Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:04170/10
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:10/26/2010
Relator:JOSÉ CORREIA
Descritores:IMPUGNAÇÃO DE IVA
REQUISITOS DA EMISSÃO DE FACTURAS ESTABELECIDOS NO ARTº 35º DO CIVA. CONSEQUÊNCIAS DA ALTERAÇÃO DA EXTENSÃO DO PROCEDIMENTO INSPECTIVO.
Sumário:I) - A lei estabeleceu, determinadas exigências relativas à emissão de facturas com o objectivo claro de evitar a fuga e evasão fiscais e daí ter estabelecido requisitos vários e pormenorizados quanto ao preenchimento das facturas que devem ser cumpridos pelos operadores económicos sob pena de não ser possível a dedução do IVA liquidado em tais documentos. Desta forma se acautela o interesse da Fazenda Pública e se previne a fraude fiscal.
II) - Nesse sentido o artigo 35º do CIVA estabelece determinados requisitos na emissão de facturas ou documentos equivalentes que são condição para a dedução do imposto por parte do sujeito passivo adquirente nos termos do artº 19º nº 2 do mesmo Código.
III) -No IVA e na medida em que a factura ou documento equivalente constitui como que um cheque sobre o Estado o legislador adoptou medidas apertadas para evitar a fraude fiscal nelas se filiando o artigo 35.° n.° 5 do CIVA que exige determinados formalismos (formalidades "ad substantiam" cujo incumprimento acarreta a invalidade destes documentos) que a recorrente não cumpriu pois nos documentos tem que constar a espécie de serviço prestado já que conforme a sua natureza a taxa do imposto também é diferente.
IV) - Decorrendo da lei que apenas dão direito à dedução do Imposto sobre o Valor Acrescentado, as facturas ou documentos equivalentes passados na forma legal, e visto que a exigência de tais documentos assim apercebidos tem também a finalidade de apetrechar a entidade pública (AF) do controlo da situação tributária, e não somente a de obter prova segura dos factos a controlar, os mesmos são formalidades substanciais, que não meramente probatórias, e, como tal, insubstituíveis por qualquer outro género de prova, designadamente a testemunhal.
V) -Os fins e a extensão do procedimento de inspecção podem ser alterados durante a sua execução mediante despacho fundamentado da entidade que o tiver ordenado (Art.° 15.° n.° 1 do RCPIT) pelo que, tendo as ordens de serviço para a inspecção sido emitidas pela Direcção de Finanças e vindo o Chefe de Divisão, no uso de poderes delegados do Director de Finanças, veio concordar com o relatório da mesma inspecção, que assim foi sancionado, tal concordância consiste numa mera irregularidade, não durante a própria fase da inspecção, mas posteriormente, no seu final, mas sem qualquer resultado no exame e decisão das liquidações e, por isso, sem quaisquer efeitos invalidantes dessas mesmas liquidações.
VI) – E, constando como declaração de princípio no preâmbulo do diploma que aprovou o RCPIT «A natureza do presente diploma é essencialmente regulamentadora, não se pretendendo alterar os actuais poderes e faculdades da inspecção tributária em os deveres dos sujeitos e demais obrigados tributários que se mantém integralmente em vigor», para que tal falta de autorização para prosseguimento da inspecção para averiguação da regularidade das deduções de IVA redundasse em vício invalidante da posterior liquidação operada, o mesmo teria que estar previsto no regime da LGT ou em outro diploma de igual categoria formal, que não neste diploma da carácter essencialmente regulamentador, como nele se diz, sem pretensões de alterar os poderes e faculdades da inspecção tributária.
VII) -Não se tratando de formalidade absolutamente essencial, e tendo os fins e extensão da inspecção sido notificados ao contribuinte, a formalidade foi atingida por outra forma, tanto mais que em sede do direito de audição, aquela tomou conhecimento do efectivo âmbito e extensão da acção inspectiva, devendo tal falta considerar-se sanada ou degradada em formalidade não essencial, na marcha do procedimento de inspecção.
VIII) – Donde que e no limite, aquele vício apenas se poderá reconduzir a mera irregularidade, com eventuais efeitos administrativos, como seja ao nível disciplinar, sem contender, só por si, com a legalidade das posteriores liquidações.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo:

1. A...– Sociedade Vitivinícola, Ldª., com os sinais dos autos, veio interpor recurso para o TCAS da sentença do TAF de Leiria que julgou improcedente a impugnação que deduziu contra a liquidação de IVA relativo aos anos de 2000 a 2003 e respectivos juros compensatórios, concluindo assim as suas alegações:
“A. O presente recurso tem por objecto a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, a 25 de Janeiro de 2010, que julgou improcedente a impugnação apresentada quanto aos actos tributários de liquidação adicional, relativos ao IVA e juros compensatórios, referentes aos exercícios de 2000 a 2003, tendo absolvido a Fazenda Pública do pedido de anulação daquelas.
B. A referida sentença proferida apreciou duas questões distintas, que se analisarão separadamente: (i) o facto de ser ou não usual a designação dos serviços prestados constante das facturas; (ii) a impossibilidade de alcançar a forma como se fixaram os valores debitados a título de despesas promocionais.
C. Porém, a sentença de que se recorre padece de dois vícios: o primeiro decorre da insuficiente valoração da prova - pois desconsiderou o Tribunal a quo a prova testemunhal produzida, através da qual se logrou demonstrar que a denominação utilizada pela Recorrente era efectivamente usual, nos termos do art. 35.°, n.° 5 al. b) do CIVA; já a segunda relaciona-se com a falta de fundamentação, no âmbito da invocação da impossibilidade de determinação dos valores debitados a título de despesas promocionais.
D. Assim, importa, antes de mais, sublinhar que a exigência da al. b) do n.° 5 do art. 35.° do CIVA, diz respeito à indicação da "quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável", sendo apenas estas as imposições legais nesta matéria.
E. Ora, a "quantificação " das prestações de serviços terá de ser entendida tendo em conta as especificidades destas operações: não se medem, não se pesam, não são susceptíveis de designar por referência a unidades; poderá, no limite, indicar-se se resumem a uma operação ou são duradouras; se são referente a um mês ou a um ano.
F. Não pretende a Recorrente, com tal entendimento, colocar em questão o carácter formalista do IVA. Porém, tal carácter terá de ser entendido em face dos propósitos do imposto, designadamente: evitar a evasão fiscal; garantir que a taxa de IVA foi correctamente aplicável; controlar as isenções ou localização dos serviços prestados, nos termos e para os efeitos do art. 6.° do CIVA.
G. Na verdade, o art. 35.° do CIVA não impõe a indicação das diligências em concreto efectuadas ou a descrição minuciosa da parte do valor cobrado que remunera os consumíveis utilizados, as deslocações realizadas, o estudo executado, ou trabalho intelectual desenvolvido. Exige-se, sim, a indicação da natureza do serviço, o cumprimento dos restantes requisitos formais que permitem uma fiscalização da regularidade da operação efectuada e que, em caso de dúvida, se prove a materialidade da operação.
H. Acresce que, os pressupostos que são, na verdade, exigidos por aquela disposição designadamente, a identificação do modo mais completo possível do comprador e vendedor, mercadorias, preço e data de transacção - encontram-se todos eles verificados no caso em apreço, apenas sendo necessário aferir se a designação "Despesas Promocionais" é idónea para cumprir os objectivos pretendidos, designadamente determinar a sujeição a imposto da operação e a taxa aplicável.
I. De facto, ficou devidamente comprovado, através do depoimento das testemunhas Alice Pires, Pedro Castro e Carlos Gomes, que a denominação usual quando se trata de distribuição de vinhos, não poderia ser diferente da que consta de todos e cada um dos avisos de lançamento em causa - sendo, aliás, impossível a descrição detalhada das prestações de serviços realizadas, dada a sua amplitude -i.e., "Despesas Promocionais", tendo sido sempre esta a expressão utilizada para este tipo de serviços, bastando que se consulte a contabilidade da empresa para comprovar esta realidade.
