Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1616/13.0BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:07/08/2021
Relator:ANTÓNIO ZIEGLER
Descritores:ERRO FORMA PROCESSO
EXECUÇÃO JULGADOS
A.A.E .
CUMULAÇÃO PEDIDOS
JUROS INDEMNIZATÓRIOS : RECONHECIMENTO DO DIREITO A TAIS JUROS.
RECLAMAÇÃO GRACIOSA
DIREITO AO SEU PROCESSAMENTO E DE CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE CERTAS QUANTIAS DEVIDAS
Sumário:I) Verifica-se a excepção de erro na forma de processo quando o A. pretende apenas que a ATA cumpra os concretos actos de execução que considera serem necessários para a obtenção do direito ao pagamento de certas quantias devidas.

II) No caso como dos autos, em que o interessado , através de A.A.E., pretende que lhe assiste o direito ao processamento de juros indemnizatórios com base em anterior sentença que reconheceu o direito a tais juros, do qual deduziu previamente reclamação graciosa que solicitava tal processamento dos juros devidos, o qual foi objecto de indeferimento por intempestividade, pelo que intentou acção administrativa especial , no sentido de cumular a pretensão do reconhecimento do direito, tendo por escopo a reconstituição da situação jurídica violada, com a solicitação de concretos actos de execução do assim decidido, neste caso ,pedindo a condenação da Adm. Fiscal ao pagamento de determinada quantia pecuniária. –cfr artº 4º, nº 2, alínea a), conjugado com o artº 5º, nº 1; artº 47º e nº 3, do artº 176º, todos do CPTA.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência os Juízes que constituem a Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

I Relatório

A sociedade "V..... - SUCURSAL EM PORTUGAL", vem deduzir recurso da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que absolveu o R. da instância por erro sobre a forma de processo, por entender que a a.a.e. por si interposta da decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada do não pagamento de juros indemnizatórios devidos em razão de uma decisão judicial que lhe reconheceu esse direito caberia uma acção de execução de julgados , tendo, para o efeito formulado as seguintes conclusões:

A. A Sentença que ora é objeto de Recurso absolveu a ora recorrida da instância, porquanto "(...) nos presentes autos, não está em causa um acto administrativo, mas uma decisão proferida em sede de processo de Impugnação Judicial, que a ora Autora pretende executar (...)" (vide,fls. 4 da Sentença recorrida).

Sucede, porém, que,

B. O que está em causa nos autos é a decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada "contra" o não pagamento de juros indemnizatórios, conforme, de um modo contraditório - é certo - é admitido na Sentença recorrida quando se refere que o "objecto da presente acção é a decisão de indeferimento da reclamação graciosa, que a ora Autora apresentou em 20/02/2013 a solicitar o pagamento de juros indemnizatórios" (fIs. 1 da Sentença).

C. A reclamação graciosa em questão foi apresentada tempestivamente nos termos do n.º 6 do artigo 61.º da LGT, a qual, conforme refere Jorge Lopes de Sousa, só não será admitida nas "(...) situações em que não há qualquer decisão que recuse explicitamente o pagamento de juros indemnizatórios (...)" (Ob. Cit., pág. 566).

Assim,

D. Perante o atual recorte legal, numa situação em que não existe uma recusa explícita do pagamento de juros indemnizatórios, os contribuintes dispõem das seguintes alternativas:

(a) alternativa administrativa (Reclamação Graciosa, nos termos dos n.os 6 ou 7 do artigo 61.º da LGT); ou

(b) alternativa judicial (Ação de Execução de Julgados, nos termos do artigo 146.º da LGT).

Sendo que,

E. Perante a opção pela via administrativa, e em caso de indeferimento da Reclamação Graciosa apresentada, o meio jurisdicional para contestar tal decisão de indeferimento será a acção administrativa especial, nos termos do disposto no artigo 97º, n.º 1, alínea p) e n.º 2 do CPPT, isto porque, conforme sucedeu no caso sub Júdice, a decisão de indeferimento não apreciou a legalidade do pedido (pagamento de juros indemnizatórios), dada a invocação de uma alegada intempestividade.

