Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1424/10.0BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:11/14/2019
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO;
FALTA DE NOTIFICAÇÃO;
IVA E COIMAS;
INEXIGIBILIDADE.
Sumário:1 - Tendo a notificação da liquidação de IVA sido efectuada por carta registada com aviso de recepção, o respectivo regime legal decorre dos n°s 3 a 6 do artigo 39º de CPPT: em regra, a notificação considera-se efectuada na data em que o aviso for assinado.

2 - No caso de o A/R ser devolvido ou se o mesmo não vier assinado por o destinatário se ter recusado a recebê-lo ou não o ter levantado no prazo previsto no regulamento dos serviços postais e não se comprovar que entretanto o contribuinte comunicou a alteração do seu domicílio fiscal, a notificação será efectuada nos 15 dias seguintes à devolução, por nova carta registada com A/R, presumindo-se a notificação se a carta não tiver sido recebida ou levantada, sem prejuízo de o notificando poder provar justo impedimento ou a impossibilidade de comunicação de mudança de residência no prazo legal.

3 - A decisão de aplicação de coima não afecta a situação tributária dos contribuintes dada a sua natureza punitiva e, como tal, a sua notificação, nos termos do artigo 70º do RGIT, basta-se com a emissão de carta registada simples. Apesar disso, porém, a entidade administrativa optou por uma forma mais solene de notificação do arguido, ou seja, a carta registada com aviso de recepção.

4 – No caso em análise, nunca Fazenda Pública se poderia fazer valer das consequências de ter repetido a notificação devolvida, ao abrigo do artigo 39º, nº5 do CPPT, pois que, como é evidente, tal repetição implica que a carta devolvida seja novamente expedida nos termos em que anteriormente o foi, ou seja, para a mesma morada.

5 - Não estando demonstrada a notificação da liquidação de IVA e da decisão de aplicação da coima, tal há-de constituir fundamento válido de oposição à execução fiscal, subsumível à alínea i) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, uma vez que a cobrança coerciva só é possível desde que demonstrada a impossibilidade da cobrança voluntária.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

1- RELATÓRIO

A Fazenda Pública, inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou procedente a oposição deduzida por F.........., com respeito ao processo de execução fiscal nº .......... e aps, instaurado pelo Serviço de Finanças de Oeiras … (Paço de Arcos), dela veio interpor o presente recurso jurisdicional, formulando as seguintes conclusões:

A. O presente recurso, visa reagir contra a decisão proferida pelo Tribunal a quo, que julgou procedente a oposição deduzida, e em consequência, declarou extintos os processos de execução fiscal n.º .......... e ...........

B. Salvo o devido respeito, o douto Tribunal errou na aplicação do direito, porquanto fez errónea subsunção da matéria considerada como provada às normas aplicáveis in casu, mais concretamente, as que regem a perfeição das notificações efetuadas pela AT, mais concretamente os n.ºs 5 e 6 do artigo 39º do CPPT, não fazendo ainda a devida aplicação das normas que regem a obrigatoriedade da comunicação da alteração do domicílio fiscal, ou seja, os artigos 19.º da LGT e 43.º do CPPT.

C. Assim, importa referir que em 24.07.2002, o Oponente, ora recorrido, alterou o seu domicilio fiscal para Estr .........., n.º 1 1.º DTO, Valeijas ....-... Barcarena, sendo essa a morada constante na base de dados da AT em 23.12.2005, aquando da citação. Note-se que apenas em 28.02.2008, o sujeito passivo alterou o seu domicilio fiscal de Estr .........., n.º 1 1.º DTO, Valeijas ....-... Barcarena para R .......... n.º 13 1 Dto, Valejas ....-... Barcarena.

D. Demonstra-se assim, que a AT se limitou a enviar as cartas de citação para a morada que o contribuinte forneceu.

E. Ora perante esta situação, não pode, de forma alguma, a Fazenda Pública ser penalizada pelo facto do sujeito passivo não ter a morada atualizada, sendo essa uma das suas obrigações enquanto contribuinte.

F. Neste pendor e salvo a devida vénia, o douto Tribunal andou mal, ao considerar que o oponente, ora recorrido, não tomou conhecimento da decisão da entidade administrativa que lhe aplicou a coima que deu origem à divida em discussão nos presentes autos.