J. Ora, tal depoimento testemunhal é essencial, não para corroborar o respeito pelos formalismos em que porventura seria dispensável, mas para provar que esta é uma designação habitual na actividade económica para o tipo de serviços prestado, que se desconhece outra designação para além da que consta nos avisos de lançamento, como entendem as testemunhas e, que a descrição detalhada das prestações de serviços realizadas é sempre impossível em tais situações, dada a sua amplitude, a dispensa da sua audição inquina a sentença proferida.
P. Mais se refira que o relatório de inspecção no âmbito da acção de inspecção realizada visava a constatação do '" (…) não regular apuramento das operações de circulação em regime de suspensão de IABA e também em sede de IVA" tendo as correcções efectuadas, porém, extravasado este âmbito, pois que se referem à não aceitação da dedução do IVA mencionado nas facturas por alegada desconformidade das mesmas.
Q. E, de facto, a douta sentença de que se recorre reconhece expressamente "(…) que a impugnante não incorreu em qualquer lapso na interpretação do âmbito e extensão da inspecção - o próprio signatário do relatório reconhece que a inspecção tinha por objectivo inicial a verificação das situações denunciadas", donde se retira ter existido uma alteração da extensão do procedimento inspectivo, sem o necessário despacho e notificação à Recorrente.
R. É igualmente incontestável que o procedimento em causa, nos termos do disposto no art. 14.°, n.° 2 RCPIT, visava uma inspecção parcial que, apenas se limitaria (i) à consulta e recolha de elementos, (ii) à verificação do sistema informático do sujeito passivo, e (iii) ao controlo dos bens em circulação, não podendo a Recorrente, assim sendo, aceitar que a inexistência de despacho que modifique a extensão do procedimento seja qualificada como mera irregularidade, pois tal entendimento contrariaria o art. 15.°, n.° l do RCPIT.
S. Deste modo, sendo um dos fins do procedimento inspectivo controlar os bens em circulação, não podem as correcções ora em crise daí decorrer, directa ou indirectamente, sendo lógica a consequência da anulação dos actos tributários de liquidação adicional, uma vez que a irregularidade do procedimento tributário consubstancia preterição de formalidades essenciais e, consequentemente, afecta a validade de todo o processamento posterior, nos termos conjugados dos art. 14.° e 15.° do RCPIT.
nestes termos, e nos mais de direito, deve o
PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE E A DECISÃO REVOGADA E SUBSTITUÍDA POR ACÓRDÃO QUE DECLARE A IMPUGNAÇÃO PROCEDENTE, ANULANDO-SE AS LIQUIDAÇÕES ADICIONAIS DE IVA E JUROS COMPENSATÓRIOS, REFERENTES AOS EXERCÍCIOS DE 2000 A 2003, COM AS DEVIDAS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS.”
Não houve contra -alegações.
A EPGA pronunciou-se no sentido de que o recurso não deve ser provido (cfr. parecer de fls. 254/255).
Os autos vêm à conferência depois de recolhidos os vistos.
*
2.- Na sentença recorrida assentou-se a seguinte matéria de facto provada, não provada e respectiva motivação:
A) A coberto do ofício n.° 5457, datado de 02/06/2004, a impugnante foi notificada da Carta/aviso de fls. 94, que se dá por integralmente reproduzida, dando-lhe a conhecer que, a curto prazo, se iniciaria uma fiscalização externa tendo como finalidade a verificação do cumprimento das obrigações tributárias, de âmbito parcial estendendo-se a IVA dos anos de 2000 a 2003.
B) No âmbito da acção inspectiva da impugnante foi elaborado o relatório final de fls. 43 a 56, que se dá por integralmente reproduzido, do qual se destaca o seguinte:
«C...;
JI-2 - Motivo, âmbito e incidência temporal
A visita de fiscalização a este sujeito passivo, surge no seguimento de uma Proposta de Verificação Externa, de 17/05/2004, decorrente de uma Informação enviada pelo Serviço de Finanças de Almeirim pelo Oficio n°1712, de 22/04/2004, onde se propõe a verificação de situações denunciadas, em virtude de urna participação efectuada pela Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos sobre o Consumo - Alfândega de Alverca, referente A...Sociedade vitivinícola, Lda (adiante apenas designada por A...), em que se constatou o não regular apuramento das operações de circulação em regime de suspensão de IABA e também em sede de IVA,
A presente acção incidiu sobre os exercícios de 2000 a 2003 para efeitos de IVA.
III-DESCRIÇAO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA COLECTÁVEL
3.1 - Em sede de IVA
3.1.1- IVA deduzido em documentos sem forma legal
O sujeito passivo contabilizou nos exercícios em análise (2000 a 2003), custos referentes a despesas promocionais, pagas à sociedade B... Distribuição, S.A,(adiante apenas designada por B...), contribuinte n° 502848987, e deduziu o correspondente IV A, nos documentos e montantes abaixo discriminados:
(...)
O Sujeito Passivo ao deduzir o IVA destes documentos, infringiu o artigo 19°, n.° 2 do CIVA, no que se refere ao exercício do direito de dedução por os documentos não se encontram emitidos de acordo com as formalidades exigidas pelo artigo 35, n.° 5, al. b) IVA, pelos motivos que se passam a descrever.
Nos termos do n° 5 do art° 35° do CIVA, e conforme oficio -Circulado n° 181 044, de 06/12/91, do Gabinete do Subdirector-Geral do SIVA, a facturação das prestações de serviços deverá sempre quantificar e especificar as operações, não podendo aceitar-se, por exemplo, a mera indicação de "serviços prestados". O facto das facturas de prestações de serviços estarem emitidas com deficiências, conduz à penalização de quem as passou e de quem as detém, jã que o adquirente procedeu à dedução do imposto, com base em documento passado sem a forma legal.
Acontece que, o sujeito passivo em análise contabilizou como custos nos exercícios de 2000 a 2003 e deduziu o respectivo IVA, tendo por base Avisos de lançamento de débito emitidos pela sociedade B..., em que apenas mencionam a designação "Despesas Promocionais Nado)" sem referência a que tipo de despesas se referem. Este descritivo constante dos Avisos de lançamento, não satisfaz o requisito da al.b) do n° 5 do art° 35° do CIVA por não conter qualquer referência à quantidade e à denominação usual dos serviços prestados, não identificando essas despesas promocionais, sendo isso elemento essencial que deve constar das facturas e que não pode ser suprido por outro meio de prova para efeitos de dedução do IVA nos termos do art° 19°, n° 2 do CIVA, que dispõe que só confere direito à dedução o impo mencionado em facturas e documentos equivalentes passados em forma legal.
Os documentos em causa não cumprem tal exigência legal, nem remetem para qualquer documento donde conste o cumprimento da exigência legal.
Neste sentido. Foi o sujeito passivo notificado, em 25/06/2004, para no dia 30/06/2004, proceder à apresentação dos comprovativos dessas despesas de publicidade, incorridas nos anos de 2000 a 2003, de modo a que as mesmas se apresentem quantificadas e especificadas, nos termos da ai. b) do n° 5 do art° 35° do CIVA, nomeadamente:
- os contratos celebrados com a entidade emitente desses avisos de lançamento, referentes às despesas de publicidade;
- forma de cálculo dos valores contabilizados nos diversos anos;
- as campanhas publicitárias realizadas em cada ano;
- indicar a razão do não diferimento desses encargos cm mais do que um exercício;
- e explicar os motivos das divergências verificadas na relação vendas à B..., S.A. com os encargos promocionais debitados pela mesma, uma vez que, por exemplo, em 2001, esses encargos representam cerca de 41,08%, enquanto que em 2002 apenas representam 6,96%.
