Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:09828/16
Secção:CT
Data do Acordão:11/24/2016
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:OMISSÃO DE PRONÚNCIA (VÍCIO DE “PETITIONEM BREVIS”).
ARTº.615, Nº.1, AL.D), DO C.P.CIVIL. ARTº.125, Nº.1, DO C.P.P.TRIBUTÁRIO.
NULIDADE DA SENTENÇA DEVIDO A FALTA DE ESPECIFICAÇÃO DOS FUNDAMENTOS DE FACTO E DE DIREITO.
ARTº.615, Nº.1, AL.B), DO C.P.CIVIL. ARTº.125, Nº.1, DO C.P.P.TRIBUTÁRIO.
NOÇÃO DE COMPETÊNCIA.
VÍCIO DE INCOMPETÊNCIA.
RATIFICAÇÃO-SANAÇÃO.
ACTOS DE DELEGAÇÃO E SUBDELEGAÇÃO DE PODERES.
SUJEITOS A PUBLICAÇÃO NO DIÁRIO DA REPÚBLICA.
INEFICÁCIA. ANULÁVEIS POR INCOMPETÊNCIA.
NATUREZA RECEPTÍCIA DO ACTO TRIBUTÁRIO.
NOTIFICAÇÃO COMO SIMPLES CONDIÇÃO DE EFICÁCIA DO ACTO TRIBUTÁRIO.
A FUNDAMENTAÇÃO DO ACTO ADMINISTRATIVO É QUESTÃO DIFERENTE DA NOTIFICAÇÃO DA FUNDAMENTAÇÃO.
I.R.C.
NOÇÃO DE CUSTOS.
Sumário:1. A omissão de pronúncia (vício de “petitionem brevis”) pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes (cfr.artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil).
2. No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, no penúltimo segmento da norma.
3. Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.b), do C.P.Civil, é nula a sentença quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Para que a sentença padeça do vício que consubstancia esta nulidade é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outras palavras, o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. Já a mera insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, podendo afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, mas não produz nulidade. Igualmente não sendo a eventual falta de exame crítico da prova produzida (cfr.artº.607, nº.4, do C.P.Civil) que preenche a nulidade sob apreciação. No processo judicial tributário o vício de não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário.
4. A competência é conceptualizada como um conjunto de poderes funcionais que a lei confere a um órgão para a prossecução das atribuições da pessoa colectiva pública que integra, assumindo-se como a pedra basilar e de vanguarda do princípio geral da legalidade administrativa. Em consequência, a competência só pode ser definida por lei ou regulamento, sendo imodificável, irrenunciável e inalienável (artº.29, C.P.Administrativo, então em vigor). Não obstante, a crescente flexibilidade da actividade administrativa, fruto da subsidiariedade da actuação dos poderes públicos na sociedade, tem determinado o legislador na adopção de cláusulas gerais de delegação de poderes, afastando um modelo rígido, fechado e inflexível de ordenação da competência de um órgão. Nesse sentido, o C. P. Administrativo institui, no seu artº.35, uma genérica delegabilidade de poderes, confiando nas mãos dos órgãos administrativos a concreta definição de quais, dentro da habilitação legal, gozam de determinada competência. No universo normativo tributário, tal cláusula geral encontra-se prevista no artº.62, da L.G.Tributária.
5. A incompetência pode definir-se como o vício que consiste na prática, por um órgão da Administração, de um acto incluído nas atribuições ou na competência de outro órgão.
6. Perante a prática de um acto administrativo por órgão desprovido de competência para tal, pode o titular do órgão competente promover a sua ratificação-sanação, acto administrativo secundário destinado à sanação do vício gerador da ilegalidade do acto administrativo principal.
7. Nos termos do artº.37, nº.2, do C.P.A., os actos de delegação e subdelegação de poderes estão sujeitos a publicação no Diário da República. Sendo que, face ao disposto no artº.130, nº.2, do mesmo diploma legal, a falta de publicidade do acto, quando legalmente exigida, implica a sua ineficácia. Assim, a falta de publicação dos actos de delegação de poderes não gera a sua invalidade mas, antes, mera ineficácia jurídica, sanável por posterior publicação.
8. No entanto, enquanto ineficaz, o despacho de delegação de competências não produz quaisquer efeitos jurídicos. Ou seja, os actos praticados ao abrigo de uma tal delegação ou subdelegação devem ser considerados como se a delegação pura e simplesmente não existisse, dado que a publicação marca o início de produção de efeitos do acto. Pelo que, à luz dos princípios gerais aplicáveis aos actos administrativos, terá de se concluir que os actos do delegado ou subdelegado, no caso de faltar a publicação da delegação ou subdelegação, são anuláveis, por incompetência (cfr.artº.135, do C.P.A., então em vigor).
9. A natureza receptícia do acto tributário, enquanto acto administrativo, deve hoje ter-se como perspectiva devidamente sedimentada pela doutrina e jurisprudência, configurando-se a notificação como requisito de perfeição do acto tributário de liquidação.
10. No entanto, a notificação não é um elemento intrínseco do acto tributário e, portanto, não é um requisito da sua validade, mas simples condição da sua eficácia, aliás, suprível por outras formas de conhecimento (cfr.artº.67, nº.1, do C.P.A., então em vigor).