Assim,

F. O ato impugnado não é - como sucede na Execução de Julgados - uma sentença, mas sim a recusa na apreciação da Reclamação referente à omissão pelo não pagamento de juros indemnizatórios / recusa em apreciar a legalidade da Reclamação.

Pelo que,

G. O meio próprio será, pois, a Ação Administrativa Especial.

Sem conceder,

H. Importa, igualmente, ter presente que a própria decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa (ato impugnado judicialmente) indica como meio de reacção a acção administrativa especial, pelo que, considerando-se errado o meio de reacção indicado na notificação emitida, merecerá sempre aplicação o disposto no n.º 4 do artigo 37.° do CPPT.

Ainda sem conceder,

I. O entendimento preconizado na sentença ora recorrida - contestar a decisão de indeferimento da reclamação graciosa através da apresentação de Ação de Execução de Julgado - não faz sentido perante a lógica da coerência do sistema jurisdicional, nem sequer é consentâneo com os artigos 20.° e 268.°, n.° 4 da CRP.

Isto porque,

J. A Ação de Execução de Julgados, contrariamente ao entendimento preconizado na Sentença recorrida, não permite a tutela jurisdicional efectiva, porquanto o início da contagem do prazo para aquela acção em nada se relaciona com a decisão de indeferimento da Reclamação Graciosa (tem, isso sim, subjacente um ato que nem sequer é notificado ao contribuinte: a remessa do processo para a AT).

Ademais,

K. O prazo para a interposição de Ação de Execução de Julgados não suspende com a apresentação da Reclamação Graciosa prevista nos n.os 6 e 7 do artigo 61.° da LGT.

L. O meio jurisdicional para reagir contra a decisão de indeferimento da reclamação graciosa que permite uma efetiva tutela jurisdicional é, pois, a Ação Administrativa Especial. Termos em que, não poderá, pois, prevalecer a sentença ora recorrida.”

*

O recorrido apresentou contra-alegações, nas quais conclui que,

“a. De acordo com a Douta Sentença: “nos presentes autos, não está em causa um acto administrativo, mas uma decisão proferida em sede de processo de Impugnação Judicial, que a ora Autora pretende executar.” (cfr. fls. 7 e 8 da Sentença recorrida)

b. Nestes termos, entendeu o Douto Tribunal a quo que: “a acção adequada para se executar uma sentença, proferida em sede de processo de impugnação judicial é a acção de execução de julgados.” (cfr. fls. 4 da Sentença recorrida).

c. Impugna a Recorrente o entendimento plasmado na Douta Sentença, invocando para tanto que, contrariamente ao referido na Sentença ora recorrida (...) o que está em causa nos autos não é “uma decisão proferida em sede de processo de impugnação que a ora Autora pretende executar”, ao invés, "o que está em causa nos presentes autos é a decisão de indeferimento da reclamação graciosa apresentada contra o não pagamento de juros indemnizatórios. ”

d. Discorda a Recorrida de um tal entendimento.

e. A Douta Sentença recorrida deu como factos assentes que foi proferida sentença pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa, transitada em julgado, em 18/09/2012, a qual concedeu provimento à impugnação judicial intentada pela Autora.

f. E bem assim, deu como facto assente que a Autora apresentou reclamação graciosa a solicitar o pagamento de juros indemnizatórios, com fundamento no dever de execução da sentença transitada em julgado a seu favor.

g. Deu ainda como assente que os fundamentos da acção que é objecto dos presentes autos se reconduziram à invocação da decisão proferida em sede de impugnação judicial e à alegação do artigo 43.° da LGT.

h. Resulta manifestamente dos elencados factos dados como assentes, que, não obstante, ter a Autora deduzido reclamação graciosa com vista ao pedido de pagamento de juros indemnizatórios, e tendo a mesma sido indeferida,

i. O que está em causa nos presentes autos é a pretensão da Autora em obter a condenação da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) no pagamento de juros indemnizatórios em consequência de ter sido proferida sentença transitada em julgado, que concedeu provimento à impugnação judicial intentada pela ora A..

