão do prazo de prescrição nos termos do artº.49, nº.3, da L.G.T., na redacção da Lei 100/99, de 26/7 (cfr.artº.49, nº.4, da L.G.T., na redacção da Lei 53-A/2006, de 29/12) e artº.169, do C.P.P.T., mais tendo como efeito que tal período não corra enquanto se verificar o facto, de natureza duradoura, a que é atribuído efeito suspensivo.
15. O acto tributário tem sempre na sua base uma situação de facto concreta, a qual se encontra prevista abstracta e tipicamente na lei fiscal como geradora do direito ao imposto. Essa situação factual e concreta define-se como facto tributário, o qual só existe desde que se verifiquem todos os pressupostos legalmente previstos para tal. As normas tributárias que contemplam o facto tributário são as relativas à incidência real, as quais definem os seus elementos objectivos. Só com a prática do facto tributário nasce a obrigação de imposto. A existência do facto tributário constitui, pois, uma condição “sine qua non” da fixação da matéria tributável e da liquidação efectuada.
16. O activo imobilizado da empresa é o conjunto de bens que revestem um carácter de permanência, ou seja, os bens que a empresa pretende manter por mais do que um exercício económico. Nesta perspectiva, o Plano Oficial de Contabilidade (P.O.C. aprovado pelo dec.lei 410/89, de 21/11, diploma aplicável ao caso "sub judice"), classificava o activo imobilizado de acordo com a sua natureza - imobilizações financeiras, corpóreas e incorpóreas. Tais elementos caracterizam-se pela sua aptidão para contribuírem para as operações do ente empresarial em causa durante um determinado período de tempo, sendo que, com algumas excepções, essa aptidão vai decrescendo ao longo da sua vida útil.
17. Por sua vez, o activo circulante ou existências (stocks) é constituído por todos os bens adquiridos ou produzidos pela empresa que se destinam a venda ou a serem integrados na produção, entre eles nos aparecendo as mercadorias (bens adquiridos para venda sem sofrerem qualquer transformação na empresa), os produtos e trabalhos em curso (os que se encontram em determinada fase do processo produtivo, mas que ainda não atingiram o seu estádio final) e os produtos acabados (os resultantes do processo produtivo da empresa, mas que já atingiram o seu estádio final). Mais se deve referir que o conhecimento e gestão das existências se verifica através do inventário.
18. A distinção entre o activo fixo, ou imobilizado, e o activo circulante, ou existências, deve aferir-se pela intenção que presidiu à aquisição do bem (v.g.lote de terreno) e não à data da sua possível venda, em que a intenção será, manifestamente, a da venda e consequente obtenção de lucro, próprio de qualquer ente empresarial. Independentemente da dificuldade que em alguns casos possa existir na descoberta da intenção que presidiu à aquisição de um determinado activo, não pode deixar de ser essa intenção que deve motivar a inclusão de tal activo no imobilizado ou nas existências, em sede contabilística. Intenção essa que deve ser aferida dos elementos disponíveis em sede probatória e que estejam associados à dita aquisição. Esta ideia resultava do próprio P.O.C., o qual, na nota explicativa da classe 4 - Imobilizações, refere textualmente que esta classe “inclui os bens detidos com continuidade ou permanência e que não se destinem a ser vendidos ou transformados no decurso normal das operações da empresa”. Este o critério que permite classificar os bens como pertencentes ao activo fixo ou circulante da empresa, o qual assenta, portanto, no destino/intenção que na mesma empresa presidiu à respectiva entrada para o património.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
“…. - SOCIEDADE GESTORA DE PARTICIPAÇÕES SOCIAIS, S.A.”, com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls.231 a 244 do presente processo, através da qual julgou improcedente a impugnação deduzida pelo recorrente tendo por objecto liquidação adicional de I.R.C., relativa ao ano de 1992 e no montante global de Esc.209.647.875$00 / € 1.045.719,19.
X
O recorrente termina as alegações (cfr.fls.309 a 383 dos autos) do seu recurso formulando as seguintes Conclusões, sintetizadas após convite para o efeito (cfr.fls.414 a 419 dos autos):

No que respeita à questão da prescrição

1-A recorrente entende que se encontra incorrectamente julgado o facto q) do probatório, porquanto a menção ao conceito de “paragem do processo” pressupõe uma preconcepção jurídica sobre a ocorrência da vida que se pretende relatar;
2-Em alternativa à inclusão naquele facto q) de conceito jurídico (paragem do processo), o Tribunal a quo deveria ter seleccionado os seguintes factos:
- Em 13 de Fevereiro de 1998, o Chefe da Repartição do …º Bairro Fiscal Lisboa de preencheu um formulário para requisição de informações aos Serviços de Inspecção Tributária, enunciando a intenção de instruir o processo de Reclamação Graciosa.
- Nos termos do formulário, seriam solicitadas informações sobre a eventual cessação de actividade pela Recorrente; sobre o modo de contabilização de um elemento do activo da sociedade (lote de terreno); e sobre a conformidade da correcção proposta por aqueles Serviços de Inspecção ao lucro tributável da Recorrente. (factos provados pelo doc. a fls. 41 do PAF);
- Em 5 de Março de 1999, o Director Distrital de Finanças de Lisboa remeteu telefax para o Chefe da Repartição do …º Bairro Fiscal de Lisboa, solicitando o envio do processo de Reclamação Graciosa movido pela Recorrente (facto provado pelo doc. a fls. 42 do PAF)
- Em 11 de Março de 1999, a Repartição do …º Bairro Fiscal de Lisboa remeteu para a Direcção Distrital de Finanças de Lisboa o processo de Reclamação Graciosa (facto provado pelo doc. a fls. 43 do PAF)
- A recolha de prova para instrução dos autos de Reclamação Graciosa a partir de 17 de Novembro de 2000 (facto provado pelos docs a fls. 67/70, 51/57 e 45/50 do PAF);
3-Caso se considere aceitável a utilização do referido conceito jurídico na descrição do facto provado (o que não se admite), não poderá admitir-se virtualidade de cessar a “paragem do processo” (e interferir no prazo prescricional) a actos aos quais não é dada sequência procedimental ou a actos inúteis para a decisão da causa;
4-A atribuição de relevância a actos que não contribuem para a decisão efectiva do procedimento é forma abusiva de restrição da garantia dos contribuintes à certeza e segurança jurídicas, conformadas pelo instituto da prescrição;
5-No caso sub judice, o Tribunal a quo, na subsunção dos factos em presença ao conceito de “paragem do processo”, atribuiu relevância a um evento que deveria ter desconsiderado (a elaboração de um ofício interno de requisição de informação, não notificado ao contribuinte e do qual não existe registo de expedição ao respectivo destinatário);
6-Contrariamente ao percepcionado pelo Tribunal a quo, os elementos do processo administrativo não demonstram ter existido, em 13/02/1998, qualquer movimentação processual relevante no âmbito da reclamação graciosa;
7-Apenas em Novembro de 2000, a após uma ordem de serviço emitida em 5 de Maio de 2000 (Cfr. documentos a fls. 68 a 70 do processo administrativo) foi dado seguimento ao ofício de requisição acima mencionado, datado de 13/02/1998;
8-O ofício de requisição datado de 13/02/1998 é um acto absolutamente inútil para a tomada de decisão do procedimento de reclamação, pois (i) as informações em causa foram solicitadas aos serviços que já tinham efectuado e fundamentado a proposta de correcção subjacente ao acto reclamado; (ii) os respectivos fundamentos invocados por estes serviços já tinham sido validados por despacho de concordância do órgão com competência para decidir a Reclamação Graciosa (Cfr. fls. 19/20 do PAF);
9-Caso o Tribunal ad quem admita a possibilidade de utilização do conceito normativo “paragem do processo” na descrição dos factos provados, sob a alínea q) deverá antes considerar-se provado que: o procedimento de reclamação graciosa esteve parado entre 24/04/1997 [data da apresentação da Reclamação] e 17/11/2000 [data em que foi praticado o primeiro acto instrutório, com vista à preparação da decisão];
10-O artº 5º do DL 124/96 prevê a suspensão do prazo prescricional das dívidas incluídas nos planos de pagamento elaborados ao abrigo deste diploma, pelo que os factos referentes ao desenvolvimento deste plano são relevantes para a decisão da causa;