11. Deve fazer-se a destrinça entre a fundamentação do acto administrativo e, questão diferente, a notificação da fundamentação, realidades diversas, apenas a primeira constituindo vício de forma determinante da eventual anulabilidade do acto tributário. A mera falta de notificação da fundamentação de um acto de liquidação não gera a invalidade deste, antes dando direito ao sujeito passivo de requerer a notificação da fundamentação ou a passagem de certidão que a contenha (cfr.artº.37, do C.P.P.Tributário).
12. Para o conceito fiscal de custo vale a definição constante do aludido artº.23, do C.I.R.C., a qual, depois de nos transmitir, de uma forma ampla, a noção de custos ou perdas como englobando todas as despesas efectuadas pela empresa que, comprovadamente, sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva, procede a uma enumeração meramente exemplificativa de várias despesas deste tipo. Estamos perante um conceito de custo que se pode considerar comum ao balanço fiscal e ao balanço comercial. A definição fiscal de custo, como conceito mais amplo do que sejam os custos de produção e de aquisição, parte de uma perspectiva ampla de actividade e de necessidade da empresa, assim estabelecendo uma conexão objectiva entre a actividade desta e as despesas que, inevitavelmente, daqui decorrerão. E fá-lo com uma finalidade claramente fiscal, a qual consiste em distinguir entre custos que podem ser aceites para fins fiscais e que, por isso, vão influenciar o cálculo do lucro tributável e os que não podem ser aceites para tal efeito. Os custos ou perdas da empresa constituem, portanto, os elementos negativos da conta de resultados, os quais são dedutíveis do ponto de vista fiscal quando, estando devidamente comprovados, forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva da empresa em causa. A ausência de qualquer destes requisitos implica a não consideração dos referidos elementos como custos, assim devendo os respectivos montantes ser adicionados ao resultado contabilístico.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
"S..., L.DA.", com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do T.A.F. de Leiria, exarada a fls.380 a 392 do presente processo, através da qual julgou improcedente a impugnação deduzida pelo recorrente visando acto de liquidação oficiosa de I.R.C. e juros compensatórios, relativo ao exercício de 2006 e no montante total de € 62.620,70.
X
O recorrente termina as alegações (cfr.fls.413 a 432 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-Conforme consta dos autos, a recorrente apresentou a sua petição inicial, nos termos do disposto no artigo 102º e seguintes do CPPT “ex vi” artigos 92º, nº 8 e 95º e seguintes da LGT, alegando o que acima se transcreveu;
2-A recorrida apresentou contestação alegando o que consta de fls.;
3-Por Sentença de fls., a Meretíssima Juiz decidiu o acima transcrito;
4-Da anulabilidade da decisão por delegação de poderes, estamos aqui perante 2 realidades diferentes, ou seja: o nº 1 do artigo 134º do CPA diz-nos que os atos nulos não produzem quaisquer efeitos jurídicos. Por sua vez os atos anuláveis dependem de decisão de anulação;
5-Na página 24 da sentença se diz: Assim se concluindo pela inexistência de qualquer vício que afete a validade do despacho de concordância com as conclusões finais do relatório de inspeção.;
6-A sentença entre as linhas 1 e 3 da página 24 da sentença em recurso diz-nos que a sanação da falta de publicação foi feita com a publicação em 12.10.2010;
7-Tendo em conta a parte final do nº 1 do artigo 35º do CPA determina precisamente: …permitir que outro órgão ou agente pratique atos administrativos sobre a matéria;
8-O despacho a que se refere a sentença não os refere como vamos ver: DR II_série nº 198 12.10.2010» 2- Nos chefes de divisão 2.2 A prática de todos os atos que, não possam deixar de ser praticados uma vez verificados os pressupostos de facto;
9-Não estão preenchidas as condições determinantes, quer no nº 1 do artigo 35º quer no nº 1 do artigo 37º, ambos do CPA, e como tal a delegação de competências para o caso em concreto, não se verifica, e estão todos os atos subsequentes feridos de ilegalidade, e como tal devem ser anulados;
10-Quanto ao próprio ato de notificação mas o que nos diz a notificação para pagamento: ‘A demonstração e a correspondente nota de cobrança seguem em envelope separado’;
11-Esse ou esses envelopes em separado nunca foram recebidos pelo contribuinte;
12-O que está aqui em causa, e que é a nossa forma de pedir, é que a notificação não foi validamente notificada, por falta de elementos essenciais;
13-Entendemos, pois, que a liquidação não foi validamente notificada, e como tal a eficácia da notificação não se verificou;
14-Quanto ao período em que se verificou o ato tributário, o relatório do serviço de inspeção tributaria, faz demonstrações que não concretiza, como sendo o momento em que os rendimentos foram obtidos; quem foi o beneficiário dos rendimentos adicionais; referindo que os cheques foram depositados na conta tal ou tal, nunca refere a quem pertence tal conta;
15-Como se disse na p.i. os rendimentos referentes às escrituras públicas, e que aí foram declarados, foram-no em 2005 e em 2007, e não em 2006;
16-O que está em causa é a contabilização dos rendimentos, e não o momento em que eles são recebidos, como nos diz o nº 1 do art.º 18º do CIRC;
17-Os valores referidos enquanto acréscimo, e que são objeto deste recurso, não constituíram acervo da sociedade, e isso nunca consta do relatório do serviço de inspeção tributária, e só por isso também não foram contabilizados na empresa;
18-Pelo que vem dito, entendemos que a sentença de que se recorre errou na sua interpretação do nosso pedido, e que se limitou a reproduzir, erradamente, o branqueamento feito pela representação da Fazenda Pública;
