Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07633/14
Secção:CT
Data do Acordão:06/29/2017
Relator:ANABELA RUSSO
Descritores:FUNDAMENTAÇÃO/ REVERSÃO/ÓNUS DA PROVA/EXCUSSÃO PRÉVIA
Sumário:I – Para decidir se um acto administrativo está ou não fundamentado impõe-se, antes de mais, que se faça a distinção entre fundamentação formal e fundamentação material, isto é, que se autonomize a questão de saber se a Administração deu a conhecer os motivos que a determinaram a actuar como actuou, as razões em que fundou a sua actuação, (validade formal do acto) da questão de saber se esses motivos correspondem à realidade e se, correspondendo, são suficientes para legitimar a concreta actuação administrativa (validade substancial do acto).
II – Dentro do âmbito daquela primeira vertente ou tipo de fundamentação, a validade formal do acto está dependente do juízo final que se realize quanto a nele terem sido vertidos (alegados) os pressupostos de que a lei faz depender a sua prática (no caso do despacho de reversão, da responsabilidade tributária subsidiária e a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada).
II – Por força do preceituado no artigo 24.º, n.º 1, al. b), da Lei Geral Tributária, são os gerentes, enquanto responsáveis subsidiários, que têm o ónus de provar que a falta de pagamento dos tributos, cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, não lhes é culposamente imputável.
III - Embora o responsável subsidiário goze do direito de se opor a que a execução dos seus bens se efectue enquanto não forem penhorados e vendidos todos os bens do devedor principal (benefício da excussão), a reversão da execução fiscal contra si pode efectuar-se em momento anterior a essa venda, desde que os bens penhoráveis do devedor principal (e eventuais responsáveis solidários) sejam fundadamente insuficientes para o pagamento da dívida exequenda e acrescido (artigos 23.º n.º 2 da LGT e 153.º n.º 2 do CPPT). O que significa que, face da LGT, concluindo-se pela «fundada insuficiência» de bens penhoráveis do devedor originário, pode ser decidida a reversão, embora a possibilidade de cobrança da dívida através dos bens da responsabilidade subsidiária esteja dependente da prévia excussão dos bens do devedor originário.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:l - RELATÓRIO

R... vem recorrer da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgou improcedente a Oposição Judicial que deduziu à execução fiscal nº... e apensos, originariamente instaurada pelo Serviço de Finanças do ... contra a sociedade “..., Lda” e posteriormente contra si revertida, tendo em vista a cobrança coerciva de dívidas relativas a IVA, IRC, IRS e coimas fiscais, dos anos de 2004 a 2007, tudo no valor global de €44.399,37.

Nas alegações que oportunamente apresentou concluiu nos seguintes termos:

«I. A reversão deve ser precedida da declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação (n°4 do art.24° da LGT e artº124°do CPA).

II. Os atos administrativos de reversão devem conter de forma clara, congruente, suficiente e concreta os motivos de facto e de direito que os fundamentam (art°77° da LGT e art.268°, n°3 da CRP).

III. O Despacho de Reversão, consubstancia uma mera alteração subjetiva da instância executiva e daí que deva conter os requisitos de uma petição em ordem àquela alteração, ou seja, deve enunciar os pressupostos factos e de direito previstos nos artigos 23° da LGT e 153° do CPPT (vide, Acórdão do STA de 02/04/2009, tirado no Recurso n° 01130/08).

IV. O Despacho de Reversão do Exmo. Senhor Chefe do Serviço de Finanças do ..., não fundamenta a reversão, nem descreve as diligências efectuadas, nomeadamente quanto à insuficiência de bens penhoráveis da devedora principal e ainda menos, quanto à excussão prévia dos bens daquela, nem por remissão.

V. Sendo o Despacho de Reversão, omisso nestes aspectos a sua fundamentação é insuficiente, pois só refere buscas informáticas, o que equivale à falta da respectiva fundamentação, gerando a sua invalidade, sendo o ato anulável (n°2 do artº125°doCPA).

VI. Assim, a douta Sentença recorrida, ao ter mantido o despacho de reversão, julgando improcedente a oposição, preconizou uma incorrecta interpretação das disposições legais aplicáveis, não podendo em consequência, permanecer na ordem jurídica.

VII. Ora, a douta Sentença recorrida, tomou em conta factos não alegados pela Fazenda Pública, tendo em vista a solução a dar à causa, sendo certo que o seu conhecimento não era oficioso.

VIII. Pelo que, padece nesta parte de erro de julgamento por violação do princípio do dispositivo, enunciado no artigo 264° do CPC, donde se extrai a regra da proibição do juiz se servir de factos não alegados pelas partes (neste sentido, v/de o Acórdão do STA de 02/04/2009, acima citado).

IX. Assim, a douta Sentença recorrida, ao ter mantido o despacho de reversão, julgando improcedente a oposição, preconizou uma incorrecta interpretação das disposições legais aplicáveis, não podendo em consequência, também pelo ora exposto, permanecer na ordem jurídica.