No dia para o qual foi notificado, apenas foi apresentado um quadro onde aparecem discriminados por anos, desde 1998 a 2002, diversos valores, destacando-se os referentes a vendas liquidas, custo da mercadoria, investimentos em Trade, investimentos em Consumer, investimentos em Média e os valores dos reembolsos pagos pela B..., S.A. No entanto, não apresenta comprovativos desses valores apresentados no quadro. Os valores constantes desse quadro resumem-se no seguinte: (...)
Os valores constantes no quadro e referentes aos reembolsos são os valores que a sociedade Somngnum imputa todos os anos à A...como sendo comparticipação nas despesas promocionais de cada ano e conforme se pode visualizar estes reembolsos apresentam percentagens em relação às vendas líquidas ou ao custo dessas mercadorias muito díspares de ano para ano. Além de não apresentarem comprovativos desses valores referentes aos investimentos efectuados, para o exercício de 2002 apenas faz referência que se trata do Budget e para 2003 o quadro não faz qualquer referência. Por fim, também não apresentaram justificação para as percentagens tão díspares da imputação das despesas de marketing e a forma de cálculo desses reembolsos, não tendo sido possível, após várias tentativas de cálculo, encontrar os valores em causa.
Além deste quadro também apresentou uma carta da B..., S.A. para a A...Soc. Vitivinícola, Lda, datada de 13/02/2000, onde menciona no ponto n° 3 da mesma que "este tipo e valor de investimentos teria um prazo para realização de no mínimo 3 anos para obter efeitos sobre o mercado e os consumidores". Esta afirmação indica claramente que os encargos referentes aos investimentos em campanhas publicitárias, debitados pela B... à A..., se tratam de encargos de projecção económica plurianual e que deveriam ter sido considerados na A...como custos, em partes iguais, em mais do que um exercício, durante um período mínimo de três anos, conforme o disposto no art° 17°1 n° 4, al.d) do Decreto Regulamentar n° 2/90, de 12/01 e não serem considerados pelo valor total, tal como aconteceu.
Posteriormente, foi apresentado um contrato de distribuição exclusiva, datado de 31/12/1996, entre as 2 sociedades, onde s se encontram definidas as cláusulas do mesmo. Este contrato tem o seu início no dia 1 de Janeiro de 1997 e vigora por um período de um ano, sendo prorrogável por iguais períodos enquanto qualquer das partes o não denunciar. Neste contrato encontram-se definidas as cláusulas, em que as 2 partes se comprometem a cumprir, destacando-se, entre outras:
• A A...compromete-se a comparticipar nas despesas de marketing conforme for estabelecido anualmente entre ambas as partes (cláusula Segunda, n° l, al. d)).
• A B... com promete-se a apresentar à A..., no inicio de cada ano, estimativas de vendas, acções promocionais a efectuar e respectivos reembolsos, bem como os investimentos de marketing de cada produto, que deverão obter a concordância por escrito de ambas as partes. E ainda, no início de cada mês, apresentar um mapa estatístico das vendas efectivamente realizadas no mês imediatamente anterior (cláusula Segunda, n° 2,al. d)).
Este contrato apresenta ainda um anexo, onde se encontram estabelecidas as condições para dar cumprimento à al. d) do n° 2 da clausula Segunda, referente ao exercício de 1997, nomeadamente objectivos de vendas para 1997, preços de venda à B... em 1997, despesas de marketing em 1997 e a percentagem das despesas de marketing a imputar à A...e à B.... Este anexo contém ainda uma nota onde se menciona que a B... se compromete a apresentar trimestralmente as despesas efectuadas e emitirá a nota de débito correspondente a uma percentagem dos mesmos.
Perante este contrato de distribuição exclusiva, deparamo-nos com cláusulas que Comprometem ambas as sociedades c que mostram que a B... imputa anualmente despesas de marketing à A..., mas mediante algumas condições, conforme se encontram descritas anteriormente e conforme foi cumprido para o exercício de 1997, uma vez que neste ano existe um anexo ao contrato onde se encontram definidas estas condições.
Assim, os Avisos de lançamento debitados pela B... à A..., para que se considerassem como documentos emitidos sob a forma legal, deveriam especificar e quantificar essas despesas promocionais ou então ter um anexo ou remeter para outro documento que cumprisse as exigências legais, que deveria ser um documento onde se encontrassem expressas e devidamente comprovadas, tanto em quantidade como em valor, todos os investimentos efectuados em publicidade e marketing, e todas as outras componentes constantes do contrato de exclusividade apresentado pela empresa, no qual as 2 sociedades se comprometeram e se resumem essencialmente à cláusula segunda desse contrato.
Apesar do sujeito passivo ter sido notificado para apresentar os contratos celebrados com a B... e referentes às despesas de publicidade, a forma de cálculo dos valores contabilizados nos diversos anos. As campanhas publicitárias realizadas em cada ano, para indicar a razão do não diferimento desses encargos em mais do que um exercício c explicar os motivos das divergências verificadas na relação vendas à B..., S.A. com os encargos promocionais debitados, o mesmo não apresentou estes elementos. Em relação aos dados que nos foram disponibilizados verificam-se diversas incongruências, conforme se destacam as seguintes:
* Na carta apresentada da B..., S.A. para A...Soc. Vitivinícola, Lda, datada de 13/02/2000, é mencionado num dos parágrafos que a B... iria debitar 50% dos custos promocionais e de trade e 12,5% do total do custo da campanha, de publicidade. No entanto, aplicando essas percentagens aos valores anteriormente apresentados no quadro n° l resultaria um total de custos suportados pela Fiúza & Bright de € 52.350,88, no ano de 2000. Recordando, em 2000, o custo que foi imputado pela B... foi de € 59.556,47, verificando-se assim uma divergência entre estes 2 valores;
* A A...apresentou outra carta emitida pela B..., em 26/12/2000, em que menciona que esta última sociedade remete para a A...a nota de débito n° 187, no valor de 13.969.800$00, correspondente à comparticipação Fiúza nas despesas de marketing/publicidade durante 2000. Esta carta tem em anexo uma listagem onde constam, supostamente a descrição dos investimentos realizados pela B... no ano de 2000 e que se resumem aos seguintes valores: Consumer = 2.366.348$00, Média = 7.546.487$00 e Trade = 12.448.707$00. Conforme se consta estes valores divergem dos apresentados no quadro n° l e também não aparece evidenciado como é calculada a percentagem das despesas promocionais debitadas à Fiúza;
* Acresce ainda referir que apresentaram uma listagem de despesas onde, além de não se conseguir identificar essas despesas, existem anotações e cálculos manuscritos nos elementos fornecidos;
* Por fim, a Fiúza apresenta ainda outra carta da B..., datada de 07/01/2002, onde refere que esta última se compromete a enviar à Fiúza todos os justificativos relativamente às despesas promocionais de 2001. No entanto, a A..., não apresentou, nem à data da notificação, nem no decurso da acção inspectiva, esses justificativos. Além disso, é ainda referido nessa carta que a B... irá elaborar um plano de investimentos para 2002 que oportunamente será apesar apresentado à A...para aprovação. Este plano também não apresentado nesta acção de inspecção.
Por todos os factos anteriormente expostos, se conclui que os documentos referentes às despesas promocionais debitadas pela B... à A..., nos exercícios de 2000 a 2003, não respeitam os requisitos legais de forma prescritos no mo 35°, no 5, do CIVA, não conferindo deste modo direito à dedução do IVA mencionados nesses documentos, independentemente da efectiva realização das operações a que esses documentos se referem (cfr. art° 19°, n° 2 do CIVA). Acresce ainda referir que, conforme o Acórdão do TCA de 25/06/2002, proc. n° 6721/02, no seu ponto II refere, "A exigência da observância desses requisitos nos referidos documentos- facturas- tem como escopo permitir à Administração tributária o controlo da situação tributária, e não apenas obter prova dos factos a controlar, motivo por que as facturas, emitidas de acordo com os termos da lei, constituem formalidade ad substanciam, insusceptível de substituição por qualquer outro meio de prova."