19-O despacho de fixação do rendimento coletável é ilegal por que proferido por pessoa que não tinha competência para o efeito, até por que a delegação de competências não lhe permitia tal competência, a notificação não foi validamente notificada ao contribuinte e os rendimentos atribuídos à sociedade não constituíram acervo da sociedade e em lado algum do relatório do serviço de inspeção tributário se determina que tais rendimentos foram auferidos pela sociedade;
20-Dúvidas não existem de que estamos perante uma ilegalidade insanável, violando-se nesta parte o disposto nas alíneas a), c) e d) do artigo 120º do Código do Processo Tributário, e artigo 77º da LGT;
21-O interesse da recorrente é legalmente protegido, o que faz com que a decisão recorrida, seja inconstitucional;
22-A decisão que deu causa a este recurso, não está fundamentada como exigem as normas referidas, tendo por esse facto de ser revogada, nulidade, esta, que aqui, mais uma vez, se requer;
23-Daí dúvidas não existirem de que terá de ser revogada a decisão recorrida, aliás, conforme acima já se referiu;
24-O (Venerando Tribunal) com a decisão recorrida, não assegurou a defesa dos direitos da alegante, ao não fundamentar exaustivamente a sua decisão, e nem se quer aplicar as normas legais aplicáveis ao caso em concreto;
25-Deixando o Venerando Juiz do Tribunal a quo de se pronunciar sobre algumas questões que são essenciais à boa decisão da causa, nomeadamente as acima expostas, cometeu, pois, uma nulidade;
26-A sentença recorrida viola:
a)O disposto nos artigos 77º, da LGT;
b)O disposto nos artigos 120º, alíneas a), c) e d) do CPT;
c)O disposto nos artigos 37º e seguintes da CPPT;
d)O disposto nos artigos 35º, nº 1, al.a), 37º, nº 1 e 134º, nº1 do CPA;
e)O disposto nas alíneas b), c) e d) do atual 615º do CPC;
f)Artigo 18º, nº 1, do CIRC;
g)O disposto no Decreto-Lei nº 256-A/77, de 17 de Junho;
h)O disposto nos artigos 13º, 20º, 202º, 204º, 205º, 266º, nº 2 e 268º, números 1, 2 e 3 da CRP;
27-Termos em que, nos melhores de direito, e com o sempre mui douto suprimento de V. Exas., deve a sentença recorrida ser revogada, e consequentemente ser anulada a liquidação, por ilegalidade, por ser de Lei, Direito, e Justiça.
X
Não foram produzidas contra-alegações.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do não provimento do presente recurso (cfr.fls.445 e 446 dos autos).
X
Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para deliberação.
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FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.381 a 388 dos autos):
1-A sociedade impugnante, "S..., L.da.", com o n.i.p.c. …, foi constituída no ano de 2003, desenvolve a actividade de "construção de edifícios (residenciais e não residenciais)" a que corresponde a CAE 041200, estando enquadrada no regime geral de tributação em sede de IRC até 31/12/2008, data em que passou a estar no Regime Geral de determinação do lucro tributável por imposição legal (cfr.cópia do relatório de inspecção junta a fls.160 a 204 dos presentes autos);
2-Em 20/5/2009 foi iniciada uma acção inspectiva externa à impugnante, com base na Ordem de Serviço n.º …, com âmbito geral e respeitante aos anos de 2005, 2006 e 2007, da qual resultou o relatório de inspecção tributária constante de fls.160 a 204 dos autos e dos anexos 1 a 14, constantes de fls.205 a 308 dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido e do qual consta, além do mais, o seguinte:
"(…)

(…)

(…)

“versão integral disponível no original”

(…)"

3-Em 12/11/2009, o Chefe de Divisão, por delegação do Director de Finanças emitiu o despacho constante de fls.107 dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido, no qual foi autorizada a ampliação por três meses do procedimento inspectivo identificado no ponto anterior;
4-O despacho de prorrogação da acção inspectiva descrito no ponto anterior foi comunicado à impugnante através do ofício n.º 7901, de 13/11/2009, com registo postal de 16/11/2009 (cfr.documentos juntos a fls.106 a 109 dos presentes autos);
5-Em 5/1/2010, a Direcção de Finanças de ..., emitiu o ofício n.º 28, dirigido à impugnante com o assunto “PROJECTO RELATÓRIO DA INSPECÇÃO TRIBUTÁRIA – ART. 60.º DO REGIME COMPLEMENTAR DO PROCEDIMNETO DE INSPECÇÃO TRIBUTÁRIA ( RCPIT)” enviado ao sujeito passivo por carta registada, tudo conforme documentos juntos a fls.154 a 156 dos presentes autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido;
6-Em 22/01/2010 a impugnante exerceu o direito de audição prévia nos termos constantes de fls.33 a 42 dos presentes autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido;
7-Em 3/2/2010, o Chefe de Divisão, no âmbito da delegação de competências do Director de Finanças, proferiu o despacho de concordância com o relatório final descrito no nº.2, nos termos constantes de fls.160 e 161 dos presentes autos;
8-Em 3/2/2010, a Direcção de Finanças de ... enviou à impugnante por carta registada com o n.º RM …, o ofício n.º 1103/DITI, constante de fls. 328 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, através do qual dá conhecimento à ora impugnante do teor do relatório de inspecção e do despacho que sobre o mesmo recaiu (cfr.documentos juntos a fls.328 a 330 dos presentes autos);
9-Em 10/3/2010, a Direcção Geral dos Impostos procedeu à emissão e envio em nome da impugnante, da liquidação de IRC n.º …, relativa ao ano de 2006, respectiva demonstração de acerto de contas, no valor total de EUR 62.620,70, tal como a demonstração da liquidação de juros n.º…, tudo conforme documentos juntos a fls.29 a 31 dos presentes autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido;
10-A liquidação de juros relativa ao capital liquidado nos termos do ponto que antecede com o n.º … no valor de EUR 6.039,46 respeita ao período de cálculo de 1/6/2007 a 20/1/2010, a uma taxa de 4% (cfr.demonstração da liquidação de juros junta a fls.31 dos presentes autos).

