Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:223/19.9BEALM
Secção:CA
Data do Acordão:02/27/2020
Relator:PEDRO NUNO FIGUEIREDO
Descritores:LEGITIMIDADE ATIVA
TRANSFERÊNCIA DE FARMÁCIA; CONCELHO LIMÍTROFE
Sumário:I. No âmbito da impugnação de atos administrativos, o artigo 55.º, n.º 1, al. a), do CPTA, expande o conceito de legitimidade ativa a quem possa não ser titular da relação material controvertida, desde que alegue ser titular de um interesse direto e pessoal, lesado pelo ato.
II. A transferência de farmácia para um concelho limítrofe, prevista no artigo 2.º da Lei 26/2011, de 16 de junho, não se encontra sujeita à emissão do parecer prévio exigido no artigo 26.º, n.º 3, do D-L n.º 307/2007, de 31 de agosto.
III. Na interpretação da expressão legal concelho limítrofe deve ter-se em consideração o sentido próprio desta palavra, uma vez que o concelho constitui uma divisão administrativa com delimitações territoriais claramente definidas.
IV. Considerando que entre os concelhos de Lisboa e Almada se interpõe domínio público fluvial, da titularidade do Estado, os mesmos não são concelhos limítrofes, para os efeitos do citado artigo 2.º da Lei 26/2011, de 16 de junho.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul

I. RELATÓRIO
S..... – S….. & C…..., Lda., intentou providência cautelar contra o Infarmed - Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde, I.P., na qual requer a suspensão de eficácia da deliberação de 14/12/2018 do Conselho Diretivo da entidade demandada, que considerou apto o pedido de transferência da farmácia M..... de Lisboa para Almada.
Indicou como contrainteressada a sociedade S....., Sociedade Farmacêutica, Lda.
Citadas, tanto a entidade demandada como a contrainteressada apresentaram contestação, por exceção, invocando a exceção de ilegitimidade da autora, e por impugnação.
A autora apresentou réplica, sustentado a improcedência daquela exceção.
Por despacho de 28/05/2019, foi determinada a antecipação do conhecimento do mérito da ação administrativa principal, processo n.º 234/19.4BEALM.
Por decisão de 19/09/2019, o TAF de Almada julgou procedente a ação administrativa e anulou a deliberação impugnada.
Inconformada, a entidade demandada interpôs recurso desta decisão, terminando as alegações com a formulação das conclusões que de seguida se transcrevem:
“1.ª O douto Tribunal a quo deveria ter julgado procedente a exceção de ilegitimidade ativa da Recorrida invocada pelo INFARMED, porquanto, nos termos do artigo 55.º/a) do CPTA, a Recorrida não tem qualquer interesse direto e pessoal nos presentes autos.
2.ª Nos termos do artigo 2.º/1/c) da Portaria 352/2012, o legislador utilizou a distância de 350 metros como critério legal para assegurar que cada farmácia tem a clientela necessária para ser um negócio atrativo e assim se manter aberta em funcionamento, de forma a garantir a distribuição medicamentosa e de serviços farmacêuticos pelo território e pela população.
3.ª Desta forma, sendo incontroverso que a farmácia da Contrainteressada se transferirá para um local situado a cerca de 850 metros da sua farmácia, é evidente que a Recorrida não tem qualquer interesse direto e pessoal pelo simples facto de também ser proprietária de uma farmácia de oficina.
4.ª Se assim não se entender, o que apenas em mero benefício de raciocínio se admite, tal significaria qualquer farmácia do país, independentemente da distância a que estejam da nova localização da farmácia da Contrainteressada, teriam legitimidade para requerer a suspensão do ato praticado pelo INFARMED, o que, naturalmente, não faz qualquer sentido.
5.ª O Tribunal a quo andou mal ao julgar procedente o vício de violação de lei do artigo 26.º/3 do DL 307/2007, por falta de parecer das câmaras municipais dos concelhos de origem e de destino da transferência ora em causa.
6.ª É que, no artigo 2.º da Lei 26/2001 – onde se encontra consagrado os requisitos deste procedimento – não se encontra previsto a necessidade de pedir parecer prévio às câmaras municipais de origem e destino da farmácia a transferir.
7.ª Aliás, mais se diga que da análise do regime de transferência de farmácia para concelhos limítrofes não resulta que os requisitos materiais e procedimentais constantes do artigo 26.º do DL 307/2007, sejam avaliados pelo INFARMED no âmbito deste procedimento, porquanto o artigo 2.º da Lei 26/2011 é totalmente omisso a qualquer remissão para o regime de transferência de farmácias dentro do mesmo município.
8.ª A conclusão que agora se efetuou é a única aceitável ao abrigo do artigo 9.º do CC, porquanto é a única que interpreta corretamente o artigo 2.º da Lei 26/2011.
9.ª De facto, se se fizer uma interpretação histórica do referido preceito, concluir-se-á que não há qualquer elemento que faça aplicar o artigo 26.º do DL 307/2007, ao procedimento para transferência de farmácias para o concelho limítrofe, porquanto
10.ª antes da entrada em vigor da Lei 26/2011 – que alterou também o DL 307/2007 –, o DL 307/2007 era omisso quanto à possibilidade da transferência das farmácias de oficina para concelhos limítrofes
11.ª Sendo certo que, com a entrada em vigor da Lei 26/2011, teve o cuidado de criar um novo regime de transferência de farmácias, regime esse que é absolutamente autónomo do já existente, na medida em que tem os seus requisitos próprios e não faz qualquer remissão para o regime já existente.
12.ª Fazendo uma interpretação sistemática do referido preceito, concluir-se-á que entre o artigo 2.º da Lei 26/2011 e os artigos 20.º e seguintes da Portaria 352/2012, as “necessárias adaptações” referidas pelo legislador no artigo 31.º daquela portaria, são referentes precisamente à não aplicação do artigo 26.º do DL 307/2007, na versão dada pela Lei 26/2011.
13.ª É que, com exceção do artigo 20.º/1/e) e f) da Portaria 352/2012, todos os demais artigos aplicáveis são relevantes para que o INFARMED possa apurar se, nos termos do artigo 2.º da Lei 26/2011, estão reunidos os requisitos para que uma farmácia se possa transferir para um concelho limítrofe, pelo que, forçoso será concluir que as “necessárias adaptações” referidas pelo legislador no artigo 31.º da Portaria 352/2012 pressupõem a não aplicação do artigo 26.º do DL 307/2007, na redação dada pela Lei 26/2011, ao regime da transferência de farmácia para concelhos limítrofes.
14.ª Pelo que, o douto Tribunal a quo deveria ter julgado improcedente este vício, assim como a presente ação.”
Igualmente apresentou recurso a contrainteressada, terminando as alegações com a formulação das conclusões que de seguida se transcrevem:
“1. O presente recurso de apelação vem interposto da sentença de fls. dos autos que «julgou a presente acção administrativa procedente e consequentemente anulou a deliberação impugnada», ou seja, a Deliberação do Conselho Directivo do INFARMED, de 14 de Dezembro de 2018, que deferiu o pedido de transferência das instalações da Farmácia M....., propriedade da Contra-Interessada, da Rua ....., n.º ....., ....-... Lisboa, concelho de Lisboa, para a Rua ....., ....., ....-... Charneca de Caparica, concelho de Almada, doravante designada por «decisão recorrida»;
2. A título meramente subsidiário e apenas para o caso de o Tribunal recorrido não rectificar a decisão recorrida, desde já se alega perante o Tribunal Central Administrativo - Sul, ao abrigo do n.º 2 do artigo 614.º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 140.º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, a existência de erro material, que corresponde ao trecho «A contra-interessada também foi citada nos presentes autos, não tendo deduzido contestação.» (cfr. p. 2 da sentença), solicitando-lhe diretamente que proceda à respetiva rectificação, para que passe a ler-se:
«A contra-interessada também foi citada nos presentes autos, tendo deduzido contestação.» (cfr. p. 2 da sentença);
3. A Contra-Interessada, ora Recorrente, considera incorrectamente julgado o ponto da matéria de facto correspondente ao artigo 78.º, da oposição da Contra-Interessada, ora Recorrente; os concretos meios probatórios, constantes do processo, que impunham decisão diversa, é o doc. n.º 5, juntos com a oposição da Contra-Interessada, ora Recorrente, o qual não foi impugnado; e a decisão que, no entender da Recorrente, deve ser proferida é a de Provado que:
«A Deliberação do Conselho Directivo do INFARMED n.º ...../CD/2015, de 29 de Janeiro, tem o teor seguinte:
«Desde a entrada em vigor da Lei n.° 26/2011, de 16 de julho (“Lei 26/2011”) o INFARMED tem entendido que a autorização de transferência de farmácias para concelhos limítrofes estava dependente da emissão de pareceres favoráveis por parte das câmaras municipais dos concelhos de origem e de destino da farmácia a transferir, por aplicação analógica do artigo 26.º/3 do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de agosto, na redação dada pela Lei 26/2011 (“DL 307/2007”).
Este entendimento do INFARMED teve como fundamento o facto de que só com os pareceres das câmaras municipais é que poderia atestar a pertinência da transferência de uma farmácia para um concelho limítrofe para a defesa do interesse público, interesse esse que se consubstancia na boa distribuição de medicamentos e serviços farmacêuticos pela população e pelo território.