Deste modo, o IVA deduzido indevidamente nos exercícios analisados, ascende aos valores de € 6,379,38 em 2000, € 19.123,76 em 2001, € 4.750,00 em 2002 e €4. 750,00 em 2003.
3.1.2- Outras Informações
Sendo o objectivo principal desta acção a verificação de situações denunciadas pela Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos sobre o Consumo- Alfândega de Alverca, com vista ao enquadramento legal dos factos referidos nessa participação, foram analisadas as situações identificadas no Oficio da Alfândega de Alverca, nomeadamente o não regular apuramento das operações de circulação em regime de suspensão de I ABA tituladas pelos DAA's constantes dos mapas em anexo a esse oficio. Desta análise resultaram as seguintes conclusões:
• As situações denunciadas dizem respeito ao facto de, algumas transmissões de bens em regime de suspensão de IABA, efectuadas pela empresa, nesses anos em análise, nomeadamente algumas transmissões intracomunitárias, não terem sido apuradas e não terem sido comunicadas à Alfândega de controlo, o que significa que o exemplar n° 3 de alguns documentos de acompanhamento não foram devo/vidos dentro do prazo previsto no Código dos Impostos Especiais do Consumo (CIEC).
Em relação a estas situações, exigidas pelo CIEC e não pelo CIVA, constatou-se no início da acção inspectiva que em relação aos exemplares n° 3 dos DAA's referidos no Oficio da Alfândega de Alverca, que não tinham sido devolvidos ao expedidor dos bens, já se encontravam na sua maioria arquivados junto das facturas de venda da A.... Em relação aos restantes, que ainda continuam a faltar, não origina qualquer correcção em sede de IVA, uma vez que se tratam de transmissões intracomunitárias de bens, e como tal são operações isentas de IVA, nos termos da ai. a) do art° 14° do RUI..
• Estas isenções previstas no art° 14° al. a) do RITI, não estão sujeitas às formas de comprovação estabelecidas no n° 8 do art° 28° do CIVA, uma vez que o estatuído neste último artigo não pode ter aplicação em sede de transacções intracomunitárias, já que tal norma elenca, com carácter taxativo, as isenções que, de entre as previstas no CIVA, estão submetidas às regras de comprovação aí expressamente previstas. Perante a falta de norma que na legislação do IVA indique expressamente os meios considerados idóneos para comprovar a verificação dos pressupostos da isenção prevista na al. a) do art° 14° do RITI, será de admitir que a prova da saída dos bens do território nacional possa ser efectuada recorrendo aos meios de prova, nomeadamente através das possibilidades alternativas definidas no Ofício -Circulado n° 30 009, de 99.12.10, da DSIVA. Nos casos concretos, o sujeito passivo apresentou, juntamente com as facturas de venda, os documentos comprovativos de transporte e os comprovativos bancários a certificar que os pagamentos correspondentes às transmissões intracomunitárias foram creditados na conta do vendedor, neste caso da A....
Face ao exposto, não há qualquer liquidação de IV A referente às operações de circulação em regime de suspensão de IABA, tituladas pelos DAA's constantes dos mapas em anexo ao Oficio enviado pela Alfândega de Alverca.
C) Consequentemente, foram emitidas as liquidações de IVA e juros compensatórios de fls. 31 a 39, que se dão por integralmente reproduzidas.
*
Factos não provados:
Com interesse para a decisão não se provaram outros factos.
*
A convicção do Tribunal baseou-se nos documentos referidos em cada uma das alíneas antecedentes.
*
3. - Fixada a factualidade relevante e atentas as conclusões do recurso que delimitam o seu objecto, decorre que as questões que se impõe conhecer são as de saber (i) se a sentença recorrida, enquanto que não considerou para efeitos de dedução do I.V.A. facturas preenchidas segundo certos procedimentos que as testemunhas ouvidas demonstraram ser inevitáveis, violou a lei, devendo, por isso, ser anulada, quer por insuficiente valoração da prova - pois desconsiderou o Tribunal a quo a prova testemunhal produzida, através da qual se logrou demonstrar que a denominação utilizada pela Recorrente era efectivamente usual, nos termos do art. 35°, n°5 al. b) do CIVA – quer por falta de fundamentação, no âmbito da invocação da impossibilidade de determinação dos valores debitados a título de despesas promocionais - conclusões a) a j) – e (ii) violação do art. 15°, n°1 do RCPIT em virtude da inexistência de despacho modificador da extensão do procedimento – demais conclusões.
Assim, quanto à 1ª questão, a AT e a sentença recorrida que sancionou o seu agir, partiu do princípio de que o contribuinte, adquirente de bens ou serviços, apenas pode efectuar a dedução do imposto suportado na medida em que o mesmo se encontre mencionado em facturas emitidas pelos fornecedores pela aquisição de bens e serviços, ou seja, de a factura constituir o documento com base no qual o sujeito passivo procede à dedução do IVA desde que tenham sido emitidas na forma legal - n° 2 do art.° 19° do CIVA.
«In casu» a A.F. entendeu que as facturas emitidas e em causa, não obedeciam aos requisitos contidos no n°5 do art°35° do CIVA pois não discriminam os bens ou serviços prestados.
A AT e o Mº juiz pronunciam-se no sentido de que é censurável que as ajuizadas facturas não respeitem o condicionalismo previsto no n° 5 do art°35° do CIVA, fundamentando-se assim na sentença recorrida (excerto):

“ (…)
Nesta conformidade e conforme expressamente se refere no douto Acórdão do TCA referido no relatório inspectivo, a emissão da factura visa, essencialmente, o controlo da situação tributária dos sujeitos passivos.
Descendo ao caso dos autos, temos que, conforme ficou demonstrado no relatório inspectivo e a impugnante nada demonstrou em sentido contrário, dos documentos que serviram de base à dedução do IVA e demais documentação apresentada pela impugnante não era possível perceber como foram apurados os valores debitados - ou seja, não era possível o controlo, por banda da AF, da correcção dos valores dos bens ou serviços, da taxa aplicável e imposto dedutível.
Como vimos, o que o legislador pretendeu foi evitar a fuga e a fraude fiscal, exigindo várias formalidades aos documentos que atestam a existência de factos tributários: nas transmissões de bens e prestações de serviços, as facturas têm que obedecer a todos os requisitos do dito Art. 35°.
No caso dos autos, o facto tributário é a comparticipação da impugnante em despesas de publicidade, pelo que os documentos relevantes para efeito de liquidação de IVA são as notas de lançamento e demais documentação que atesta os termos em que tal comparticipação é efectuada, mormente, discriminando a percentagem da comparticipação e o valor sobre o qual tal percentagem incide.
Todavia, as notas de lançamento não possuem os elementos essenciais legalmente previstos que permitam determinar a obrigação da impugnante. Sendo que, da restante documentação fornecida por esta e analisada pela AT, não era, também, possível perceber o quantum da sua obrigação de comparticipação nas despesas de publicidade, em cada um dos anos analisados.
Repetindo o que acima referimos, é reconhecido o carácter formalista do IVA, em ordem nomeadamente, a evitar, o mais possível, a evasão fiscal, pelo que as respectivas formalidades o são ad substanciam, que não meramente ad probationem, por isso, não consideraremos a prova testemunhal produzida.”

