Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06134/12
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:12/04/2012
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA.
ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO.
OMISSÃO DE PRONÚNCIA (VÍCIO DE “PETITIONEM BREVIS”). CONCEITO E ÂMBITO DESTA NULIDADE.
NULIDADE DA SENTENÇA. ARTº.668, Nº.1, AL.B), DO C. P. CIVIL.
NULIDADE DA SENTENÇA QUANDO OS SEUS FUNDAMENTOS ESTÃO EM OPOSIÇÃO COM A DECISÃO.
ARTº.668, Nº.1, AL.C), DO C. P. CIVIL.
EXCEPÇÃO DE CASO JULGADO.
CASO JULGADO MATERIAL E FORMAL.
FUNDAMENTAÇÃO FORMAL E SUBSTANCIAL DO ACTO ADMINISTRATIVO.
FUNDAMENTAÇÃO INSUFICIENTE.
PROCEDIMENTO DE DISPENSA DE PRESTAÇÃO DE GARANTIA.
ARTº.52, Nº.4, DA L.G.TRIBUTÁRIA. ARTº.170, DO C.P.P.TRIBUTÁRIO.
ÓNUS DA PROVA.
Sumário:1. Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr.artº.655, nº.1, do C.P.Civil). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.

2. O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida.

3. A omissão de pronúncia (vício de “petitionem brevis”) pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes. No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C. P. P. Tributário, no penúltimo segmento da norma.

4. Nos termos do preceituado no citado artº.668, nº.1, al.b), do C. P. Civil, é nula a sentença, além do mais, quando não especifique os fundamentos de facto que justificam a decisão. Para que a sentença padeça do vício que consubstancia esta nulidade é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outras palavras, o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. Já a mera insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, podendo afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, mas não produz nulidade. Igualmente não sendo a eventual falta de exame crítico da prova produzida (cfr.artº.659, nº.3, do C.P.Civil) que preenche a nulidade sob apreciação. No processo judicial tributário o vício de não especificação dos fundamentos de facto da decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C. P. P. Tributário.

5. Nos termos do preceituado no citado artº.668, nº.1, al.c), do C. P. Civil, é nula a sentença quando os seus fundamentos estejam em oposição com a decisão. Encontramo-nos perante um corolário lógico da exigência legal de fundamentação das decisões judiciais em geral consagrado no artº.158, nº.1, do C.P.Civil. O vício em análise, o qual tem como premissa a eventual violação do necessário silogismo judiciário que deve existir em qualquer decisão judicial, terá lugar somente quando os fundamentos da sentença devam conduzir, num processo lógico, a uma decisão oposta ou, pelo menos, diferente da que foi adoptada. No processo judicial tributário o vício de oposição entre os fundamentos e a decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C. P. P.
Tributário.

6. Após a reforma do processo civil de 1995/96, o caso julgado passou a ser uma excepção dilatória, de conhecimento oficioso pelo Tribunal, que obsta à apreciação do mérito da causa e conduz à absolvição da instância (cfr.artºs.493, nº.2, 494, al.i), e 495, todos do C.P.Civil, “ex vi” do artº. 2, al.e), do C.P.P.Tributário).

7. Versando a decisão judicial sobre a matéria de fundo da acção, a sua força obrigatória não se limita ao processo em que foi proferida, igualmente se manifestando fora dele, de tal modo que constitui impedimento a que outra acção idêntica (com os mesmos sujeitos, pedido e causa de pedir) seja proposta. Esta obrigatoriedade dentro do processo e fora dele caracteriza o caso julgado material, assim se impondo a todos os Tribunais e a quaisquer outras autoridades (cfr.artºs.673 e 675, do C.P.Civil). Pelo contrário, se a decisão judicial apenas incidir sobre a relação processual (v.g.absolvição do réu da instância), então a sua força obrigatória limita-se ao processo em que foi proferida. É o que se designa por caso julgado formal o qual se resume, em última análise, à simples preclusão dos recursos ordinários (cfr.artº.672, do C.P.Civil).

8. Para apurar se um acto administrativo-tributário está, ou não, fundamentado impõe-se, antes de mais, que se faça a distinção entre fundamentação formal e fundamentação material: uma coisa é saber se a Administração deu a conhecer os motivos que a determinaram a actuar como actuou, as razões em que fundou a sua actuação, questão que se situa no âmbito da validade formal do acto; outra, bem diversa e situada já no âmbito da validade substancial do acto, é saber se esses motivos correspondem à realidade e se, correspondendo, são suficientes para legitimar a concreta actuação administrativa.

9. Se a fundamentação formal não esclarecer concretamente a motivação do acto, por obscuridade, contradição ou insuficiência, o acto considera-se não fundamentado (cfr.artº.125, nº.2, do C.P.Administrativo). Haverá obscuridade quando as afirmações feitas pelo autor da decisão não deixarem perceber quais as razões porque decidiu da forma que decidiu. Por outras palavras, os fundamentos do acto devem ser claros, por forma a colher-se com perfeição o sentido das razões que determinaram a prática do acto, assim não sendo de consentir a utilização de expressões dúbias, vagas e genéricas. Ocorrerá contradição da fundamentação quando as razões invocadas para decidir, justificarem não a decisão proferida, mas uma decisão de sentido oposto (contradição entre fundamentos e decisão), e quando forem invocados fundamentos que estejam em oposição com outros. Por outras palavras, os fundamentos da decisão devem ser congruentes, isto é, que sejam premissas que conduzam inevitavelmente à decisão que funcione como conclusão lógica e necessária da motivação aduzida. Por último, a fundamentação é insuficiente se o seu conteúdo não é bastante para explicar as razões por que foi tomada a decisão. Por outras palavras, a fundamentação deve ser suficiente, no sentido de que não fiquem por dizer razões que expliquem convenientemente a decisão final.

10. O procedimento de isenção de prestação de garantia, está previsto no artº.52, nº.4, da L.G.Tributária, norma em que se consagra a possibilidade da Administração Tributária, a requerimento do executado, poder isentá-lo da prestação de garantia nos casos de a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou existindo manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, desde que, em qualquer dos casos, a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado. Concluindo, para ser deferido o pedido de dispensa de prestação de garantia é necessário que se satisfaçam três requisitos, cumulativamente, embora dois deles comportem alternativas, pelo que o executado deverá na petição tê-los em conta:
a-Que haja uma situação de inexistência de bens ou a sua insuficiência para pagamento da dívida exequenda e do acrescido;
b-Que essa inexistência ou insuficiência não seja imputável ao executado;
c-Que a prestação da garantia cause prejuízo irreparável ao executado ou que seja manifesta a sua falta de meios económicos.

11. Face ao disposto no artº.342, do C.Civil, e no artº.74, nº.1, da L.G.Tributária, é de concluir que é sobre o executado, que pretende a dispensa de garantia, invocando explícita ou implicitamente o respectivo direito, que recai o ónus de provar que se verificam as condições de que tal dispensa depende, pois tratam-se de factos constitutivos do direito que pretende ver reconhecido. De resto, o texto do artº.170, nº.3, do C.P.P.Tributário, aponta no mesmo sentido, ao estabelecer que o pedido deve ser instruído com a prova documental necessária, o que pressupõe que toda a prova relativa a todos os factos que têm de estar comprovados para ser possível dispensar a prestação de garantia seja apresentada pelo executado, instruindo o seu pedido, pois a prova de todos esses elementos é necessária para o deferimento da sua pretensão.