X. Nunca foi invocado pela Fazenda Pública que para demonstrar a ausência de culpa do ora recorrente, era obrigatória a cobrança das dívidas da sociedade.

XI. Ora, a douta Sentença recorrida, tomou em conta factos não alegados pela Fazenda Pública, tendo em vista a solução a dar à causa, sendo certo que o seu conhecimento não era oficioso.

XII. Pelo que, padece nesta parte de erro de julgamento por violação do princípio do dispositivo, enunciado no artigo 264° do CPC, donde se extrai a regra da proibição do juiz se servir de factos não alegados pelas partes (neste sentido, vide o Acórdão do STA de 02/04/2009, acima citado).

XIII. Assim, ainda que se entenda que o Despacho de Reversão não padece do vício de falta de fundamentação, o que se refuta com veemência, pelo ora exposto, sempre a oposição deveria proceder.

Nestes termos, atentos os fundamentos expendidos, nos melhores de direito, sempre com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser pelos fundamentos aduzidos, revogada a douta Sentença do Tribunal "a quo", e em consequência julgada procedente a oposição à execução fiscal na origem dos presentes autos, com todas as consequências legais daí advindas.».

A Fazenda Pública notificada da admissão do recurso, não contra-alegou.

A Exma. Procuradora-Geral Adjunta neste Tribunal Central emitiu parecer defendendo a improcedência do recurso.

Colhidos os «Vistos» das Exmas. Juízas Desembargadoras Adjuntas, cumpre, agora, decidir.

II - OBEJCTO DO RECURSO

Como é sabido, sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que o recorrente remate a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem.

Assim, e pese embora na falta de especificação no requerimento de interposição se deva entender que este abrange tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (artigo 635°, n°2, do C.P.C.), esse objecto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (n°3 do mesmo artigo 635°). Pelo que, todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, devem considerar-se definitivamente decididas e, consequentemente, delas não pode conhecer o Tribunal de recurso.

Acresce que, constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode pretender, salvo a já mencionada situação de questões de conhecimento oficioso, a reapreciação do decidido e não a prolação de decisão sobre matéria não submetida à apreciação do Tribunal a quo.

Atento o exposto, e as conclusões das alegações do recurso interposto, importa agora decidir se a sentença recorrida, ao julgar que o despacho de reversão está devidamente fundamentado e que o Oponente não logrou provar que não lhe é imputável culposamente a insuficiência patrimonial da sociedade para solver as dívidas fiscais, errou na apreciação dos factos apurados e no direito aplicável.

III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
A sentença recorrida deu como assente a factualidade que infra se reproduz:

1. A gerência da sociedade V..., Lda., desde 24/01/2004 pertencia a R... (cfr. doc. junto a fls. 10 a 19 do processo executivo junto aos autos);

2. A declaração de Inicio de Actividade da sociedade identificada no ponto anterior foi assinada pelo oponente (cfr. doc. junto a fls. 20 a 21, frente e verso, do processo executivo junto aos autos);

3. A Declaração de Alterações da Actividade da sociedade identificada no ponto 1 foi assinada pelo oponente (cfr. doc. junto a fls. 22 a 23, frente e verso do processo executivo junto aos autos);

4. Em 08/01/2004, foi autuado o processo de execução fiscal n°... por dívidas de lVA de 2002 no montante de €2.360,71 em que é executada a sociedade comercial por quotas sob a firma V..., Lda. (cfr. doc. junto a fls. 2 e 3 do processo executivo junto aos autos);

5. Ao processo identificado no ponto anterior foram apensos os processos n°…, referentes a coimas, IVA de 2004, a 2006, IRS de 2006 e 2007 e IRC de 2004 e 2005 num montante global de €45.758,93 (cfr. docs. junto a fls. 27 e fls. finais do processo executivo junto aos autos);

6. A Sociedade F..., por carta de 29/11/2006, informou que não tem nenhum movimento aberto com a devedora originária (cfr. doc. junto a fls. 8 dos autos);

7. Em 14/05/2008, foi elaborada uma informação da qual consta que após buscas informáticas verificou-se a insuficiência de bens penhoráveis, remetendo-se para fls. 8 e 9 do processo executivo (cfr. doc. junto a fls. 24 e 25 do processo executivo junto aos autos);

8. Em 20/06/2008 foi proferido despacho onde se determina a reversão contra a oponente com fundamento de não existirem bens da sociedade originariamente devedora suficientes para pagamento da dívida (cfr. doc. junto a fls. 42 do processo executivo junto aos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido);

9. Por oficio de 25/06/2008 foi o oponente citado na qualidade de revertido das dívidas identificadas no ofício (cfr. doc. junto a fls. 65 a 66 do processo executivo junto aos autos);

10. Por requerimento de 24/07/2008 a devedora originário requereu que fossem penhorados os seus créditos sobre a sociedade F... - Digital Imagens, Lda., NIPC …, juntando cópias de facturas por si emitidas em 2007 e 2008 no montante global de €52.850,00 (cfr. doc. junto a fls. 57 a 61 do processo executivo junto aos autos).