Na verdade, porém, e após reanálise desta questão, o INFARMED concluiu que, pelos motivos que de seguida se enunciarão, esse entendimento não é o que melhor se coaduna com a letra e o espírito da lei.
Vejamos.
O regime de transferência de farmácias encontra-se consagrado no artigo 26.° do DL 307/2007, e no artigo 2.º da Lei 26/2011, sendo que, aquele artigo consagra a transferência de farmácias dentro do mesmo concelho, enquanto que este consagra o regime das transferências de farmácias para os concelhos limítrofes da localização original.
O artigo 26.°/1 do DL 307/2007, na redação dada pela Lei 26/2011, estatui que, “sem prejuízo do disposto nos números seguintes, a proprietária pode, dentro do mesmo município, transferir a localização da farmácia, desde que observe as condições de funcionamento.”
Isto é, nos termos do referido artigo, uma farmácia pode transferir-se para uma localização dentro do mesmo concelho desde que observe as condições de funcionamento previstas nos artigos 27.º e seguintes do DL 307/2007) e respeite os demais requisitos materiais e procedimentais constantes do artigo 26.º do DL 307/2007.
Por outro lado, no artigo 2.º da Lei 26/2011, uma farmácia pode transferir-se para um dos concelhos limítrofes do concelho onde se encontra instalada, desde que, para além de serem observadas as condições de funcionamento (previstas nos artigos 27.º e seguintes do DL 307/2007), se verifiquem as seguintes condições: i) a transferência seja para um concelho limítrofe cuja capitação seja superior á capitação mínima, ii) existam farmácias a menos de 350 metros do local onde a farmácia originariamente se encontra instalada, e iii) a capitação no município de origem não se torne superior ao mínimo legalmente exigível para a abertura de novas farmácias.
Note-se que, da análise do regime de transferência de farmácia para concelhos limítrofes não resulta que os requisitos materiais e procedimentais constantes do artigo 26.º do DL 307/2007, sejam avaliados pelo INFARMED no âmbito deste procedimento, porquanto o artigo 2.º da Lei 26/2011 é totalmente omisso a qualquer remissão para o regime de transferência de farmácias dentro do mesmo município.
Posto isto, refira-se que, nos termos do artigo 9.º/1 do CC, “a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições especificas do tempo em que é aplicada”, sendo que, o artigo 9.º/2 do CC estatui que, “não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei o mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso”.
Ou seja, nos termos do Código Civil, a interpretação das normas legais deve ser efetuada tendo por base a consideração dos elementos históricos e sistemáticos, desde que, da consideração desses elementos resulte o mínimo de correspondência verbal com a letra da norma a interpretar.
Assim, cabe fazer uma interpretação histórica e sistemática da norma em análise e posteriormente verificar se a mesma tem correspondência, ainda que imperfeita, com a letra da lei
Ora, fazenda uma interpretação histórica e sistemática do artigo 2.° da Lei 26/2011 resulta que não há qualquer elemento que faça aplicar o artigo 26.º do DL 307/2007, ao procedimento para transferência de farmácias para o concelho limítrofe. Isto porque, antes da entrada em vigor da Lei 26/2011, o DL 307/2007 era omisso quanto à possibilidade da transferência das farmácias de oficina para concelhos limítrofes, na medida em que o artigo 26.º do DL 307/2007, na sua redação inicial, dispunha simplesmente que, “a proprietária pode, dentro do mesmo município, transferir a localização da farmácia, desde que observe as condições de funcionamento”; isto ainda que, nos termos do artigo 38.º da Portaria n.º 1430/2007, de 2 de novembro (“Portaria 1430/2007”) fosse previsto um procedimento administrativo para a transferência de farmácias para os concelhos limítrofes.
Com a entrada em vigor da Lei 26/2011, o legislador para além de modificar os requisitos para a transferência de farmácias dentro do mesmo município, criou a possibilidade de transferência de farmácias para os concelhos limítrofes daqueles em que estão instaladas, isto é, o legislador, a par do regime geral de transferências de farmácias dentro do mesmo concelho, criou um novo regime de transferência de farmácias para concelhos limítrofes.
Ou seja, o legislador, com a entrada em vigor da Lei 26/2011, teve o cuidado de criar um novo regime de transferência de farmácias, regime esse que é absolutamente autónomo do já existente, na medida em que tem os seus requisitos próprios e não faz qualquer remissão para o regime já existente.
Sendo que, da leitura do artigo 2.º da Lei 26/2011, não resulta que haja qualquer omissão por parte do legislador nos requisitos necessários para a transferência de farmácias para concelhos limítrofes. Aliás, nos termos do artigo 9.º/3 do CC o intérprete deve presumir que o legislador consagrou as soluções acertadas e que soube exprimir o seu pensamento, pelo que, nunca seria possível considerar-se que o legislador foi omisso na elaboração do artigo 2.º da Lei 26/2011.
Ou seja, fazendo uma interpretação histórica e sistemática do artigo 2.º da Lei 26/2011 ter-se-á de concluir que o legislador teve o cuidado de separar ambos os regimes de transferência de farmácias, criando para cada um desses regimes os seus requisitos próprios.
E contra o que agora se disse, não se argumente que a artigo 26.º do DL 307/2007, na redação dada pela Lei 26/2011, é aplicável ao regime de transferência de farmácias para os concelhos limítrofes onde estão instaladas, pelo facto de serem aplicáveis a este último regime os artigos 20.º e seguintes da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro (“Portaria 352/2012”) referentes à tramitação procedimental dos pedidos de transferência de farmácias dentro do mesmo concelho.
Isto porque, os artigos 20.° e seguintes da Portaria 352/2012 são aplicáveis aos pedidos de transferência de farmácias para os concelhos limítrofes ex vi artigo 31.° da mesma portaria, artigo este que estatui que “a tramitação do pedido de transferência no artigo 2.º da Lei n.° 26/2011, de 16 de junho, obedece ao disposto nos artigos 20.° e seguintes, com as necessárias adaptações” (ênfase nosso).
Ou seja, a referida Portaria 352/2012 definiu claramente que a tramitação de ambos os procedimentos não é igual ainda que se apliquem os mesmos artigos, na medida em que a aplicação dos artigos 20.° e seguintes da Portaria 352/2012 ao regime de transferência de farmácias para concelhos limítrofes carece de ajustamentos por parte do intérprete /aplicador daquelas normas.
Acresce que, fazendo uma análise sistemática entre o artigo 2.° da Lei 26/2011 e os artigos 20.° e seguintes da Portaria 352/2012, concluiremos que as “necessárias adaptações” referidas pelo legislador no artigo 31º daquela portaria, são referentes precisamente à não aplicação do artigo 26.° do DL 307/2007, na versão dada pela Lei 26/2011.
De facto, com exceção do artigo 20.°/1/e) e f) da Portaria 352/2012 - que no âmbito do regime para transferência de farmácias dentro do mesmo concelho é relevante para determinar o cumprimento dos requisitos materiais e procedimentais previstos no artigo 26.° do DL 307/2007, na redação dada pela Lei 26/2011 - os demais artigos constantes daquele capítulo da Portaria 352/2012 são relevantes para aferir do cumprimento das condições de funcionamento das farmácias que se pretendem transferir, assim como dos requisitos de distância previstos no artigo 3.° da Lei 26/2011.
Isto é, com exceção do artigo 20.º/1/e) e f) da Portaria 352/2012, todos os demais artigos aplicáveis são relevantes para que o INFARMED possa apurar se, nos termos do artigo 3° da Lei 26/2011 estão reunidos os requisitos para que uma farmácia se possa transferir para um concelho limítrofe, pelo que, forçoso será concluir que as “necessárias adaptações” referidas pelo legislador no artigo 31.º da Portaria 352/2012 pressupõem a não aplicação do artigo 26.º do DL 307/2007, na redação dada pela Lei 26/2011, ao regime da transferência de farmácia para concelhos limítrofes.
Ou seja, é absolutamente inequívoco que, fazendo uma interpretação sistemática do artigo 2.º da Lei 26/2011, não é aplicável o artigo 26.º do DL 307/2007, ao regime da transferência de farmácia para concelhos limítrofes, motivo pelo qual o INFARMED, no âmbito dos procedimentos de transferência de farmácias para concelhos limítrofes, deve abandonar o entendimento de que é necessário a emissão de pareceres positivos por parte das câmaras municipais dos concelhos de origem e destino da farmácia a transferir».
4. Por ser essencial para a decisão da causa e por se encontrar provado pelo doc. n.º 5, juntos com a oposição da Contra-Interessada, ora Recorrente, o qual não foi impugnado, requer-se, ao abrigo do disposto no artigo 662.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do disposto no artigo 140.º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, que à matéria de facto da decisão recorrida seja aditado o ponto da matéria de facto correspondente ao artigo 78.º, da oposição da Contra-Interessada, ora Recorrente, nos termos seguintes:
«A Deliberação do Conselho Directivo do INFARMED n.º ...../CD/2015, de 29 de Janeiro, tem o teor seguinte:
«Desde a entrada em vigor da Lei n.° 26/2011, de 16 de julho (“Lei 26/2011”) o INFARMED tem entendido que a autorização de transferência de farmácias para concelhos limítrofes estava dependente da emissão de pareceres favoráveis por parte das câmaras municipais dos concelhos de origem e de destino da farmácia a transferir, por aplicação analógica do artigo 26.º/3 do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de agosto, na redação dada pela Lei 26/2011 (“DL 307/2007”).