j. Ora, são o pedido e a causa de pedir, nos termos delineados na PI, que delimitam o objecto processual da acção, nomeadamente, no que tange ao poder/dever de pronúncia do Tribunal.

k. Tal como considerou o Douto Tribunal a quo, como facto assente, os fundamentos da acção que é objecto dos presentes autos restringiram-se à invocação da decisão proferida em sede de impugnação judicial e à alegação do artigo 43.° da LGT (o que resulta, de acordo com a própria Sentença recorrida, da leitura da PI).

l. Como tal, quer o pedido, quer a causa de pedir da acção administrativa especial apresentada pela ora Recorrente são, em bom rigor, manifestamente demonstrativos de que a pretensão da ora Recorrente é o pagamento de juros indemnizatórios e que a causa de pedir é a prolacção de sentença transitada em julgado

m. Como tal, ainda que o indeferimento da reclamação graciosa possa fazer parte do objecto da referida acção administrativa especial, o que, verdadeiramente está em causa é o dever de execução de uma sentença transitada em julgado em matéria de juros.

n. Termos em que, estabelecendo o artigo 101alínea j) da LGT e o artigo 97.°, n.° 1, alínea p) do CPPT), que são susceptíveis de ser sindicados mediante o processo de acção administrativa especial, os actos administrativos em matéria tributária que não comportem a apreciação da legalidade dos actos de liquidação, dúvidas não subsistem de que, não pode a acção administrativa especial ser o meio próprio para deduzir pedido de pagamento de juros indemnizatórios, derivado da execução de sentença transitada em julgado.

o. Com efeito, neste caso, quer a jurisprudência, quer a doutrina, se orientam no sentido da impropriedade do meio da acção administrativa especial para formular a pretensão de juros indemnizatórios (vide Acórdão do ST A, de 26/06/2002, processo n.° 502/02 e Jorge Lopes de Sousa, in “Código de Procedimento e de Processo Tributário”. Volume \ (1° a 95.°), 6a Edição. 2011. p.p. 542 e 543)

p. Assim, considerando o princípio de que "A todo o direito de impugnar corresponde o meio processual mais adequado de o fazer valerem juízo" (cf. artigo 97° n.° 2 da Lei Geral Tributária) e que o artigo 176.° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA) prevê a acção de execução de julgados, constata-se que a acção para a execução da sentença proferida no âmbito da impugnação judicial, julgada procedente a favor do sujeito passivo, seria a forma processual adequada à tutela jurisdicional pretendida pela A..

q. Ao contrário da posição perfilhada pela Recorrente, mesmo nos casos em que haja uma decisão da administração tributária sobre juros indemnizatórios, decisão essa que pode ser objecto de reclamação ou impugnação judicial autónomas em relação à que tem por objecto o acto de liquidação, ainda assim, mesmo nestas situações, o meio próprio não seria, de qualquer modo, a Acção Administrativa Especial, mas antes a Impugnação judicial.

r. Parece justificar-se que o meio próprio seja a impugnação judicial, por a liquidação de juros indemnizatórios, em regra, dever acompanhar o acto de liquidação, e nessas condições, ser objecto de impugnação em conjunto com ele.

s. E tanto se verifica esta identidade entre a liquidação do imposto e os juros indemnizatórios que deste podem resultar que inclusivamente, o juiz competente para a apreciação dos processos de execução de julgados, é o Magistrado que proferiu a sentença em sede de processo de impugnação judicial, e que cumpre executar, processo este que é, por esse motivo, apenso ao processo de execução de julgados.

t. Nestes termos, prevendo o direito adjectivo meio próprio para a ora Recorrente atacar o acto controvertido nestes autos e não sendo este a acção administrativa especial, há que concluir que a mesma fez uso de meio inadequado à pretensão que pretendia fazer valer, tal como, decidiu, e bem, a Douta Sentença recorrida.

u. Atendendo às razões invocadas, decaem (todos) os argumentos apresentados pela Recorrente por forma a (tentar) demonstrar que é a Acção Administrativa Especial o meio próprio para deduzir pedido de juros indemnizatórios com fundamento na execução de sentença de impugnação judicial transitada em julgado a seu favor.”