11-No entender da Impugnante, quanto a esta matéria, padece de erro o julgamento da parte final na alínea p) da Matéria de Facto (com base nos documentos a fls. 206 a 209 e 210);
12-O acto de 2/07/2003 pelo qual o Sub-director Geral da Justiça Tributária declarou a exclusão da Recorrente do regime prestacional previsto no Decreto-Lei 124/96, não tem eficácia extintiva desta medida excepcional de pagamento faseado da dívida;
13-Nos termos da alínea a) do nº 2 do artigo 3º do Decreto-Lei 124/96, é a mera falta de pagamento pontual de uma das prestações autorizadas que determina, ope legis, a imediata exigibilidade da obrigação tributária, sendo irrelevante o acto expresso de um órgão administrativo;
14-A Recorrente, aquando da apresentação do requerimento previsto no DL 124/96, solicitou também à Administração Fiscal a suspensão da obrigação de pagamento das prestações até decisão final da sua Reclamação Graciosa - o que não foi atendido (Cfr. fls 206 e ss e fls. do processo executivo);
15-A Recorrente não efectuou o pagamento de qualquer prestação ao abrigo do regime estabelecido nos termos do DL 124/96 (Cfr. fls 206 e ss e fls. do processo executivo), omissão que determinou, sem mais, a exclusão daquela Recorrente de tal regime excepcional;
16-No entendimento da Recorrente, sob a alínea p) da sentença, o Tribunal a quo apenas poderia ter dado como provada a primeira parte do facto aí enunciado, como segue: p) Em 31/01/1997 a impugnante requereu o pagamento da dívida de IRC do ano de 1992 … em 24 prestações, nos termos do Dec.-Lei nº 124/96, que lhe foi deferido por despacho de 03/07/1997…”;
17-No que respeita aos factos relevantes referentes ao curso do processo de Execução Fiscal, entende a Recorrente que o Tribunal a quo errou ao não ter seleccionado a factualidade seguinte:
- Por ofício expedido em 9 de Setembro de 1997, a Recorrente foi citada para o processo nº 3255-97/103119.8. (facto provado pelo Ofício de Citação integrado no processo de execução, apenso aos autos, a fls. );
- Entre 1 de Janeiro de 2001 e Novembro de 2003 [data em que foi proferido mandado de penhora] não existe registo, nos autos do processo executivo, da prática de actos ou diligência tendentes à cobrança do tributo exequendo (facto provado por omissão de registo no processo de execução apenso aos autos);
18-No que respeita à tramitação do processo de Impugnação Judicial, entende a Recorrente que o Tribunal a quo errou ao não ter seleccionado a seguinte factualidade:
- Em 27 de Janeiro de 2005, o Tribunal a quo proferiu despacho de admissão liminar da Impugnação Judicial deduzida pela Recorrente (Cfr- Fls.124 dos autos);
- Entre 25 de Novembro de 2003 e 27 de Janeiro de 2005 não foi praticado qualquer acto, no âmbito do processo de Impugnação Judicial, com vista à preparação da decisão;
19-A Recorrente aceita o entendimento do Tribunal a quo de que o prazo prescricional mais curto (de 8 anos) previsto na LGT é aplicável aos prazos que já estavam em curso à data da entrada em vigor deste diploma (contado a partir desta data), salvo se, segundo a lei antiga (C.P.T.), faltar menos tempo para o prazo (de dez anos) se completar;
20-Atendendo agora à base factual adequada ao julgamento da causa, deverá analisar-se, primeiramente, se o prazo prescricional de 10 anos, previsto no C.P.T., se encontra decorrido e, só a final, julgando negativamente, proceder à contagem do prazo nos termos estabelecidos na LGT;
21-Conforme bem decidido na sentença recorrida, o dies a quo do prazo prescricional da obrigação tributária em causa é 1/01/1993 e, em consequência da apresentação de Reclamação Graciosa do acto, aquele foi interrompido em 24 de Abril de 1997 [Cfr. facto provado l)];
22-No período entre 24 de Abril de 1997 e 24 de Abril de 1998, não foi praticado qualquer acto que materialize efectiva movimentação processual susceptível de interromper o prazo prescricional, pelo que, nos termos do nº 3 do artº 34º do CPT (solução legislativa mantida no nº 2 do artº 49º da LGT 98), se deverá entender que o efeito interruptivo do prazo de prescrição, provocado pela Reclamação Graciosa, se degrada em efeito suspensivo, voltando a correr findo o período de um ano de paragem do procedimento;
23-Para a contagem do concreto prazo prescricional, não se afigura relevante a suspensão prevista no DL 124/96, já que, pese embora a Recorrente tenha requerido o pagamento faseado da alegada dívida, não efectuou o pagamento de qualquer prestação; assim, tal requerimento não impediria, em abstracto, o retomar imediato da contagem do prazo de prescrição logo após o período de um ano de paragem do procedimento de Reclamação Graciosa;
24-Em consequência da instauração do processo de execução fiscal, o prazo prescricional foi interrompido em 19/05/1997;
25-Desde 9/09/1997 e durante vários anos, por causa não imputável à Requerente, nenhum acto foi praticado no âmbito do processo executivo, pelo que se deve entender que o efeito interruptivo do prazo de prescrição, provocado pela instauração do Processo Executivo, se degrada em efeito suspensivo, voltando a correr findo o período de um ano de paragem do procedimento (entre 9/09/1997 e 9/09/1998);
26-Em consequência da apresentação da Impugnação Judicial, o prazo prescricional foi interrompido em 25/11/2003;
27-Também este processo judicial se encontrou parado, por causa não imputável à Recorrente, por prazo superior a um ano (que terminou antes da entrada em vigor da Lei 53-A/2006, que revogou o nº 2 da LGT 98), motivo pelo qual, também esta causa interruptiva se degradou em causa suspensiva do prazo prescricional, nos termos da parte final do nº 3 do artº 34º do CPT - o que determinou o retomar da contagem de tal prazo a partir de 25/11/2004;
28-O prazo prescricional decorreu por:
- quatro anos, três meses e vinte e três dias entre 1/1/1993 e 24/04/97;
- cinco anos, dois meses e dezasseis dias, entre 9/9/98 e 25/11/2003;
- três anos dois meses e doze dias, entre 25/11/2004 e 7/2/2008, data em que o processo de execução fiscal foi objecto de suspensão, devido à prestação de garantia pela Recorrente [Facto Provado s) – por lapso, designado por a) na sentença recorrida];
29-No cômputo global, entre 1/1/1993 e 7/2/2008, decorreram doze anos, oito meses e vinte e um dias, pelo que a (pretensa) obrigação tributária subjacente aos autos se encontra prescrita;
30-A prescrição encontra-se verificada, ainda que se analise o caso à luz do regime da LGT (aplicado nos termos previstos no artº 287º do C.Civil), já que, nesse caso, devendo nesse caso considerar-se que:
- o dies a quo para a contagem da prescrição (novo prazo de 8 anos) seria 1/1/1999 – data da entrada em vigor da LGT 98.
- entre 1/1/1998 e 25/11/2003 (data da apresentação de Impugnação Judicial) decorreram quatro anos, dez meses e vinte e quatro dias;
- o prazo retomou o seu curso em 25/11/2004 (porque decorrido um ano de paragem do processo não imputável ao Recorrente), correndo até 7/2/2008 (data da suspensão do processo executivo, por prestação de garantia), num período de três anos, dois meses e doze dias;
- no cômputo global, entre 1/1/1999 e 7/2/2008, e sem prejuízo do período de suspensão do prazo, decorreram oito anos, um mês e seis dias;
31-O Tribunal a quo, na decisão recorrida, aplicou erroneamente as normas previstas no nº 1 e 3 do artº 34º do CPT e, também, as normas previstas no nº 1, 2 e 3 do artº 49º da LGT 98;
32-O erro de julgamento do Tribunal a quo resulta de uma deficiente e insuficiente apreensão dos factos relevantes e essenciais para o conhecimento da questão incidental de prescrição, e, consequentemente, de uma desadequada subsunção daqueles à previsão normativa.

No que respeita ao mérito da causa:

33-No entendimento da Recorrente, encontra-se incorrectamente julgado o ponto de facto elencado sob a alínea b) da sentença, devendo considerar-se provado, em face da alegação inicial da Recorrente (artigos 4ºe 5º da sua Petição) e do documento de fls. 42 e ss dos autos, que:
- Entre Maio de 1934 e 16 de Outubro de 1995, a Recorrente tinha por objecto social o comércio de transacção sobre propriedades rústicas e urbanas, quer por compra e venda, quer por arrendamento e construção.
- Em 16 de Outubro de 1995, a Assembleia Geral da Recorrente deliberou a alteração do objecto social para a Gestão de Participação Sociais de outras sociedades como forma indirecta de exercício da actividade económica.