Este entendimento do INFARMED teve como fundamento o facto de que só com os pareceres das câmaras municipais é que poderia atestar a pertinência da transferência de uma farmácia para um concelho limítrofe para a defesa do interesse publico, interesse esse que se consubstancia na boa distribuição de medicamentos e serviços farmacêuticos pela população e pelo território.
Na verdade, porém, e após reanálise desta questão, o INFARMED concluiu que, pelos motivos que de seguida se enunciarão, esse entendimento não é o que melhor se coaduna com a letra e o espírito da lei.
Vejamos.
O regime de transferência de farmácias encontra-se consagrado no artigo 26.° do DL 307/2007, e no artigo 2.º da Lei 26/2011, sendo que, aquele artigo consagra a transferência de farmácias dentro do mesmo concelho, enquanto que este consagra o regime das transferências de farmácias para os concelhos limítrofes da localização original.
O artigo 26.°/1 do DL 307/2007, na redação dada pela Lei 26/2011, estatui que, “sem prejuízo do disposto nos números seguintes, a proprietária pode, dentro do mesmo município, transferir a localização da farmácia, desde que observe as condições de funcionamento.”
Isto é, nos termos do referido artigo, uma farmácia pode transferir-se para uma localização dentro do mesmo concelho desde que observe as condições de funcionamento previstas nos artigos 27.º e seguintes do DL 307/2007) e respeite os demais requisitos materiais e procedimentais constantes do artigo 26.º do DL 307/2007.
Por outro lado, no artigo 2.º da Lei 26/2011, uma farmácia pode transferir-se para um dos concelhos limítrofes do concelho onde se encontra instalada, desde que, para além de serem observadas as condições de funcionamento (previstas nos artigos 27.º e seguintes do DL 307/2007), se verifiquem as seguintes condições: i) a transferência seja para um concelho limítrofe cuja capitação seja superior á capitação mínima, ii) existam farmácias a menos de 350 metros do local onde a farmácia originariamente se encontra instalada, e iii) a capitação no município de origem não se torne superior ao mínimo legalmente exigível para a abertura de novas farmácias.
Note-se que, da análise do regime de transferência de farmácia para concelhos limítrofes não resulta que os requisitos materiais e procedimentais constantes do artigo 26.º do DL 307/2007, sejam avaliados pelo INFARMED no âmbito deste procedimento, porquanto o artigo 2.º da Lei 26/2011 é totalmente omisso a qualquer remissão para o regime de transferência de farmácias dentro do mesmo município.
Posto isto, refira-se que, nos termos do artigo 9.º/1 do CC, “a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições especificas do tempo em que é aplicada”, sendo que, o artigo 9.º/2 do CC estatui que, “não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei o mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso”.
Ou seja, nos termos do Código Civil, a interpretação das normas legais deve ser efetuada tendo por base a consideração dos elementos históricos e sistemáticos, desde que, da consideração desses elementos resulte o mínimo de correspondência verbal com a letra da norma a interpretar.
Assim, cabe fazer uma interpretação histórica e sistemática da norma em análise e posteriormente verificar se a mesma tem correspondência, ainda que imperfeita, com a letra da lei
Ora, fazenda uma interpretação histórica e sistemática do artigo 2.° da Lei 26/2011 resulta que não há qualquer elemento que faça aplicar o artigo 26.º do DL 307/2007, ao procedimento para transferência de farmácias para o concelho limítrofe. Isto porque, antes da entrada em vigor da Lei 26/2011, o DL 307/2007 era omisso quanto à possibilidade da transferência das farmácias de oficina para concelhos limítrofes, na medida em que o artigo 26.º do DL 307/2007, na sua redação inicial, dispunha simplesmente que, “a proprietária pode, dentro do mesmo município, transferir a localização da farmácia, desde que observe as condições de funcionamento”; isto ainda que, nos termos do artigo 38.º da Portaria n.º 1430/2007, de 2 de novembro (“Portaria 1430/2007”) fosse previsto um procedimento administrativo para a transferência de farmácias para os concelhos limítrofes.
Com a entrada em vigor da Lei 26/2011, o legislador para além de modificar os requisitos para a transferência de farmácias dentro do mesmo município, criou a possibilidade de transferência de farmácias para os concelhos limítrofes daqueles em que estão instaladas, isto é, o legislador, a par do regime geral de transferências de farmácias dentro do mesmo concelho, criou um novo regime de transferência de farmácias para concelhos limítrofes.
Ou seja, o legislador, com a entrada em vigor da Lei 26/2011, teve o cuidado de criar um novo regime de transferência de farmácias, regime esse que é absolutamente autónomo do já existente, na medida em que tem os seus requisitos próprios e não faz qualquer remissão para o regime já existente.
Sendo que, da leitura do artigo 2.º da Lei 26/2011, não resulta que haja qualquer omissão por parte do legislador nos requisitos necessários para a transferência de farmácias para concelhos limítrofes. Aliás, nos termos do artigo 9.º/3 do CC o intérprete deve presumir que o legislador consagrou as soluções acertadas e que soube exprimir o seu pensamento, pelo que, nunca seria possível considerar-se que o legislador foi omisso na elaboração do artigo 2.º da Lei 26/2011.
Ou seja, fazendo uma interpretação histórica e sistemática do artigo 2.º da Lei 26/2011 ter-se-á de concluir que o legislador teve o cuidado de separar ambos os regimes de transferência de farmácias, criando para cada um desses regimes os seus requisitos próprios.
E contra o que agora se disse, não se argumente que a artigo 26.º do DL 307/2007, na redação dada pela Lei 26/2011, é aplicável ao regime de transferência de farmácias para os concelhos limítrofes onde estão instaladas, pelo facto de serem aplicáveis a este último regime os artigos 20.º e seguintes da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro (“Portaria 352/2012”) referentes à tramitação procedimental dos pedidos de transferência de farmácias dentro do mesmo concelho.
Isto porque, os artigos 20.° e seguintes da Portaria 352/2012 são aplicáveis aos pedidos de transferência de farmácias para os concelhos limítrofes ex vi artigo 31.° da mesma portaria, artigo este que estatui que “a tramitação do pedido de transferência no artigo 2.º da Lei n.° 26/2011, de 16 de junho, obedece ao disposto nos artigos 20.° e seguintes, com as necessárias adaptações” (ênfase nosso).
Ou seja, a referida Portaria 352/2012 definiu claramente que a tramitação de ambos os procedimentos não é igual ainda que se apliquem os mesmos artigos, na medida em que a aplicação dos artigos 20.° e seguintes da Portaria 352/2012 ao regime de transferência de farmácias para concelhos limítrofes carece de ajustamentos por parte do intérprete /aplicador daquelas normas.
Acresce que, fazendo uma análise sistemática entre o artigo 2.° da Lei 26/2011 e os artigos 20.° e seguintes da Portaria 352/2012, concluiremos que as “necessárias adaptações” referidas pelo legislador no artigo 31º daquela portaria, são referentes precisamente à não aplicação do artigo 26.° do DL 307/2007, na versão dada pela Lei 26/2011.
De facto, com exceção do artigo 20.°/1/e) e f) da Portaria 352/2012 - que no âmbito do regime para transferência de farmácias dentro do mesmo concelho é relevante para determinar o cumprimento dos requisitos materiais e procedimentais previstos no artigo 26.° do DL 307/2007, na redação dada pela Lei 26/2011 - os demais artigos constantes daquele capítulo da Portaria 352/2012 são relevantes para aferir do cumprimento das condições de funcionamento das farmácias que se pretendem transferir, assim como dos requisitos de distância previstos no artigo 3.° da Lei 26/2011.
Isto é, com exceção do artigo 20.º/1/e) e f) da Portaria 352/2012, todos os demais artigos aplicáveis são relevantes para que o INFARMED possa apurar se, nos termos do artigo 3° da Lei 26/2011 estão reunidos os requisitos para que uma farmácia se possa transferir para um concelho limítrofe, pelo que, forçoso será concluir que as “necessárias adaptações” referidas pelo legislador no artigo 31.º da Portaria 352/2012 pressupõem a não aplicação do artigo 26.º do DL 307/2007, na redação dada pela Lei 26/2011, ao regime da transferência de farmácia para concelhos limítrofes.
Ou seja, é absolutamente inequívoco que, fazendo uma interpretação sistemática do artigo 2.º da Lei 26/2011, não é aplicável o artigo 26.º do DL 307/2007, ao regime da transferência de farmácia para concelhos limítrofes, motivo pelo qual o INFARMED, no âmbito dos procedimentos de transferência de farmácias para concelhos limítrofes, deve abandonar o entendimento de que é necessário a emissão de pareceres positivos por parte das câmaras municipais dos concelhos de origem e destino da farmácia a transferir.».