X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Nada mais foi provado com interesse para a decisão em causa, atenta a causa de pedir…”.
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Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais constantes dos autos, e especificados nos vários pontos da matéria de facto provada…”.
X
Levando em consideração que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa igualmente relevante para a decisão do recurso e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.662, nº.1, do C.P.Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário):
11-O despacho identificado no nº.7 do probatório, foi praticado ao abrigo de delegação de competências expressamente mencionada no mesmo, efectuada pelo Director de Finanças de ..., cuja publicação em D.R. ocorreu 12/10/2010, II série, reportando os efeitos ao dia 1/1/2010 e ratificando os actos entretanto praticados, entre os actos cuja delegação ocorreu se encontrando a fixação dos prazos para a audição prévia e dos actos subsequentes até à conclusão do procedimento gracioso (cfr.documento junto a fls.310 a 313 dos presentes autos).
X
ENQUADRAMENTO JURÍDICO
X
Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida decidiu, em síntese, julgar improcedente a presente impugnação, em virtude do decaimento de todos os seus fundamentos, e, em consequência, manter a liquidação de I.R.C. e juros compensatórios objecto do presente processo (cfr.nº.9 do probatório).
X
Antes de mais, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O apelante discorda do decidido aduzindo, em primeiro lugar, que a sentença recorrida deixou de se pronunciar sobre questões que devia apreciar, nomeadamente, as já alegadas nesta peça processual (cfr.conclusão 25 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar, supomos, uma nulidade por omissão de pronúncia da decisão recorrida.
Examinemos se o presente processo enferma de tal vício.
A sentença é uma decisão judicial proferida pelos Tribunais no exercício da sua função jurisdicional que, no caso posto à sua apreciação, dirimem um conflito de interesses públicos e privados no âmbito das relações jurídicas administrativo-tributárias. Tem por obrigação conhecer do pedido e da causa de pedir, ditando o direito para o caso concreto. Esta peça processual pode padecer de vícios de duas ordens, os quais obstam à eficácia ou validade da dicção do direito:
1-Por um lado, pode ter errado no julgamento dos factos e do direito e então a consequência é a sua revogação;
2-Por outro, como acto jurisdicional, pode ter atentado contra as regras próprias da sua elaboração ou contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada e, então, torna-se passível de nulidade, nos termos do artº.615, do C.P.Civil.
Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.d), do C.P.Civil, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento. Decorre de tal norma que o vício que afecta a decisão advém de uma omissão (1º. segmento da norma) ou de um excesso de pronúncia (2º. segmento da norma). Na verdade, é sabido que essa causa de nulidade se traduz no incumprimento, por parte do julgador, do poder/dever prescrito no artº.608, nº.2, do mesmo diploma, o qual consiste, por um lado, no resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e, por outro, de só conhecer de questões que tenham sido suscitadas pelas partes (salvo aquelas de que a lei lhe permite conhecer oficiosamente). Ora, como se infere do que já deixámos expresso, a omissão de pronúncia pressupõe que o julgador deixa de apreciar alguma questão que lhe foi colocada pelas partes. Por outras palavras, haverá omissão de pronúncia, sempre que a causa do julgado não se identifique com a causa de pedir ou o julgado não coincida com o pedido. Pelo que deve considerar-se nula, por vício de “petitionem brevis”, a sentença em que o Juiz invoca, como razão de decidir, um título, ou uma causa ou facto jurídico, essencialmente diverso daquele que a parte colocou na base (causa de pedir) das suas conclusões (pedido). No entanto, uma coisa é a causa de pedir, outra os motivos, as razões de que a parte se serve para sustentar a mesma causa de pedir. E nem sempre é fácil fazer a destrinça entre uma coisa e outra. Com base neste raciocínio lógico, a doutrina e a jurisprudência distinguem por uma lado, “questões” e, por outro, “razões” ou “argumentos” para concluir que só a falta de apreciação das primeiras (ou seja, das “questões”) integra a nulidade prevista no citado normativo, mas já não a mera falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados para concluir sobre as questões (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.53 a 56 e 142 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.690; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.37).