34-O ponto de facto elencado sob a alínea g) corresponde à verdade, foi alegado pela Recorrente e objecto de suficiente prova;
35-Não obstante, relativamente à parcela de terreno a que se refere a alínea g), no artigo 72º da Petição Inicial, foi também alegada pela Recorrente a respectiva caracterização (no que se refere à dimensão e ao seu carácter complementar face às outras parcelas de terreno), que é pertinente para a apreciação da legalidade do lançamento daquela parcela em conta do imobilizado corpóreo na contabilidade;
36-Deveria ter sido seleccionado para a matéria probanda que a parcela de terreno a que se refere a alínea g) da Matéria de Facto tinha 142,80 m2 e era acessória face às duas parcelas de terreno principais a que se refere a alínea a), estas com 574,25 m2 (facto que foi demonstrado pelos docs. a fls. 43 e ss. dos autos, 30, 33, 34, 38, 75 e 77 do processo administrativo apenso);
37-O facto considerado provado sob a alínea i) não se encontra devidamente circunstanciado no tempo, padecendo assim de erro de julgamento;
38-O Ponto de Facto elencado na alínea i), deverá assim ser objecto de modificação pelo Tribunal ad quem, nos seguintes termos:
i) O valor de realização da venda do terreno a que se refere a alínea anterior foi reinvestido pela impugnante, no final de 1994, nas seguintes imobilizações financeiras:
- 88.400.000$00, referente a 650 acções da “A… - Sociedade de Construções, S.A.”
- 85.680.000$00, referente a 630 acções da “A… - Sociedade de Construções, S.A.”
- 350.000.000$00, referente a quotas da “T… – Organização Hoteleira do Centro, Lda.”
- Por despacho do Director de Serviços do IRC, estas três sociedades foram tributadas pelo lucro consolidado entre 1999 e 2003;
39-Por se encontrarem demonstrados nos docs. a fls. 50 a 58 e 60 a 68 dos autos, serem essenciais ao julgamento da causa e não terem sido seleccionados para a matéria de facto elencada na sentença, foram incorrectamente julgados os pontos de facto alegados nos artigos 14º, 16º, 17º, 18º, 19º, 21º e 22º da Petição Inicial;
40-A Recorrente entende que, por esse motivo, deverá o Tribunal ad quem, carrear para Matéria de Facto Provada, que:
- A Recorrente contabilizou como um activo imobilizado corpóreo o lote de terreno para construção a que se referem as alíneas a), d) e g) da Matéria de Facto seleccionada;
- Em 31 de Maio de 1993, a Recorrente entregou a sua Declaração de Rendimentos Modelo 22 do exercício de 1992, tendo apurado um lucro tributável de Esc. 1.460.629$00 (€ 7.286);
- Na sua Declaração de Rendimentos referente a 1992, deduzidos os prejuízos fiscais reportáveis, a Recorrente apurou uma matéria colectável de 899.959$00 (€4.488,98) e imposto a pagar de 356.384$00 (€ 1.777,64);
- Nessa Declaração de Rendimentos, a Recorrente declarou um proveito ou ganho extraordinário, referente à venda do lote de terreno a que se referem as alíneas a), d) e g) da Matéria de Facto seleccionada, no montante de 504.462.416$00 (€ 2.516.247,92);
- No mapa de mais-valias e menos-valias fiscais anexo à Declaração Modelo 22 do exercício de 1992, a Recorrente declarou à Administração Fiscal a obtenção de uma mais-valia resultante da alienação do lote de terreno mencionado em a), d) e g), no montante de 320.317.937$00 (€ 1.597.739,13);
- No quadro 29, campo 569 da Declaração de Rendimentos Modelo 22 referente a 1992, a Recorrente declarou a sua intenção de reinvestir o valor de realização do lote de terreno, no montante de 509.140.000$00 (€ 2.539.579,61);
41-Em face dos elementos da previsão das normas aplicáveis ao caso (Cfr. artº 42º/1 e 2, artº 44º/1, 2 e 4 do Código do IRC, artº 18º/1 do EBF – ambos na redacção à data em vigor - e normas contabilísticas do Plano Oficial de Contabilidade, aprovadas pelo DL 410/89 e sucessivas alterações – em especial nas Notas Explicativas, ponto 12, Classe 4), a apreciação da licitude do procedimento contabilístico adoptado pela Recorrente depende, em grande medida, das suas expectativas, vontade e determinação relativamente ao modo de utilização e/ou disposição do imóvel a que se referem as alíneas a), g) e d) do probatório;
42-A matéria alegada, entre outros, sob os artigos 9º, 10º, 11º, 20º, 48º, 49º e 50º da Petição Inicial, não pode ser reconduzida à prolação de meras considerações ou juízos conclusivos, integrando factos de que depende a boa decisão da causa (embora sejam do foro interno ou subjectivo);
43-O Tribunal a quo errou ao não seleccionar os referidos factos, que, aliás, devem ser considerados provados;
44-Os factos do foro anímico, intelectual ou volitivo (em que é diminuta a possibilidade de produzir sobre os mesmos prova directa), devem inferir-se a partir de outros, instrumentais e objectivos, tidos como certos, mediante presunção judicial, fazendo-o no desenvolvimento de um processo lógico, prudente e baseado na experiência comum;
45-No caso concreto, encontram-se reunidos os elementos objectivos que
permitem suportar a convicção, formada por presunção judicial, de que correspondem à verdade:

- Ser vontade da Recorrente construir um edifício no lote de terreno com o objectivo de o utilizar directamente e de o arrendar a terceiros;
- Não ter tido a Recorrente a intenção de vender a(s) parcela(s) de terreno que constituiam o lote para construção;
- Pretender a Recorente manter a titularidade do direito de propriedade sobre o bem imóvel, reservando-o no seu património;
46-Caso a Recorrente tivesse adquirido o lote de terreno, localizado numa zona consolidada da cidade de Lisboa, com vista à realização de um negócio de alienação futuro, seria expectável que tal negócio se viesse a realizar num quadro temporal relativamente reduzido, nunca decorridos mais de cinquenta anos sobre a data de aquisição;
47-Caso fosse intenção da Recorrente alienar o imóvel adquirido, seriam razões de lógica financeira e de eficiência fiscal a determinar que a alienação tivesse lugar a curto ou médio prazo, e não ao fim de cinquenta e oito anos, já que, daquela forma, a Recorrente poderia ter gozado do benefício fiscal à aquisição então previsto no Artº 11º do C.S.I.S.D.;
48-Sem prejuízo da prova indiciária que a Recorrente procurou carrear para os autos, a prova dos factos alegados nos artigos 9º, 10º, 11º, 20º, 48º, 49º e 50º da Petição Inicial decorre ainda de acto praticado pela própria Administração Fiscal;
49-A fls. 67 e seguintes do processo administrativo, por informação prestada com despacho de concordância do Chefe de Divisão, os Serviços de Inspecção Tributária declaram que o “sujeito passivo tinha a intenção de afectar [o imóvel] à construção de um prédio para arrendamento ou exploração” e que “em 1989 foi entregue na Câmara Municipal de Lisboa um projecto para construção de um edifício para escritórios no referido terreno, sendo o último piso para a própria empresa e os restantes para arrendar”;
50-Nos termos do artº 76º da Lei Geral Tributária, estas informações, “prestadas pela inspecção tributária fazem fé, quando fundamentadas e se basearem em critérios objectivos nos termos previstos na lei”;
51-Encontrando-se provados, pela conjugação dos acima referidos indícios probatórios e da admissão dos serviços de Inspecção Tributária, deverá agora ser considerado provado que:
- A Recorrente nunca teve intenção de vender o bem imóvel referido nas alíneas a), d) e g) do Probatório, e, por essa razão, procedeu à sua contabilização como um activo imobilizado corpóreo.