*

Deu-se conhecimento do processado ao D.M.M.P.

Na sentença recorrida , a decisão sobre a matéria de facto foi a seguinte:

a) A presente Acção Administrativa Especial tem por objecto a decisão de indeferimento da reclamação graciosa, que a ora Autora apresentou em 20/02/2013, a solicitar o pagamento de juros indemnizatórios, com fundamento no dever de execução da sentença transitada em julgado a seu favor, alegando que a AT apenas veio a restituir o valor de € 100.761,49 respeitante a retenções na fonte a título definitivo indevidamente efectuadas, não tendo procedido ao pagamento dos respectivos juros indemnizatórios, no valor global de € 70.218,34 (setenta mil, duzentos e dezoito euros e trinta e quatro cêntimos) - análise da douta petição inicial e decisão de fls. 23 a fls. 29 dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido, para todos os legais efeitos.

b) A sentença de Impugnação, que ora se pretende executar, foi proferida em 16/08/2012 e o respectivo processo correu os seus termos neste Tribunal sob o n.° 437/0.5.2, tendo sido anulada a retenção na fonte a título definitivo da quantia de € 100.761,94 referente a imposto de IRC do ano de 1997 - sentença junta de fls. 55 a fls. 67 dos autos, que aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais.

c) A referida sentença transitou em julgado em 18/09/2012 - consulta do sistema SITAF do Tribunal Tributário de Lisboa.

d) Os fundamentos da presente acção administrativa reconduzem-se à alegação da fundamentação da decisão proferida em sede da Impugnação, id. em b), e à alegação da previsão do artigo 43.° da Lei Geral Tributária - leitura da douta p.i.

e) A petição inicial da presente acção administrativa foi remetida ao Tribunal Tributário de Lisboa, por e-mail, em 16/09/2013 - expediente de fls. 2 dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido.

……..

FACTOS NÃO PROVADOS:

Não se provou em que data foi enviada, ao respectivo serviço de finanças, a Impugnação Judicial, id. em 4.1 .b), para execução espontânea - pois que, o processo de Impugnação Judicial não foi apenso aos presentes autos, nem teria que o ser, pois

que, não estamos em sede de processo de Execução de Julgados.”.

*

Quanto à fundamentação de direito, consta da sentença o seguinte:

São susceptíveis de ser sindicados mediante o processo de acção administrativa especial, os actos administrativos em matéria tributária, que não comportem a apreciação da legalidade dos actos de liquidação (artigos 101.°, alínea j) da LGT e 97.°, n°1, alínea p) do CPPT).

Ora, nos presentes autos, não está em causa um acto administrativo em matéria tributária, mas uma decisão proferida em sede de processo de Impugnação Judicial, que a ora Autora pretende executar, nomeadamente na parte referente a juros.

Assim, considerando o princípio de que, a todo o direito de impugnar corresponde o meio processual mais adequado de o fazer valer em juízo (artigo 97.°, n.°2 da Lei Geral Tributária), devendo o Juiz ordenar a correcção do processo

quando o meio usado não for o adequado (n°3 da referida disposição), a acção Acção Administrativa n.° 1616/13.0 BELRS adequada para se executar uma sentença, proferida em sede de processo de Impugnação Judicial é a acção de Execução de Julgados.

Neste sentido vide Jorge Lopes de Sousa (em “Código de Procedimento e Processo Tributário”, Áreas Editora, 2011, 6.ª Ed.ª, Vol. I, pags. 542 e 543), “o processo de execução de julgados é mais adequado a determinar a existência de tal direito a juros indemnizatórios que o próprio processo de impugnação judicial, cuja finalidade primacial é apreciar a legalidade do acto impugnado (...) por isso, de harmonia com o disposto no artigo 97. °, n. °2 da LGT deve ser reconhecido como o escolhido por lei para assegurar aquele direito indemnizatório ”.

De todo o exposto resulta que in casu ocorre erro na forma de processo, pois que, conforme supra se referiu, a acção administrativa especial não é o processo adequado para executar o eventual direito a juros indemnizatórios.