Consta da mesma sentença que: «Dos factos constantes da oposição, todos objectos de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita» e que: «A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório».

IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

A presente Oposição foi deduzida contra o despacho do órgão de execução fiscal que, julgando o património da executada originária insuficiente para pagamento da dívida exequenda, determinou que os autos prosseguissem para cobrança daquela dívida contra o gerente, Oponente e doravante recorrente, que passou a assumir, por força desse despacho, a qualidade de revertido.

Como resulta da petição inicial, o recorrente nunca questionou a existência da dívida ou a sua qualidade de gerente de facto e direito da sociedade, mas, tão só, a falta de fundamentação do despacho de reversão, por dele não constarem as diligências que concretamente suportaram a conclusão da Administração tributária vertida no despacho de reversão quanto à invocada insuficiência patrimonial; a inexistência, nesse despacho, de factos/provas capazes de suportar a verificação do “pressuposto culpa” quanto à mencionada insuficiência e a inexistência de nexo causal entre qualquer conduta que tenha assumido e o não pagamento das dívidas fiscais. Tudo, defende, que se impunha que a Fazenda Pública tivesse invocado e realizado, por assim o determinar o que se mostra consagrado no artigo 24.º da LGT e anteriormente no artigo 13.º do CPT.

Na sentença, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, a Oposição veio a ser julgada procedente no que respeita à dívida relativa a coimas e improcedente no que se reporta aos valores em falta e devidos a título de IVA, IRS e IRC, aduzindo, para o que ora releva atento o objecto deste recurso, que:

«(…)
Decorre do probatório supra que o despacho de reversão se estriba numa informação onde é afirmado que apôs as diligências efectuadas se verifica que não existem bens suficientes da devedora originária para fazerem face às dívidas exequendas e acrescido.
Embora fundamentado de forma sucinta a verdade é que o despacho e a respectiva fundamentação cumprem as exigências do art.23° do LGT, pelo que improcede nesta parte a presente oposição.
O oponente alega ainda que não é parte legítima na presente execução porquanto não foi por culpa sua que o património da devedora originária se tornou insuficiente para fazer face às dívidas exequendas.
Vejamos então a questão da responsabilidade subsidiária do oponente.
Desde logo convém esclarecer que as normas que determinam a responsabilidade dos gerentes relativamente às dívidas tributárias são normas de carácter substantivo pelo que deverão ser aplicadas as normas que estiverem em vigor à data dos factos a que se reporta a reversão ou, dito doutro modo, à data a que se reportam os impostos ou contribuições em causa
(…)
Assim sendo, e passando agora ao caso concreto dos presentes autos e estando nós perante dívidas de lVA do exercício de lVA de 2002 e 2004 a 2006, IRS de 2006 e 2007 e IRC de 2004 e 2005, ou seja, na vigência do art.24° da LGT (cfr. pontos 4 e 5 do probatório supra), as normas referentes à responsabilidade subsidiária dos gerentes, aplicáveis ao caso dos autos são as constantes da LGT.
Ora, determina o art. 24° da LGT, na redacção em vigor à data dos factos, que:
"1 - Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento. (...)"
Desta norma resulta que são dois os regimes distintos de responsabilidade dos corpos sociais das sociedades pelas dívidas tributárias onde responsabilidade assenta sempre na insuficiência do património societário. Acontece porém que no caso da alínea a) compete à AF provar que a falta de pagamento decorre da culpa do gerente na falta ou insuficiência do património societário para fazer face ao pagamento das dívidas fiscais; pelo contrário no caso da al. b) a responsabilidade pela falta de pagamento, porque esta ocorre durante o período da gerência, a lei presume a responsabilidade por essa falta e impende sobre o gerente o ónus da prova da falta de responsabilidade pela falta do pagamento não é da sua responsabilidade.
(…)
Decorre do probatório supra que o oponente foi gerente da devedora originária, de direito e de facto (cfr. pontos 1 a 3 do probatório supra), durante o período desde a constituição da sociedade até ao presente.
Ou seja, em qualquer dos momentos a que se reportam os impostos em falta o oponente era gerente de direito e de facto da devedora originária, pelo que relativamente a estes impostos será de aplicar o disposto na alínea b) do n°1 do art.24° da LGT.
Assim sendo e uma vez que em qualquer dos impostos em causa nos autos é sempre aplicável a alínea b) do n° 1 do art.24° da LGT, cumpria ao oponente alegar e provar que não foi por culpa sua que os impostos em causa não foram pagos pela devedora originária e à Fazenda Pública provar que o oponente havia sido gerente de facto da referida sociedade.
O Oponente exerceu a gerência de facto da sociedade. Desde logo pela AF foram juntos elementos que provam essa gerência de facto; por outro lado, tal facto não é colocado em causa pelo oponente.
O que o oponente alega é que não está provada a insuficiência do património da devedora originária tanto mais que alega existirem créditos desta sobre uma outra sociedade.
Ora, decorre do regime da LGT, mais concretamente do seu art. 24° supra transcrito que é ao oponente que incumbe esta prova de que não foi por culpa sua que o património da devedora originária se tornou insuficiente para o pagamento das dívidas tributárias.
No caso concreto o oponente não logrou fazer tal prova. Mais, se o oponente sabe que existem tais créditos é sua obrigação como gerente da sociedade que administra obrigar a devedora a pagar esses créditos. Se o não fez não pode afirmar que não é por sua culpa que o património da sociedade não é suficiente para pagar as dívidas.
Acresce ainda que a AF não tem que se substituir a devedora originária.
Improcede por isso, nesta parte a presente oposição.» (negrito de nossa autoria).