5. O disposto no artigo 26.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de Agosto, na redacção introduzida pelo artigo 1.º, da Lei n.º 26/2011, de 16 de Junho, aplica-se, exclusivamente, à transferência de farmácias dentro do mesmo município, e não se aplica à transferência de uma farmácia para outro concelho limítrofe;
6. Conforme demonstra, de modo exaustivo, o Parecer proferido pelo Prof. Doutor MIGUEL PRATA ROQUE, ora junto, a interpretação normativa extraída pela decisão recorrida, de acordo com a qual o artigo 31.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de Outubro, faria estender aos procedimentos de transferência de farmácias para um concelho limítrofe todo o regime aplicável à transferência dentro do mesmo concelho (incluindo a exigência de parecer, por força do n.º 3 do artigo 26.º do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de Agosto), apresenta-se como absolutamente inadmissível, porque:
a) Corresponderia a uma restrição “inidónea” (ou “inapta”) da liberdade de iniciativa privada da Recorrente, o que ofenderia o “princípio da proporcionalidade”;
b) Corresponderia a uma restrição “desproporcionada (em sentido estrito)” (ou “excessiva”) da liberdade de iniciativa privada da Recorrente, o que ofenderia o “princípio da proporcionalidade”;
c) Pressuporia que uma norma regulamentar (cfr. artigo 31.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de Outubro) poderia prevalecer sobre uma norma legal (a saber: o artigo 2.º da Lei n.º 26/2011, de 16 de Junho), impondo, apenas por via regulamentar, uma obrigatoriedade de parecer que não constava diretamente da competente lei;
d) Implicaria que se aplicasse uma restrição ao direito fundamental da Recorrente por via de mera interpretação extensiva analógica, em violação da regra “odiosa est restringenda” (que impede que se restrinjam direitos fundamentais sem a existência de lei prévia, certa e clara) e do princípio da “separação de poderes”;
e) Configuraria uma violação da exigência constitucional de “reserva de lei” (cfr. artigo 18.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa), pois permitiria restringir a liberdade de iniciativa privada através de um mero regulamento administrativo e não por via de ato legislativo;
f) Implicaria uma inconstitucionalidade de tal interpretação normativa, visto que ofenderia a proibição constitucional de que um regulamento possa interpretar, corrigir ou revogar o sentido normativo expresso por uma lei prévia (cfr. artigo 112.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa), o que, no limite, configuraria uma violação do “princípio da separação de poderes”;
7. O artigo 31.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de Outubro – usado pela decisão recorrida como fundamento para estender o parecer exigido pelo n.º 3 do artigo 26.º do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de Agosto, à transferência de farmácias para um concelho limítrofe – não pode servir de base habilitante para tal raciocínio extensivo, visto que o mesmo corresponde a uma mera norma regulamentar, que não pode prevalecer (nem prevalece) sobre a lei que o mesmo visou (apenas) regulamentar; isto é, o Regime Jurídico das Farmácias de Oficina e, em especial, o artigo 2.º da Lei n.º 26/2011, de 16 de Junho;
8. Para além disso, o n.º 1 do artigo 91.º, do Código de Procedimento Administrativo, exige que só a lei possa fixar como obrigatório (ou vinculativo) qualquer parecer técnico a proferir por órgão consultivo. Isto é, aquele preceito legal não admite que a obrigatoriedade de parecer jurídico decorra de mera norma regulamentar; como é o caso do artigo 31.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de Outubro, na interpretação (errada) que lhe foi dada pela decisão recorrida;
9. Assim sendo – e conforme impõe o artigo 112.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa – não pode um regulamento administrativo (como é o caso da Portaria n.º 352/2012, de 30 de Outubro) impor a obrigatoriedade de um parecer quando tal não resulta expressamente da lei aplicável, sob pena de perversão da relação de supremacia hierárquico- administrativa entre lei e regulamento (cfr. artigo 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa);
10. Os pressupostos que se aplicam à transferência de uma farmácia para outro concelho limítrofe são apenas os que constam do disposto no artigo 2.º da Lei n.º 26/2011, de 16 de Junho, não lhe sendo aplicável o disposto no artigo 26.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de Agosto, na redacção introduzida pelo artigo 1.º, da Lei n.º 26/2011, de 16 de Junho, motivo pelo qual, o artigo 31.º, da Portaria n.º 352/2012, de 30 de Outubro, que regulamenta o procedimento de licenciamento e de atribuição de alvará a novas farmácias, bem como a transferência da localização de farmácias e o averbamento no alvará, estabelece que a tramitação do pedido de transferência previsto no artigo 2.º da Lei n.º 26/2011, de 16 de junho, obedece ao disposto nos artigos 20.º e seguintes, com as necessárias adaptações, as se prendem, precisamente, com o facto de não haver lugar à emissão de parecer prévio da câmara municipal competente em razão do território, previsto no artigo 26.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de Agosto, na redacção introduzida pelo artigo 1.º, da Lei n.º 26/2011, de 16 de Junho;
11. Para que não houvesse quaisquer dúvidas, de acordo com a Deliberação do Conselho Directivo do INFARMED n.º ...../CD/2015, de 29 de Janeiro, que a decisão recorrida ignorou completamente, no que respeita à transferência de farmácias situadas em municípios com uma capitação inferior à exigível para a abertura de novas farmácias, para os concelhos limítrofes com capitação superior, não há lugar à emissão de parecer prévio da câmara municipal competente em razão do território, previsto no artigo 26.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de Agosto, na redacção introduzida pelo artigo 1.º, da Lei n.º 26/2011, de 16 de Junho;
12. Com os fundamentos constantes da Deliberação do Conselho Directivo do INFARMED n.º ...../CD/2015, de 29 de Janeiro, na transferência das instalações da Farmácia M....., propriedade da Contra- Interessada, ora Recorrente, da Rua ....., n.º ....., ....-... Lisboa, concelho de Lisboa, para a Rua ....., ....., ....-... Charneca de Caparica, concelho de Almada, ou seja, para um concelho limítrofe do concelho de Lisboa, não havia lugar à emissão de parecer prévio da câmara municipal competente em razão do território, previsto no artigo 26.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de Agosto, na redacção introduzida pela Lei n.º 26/2011, de 16 de Junho, pelo que a deliberação impugnada não é ilegal por violação do disposto no artigo 26.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de Agosto, na redacção introduzida pelo artigo 1.º, da Lei n.º 26/2011, de 16 de Junho;
13. A decisão recorrida, ao ter anulado a deliberação impugnada, ou seja, a Deliberação do Conselho Directivo do INFARMED, de 14 de Dezembro de 2018, que deferiu o pedido de transferência das instalações da Farmácia M....., propriedade da Contra-Interessada, da Rua ....., n.º ....., ....-... Lisboa, concelho de Lisboa, para a Rua ....., ....., ....-... Charneca de Caparica, concelho de Almada, por ter concluído que a decisão de transferência de uma farmácia para outro concelho limítrofe tem de ser antecedida do necessário parecer prévio dos órgãos autárquicos, violou o disposto no artigo 26.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de Agosto, na redacção introduzida pelo artigo 1.º, da Lei n.º 26/2011, de 16 de Junho, o artigo 2.º, da Lei n.º 26/2011, de 16 de Junho, e o artigo 31.º, da Portaria n.º 352/2012, de 30 de Outubro, padecendo, assim, de erro de julgamento da matéria de direito;
14. Por fim, Mesmo que se equacionasse a obrigatoriedade de parecer por parte da competente câmara municipal (o que não se admite, mas por mera cautela de patrocínio se pondera), sempre se diria que a falta de parecer obrigatório apenas configuraria uma preterição de “formalidade não essencial”;
15. Ora, a jurisprudência consolidada nos tribunais administrativos portugueses tem vindo a admitir que, quando apenas esteja em causa uma preterição de “formalidade não essencial” (como é o caso), se pode concluir pela verificação de uma “mera irregularidade” e, assim, proceder-se ao aproveitamento dos efeitos jurídicos do ato administrativo (pretensamente) ilegal (nesse sentido, ver os Acórdãos do STA, proferidos, respectivamente, em 12 de Maio de 1998, Proc. n.º 32880, e em 20 de junho de 2012, Proc. n.º 01013/11;
16. Esse entendimento jurisprudencial viria, aliás, a ganhar foros legislativos, com a reforma do Código de Procedimento Administrativo, de 2015, que consagrou um mecanismo de aproveitamento de efeitos de atos administrativos anuláveis, consagrado, hoje, no n.º 5 do artigo 163.º do Código de Procedimento Administrativo vigente;
17. Ora, mesmo que o parecer obrigatório previsto no n.º 3 do artigo 26.º do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de Agosto, tivesse sido proferido, certo é que – conforme melhor demonstra o Parecer do Prof. Doutor MIGUEL PRATA ROQUE, já junto – o conteúdo vinculado do ato administrativo proferido pelo INFARMED seria sempre o mesmo; isto é, a solicitação (e eventual emissão) de parecer nunca afetaria o sentido da decisão proferida, visto que o conteúdo da mesma é vinculado, por se cingir à verificação do preenchimento das condições legais fixadas pelo artigo 2.º da Lei n.º 26/2011, de 16 de Junho;
18. Para além disso, o mesmo resultado se extrairia da alínea b) do n.º 5 do artigo 163.º, do Código de Procedimento Administrativo, visto que existiam outros meios que alcançavam, de modo idêntico, o fim visado pela (pretensa) exigência de parecer. Com efeito, não só se impõe a junção, pelos requerentes da transferência, de uma certidão camarária que ateste o cumprimento dos requisitos legais de distância, como as demais condições legais carecem de prova documental a juntar por aqueles requerentes e a ser avaliada pelo INFARMED;
19. Em suma, mesmo que se equacionasse ter havido, de facto, preterição de um parecer obrigatório (o que não se concede, mas por mera cautela de patrocínio se pondera), certo é que essa preterição apenas incide sobre uma “formalidade não essencial”, que não só não seria apta a afetar o sentido final da decisão proferida, como foi suficientemente acautelada por outras vias procedimentais. Razão pela qual, por aplicação das alíneas a) e b) do n.º 5 do artigo 163.º, do Código de Procedimento Administrativo, sempre deveriam ter sido (e deverão ser) preservados os efeitos jurídico- administrativos da decisão proferida pelo INFARMED em 14 de Dezembro de 2018.”