- Desde a aquisição da primeira parcela de terreno, em 1943, a Recorrente tinha intenção de construir um edifício para ser por si utilizado e/ou ser dado de arrendamento a terceiros;
52-A Recorrente não se conforma com as conclusões do Tribunal a quo quanto ao enquadramento jurídico dos factos, que, no seu entender, violam as normas jurídicas previstas no artº 42º/1 e 2, artº 44º/1, 2 e 4 do Código do IRC e artº 18º/1 do EBF (ambos na redacção à data em vigor);
53-Estas normas, aplicadas ao conjunto (suficiente) de factos alegado pela Recorrente, deveriam ter sido interpretadas e aplicadas por forma a reconhecer que: (i) o rendimento resultante da transmissão do imóvel, em 1992, é considerado uma mais-valia; (ii) a referida mais valia encontra-se excluída de tributação em caso de reinvestimento do valor de realização em imobilizações financeiras; (iii) em concreto, a mais valia obtida pela Recorrente encontrava-se excluída de tributação, por ter sido objecto de reinvestimento adequado e tempestivo;
54-No entendimento da Recorrente, o suporte factual da decisão recorrida afigurava-se insuficiente, situação que condicionou a boa decisão da causa;
55-Por outro lado, é inaceitável, porque afastado das regras de lógica formal, o argumento do Tribunal a quo, que rejeita a integração de um bem no activo imobilizado com fundamento na impossibilidade de qualificação, como mais-valia, do rendimento decorrente da sua venda;
56-Sendo as mais-valias definidas, nos termos do artº 44º do CIRC, como os rendimentos decorrentes da transmissão onerosa de elementos do activo imobilizado, a definição do que é, ou não é, um elemento do activo imobilizado será sempre prévia à (e dela dependerá a) qualificação de um rendimento como mais valia;
57-Ao contrário do que considerou o Tribunal a quo, a ocasionalidade e imprevisibilidade, sendo características das mais valias, também não podem ser vistas como critério para a qualificação dos rendimentos;
58-O carácter lucrativo da operação igualmente não afecta a caracterização do bem vendido, nem, tão pouco, do rendimento obtido - já que todos os negócios das sociedades comerciais devem prosseguir a obtenção de lucro;
59-Do mesmo modo, o objecto social da sociedade não é decisivo para permitir ou impedir a integração de um determinado bem no imobilizado, pois aquela pode aí registar bens idênticos aos que transacciona com carácter de habitualidade, se os mesmos não se destinarem a ser revendidos e ser afectos à actividade produtiva;
60-No caso, o imóvel alienado pela Recorrente em 1992 deveria considerar-se integrado no activo imobilizado da sociedade, porque se encontravam cumpridos os pressupostos para ser objecto de tal contabilização identificados nas Notas Explicativas ao Plano Oficial de Contabilidade: (i) era detido com continuidade e permanência superior a um ano; (ii) não se destinava a ser vendido ou transformado no decurso normal das operações da empresa;
61-Atenta a matéria de facto provada (em particular aquela cuja selecção ora se peticiona), verifica-se que, no caso concreto, e não obstante o objecto social da Recorrente lhe permitir, em 1992, o exercício da actividade de compra e venda de imóveis, a sociedade não tinha efectivamente afectado tal imóvel como uma mercadoria transaccionável no âmbito dessa actividade;
62-Em 1992, a Recorrente não exercia efectivamente, nem veio mais a exercer a actividade de compra e venda de imóveis e, tendo o imóvel no activo há mais de cinquenta anos (salvo a parcela adquirida em 1992, mas que se provou ter carácter acessório), pretendia mantê-lo na sua titularidade para o explorar directamente;
63-Nos termos previstos no Plano Oficial de Contabilidade, nada obsta, pois, a que o bem em causa tenha sido contabilizado como imobilizado corpóreo, e, por conseguinte, nada deveria ter obstado também à tributação do rendimento decorrente da sua alienação (por natureza, excepcional) nos termos do artº 44º do Código do IRC e artº 18º/1 do EBF (ambos na redacção à data em vigor);
64-Em face de alegações passadas da Administração Fiscal, a Recorrente reitera que, aquando da realização do reinvestimento, foram cumpridas as condições previstas na alínea c) do nº 3 do artº 18º do EBF para beneficiar da exclusão da tributação;
65-Com efeito, não é verdade que o reinvestimento efectuado pela Recorrente, em 1994, pela aquisição de imobilizado financeiro (participações na “A…” e na “T…”), tenha resultado na transmissão de acções ou quotas entre a sociedade e os seus sócios;
66-Não obstante a redacção do nº 3 do artº 18º do EBF tenha passado a restringir transacções entre sociedade e sócios “através de relações indirectas entre empresas” em 1993, resulta dos autos que a tributação daquelas sociedade pelo lucro consolidado apenas ocorreu a partir de 1999 (já após e como consequência do investimento financeiro realizado).
X
Não foram produzidas contra-alegações.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no qual pugna pelo não provimento do recurso (cfr.fls.422 dos autos).
X
Corridos os vistos legais (cfr.fls.409 e 437 do processo), vêm os autos à conferência para deliberação.
X
FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.232 a 236 dos autos):
a) Em 03/09/1943 a impugnante, então com a denominação “..., L.da.”, comprou um parcela de terreno para construção urbana e em 11/01/1947 comprou outra parcela de terreno contígua à primeira, que foram anexadas e mostram-se descritas na 6ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa sob os nºs … e … (cfr.documento junto a fls.42 a 48 dos presentes autos);
b) A sociedade impugnante, “…. - Sociedade Gestora de Participações Sociais, S.A.”, com o n.i.p.c. …, até 1995 tinha como objecto social o comércio de transacção sobre propriedades rústicas e urbanas, quer por compra e venda, quer por arrendamentos e construção (cfr.certidão da Conservatória do Registo Comercial junta a fls.30 a 40 dos presentes autos);
c) A impugnante, entre 1958 e 1990, não efectuou qualquer operação tributável (cfr. informação exarada a fls.68 a 70 do procedimento de reclamação graciosa apenso);
d) Em 16/11/1989 a impugnante deu início na Câmara Municipal de Lisboa ao processo de licenciamento para construção de um edifico para escritórios no terreno identificado na alínea a) supra (cfr.documentos juntos a fls.71 a 77 do procedimento de reclamação graciosa apenso);
e) Pela Ap. 49 a 57/900711 foram registadas diversas cessões de quotas, passando a sociedade a ter como sócios: J…, M…, L… e R… (cfr.certidão da Conservatória do Registo Comercial junta a fls.30 a 40 dos presentes autos);
f) À data da cessão de quotas o único activo propriedade da impugnante era um terreno para construção, no valor de Esc.10.000$00 (cfr.documento junto a fls.62 dos presentes autos);
g) Em 20/04/1992 a impugnante comprou outra parcela de terreno com a área de 142,80 m2 que anexou às referidas na alínea a), formando um lote para construção (cfr. documento junto a fls.29 a 32 do procedimento de reclamação graciosa apenso);
h) Em 12/08/1992 a impugnante vendeu o terreno para construção, com a área 716,05 m2, a que se referem as alíneas a), d) e g), pelo valor de Esc.509.140.000$00 (cfr. documentos juntos a fls.42 a 48, 50 a 58 e 60 dos presentes autos; informação exarada a fls.68 a 70 do procedimento de reclamação graciosa apenso);
i) O valor de realização da venda do terreno a que se refere a alínea anterior foi reinvestido pela impugnante, no final de 1994, nas seguintes imobilizações financeiras:
- 88.400.000$00 referente a 650 acções da “A…-Sociedade de Construções, SA”;
- 85.680.000$00 referente a 630 acções da “A….-Sociedade de Construções, SA”; e,
- 350.000.000$00 referente a quotas da “T…-Organização Hoteleira do Centro, Lda.”,
Pertencendo estas sociedades ao mesmo grupo de empresas - Grupo J… - e sendo tributadas pelo lucro consolidado (cfr.documentos juntos a fls.83 a 89 do procedimento de reclamação graciosa apenso);
j) Pela Ap. 4/960209 foi registado aumento de capital da sociedade impugnante, transformação em anónima e alteração da denominação para “G…. - Sociedade Gestora de Participações Sociais, S.A.” (cfr.certidão da Conservatória do Registo Comercial junta a fls.30 a 40 dos presentes autos);
k) Na sequência de uma acção de fiscalização interna à declaração Mod 22 do ano de 1992, apresentada pela impugnante, em sede de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), veio a ser-lhe corrigida a matéria colectável e, por isso, efectuada liquidação adicional desse imposto, derrama e juros compensatórios, em 06/12/1996, no montante total de Esc.209.647.875$00, com data limite de pagamento em 27/01/1997 (cfr.documento junto a fls.28 dos presentes autos; informação exarada a fls.243 a 250 do processo administrativo tributário apenso);
l) Em 24/04/1997 a impugnante deduziu reclamação graciosa a qual veio a ser indeferida por despacho de 06/11/2003 do Director de Finanças Adjunto (cfr.articulado inicial junto a fls.2 a 13 do procedimento de reclamação graciosa apenso; informação, parecer e despacho juntos a fls.128 a 134 do procedimento de reclamação graciosa apenso);
m) A fundamentação da decisão proferida no procedimento da reclamação graciosa, constante da informação exarada a fls.129 a 134, que aqui se dá por integralmente reproduzida, contém, além do mais, o seguinte:
“(...)
Existe uma divergência de posicionamento tributário entre a Administração Fiscal e a ora reclamante acerca da alienação do terreno para construção sito em Avenida Infante Santo, adquirido em 1934 e da parcela complementar comprada em 1992 à Câmara Municipal de Lisboa por imposição desta entidade.
Considera a ora reclamante que desde 1934 sempre contabilizou aquele terreno em imobilizado corpóreo por ter a pretensão de construir um terreno para arrendamento, como tal concluiu que o proveito resultante da sua alienação constitui um ganho de mais-valia.