Exposta a pretensão tal como a mesma foi pelo Oponente definida na petição inicial e revelada a forma como as questões suscitadas foram enquadradas de facto e direito no julgado, vejamos, agora, em que termos se encontra suportada a pretensão revogatória neste recurso aduzida.

4.1. Assim, e quanto à questão da fundamentação, imputa o recorrente à sentença dois erros ou vícios:

(i) o despacho de reversão não fundamenta a reversão porque não descreve as diligências efectuadas, nomeadamente quanto à insuficiência de bens penhoráveis da devedora principal e ainda menos, quanto à excussão prévia dos bens daquela, nem por remissão, sendo que, para concluir pela verificação daquela fundamentação o Tribunal a quo, para além de desconsiderar a referida omissão de identificação de diligências, relevou factos que dele não constavam e que não eram do seu conhecimento oficioso. Tudo, pois, em violação do preceituado, em especial, nos artigos 23.º, 24.º, n.º 4 e 77.º, da LGT, 153.º do CPPT, 124.º e 125.º, do CPA, 264.º do CPC e 268.º, n.º 3, da CRP [conclusões I. a IX.]

(ii) independentemente do juízo de falta de fundamentação, sempre a Oposição deveria ter sido julgada procedente - presume-se, por ser essa a única decisão compatível com a desconsideração daquela factualidade não invocada [conjugação lógica e única capaz de suportar algum efeito útil ao vertido na conclusão XIII].

Vejamos, então, per se, as objecções suscitadas.
Começando pela questão da fundamentação do despacho de reversão, adianta-se que a sua necessidade, enquanto acto administrativo (em matéria tributária) que aquele despacho inquestionavelmente é, está pacificamente firmada na doutrina e jurisprudência, posições que constituem um corolário indiscutível do nosso ordenamento jurídico.
Efectivamente, e como de forma sistemática tem vindo a ser expressamente afirmado, a decisão de um procedimento deve ser sempre fundamentada ainda que por sucinta exposição das razões de facto e de direito que a motivaram, admitindo-se que essa fundamentação possa consistir numa declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, sem prejuízo, como é natural, da indicação das disposições legais aplicáveis, conforme artigo 77.°, n.º 1 e 2, da Lei Geral Tributária.

Acresce que, o artigo 125° do Código de Procedimento Administrativo (CPA), em conformidade com a constitucional exigência plasmada no art. 268º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa (CRP), dispõe que a fundamentação deve ser expressa através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres ou informações ou propostas, que constituirão neste caso parte integrante do respectivo acto.

Num acórdão do Supremo Tribunal Administrativo em que a questão da fundamentação dos actos administrativos em matéria tributária foi profundamente analisada [Acórdão de 3-11-2010, relatado pelo Conselheiro Casimiro Gonçalves e disponível em www.dgsi.pt], fez-se uma síntese impar do que não pode ser desconsiderado na apreciação desta questão: «A fundamentação do acto tributário ou de acto «praticado em matéria tributária» que afecte os direitos ou interesses legalmente protegidos do contribuinte, deve ser contextual e integrada no próprio acto (ainda que o possa ser de forma remissiva), expressa (através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão), clara (de modo a permitir que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide), suficiente (permitindo ao destinatário do acto um conhecimento concreto da motivação deste) e congruente (a decisão deverá constituir a conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação).