G. Pelo que, ao contrário do doutamente decidido e salvo o devido respeito, foi a oponente, ora recorrida, devidamente notificada, para o domicílio fiscal constante do cadastro da administração tributária.

H. Assim, ao contrário do doutamente decidido e salvo o devido respeito, foi a oponente, ora recorrida, notificada, para o domicílio fiscal constante do cadastro da administração tributária.

I. Por todo o descrito e ressalvando sempre o devido respeito, que é muito, não podemos concordar com o entendimento perfilhado pela douta sentença recorrida, relativamente à questão controvertida.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que julgue a oposição judicial totalmente improcedente.

PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA!


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O Recorrido não apresentou contra-alegações.

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Neste Tribunal Central Administrativo, a Exma. Magistrada do Ministério Público pronunciou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso (cfr. parecer de fls. 136 a 138).

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Colhidos os vistos legais, importa apreciar e decidir.

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2 - FUNDAMENTAÇÃO

2.1. De facto

É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto constante da sentença recorrida:

“Com interesse para a decisão da causa considera-se assente a factualidade que se passa a subordinar por alíneas:
A) Em 22.12.2005 foi instaurado no Serviço de Finanças de Oeiras-…, contra a ora oponente, o processo de execução fiscal (PEF) n.º .........., com base em certidão de dívida emitida pela Alfândega do Jardim do Tabaco para cobrança de dívida no valor de € 3.067,07, sendo € 2.850,00 relativos IVA devido pela legalização de veículo marca Mercedes, modelo CLK 55 AMG, matrícula ..-..-.., e € 217,07 de juros compensatórios – cf. fls. 1 e 3 do respetivo Processo de Execução Fiscal (PEF) apenso.
B) Em 26.11.2008 foi instaurado o PEF n.º .......... para cobrança coerciva da quantia de € 2.548,00, relativa a coima e respetivas custas processuais – cf. fls. 1/2 do respetivo PEF apenso.
C) Em 23.12.2005 foi enviada à ora Oponente, para a morada “ESTR .......... N 1 1DTO – VALEIJAS, ..... BARCARENA” carta de citação ao remetente a carta de citação para o PEF identificado em A) – cf. fls. 5/6 do PEF respetivo.
D) Em 06.03.2010, no PEF identificado em A) foi enviada em nome da ora Oponente, para a morada “R .........., N 13, 1 DTO, VALEJAS, ....-... BARCARENA” carta de notificação de penhora/citação pessoal, relativa à penhora da fração “C” do art.º urbano ....., concelho de Oeiras, freguesia de Barcarena – cf. fls. 17 do PEF respetivo.
E) Em 19.03.2010 a carta identificada na alínea que antecede foi devolvida ao remetente com a indicação “objecto não reclamado” – cf. verso de fls. 17 do PEF respetivo.
F) Em 15.04.2010 foi deixado na caixa postal da ora Oponente “Aviso para hora certa (Artº 240º nº 1 do Código de Processo Civil)”, designando o dia 19.04.2010, pelas 14,30 horas, para “Notificação de Penhora nos Procs. .......... e ..........” – cf. fls. 20 do PEF identificado em A).
G) Em 19.04.2010 foi afixada na porta da ora Oponente, na Rua .........., n.º 13, 1.º Dto, em Valejas, nota da citação – cf. fls. 20 do PEF identificado em A).
H) Em 22.04.2010 foram enviadas para a mesma morada que antecede as notificações nos termos do disposto no art.º 241.º do CPC, relativas aos PEF’s indicados em A) e B), que foram devolvida ao remetente com a indicação “não atendeu” – cf. fls. 22/23 do PEF identificado em A) e fls. 6/7 do PEF identificado em B).
I) No dia 19.07.2010 foi afixada na porta da morada referida em G) “Edital Convocação de Credores e Venda Judicial”, relativo à penhora da fração identificada em D), relativa aos PEF’s identificados em A) e B) – cf. fls. 31 do PEF identificado em A) e fls. 10 do PEF identificado em B).
J) Em 26.07.2010 foi enviada em nome da ora Oponente, para a morada referida em G), carta registada com aviso de receção para efeitos de notificação de marcação da venda do imóvel penhorado identificado em D) – cf. fls. 33/34 do PEF identificado em A) e fls. 10 do PEF identificado em B).
K) O expediente que antecede foi devolvido ao remetente com a indicação “objecto não reclamado” – cf. fls. 33/34 do PEF identificado em A).
L) A coima em cobrança coerciva no PEF identificado em B) foi aplicada por decisão do Diretor da Alfândega do Jardim do Tabaco de 12.05.2008 e enviada à ora oponente em 15.05.2008, por carta registada com aviso de receção, para a morada “Estrada .........., n.º 1 – 1º Dtº - Valeias, ..... Barcarena” – cf. fls. 37 a 42 do PEF identificado em B).
M) A notificação que antecede foi devolvida ao remetente – cf. fls. 42 do PEF identificado em B).
N) A carta de notificação da decisão de aplicação da coima foi novamente enviada para a ora Oponente por ofício de 22.07.2008, por correio registado com aviso de receção para a morada “Rua .........., n.º 13 – 1º Dtº Valeia, ....-... Barcarena” – cf. fls. 44 a 46 do PEF identificado em B).
O) A notificação que antecede foi devolvida ao remetente – cf. fls. 46 do PEF identificado em B).
P) Em 24.10.2008 foi elaborada informação pelos serviços da Alfândega, sobre a qual recaiu despacho concordante do respetivo Diretor, onde se considerou que “tendo as cartas sido devolvidas, considera-se a arguida notificada, nos termos dos n.ºs 5 e 6 do artº 39.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário […], aplicável por remissão do n.º 2 do art.º 70.º do Regime Geral das Infracções Tributárias” – cf. fls. 50/51 do PEF identificado em B).
Q) A liquidação de IVA em cobrança no PEF identificado em A) foi enviada em nome da ora Oponente para a morada “Estrada .......... nº 1 1º Dto, ..... Barcarena” por ofício de 16.11.2005, sob registo postal n.º RS .......... PT com aviso receção, tendo sido devolvida ao remetente em 18.11.2005 com a indicação “endereço inexistente” – cf. fls. 65 a 68 dos autos.
R) Em 21.11.2005 foi repetida a notificação que antecede, tendo sido devolvida ao remetente em 25.11.2005 com a indicação “endereço inexistente” – cf. fls. 69 a 71 dos autos.
S) A presente oposição deu entrada no Serviço de Finanças em 17.08.2010 – cf. fls. 6 dos autos.
Factos não provados:
1) O motivo da devolução das notificações relativas à decisão de aplicação da coima identificadas em L) e N) dos factos provados.
Motivação da decisão de facto:
A decisão da matéria de facto, relativamente aos factos dados como provados, assenta nos documentos constantes dos autos, conforme indicado nas respetivas alíneas do probatório, os quais não foram impugnados nem existem indícios que ponham em causa a sua genuinidade.
Quanto ao facto dado como não provado, resulta não se encontrarem nos autos, incluindo os PEF’s apensos, elementos que permitam identificar o motivo da devolução do expediente em causa.”