O erro na forma de processo ocorre sempre que a forma processual escolhida não corresponde à natureza ou valor da acção e constitui nulidade, de conhecimento oficioso: artigos 199.° e 202.° do Código de Processo Civil.

E, quais as consequências a extrair de tal facto?

Nos termos do artigo 199.° do CPC as consequências daí resultantes poderão divergir consoante se possam ou não aproveitar os actos já praticados, tendo em vista as garantias do réu; se da errada forma processual resultar diminuição das garantias do réu, deverão anular-se todos os actos posteriores. Caso contrário, anular-se-ão apenas os que não possam ser aproveitados, praticando-se os necessários para que o processo se aproxime da forma estabelecida na lei.

Por seu lado, os artigos 97.°, n.°3 da LGT e 98.°, n.°4 do CPPT impõem, no caso de erro na forma de processo, a respectiva convolação para a forma de processo adequada, desde que preenchidos os requisitos do pedido, da causa de pedir e da tempestividade.

E, o STA tem vindo a entender que a convolação é admitida sempre que não seja manifesta a improcedência ou intempestividade desta, sem prejuízo da necessária idoneidade da respectiva petição para o efeito (vide acórdãos do STA de 07/01/2009, proferido em sede do Proc. n.° 638/08 e de 06/04/2005, proferido em sede do Proc. n.° 01100/04).

Ainda, neste sentido, se pronuncia Jorge Lopes de Sousa (em “Código de Procedimento e de Processo Tributário ”, Áreas Editora, 4ª Ed.ª, 2003, pág. 1045, anotação 5ª ao artigo 276.°): “A haver erro naforma de processo utilizada, deverá efectuar-se a convolação para a forma de processo adequada, sempre que não haja obstáculo intransponível ”.

Porém, no caso em análise, não é possível proceder à convolação, porquanto, se bem que, em face do pedido e da causa de pedir invocados pela Autora se pudesse configurar o prosseguimento dos presentes autos como processo de Execução de Julgados, previsto no artigo 157.° e seguintes do CPTA, não é possível proceder-se à referida convolação, por não se ter apurado da respectiva tempestividade (recorde-se que não se apurou em que data o processo de Impugnação foi remetido ao serviço de finanças, para proceder à sua execução espontânea e o artigo 146.°, n.°2 do CPPT dispõe que o prazo de execução espontânea das sentenças, proferidas pelos tribunais tributários, se conta a partir da data em que o processo tiver sido remetido ao órgão da administração tributária competente para a execução).

Efectivamente, sobre a execução de julgados nos tribunais administrativos regulam os artigos 157.° e seguintes do CPTA.

E, decorre do disposto no artigo 175.°, n°1 e n°3 do CPTA que “(...) o dever de executar deve ser integralmente cumprido no prazo de três meses ” e que “quando a execução da sentença de anulação, consista no pagamento de uma quantia pecuniária (...), o pagamento deverá ser realizado no prazo de 30 dias ”, contendo o artigo 146.°, n.°2 do CPPT norma específica sobre o prazo de execução espontânea das sentenças proferidas pelos tribunais tributários.

Por sua vez, caso não se verifique a execução espontânea do julgado, no prazo referido nas disposições conjugadas dos artigos 175.°, n.°1 e n.°3 do CPTA e 146.°, n.°2 do CPPT (isto é, 1 mês após a remessa do processo ao órgão da administração tributária competente para a execução, caso a execução da sentença consista no pagamento de uma quantia pecuniária e 3 meses nos restantes casos), prevê o CPTA que, o interessado possa fazer valer o seu direito à execução perante o tribunal que tenha proferido a sentença, em primeiro grau de jurisdição, no prazo de 6 meses, contados desde o termo do prazo referido no artigo 175.°, n.°1 do CPTA (isto é 3 meses após a remessa do processo ao órgão da administração tributária).

E, para além do mencionado requisito da tempestividade, ocorre ainda outro obstáculo, qual seja, o do Juiz competente para a apreciação do mérito daqueles autos de Execução de Julgados.