Em suma, diz-se no mesmo Acórdão, «Utilizando a linguagem da jurisprudência, o acto só está fundamentado se um destinatário normalmente diligente ou razoável - uma pessoa normal - colocado na situação concreta expressada pela declaração fundamentadora e perante o concreto acto administrativo (que determinará consoante a sua diversa natureza ou tipo uma maior ou menor exigência da densidade dos elementos de fundamentação) fica em condições de conhecer o itinerário funcional (não psicológico) cognoscitivo e valorativo do autor do acto, sendo, portanto, essencial que o discurso contextual lhe dê a conhecer todo o percurso da apreensão e valoração dos pressupostos de facto e de direito que suportam a decisão ou os motivos por que se decidiu num determinado sentido e não em qualquer outro. Ela visa «esclarecer concretamente as razões que determinaram a decisão tomada e não encontrar a base substancial que porventura a legitime, já que o dever formal de fundamentação se cumpre “pela apresentação de pressupostos possíveis ou de motivos coerentes e credíveis, enquanto a fundamentação substancial exige a existência de pressupostos reais e de motivos correctos susceptíveis de suportarem uma decisão legítima quanto ao fundo”. O discurso fundamentador tem de ser capaz de esclarecer as razões determinantes do acto, para o que há-de ser um discurso claro e racional; mas, na medida em que a sua falta ou insuficiência acarreta um vício formal, não está em causa, para avaliar da correcção formal do acto, a valia substancial dos fundamentos aduzidos, mas só a sua existência, suficiência e coerência, em termos de dar a conhecer as razões da decisão.» (cfr. Vieira de Andrade - O Dever de Fundamentação Expressa de Actos Administrativos, pag. 239, na citação do ac. do STA, de 11/12/2002, rec. 01486/02)».

Ainda no que respeita concretamente à fundamentação do despacho de reversão, também a jurisprudência do nosso Superior Tribunal há muito não tem dúvidas: o acto administrativo tributário - despacho de reversão deve incluir, além da indicação das normas legais que determinam a imputação da responsabilidade subsidiária ao revertido, por forma a permitir-lhe o eventual exercício esclarecido do direito de defesa (citado nº 1 do art. 77º da LGT), também a «declaração fundamentada dos seus pressupostos e extensão, a incluir na citação».

Assim, e porque «são pressupostos da responsabilidade tributária subsidiária, a inexistência ou fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal, dos responsáveis solidários e seus sucessores (nº 2 do art. 23º da LGT e nº 2 do art. 153º do CPPT), bem como o exercício efectivo do cargo nos períodos relevantes de verificação do facto constitutivo da dívida tributária ou do prazo legal de pagamento ou entrega desta (nº 1 do art. 24º da LGT).», «a fundamentação formal do despacho de reversão se baste com a alegação dos pressupostos e com a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada (citado nº 4 do art. 23º da LGT).», não se «impondo, porém, que dele constem os factos concretos nos quais a AT fundamenta a alegação relativa ao exercício efectivo das funções do gerente revertido.».

Em suma, para apurar se um acto administrativo-tributário está, ou não, fundamentado impõe-se, antes de mais, que se faça a distinção entre fundamentação formal e fundamentação material, isto é, que se autonomize a questão de saber se a Administração deu a conhecer os motivos que a determinaram a actuar como actuou, as razões em que fundou a sua actuação, (validade formal do acto) da questão de saber se esses motivos correspondem à realidade e se, correspondendo, são suficientes para legitimar a concreta actuação administrativa (validade substancial do acto).
Clarificada a distinção, e dentro do âmbito daquela primeira vertente ou tipo de fundamentação, aferir se efectivamente no despacho se encontram vertidos os referidos pressupostos da responsabilidade tributária subsidiária e a referência à extensão temporal da responsabilidade subsidiária que está a ser efectivada, como dissemos, imprescindíveis ao reconhecimento da validade formal do acto.
No caso concreto, e face ao que supra deixámos notado, impõe-se concluir que o recorrente questiona a falta de fundamentação formal e a falta de fundamentação substancial. A primeira, quando alega que no despacho deviam constar as concretas diligências realizadas. A segunda quando diz não ter a Administração Fiscal demonstrado a sua culpa naquela insuficiência ou, sequer que ela exista, não valendo para tal o resultado de uma mera consulta do sistema informático, para além de que, como bem demonstrou, a devedora originária tem créditos e, consequentemente, não podia o órgão de execução fiscal ter contra si revertido a execução antes devendo executar aquele património societário.
Ora, salvo o devido respeito, nem quanto a uma, nem quanto a outra das objecções ou asserções lhe deve ser reconhecida razão.
Na verdade, e atentando no teor do despacho de fundamentação tal como o mesmo ficou provado no ponto 8 do probatório, mais concretamente no teor do despacho constante de fls. 42, para o qual naquele ponto somos remetidos, constamos com facilidade que aí foram vertidos os pressupostos da reversão: evidente insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal que possa satisfazer a dívida exequenda e respectivos acréscimos legais, necessidade de garantir esse pagamento pela figura da reversão chamando á execução o responsável subsidiário/ gerente para que satisfaça aquele pagamento, invocando-se, juridicamente, o preceituado, conjugadamente, nos artigos 23.º e 24.º, 153.º e 159.º do CPPT e ordenando a sua citação, nestes termos e com cópias do despacho, da informação que o antecedia (da qual constavam as “buscas informáticas” realizadas e plasmadas a fls. 8 e 9 dos autos de execução) e da certidão da dívida.
O que veio a ser feito, como igualmente resulta evidente do ponto 9., da factualidade apurada e do teor dos documentos para onde aí somos remetidos.
Não podemos, pois, contemporizar com a insistentemente alegada “falta de fundamentação” formal do despacho de reversão que, pelo exposto, se tem que julgar improcedente.