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2.2. De direito

Tal como a sentença recorrida evidenciou, no articulado inicial o oponente alegava, em síntese, a inexigibilidade da dívida exequenda, resultante da falta de notificação do acto de liquidação de IVA e juros compensatórios e, bem assim, da decisão de aplicação de coima, actos estes – já se vê – subjacentes à dívida exequenda em cobrança no processo de execução fiscal nº .......... e aps.

O TAF de Sintra acolheu integralmente as razões do Oponente e, considerando a inexigibilidade da dívida, atenta a falta de notificação, julgou a Oposição procedente e determinou a extinção dos dois processos executivos apensos.

Para assim concluir, a sentença considerou, naquilo que para aqui importa, o seguinte:

“(…)

De harmonia com o preceituado no artigo 36.º, n.º 1 do CPPT “os atos em matéria tributária que afetem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados”.

Por sua vez, o n.º 1 do artigo 38.º do CPPT estatui que “[a]s notificações são efetuadas obrigatoriamente por carta registada com aviso de receção, sempre que tenham por objeto atos ou decisões suscetíveis de alterarem a situação tributária dos contribuintes ou a convocação para estes assistirem ou participarem em atos ou diligências”. Além disso, “[h]avendo aviso de receção, a notificação considera-se efetuada na data em que ele for assinado”, conforme decorre do n.º 2 do art.º 39.º do CPPT e, atento o disposto nos n.ºs 5 e 6 do mesmo artigo:

“5 - Em caso de o aviso de receção ser devolvido ou não vier assinado por o destinatário se ter recusado a recebê-lo ou não o ter levantado no prazo previsto no regulamento dos serviços postais e não se comprovar que entretanto o contribuinte comunicou a alteração do seu domicílio fiscal, a notificação será efetuada nos 15 dias seguintes à devolução por nova carta registada com aviso de receção, presumindo-se a notificação se a carta não tiver sido recebida ou levantada, sem prejuízo de o notificando poder provar justo impedimento ou a impossibilidade de comunicação da mudança de residência no prazo legal.