Discordamos deste posicionamento, rebatendo que a natureza do bem e a aplicação que se lhe veio a dar revelam, que a sua alienação teve em vista a prossecução do objecto social da ora reclamante, no decurso do desenvolvimento da sua actividade normal.
O meio legal de prova que a Administração Fiscal dispõe para tributar o ganho resultante da venda do terreno para construção é a circunstância de que apesar da ora impugnante mencionar o propósito de construir um edifício no terreno em apreço, durante 58 anos nunca ter concretizado esse objectivo.
Muito pelo contrário, logo após a obtenção de autorização Camarária dando a possibilidade de construir no terreno a ora reclamante, ao invés de realizar o projecto para o qual alegadamente o terreno estava destinado (construir um edifício para arrendamento), resolveu modificar a função económica que até então estava vinculada àquele terreno, pondo-o ao serviço da sua actividade económica - compra e venda.
Os bens do activo imobilizado englobam os bens móveis ou imóveis que a empresa utiliza na sua actividade operacional que não se destinam a ser vendidos ou transformados, com carácter de permanência superior a um ano.
Somos da opinião que o terreno em questão não contempla todos os requisitos supra mencionado, dado ter-se verificado objectivamente que, durante os 58 anos de permanência na empresa ele não foi afecto à actividade operacional-arrendamento.
(…)
Na situação concreta, deve prevalecer o princípio contabilístico da substância sobre a forma, isto é as operações dever ser contabilizadas e tratadas atendendo à sua realidade (substância) e não à sua aparência (forma).
(…)
Trata-se de um acto de natureza comercial com incidência no objecto social da reclamante, e consequentemente os ganhos ou proveitos daí derivados enquadram-se na alínea a) do nº 1 do artigo 20º do CIRC dado tratarem-se de resultados operacionais (conta 81 do POC) e não na alínea f) do artigo 20 e do artigo 42º do CIRC (Mais - Valias) como pretende a reclamante.
(...)”
n) Pelo ofício datado de 07/11/2003 - 12852, a impugnante foi notificada da decisão proferida no procedimento de reclamação graciosa (cfr.documentos juntos a fls.150 a 152 do procedimento de reclamação graciosa apenso);
o) Em 25/11/2003 a impugnante deduziu a presente impugnação (cfr.carimbo de entrada aposto a fls.5 dos presentes autos);
p) Em 31/01/1997 a impugnante requereu o pagamento da dívida de IRC do ano de 1992, relativa à liquidação adicional em impugnação nos presentes autos, no montante de Esc.209.647.875$00, em 24 prestações, nos termos do dec.lei 124/96, de 10/08, o que lhe foi deferido por despacho de 03/07/1997, tendo sido excluída do regime daquele diploma por despacho proferido em 02/07/2003 (cfr.documentos juntos a fls.206 a 211 dos presentes autos);
q) O procedimento de reclamação graciosa identificado na alínea l) esteve parado entre 13/02/1998 e 08/03/1999 (cfr.documentos juntos a fls.41 e 42 do procedimento de reclamação graciosa apenso);
r) Em 19/05/1997 foi instaurada a execução fiscal nº.3255-97/103119.8 contra a impugnante, visando a cobrança coerciva da dívida de IRC do ano de 1992, no montante de Esc.209.647.875$00/€ 1.045.719,19 (cfr.documentos juntos a fls.1 e 2 do processo de execução fiscal apenso);
s) Por despacho de 08/02/2007 do Chefe do 10º. Serviço de Finanças de Lisboa, a execução fiscal identificada na alínea anterior foi suspensa, devido a prestação de garantia e ao abrigo do artº.169, do C.P.P.T. (cfr.despacho exarado a fls.445 do processo de execução fiscal apenso - III volume).
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Não se provaram outros factos, por nenhuma prova ter sido feita. As demais asserções da douta petição integram conclusões de facto ou direito ou meras considerações pessoais da impugnante…”.
X
Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…Os factos provados assentam na análise crítica dos documentos e informações oficiais constantes dos autos e que não foram impugnados …”.
X
Ao abrigo do disposto no artº.614, nº.1, do actual C.P.Civil, rectificou-se a data constante da alínea s) do probatório, “08/02/2007”, que não “07/02/2008”, tudo conforme se retira do exame do despacho exarado a fls.445 do processo de execução fiscal apenso - III volume, visto tratar-se de um erro de escrita, modalidade de erro na declaração (cfr. artº.249, do C.Civil; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 29/5/2014, proc.7308/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/02/2015, proc.8126/14).
X
Dado que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou, essencialmente, em prova documental constante dos presentes autos e apensos, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa relevante para a decisão e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6 (“ex vi” do artº.281, do C.P.P. Tributário):
t) Na declaração Mod 22, do ano de 1992, apresentada pela impugnante constava, além do mais, o seguinte (cfr.documento junto a fls.50 a 58 dos presentes autos):
1-Um proveito ou ganho extraordinário, referente à venda do lote de terreno a que se referem as alíneas a), d) e g) supra, no montante de 504.462.416$00 (€ 2.516.247,92);
2-No mapa de mais-valias e menos-valias fiscais anexo à Declaração Modelo 22 do exercício de 1992, o sujeito passivo declarou à Administração Fiscal a obtenção de uma mais-valia resultante da alienação do lote de terreno mencionado em a), d) e g), no montante de 320.317.937$00 (€ 1.597.739,13);
3-No quadro 29, campo 569, o sujeito passivo declarou a sua intenção de reinvestir o valor de realização do lote de terreno, no montante de 509.140.000$00 (€ 2.539.579,61).
X
ENQUADRAMENTO JURÍDICO
X
Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida decidiu, em síntese, julgar improcedente a presente impugnação e, em consequência, manter a liquidação de I.R.C. objecto do presente processo (cfr.al.k) do probatório).
X
Antes de mais, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
Aduz o apelante, em primeiro lugar e em sinopse, que em sede de exame da questão da prescrição se deve alterar a matéria de facto constante das alíneas p) e q) do probatório, tal como se deve aditar factualidade relativa ao processado existente nos autos de execução fiscal apensos e nos presentes autos de impugnação (cfr.conclusões 1 a 18 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar um erro de julgamento de facto da sentença recorrida.
Dissequemos se a decisão do Tribunal "a quo" padece de tal vício.
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cfr.artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, IV, Coimbra Editora, 1987, pág.566 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.660 e seg.).
Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida. A decisão é errada ou por padecer de “error in procedendo”, quando se infringe qualquer norma processual disciplinadora dos diversos actos processuais que integram o procedimento aplicável, ou de “error in iudicando”, quando se viola uma norma de direito substantivo ou um critério de julgamento, nomeadamente quando se escolhe indevidamente a norma aplicável ou se procede à interpretação e aplicação incorrectas da norma reguladora do caso ajuizado. A decisão é injusta quando resulta de uma inapropriada valoração das provas, da fixação imprecisa dos factos relevantes, da referência inexacta dos factos ao direito e sempre que o julgador, no âmbito do mérito do julgamento, utiliza abusivamente os poderes discricionários, mais ou menos amplos, que lhe são confiados (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/6/2013, proc.5618/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/4/2014, proc.7396/14; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.130; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 9ª. edição, 2009, pág.72).
Ainda no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.181; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 20/12/2012, proc.4855/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/7/2013, proc.6505/13).
Tal ónus rigoroso deve considerar-se mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6 (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6531/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.5555/12; ac.T.C.A. Sul-2ª.Secção, 27/02/2014, proc.7205/13).
No caso concreto, nenhum relevo envolve a factualidade que o recorrente pretende que se altere/adite ao probatório, no que diz respeito às alíneas p) e q) da factualidade provada, tal como em relação ao processado constante dos autos de execução fiscal apensos e dos presentes autos de impugnação, visto constar da factualidade provada uma causa de suspensão do prazo de prescrição que se consubstancia na adesão ao regime previsto no dec.lei 124/96, de 10/08 (cfr.alínea p) do probatório), o qual suspendeu o mesmo prazo entre 3/07/1997 e 2/07/2003, contrariamente ao que defende o recorrente, ao alegar que não efectuou o pagamento de qualquer prestação da liquidação objecto do presente processo ao abrigo do mesmo regime, tudo conforme infra se desenvolverá e para onde se remete.
Concluindo, não vislumbra o Tribunal “ad quem” que a sentença recorrida padeça do examinado erro de julgamento de facto, assim sendo forçoso julgar improcedente este fundamento do recurso.