4.2. Questão distinta, e que o recorrente igualmente convoca, é a da falta de fundamentação substancial do despacho de reversão, isto é, que “esses motivos” não correspondem à realidade e que o apurado é insuficiente para legitimar a concreta actuação administrativa (validade substancial do acto).
A este propósito urge realizar antes de mais um breve parêntesis: a recorrente “começa” por colocar a questão da validade substancial do despacho e, consequentemente, a critica ao julgado, numa alegada violação do princípio do dispositivo consagrado no artigo 264.º, do Código de Processo Civil.
Diga-se, e daí a necessidade deste parêntesis, que este Tribunal de recurso teve muitas dúvidas se a recorrente “começa” nessa violação a crítica ao julgado ou se nessa violação se esgota o fundamento da sua pretensão revogatória, já que, como se vê do teor das conclusões VII a XIII, tudo quanto se colhe, para além da concretização daquela violação do princípio do dispositivo, é a conclusiva afirmação de que «XIII. Assim, ainda que se entenda que o Despacho de Reversão não padece do vício de falta de fundamentação, o que se refuta com veemência, pelo ora exposto, sempre a oposição deveria proceder.».
Todavia, porque da locução adverbial utilizada ainda é possível extrair a conclusão que o que a recorrente pretende invocar é que da desconsideração dos “factos novos” – em que alegadamente se louvou a sentença recorrida - resulta a ilegalidade do despacho de reversão, este Tribunal apreciará do mérito da decisão com a amplitude por nós agora definida.
Antes de avançarmos na apreciação do recurso e porque, como vimos, é na violação do princípio do dispositivo que o recorrente, no essencial, suporta a revogação da decisão, importa que tenhamos presente o seguinte: o princípio do dispositivo, hoje consagrado no artigo 5.º do CPC e durante muitos anos sedimentado no artigo 264.º do mesmo Código [o que terá inclusive o Ilustre Mandatário, pese embora na data de prolação da sentença e de interposição do recurso ter já entrado em vigor o Código de Processo Civil na nova redacção (doravante apenas designado por NCPC) e, como tal, aplicável] foi sempre visto, na sua forma pura, como traduzindo a ideia (princípio) de que são as partes que dispõe do processo tal como dispõe da relação jurídica material que aquele processo visa conformar. Ou seja, tal como no domínio das relações jurídicas que têm por objecto direitos disponíveis cabe às partes o total controlo da sua sindicância, também ao nível do processo às partes cabe promover o que bem entendam, competindo ao Juiz um mero papel de controlo, uma função de controlador de observância das normas processuais.
Esta consagração pura do principio do dispositivo constitui, como é sabido, uma realidade jurídico processual cada vez mais afastada dos ordenamentos jurídicos modernos, sendo hoje comum a sua instituição temperada ou, como é mais comum dizer-se, que a sua consagração surja mitigada pela consagração de outros princípios, como o do inquisitório, capazes de, sem afastar em absoluto o poder das partes de influírem decisivamente no controlo da relação material e processual, facultar os meios processuais necessários a que o juiz tenha uma maior intervenção ao nível dessa conformação processual, com elevados e muito positivos reflexos ao nível da concretização de princípios fundamentais, como sejam os da verdade material e da justiça (que os meios processuais visam, como é sabido, antes de mais, satisfazer).
É neste contexto que deve ser entendida a consagração, antes da reforma do NCPC, das alterações introduzidas pelo reforma processual de 1995, com a consagração formal, no então artigo 265.º, do princípio inquisitório, evidenciado pelo reforço dos poderes atribuídos ao juiz na condução do processo (artigo 265.º, n.º 1 e 2) e pelo aumento de poderes tendo em vista a descoberta da verdade (artigo 265.º, nº 3 do mesmo diploma), os quais ganham uma maior acuidade e relevância se conjugado com a implementação de outros, sobretudo ao nível de aquisição de prova (artigos 552.º, n.º 1 e 645.º, ambos do CPC96).
Em suma, o legislador processual civil, não optando pelo sacrifício imediato de um princípio em desfavor de outro, entendeu ser o momento de ponderar as vantagens e as menos valias de um e outro, e estabelecer as regras que julgou capazes de assegurar uma relação adequada (proporcional) aos interesses visados, mantendo, desta forma, o reconhecimento do princípio dispositivo como um dos princípios estruturantes do processo e realçando, simultaneamente, a importância da investigação oficiosa, apenas operante dentro dos limites legalmente estabelecidos, para o apuramento da verdade (cfr. Preâmbulo do DL 329-A/95).