A autora recorre da sentença na parte em que julgou improcedente o vício da invalidade invocado relativamente à errada consideração do Município de Almada como concelho limítrofe, concluindo as suas alegações como seguidamente se transcreve:
“1.ª A douta sentença deverá ser reformada quanto a custas na parte em imputou à Autora a responsabilidade pelas custas do processo, considerando erradamente ter sido esta que lhe deu causa quando o certo é que, tendo o ato impugnado sido anulado, a responsabilidade pelas custas da ação devem ser imputadas a quem o praticou ilegalmente.
2.ª Ao contrário do entendimento expresso na sentença recorrida, Almada e Lisboa não são «limítrofes» para efeitos de aplicação do regime excecional de transferência de farmácias previsto no artigo 2.º da Lei n.º 26/2011, de 16 de junho e 20.º segts., maxime, art. 31.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro, pelo que a sentença recorrida enferma de erro de julgamento e viola tais normas delas fazendo errada interpretação.
3.ª Interpretar a expressão «limítrofes» usada pelo legislador com o sentido de «muito próximos» ou «vizinhos» - como erradamente o fez a sentença recorrida –, é violar o limite negativo do elemento literal, apelando para um segundo sentido imprestável para a operação de hermenêutica, convocando um sentido figurado, funcionalmente válido apenas para coisas que não têm limites definidos, o que não é o caso dos concelhos, constituindo estes circunscrições territoriais com limites cartograficamente definidos.
4.ª A solução expressa no artigo 2.º da Lei n.º 26/2011 constitui um equilíbrio delicado entre os fins de salvaguarda da acessibilidade das populações aos medicamentos, de viabilidade económica das farmácias ou de melhoria dos serviços farmacêuticos de promoção de saúde e do bem- estar dos utentes e os princípios da concorrência e da igualdade.
5.ª O legislador de 2011 entendeu que a transferência de farmácias para concelhos limítrofes era, conjuntamente com a transferência intraconcelho, aquela solução que implicava um melhor equilíbrio dos interesses em jogo, porque entre concelhos limítrofes (com mercados tendencialmente semelhantes e concorrentes entre si) não havia o risco de introduzir distorções na concorrência ou de abrir fugas ao regime concursal de licenciamento.
6.ª Interpretar a norma em apreço como o fizeram o Recorrido e o Tribunal a quo passaria por permitir algo que o legislador nunca quis permitir: a transferência de farmácias entre concelhos vizinhos (não limítrofes), criando uma solução ao arrepio do pensamento do legislador e que o legislador nunca pretendeu ver consagrada, em violação das regras de interpretação da lei (artigo 9.º do Código Civil).
7.ª “Limítrofes” do concelho de Lisboa para efeitos de aplicação do regime excecional de transferência de farmácias previsto no artigo 2.º da Lei n.º 26/2011, de 16 de junho e 20.º segts., maxime, art. 31.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro, são os concelhos de Amadora, Oeiras, Odivelas e Loures e já não os concelhos de Cascais, Seixal, Barreiro, Almada, Moita, Montijo ou Alcochete.”
A contrainteressada apresentou contra-alegações, ampliando o âmbito do recurso interposto, e terminando as mesmas com a formulação das conclusões que de seguida se transcrevem:
“1. Nos termos do disposto no artigo 636.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, a Recorrida impugna, a título subsidiário, a decisão proferida sobre a matéria de facto, no que respeita aos artigos 38.º, 39.º, 40.º, 42.º, 43.º, 44.º, 45.º, 47.º, 49.º, 50.º, 51.º, 53.º, 54.º, 56.º, 57.º, 58.º, 59.º, 61.º e 62.º, da oposição;
2. Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 640.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, a Recorrida considera incorrectamente julgados os pontos da matéria de facto correspondentes aos artigos 38.º, 39.º, 40.º, 42.º, 43.º, 44.º, 45.º, 47.º, 49.º, 50.º, 51.º, 53.º, 54.º, 56.º, 57.º, 58.º, 59.º, 61.º e 62.º, da oposição; os concretos meios probatórios, constantes do processo, que impunham decisão diversa, são os docs. n.ºs 2, 3 e 4, juntos com a oposição da Recorrida, os quais não foram impugnados pela Recorrente; e a decisão que, no entender do Recorrida, deve ser proferida é a de Provado que:
«O Aviso n.º 15115/2008, no Diário da República, 2.ª série, n.º 94, de 15 de Maio de 2008, considera concelhos limítrofes do concelho de Lisboa, com capitação superior prevista na lei (concelhos de destino), os concelhos seguintes:
o Moita (Setúbal);
o Amadora;
o Loures;
o Odivelas;
o Almada (Setúbal); o Seixal (Setúbal); o Barreiro (Setúbal); o Oeiras;
o Alcochete (Setúbal).
O Aviso n.º 15115/2008, no Diário da República, 2.ª série, n.º 94, de 15 de Maio de 2008, considera concelhos limítrofes do concelho do Porto, com capitação superior prevista na lei (concelhos de destino), os concelhos seguintes:
o Matosinhos;
o Maia;
o Gondomar;
o Vila Nova de Gaia, separado do concelho do Porto pelo Rio Douro.
O Aviso n.º 15115/2008, no Diário da República, 2.ª série, n.º 94, de 15 de Maio de 2008, considera concelhos limítrofes do concelho de Santarém, com capitação superior prevista na lei (concelhos de destino), o concelho de Almeirim, separado do concelho de Santarém pelo Rio Tejo.
Por deliberação de 24 de novembro de 2017, do Conselho Diretivo do INFARMED
– Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia B....., sita na Avenida ..... n.º ....., freguesia de Avenidas Novas, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Estrada ..... n.º ..... e n.º ....., União das freguesias de Laranjeiro e Feijó, concelho de Almada, distrito de Setúbal.
Por despacho de 10 de outubro de 2013, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia C....., sita na Rua ..... n.ºs ....., freguesia de São Nicolau, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Rua ..... n.º ....., localidade ....., freguesia Charneca de Caparica, concelho de Almada, distrito de Setúbal.
Por despacho de 27 de fevereiro de 2015, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia M....., sita na Avenida ..... n.º ....., freguesia de Anjos, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a localidade ....., Rua ..... n.º ....., Loja ....., União das freguesias de Laranjeiro e Feijó, concelho de Almada, distrito de Setúbal.
Por despacho de 30 de março de 2015, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia I....., sita na Avenida ..... n.º ....., freguesia de Alvalade, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Rua ..... n.º ..... e n.º ....., União das freguesias de Laranjeiro e Feijó, concelho de Almada, distrito de Setúbal.
Por deliberação de 15 de maio de 2017, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia G....., sita na Avenida ..... n.º ....., freguesia de Areeiro, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Rua ..... n.º ....., União das freguesias de Alto do Seixalinho, Santo André e Verderena, concelho do Barreiro, distrito de Setúbal. Publicado em 19.05.2017.
Por despacho de 02 de Dezembro de 2008, do Conselho Directivo do INFARMED
– Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 24.º da Portaria n.º 1430/2007, de 2 de Novembro de 2007, no que se refere ao local, ao espaço e ao quadro farmacêutico, o pedido de transferência da Farmácia G..... Lda, sita na Rua ..... n.º ....., freguesia de Encarnação, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Avenida ..... n.º ..... e ....., freguesia de Corroios, concelho de Seixal, distrito de Setúbal.
Por deliberação de 09 de junho de 2016, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia S....., sita na Rua ..... n.º ....., freguesia de Santa Maria Maior, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Praceta ..... n.º ..... e ....., ....., União das freguesias do Seixal, Arrentela e Aldeia de Paio Pires, concelho de Seixal, distrito de Setúbal.
Por deliberação de 13 de julho de 2018, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia P....., sita no Campo ....., n.º ....., freguesia de Arroios, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Avenida ....., n.º ....., União das freguesias do Seixal, Arrentela e Aldeia de Paio Pires, concelho do Seixal, distrito de Setúbal.