12. A eventual dificuldade que possa ter o executado em provar o facto negativo que é a sua irresponsabilidade na génese da insuficiência ou inexistência de bens não é obstáculo à atribuição ao mesmo do ónus da prova respectivo, pois essa dificuldade de prova dos factos negativos em relação à dos factos positivos não foi legislativamente considerada relevante para determinar uma inversão do ónus da prova, como se conclui das regras consagradas no artº.344, do C.Civil. A acrescida dificuldade da prova de factos negativos deverá ter como corolário somente, por força do princípio constitucional da proporcionalidade, uma menor exigência probatória por parte do aplicador do direito, dando relevo a provas menos relevantes e convincentes que as que seriam exigíveis se tal dificuldade não existisse, assim aplicando a máxima latina “iis quae difficilioris sunt probationis leviores probationes admittuntur”.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
MANUEL ………………………, com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do T.A.F. de Leiria, exarada a fls.181 a 188 do presente processo, através da qual julgou improcedente a reclamação de acto do órgão de execução fiscal deduzida pelo reclamante/recorrente enquanto executado por reversão no âmbito do processo de execução fiscal nº………………… e aps. que corre seus termos no Serviço de Finanças de ……………., visando despacho que indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia no espaço da mencionada execução.
X
O recorrente termina as alegações (cfr.fls.197 a 206 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
MATÉRIA DE FACTO
1-Com base nos depoimentos das testemunhas Dina ……….. e Benvinda ……………… e no recibo de vencimento de fls.53, deve ser dado explicitamente como provado que o recorrente aufere o ordenado líquido mensal de € 711,48;
2-Com base no depoimento destas testemunhas, em conjugação com as demais circunstâncias, como o montante do vencimento do recorrente, o facto deste ajudar os filhos, deve ser dado como provado que os rendimentos do recorrente nunca lhe permitiram adquirir bens;
3-É que nem à data do pedido, nem no momento actual, o requerente não dispõe de meios financeiros e económicos que lhe permitam prestar qualquer garantia;
4-Deve ainda ser dado como provado com base nos mesmos depoimentos e demais circunstâncias que o recorrente nunca dissipou bens, devendo ainda quanto a este facto julgar-se não fundamentada a decisão de não o considerar provado, dado que tendo o Tribunal reconhecido que as testemunhas responderam positivamente a esta matéria, não indicou qualquer razão objetiva para não conferir credibilidade aos depoimentos neste ponto (sendo que conferiu credibilidade aos depoimentos noutros);
5-O Tribunal invocou apenas uma circunstância subjetiva para não reconhecer isenção aos depoimentos, consistente no grau de parentesco com o recorrente, mas, apesar deste grau de parentesco, considerou credível os mesmos depoimentos quanto à restante matéria;
6-Não tendo o Tribunal indicado qualquer circunstância objectiva para não conferir credibilidade ao depoimento das testemunhas relativamente ao ponto em questão, se entendeu as testemunhas credíveis para fundamentar a prova à restante matéria, não pode deixar de as considerar igualmente credíveis quando ao ponto em questão;
7-Devem assim os factos em questão ser dados como provados;
MATÉRIA DE DIREITO
8-Tendo a primeira decisão de indeferimento da dispensa de prestação de garantia sido anulada pelos Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, com fundamento em falta de fundamentação e decidido a ATA não revogar a decisão de indeferimento sustentando, contrariamente ao decidido pelo Tribunal que não teria ocorrido falta de fundamentação, quer a decisão de indeferimento, quer a sentença recorrida violaram caso julgado;
9-Ainda que assim se não entenda, o que por mera cautela se põe, a decisão de indeferimento mostra-se não fundamentada;
10-A sentença recorrida incorre em contradição quando para afirmar a não violação de caso julgado e a ausência do vício de falta de fundamentação, sustenta que foi introduzido um novo fundamento -valor recebido em tornas- (a retirada doutro fundamento -retirada da referência a declaração de compromisso de honra referente a contas bancárias- não é um novo fundamento), mas simultaneamente desconsidera esse fundamento ao afirmar que “o montante alegadamente recebido em tornas remonta a 2006, pelo que é justificável a erosão”;
11-A decisão de indeferimento mostra-se não fundamentada, contrariamente ao decidido na sentença;
12-A douta sentença recorrida não se pronunciou sobre o vício apontado à sentença consistente na não inquirição das testemunhas indicadas pelo recorrente no pedido de dispensa de prestação de garantia, sendo assim a sentença ilegal, também por omissão de pronúncia;
13-A douta sentença faz incorrecta interpretação do artº.52, nº.4, da L.G.T., quando entende que a mesma permite a dispensa parcial de garantia, quando os bens do executado existirem mas forem insuficientes, porquanto tal significaria que só em caso extremo de inexistência total de bens penhoráveis poderia haver dispensa;
14-A solução da lei para os casos de insuficiência de bens penhoráveis é a dispensa (total) de prestação de garantia e não a dispensa parcial, que a lei não prevê, sendo que o pressuposto previsto na lei é a “insuficiência de bens penhoráveis” e não a “inexistência de bens penhoráveis”;
15-Termos em que deve a sentença recorrida ser anulada e substituída por decisão que decrete a dispensa de prestação de garantia;
16-Caso assim se não entenda deve ser anulada a sentença recorrida e a decisão de indeferimento, por omissão de pronúncia, violação de caso julgado e insuficiência de fundamentação;
17-Foram violados, designadamente, os artºs.52, nº.4, e 77, nº.1, da L.G.T., 653, nº.2, 660, nº.2, 671, nº.1, do Código de Processo Civil e o princípio do direito à prova;
18-Deve a sentença recorrida ser substituída por decisão que defira a pretensão do recorrente ou, caso assim se não entenda, deve a mesma ser anulada tal como a decisão de indeferimento proferida pelo Órgão de Execução Fiscal.
X
Não foram produzidas contra-alegações.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer (cfr.fls.225 a 227 dos autos) no sentido de se negar provimento ao recurso e manter-se a douta sentença recorrida, com a consequente improcedência da reclamação deduzida.
X
Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo (cfr.artº.707, nº.4, do C.P.Civil; artº.278, nº.5, do C.P.P.T.), vêm os autos à conferência para decisão.
X
FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.182 a 184 dos autos):
1-Mediante requerimento datado de 9/9/2011 o reclamante requereu isenção da prestação de garantia nos termos que constam de fls.49 e seg. dos autos cujo conteúdo se dá por reproduzido, alegando, em síntese, não possuir quaisquer bens que pos­sam ser dados em garantia da dívida exequenda.
a)Juntou recibo de vencimento no montante líquido de € 711,48 (cfr.documento junto a fls.53 cujo conteúdo se dá por reproduzido);
2-Em 27/9/2011, foi proferido despacho sobre o pedido de isenção de prestação de garantia formulado pelo requerente, no qual era convidado a apresentar “Declaração sob compromisso de honra das contas bancárias que possuem e entidades bancárias onde as mesmas contas estão sediadas, acompanhadas dos respetivos extratos bancários” (documento junto a fls.56 e 57 cujo conteúdo se dá por reproduzido);
3-Mais se referia no despacho que “contrariamente ao declarado nos pontos 4 a 7 da petição, o peticionário é detentor do direito à herança ilíquida e indivisa aberta pelos óbitos de Gracinda ………………., sua mãe, e Alfredo ……………….., seu pai, que entre outros bens, é constituída por diversos bens imó­veis, sitos nos concelhos de ………. e ……….., com considerável valor patrimonial”;
4-Por requerimento de 10/10/2011, o reclamante alegou não poder prestar garantia no montante exigido de € 33.058,58, pois apenas aufere um vencimento mensal de € 711,00. Adiantou ainda que os alegados bens imóveis que fazem parte da herança ilíquida e indivisa aberta pelo óbito dos pais do requerente são de valor muito baixo, pelo que sempre serão insuficientes para garantir a execução e suspender o processo (documento junto a fls.60 e 61 cujo conteúdo se dá por reproduzido);
5-Por despacho de 21/11/2011 o pedido foi indeferido na totalidade (cfr.documento junto a fls.86 do processo judicial de reclamação nº.1466/11.9BELRA apenso, cujo conteúdo se dá por reproduzido);
6-No processo de reclamação nº.1466/11, deste T.A.F., foi proferida sentença que anulou o despacho reclamado (cfr.fls.175 a 184 do processo judicial de reclamação nº.1466/11.9BELRA apenso, cujo conteúdo se dá por reproduzido);
7-Pronunciando-se novamente sobre a requerida isenção, por despacho de 24/5/2012 foi indeferida a dispensa de prestação de garantia, nos termos que constam de fls.17 a 19 dos presentes autos, cujo conteúdo se dá por reproduzido;
8-Consta do despacho identificado no nº.7, designadamente o seguinte:
“…face aos óbitos dos ascendentes do reclamante, o mesmo é detentor do direito à sua quota ideal na herança aberta por óbito de Gracinda ………….., sua mãe, falecida em 2004-10-30, e Alfredo ……………., seu pai, também já falecido em 2009-05-26, possuindo ele, nesta data, metade indivisa dos Imóveis descritos nos referidos prints. Correspondendo tal fracção a um valor patrimonial total de 23.867,92 €, susceptível de eventual avaliação pelo valor actual do mercado. Acresce que, pretendendo o reclamante a suspensão dos autos, deveria previamente ao pedido de isenção pretendido, oferecer para constituição de eventual garantia idónea, os bens imóveis de sua pertença, com vista à apreciação e decisão por parte do órgão competente da sua capacidade para a necessária prestação e não, como claramente descreve na petição, proceder à sua auto avaliação com a dedução de que os referidos bens são de valor diminuto e insuficientes para garantir o valor em causa. Para além disso, importa também ter em conta que, do documento entregue com a petição de 10 de Outubro de 2011 (fls.80/82), é junta escritura de partilha por separação de pessoas e bens relativa ao casamento do executado, em consequência da qual o interessado recebeu tornas em dinheiro no valor de 10.326,95 €, montante que, salvo o devido respeito por opinião contrária, contraria a fundamentação de falta de meios financeiros para a prestação de garantia…”(cfr.documento junto a fls.17 a 19 cujo conteúdo se dá por reproduzido);
9-Despacho que foi notificado ao reclamante por ofício nº.4593, de 25/5/2012 (cfr.documentos juntos a fls.20 e 21 cujo conteúdo se dá por reproduzido);
10-Os bens que constituem acervo patrimonial da herança deixada por óbito de Gracinda ……………., mãe do requerente, constam de fls.104 dos autos, constituído por 7 prédios rústicos e dois urbanos. Dos urbanos o VPT do ………. é € 10.836,02 e o ……… de € 36.172,70 (cfr.documentos juntos a fls.131 a 133 dos autos, cujo conteúdo se dá por reproduzido);
11-No dia 24/1/2006 foi outorgada escritura de partilha por separação de pessoas e bens entre o reclamante e Maria ……………….., nos termos da qual aquele recebeu tornas no montante de € 10.326,95 (cfr.documento junto a fls.82 a 84 do processo judicial de reclamação nº.1466/11.9BELRA apenso, cujo conteúdo se dá por reproduzido);
12-O requerente ajuda os filhos, com idades de 23 e 19 anos, sendo que o mais velho já trabalha;
13-O requerente continua a viver na casa que foi casa de morada de família.
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Com interesse para a decisão da causa nada mais se provou…”.
X
A fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A convicção do tribunal baseou-se nos seguintes meios de prova:
PROVA DOCUMENTAL. Os meios de prova documental que serviram para a convicção do tribunal estão referidos no «probatório» com remissão para as fls. do processo onde se encontram.
PROVA TESTEMUNHAL. Quanto a este meio de prova, relevaram os depoimentos das testemunhas inquiridas, cunhada e sogra respectivamente, que confirmaram as dificuldades económicas do requerente. As testemunhas adiantaram ainda que o requerente nunca dissipou bens. Esta matéria não ficou provada, pois considerando o grau de parentesco com o requerente, não seria expectável que dissessem o contrário, por essa razão, não se lhes reconheceu isenção suficiente para semelhante conclusão…”.
X
Dado que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou, por um lado, em prova documental constante dos presentes autos e do processo apenso e, por outro, em prova testemunhal cujos depoimentos se encontram gravados em CD apenso, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa relevante para a decisão e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.712, nº.1, al.a), e 2, do C. P. Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P. Tributário):
14-O processo de execução fiscal nº…………………… e aps., o qual corre seus termos no Serviço de Finanças de ………….., no âmbito do mesmo sendo lavrado o despacho identificado no nº.7 do probatório, tem por objecto a cobrança coerciva de dívidas de I.V.A., relativas aos anos de 2001 a 2004, e de I.R.S.-Retenções na Fonte, de 2005, sendo a quantia exequenda no total de € 32.942,57, a que acrescem juros de mora e custas, no mesmo surgindo como executada originária a empresa “Rodrigues ……………., L.da.” (cfr.documentos juntos a fls.1, 2 e 16 do processo judicial de reclamação nº.1466/11.9BELRA apenso);
15-Em 24/6/2011, o requerente/recorrente, Manuel …………, com o n.i.f. ……………., foi citado por reversão no âmbito do processo de execução identificado no nº.14, com vista ao pagamento da quantia exequenda no montante de € 19.864,74 (cfr.documentos juntos a fls.48 a 50 do processo judicial de reclamação nº.1466/11.9BELRA apenso);
16-O valor da garantia a prestar pelo requerente no âmbito do processo de execução fiscal identificado no nº.14 cifra-se no montante de € 33.058,58 (cfr.conta exarada a fls.76 do processo judicial de reclamação nº.1466/11.9BELRA apenso);
17-No mês de Agosto de 2011, o requerente auferiu o vencimento líquido de € 711,48 ao serviço da empresa “Mira ………… - Obras ……….., L.da.” (cfr.documento junto a fls.53 dos presentes autos; número aditado ao probatório visando complementar o nº.1 da factualidade);
18-O requerente e a ex-mulher continuam a viver na mesma casa, a casa de morada de família, juntamente com os dois filhos (cfr.depoimento das testemunhas Dina …………….. e Maria ………………… o qual se encontra gravado em CD apenso aos presentes autos; número aditado ao probatório visando complementar o nº.13 da factualidade);
19-Do dispositivo da sentença identificada no nº.6 do probatório, a qual anula o despacho reclamado devido a vício de forma, consta o seguinte:
“Pelo exposto, julgo a presente reclamação totalmente procedente e, consequentemente, anulo o despacho reclamado (a procedência da acção não importa o deferimento da pretensão de isenção de prestação de garantia por nos inserirmos no contencioso de mera anulação, cabendo à A.T. a decisão final nesta matéria)…” (cfr.dispositivo da sentença constante de fls.184 do processo judicial de reclamação nº.1466/11.9BELRA apenso).
X
Alicerçou-se a convicção do Tribunal, no que diz respeito à matéria de facto aditada, no teor dos documentos e depoimentos testemunhais referidos em cada número do probatório.
X
Aduz, antes de mais, o reclamante/recorrente que, para além dos factos dados como assentes pelo Tribunal “a quo”, resultou ainda provado, através da prova testemunhal e documental produzida, com interesse para a decisão da causa, que:
1-O recorrente aufere o ordenado líquido mensal de € 711,48;
2-Os rendimentos do recorrente nunca lhe permitiram adquirir bens;
3-O recorrente nunca dissipou bens.
Mais se devendo determinar a alteração da matéria de facto assente em 1ª. Instância, nos termos requeridos (cfr.conclusões 1 a 7 do recurso), com base em tal alegação pretendendo consubstanciar erro de julgamento de facto da decisão recorrida.
Analisemos se a decisão recorrida sofre de tal vício.
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cfr.artº.655, do C.P.Civil; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, IV, Coimbra Editora, 1987, pág.566 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.660 e seg.).
O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida (cfr.ac.T.C.A.Sul, 6/11/2012, proc.6028/12; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.130; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 9ª. edição, 2009, pág.72).
Voltando ao caso concreto, e começando pelo primeiro dos vectores que o recorrente pugna por que se adite ao probatório (aufere o ordenado líquido mensal de € 711,48), remete-se o mesmo para o ponto nº.17 aditado à matéria de facto e supra exarado.
Assim é, porquanto, somente a factualidade relativa ao documento junto a fls.53 dos presentes autos deve levar-se ao probatório (recibo de vencimento relativo ao mês de Agosto de 2011). Quanto à prova testemunhal, para além de se levar em consideração o seu valor probatório (cfr.artº.396, do C.Civil), igualmente se deve referir que os concretos depoimentos das testemunhas Dina ……….. e Maria …………., os quais se encontram gravados em CD apenso aos presentes autos, são bastante evasivos quanto aos rendimentos auferidos pelo recorrente, apenas se limitando a confirmar que o mesmo ganha cerca de setencentos euros face a pergunta efectuada pelo seu douto mandatário, na qual, concretamente, se refere tal quantia pecuniária. Mais se dirá que o recorrente, supondo que somente aufere rendimentos ao serviço da empresa “Mira ……… - Obras ……….., L.da.”, os mesmos igualmente incluem o subsídio de férias e de natal, segundo um critério de normalidade, dado que nos encontramos perante empresa privada. Por último, a prova desta factualidade compete ao recorrente (cfr.artº.342, do C.Civil, e artº.74, nº.1, da L.G.Tributária), não tendo efectuado produção de prova nesse sentido (de que, realmente, tem rendimentos mensais de € 711,00).
Passemos ao segundo segmento que o recorrente pugna porque se adite ao probatório (os rendimentos do recorrente nunca lhe permitiram adquirir bens). Ora, este tema que o recorrente pugna por que se adite à matéria de facto reveste natureza meramente conclusiva, assim não se devendo levar ao probatório.
Quanto ao terceiro vector (o recorrente nunca dissipou bens), igualmente nos encontramos perante tema que reveste natureza meramente conclusiva.