No processo judicial tributário o vício de omissão de pronúncia, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, no penúltimo segmento da norma (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, I volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2006, pág.911 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.50/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 1/3/2011, proc.2442/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/5/2011, proc.4629/11).
Mais se dirá que a sentença nula é a que está inquinada por vícios de actividade (erros de construção ou formação), os quais devem ser contrapostos aos vícios de julgamento (erros de julgamento de facto ou de direito). A nulidade da sentença em causa reveste a natureza de uma nulidade sanável ou relativa (por contraposição às nulidades insanáveis ou absolutas), sendo que a sanação de tais vícios de actividade se opera, desde logo, com o trânsito em julgado da decisão judicial em causa, quando não for deduzido recurso (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 3/10/2013, proc.6608/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/12/2013, proc.7119/13; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.122 e seg.).
Trata-se, em qualquer caso, nesta nulidade, de falta de pronúncia sobre questões e não de falta de realização de diligências instrutórias ou de falta de avaliação de provas que poderiam ter sido apreciadas. A falta de realização de diligências constituirá uma nulidade processual e não uma nulidade de sentença. A falta de avaliação de provas produzidas, tal como a sua errada avaliação, constituirá um erro de julgamento da matéria de facto. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e referir se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P. Tributário).
Ainda, a nulidade de omissão de pronúncia impõe ao juiz o dever de conhecer de todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Se o Tribunal entende que o conhecimento de uma questão está prejudicado e o declara expressamente, poderá haver erro de julgamento, se for errado o entendimento em que se baseia esse não conhecimento, mas não nulidade por omissão de pronúncia.
Por último, embora o Tribunal tenha também dever de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso não suscitadas pelas partes (cfr.artº.608, nº.2, do C.P.Civil), a omissão de tal dever não constituirá nulidade da sentença, mas sim um erro de julgamento. Com efeito, nestes casos, a omissão de pronúncia sobre questões de conhecimento oficioso deve significar que o Tribunal entendeu, implicitamente, que a solução das mesmas não é relevante para a apreciação da causa. Se esta posição for errada, haverá um erro de julgamento. Se o não for, não haverá erro de julgamento, nem se justificaria, naturalmente, que fosse declarada a existência de uma nulidade para o Tribunal ser obrigado a tomar posição explícita sobre uma questão irrelevante para a decisão. Aliás, nem seria razoável que se impusesse ao Tribunal a tarefa inútil de apreciar explicitamente cada uma das questões legalmente qualificadas como de conhecimento oficioso sobre as quais não se suscita controvérsia no caso concreto, o que ressalta, desde logo, da dimensão da lista de excepções dilatórias de conhecimento oficioso (cfr.artºs.577 e 578, do C.P.Civil), e da apreciável quantidade de vícios geradores de nulidade contida no artº.133, nº.2, do C.P.Administrativo (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 28/5/2003, rec.1757/02; ac.T.C.A.Sul-2.ªSecção, 25/8/2008, proc.2569/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 18/9/2012, proc.3171/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/12/2013, proc.7119/13; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.365).
Revertendo ao caso dos autos, do exame da decisão do Tribunal “a quo”, principalmente do seu enquadramento jurídico (cfr.fls.388-verso a 392 dos autos), deve concluir-se que foram analisadas e decididas as causas de pedir (questões) estruturadas pelo recorrente na p.i. do presente processo (cfr.articulado junto a fls.4 a 27 dos autos), não se vislumbrando qualquer omissão de pronúncia, sendo que o próprio apelante também não materializa quais as questões que, concretamente, deixaram de ser apreciadas, tudo levando em consideração o articulado inicial deste processo.
Atento o acabado de mencionar, não se vê que a sentença recorrida tenha omitido pronúncia e, nestes termos, improcedendo este fundamento do recurso.
Mais alega o recorrente que a decisão que deu causa a este recurso não está fundamentada (cfr.conclusões 22 e 24 do recurso), com base em tal alegação pretendendo consubstanciar, segundo entendemos, a nulidade da sentença devido a falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
Nos termos do preceituado no citado artº.615, nº.1, al.b), do C.P.Civil, é nula a sentença, além do mais, quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Para que a sentença padeça do vício que consubstancia esta nulidade é necessário que a falta de fundamentação seja absoluta, não bastando que a justificação da decisão se mostre deficiente, incompleta ou não convincente. Por outras palavras, o que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação, tanto de facto, como de direito. Já a mera insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, podendo afectar o valor doutrinal da sentença, sujeitando-a ao risco de ser revogada em recurso, mas não produz nulidade. Igualmente não sendo a eventual falta de exame crítico da prova produzida (cfr.artº.607, nº.4, do C.P.Civil) que preenche a nulidade sob apreciação (cfr.Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.139 a 141; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.687 a 689; Luís Filipe Brites Lameiras, Notas Práticas ao Regime dos Recursos em Processo Civil, 2ª. edição, Almedina, 2009, pág.36).
No processo judicial tributário o vício de não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, como causa de nulidade da sentença, está previsto no artº.125, nº.1, do C.P.P.Tributário, norma onde estão consagrados todos os vícios (e não quaisquer outros) susceptíveis de ferir de nulidade a sentença proferida (cfr.Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.357 e seg.; ac.S.T.A-2ª.Secção, 24/2/2011, rec.871/10; ac.S.T.A-2ª.Secção, 13/10/2010, rec.218/10; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 28/5/2013, proc.6406/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6531/13).