Por despacho de 11 de janeiro de 2016, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia C....., sita na Av. ..... n.º ....., freguesia de Avenidas Novas, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Rua ....., ....., Loja …, freguesia de Alhos Vedros, concelho da Moita, distrito de Setúbal.
Por deliberação de 20 de dezembro de 2017, do Conselho Diretivo do INFARMED
– Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia S....., sita na Avenida ....., n.º ....., freguesia de Avenidas Novas, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Rua ....., n.º … e …, localidade de ....., freguesia de Alhos Vedros, concelho da Moita, distrito de Setúbal.
Por despacho de 09 de novembro de 2012, do Conselho Directivo do INFARMED
– Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 3 de Outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia ....., sita na Avenida ..... n.º ....., freguesia de São João de Deus, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para o Fórum ....., Loja n.º ....., Zona ..... – Rua ....., freguesia de Afonsoeiro, concelho de Montijo, distrito de Setúbal.
Por despacho de 02 de dezembro de 2013, do Conselho Diretivo do INFARMED
– Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia C....., sita na Rua ..... n.º ....., freguesia de São Jorge de Arroios, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Rua ..... n.º ....., freguesia do Montijo, concelho do Montijo, distrito de Setúbal.
Por despacho de 08 de janeiro de 2014, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia S....., sita na Rua ..... n.ºs ....., freguesia de Santos o Velho, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Praça ..... n.º ....., freguesia de Afonsoeiro, concelho do Montijo, distrito de Setúbal.
Por deliberação de 03 de agosto de 2017, do Conselho Diretivo do INFARMED
– Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia E....., sita na Rua ..... n.º ....., freguesia de Penha de França, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Avenida ....., ....., União das freguesias do Montijo e Afonseiro, concelho do Montijo.
Por deliberação de 30 de março de 2016, do Conselho Diretivo do INFARMED
– Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia B....., sita na Praça ..... n.º ....., freguesia de Santo Ildefonso, concelho do Porto, distrito do Porto, para a Avenida ..... n.º ....., freguesia de Arcozelo, concelho de Vila Nova de Gaia, distrito do Porto.
Por despacho de 08 de janeiro de 2013, do Conselho Directivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia G....., sita na Rua ..... n.º ....., freguesia de Cedofeita, concelho do Porto, distrito do Porto, para a Rua ..... n.º ....., freguesia de São Félix da Marinha, concelho de Vila Nova de Gaia.»
3. Os pontos da matéria de facto correspondentes aos artigos 38.º, 39.º, 40.º, 42.º, 43.º, 44.º, 45.º, 47.º, 49.º, 50.º, 51.º, 53.º, 54.º, 56.º, 57.º, 58.º, 59.º, 61.º e 62.º, da oposição, são relevantes para a decisão da causa, pois, a Recorrente invocou que o acto suspendendo, que deferiu o pedido de transferência das instalações da Farmácia M....., propriedade da Recorrida, da Rua ....., n.º ....., ....-... Lisboa, concelho de Lisboa, para a Rua ....., ....., ....-... Charneca de Caparica, concelho de Almada, era ilegal, por violação do disposto no artigo 2.º, da Lei n.º 26/2011, de 16 de Junho, porque os concelhos de Lisboa e de Almada não seriam, alegadamente, concelhos limítrofes, e encontram-se provados pelos docs. n.ºs 2, 3 e 4, juntos com a oposição da Recorrida, os quais não foram impugnados pela Recorrente;
4. Por serem relevantes para a decisão da causa e por se encontrarem provados pelos docs. n.ºs 2, 3 e 4, juntos com a oposição da Recorrida, os quais não foram impugnados pela Recorrente, requer-se, ao abrigo do disposto no artigo 662.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do disposto no artigo 140.º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, que à matéria de facto da decisão recorrida sejam aditados os pontos da matéria de facto correspondentes aos artigos 38.º, 39.º, 40.º, 42.º, 43.º, 44.º, 45.º, 47.º, 49.º, 50.º, 51.º, 53.º, 54.º, 56.º, 57.º, 58.º, 59.º, 61.º e 62.º, da oposição, nos termos seguintes:
«O Aviso n.º 15115/2008, no Diário da República, 2.ª série, n.º 94, de 15 de Maio de 2008, considera concelhos limítrofes do concelho de Lisboa, com capitação superior prevista na lei (concelhos de destino), os concelhos seguintes:
o Moita (Setúbal);
o Amadora;
o Loures;
o Odivelas;
o Almada (Setúbal); o Seixal (Setúbal); o Barreiro (Setúbal); o Oeiras;
o Alcochete (Setúbal).
O Aviso n.º 15115/2008, no Diário da República, 2.ª série, n.º 94, de 15 de Maio de 2008, considera concelhos limítrofes do concelho do Porto, com capitação superior prevista na lei (concelhos de destino), os concelhos seguintes:
o Matosinhos;
o Maia;
o Gondomar;
o Vila Nova de Gaia, separado do concelho do Porto pelo Rio Douro.
O Aviso n.º 15115/2008, no Diário da República, 2.ª série, n.º 94, de 15 de Maio de 2008, considera concelhos limítrofes do concelho de Santarém, com capitação superior prevista na lei (concelhos de destino), o concelho de Almeirim, separado do concelho de Santarém pelo Rio Tejo.
Por deliberação de 24 de novembro de 2017, do Conselho Diretivo do INFARMED
– Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia B....., sita na Avenida ..... n.º ....., freguesia de Avenidas Novas, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Estrada ..... n.º ..... e n.º .........., União das freguesias de Laranjeiro e Feijó, concelho de Almada, distrito de Setúbal.
Por despacho de 10 de outubro de 2013, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia C....., sita na Rua ..... n.ºs ....., freguesia de São Nicolau, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Rua ..... n.º ....., localidade ....., freguesia Charneca de Caparica, concelho de Almada, distrito de Setúbal.
Por despacho de 27 de fevereiro de 2015, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia M....., sita na Avenida ..... n.º ....., freguesia de Anjos, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a localidade ....., Rua ..... n.º 5, Loja ....., União das freguesias de Laranjeiro e Feijó, concelho de Almada, distrito de Setúbal.
Por despacho de 30 de março de 2015, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia I....., sita na Avenida ..... n.º ....., freguesia de Alvalade, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Rua ..... n.º ..... e n.º ....., União das freguesias de Laranjeiro e Feijó, concelho de Almada, distrito de Setúbal.
Por deliberação de 15 de maio de 2017, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia G....., sita na Avenida ..... n.º ....., freguesia de Areeiro, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Rua ..... n.º ....., União das freguesias de Alto do Seixalinho, Santo André e Verderena, concelho do Barreiro, distrito de Setúbal. Publicado em 19.05.2017.
Por despacho de 02 de Dezembro de 2008, do Conselho Directivo do INFARMED
– Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 24.º da Portaria n.º 1430/2007, de 2 de Novembro de 2007, no que se refere ao local, ao espaço e ao quadro farmacêutico, o pedido de transferência da Farmácia G..... Lda, sita na Rua ..... n.º ....., freguesia de Encarnação, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Avenida ..... n.º ..... e ....., freguesia de Corroios, concelho de Seixal, distrito de Setúbal.
Por deliberação de 09 de junho de 2016, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia S....., sita na Rua ..... n.º ....., freguesia de Santa Maria Maior, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Praceta ..... n.º 6 e 6-A, ....., União das freguesias do Seixal, Arrentela e Aldeia de Paio Pires, concelho de Seixal, distrito de Setúbal.
Por deliberação de 13 de julho de 2018, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia P....., sita no Campo ....., n.º ....., freguesia de Arroios, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Avenida ....., n.º ....., União das freguesias do Seixal, Arrentela e Aldeia de Paio Pires, concelho do Seixal, distrito de Setúbal.
Por despacho de 11 de janeiro de 2016, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia C....., sita na Av. ..... n.º ....., freguesia de Avenidas Novas, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Rua ....., ....., Loja ….., freguesia de Alhos Vedros, concelho da Moita, distrito de Setúbal.
Por deliberação de 20 de dezembro de 2017, do Conselho Diretivo do INFARMED
– Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia S....., sita na Avenida ....., n.º ....., freguesia de Avenidas Novas, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Rua ....., n.º … e …, localidade de ....., freguesia de Alhos Vedros, concelho da Moita, distrito de Setúbal.
Por despacho de 09 de novembro de 2012, do Conselho Directivo do INFARMED
– Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia ....., sita na Avenida ..... n.º ....., freguesia de São João de Deus, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para o Fórum Montijo, Loja n.º ....., Zona ..... – Rua ....., freguesia de Afonsoeiro, concelho de Montijo, distrito de Setúbal.
Por despacho de 02 de dezembro de 2013, do Conselho Diretivo do INFARMED
– Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia C....., sita na Rua ..... n.º ....., freguesia de São Jorge de Arroios, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Rua ..... n.º ....., freguesia do Montijo, concelho do Montijo, distrito de Setúbal.
Por despacho de 08 de janeiro de 2014, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia S....., sita na Rua ..... n.ºs ....., freguesia de Santos o Velho, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Praça ..... n.º ....., freguesia de Afonsoeiro, concelho do Montijo, distrito de Setúbal.