É que, o Processo de Execução de Julgados é distribuído ao Magistrado que proferiu a sentença em sede do processo de Impugnação, que cumpre executar (que não é a titular dos presentes autos), o qual é autuado, por apenso, ao processo de Execução de Julgado

Pelo exposto, não pode o Tribunal proceder à respectiva convolação, sem prejuízo da ora Autora, no prazo de 15 dias, apresentar nova petição, nos termos do artigo 89.°, n.° 2 do CPTA.”.

*

Com dispensa dos vistos legais, cumpre decidir

Quanto ao erro de julgamento de direito por alegada violação de lei processual que prevê o recurso contencioso do acto administrativo de indeferimento de reclamação graciosa deduzida do não pagamento de juros indemnizatório, em caso de execução de uma decisão judicial de que resulta esse direito, entende o recorrente que,

Tal seria a forma processual adequada para fazer valer tal direito, resultando um erro naquele entendimento do Tribunal A Quo ao considerar existir erro sobre a forma de processo. Sobre tal questão, dir-se-á o seguinte:

Em tese nada obsta a que o recorrente impugnasse o acto administrativo que lhe concedeu parte do direito a tais juros indemnizatórios e da condenação à substituição do acto ilegalmente praticado por outro legalmente devido (de pagamento da totalidade dos referidos juros) em razão da decisão judicial de que resultou esse direito e objecto de reclamação perante a ATA, ainda que dirigida à determinação judicial do conteúdo dos actos e operações que a Adm. deve adoptar para reconstituir a situação que existiria se o acto ilegal não tivesse sido praticado ( cfr nº1, do artº 173º do CPTA).

Não obstante, sabendo-se que,

O erro na forma de processo se afere pela adequação do meio processual utilizado ao fim por ele visado, já que, se o pedido formulado pelo A. não se ajusta à finalidade abstractamente desenhado pela lei para essa forma processual, então ocorrerá tal erro na forma de processo .Ora,

Atendendo ao pedido formulado nos autos que fixou as questões que ao Tribunal cumpre solucionar ( cfr nº1, do artº 123º do CPPT, “in fine”), verifica-se que o A. formulou na respectiva p.i. as seguintes pretensões:

“(i) Seja anulada a decisão de indeferimento do Requerimento interposto pela Autora a solicitar o reembolso de juros indemnizatórios por, como supra comprovado, a mesma estar ferida de ilegalidade;

(ii) Em cumulação de pedidos, e porque não é incompatível com o primeiro pedido, mas apenas uma extensão deste, a AT ser condenada à prática do acto devido, pois a Autora entende que no âmbito dos poderes que lhe são conferidos pelo artigo 712 do CPTA, o Douto Tribunal tem conhecimento do caso concreto que lhe permite pronunciar-se sobre a pretensão material e intimar a AT a reembolsar o impetrante do montante de € 70.218,34, a título de juros indemnizatórios.”. Assim,

Dúvidas não se suscitam que o pedido se adequa à forma processual de A.A.E., a qual compreende um pedido de condenação à prática de acto devido, nele se compreendendo o direito à execução perante o tribunal , designadamente ao pagamento de pagamento de quantias pecuniárias assim peticionadas.- cfr nº3, do artº 176º, do CPTA. De resto,

O acto que se reporta ao objecto imediato da causa , não aprecia a sua legalidade, nem o mérito da pretensão, limitando-se a indeferi-lo por extemporaneidade.

Com efeito, importa ter presente que na petição deduzida pelo interessado, que delimita a apreciação da causa pelo Tribunal, o que se pede perante a referida instância judicial é, por um lado , compelir a entidade a quem compete executar a decisão judicial, da qual resultou esse direito aos juros indemnizatórios, a proceder ao seu pagamento, efectuada ao abrigo do disposto no artº 61º, do CPPT, e por outro, “ fazer valer o seu direito à execução”( cfr nº1, do artº 176º, do CPTA), especificando os actos e operações que considera que a execução deve consistir para o efeito de pedir a correspondente condenação da Adm. no cumprimento desses específicos deveres ( nº3, do artº do mesmo preceito legal), pelo que , considerando que tal desiderato resulta da cumulação de pretensões relativas ao pagamento dos juros indemnizatórios devidos, com a pretendida execução de sentença e a que se refere a alínea a), do probatório.- cfr artº 47º, nºs 1 a 3, do CPTA. De facto,