Tal como se expendeu nos Acórdãos do TCA de 08/10/2002, no Recurso nº 6180/02 e de 15/10 /2002, no Recurso nº 6153/01, também relatados pelo relator desta formação e cuja fundamentação iremos seguir adaptando-a ao caso concreto, atendendo ao especial regime de liquidação e cobrança do IVA (o Estado comete a liquidação aos intervenientes nas operações sujeitas e a entrega final impende sobre o sujeito passivo), para que haja direito à dedução do IVA mencionado nas facturas e documentos equivalentes, além de ser necessário que estes estejam passados em forma legal - nº 2 do art. 19º e art. 35º do CIVA), também é necessário que as operações constantes das facturas ou documentos equivalentes se tenham realizado e pelo preço aí referido, não podendo deduzir-se imposto que resulte de operações simuladas ou em que seja simulado o preço constante da factura ou documento equivalente (nº 3 do art. 19º citado).

Por um lado, aquela exigência de observância da forma legal prescrita no CIVA para conferir o direito à dedução do imposto (citados arts. 19° n° 2 e 35° n° 5) justifica-se dentro da lógica interna do regime de um imposto plurifásico, que incide sobre cada fase da transacção dos bens ou serviços, por ser necessário o cumprimento rigoroso das regras legais, de forma a facilitar o controlo da fiscalização e evitar a fuga à tributação e, por outro lado, é dentro dessa lógica de combate à evasão fiscal que o n°3 do também citado art. 19° do CIVA estipula que não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da factura ou documento equivalente.


Mas porque a AF, no exercício da sua competência fiscalizadora da conformidade da actuação dos contribuintes com a lei (arts. 76º do CIVA e 107º do CIRC) actua no uso de poderes vinculados, submetida ao princípio da legalidade, cabe-lhe o ónus de prova da verificação dos pressupostos que a determinaram a efectuar as correcções técnicas ou, porventura, a fixar o imposto por métodos indirectos, cumprindo-lhe demonstrar a factualidade que a leva a considerar determinada factura, quer como não preenchendo os requisitos formais contidos na lei, quer a considerar determinada operação documentada, como simulada.
Mas só quanto a esta última vertente da questão, se pode dizer que tal factualidade tem de ser susceptível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte (atento o princípio da declaração e da veracidade da escrita vigente no nosso direito - art. 75° da LGT), só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova de que as operações se realizaram efectivamente.
No caso dos autos a liquidação reporta-se à reposição de IVA que a AF considerou como indevidamente deduzido relativamente a diversas prestações de serviços suportadas pela impugnante.
Todavia, para proceder à liquidação impugnada, a AF fundamentou-se em que as facturas em apreço não obedecem aos requisitos previstos no art. 35º do CIVA.
Ora, o recorrente desde logo faz assentar a sua discordância com o decidido, também naquele facto: a falta dos requisitos legais exigidos para que as facturas possam conferir à impugnante o direito à dedução do IVA nelas liquidado. Com efeito, sustenta a recorrente que as facturas emitidas contêm os elementos impostos pelo art. 35º do CIVA.
Ou seja e atendendo também à fundamentação da sentença, o objecto do recurso não consiste tanto em saber se a recorrida efectuou operações com direito a dedução de imposto, mas, também, saber se o imposto mencionado nas facturas em questão pode ser deduzido, considerando a exigência do nº 2 do art. 19º do CIVA.
A sentença recorrida expressamente considerou que as facturas em causa não cumpriam os requisitos previstos no art. 35º do CIVA, e por isso, não permitiam o direito à dedução do imposto nelas liquidado, isso respondendo à questão da falta de fundamentação legal suscitada pela impugnante quando sustenta que a AT deveria ter indicado o descritivo que, do seu ponto de vista, teria que constar dos avisos de lançamento.
No ponto não tem razão a impugnante pois, como bem discreteou o Mº Juiz «quo», resulta do relatório que as correcções efectuadas não derivam da mera designação dos serviços prestados constante das facturas mas do facto de, após a análise dos elementos solicitados e fornecidos pela impugnante, não ter sido possível à AF o controlo da situação tributária daquela, porquanto não conseguiu alcançar o modo de determinação dos valores debitados a título de despesas promocionais.
Não obstante, persiste a recorrente em afirmar que, contrariamente ao fundamentado na sentença, existiu o vício de violação de lei por erro nos pressupostos de facto e de direito da liquidação pela fundamental razão de que os Avisos de lançamento contêm a denominação usual das despesas nelas mencionadas.
Ora, para a recorrente, a sentença fez uma insuficiente valoração da prova ao desconsiderar a prova testemunhal produzida, através da qual se logrou demonstrar que a denominação utilizada pela Recorrente era efectivamente usual, nos termos do art. 35.°, n.° 5 al. b) do CIVA, sendo que efectivamente ocorre a falta de fundamentação, no âmbito da invocação da impossibilidade de determinação dos valores debitados a título de despesas promocionais.
É que, esgrime ainda a recorrente, o art. 35.° do CIVA não impõe a indicação das diligências em concreto efectuadas ou a descrição minuciosa da parte do valor cobrado que remunera os consumíveis utilizados, as deslocações realizadas, o estudo executado, ou trabalho intelectual desenvolvido, encontrando-se os pressupostos exigidos por aquela disposição designadamente, a identificação do modo mais completo possível do comprador e vendedor, mercadorias, preço e data de transacção, verificados no caso em apreço, apenas sendo necessário aferir se a designação "Despesas Promocionais" é idónea para cumprir os objectivos pretendidos, designadamente determinar a sujeição a imposto da operação e a taxa aplicável.
Ora, diz a recorrente que ficou devidamente comprovado, através do depoimento das testemunhas Alice Pires, Pedro Castro e Carlos Gomes, que a denominação usual quando se trata de distribuição de vinhos, não poderia ser diferente da que consta de todos e cada um dos avisos de lançamento em causa - sendo, aliás, impossível a descrição detalhada das prestações de serviços realizadas, dada a sua amplitude -i.e., "Despesas Promocionais", tendo sido sempre esta a expressão utilizada para este tipo de serviços, bastando que se consulte a contabilidade da empresa para comprovar esta realidade.
O certo é que, o art. 19º do CIVA dispõe, no que agora interessa:
1 - Para apuramento do imposto devido, os sujeitos passivos deduzirão, nos termos dos artigos seguintes, ao imposto incidente sobre as operações tributáveis que efectuaram:
a) O imposto que lhes foi facturado na aquisição de bens e serviços por outros sujeitos passivos;
(...)
2 - Só confere direito a dedução o imposto mencionado em facturas e documentos equivalentes passados em forma legal, bem como no recibo de pagamento de IVA que faz parte das declarações de importação, em nome e na posse do sujeito passivo.
3 - Não poderá deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da factura ou documento equivalente.
Por sua vez, dispõe o artº 35º do mesmo CIVA, também no que agora interessa, o seguinte:
«5 - As facturas ou documentos equivalentes devem ser datados, numerados sequencialmente e conter os seguintes elementos:
a) Os nomes, firmas ou denominações sociais e a sede ou domicílio do fornecedor de bens ou prestador de serviços e do destinatário ou adquirente, bem como os correspondentes números de identificação fiscal dos sujeitos passivos de imposto;
b) A quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável; as embalagens não efectivamente transaccionadas deverão ser objecto de indicação separada e com menção expressa de que foi acordada a sua devolução;
c) O preço, líquido de imposto, e os outros elementos incluídos no valor tributável;
d) As taxas aplicáveis e o montante de imposto devido;»
No caso vertente, a AF refere, a este respeito, que as ditas facturas não reúnem todos os requisitos referidos no art. 35° do CIVA, porquanto “… a facturação das prestações de serviços deverá sempre quantificar e especificar as operações, não podendo aceitar-se, por exemplo, a mera indicação de "serviços prestados". O facto das facturas de prestações de serviços estarem emitidas com deficiências, conduz à penalização de quem as passou e de quem as detém, jã que o adquirente procedeu à dedução do imposto, com base em documento passado sem a forma legal.