Por deliberação de 03 de agosto de 2017, do Conselho Diretivo do INFARMED
– Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia E....., sita na Rua ..... n.º ....., freguesia de Penha de França, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Avenida ....., ....., União das freguesias do Montijo e Afonseiro, concelho do Montijo.
Por deliberação de 30 de março de 2016, do Conselho Diretivo do INFARMED
– Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia B....., sita na Praça ..... n.º ....., freguesia de Santo Ildefonso, concelho do Porto, distrito do Porto, para a Avenida ..... n.º ....., freguesia de Arcozelo, concelho de Vila Nova de Gaia, distrito do Porto.
Por despacho de 08 de janeiro de 2013, do Conselho Directivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia G....., sita na Rua ..... n.º ....., freguesia de Cedofeita, concelho do Porto, distrito do Porto, para a Rua ..... n.º ....., freguesia de São Félix da Marinha, concelho de Vila Nova de Gaia.»
5. O artigo 2.º da Lei n.º 26/2011 limita-se a condicionar a transferência de uma farmácia ao facto de ela ser feita para um “concelho limítrofe”, nunca exigindo que ela seja transferida para um concelho identificado pela Carta Administrativa Oficial de Portugal identifique, em mapa cartográfico, com linhas divisórias contíguas;
6. O único órgão que dispõe de competências constitucionais para fixar os limites territoriais das circunscrições administrativas autárquicas (e, em especial, dos municípios) é a Assembleia da República, nos termos da alínea n) do artigo 164.º, do n.º 3 do artigo 236.º e do artigo 249.º, todos da Constituição da República Portuguesa;
7. A Direcção-Geral do Território não dispõe de competências para fixar os limites territoriais das circunscrições administrativas autárquicas; em especial, dos municípios e respectivas áreas territoriais concelhias, sendo que as suas competências se circunscrevem a uma determinação dos limites territoriais para fins cadastrais e cartográficos; isto é, para efeitos de planeamento e de ordenamento do território;
8. A Carta Administrativa Oficial de Portugal não dispõe de qualquer valor normativo, nem é critério de legalidade, visto que se limita a ser um instrumento técnico – in casu, de natureza cartográfica –, cuja competência para a sua elaboração e conservação cabe à Direcção-Geral do Território, nos termos da alínea l) do artigo 2.º do Decreto Regulamentar n.º 30/2012, de 13 de março;
9. A Carta Administrativa Oficial de Portugal tem sido alvo de inúmeras correcções, sendo que a própria Direcção-Geral do Território admite a falibilidade da mesma, pois requer às entidades públicas e privadas que lhe comuniquem quaisquer incorrecções, inexactidões ou omissões, através do seu sítio electrónico;
10. Por se fundar apenas num regulamento administrativo (isto é, no Decreto Regulamentar n.º 30/2012, de 13 de março) e não na lei, a Carta Administrativa Oficial de Portugal não pode interpretar, integrar, modificar, suspender ou revogar a norma extraída do artigo 2.º da Lei n.º 26/2011, de 16 de Junho, fixando os limites territoriais dos concelhos de Lisboa e de Almada;
11. A noção jurídico-constitucional de “território” não se limita a abranger a plataforma terrestre, também incluindo a zona marítima (mar territorial e zona económica exclusiva), as águas de transição (entre zona marítima e zona fluvial), as águas interiores (fluviais e lacustres), o subsolo terrestre e até a atmosfera, pelo que não subsiste nenhum obstáculo que impeça de considerar que os concelhos de Lisboa e Almada se encontram ligados pelo Rio Tejo e, portanto, são contíguos ou limítrofes;
12. Os concelhos são limítrofes quando entre eles não se interpõe outro concelho, pelo que os concelhos de Almada, Seixal, Barreiro, Montijo e Alcochete são concelhos limítrofes face a Lisboa, visto que nenhum outro concelho se interpõe entre eles;
13. E tanto assim é que – conforme melhor se demonstra, mais amplamente, nas motivações das presentes alegações – o INFARMED tem vindo a proferir sucessivas decisões administrativas, nos termos das quais autorizou a transferência de farmácias situadas em Lisboa para os concelhos de Almada, Seixal, Barreiro, Montijo e Alcochete, considerando-os, assim, como concelhos limítrofes, para os efeitos do artigo 2.º da Lei n.º 26/2011, de 16 de Junho;
14. As referidas decisões geraram uma força de precedente administrativo, pelo que o INFARMED encontra-se vinculado a proferir decisão favorável à Recorrida, em homenagem ao princípio da igualdade (cfr. artigos 13.º e 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa, e artigo 6.º da Constituição da República Portuguesa), bem como ao princípio da segurança jurídica (cfr. artigos 2.º e 266.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa), em especial, na sua dimensão de proibição de frustração da confiança suscitada na contraparte, por força de uma conduta reiterada (cfr. artigo 10.º, n.º 2, do Código de Procedimento Administrativo);
15. Nos termos da alínea d) do artigo 152.º do Código de Procedimento Administrativo, sempre que um órgão administrativo entenda decidir de modo diferente da prática habitualmente seguida na resolução de casos semelhantes, deve proceder a uma fundamentação reforçada das razões que a conduziram a essa mudança, sendo que, no presente caso, não existe qualquer razão de interesse público que justificasse tal mudança, abrupta e inesperada, do sentido decisório até aqui adoptado, quanto à interpretação do artigo 2.º da Lei n.º 26/2011, de 16 de Junho;
16. Acresce que, tratando-se do exercício de poderes discricionários – como são os poderes de autorizar a transferência de farmácia para um concelho limítrofe – não poderia o Tribunal Central Administrativo – Sul conhecer dessa questão, quer por lhe estar legalmente vedada (cfr. artigo 3.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos), quer por isso implicar uma mudança do sentido decisório anteriormente adoptado pelo INFARMED, sem a devida fundamentação reforçada;
17. Por outro lado, não estabelecendo o artigo 2.º da Lei n.º 26/2011, de 16 de Junho, qualquer restrição explícita que permitisse interpretar “concelhos limítrofes” como apenas aqueles que mantêm uma ligação terrestre contígua, não pode o intérprete/aplicador interpretar aquele preceito de modo restritivo, pois tal configuraria uma restrição implícita constitucionalmente vedada, por força do n.º 3 do artigo 18.º da Constituição da República Portuguesa, a um direito fundamental; in casu, à liberdade de iniciativa económica (cfr. artigo 61.º da Constituição da República Portuguesa), que é um direito análogo a um direito, liberdade e garantia (cfr. artigo 17.º da Constituição da República Portuguesa);
18. Caso se interpretasse o conceito de “concelho limítrofe” de modo a que tal dependesse de a Carta Administrativa Oficial de Portugal expressamente cartografar os limites geográficos de dois concelhos em linha contígua, estar-se-ia a proceder a uma verdadeira interpretação correctiva daquele artigo 2.º da Lei n.º 26/2011, de 16 de Junho, que se apresenta como inadmissível, à luz do princípio da separação de poderes (cfr. artigo 111.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa);
19. Ao invés, a interpretação do artigo 2.º da Lei n.º 26/2011, de 16 de Junho, tal como adoptada pela decisão recorrida, não briga ou sequer afecta o regime geral de licenciamento prévio mediante concurso, visto que apenas se aplica a dois concelhos vizinhos, contíguos e, portanto, limítrofes, coadunando-se, perfeitamente, com o objectivo de estabelecer um regime excepcional que permita aliviar o concelho de origem de um número excessivo de farmácias e beneficiar o concelho vizinho com o aumento de oferta de farmácias;
20. O acto suspendendo, que deferiu o pedido de transferência das instalações da Farmácia M....., propriedade da Recorrida, da Rua ....., n.º ....., ....-... Lisboa, concelho de Lisboa, para a Rua ....., ....., ....-... Charneca de Caparica, concelho de Almada, ou seja, para um concelho limítrofe do concelho de Lisboa, não é ilegal por violação do disposto no artigo 2.º, da Lei n.º 26/2011, de 16 de Junho, pelo que, nesta parte que foi alvo de impugnação, mediante recurso, pela Recorrente, a decisão recorrida não merece qualquer censura, devendo ser mantida nos seus precisos termos.”
A entidade demandada apresentou contra-alegações, concluindo dever ser negado provimento ao recurso interposto pela autora.
Igualmente apresentou contra-alegações a autora, concluindo como segue:
“1.ª Improcede (e é inconsequente e inútil), a impugnação da matéria de facto quanto à pretensão de passar a dar-se como provada a existência e o teor da deliberação cuja existência foi alegada no artigo 78.º da oposição da contrainteressada, pois tal deliberação e o seu teor nunca foram controvertidos nem apresentam especial relevo ou interesse para a decisão da lide, sendo certo que do elenco da matéria de facto só devem figurar os factos relevantes para a decisão da causa com interesse para a decisão, sem prejuízo da existência de outros factos provados, designadamente de todo o acervo documental que se encontra junto ao processo e que se encontra provado.
2.ª Contrariamente ao que defende a entidade administrativa recorrente, o Tribunal a quo decidiu bem ao julgar improcedente a exceção de ilegitimidade ativa da Autora aqui Recorrida, cabendo a esta um interesse tutelado por lei em sindicar a legalidade de um ato que autoriza a transferência de uma farmácia para o mesmo concelho em que a Recorrida explora a sua farmácia (a escassas centenas de metros), com fundamento na ilegalidade desse ato e nos prejuízos que daí para si resultam.