6 - No caso da recusa de recebimento ou não levantamento da carta, previstos no número anterior, a notificação presume-se feita no 3.º dia posterior ao do registo ou no 1.º dia útil seguinte a esse, quando esse dia não seja útil.”

No caso dos autos, e no qua à liquidação e IVA respeita, como resulta provado em Q) e R), a mesma foi devolvida das duas vezes com a mesma indicação: “endereço inexistente”, resultando daqui que não pode dar-se a mesma como efetuada por não operar nenhuma das presunções de notificação previstas no art.º 39.º do CPPT, por falta de verificação dos respetivos pressupostos.

Assim, e sem necessidade de considerandos acrescidos, impõe-se concluir que, neste ponto, a razão está com a Oponente, que viu contra si instaurado um processo de execução fiscal por dívida inexigível por falta de notificação.

No que à decisão de aplicação da coima se refere, não obstante a Oponente vir igualmente invocar a respetiva falta de notificação, em 24.10.2008 os serviços da Alfândega, dando nota da devolução ao remetente das respetivas cartas de notificação, consideraram a mesma efetuada nos termos dos n.ºs 5 e 6 do art.º 39.º do CPPT, aplicável por remissão do n.º 2 do art.º 70.º do RGIT [cf. al. P) do probatório].

Ora, conforme provado em L) e N), a decisão de aplicação da coima objeto de cobrança coerciva no PEF identificado na al. B) do probatório foi enviada à ora oponente primeiro em 15.05.2008, por carta registada com aviso de receção, para a morada “Estrada .........., n.º 1 - 1º Dtº, Valeias, ..... Barcarena”, carta que foi devolvida ao remetente, e posteriormente em por ofício de 22.07.2008, também objeto de devolução ao remetente [cf. als. M) e O) dos factos provados].

Contudo, não resulta dos autos a razão da devolução do expediente – cf. pontos 1) e 2) dos factos não provados – sendo certo que para se considerar em conformidade com o legalmente disposto acerca das presunções de notificação previstas nos n.º 5 e 6 do art.º 39.º do CPPT, aplicável por remissão do n.º 2 do art.º 70.º do RGIT, seria imprescindível conhecer o motivo das mencionas devoluções de expediente, o que não é possível alcançar dos elementos carreados para os autos pela Administração Tributária, estando em causa neste ponto fotocópias do expediente das quais não resulta a indicação do motivo da devolução, ao contrário do que sucede com o expediente relativo à notificação da liquidação.

Vindo invocada pela Oponente a falta de notificação, era sobre a Administração Tributária que recaía o ónus de demonstrar a respetiva concretização, o que cumpriria demonstrando que efetuou a notificação de forma correta, cumprindo os requisitos formalmente exigidos pelas normas procedimentais e, ainda, para fazer operar a presunção de notificação, como fez na informação de 24.10.2008, que se verificavam os pressupostos previstos nos n.ºs 5 e 6 do art.º 39.º do CPPT, demonstrando a razão da devolução do expediente, o que não fez.

Na ausência dessa demonstração não se pode dar por provado que a Oponente tomou conhecimento do ato notificando – a decisão da entidade administrativa que aplicou a coima que deu origem à dívida exequenda no PEF identificado em B), pelo que, também neste ponto a razão está com a Oponente, sendo de julgar procedente a oposição à execução fiscal deduzida com fundamento em inexigibilidade por falta de notificação”.