Mais alega o recorrente, em síntese, que já ocorreu o termo final do prazo de prescrição da dívida exequenda consubstanciada na liquidação de I.R.C. objecto do presente processo. Que o Tribunal “a quo” aplicou, erroneamente, as normas previstas no artº.34, nºs.1 e 3, do C.P.T., e no artº.49, nºs.1 a 3, da L.G.T. (cfr.conclusões 19 a 31 do recurso), pelo que deve ser dado provimento ao recurso e, em consequência, ser revogada a decisão recorrida. Com base em tal alegação pretendendo consubstanciar um erro de julgamento de direito da sentença objecto da presente apelação.
Analisemos se a sentença recorrida sofre de tal pecha.
A prescrição da dívida exequenda constitui fundamento de oposição à execução (cfr. artº.176, al.d), do C.P.C.Impostos; artº.286, nº.1, al.d), do C.P.Tributário; artº.204, nº.1, al.d), do C.P.P.Tributário), consubstanciando excepção peremptória de conhecimento oficioso no âmbito do processo tributário (cfr.artº.27, §2 e 3, do C.P.C.Impostos; artº.259, do C.P.Tributário; artº.175, do C.P.P.Tributário).
No que diz respeito ao processo de impugnação judicial, vem entendendo a jurisprudência dos Tribunais Superiores, à qual se adere, que a prescrição da obrigação tributária pode ser do conhecimento do Tribunal no âmbito da identificada espécie processual, embora para retirar da eventual procedência da mesma excepção não a procedência da impugnação e consequente anulação da liquidação objecto do processo (vertente dos requisitos de validade do acto), mas antes a declaração de extinção da instância devido a inutilidade superveniente da lide, dado que estamos perante acto tributário ineficaz, porque inexigível. Verificando-se a prescrição, a lide impugnatória não tem qualquer utilidade. Por outras palavras, a questão não radica na inclusão da prescrição da obrigação tributária no universo de análise da ilegalidade da liquidação mas, em termos processuais, da utilidade da lide impugnatória que, assim, não pode ter qualquer reflexo na relação substancial respectiva, pelo que a sua continuação seria inútil (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 9/2/2005, proc.939/04; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 12/6/2007, proc. 291/07; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 16/1/2008, proc.451/07; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/5/2013, proc.6114/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/6/2013, proc.5618/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/12/2013, proc.6826/13; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.279 e seg.).
O decurso do prazo de prescrição extingue o direito do Estado à cobrança do imposto. O instituto da prescrição, tal como o da caducidade, tem na sua base o interesse da certeza e segurança jurídicas, encontrando aquele igualmente fundamento na negligência do credor (cfr.Pedro Soares Martínez, Direito Fiscal, Almedina, 1996, pág.274 e seg.; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.98 e seg.).
O prazo de prescrição das obrigações tributárias em geral é actualmente de oito anos (cfr.artº.48, da L.G.Tributária), sendo anteriormente de dez anos (cfr.artº.34, do C.P.Tributário), e antes de vinte anos nos termos do artº.27, do C.P.C.Impostos. Embora mais favorável ao contribuinte, o prazo actual não é de aplicação retroactiva, devendo, em tal situação, lançar-se mão dos princípios consagrados no artº.297, do C. Civil, no que diz respeito ao cômputo do mesmo. Nestes termos, o prazo de dez anos consagrado no artº.34, do C. P. Tributário, ou o prazo de oito anos consagrado no artº.48, da Lei Geral Tributária, somente se contam a partir da entrada em vigor dos respectivos diplomas (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 28/4/93, Acórdãos Doutrinais, nº.385, pág.461; ac.T.T.2ª.Instância, 29/10/91, C.T.F.365, pág.243 e seg.; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.98; Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2010, pág.94 e seg.).
Passemos à determinação do regime de prescrição a apor ao caso dos autos. A determinação do regime de prescrição a aplicar faz-se no momento da entrada em vigor da nova lei (cfr.artº.297, nº.1, do C.Civil; Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2010, pág.94).
No que concerne à sucessão de leis no tempo sobre prazos de prescrição, aplica-se o disposto no artº.297, nº.1, do C.Civil, o qual determina que a lei que estabelecer um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar.
O termo inicial do prazo de prescrição conta-se em função da ocorrência do facto tributário (sendo computado a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário, nos impostos periódicos, ou a partir da data em que o facto tributário ocorreu, nos impostos de obrigação única, se o regime aplicável for o previsto na L.G.T.- cfr.artº.48, nº.1, da L.G.Tributária).
À face do regime previsto no C.P.Tributário o prazo de prescrição conta-se desde o início do ano seguinte àquele em que tiver ocorrido o facto tributário, independentemente da natureza periódica ou de obrigação única do tributo em causa (cfr.artº.34, nº.2, do C.P.T.). A instauração de processo de execução fiscal contra o devedor principal, consubstancia facto interruptivo da prescrição, tal como a dedução de reclamação graciosa, recurso hierárquico ou impugnação (cfr.artº.34, nº.3, do C.P.Tributário). Cessa, no entanto, o efeito interruptivo da prescrição a que se alude, o qual se transforma em efeito suspensivo, quando o processo (v.g.execução fiscal) estiver parado durante mais de um ano devido a facto não imputável ao sujeito passivo, caso em que se soma o prazo decorrido após esse período de um ano ao que se tiver verificado até à autuação dos autos (cfr.artº.34, nº.3, do C.P.Tributário; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 8/8/2012, proc.5814/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/4/2013, proc.4416/10).
“In casu”, o facto tributário objecto do presente processo é relativo a I.R.C. do ano de 1992 (cfr.al.k) da matéria de facto provada), imposto periódico, pelo que o termo inicial do prazo de prescrição ocorreu em 01/01/1993 (cfr.artº.34, nº.2, do C.P.T.; artº.48, nº.1, da L.G.T.).
Analisemos agora os factos interruptivos e suspensivos do prazo de prescrição.
Como se retira do preceituado nos artºs.318 a 320, do C.Civil, a suspensão da prescrição tem como efeito que esta não comece a correr ou não corra, depois de iniciado o prazo, enquanto se verificar o facto, de natureza duradoura, a que é atribuído efeito suspensivo. Os factos suspensivos são de natureza duradoura, obstando ao começo e ao decurso do prazo de prescrição enquanto perdurarem, como se infere dos citados artºs. 318, 319 e 320, do C.Civil. Nas leis tributárias prevêem-se factos especiais a que é atribuído efeito suspensivo, pelo que serão essas as regras a aplicar em matéria de prescrição da obrigação tributária (cfr.v.g.artº.49, nº.4, da L.G.Tributária, na redacção resultante da Lei 53-A/2006, de 29/12 - O.E. de 2007). Concluindo, para além da especificidade dos factos a que é atribuído efeito suspensivo, o regime da suspensão da prescrição da obrigação tributária não tem especialidades no domínio do direito tributário, pelo que, face a qualquer facto com natureza suspensiva, enquanto este surtir efeitos, a prescrição não começa nem corre.
Por sua vez, a interrupção da prescrição tem sempre como efeito a inutilização para o respectivo regime de toda o tempo decorrido anteriormente, sendo esse efeito instantâneo o único próprio da interrupção, presente em todas as situações (cfr.artº.326, nº.1, do C.Civil). Porém, em certos casos, designadamente quando a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (cfr.artº.327, nº.1, do C.Civil). Resultam, assim, destes artºs.326 e 327, do C. Civil, dois conceitos de interrupção da prescrição: um que se traduz exclusivamente num efeito instantâneo sobre o prazo de prescrição (inutilização para a prescrição do tempo decorrido); outro que se consubstancia no mesmo efeito instantâneo acrescido de um efeito suspensivo (é eliminado o período decorrido e a prescrição não corre enquanto o processo durar, efeito duradouro este que é próprio dos factos suspensivos da prescrição). Nas leis tributárias prevêem-se factos a que é atribuído efeito interruptivo da obrigação tributária, pelo que não há que fazer apelo às normas do C.Civil, no que concerne a determinar os factos interruptivos. Porém, os efeitos da interrupção da prescrição não estão completamente regulados, assim devendo aplicar-se, quanto a estes, subsidiariamente o regime do Código Civil (cfr.Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2ª. edição, 2010, pág.52 e seg.).
Por último, a aplicação de diferentes regimes no tocante aos prazos prescricionais, em resultado da previsão normativa do artº.297, nº.1, do C.Civil, não impõe a aplicação de um ou outro regime em bloco, pois só se refere tal normativo à lei que altere o prazo e não aos termos em que se conta, nem a tudo o que releva para o seu curso. O texto do artigo e a respectiva epígrafe revelam que se tem em vista apenas as leis que alteram prazos e não as que alteram os efeitos das causas interruptivas ou suspensivas da prescrição. Por isso, as leis que alteram causas de suspensão ou interrupção não sendo leis sobre “alteração de prazos”, não estão abrangidas na previsão do referido artº.297, do C.Civil. Estas leis seguem a regra de aplicação no tempo do artº.12, nº.2, do mesmo diploma (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 2/2/2011, rec.807/10; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 18/9/2012, proc.3171/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 23/4/2013, proc.4416/10; Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2ª. edição, 2010, pág.92).