É, no fundo, e se bem vemos, esta filosofia que vem a obter um avanço acrescido, em termos de reconhecimento formal, com a última reforma do Código de processo Civil (introduzida pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, desde 1 de Setembro de 2013), como nos é revelado pelo regime consagrado no artigo 5.º do NCPC (que acolheu os n.ºs 1 e 2 do anterior artigo 264.º e a primeira parte do artigo 664.º, todos na anterior redacção), quer através da nova epígrafe do preceito (onde antes se identificava o “Princípio do dispositivo” hoje menciona-se expressamente um “Ónus de alegação das partes e poderes de cognição do tribunal”) quer pelos efeitos do novo regime do princípio do inquisitório e do dispositivo, cujo balizamento final se há-de alcançar pela consideração do corpo deste preceito na sua articulação, em especial, com o disposto no artigo 3.º, n.º 1, 6.º, n.º 1 e 272.º, n.º 2 (segunda parte) e n.º 4.
Ou seja, hoje está de forma expressa legalmente consagrada a vontade que se vinha fazendo sentir na comunidade jurídica de «homenagear o mérito e a substância em detrimento da mera formalidade processual» conferindo-se às partes «a prerrogativa de articularem os factos essenciais que sustentam as respectivas pretensões, ficando reservada a possibilidade de, ao longo de toda a tramitação (…) vir a entrar nos autos todo um acervo factual merecedor de consideração pelo tribunal com vista à justa composição do litígio» (cfr. “Exposição de Motivos” que acompanhou a Proposta de Lei n.º 113/XII).
Cientes desta evolução legislativa e ponderada as especificas condicionantes, substantivas e, especialmente, processuais, da questão que enfrentamos, que dizer da objecção do recorrente?
Naturalmente, que a mesma não tem qualquer sentido.
Desde logo porque na sentença não foi, como demonstraremos, invocado como suporte da decisão de julgar improcedente o vício de falta de fundamentação qualquer facto não invocado pela Administração Tributária.
Depois, porque estando nós no âmbito da validade substancial do despacho de reversão, isto é, da prova de verificação dos pressupostos efectivamente invocados pela Administração Tributária, a sustentação de uma decisão quanto aos factos/pressupostos invocados constitui um verdadeiro dever do Juiz em processo tributário, nos termos em que o exercício da sua função se mostra conformada no artigo 13.º do Código de procedimento e de Processo Tributário.
Porém, como dissemos, nem foi este último circunstancialismo o que se verificou.
Na verdade, e revertendo ao caso concreto, recordemos os “factos novos” em que o Tribunal a quo, no entender do recorrente, suportou o seu julgamento de validade substancial do despacho de reversão: «Nunca foi invocado pela Fazenda Pública que para demonstrar a ausência de culpa do ora recorrente, era obrigatória a cobrança das dívidas da sociedade”, factos que foram atendidos pela sentença para decidir pela sua fundamentação substancial.
Acontece porém que, devidamente lida a sentença recorridae que supra na parte relevante deixámos transcritapercebe-se com meridiana clareza que o Tribunal a quo não fundou a validade substancial do despacho de reversão em qualquer “facto novo”, tendo-se limitado, na apreciação dos argumentos aduzidos pelo então Oponente, a demonstrar a sua inconsistência: «O que o oponente alega é que não está provada a insuficiência do património da devedora originária tanto mais que alega existirem créditos desta sobre uma outra sociedade.//Ora, decorre do regime da LGT, mais concretamente do seu art. 24° supra transcrito que é ao oponente que incumbe a prova de que não foi por culpa sua que o património da devedora originária se tornou insuficiente para o pagamento das dívidas tributárias.//No caso concreto o oponente não logrou fazer tal prova. Mais, se o oponente sabe que existem tais créditos é sua obrigação como gerente da sociedade que administra obrigar a devedora a pagar esses créditos. Se o não fez não pode afirmar que não é por sua culpa que o património da sociedade não é suficiente para pagar as dívidas. Acresce ainda que a AF não tem que se substituir a devedora originária.».
E se é certo que nesta parte a sentença andou menos bem – como veremos, a improcedência nesta parte do recurso não pode encontrar conforto, ou pelo menos não pode apenas confortar-se no juízo realizado – não é menos certo que a tentativa de desmontar a argumentação do recorrente, que efectivamente invocou a falta de prova da insuficiência patrimonial e até imputou à Administração Tributária a obrigação de a demonstrar, não constitui nenhuma violação do princípio do dispositivo.
Porém, porque há efectivamente alguma confusão na sentença entre a alegação de insuficiência patrimonial que sustenta o despacho de reversão, a invocação de falta de sustentação real da invocação desse pressupostos do despacho de reversão – que foi o que o recorrente verdadeiramente invocou na petição de Oposição e ora clama em recurso - e o ónus de prova da inexistência de culpa do Oponente por essa insuficiência, impõe-se que analisemos o julgado nesta tripla perspectiva.