Concluindo, não vislumbra o Tribunal “ad quem” que a sentença recorrida padeça do examinado erro de julgamento de facto, assim sendo forçoso julgar improcedente este fundamento do recurso.
X
ENQUADRAMENTO JURÍDICO
X
Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida ponderou, em resumo, julgar improcedente a reclamação deduzida, devido ao decaimento de todos os seus fundamentos.
X
Antes de mais, refere-se que são as conclusões das alegações do recurso que, como é sabido, definem o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artºs.684 e 685-A, do C.P.Civil; António Santos Abrantes Geraldes, Recurso em Processo Civil, Novo Regime, 2ª. Edição Revista e Actualizada, 2008, Almedina, pág.89 e seg.; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.41).
O recorrente discorda do decidido sustentando, em primeiro lugar e como supra se alude, que a douta sentença recorrida não se pronunciou sobre o vício apontado ao despacho de indeferimento consistente na não inquirição das testemunhas indicadas pelo mesmo no pedido de dispensa de prestação de garantia, assim sendo a sentença ilegal por omissão de pronúncia (cfr.conclusões 12 e 16 do recurso). Com base em tal alegação pretendendo consubstanciar nulidade por omissão de pronúncia da decisão recorrida.
Analisemos se a decisão recorrida sofre de tal pecha.
A sentença é uma decisão judicial proferida pelos Tribunais no exercício da sua função jurisdicional que, no caso posto à sua apreciação, dirimem um conflito de interesses públicos e privados no âmbito das relações jurídicas administrativo-tributárias. Tem por obrigação conhecer do pedido e da causa de pedir, ditando o direito para o caso concreto. Esta peça processual pode padecer de vícios de duas ordens, os quais obstam à eficácia ou validade da dicção do direito:
1-Por um lado, pode ter errado no julgamento dos factos e do direito e então a consequência é a sua revogação;
2-Por outro, como acto jurisdicional, pode ter atentado contra as regras próprias da sua elaboração ou contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada e, então, torna-se passível de nulidade, nos termos do artº.668, do C. P. Civil.
Face ao preceituado no citado artº.668, nº.1, al.d), do C. P. Civil, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento. Decorre de tal norma que o vício que afecta a decisão advém de uma omissão (1º. segmento da norma) ou de um excesso de pronúncia (2º. segmento da norma). Na verdade, é sabido que essa causa de nulidade se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artº.660, nº.2, do mesmo diploma, o qual consiste, por um lado, no resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes (salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente). Ora, como se infere do que já deixámos expresso, a omissão de pronúncia pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes. Por outras palavras, haverá omissão de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de “petitionem brevis”, a sentença em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido). No entanto, uma coisa é a causa de pedir, outra os motivos, as razões de que a parte se serve para sustentar a mesma causa de pedir. E nem sempre é fácil fazer a destrinça entre uma coisa e outra. Com base neste raciocínio lógico, a doutrina e a jurisprudência distinguem por uma lado, “questões” e, por outro, “razões” ou “argumentos” para concluir que só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das “questões”) integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.53 a 56 e 142 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.690; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.37).
No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C. P. P. Tributário, no penúltimo segmento da norma (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2006, pág.911 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.50/11; ac.T.C.A. Sul, 1/3/2011, proc.2442/08; ac.T.C.A. Sul, 3/5/2011, proc.4629/11).
Mais, a nulidade de omissão de pronúncia impõe ao juiz o dever de conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Se o Tribunal entende que o conhecimento de uma questão está prejudicado e o declara expressamente, poderá haver erro de julgamento, se for errado o entendimento em que se baseia esse não conhecimento, mas não nulidade por omissão de pronúncia.
Por último, embora o Tribunal tenha também dever de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso não suscitadas pelas partes (cfr.artº.660, nº.2, do C.P.Civil), a omissão de tal dever não constituirá nulidade, mas sim um erro de julgamento. Com efeito, nestes casos, a omissão de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso deve significar que o Tribunal entendeu, implicitamente, que a solução das mesmas não é relevante para a apreciação da causa. Se esta posição for errada, haverá um erro de julgamento. Se o não for, não haverá erro de julgamento, nem se justificaria, naturalmente, que fosse declarada a existência de uma nulidade para o Tribunal ser obrigado a tomar posição explícita sobre uma questão irrelevante para a decisão. Aliás, nem seria razoável que se impusesse ao Tribunal a tarefa inútil de apreciar explicitamente cada uma das questões legalmente qualificadas como de conhecimento oficioso sobre as quais não se suscita controvérsia no caso concreto, o que ressalta, desde logo, da dimensão da lista de excepções dilatórias de conhecimento oficioso (cfr.artºs.494 e 495, do C.P.Civil), e da apreciável quantidade de vícios geradores de nulidade contida no artº. 133, nº.2, do C.P.Administrativo (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 28/5/2003, rec.1757/02; ac. T.C.A. Sul, 25/8/2008, proc.2569/08; Jorge Lopes de Sousa, ob.cit., pág.912 a 914).
No caso “sub judice”, o que o recorrente pretende é que o Tribunal “a quo” deixou de se pronunciar sobre o vício apontado ao despacho de indeferimento consistente na não inquirição das testemunhas indicadas pelo mesmo no pedido de dispensa de prestação de garantia. Ora, se o Tribunal “a quo” ouviu em depoimento as duas testemunhas arroladas pelo requerente no pedido de dispensa de prestação de garantia identificado no nº.1 do probatório supra, nestes termos, a eventual ilegalidade do despacho reclamado foi suprida no processado estruturado em Tribunal, pelo que não tinha que ser apreciada na sentença e assim não se vislumbrando qualquer omissão de pronúncia.
Em suma, não se vê que a sentença recorrida tenha omitido pronúncia sobre qualquer questão relevante suscitada, não ocorrendo, portanto, a respectiva nulidade e, assim sendo, improcedendo este fundamento do recurso.
Em segundo lugar, alega o recorrente que a sentença recorrida incorre em contradição quando, para afirmar a não violação de caso julgado e a ausência do vício de falta de fundamentação, sustenta que foi introduzido um novo fundamento -valor recebido em tornas- (a retirada doutro fundamento -retirada da referência a declaração de compromisso de honra referente a contas bancárias- não é um novo fundamento), mas simultaneamente desconsidera esse fundamento ao afirmar que “o montante alegadamente recebido em tornas remonta a 2006, pelo que é justificável a erosão” (cfr.conclusão 10 do recurso), com base em tais razões pretendendo consubstanciar, segundo entendemos, mais uma nulidade da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece deste vício.
Nos termos do preceituado no citado artº.668, nº.1, al.c), do C. P. Civil, é nula a sentença quando os seus fundamentos estejam em oposição com a decisão. Encontramo-nos perante um corolário lógico da exigência legal de fundamentação das decisões judiciais em geral consagrado no artº.158, nº.1, do C.P.Civil. O vício em análise, o qual tem como premissa a eventual violação do necessário silogismo judiciário que deve existir em qualquer decisão judicial, terá lugar somente quando os fundamentos da sentença devam conduzir, num processo lógico, a uma decisão oposta ou, pelo menos, diferente da que foi adoptada (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.141 e 142; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.689 e 690; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.36 e 37).
No processo judicial tributário o vício de oposição entre os fundamentos e a decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C. P. P. Tributário (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2006, pág.910 e 911; ac.S.T.A-2ª.Secção, 18/2/2010, rec.1158/09; ac.S.T.A-2ª.Secção, 4/5/2011, rec.66/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 6/3/2012, proc. 1103/06).
No caso “sub judice”, não vislumbramos que a sentença recorrida sofra da nulidade em análise. O apelante ao invocar tal nulidade aduz que a decisão recorrida assenta na alegada contradição que se consubstancia na decisão de improcedência dos fundamentos por si arguidos de violação de caso julgado e falta de fundamentação do despacho reclamado, ao sustentar que foi introduzido um novo fundamento -valor recebido em tornas- neste novo despacho objecto da reclamação (cfr.nºs.7 e 8 do probatório), embora, simultaneamente, desconsiderando este novo fundamento do despacho reclamado.
Sobre esta matéria constam da sentença recorrida as seguintes passagens que integralmente reproduzimos:

“…Diz o reclamante que ocorre violação de caso julgado, depreendendo-se que o fundamento concreto desta violação é o facto de a sentença determinar a anulação do despacho e o OEF entender que não se mostra necessário qualquer revogação do mesmo.
Porém, mais do que as palavras, ou os termos jurídicos que às vezes são empregues impropriamente, interessa o procedimento concreto. E neste capítulo, deve reconhecer-se que o despacho ora reclamado, de 24/5/2012, embora refira não revogar os anteriores, acaba por introduzir outros fundamentos que não constavam dos despachos, anteriores, (valo recebido em tornas) e retira a referência à declaração sob compromisso de honra referente às contas bancárias.
Portanto, embora refira não revogar o despacho, acaba por decidir pelo indeferimento com base em fundamentos diferentes daqueles que constam do despacho anulado.
Assim, crê-se que embora procedendo de forma não totalmente correcta, não houve violação de caso julgado.
(…)
A fundamentação exigida pelo Art.° 77º/1,2 LGT e 124 CPA, deve ser suficien­te, clara, inteligível e congruente.
É suficiente quando abarca todos os elementos escolhidos pela administração de forma a permitir a reconstituição do "iter" lógico e jurídico do procedimento que terminou com a decisão final;
É clara quando é inteligível, sem ambiguidades nem obscuridades, tendo em conta a figura do destinatário normal que na situação concreta tenha de compreender as razões decisivas e justificativas da decisão;
E é congruente quando há consonância entre os pressupostos normativos do acto e os motivos do mesmo.
A adopção de fundamentos que por contradição não esclareçam concretamente a motivação do acto equivale à falta de fundamentação (Art.°125/2 CPA).
Ora, tendo presente estes critérios, resulta evidente que o despacho reclamado se encontra fundamentado, pois explicita de forma clara as razões pelas quais indefere o pedido, e que resultam do facto de o requerente ser titular do direito à herança que integra bens imóveis, e ter recebido tornas em partilha.
O facto de não estarem descriminados os bens imóveis nem os valores e o reclamante desconhecer os «prints» onde esses bens são mencionados, não impede que esses bens existam, o que aliás nem é negado pelo requerente.
De resto, não é a AT que tem de demonstrar que o reclamante dispõe de bens; é ao reclamante que cabe provar não dispor de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis, e não limitar-se a alegar a inexistência de bens (como fal­samente fez no primeiro requerimento), ou a dizer que tais bens não têm valor suficiente para garantir a dívida exequenda.
Portanto, reconduzindo as coisas aos seus devidos lugares, o facto de o recla­mante alegar desconhecer os «prints» é irrelevante. Ou tem os bens (a herança) e deveria tê-los oferecido em garantia, ou não os tem.
Mas o reclamante não nega «possuir» tais bens…”.