A Fazenda Pública discorda do assim decidido por entender, em síntese, que o “Tribunal errou na aplicação do direito, porquanto fez errónea subsunção da matéria considerada como provada às normas aplicáveis in casu, mais concretamente, as que regem a perfeição das notificações efetuadas pela AT, mais concretamente os n.ºs 5 e 6 do artigo 39º do CPPT, não fazendo ainda a devida aplicação das normas que regem a obrigatoriedade da comunicação da alteração do domicílio fiscal, ou seja, os artigos 19.º da LGT e 43.º do CPPT”. A este propósito, realça a Recorrente que “em 24.07.2002, o Oponente, ora recorrido, alterou o seu domicilio fiscal para Estr .........., n.º ... 1.º DTO, Valeijas ....-... Barcarena, sendo essa a morada constante na base de dados da AT em 23.12.2005, aquando da citação. Note-se que apenas em 28.02.2008, o sujeito passivo alterou o seu domicilio fiscal de Estr .........., n.º ... 1.º DTO, Valeijas ....-... Barcarena para R .......... n.º ... 1 Dto, Valejas ....-... Barcarena”. Portanto, prossegue a Fazenda evidenciando que “a AT se limitou a enviar as cartas de citação para a morada que o contribuinte forneceu”, sendo certo que “não pode, de forma alguma, a Fazenda Pública ser penalizada pelo facto do sujeito passivo não ter a morada atualizada, sendo essa uma das suas obrigações enquanto contribuinte”.

Sem prejuízo de alguma confusão estabelecida no teor das conclusões, pois que, contrariamente ao que ressalta da conclusão D), não está aqui em causa o recebimento das citações para os termos da execução (mas antes – isso sim – a notificação da liquidação de IVA e da decisão de aplicação da coima, actos estes subjacentes à dívida exequenda), ainda assim se percebe que a Recorrente discorda da sentença e da conclusão aí extraída quanto à inexigibilidade das dívidas, por falta de notificação dos actos que lhe estão subjacentes.

Vejamos por partes, começando pela notificação da liquidação de IVA e respectivos juros compensatórios, em cobrança no processo nº ...........

Ora, resulta das alíneas Q) e R) dos factos provados que a liquidação de IVA foi enviada em nome da ora Oponente para a morada Estrada .......... nº ..., 1º Dto, ..... Barcarena, por ofício de 16/11/05, sob registo postal n.º RS .......... PT, com aviso recepção, tendo sido devolvida ao remetente, em 18/11/05, com a indicação “endereço inexistente” e, bem assim, que em 21/11/05 foi repetida a notificação, tendo sido devolvida ao remetente, em 25/11/05, com a indicação “endereço inexistente”.

Ora, como a Mma. Juíza não deixou de realçar, atenta a devolução das cartas, com a indicação “endereço inexistente”, resulta claro que jamais se pode presumir a notificação, nos termos previstos no artigo 39º doa CPPT.

Na linha daquilo que uniformemente a jurisprudência vem repetindo em inúmeros acórdãos, tendo a notificação da liquidação sido efectuada por carta registada com aviso de recepção, o respectivo regime legal decorre dos n°s 3 a 6 do artigo 39º de CPPT: em regra, a notificação considera-se efectuada na data em que o aviso for assinado. No caso de o A/R ser devolvido ou se o mesmo não vier assinado por o destinatário se ter recusado a recebê-lo ou não o ter levantado no prazo previsto no regulamento dos serviços postais e não se comprovar que entretanto o contribuinte comunicou a alteração do seu domicílio fiscal, a notificação será efectuada nos 15 dias seguintes à devolução, por nova carta registada com A/R, presumindo-se a notificação se a carta não tiver sido recebida ou levantada, sem prejuízo de o notificando poder provar justo impedimento ou a impossibilidade de comunicação de mudança de residência no prazo legal. E nestes casos, de recusa de recebimento ou não levantamento da carta, a notificação presume-se feita no 3° dia útil posterior ao do registo.

Esta presunção de notificação só opera, assim, nas duas apontadas situações: (i) no caso de o destinatário se recusar a receber a notificação; (ii) no caso de não levantamento da carta (remetida para a notificação) no prazo previsto no regulamento dos serviços postais e não se provar que, entretanto, o contribuinte comunicou à AT a alteração do seu domicílio fiscal (cfr., sobre esta matéria, os acs. do STA, de 21/5/2008, proc. nº 01031/07; de 8/7/2009, proc. nº 0460/09; de 27/1/2010, proc. nº 807/09; de 18/6/2013, proc. nº 0595/13; de 22/11/2017, proc. nº 01476/17; de 03/05/18, proc. nº 032/18, bem como o acórdão do Pleno da Secção de CT, do STA, de 5/7/2017, proc. nº 01271/15).