Voltando ao caso concreto, conforme se retira do exame da decisão recorrida constante de fls.380 a 392 do presente processo e das referências supra exaradas à fundamentação da decisão de facto constante da mesma, deve julgar-se manifestamente improcedente a alegação do recorrente, visto que o vício que consubstancia esta nulidade, conforme mencionado acima, consiste na falta de fundamentação absoluta, não bastando que a justificação da decisão (tanto na vertente factual como no aspecto do enquadramento jurídico) se mostre deficiente, incompleta ou não convincente.
Concluindo, improcede o presente esteio do recurso incidente sobre a alegada falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão recorrida.
Defende o recorrente, igualmente e em síntese, que a decisão recorrida conclui pela inexistência de qualquer vício que afecte a validade do despacho de concordância com as conclusões finais do relatório de inspecção (cfr.nº.7 do probatório). Que a delegação de competências, para o caso em concreto, não se verifica, estando todos os actos subsequentes feridos de ilegalidade e, como tal, devendo ser anulados. Que estamos perante uma ilegalidade insanável (cfr.conclusões 4 a 9, 19 e 20 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo, supõe-se, consubstanciar um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Vejamos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
A competência é conceptualizada como um conjunto de poderes funcionais que a lei confere a um órgão para a prossecução das atribuições da pessoa colectiva pública que integra, assumindo-se como a pedra basilar e de vanguarda do princípio geral da legalidade administrativa. Em consequência, a competência só pode ser definida por lei ou regulamento, sendo imodificável, irrenunciável e inalienável (artº.29, C.P. Administrativo). Não obstante, a crescente flexibilidade da actividade administrativa, fruto da subsidiariedade da actuação dos poderes públicos na sociedade, tem determinado o legislador na adopção de cláusulas gerais de delegação de poderes, afastando um modelo rígido, fechado e inflexível de ordenação da competência de um órgão. Nesse sentido, o C.P.Administrativo institui, no seu artº.35, uma genérica delegabilidade de poderes, confiando nas mãos dos órgãos administrativos a concreta definição de quais, dentro da habilitação legal, gozam de determinada competência. No universo normativo tributário, tal cláusula geral encontra-se prevista no artº.62, da L.G.Tributária (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/7/2014, proc.7512/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 4/6/2015, proc.8508/15; Diogo Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, Vol.I, 2ª.edição, pág.604 e seg.; Paulo Otero, Legalidade e Administração Pública, 2003, págs.862 e seg.; Mário Esteves de Oliveira e Outros, Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2ª.edição, págs.190 e seg.; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária Anotada e comentada, 4ª.edição, 2012, pág.536 e seg.).
A incompetência pode definir-se como o vício que consiste na prática, por um órgão da Administração, de um acto incluído nas atribuições ou na competência de outro órgão (cfr. ac.T.C.A.Sul-1ª.Secção, 17/6/2004, proc.2976/99; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/7/2014, proc.7512/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 4/6/2015, proc.8508/15; M. Caetano, Manual de D. Administrativo, Almedina, 1991, I, pág.499 e seg.; D. Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, II, Almedina, 2010, pág.387 e seg.).
Perante a prática de um acto administrativo por órgão desprovido de competência para tal, pode o titular do órgão competente promover a sua ratificação-sanação, acto administrativo secundário destinado à sanação do vício gerador da ilegalidade do acto administrativo principal (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/7/2014, proc.7512/14; ac.T.C.A. Sul-2ª.Secção, 4/6/2015, proc.8508/15; D. Freitas do Amaral, Curso de Direito Administrativo, II, Almedina, 2010, pág.268 e 269; Mário Esteves de Oliveira e Outros, Código do Procedimento Administrativo Comentado, 2ª.edição, págs.662 e seg.).
Mais se dirá, que nos termos do artº.37, nº.2, do C.P.A., então em vigor, os actos de delegação e subdelegação de poderes estavam sujeitos a publicação no Diário da República. Sendo que, face ao disposto no artº.130, nº.2, do mesmo diploma legal, a falta de publicidade do acto, quando legalmente exigida, implicava a sua ineficácia. Assim, a falta de publicação dos actos de delegação de poderes não gera a sua invalidade mas, antes, mera ineficácia jurídica, sanável por posterior publicação.
No entanto, enquanto ineficaz, o despacho de delegação de competências não produz quaisquer efeitos jurídicos. Ou seja, os actos praticados ao abrigo de uma tal delegação ou subdelegação devem ser considerados como se a delegação pura e simplesmente não existisse, dado que a publicação marca o início de produção de efeitos do acto. Pelo que, à luz dos princípios gerais aplicáveis aos actos administrativos, terá que se concluir que os actos do delegado ou subdelegado, no caso de faltar a publicação da delegação ou subdelegação, são anuláveis, por incompetência (cfr.artº.135, do C.P.A., então em vigor; ac.S.T.A-1ª.Secção, 5/5/1994, rec.34223; ac.S.T.A-1ª.Secção, 18/12/2002, rec.646/02; ac.S.T.A-1ª.Secção, 18/3/2010, rec.528/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 4/6/2015, proc. 8508/15; Mário Esteves de Oliveira, Pedro Costa Gonçalves e João Pacheco de Amorim, Código do Procedimento Administrativo Anotado, Volume I, Almedina, pág.277; J. M. Santos Botelho, Américo Joaquim Pires Esteves e José Cândido Pinho, Código do Procedimento Administrativo Anotado e comentado, 4.ª edição, Almedina, 2000, pág.208 e 209).