Consagrava o artº.34, nº.3, do C.P.T., bem como o artº.49, nº.2, da L.G.T. (redacção anterior à Lei 53-A/2006, de 29/12 - O.E. de 2007), que a paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito interruptivo, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após este período ao que tiver decorrido até à data da autuação.
No caso concreto, atenta a matéria de facto provada, assume relevância, desde logo, como vector interruptivo da prescrição, a instauração da reclamação graciosa, a qual ocorreu em 24/04/1997 (cfr.al.l) da matéria de facto provada).
Tal facto interruptivo inutilizou todo o tempo decorrido anteriormente. Relembre-se que ocorrendo uma causa de interrupção e findos os efeitos da mesma, inicia-se uma nova contagem do prazo, ou seja, mais dez anos no caso concreto. Concretizando, a contagem do novo prazo de prescrição de dez anos, passa a ter o seu termo inicial em 25/04/1997 (cfr.artº.279, al.b), do C.Civil), dado que nos encontramos perante facto interruptivo (a instauração de processo de reclamação graciosa) de natureza instantânea. O mesmo se diga da instauração da execução fiscal, ocorrida em 19/05/1997 (cfr.al.r) da matéria de facto provada).
Continuando a examinar a factualidade provada surge-nos, a seguir, como vector suspensivo do prazo de prescrição, a adesão ao regime previsto no dec.lei 124/96, de 10/08 (cfr.alínea p) do probatório), o qual suspendeu o mesmo prazo entre 3/07/1997 e 2/07/2003, datas em que a sociedade recorrente foi admitida no identificado regime e em que foi excluída do mesmo. Recorde-se que a suspensão da prescrição prevista no artº.5, nº.5, do dec.lei 124/96, de 10/08, se mantém desde o despacho de adesão ao regime e até à data de exclusão do mesmo, sendo irrelevante o facto das prestações de pagamento, inicialmente acordadas, não terem sido efectivamente pagas (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 14/07/2008, rec.431/08; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 7/01/2009, rec.569/08; ac.S.T.A. -2ª.Secção, 3/06/2009, rec.466/09).
Com base neste vector suspensivo do prazo de prescrição, inútil se torna o exame das ocorrências processuais no âmbito dos processos de reclamação graciosa e de execução fiscal verificadas até à relatada data de 2/07/2003, devido à dita suspensão do prazo de prescrição.
Continuando a examinar a matéria de facto provada, surge como vector interruptivo da prescrição, a instauração da presente impugnação, a qual ocorreu em 25/11/2003 (cfr.al.o) da matéria de facto provada), tendo os efeitos já supra delineados para a instauração dos processos de reclamação graciosa e de execução fiscal (cfr.artº.49, nº.1, da L.G.T., na redacção da Lei 100/99, de 26/07).
Continuando a examinar a factualidade provada surge-nos, a seguir, como vector suspensivo do prazo de prescrição, o decretamento da suspensão do processo de execução fiscal nº.3255-97/103119.8, o qual se verificou em 08/02/2007 em virtude da prestação de garantia por parte do impugnante/executado/recorrente (cfr.al.s) do probatório).
Tal factualidade é motivo de suspensão do prazo de prescrição nos termos do artº.49, nº.4, da L.G.T., na redacção da Lei 53-A/2006, de 29/12, e artº.169, do C.P.P.T., mais tendo como efeito que tal período não corra enquanto se verificar o facto, de natureza duradoura, a que é atribuído efeito suspensivo (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 7/12/2010, rec.490/10; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 23/11/2011, rec.993/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/05/2016, proc.9523/16; José Maria Fernandes Pires e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Almedina, 2015, pág.470 e seg.), no caso, a decisão com trânsito em julgado do presente processo de impugnação.
Levando em consideração todos os vectores interruptivos e suspensivos do prazo de prescrição acima identificados (desnecessário sendo o exame de outros), deve concluir-se que o prazo de prescrição apenas correu seus termos entre 26/11/2003 (devido a inutilização, para o respectivo regime, de toda o tempo decorrido anteriormente, típico dos vectores interruptivos da prescrição e supra definidos) e 08/02/2007, assim estando muito longe de ocorrer o seu termo final.
Em conclusão, o prazo de prescrição em causa somente voltará a correr termos após o trânsito em julgado da decisão do presente processo de impugnação, pelo que dúvidas não podem restar de que até ao presente a liquidação de I.R.C. identificada na al.k) do probatório não se mostra prescrita, assim se devendo confirmar, nesta parte, a decisão do Tribunal “a quo”, embora com a presente fundamentação.
X
Passemos ao exame da apelação na vertente da errónea qualificação dos rendimentos (mérito da causa).
Começa o recorrente por aduzir, em síntese, que se encontra incorrectamente julgado o ponto de facto elencado sob a alínea b) da matéria de facto. Que se deve alterar a factualidade constante das alíneas g) e i) do probatório. Que se deve aditar ao probatório a seguinte factualidade alegada nos artºs.14 e 16 a 22 do articulado inicial:
- A Recorrente contabilizou como um activo imobilizado corpóreo o lote de terreno para construção a que se referem as alíneas a), d) e g) da Matéria de Facto seleccionada;
- Em 31 de Maio de 1993, a Recorrente entregou a sua Declaração de Rendimentos Modelo 22 do exercício de 1992, tendo apurado um lucro tributável de Esc. 1.460.629$00 (€ 7.286);
- Na sua Declaração de Rendimentos referente a 1992, deduzidos os prejuízos fiscais reportáveis, a Recorrente apurou uma matéria colectável de 899.959$00 (€4.488,98) e imposto a pagar de 356.384$00 (€ 1.777,64);
- Nessa Declaração de Rendimentos, a Recorrente declarou um proveito ou ganho extraordinário, referente à venda do lote de terreno a que se referem as alíneas a), d) e g) da Matéria de Facto seleccionada, no montante de 504.462.416$00 (€ 2.516.247,92);
- No mapa de mais-valias e menos-valias fiscais anexo à Declaração Modelo 22 do exercício de 1992, a Recorrente declarou à Administração Fiscal a obtenção de uma mais-valia resultante da alienação do lote de terreno mencionado em a), d) e g), no montante de 320.317.937$00 (€ 1.597.739,13);
- No quadro 29, campo 569 da Declaração de Rendimentos Modelo 22 referente a 1992, a Recorrente declarou a sua intenção de reinvestir o valor de realização do lote de terreno, no montante de 509.140.000$00 (€ 2.539.579,61).
Que se deve aditar ao probatório a factualidade constante dos artºs.9 a 11 e 48 a 50 do articulado inicial, matéria essa que não pode ser reconduzida à prolação de meras considerações ou juízos conclusivos, integrando factos de que depende a boa decisão da causa, embora sejam do foro interno ou subjectivo (cfr.conclusões 33 a 51 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar mais um erro de julgamento de facto da sentença recorrida.
Examinemos se a decisão do Tribunal "a quo" padece de tal vício.
Antes de mais, remete-se para toda a argumentação jurídica supra exarada quanto ao exame do erro de julgamento de facto em sede da excepção de prescrição.
Relativamente à factualidade constante das alíneas b), g) e i), do probatório, não visualiza o Tribunal a necessidade de alterar a mesma, contrariamente ao que defende o apelante, visto que as alterações pedidas nenhum relevo revestem para a decisão da causa, tudo conforme infra se explicará. O mesmo se diga da matéria de facto constante dos artºs.9 a 11 e 48 a 50 do articulado inicial e relativa ao foro interno ou subjectivo. De resto, quanto à prova das intenções da sociedade recorrente, no que se refere à aquisição dos terrenos identificados na alínea a) da factualidade provada, já constam do probatório indícios seguros constantes das alíneas c) e d).
No que se refere à factualidade constante dos artºs.14 e 16 a 22 do articulado inicial, remete-se o recorrente para a alínea t) aditada ao probatório e supra exarada.
Sem necessidade de mais amplas considerações, concede-se parcial provimento ao presente esteio do recurso, na exacta medida da factualidade aditada ao probatório na alínea t).