Assim, sendo indiscutível que a Administração tributária realizou as diligências possíveis no sentido de apurar da existência de bens, pesquisando com os meios ao seu dispor para os lograr encontrar – cfr. factualidade vertida no probatório nos pontos 6., 7. e 8., do ponto III supra– e que é dessa verdade ao tempo da prolação do despacho que nos incumbe apurar, a única conclusão que se pode extrair é a de que na data dessa prolação não existiam bens susceptíveis de, penhorados que fossem, assegurar, no mínimo de forma suficiente, o tributo cujo pagamento é exigível.
Note-se, o que é por demais relevante, que mesmo antes da invocação pelo ora recorrente da existência de créditos sobre uma terceira sociedade, a própria Administração Tributária notificou a mesma entidade para informar da existência desses créditos, no ano de 2006, e que só após uma resposta negativa, prosseguiu com a preparação do procedimento no sentido de reverter a execução contra o responsável subsidiário. E que, notificado da preparação do procedimento e da intenção de contra si a execução prosseguir na qualidade de revertido, o Oponente nada invocou - sendo neste contexto que se entende a argumentação exposta na sentença de que não podia a Administração Tributária substituir-se ao Oponente na completa informação de bens que aquele não indicara -, sendo apenas já no âmbito deste processo, e após ter sido proferido despacho de reversão, que veio alegar que existem bens, créditos, que, como o próprio confessa, terão (alegadamente) sido constituídos ou entrado no património da devedora originária em 2008, isto é, após o mesmo despacho de reversão ter sido proferido e, consequentemente, insusceptíveis, mesmo que existam, de por em causa a conclusão de insuficiência patrimonial que anteriormente a essa constituição dos créditos foi tomada.
Temos, pois, por seguro, que o invocado em recurso, nesta parte, mantém intocada a alegação e comprovação da insuficiência patrimonial na data de prolação do despacho de reversão.
Restam, assim, ainda duas questões. A questão do ónus da prova quanto à culpa pela insuficiência de bens capazes de assegurar o pagamento da dívida e a questão do benefício de excussão prévia, ambas invocadas em recurso.
Relativamente à primeira, não parece que possam existir dúvidas de que é sobre o revertido que recai o ónus dessa prova. Este é um entendimento doutrinário e jurisprudencialmente pacífico desde a entrada em vigor da Lei Geral Tributária e que, de resto, resulta linearmente da lei, mais concretamente do preceituado no artigo 24.º, n.º 1, al. b), do referido diploma legal (normativo aplicável já que foi no período de exercício do cargo de gerente do responsável subsidiário que terminou o prazo legal de pagamento terminou), que sob a epígrafe «Responsabilidade dos membros de corpos sociais e responsáveis técnicos» determina que os gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.
Quanto à questão do benefício de excussão prévia, para além de antes deste recurso, se bem vemos, nunca antes ter sido invocada, pelo menos não de forma clara, sempre se dirá que é uma falsa questão, uma vez que, como é sabido, - e limitamo-nos a reproduzir um esclarecedor sumário de um recentíssimo acórdão do Supremo Tribunal Administrativo - embora o responsável subsidiário goze do direito de se opor a que a execução dos seus bens se efectue enquanto não forem penhorados e vendidos todos os bens do devedor principal (benefício da excussão), a reversão da execução fiscal contra si pode efectuar-se em momento anterior a essa venda, desde que os bens penhoráveis do devedor principal (e eventuais responsáveis solidários) sejam fundadamente insuficientes para o pagamento da dívida exequenda e acrescido (artigos 23.º n.º 2 da LGT e 153.º n.º 2 do CPPT). O que significa que, face da LGT, concluindo-se pela «fundada insuficiência» de bens penhoráveis do devedor originário, pode ser decidida a reversão, embora a possibilidade de cobrança da dívida através dos bens da responsabilidade subsidiária esteja dependente da prévia excussão dos bens do devedor originário. Tal interpretação não se afigura violadora dos princípios da justiça, da capacidade contributiva, da igualdade ou da proporcionalidade (Acórdão do STA de 25-1-2017, processo n.º 286/16).

Improcede, pois, integralmente o recurso jurisdicional interposto pelo Oponente, confirmando-se, com a fundamentação de facto e direito exposta nos pontos III e IV, a decisão recorrida.

V - Decisão

Por todo o exposto, acordam os Juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em julgar improcedente o recurso jurisdicional interposto por R....

Custas pelo recorrente.

Registe e notifique.

Lisboa, 29 de Junho de 2017

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[Anabela Russo]

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[Lurdes Toscano]





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[Ana Pinhol]