Atento o exposto, deve concluir-se, sem margem para dúvidas, que da fundamentação jurídica da sentença (segundo cremos o recorrente discorda, essencialmente, da fundamentação jurídica) não decorre, necessariamente, decisão oposta ou, pelo menos, diversa da proferida, visto que a decisão é o corolário lógico da fundamentação.
Em suma, não se vê que a sentença recorrida padeça de qualquer vício lógico na sua estrutura que tenha por consequência a respectiva declaração de nulidade.
Face ao exposto, julga-se improcedente também este fundamento do recurso.
O recorrente discorda do decidido sustentando, igualmente e como supra se alude, que tendo a primeira decisão de indeferimento da dispensa de prestação de garantia sido anulada pelos Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, com fundamento em falta de fundamentação e decidindo a A.T. não revogar a decisão de indeferimento sustentando, contrariamente ao decidido pelo Tribunal, que não teria ocorrido falta de fundamentação, quer a decisão de indeferimento, quer a sentença recorrida violaram caso julgado (cfr.conclusão 8 do recurso), com base em tais alegações pretendendo consubstanciar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Analisemos se a decisão recorrida padece de tal pecha.
Após a reforma do processo civil de 1995/96, o caso julgado passou a ser uma excepção dilatória, de conhecimento oficioso pelo Tribunal, que obsta à apreciação do mérito da causa e conduz à absolvição da instância (cfr.artºs.493, nº.2, 494, al.i), e 495, todos do C.P.Civil, “ex vi” do artº. 2, al.e), do C.P.P.Tributário).
Na base do caso julgado, tal como da litispendência, está o fenómeno da repetição de uma causa. Conforme a causa se repete durante a pendência da acção anterior ou já depois de esta estar finda, assim o fenómeno dá origem ao aparecimento da excepção de litispendência ou do caso julgado (cfr.artº.497, nº.1, do C.P.Civil). As referidas excepções visam evitar que o Tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior (cfr.artº.497, nº.2, do C.P.Civil), devendo o Juiz absolver o réu da instância na acção proposta em segundo lugar, a qual como que desaparece devido à actuação da excepção e assim ficando somente de pé a primeira. A excepção de caso julgado visa, pois, evitar um duplo dispêndio (desnecessário) de tempo, de dinheiro e de esforços, igualmente tentando obviar ao risco de grave dano para o prestígio da Justiça, derivado da eventual reprodução ou contradição de julgados.
A excepção de caso julgado não deve abranger os fundamentos de direito da decisão, mas tão-somente esta. Versando a decisão judicial sobre a matéria de fundo da acção, a sua força obrigatória não se limita ao processo em que foi proferida, igualmente se manifestando fora dele, de tal modo que constitui impedimento a que outra acção idêntica (com os mesmos sujeitos, pedido e causa de pedir) seja proposta. Esta obrigatoriedade dentro do processo e fora dele caracteriza o caso julgado material, assim se impondo a todos os Tribunais e a quaisquer outras autoridades (cfr.artºs.673 e 675, do C.P.Civil).
Pelo contrário, se a decisão judicial apenas incidir sobre a relação processual (v.g.absolvição do réu da instância), então a sua força obrigatória limita-se ao processo em que foi proferida. É o que se designa por caso julgado formal o qual se resume, em última análise, à simples preclusão dos recursos ordinários (cfr.artº.672, do C.P.Civil; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2ª.edição, 1985, pág.701 e seg.; Manuel A. Domingos Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, pág.304 e seg.).
Importa agora estabelecer, com nitidez, o conceito de repetição. Quando é que se pode afirmar com segurança que se repete a causa? A tal pergunta responde o artº.498, do actual C. P. Civil, preceito que nos diz repetir-se a causa quando se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir.
Existe identidade de sujeitos quando as partes são as mesmas em ambas as acções, sob o ponto de vista da sua qualidade jurídica. Há identidade de pedido quando numa e noutra causa se pretende obter o mesmo efeito jurídico. Por último, existe identidade de causa de pedir quando a pretensão deduzida nas duas acções procede do mesmo facto jurídico (cfr.artº.498, nºs.2, 3 e 4, do C.P.Civil; Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, III, 4ª.edição, Coimbra 1985, pág.91 e seg.; Antunes Varela e outros, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2ª.edição, 1985, pág.283 e 301 e seg.).
“In casu”, será que deve considerar-se procedente a excepção de caso julgado conforme defende o recorrente.
Cremos que não.
Desde logo, o recorrente não concretiza se estamos perante alegada violação de caso julgado formal ou material.
Por outro lado, o que é pressuposto do caso julgado material é a existência de uma decisão judicial sobre a matéria de fundo da acção. No entanto, no caso concreto, tal não se verifica, conforme se pode concluir da matéria de facto (cfr.nº.19 do probatório), dado que a sentença exarada no âmbito do processo judicial de reclamação nº. 1466/11.9BELRA apenso não conheceu do mérito da causa.
Por último, é manifesto que nos encontramos perante processos de reclamação diferentes e tendo por objecto despachos de indeferimento de pedido de isenção de prestação de garantia também diferentes (cfr.nºs.5 e 7 do probatório), pelo que a causa de pedir é diferente em ambos os processos (acto administrativo em exame em cada um dos processos).
Sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se infundado este esteio do recurso, assim se considerando improcedente a excepção de caso julgado deduzida pelo recorrente.
Mais alega o apelante que a decisão de indeferimento objecto dos presentes autos mostra-se não fundamentada, contrariamente ao decidido na sentença (cfr.conclusão 11 do recurso), com base em tais alegações pretendendo consubstanciar mais um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
A fundamentação é um conceito relativo que pode variar em função do tipo legal de acto administrativo que estamos a examinar.
Tem sido entendimento constante da jurisprudência e da doutrina que determinado acto (no caso acto administrativo-tributário) se encontra devidamente fundamentado sempre que é possível, através do mesmo, descobrir qual o percurso cognitivo utilizado pelo seu autor para chegar à decisão final (cfr.ac.S.T.J.26/4/95, C.J.-S.T.J., 1995, II, pág.57 e seg.; A. Varela e outros, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 2ª. edição, 1985, pág.687 e seg.; Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Coimbra Editora, 1984, V, pág.139 e seg.). Quer dizer. Utilizando a linguagem de diversos acórdãos do S.T.A. (cfr.por todos, ac.S.T.A-1ª.Secção, 6/2/90, A.D., nº.351, pág.339 e seg.) o acto administrativo só está fundamentado se um destinatário normalmente diligente ou razoável - uma pessoa normal - colocado na situação concreta expressada pela declaração fundamentadora e perante o concreto acto (que determinará consoante a sua diversa natureza ou tipo uma maior ou menor exigência da densidade dos elementos de fundamentação) fica em condições de conhecer o itinerário funcional (não psicológico) cognoscitivo e valorativo do autor do acto. Mais se dirá que a fundamentação pode ser expressa ou consistir em mera declaração de concordância de anterior parecer, informação ou proposta, o qual, neste caso, constitui parte integrante do respectivo acto (é a chamada fundamentação “per relationem” - cfr.artº.125, do C.P.Administrativo).