Assim, atendendo à factualidade provada e à argumentação que se deixou exposta, dúvidas não restam que o decidido pelo TAF de Sintra é de manter, ou seja, é correcta a sentença que julgou a falta de notificação da liquidação de IVA e juros e, nessa medida, a inexigibilidade da dívida exequenda, nos termos previstos na alínea i) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT.

Passemos, agora, à outra parte da dívida em cobrança coerciva, à qual está subjacente a decisão de aplicação de coima.

Importa aqui ter presentes os factos a que correspondem as alíneas L) a P) do probatório, sendo de realçar que a decisão de aplicação da coima em cobrança coerciva foi enviada à oponente em 15/05/08, por carta registada, com aviso de recepção, para a morada “Estrada .........., n.º ... – 1º Dtº - Valeias, ..... Barcarena”, tendo a mesma sido devolvida sem indicação do motivo. A carta de notificação da decisão de aplicação da coima foi novamente enviada para a ora Recorrida, por ofício de 22/07/008, por correio registado, com aviso de recepção, para a morada “Rua .........., n.º ... – 1º Dtº Valeia, ....-... Barcarena”, tendo a mesma sido devolvida sem indicação do motivo.

Vejamos, então, tendo presente que a Fazenda Pública pretende que se tenha em conta que “apenas em 28.02.2008, o sujeito passivo alterou o seu domicílio fiscal de Estr .........., n.º ... 1.º DTO, Valeijas ....-... Barcarena para R .......... n.º ... 1 Dto, Valejas ....-... Barcarena”.

Preliminarmente, importa deixar claro que a decisão de aplicação de coima não afecta a situação tributária dos contribuintes dada a sua natureza punitiva e, como tal, a sua notificação, nos termos do artigo 70º do RGIT, basta-se com a emissão de carta registada simples.

Isto dito, porém, temos que, no caso, a entidade administrativa optou por uma forma mais solene de notificação do arguido, ou seja, a carta registada com aviso de recepção.

Vejamos, desde já se adiantando que, também aqui, a Fazenda Pública não tem a menor razão naquilo que alega.

Como se vê da análise das alíneas L) e N) do probatório, as duas cartas enviadas ao arguido, registadas e com AR, foram dirigidas para dois endereços distintos: uma primeira, para a Estrada .......... n.º ..., 1.º Dtº, Valeias .....- Barcarena; uma segunda, para a Rua .........., n.º ..., 1 Dto, Valejas ....-... Barcarena.

Daqui resulta, sem hesitações, que nunca Fazenda Pública se poderia fazer valer das consequências de ter repetido a notificação devolvida, ao abrigo do artigo 39º, nº5 do CPPT, pois que, como é evidente, tal repetição implica que a carta devolvida seja novamente expedida nos termos em que anteriormente o foi, ou seja, para a mesma morada.

E tanto basta para arredar a presunção de notificação de que a Recorrente pretende retirar relevantes efeitos.

Não é demais, porém, sublinhar, como fez a EMMP que “Vindo invocada pela Oponente a falta de notificação, era sobre a Administração Tributária que recaía o ónus de demonstrar a respetiva concretização, o que cumpriria demonstrando que efetuou a notificação de forma correta, cumprindo os requisitos formalmente exigidos pelas normas procedimentais e, ainda, para fazer operar a presunção de notificação, como fez na informação de 24.10.2008, que se verificavam os pressupostos previstos nos n.ºs 5 e 6 do art.º 39.º do CPPT, demonstrando a razão da devolução do expediente, o que não fez”.

Portanto, não estando demonstrada a notificação da decisão de aplicação da coima, tal há-de constituir fundamento válido de oposição à execução fiscal, subsumível à alínea i) do n.º 1 do artigo 204.º do CPPT, uma vez que a cobrança coerciva só é possível desde que demonstrada a impossibilidade da cobrança voluntária.

Tanto basta, pois, para, nos termos expostos, confirmar o juízo adoptado pelo TAF de Sintra, quanto à verificação da inexigibilidade da dívida exequenda e, como tal, quanto à procedência da oposição.

Há, assim, que julgar improcedentes as conclusões da alegação de recurso e negar provimento ao recurso.


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3 - DECISÃO

Face ao exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário do TCA Sul em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 14.11.19


(Catarina Almeida e Sousa)

(Isabel Fernandes)

(Jorge Cortês)