Revertendo ao caso dos autos, do exame da factualidade provada (cfr.nºs.7 e 11 do probatório), conclui-se, com o Tribunal "a quo", que o despacho de concordância com as conclusões finais do relatório de inspecção não padece de qualquer vício que afecte a sua validade formal, visto ser expressamente mencionado no mesmo que o acto é praticado ao abrigo de delegação de competências. Por outro lado, verifica-se a sanação da ineficácia do mesmo acto com a publicação posterior do acto de delegação de competências ao abrigo do qual o despacho foi produzido, em 12/10/2010, mais abarcando a delegação de competências efectuada o tipo de acto em causa, os que concluem o procedimento gracioso, contrariamente ao defendido pelo recorrente.
Rematando, sem necessidade de mais amplas considerações, nega-se provimento ao presente fundamento do recurso, nessa medida se confirmando a decisão recorrida neste segmento.
Sustenta o apelante, igualmente e em síntese, que a liquidação não foi validamente notificada devido a falta de elementos essenciais, pelo que a eficácia da notificação não se verificou (cfr.conclusões 10 a 13 e 19 do recurso), com base em tal alegação pretendendo consubstanciar mais um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece deste vício.
A natureza receptícia do acto tributário, enquanto acto administrativo, deve hoje ter-se como perspectiva devidamente sedimentada pela doutrina e jurisprudência, configurando-se a notificação como requisito de perfeição do específico acto tributário de liquidação (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/1/2013, proc.6055/12; Alberto Pinheiro Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, Almedina, 1972, pág.239 a 242; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.94 e seg.; Soares Martínez, Direito Fiscal, Almedina, 1996, pág.309 a 311).
No entanto, a notificação não é um elemento intrínseco do acto tributário e, portanto, não é um requisito da sua validade, mas simples condição da sua eficácia, aliás, suprível por outras formas de conhecimento (cfr.artº.67, nº.1, do C.P.A., então em vigor; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/10/2012, proc.5673/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 22/1/2013, proc.6055/12).
Ainda, deve fazer-se a destrinça entre a fundamentação do acto administrativo e, questão diferente, a notificação da fundamentação, realidades diversas, apenas a primeira constituindo vício de forma determinante da eventual anulabilidade do acto tributário (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 9/9/99, rec.23773; ac.S.T.A-2ª.Secção, 4/2/2009, rec.889/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/1/2012, proc.4966/11).
A mera falta de notificação da fundamentação de um acto de liquidação não gera a invalidade deste, antes dando direito ao sujeito passivo de requerer a notificação da fundamentação ou a passagem de certidão que a contenha (cfr.artº.37, do C.P.P. Tributário).
No caso "sub judice", mais uma vez se concorda com o Tribunal "a quo", quando conclui que dos documentos juntos com a p.i. (cfr.nº.9 do probatório), concretamente, a nota de liquidação, a demonstração de acerto de contas e a demonstração da liquidação de juros compensatórios, constam todos os elementos subjacentes ao respectivo cálculo e a indicação dos meios de defesa que o sujeito passivo tinha ao seu dispor.
Por outro lado, no que se refere à fundamentação de facto e de direito da liquidação a mesma consta do relatório de inspecção regularmente notificado ao impugnante/ recorrente.
Mais, se acaso não se considerava devidamente esclarecido da fundamentação do acto tributário objecto do presente processo, deveria ter feito uso do examinado dispositivo constante do artº.37, nº.1, do C.P.P.Tributário.
Face ao exposto, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente igualmente este fundamento do recurso, mais se confirmando a decisão recorrida neste esteio.
Aduz o apelante, também e em sinopse, que os rendimentos referentes às escrituras públicas, e que aí foram declarados, foram-no em 2005 e em 2007, e não em 2006. Que está em causa a contabilização dos rendimentos, e não o momento em que eles são recebidos, como nos diz o artº.18, nº.1, do C.I.R.C. Que os valores referidos enquanto acréscimo, e que são objecto deste recurso, não constituíram acervo da sociedade recorrente (cfr.conclusões 14 a 18 do recurso), com base em tal alegação pretendendo consubstanciar, supomos, novo erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece deste vício.
No exame do presente esteio do recurso, desde logo, se deve recordar que o apelante não impugna a factualidade provada constante da sentença recorrida no âmbito do salvatério que deduz para este Tribunal (cfr.artº.640, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), nos termos previstos na lei.
Avancemos.
A base de incidência do I.R.C. encontra-se consagrada no artº.3, do C.I.R.C., sendo, nos termos do seu nº.2, definido o lucro tributável como o resultante da “diferença entre os valores do património líquido no fim e no início do período de tributação, com as correcções estabelecidas neste Código”.
Por outro lado, é no artº.17 e seg. do mesmo diploma que se consagram as regras gerais de determinação do lucro tributável, especificando-se no artº.23 quais os custos que, como tal, devem ser considerados pela lei.