Acontece que, o sujeito passivo em análise contabilizou como custos nos exercícios de 2000 a 2003 e deduziu o respectivo IVA, tendo por base Avisos de lançamento de débito emitidos pela sociedade B..., em que apenas mencionam a designação "Despesas Promocionais Nado)" sem referência a que tipo de despesas se referem. Este descritivo constante dos Avisos de lançamento, não satisfaz o requisito da al.b) do n° 5 do art° 35° do CIVA por não conter qualquer referência à quantidade e à denominação usual dos serviços prestados, não identificando essas despesas promocionais, sendo isso elemento essencial que deve constar das facturas e que não pode ser suprido por outro meio de prova para efeitos de dedução do IVA nos termos do art° 19°, n° 2 do CIVA, que dispõe que só confere direito à dedução o impo mencionado em facturas e documentos equivalentes passados em forma legal.
Os documentos em causa não cumprem tal exigência legal, nem remetem para qualquer documento donde conste o cumprimento da exigência legal.
Neste sentido. Foi o sujeito passivo notificado, em 25/06/2004, para no dia 30/06/2004, proceder à apresentação dos comprovativos dessas despesas de publicidade, incorridas nos anos de 2000 a 2003, de modo a que as mesmas se apresentem quantificadas e especificadas, nos termos da al. b) do n° 5 do art° 35° do CIVA, nomeadamente:
- os contratos celebrados com a entidade emitente desses avisos de lançamento, referentes às despesas de publicidade;
- forma de cálculo dos valores contabilizados nos diversos anos;
- as campanhas publicitárias realizadas em cada ano;
- indicar a razão do não diferimento desses encargos cm mais do que um exercício;
- e explicar os motivos das divergências verificadas na relação vendas à B..., S.A. com os encargos promocionais debitados pela mesma, uma vez que, por exemplo, em 2001, esses encargos representam cerca de 41,08%, enquanto que em 2002 apenas representam 6,96%.
No dia para o qual foi notificado, apenas foi apresentado um quadro onde aparecem discriminados por anos, desde 1998 a 2002, diversos valores, destacando-se os referentes a vendas liquidas, custo da mercadoria, investimentos em Trade, investimentos em Consumer, investimentos em Média e os valores dos reembolsos pagos pela B..., S.A. No entanto, não apresenta comprovativos desses valores apresentados no quadro. Os valores constantes desse quadro resumem-se no seguinte: (...)
Os valores constantes no quadro e referentes aos reembolsos são os valores que a sociedade Somngnum imputa todos os anos à A...como sendo comparticipação nas despesas promocionais de cada ano e conforme se pode visualizar estes reembolsos apresentam percentagens em relação às vendas líquidas ou ao custo dessas mercadorias muito díspares de ano para ano. Além de não apresentarem comprovativos desses valores referentes aos investimentos efectuados, para o exercício de 2002 apenas faz referência que se trata do Budget e para 2003 o quadro não faz qualquer referência. Por fim, também não apresentaram justificação para as percentagens tão díspares da imputação das despesas de marketing e a forma de cálculo desses reembolsos, não tendo sido possível, após várias tentativas de cálculo, encontrar os valores em causa.
Além deste quadro também apresentou uma carta da B..., S.A. para a A...Soc. Vitivinícola, Lda, datada de 13/02/2000, onde menciona no ponto n° 3 da mesma que "este tipo e valor de investimentos teria um prazo para realização de no mínimo 3 anos para obter efeitos sobre o mercado e os consumidores". Esta afirmação indica claramente que os encargos referentes aos investimentos em campanhas publicitárias, debitados pela B... à A..., se tratam de encargos de projecção económica plurianual e que deveriam ter sido considerados na A...como custos, em partes iguais, em mais do que um exercício, durante um período mínimo de três anos, conforme o disposto no art° 17°1 n° 4, al.d) do Decreto Regulamentar n° 2/90, de 12/01 e não serem considerados pelo valor total, tal como aconteceu.
Posteriormente, foi apresentado um contrato de distribuição exclusiva, datado de 31/12/1996, entre as 2 sociedades, onde s se encontram definidas as cláusulas do mesmo. Este contrato tem o seu início no dia 1 de Janeiro de 1997 e vigora por um período de um ano, sendo prorrogável por iguais períodos enquanto qualquer das partes o não denunciar. Neste contrato encontram-se definidas as cláusulas, em que as 2 partes se comprometem a cumprir, destacando-se, entre outras:
• A A...compromete-se a comparticipar nas despesas de marketing conforme for estabelecido anualmente entre ambas as partes (cláusula Segunda, n° l, al. d)).
• A B... com promete-se a apresentar à A..., no inicio de cada ano, estimativas de vendas, acções promocionais a efectuar e respectivos reembolsos, bem como os investimentos de marketing de cada produto, que deverão obter a concordância por escrito de ambas as partes. E ainda, no início de cada mês, apresentar um mapa estatístico das vendas efectivamente realizadas no mês imediatamente anterior (cláusula Segunda, n° 2,al. d)).
Este contrato apresenta ainda um anexo, onde se encontram estabelecidas as condições para dar cumprimento à al. d) do n° 2 da clausula Segunda, referente ao exercício de 1997, nomeadamente objectivos de vendas para 1997, preços de venda à B... em 1997, despesas de marketing em 1997 e a percentagem das despesas de marketing a imputar à A...e à B.... Este anexo contém ainda uma nota onde se menciona que a B... se compromete a apresentar trimestralmente as despesas efectuadas e emitirá a nota de débito correspondente a uma percentagem dos mesmos.
Perante este contrato de distribuição exclusiva, deparamo-nos com cláusulas que Comprometem ambas as sociedades c que mostram que a B... imputa anualmente despesas de marketing à A..., mas mediante algumas condições, conforme se encontram descritas anteriormente e conforme foi cumprido para o exercício de 1997, uma vez que neste ano existe um anexo ao contrato onde se encontram definidas estas condições.
Assim, os Avisos de lançamento debitados pela B... à A..., para que se considerassem como documentos emitidos sob a forma legal, deveriam especificar e quantificar essas despesas promocionais ou então ter um anexo ou remeter para outro documento que cumprisse as exigências legais, que deveria ser um documento onde se encontrassem expressas e devidamente comprovadas, tanto em quantidade como em valor, todos os investimentos efectuados em publicidade e marketing, e todas as outras componentes constantes do contrato de exclusividade apresentado pela empresa, no qual as 2 sociedades se comprometeram e se resumem essencialmente à cláusula segunda desse contrato.
Apesar do sujeito passivo ter sido notificado para apresentar os contratos celebrados com a B... e referentes às despesas de publicidade, a forma de cálculo dos valores contabilizados nos diversos anos. As campanhas publicitárias realizadas em cada ano, para indicar a razão do não diferimento desses encargos em mais do que um exercício c explicar os motivos das divergências verificadas na relação vendas à B..., S.A. com os encargos promocionais debitados, o mesmo não apresentou estes elementos. Em relação aos dados que nos foram disponibilizados verificam-se diversas incongruências, conforme se destacam as seguintes:
* Na carta apresentada da B..., S.A. para A...Soc. Vitivinícola, Lda, datada de 13/02/2000, é mencionado num dos parágrafos que a B... iria debitar 50% dos custos promocionais e de trade e 12,5% do total do custo da campanha, de publicidade. No entanto, aplicando essas percentagens aos valores anteriormente apresentados no quadro n° l resultaria um total de custos suportados pela Fiúza & Bright de € 52.350,88, no ano de 2000. Recordando, em 2000, o custo que foi imputado pela B... foi de € 59.556,47, verificando-se assim uma divergência entre estes 2 valores;
* A A...apresentou outra carta emitida pela B..., em 26/12/2000, em que menciona que esta última sociedade remete para a A...a nota de débito n° 187, no valor de 13.969.800$00, correspondente à comparticipação Fiúza nas despesas de marketing/publicidade durante 2000. Esta carta tem em anexo uma listagem onde constam, supostamente a descrição dos investimentos realizados pela B... no ano de 2000 e que se resumem aos seguintes valores: Consumer = 2.366.348$00, Média = 7.546.487$00 e Trade = 12.448.707$00. Conforme se consta estes valores divergem dos apresentados no quadro n° l e também não aparece evidenciado como é calculada a percentagem das despesas promocionais debitadas à Fiúza;
* Acresce ainda referir que apresentaram uma listagem de despesas onde, além de não se conseguir identificar essas despesas, existem anotações e cálculos manuscritos nos elementos fornecidos;
* Por fim, a Fiúza apresenta ainda outra carta da B..., datada de 07/01/2002, onde refere que esta última se compromete a enviar à Fiúza todos os justificativos relativamente às despesas promocionais de 2001. No entanto, a A..., não apresentou, nem à data da notificação, nem no decurso da acção inspectiva, esses justificativos. Além disso, é ainda referido nessa carta que a B... irá elaborar um plano de investimentos para 2002 que oportunamente será apesar apresentado à A...para aprovação. Este plano também não apresentado nesta acção de inspecção.