Para apurar se um acto administrativo-tributário está, ou não, fundamentado impõe-se, antes de mais, que se faça a distinção entre fundamentação formal e fundamentação material: uma coisa é saber se a Administração deu a conhecer os motivos que a determinaram a actuar como actuou, as razões em que fundou a sua actuação, questão que se situa no âmbito da validade formal do acto; outra, bem diversa e situada já no âmbito da validade substancial do acto, é saber se esses motivos correspondem à realidade e se, correspondendo, são suficientes para legitimar a concreta actuação administrativa (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 13/7/2011, rec.656/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/6/2012, proc.3096/09).
Se a fundamentação formal não esclarecer concretamente a motivação do acto, por obscuridade, contradição ou insuficiência, o acto considera-se não fundamentado (cfr.artº.125, nº.2, do C.P.Administrativo). Haverá obscuridade quando as afirmações feitas pelo autor da decisão não deixarem perceber quais as razões porque decidiu da forma que decidiu. Por outras palavras, os fundamentos do acto devem ser claros, por forma a colher-se com perfeição o sentido das razões que determinaram a prática do acto, assim não sendo de consentir a utilização de expressões dúbias, vagas e genéricas. Ocorrerá contradição da fundamentação quando as razões invocadas para decidir, justificarem não a decisão proferida, mas uma decisão de sentido oposto (contradição entre fundamentos e decisão), e quando forem invocados fundamentos que estejam em oposição com outros. Por outras palavras, os fundamentos da decisão devem ser congruentes, isto é, que sejam premissas que conduzam inevitavelmente à decisão que funcione como conclusão lógica e necessária da motivação aduzida. Por último, a fundamentação é insuficiente se o seu conteúdo não é bastante para explicar as razões por que foi tomada a decisão. Por outras palavras, a fundamentação deve ser suficiente, no sentido de que não fiquem por dizer razões que expliquem convenientemente a decisão final (cfr.Marcello Caetano, Manual de Direito Administrativo, vol.I, Almedina, 1991, pág.477 e seg.; Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, vol.II, Almedina, 2001, pág.352 e seg.; Diogo Leite de Campos e outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Vislis, 2003, pág.381 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/12/2008, proc.2606/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/11/2009, proc.3510/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 19/6/2012, proc.3096/09).
No caso dos autos, conforme se retira da matéria de facto provada (cfr.nºs.7 e 8 do probatório), o despacho reclamado deve considerar-se fundamentado, pois explicita de forma clara as razões pelas quais indefere o pedido de dispensa de prestação de garantia, as quais resultam do facto de o requerente ser titular do direito a metade indivisa de herança que integra bens imóveis com valor suficiente para a prestação de garantia na execução, mais tendo recebido tornas em partilha devido a separação judicial de pessoas e bens (cfr.nºs.10 e 11 da matéria de facto provada), tudo, de resto, conforme já consta da sentença do Tribunal “a quo”, a qual se confirma neste segmento por esta instância judicial de controlo.
Sem necessidade de mais amplas considerações, nega-se provimento ao presente fundamento do recurso.
Aduz, ainda, o recorrente que a sentença recorrida faz incorrecta interpretação do artº.52, nº.4, da L.G.T., quando entende que a mesma permite a dispensa parcial de garantia, quando os bens do executado existirem mas forem insuficientes, porquanto tal significaria que só em caso extremo de inexistência total de bens penhoráveis poderia haver dispensa. Que a solução da lei para os casos de insuficiência de bens penhoráveis é a dispensa (total) de prestação de garantia e não a dispensa parcial, que a lei não prevê, sendo que o pressuposto previsto na lei é a “insuficiência de bens penhoráveis” e não a “inexistência de bens penhoráveis” (cfr.conclusões 13 e 14 do recurso), com base em tais alegações pretendendo consubstanciar mais um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
O processo de execução fiscal tem como objectivo primacial a cobrança dos créditos tributários, de qualquer natureza, estando estruturado em termos mais simples do que o processo de execução comum, com o intuito de conseguir uma maior celeridade na sua cobrança, recomendada pelas finalidades de interesse público das receitas que através dele são cobradas.
Continua a ser dominante o entendimento de que a posição jurídica de supremacia que o Estado ocupa na relação fiscal não deve ficar afectada em virtude da utilização pelo sujeito passivo de um qualquer dos meios de defesa que a lei lhe faculta. Julgamos não ser necessária a invocação da ideia de supremacia do credor fiscal para justificar a ausência de efeito suspensivo do processo executivo resultante da utilização dos meios de defesa que a lei faculta ao contribuinte. Os casos em que a execução fiscal se pode suspender estão previstos no artº.169, do C.P.P.T. (cfr.artº.52, da L.G.T.), consubstanciando um deles a hipótese em que o próprio executado oferece uma garantia idónea susceptível de assegurar os créditos do exequente (cfr.artº.199, do C.P.P.T.).
Ponderado o disposto nos artºs.52, nºs.1 e 2, da L. G. Tributária, e 183, nº.1, do C. P. P. Tributário, a execução fiscal pode suspender-se mediante a prestação da dita garantia idónea por parte do executado (ou até de um terceiro com interesse em tal-v.g.promitente-comprador de um imóvel que não ocupa o lugar de executado). O acto tributário que constitui a dívida exequenda vê, assim, a sua eficácia suspensa a partir do momento em que o Estado assegurou (através da garantia) a efectiva cobrança do crédito que se atribui. A citada garantia idónea, de acordo com o legislador, pode consistir na garantia bancária, na caução, no seguro-caução, no penhor ou na hipoteca voluntária, idoneidade essa que deve ser aferida pela susceptibilidade de assegurar os créditos do exequente (cfr.artº.199, nºs.1 e 2, do C.P.P.Tributário). Sobre o valor da garantia, deve esta abranger a dívida exequenda, juros de mora computados até cinco anos e custas, tudo acrescido de 25% e conforme dispõe o artº.199, nº.5, do C. P. P. Tributário (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 21/2/2012, proc.5329/11; Diogo L. Campos e Outros, L.G.T. comentada e anotada, 4ª. edição, 2012, pág.423 e seg.; Carlos Paiva, O processo de Execução Fiscal, Almedina, 2008, pág.246 e seg.; Rui Duarte Morais, A Execução Fiscal, 2ª. edição, Almedina, 2010, pág.73 e seg.).