Para o conceito fiscal de custo vale a definição constante do aludido artº.23, do C.I.R.C., a qual, depois de nos transmitir, de uma forma ampla, a noção de custos ou perdas como englobando todas as despesas efectuadas pela empresa que, comprovadamente, sejam indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva, procede a uma enumeração meramente exemplificativa de várias despesas deste tipo. Estamos perante um conceito de custo que se pode considerar comum ao balanço fiscal e ao balanço comercial. A definição fiscal de custo, como conceito mais amplo do que sejam os custos de produção e de aquisição, parte de uma perspectiva ampla de actividade e de necessidade da empresa, assim estabelecendo uma conexão objectiva entre a actividade desta e as despesas que, inevitavelmente, daqui decorrerão. E fá-lo com uma finalidade claramente fiscal, a qual consiste em distinguir entre custos que podem ser aceites para fins fiscais e que, por isso, vão influenciar o cálculo do lucro tributável e os que não podem ser aceites para tal efeito (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/2/2012, proc.4690/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc.5721/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 29/5/2014, proc.7524/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2014, proc.6754/13; J. L. Saldanha Sanches, A Quantificação da Obrigação Tributária, Lex Lisboa 2000, 2ª. Edição, pág.237 e seg.; António Moura Portugal, A Dedutibilidade dos Custos na Jurisprudência Fiscal Portuguesa, Coimbra Editora, 2004, pág.101 e seg.).
Os custos ou perdas da empresa constituem, portanto, os elementos negativos da conta de resultados, os quais são dedutíveis do ponto de vista fiscal quando, estando devidamente comprovados, forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtiva da empresa em causa. A ausência de qualquer destes requisitos implica a não consideração dos referidos elementos como custos, assim devendo os respectivos montantes ser adicionados ao resultado contabilístico (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/2/2012, proc.4690/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc. 5721/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 29/5/2014, proc.7524/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2014, proc.6754/13; F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, anotado e comentado, Rei dos Livros, 5ª.edição, 1996, pag.206 e seg.).
Refira-se, igualmente, que as empresas são obrigadas a dispor de contabilidade organizada nos termos da lei comercial e fiscal, a qual permita o controlo do lucro tributável (cfr.artº.115, do C.I.R.C., na versão em vigor em 2006; artºs.29 e 31, do C.Comercial).
Revertendo ao caso dos autos, o valor probatório das escrituras celebradas pela sociedade impugnante/recorrente não foi posto em causa nas situações assinaladas pela Administração Tributária. Pelo contrário, o seu conteúdo demonstra que a transmissão dos imóveis foi efectivamente escriturada, mas por valores inferiores aos reais (cfr.nº.2 do probatório).
Já os pagamentos efectuados pelos adquirentes dos imóveis, à margem do valor escriturado e contabilizado pelo recorrente, assumidos em sede de inspecção, foram efectuados através de um ou mais cheques emitidos à ordem dos sócios-gerentes da apelante ou ao portador e depositados em contas que não faziam parte da contabilidade social.
No que se refere à data de recepção dos pagamentos efectuados, resulta das cópias dos cheques anexas ao relatório que os mesmos foram emitidos e depositados no ano de 2006, assim não sendo relevante, no caso concreto, a menção do recorrente ao princípio da especialização dos exercícios consagrado no artº.18, do C.I.R.C.
Por último, dir-se-á que o acto tributário impugnado se baseou na avaliação directa da matéria colectável da sociedade recorrente, realizada em sede de inspecção e baseada na abundante documentação que fundamenta as correcções efectuadas.
Concluindo, sem necessidade de mais amplas considerações, nega-se provimento ao presente esteio do recurso, mais se confirmando a sentença recorrida neste segmento.
Por último, o recorrente chama à colação a alegada violação de um extenso rol de preceitos/diplomas legais e constitucionais (cfr.a sentença recorrida viola:
a)O disposto nos artigos 77º, da LGT;
b)O disposto nos artigos 120º, alíneas a), c) e d) do CPT;
c)O disposto nos artigos 37º e seguintes da CPPT;
d)O disposto nos artigos 35º, nº 1, al.a), 37º, nº 1 e 134º, nº1 do CPA;
e)O disposto nas alíneas b), c) e d) do atual 615º do CPC;
f)Artigo 18º, nº 1, do CIRC;
g)O disposto no Decreto-Lei nº 256-A/77, de 17 de Junho;
h)O disposto nos artigos 13º, 20º, 202º, 204º, 205º, 266º, nº 2 e 268º, números 1, 2 e 3 da CRP).
Quanto a esta pretensa violação de preceitos/diplomas legais e constitucionais (alguns já revogados), o recorrente não concretiza minimamente essas infracções, sendo que já se afirmou que a decisão recorrida não padece de qualquer nulidade, não se vislumbrando em que termos foram colocados em crise os preceitos/diplomas citados, a não ser com referência ao facto de a decisão recorrida ter sido desfavorável ao apelante. Este Tribunal também não vislumbra tais alegadas infracções, assim estando o presente esteio do recurso condenado ao insucesso.
Atento o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente o presente recurso e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
X
DISPOSITIVO
X
Face ao exposto, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul ACORDAM EM NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA, a qual, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
X
Condena-se o recorrente em custas.
X
Registe.
Notifique.
X
Lisboa, 24 de Novembro de 2016



(Joaquim Condesso - Relator)


(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)



(Bárbara Tavares Teles - 2º. Adjunto)