Por todos os factos anteriormente expostos, se conclui que os documentos referentes às despesas promocionais debitadas pela B... à A..., nos exercícios de 2000 a 2003, não respeitam os requisitos legais de forma prescritos no mo 35°, no 5, do CIVA, não conferindo deste modo direito à dedução do IVA mencionados nesses documentos, independentemente da efectiva realização das operações a que esses documentos se referem (cfr. art° 19°, n° 2 do CIVA).
Como se refere no Ac. de 17/2/99, do STA, Rec. 20593, «Embora a expressão "factura" surja com frequência nos textos legais, ao menos desde 1888, quando o Código Comercial incluiu um artigo (476°) sob a epígrafe "Factura e recibo", não existe na lei definição do que seja uma factura.
Mas a arrumação do artigo 476° do Código Comercial no título consagrado à compra e venda, e o teor da sua letra - "o vendedor não pode recusar ao comprador a factura das cousas vendidas e entregues" - logo permite concluir que se trata de um documento emitido pelo vendedor, destinado ao adquirente, que deve, ao menos, identificar os intervenientes e as mercadorias objecto de transacção».
É então bom de ver que, conforme o fim a que a destina o comprador, será necessário que a factura contenha mais ou menos elementos; na maioria dos casos, o preço das mercadorias será imprescindível; em muitos casos, não poderão faltar as condições de entrega e pagamento - etc., etc..
No caso concreto, a factura não se destina, só, ao uso do comprador, mas constitui um elemento essencial, também, para o fisco, pois é o documento demonstrativo das operações sobre que incide o imposto. Assim, fácil é entender que a factura válida para efeito de IVA terá de identificar do modo mais completo possível os comprador e vendedor, as mercadorias, o preço, e a data da transacção. Trata-se de elementos todos eles relevantes para permitir identificar a operação de modo bastante para que possam extrair-se as devidas consequências quanto ao imposto (sua incidência, sujeitos, taxa, cobrança, reembolsos, etc.). A falta de algum destes elementos pode pôr em risco o mecanismo concebido com o objectivo de arrecadar o imposto.
Natural é, pois, que o legislador tenha entendido que, para que o sistema, aliás, complexo, do IVA, possa funcionar, para facilitar o controlo das operações sujeitas e isentas, e para obstar à evasão fiscal, se tornava necessária, não apenas a emissão de facturas ou documentos equivalentes, na forma que entendesse cada um dos intervenientes, mas a sua emissão com um conteúdo e rigor definidos pela lei. Daí a exigência de uma forma legal.»
O certo é que a norma do artigo 19° do CIVA não nos esclarece sobre qual é a "forma legal" que exige. Mas o diploma diz-nos, adiante, nas várias alíneas do n° 5 do artigo 35°, que as facturas ou documentos equivalentes devem ser datados, numerados sequencialmente e conter os nomes, firmas ou denominações sociais e a sede ou domicílio do fornecedor de bens ou prestador de serviços e do destinatário ou adquirente, bem como os correspondentes números de identificação fiscal dos sujeitos passivos de imposto; conter a quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos elementos necessários à determinação da taxa aplicável; conter o preço, líquido de imposto, e os outros elementos incluídos no valor tributável; e conter as taxas aplicáveis e o montante de imposto devido.
Daqui resulta, pois, que, para o CIVA, uma factura passada em forma legal é a que respeite o estatuído no seu artigo 35°, ou seja, que para tal efeito, a factura que não respeite todas estas exigências não é uma factura passada em forma legal.
Neste conspecto, nem pode dizer-se que este artº 35º permite distinguir entre falta de forma legal e falta de elementos meramente acessórios, não essenciais, que só podem levar ao suprimento da falta.
É que, o legislador estabeleceu, no artigo 19° n° 2 do CIVA, duas condições para a dedução do imposto: que ele esteja mencionado em factura ou documento equivalente e que essa factura ou documento equivalente esteja "em forma legal".
Ora, a forma legal, já se viu, é a do artigo 35° n° 5. Como também se expende no citado acórdão acima «Não se vêm elementos que permitam ao intérprete separar, de entre as exigências da norma, as essenciais das acessórios. A "forma legal" é a que satisfaça todas as imposições da norma legal que as indica».
Assim sendo, a factura ou documento equivalente que não respeite integralmente o artigo 35° n° 5 do CIVA não está passada "em forma legal" e, consequentemente, não permite deduzir o respectivo imposto.
No caso que nos ocupa, nas facturas em causa não se mostram cumpridas as exigências formais contidas nas als. b) e c) do citado nº 5 do art. 35º do CIVA, como clara e irrefutavelmente demonstrou a AT conforme transcrição acima do pertinente bloco fundamentador constante do relatório inspectivo.
Refira-se, ainda, que nem sequer estamos perante caso a que seja aplicável o regime do art. 38º do CIVA, nem perante caso em que o contribuinte possa processar facturas globais, comunicando previamente o facto à DGCI.
Acresce que, não obstante a prova testemunhal produzida nos autos, os depoimentos não podem substituir as indicações que a lei impõe sejam discriminadas na própria factura: para efeitos de IVA só confere direito a dedução o imposto mencionado em facturas e documentos equivalentes passados em forma legal e, como assim, por mais apropriados que sejam outros métodos, dado que o legislador só conferiu o direito à dedução do imposto mencionado em facturas e documentos equivalentes, estes têm que ser necessariamente os processados pelos vendedores (cfr. Ac. de 20/1/93, da 2ª Secção do STA, in RLJurisprudência nº 3835, p. 291).
E a expressão "quantidade e denominação usual dos bens transmitidos ou dos serviços prestados, com especificação dos bens necessários à determinação da taxa aplicável" tem como finalidade permitir quer ao cliente quer à AF controlarem se a taxa incidente sobre o valor tributável é a correcta. Por isso, porque a exigência de tais documentos assim apercebidos tem também esta finalidade de apetrechar a entidade pública (AF) do controlo da situação tributária, e não somente a de obter prova segura dos factos a controlar, os mesmos são formalidades substanciais, que não meramente probatórias, e, como tal, insubstituíveis por qualquer outro género de prova, como decorre do art. 364º do C. Civil (cfr. ac. do STA, de 27/9/2000, rec. 25033).
No IVA e na medida em que a factura ou documento equivalente constitui como que um cheque sobre o Estado o legislador adoptou medidas apertadas para evitar a fraude fiscal.
O artigo 35.° n.° 5 do CIVA exige determinados formalismos (formalidades "ad substantiam" cujo incumprimento acarreta a invalidade destes documentos) que a recorrente não cumpriu.