Este regime é, obviamente, uma manifestação dos princípios da proporcionalidade e da suficiência, os quais sempre devem presidir à constituição da garantia e sua manutenção, durante as vicissitudes que podem ocorrer no processo de execução fiscal suspenso.
Haverá, agora, que analisar o procedimento de dispensa de prestação garantia, o qual encontra consagração legal nos artºs.52, da L.G.Tributária, e 170, do C.P.P. Tributário.
O procedimento de isenção de prestação de garantia, está previsto no artº.52, nº.4, da L.G.Tributária, norma em que se consagra a possibilidade da Administração Tributária, a requerimento do executado, poder isentá-lo da prestação de garantia nos casos de a sua prestação lhe causar prejuízo irreparável ou existindo manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido, desde que, em qualquer dos casos, a insuficiência ou inexistência de bens não seja da responsabilidade do executado. Por outras palavras, admite-se a dispensa da prestação de garantia a efectuar pelo órgão da execução fiscal, em caso de manifesta falta de meios económicos do executado ou, mesmo quando este disponha de meios económicos suficientes, a prestação de garantia lhe cause ou possa causar prejuízo irreparável, circunstância que obviamente lhe cabe provar. Por sua vez, a forma de o executado obter a dispensa da prestação da garantia está prevista no artº.170, do C.P.P.Tributário (cfr.António Lima Guerreiro, Lei Geral Tributária anotada, Rei dos Livros, 2000, pág.243; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2007, pág.182; ac.S.T.A.-Pleno da 2ª.Secção, 17/12/2008, rec.327/08; ac.T.C.A.Sul, 27/4/2006, proc.1139/06; ac.T.C.A.Sul, 4/10/2011, proc.5021/11).
Concluindo, para ser deferido o pedido de dispensa de prestação de garantia é necessário que se satisfaçam três requisitos, cumulativamente, embora dois deles comportem alternativas, pelo que o executado deverá na petição tê-los em conta:
1-Que haja uma situação de inexistência de bens ou a sua insuficiência para pagamento da dívida exequenda e do acrescido;
2-Que essa inexistência ou insuficiência não seja imputável ao executado;
3-Que a prestação da garantia cause prejuízo irreparável ao executado ou que seja manifesta a sua falta de meios económicos.
Face ao disposto no artº.342, do C.Civil, e no artº.74, nº.1, da L.G.Tributária, é de concluir que é sobre o executado, que pretende a dispensa de garantia, invocando explícita ou implicitamente o respectivo direito, que recai o ónus de provar que se verificam as condições de que tal dispensa depende, pois tratam-se de factos constitutivos do direito que pretende ver reconhecido, contrariamente ao que defende a reclamante/recorrente. De resto, o texto do artº.170, nº.3, do C.P.P.Tributário, aponta no mesmo sentido, ao estabelecer que o pedido deve ser instruído com a prova documental necessária, o que pressupõe que toda a prova relativa a todos os factos que têm de estar comprovados para ser possível dispensar a prestação de garantia seja apresentada pelo executado, instruindo o seu pedido, pois a prova de todos esses elementos é necessária para o deferimento da sua pretensão. Em regra, o pedido de dispensa de prestação de garantia deve ser formulado no prazo de quinze dias concedido para a sua prestação, conforme resulta dos artºs.169, nº.2, e 170, nº.1, ambos do C.P.P.Tributário (cfr.Diogo L. Campos e Outros, L.G.T. comentada e anotada, 4ª. edição, 2012, pág.427 e seg.; Carlos Paiva, O processo de Execução Fiscal, Almedina, 2008, pág.251 e seg.; Rui Duarte Morais, A Execução Fiscal, 2ª. edição, Almedina, 2010, pág.85 e seg.).
A eventual dificuldade que possa ter o executado em provar o facto negativo que é a sua irresponsabilidade na génese da insuficiência ou inexistência de bens não é obstáculo à atribuição ao mesmo do ónus da prova respectivo, pois essa dificuldade de prova dos factos negativos em relação à dos factos positivos não foi legislativamente considerada relevante para determinar uma inversão do ónus da prova, como se conclui das regras consagradas no artº.344, do C.Civil. A acrescida dificuldade da prova de factos negativos deverá ter como corolário somente, por força do princípio constitucional da proporcionalidade, uma menor exigência probatória por parte do aplicador do direito, dando relevo a provas menos relevantes e convincentes que as que seriam exigíveis se tal dificuldade não existisse, assim aplicando a máxima latina “iis quae difficilioris sunt probationis leviores probationes admittuntur” (cfr.Manuel A. Domingos de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, Coimbra Editora, 1979, pág.203; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.467, nota 1; ac.S.T.A.-Pleno da 2ª.Secção, 17/12/2008, rec.327/08).
“In casu”, no processo de execução fiscal nº.2089-2004/101224.0 e aps., no âmbito do qual foi deduzida a reclamação que originou os presentes autos, de acordo com a matéria de facto provada o reclamante/recorrente (cfr.nºs.10 e 16 da matéria de facto provada), revela possibilidades económicas para prestar a garantia fixada (€ 33.058,58), assim não se tornando necessário aquilatar da verificação dos demais requisitos da dispensa da prestação da caução (v.g. se o executado/reclamante efectivamente teve culpa na insuficiência ou inexistência de bens). Tais possibilidades económicas derivam, desde logo, do facto de ser titular do direito a metade indivisa de herança que integra bens imóveis com valor suficiente para a prestação de garantia na execução (bens esses cuja avaliação actualizada poderia ser levada a efeito no âmbito do processo executivo, como, de resto, refere a A. Fiscal quando indefere o requerimento a pedir a isenção de prestação de garantia).
Face a tais elementos probatórios, caem por terra as alegações do executado/reclamante no sentido da inexistência/insuficiência de bens com vista à prestação de garantia, em ordem à suspensão do processo de execução fiscal. E, relembre-se, que sobre si recaía o ónus da prova de tal factualidade.
Concluindo, não vislumbra este Tribunal que a decisão recorrida tenha efectuado uma incorrecta interpretação do artº.52, nº.4, da L.G.T., mais devendo improceder este fundamento do recurso.
Por último, faz o recorrente menção da alegada violação do princípio do direito à prova por parte da decisão recorrida, embora não especifique em que consiste tal princípio, alegadamente vigente no âmbito do direito probatório. Se com tal menção queria fazer referência ao facto de a A. Fiscal não ter inquirido as testemunhas por si arroladas, tal matéria está ultrapassada, conforme mencionado supra para onde se remete.
Finalizando, sem necessidade de mais amplas ponderações, julga-se improcedente o presente recurso e, em consequência, confirma-se a decisão recorrida, embora com a presente fundamentação, ao que se procederá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o reclamante/recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 4 de Dezembro de 2012

(Joaquim Condesso - Relator)

(Lucas Martins - 1º. Adjunto)

(Aníbal Ferraz - 2º. Adjunto) Votei a decisão