Por último, defende o recorrente, em síntese, que o imóvel alienado em 1992 deveria considerar-se integrado no activo imobilizado da sociedade, porque se encontravam cumpridos os pressupostos para ser objecto de tal contabilização. Que a decisão recorrida viola as normas jurídicas previstas nos artºs.42, nºs.1 e 2, e 44, nºs.1, 2 e 4, ambos do C.I.R.C., e artº.18, nº.1, do E.B.F., na redacção à data em vigor (cfr.conclusões 52 a 66 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Vejamos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
O acto tributário tem sempre na sua base uma situação de facto concreta, a qual se encontra prevista abstracta e tipicamente na lei fiscal como geradora do direito ao imposto. Essa situação factual e concreta define-se como facto tributário, o qual só existe desde que se verifiquem todos os pressupostos legalmente previstos para tal. As normas tributárias que contemplam o facto tributário são as relativas à incidência real, as quais definem os seus elementos objectivos (cfr.Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, pág.324; Nuno de Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, II, Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, 1996, pág.57; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.269). Só com a prática do facto tributário nasce a obrigação de imposto. A existência do facto tributário constitui, pois, uma condição “sine qua non” da fixação da matéria tributável e da liquidação efectuada.
O activo imobilizado das empresas é o conjunto de bens que revestem um carácter de permanência, ou seja, os bens que a empresa pretende manter por mais do que um exercício económico. Nesta perspectiva, o Plano Oficial de Contabilidade (P.O.C. aprovado pelo dec.lei 410/89, de 21/11, diploma aplicável ao caso "sub judice"), classificava o activo imobilizado de acordo com a sua natureza - imobilizações financeiras, corpóreas e incorpóreas (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 25/9/2012, proc. 5073/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 15/5/2014, proc.2832/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 4/6/2015, proc.8630/15; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 29/06/2017, proc.125/10.4BEBJA; José María Lozano Irueste, Dicionário abreviado de Economia, Campo das Letras, 1999, pág.139 e seg.; Manuel M. Fernandes Pires, Glossário de Direito Fiscal, Dislivro, 2007, pág.17).
Por outras palavras, os elementos do activo imobilizado (por contraposição ao activo circulante) são os recursos que uma empresa utiliza para realizar as suas operações (objecto social) e que não se destinam a venda no âmbito da sua actividade operacional. Tais elementos caracterizam-se pela sua aptidão para contribuírem para as operações do ente empresarial em causa durante um determinado período de tempo, sendo que, com algumas excepções, essa aptidão vai decrescendo ao longo da sua vida útil.( (a vida útil de um elemento do activo imobilizado é, para efeitos fiscais, o período durante o qual se reintegra ou amortiza totalmente o seu valor - cfr.artº.3, nº.1, do dec.reg.2/90, de 12/1; Gil Fernandes Pereira, Tratamento Fiscal e Contabilístico das Provisões, Amortizações e Reavaliações, 8ª. edição, 2006, pág.177 e seg.). )
Por sua vez, o activo circulante ou existências (stocks) é constituído por todos os bens adquiridos ou produzidos pela empresa que se destinam a venda ou a serem integrados na produção, entre eles nos aparecendo as mercadorias (bens adquiridos para venda sem sofrerem qualquer transformação na empresa), os produtos e trabalhos em curso (os que se encontram em determinada fase do processo produtivo, mas que ainda não atingiram o seu estádio final) e os produtos acabados (os resultantes do processo produtivo da empresa, mas que já atingiram o seu estádio final). Mais se deve referir que o conhecimento e gestão das existências se verifica através do inventário (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 15/09/2016, proc.9587/16; A. Borges e M. Ferrão, A Contabilidade e a Prestação de Contas, Rei dos Livros, 8.ª edição, 2000, pág.173 e seg. e 396 e seg.; A. Borges, A. Rodrigues, R. Rodrigues, Elementos de Contabilidade Geral, Áreas Editora, 19.ª edição, 2002, pag.707 e seg.; Rui Duarte Morais, Apontamentos ao IRC, Almedina, 2009, pág.97 e seg.).
Revertendo ao caso dos autos, como resulta do probatório (cfr.alíneas m) e t) da matéria de facto) a sociedade impugnante/recorrente contabilizou o ganho resultante da venda do lote de terreno identificado nas alíneas a), d) e g), como uma mais-valia, derivada da venda de um imobilizado corpóreo (cfr.artºs.20, nº.1, al.f), e 42, nº.1, do C.I.R.C., na versão em vigor em 1992).
A A. Fiscal, por seu turno, entendeu que o ganho realizado deve ser considerado como resultante do desenvolvimento da actividade económica (objecto social) da sociedade impugnante, o qual consistia, em 1992, no comércio de transacções sobre propriedades rústicas e urbanas, quer por compra e venda, quer arrendamento e construção, ganho esse sujeito a tributação, em sede de IRC, nos termos do artº.20, nº.1, al.a), do C.I.R.C. (cfr.alínea m) do probatório).
Esta alteração traz consequências fiscais, uma vez que a tributação de imóveis-existências e imóveis-imobilizado é diferente, por se encontrarem excluídas da tributação as mais-valias obtidas com a venda do imobilizado corpóreo, desde que o reinvestimento fosse concretizado no prazo de 2 anos (cfr.artº.44, do C.I.R.C.), daí que se imponha tomar posição, sobre se o rendimento em causa resulta da venda de um bem constante das existências ou de um bem constante do imobilizado corpóreo, desta decisão dependendo a sorte da presente acção.
Ora, a distinção entre o activo fixo, ou imobilizado, e o activo circulante, ou existências, deve aferir-se pela intenção que presidiu à aquisição do bem (v.g.lote de terreno) e não à data da sua possível venda, em que a intenção será, manifestamente, a da venda e consequente obtenção de lucro, próprio de qualquer ente empresarial.
Independentemente da dificuldade que em alguns casos possa existir na descoberta da intenção que presidiu à aquisição de um determinado activo, não pode deixar de ser essa intenção que deve motivar a inclusão de tal activo no imobilizado ou nas existências, em sede contabilística. Intenção essa que deve ser aferida dos elementos disponíveis em sede probatória e que estejam associados à dita aquisição. Esta ideia resultava do próprio P.O.C., o qual, na nota explicativa da classe 4 - Imobilizações, refere textualmente que esta classe “inclui os bens detidos com continuidade ou permanência e que não se destinem a ser vendidos ou transformados no decurso normal das operações da empresa”. Este o critério que permite classificar os bens como pertencentes ao activo fixo ou circulante da empresa, o qual assenta, portanto, no destino/intenção que na mesma empresa presidiu à respectiva entrada para o património (cfr.José Alberto Pinheiro Pinto, Tratamento Contabilístico e Fiscal do Imobilizado, Areal Editores, 2005, pág.8 e seg.; A. Borges e M. Ferrão, A Contabilidade e a Prestação de Contas, Rei dos Livros, 8.ª edição, 2000, pág.193).
No caso “sub judice”, da factualidade provada deve retirar-se a conclusão de que o lote de terreno vendido pela sociedade impugnante/recorrente em 1992 se integrava no imobilizado corpóreo da empresa, nesse sentido indo o facto da empresa deter a propriedade de tal imóvel por período superior a cinquenta anos, tal como o facto de ter iniciado, em 1989, um processo de licenciamento relativo ao mesmo imóvel, visando a construção de um edifico para escritórios (cfr.als.a) e d) do probatório). Destes vectores se deve retirar a conclusão de que tal imóvel fazia parte do imobilizado da empresa, que não do activo circulante, nenhum relevo tendo para a tal epílogo se chegar, a venda realizada em 1992 e depois da anexação de uma nova parcela adquirida à Câmara Municipal de Lisboa (cfr.alínea g) do probatório), visto que, conforme acabado de vincar, não será do exame do acto de venda do imóvel que se retira a conclusão do enquadramento do mesmo em sede contabilística (tal enquadramento retira-se do exame da intenção da sua aquisição).
Com estes pressupostos, deve concluir-se que o enquadramento legal constante da declaração de rendimentos apresentada pela sociedade recorrente em relação ao ano de 1992 e em sede de I.R.C. era o correcto, assim padecendo a liquidação impugnada de vício de errónea qualificação dos rendimentos, devendo ser anulada.
Rematando, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se procedente o presente recurso e, consequentemente, revoga-se a decisão recorrida, na parte em que julga improcedente a impugnação quanto ao fundamento da errónea qualificação dos rendimentos, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul ACORDAM EM CONCEDER PROVIMENTO AO RECURSO, REVOGAR A DECISÃO RECORRIDA E JULGAR PROCEDENTE A IMPUGNAÇÃO QUE ORIGINOU O PRESENTE PROCESSO.
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Sem custas, por delas estar isenta a Fazenda Pública.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 18 de Abril de 2018


(Joaquim Condesso - Relator)


(Jorge Cortês - 1º. Adjunto)


(Lurdes Toscano - 2º. Adjunto)