Assim, a factura só pode, em qualquer caso, conferir direito à dedução do imposto nela liquidado se, à partida, estiver emitida na forma legal. Portanto, em relação a factura não emitida na forma legal, não aproveita ao contribuinte a prova de que a operação titulada se verificou na realidade ou que se verifica dúvida fundada acerca do facto tributário respectivo, se igualmente não fizer a prova de que o requisito formal está preenchido, pois que, para efeitos daquela dedução este é pressuposto quer da factura que documenta uma operação real quer da que documenta uma operação pretensamente simulada.
Concluindo-se, pois, que as facturas questionadas (e por cuja não aceitação - por parte da AF - da dedução do IVA nelas mencionado foram feitas as liquidações adicionais impugnadas) não estão passadas na forma legal, tal como a impõe o art. 35º do CIVA e sendo certo que as ditas liquidações foram feitas também porque a AF apurou este facto (como consta do respectivo relatório da fiscalização), a sentença recorrida decidiu de acordo com a lei ao não aceitar a regularidade de tais facturas e a legalidade da dedução do imposto nelas mencionado.
Improcedem, por isso, as conclusões do recurso sob análise, o que o mesmo é dizer que não se verifica a falta de julgamento e de fixação de matéria de facto pois ao probatório da sentença foi levada a matéria de facto indispensável à decisão.
*
Vejamos agora se a sentença incorreu em erro de julgamento sobre a interpretação e aplicação do art. 15.°, n.°1 do RCPIT em virtude da inexistência de despacho modificador da extensão do procedimento.
A recorrente funda tal vício na inexistência de despacho modificador da extensão do procedimento, o que traduz a preterição de formalidade legal essencial, isso porque a inspecção tinha por objecto "constatar o não regular apuramento das operações de circulação em regime de suspensão de IABA e também em sede de IVA", e, afina, as correcções não decorrem do mencionado âmbito da inspecção, pois referem-se à não aceitação da dedução do IVA mencionado nas facturas por alegada desconformidade das mesmas, para efeitos do disposto na alínea b) do n.° 5 do artigo 35° do CIVA. E, por assim ser, deveria a AT abrir um novo procedimento inspectivo, para proceder às correcções que efectuou.
Ora, tal como se esclarece no relatório final da inspecção, «A visita de fiscalização a este sujeito passivo, surge no seguimento de uma Proposta de Verificação (...), em que se constatou o não regular apuramento das operações de circulação em regime de suspensão de IABA e também em sede de IVA.», acrescentando que «Sendo o objectivo principal desta acção a verificação de situações denunciadas (...), com vista ao enquadramento legal dos factos referidos nessa participação».
Do excerto do relatório acabado de transcrever, resulta que a há convergência entre o ponto de vista da impugnante e o do signatário que do relatório quanto ao âmbito e extensão da inspecção, já que este, como certeiramente refere o Mº Juiz, reconhece que a inspecção tinha por objectivo inicial a verificação das situações denunciadas.
Posto é saber se o extravasar do âmbito fixado à inspecção configura um vício determinante da anulação dos actos tributários subsequentes.
E no dissídio, inclinamo-nos para a solução definida na sentença recorrida arrimando-se à jurisprudência que dimana do Acórdão do TCAN de 03-05-2007, proferido no recurso n.° 01652/07, segundo a qual aquele vício apenas se poderá reconduzir a mera irregularidade, com eventuais efeitos administrativos, como seja ao nível disciplinar, sem contender, só por si, com a legalidade das posteriores liquidações.
Nesse sentido, cumpre chamar à colação o disposto no artº 63º da LGT que, versando sobre a "Inspecção", estabelece que «os órgãos competentes podem, nos termos da lei, desenvolver todas as diligências necessárias ao apuramento da situação tributária dos contribuintes, (...)» (nº 1), precisando que «O procedimento da inspecção e os deveres de cooperação são os adequados e proporcionais aos objectivos a prosseguir, só podendo haver mais de um procedimento externo de fiscalização respeitante ao mesmo sujeito passivo ou obrigado tributário, imposto e período de tributação mediante decisão, fundamentada com base em factos novos, do dirigente máximo do serviço, salvo se a fiscalização visar apenas a confirmação dos pressupostos de direitos que o contribuinte invoque perante a administração tributária e sem prejuízo do apuramento da situação tributária do sujeito passivo por meio de inspecção ou inspecções dirigidas a terceiros com quem mantenha relações económicas» (nº3).
Decorre deste inciso legal que apenas para os casos de novo procedimento externo, a lei exige um despacho especialmente qualificado do ponto de vista da sua fundamentação, tendo em vista garantir ao contribuinte não poder ser inspeccionado diversas vezes quanto aos mesmos factos tributários já existentes à data da 1.a inspecção realizada, bem como, ao mesmo tempo, contribuir para a estabilização das relações jurídico -tributárias.
E, como é manifesto, não foi o que ocorreu no caso sub judice, em que se tratou, pura e simples, de dentro do imposto e exercícios previamente determinados, averiguar a regularidade das deduções de IVA efectuadas pelo sujeito passivo.
Donde que, entendemos que a melhor hermenêutica sobre a questão em análise é a sustentada na sentença recorrida, que inteiramente se sufraga e se capta do seguinte segmento da fundamentação jurídica:
“O Regulamento da Inspecção Tributária aprovado pelo DL n.° 413/98, de 31 de Dezembro (RCPIT), no seu Capítulo III, sob a epígrafe, "Classificações do procedimento de inspecção tributária", vem dispor no seu Art.° 15.° n.° 1 que, «os fins e a extensão do procedimento de inspecção podem ser alterados durante a sua execução mediante despacho fundamentado da entidade que o tiver ordenado.» No caso, as ordens de serviço para a inspecção foram emitidas pela Direcção de Finanças de Santarém e o Chefe de Divisão, no uso de poderes delegados do Director de Finanças, veio concordar com o relatório da mesma inspecção, pelo que assim foi tal relatório sancionado.
(…)
Por outro lado, como expressamente se diz no preâmbulo do diploma que aprovou o RCPIT «A natureza do presente diploma é essencialmente regulamentadora, não se pretendendo alterar os actuais poderes e faculdades da inspecção tributária em os deveres dos sujeitos e demais obrigados tributários que se mantém integralmente em vigor.»
Ou seja, para que tal falta de autorização para prosseguimento da inspecção para averiguação da regularidade das deduções de IVA redundasse em vício invalidante da posterior liquidação operada, o mesmo teria que estar previsto no regime da LGT ou em outro diploma de igual categoria formal, que não neste diploma da carácter essencialmente regulamentador, como nele se diz, sem pretensões de alterar os poderes e faculdades da inspecção tributária.
Como é sabido, nem toda a preterição à forma legalmente prescrita para o acto a praticar, produz vício de forma invalidante, a não ser em dois casos: quando se trate duma formalidade absolutamente essencial ou quando se trate de uma formalidade relativamente essencial e o interesse que ela se destinava a garantir não aparece realizado por qualquer outra via.
No caso, não se tratando de formalidade absolutamente essencial, os fins e extensão da inspecção foram notificados ao contribuinte (fls. 94) que com tal anunciar ao contribuinte da extensão do âmbito da inspecção, pelo que a formalidade foi atingida por outra forma, sendo que, pelo menos em sede do direito de audição, que a impugnante não alega não ter ocorrido, esta tomou conhecimento do efectivo âmbito e extensão da acção inspectiva, pelo que tal falta se tem de considerar sanada ou degradada em formalidade não essencial, na marcha do procedimento de inspecção.
Termos em que também improcede este fundamento de recurso nos termos supra transcritos.
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4. – Pelo exposto, acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em, negando provimento ao recurso, confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrente.
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Lisboa, 26/10/2010
(Gomes Correia)
(Pereira Gameiro)
(Lucas Martins)