A predita formulação cumulativa do pedido de pagamento de juros indemnizatórios formulada após a apresentação de reclamação graciosa deduzida ou directamente ao abrigo do disposto no referido artº 61º, nº 2, do CPPT, com a pretensão consubstanciada da afirmação do seu direito à execução perante o tribunal, enquanto fundamentadas no dever de executar as sentenças de anulação por banda da Administração, assim concretizando , num único processo de execução de sentença de anulação, os respectivos pressupostos processuais assim cumulados numa única acção , a qual se mostra adequado a fazer valer o direito em juízo.- cfr nº 2, do artº 97ºda LGT.

No sentido ora pugnado, de que tais tipos de pretensões podem ser deduzidas cumulativamente numa única acção judicial, vd Ilts Prof. Dr. Freitas do Amaral e M. Aroso de Almeida, in “Grandes Linhas da Reforma do Contencioso Administrativo”, Almedina Coimbra , Junho 2002, pags 66 a 72. Assim sendo,

Ao pretender exercer o direito à execução perante o tribunal, a tanto bastava que indicasse os actos e operações que considerava como necessários a tal desiderato e para o efeito da condenação da Adm. no cumprimento desses específicos deveres para a emissão do necessário título executivo que servirá de base à execução em causa nos autos, pelo que, como bem refere o Tribunal A Quo, se tal impunha a interposição de um processo de execução da dita sentença anulatória, na justa medida em que só através de tal forma processual poderia o recorrido ser condenado no cumprimento desses deveres específicos , nada obstava a que instasse judicialmente tal entidade a quem competia executar a sentença de anulação a pagar tais juros, que assim foram cumulados desde logo no processo impugnatório , não se exigindo a dedução autónoma do referido direito à execução por via do dito processo de execução da sentença anulatória.– cfr nesse sentido os Iltes autores M. Aroso de Almeida e Carlos Cadilha in “ Comentário ao CPTA”, ed. Almedina, 2005, pags 232 e segs em anotação ao artº 47º do CPTA, e fls 857 e segs.( e especialmente a menção constante de fls 860), todas em observação ao disposto no nº1, do artº 173º do CPTA.

Assim entende-se que a decisão proferida pelo Mº Juiz padece do referido erro violação de lei processual que prevê o recurso contencioso do acto administrativo de indeferimento de reclamação graciosa deduzida do não pagamento de juros indemnizatório, em caso de execução de uma decisão judicial de que resulta esse direito, no âmbito do dever de a Administração executar as sentenças de anulação que a determinam, dado que a mesma pode abranger, não só o restabelecimento da situação que existiria se não tivesse sido praticado o acto anulado, como a imposição de um novo acto administrativo que substitua o anterior.

Atento que, não podendo esta Instância superior apreciar da pretensão deduzida objecto da presente apelação, desde logo por falta de elementos nos autos para o efeito, máxime da decisão judicial que determinou o apuramento dos ditos juros indemnizatórios, ordena-se a baixa dos autos à 1.ª instância para devido conhecimento do mérito se a tal nada mais obstar.

*

Dispositivo

Nos termos expostos , entende-se dar provimento ao recurso, sendo revogada a sentença proferida nos autos que julgou verificado o erro na forma de processo e absolveu o R. da instância , baixando os autos à 1º instância para prosseguimento dos autos, se a tal nada mais obstar.

*

Custas pelo recorrido nas duas instâncias, sendo responsável pelas custas na presente instância por ter apresentado contra alegações. –cfr nº 2, do artº 7º, do R.C.P., “ex vii”, do disposto no nº1, do artº 530º, do CPC.

Notifique.

[O relator consigna e atesta que, nos termos do disposto no art.º 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13 de março, aditado pelo art.º 3.º do DL n.º 20/2020, de 01 de maio, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Desembargadores integrantes da formação de julgamento, os Senhores Desembargadores Mário Rebelo e Patrícia Manuel Pires ].