3.ª A legitimidade e o interesse para a impugnação de atos administrativos devem ser interpretados à luz da garantia constitucional de impugnação de atos administrativos lesivos (artigo 268.º, n.º 4 da CRP), sendo certo que “no âmbito da ponderação dos pressupostos processuais, os princípios antiformalista, "pro actione" e "in dubio pro favoritatae instantiae" impõem uma interpretação que se apresente como a mais favorável ao acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efectiva” (cfr., entre outros, o Ac. do STA de 02/22/2006, no Proc. n.º 0665/05, in www.dgsi.pt).
4.ª Decidiu bem a sentença recorrida ao anular a deliberação impugnada atenta a sua ilegalidade ao autorizar a transferência da farmácia da contrainteressada sem prévia consulta, quer ao Município de Lisboa, quer ao município de Almada, fazendo-o desse modo contra expressa previsão legal e em violação do artigo 26.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de agosto e arts. 20.º segts., maxime, art. 31.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro, normas que impõem tal consulta, não enfermando a sentença recorrida de qualquer erro ou ilegalidade a este propósito.
5.ª Saber em que termos pode o ato inválido ser aproveitado é questão que extrapola dos presentes autos e que melhor se situará no plano da execução do julgado anulatório, tanto mais que não foi objeto de decisão pelo Tribunal a quo na sentença recorrida, nem teria de o ser dado que não foi sequer ali suscitada.
6.ª Na situação dos autos não está em causa a falta de pronúncia de entidades consultadas para emitir pareceres mas antes a própria falta de solicitação desses pareceres obrigatórios por parte do responsável pelo procedimento, estando em causa uma formalidade essencial.
7.ª Não existe nos autos qualquer elemento de prova que possa secundar a afirmação agora produzida pela Recorrente de que o conteúdo do ato sempre seria o mesmo se acaso tais pareceres tivessem sido solicitados ou que o fim visado pela norma teria sido alcançado, sendo que tais atos apelam a uma valoração a ser feita exclusivamente pelos órgãos municipais consultados.
8.ª Improcedem todas as conclusões de recurso, devendo o segmento decisório da sentença que se mostra impugnado pelas recorrentes ser mantido, com as legais consequências.”
A Exma. Sra. Procuradora-Geral-Adjunta neste Tribunal emitiu parecer nos termos do artigo 146.º, n.º 1, do CPTA, pronunciando-se, em síntese, como segue:
- no sentido da improcedência do recurso da autora, pois face à inexistência de uma definição legal taxativa quanto ao conceito de municípios limítrofes, mostra-se perfeitamente razoável o conceito adotado na decisão, são limítrofes os municípios entre os quais não se interponha nenhum outro município;
- no sentido da procedência dos recursos da entidade demandada e da contrainteressada, porquanto, apesar do elemento lógico levar a considerar que o parecer autárquico se justifica em ambos os casos, o mesmo não tem na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, pois o artigo 2.º da Lei n.º 26/2011 não remete para os requisitos do artigo 26.º do D-L n.º 307/2007, não podendo o intérprete acrescentar restrições não previstas pelo legislador, para além da reiterada posição do Infarmed nos últimos 5 anos não merecer daquele reprovação.
Notificada deste parecer, a autora pronunciou-se pelo desatendimento da pronúncia do Ministério Público.
*

Perante as conclusões das alegações dos recorrentes e requerimento de ampliação do âmbito do recurso, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso, cumpre aferir:
- do erro de julgamento de facto quanto ao artigo 78.º da oposição (recurso da contrainteressada);
- do erro de julgamento de facto quanto aos artigos 38.º, 39.º, 40.º, 42.º, 43.º, 44.º, 45.º, 47.º, 49.º, 50.º, 51.º, 53.º, 54.º, 56.º, 57.º, 58.º, 59.º, 61.º e 62.º da oposição (requerimento de ampliação do âmbito do recurso).
- do erro de julgamento de direito quanto à improcedência da exceção de ilegitimidade ativa da recorrida (recurso da entidade demandada);
- do erro de julgamento de direito quanto à procedência do vício de violação de lei do artigo 26.º, n.º 3, do D-L n.º 307/2007, por falta de parecer das câmaras municipais dos concelhos de origem e de destino da transferência em causa. (recursos da entidade demandada e da contrainteressada);
- do erro de julgamento de direito quanto à improcedência do vício de invalidade invocado relativamente à errada consideração do Município de Almada como concelho limítrofe do Município de Lisboa (recurso da autora).

Dispensados os vistos legais, atenta a natureza urgente do processo, cumpre apreciar e decidir.
*

II. FUNDAMENTOS
II.1 DECISÃO DE FACTO
Na decisão recorrida foram considerados provados os seguintes factos:
A)
A Autora é uma sociedade comercial que tem por objeto social o exercício da actividade de farmácia, a prestação de serviços farmacêuticos e atividades conexas (cfr. Certidão Permanente com o código de acesso ....., válida até 18 de dez. de 2019.)
B)
A Autora é a titular do alvará de farmácia n.º ..... e explora a «Farmácia M.....», sita na Praceta ....., n.º ....., União das freguesias de Charneca de Caparica e Sobreda, concelho de Almada, distrito de Setúbal. – (cfr. prova documental documento nº2 junto com a contestação).
C)
A Contrainteressada, S....., SOCIEDADE FARMACÊUTICA, LDA, é a sociedade comercial que explora a farmácia «M.....» (alvará n.º .....), sita na Rua ....., n.ºs ....., freguesia da Misericórdia, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa.- (cfr. prova documental processo administrativo).
D)
A contra-interessada requereu ao Réu INFARMED, o seguinte: (cfr. prova documental processo administrativo)

E)
Foi elaborada pelos serviços técnicos da Entidade Demandada, uma proposta com o seguinte teor: (cfr. prova documental processo administrativo)



F)
Sobre a proposta mencionado no facto provado anterior foram exarados os seguintes despachos e deliberação: (cfr. prova documental processo administrativo)

G)
No dia 21 de Janeiro de 2019, foram fixadas as seguintes farmácias de serviço permanente e de turno para o concelho de Lisboa: (cfr. prova documenta l documento nº 5 junto com a contestação).




l. Dos Factos Não Provados:
Inexistem factos alegados que com relevância para a decisão da causa devam ser considerados não provados.
II. Da Motivação:
Para convicção do Tribunal, na delimitação da matéria de facto supra provada, foi decisivo o conjunto da prova produzida, analisada individualmente e no seu conjunto.
Designadamente nos documentos não impugnados juntos aos autos, referidos nos "factos provados", com remissão para as folhas do processo onde se encontram, bem como à posição das partes sobre a matéria alegada.”
*

II.2 APRECIAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO

Conforme já enunciado, as questões a decidir neste processo cingem-se a saber se:
- ocorre erro de julgamento de facto quanto ao artigo 78.º da oposição (recurso da contrainteressada);
- ocorre erro de julgamento de facto quanto aos artigos 38.º, 39.º, 40.º, 42.º, 43.º, 44.º, 45.º, 47.º, 49.º, 50.º, 51.º, 53.º, 54.º, 56.º, 57.º, 58.º, 59.º, 61.º e 62.º da oposição (requerimento de ampliação do âmbito do recurso).
- ocorre erro de julgamento de direito quanto à improcedência da exceção de ilegitimidade ativa da recorrida (recurso da entidade demandada);
- ocorre erro de julgamento de direito quanto à procedência do vício de violação de lei do artigo 26.º, n.º 3, do D-L n.º 307/2007, por falta de parecer das câmaras municipais dos concelhos de origem e de destino da transferência em causa (recursos da entidade demandada e da contrainteressada);
- ocorre erro de julgamento de direito quanto à improcedência do vício de invalidade invocado relativamente à errada consideração do Município de Almada como concelho limítrofe do Município de Lisboa (recurso da autora).


a) do erro de julgamento de facto

Vem a recorrente / contrainteressada invocar que a sentença errou na decisão da matéria de facto, ao não dar como provado o ponto da matéria de facto correspondente ao artigo 78.º da sua oposição, indicando o respetivo doc. n.º 5 como o concreto meio probatório que impunha decisão diversa.
Mais invoca, em sede do requerimento de ampliação do âmbito do recurso, que os pontos da matéria de facto correspondentes aos artigos 38.º, 39.º, 40.º, 42.º, 43.º, 44.º, 45.º, 47.º, 49.º, 50.º, 51.º, 53.º, 54.º, 56.º, 57.º, 58.º, 59.º, 61.º e 62.º da oposição são relevantes para a decisão da causa, pois assaca-se ao ato suspendendo o vício de violação do artigo 2.º da Lei n.º 26/2011, por os concelhos de Lisboa e de Almada não serem, alegadamente, concelhos limítrofes.
Respondeu a autora que é inconsequente e inútil a impugnação da matéria de facto, por não estarem em causa factos controvertidos ou de relevo para a decisão da lide.

O artigo 640.º do CPC, sob a epígrafe ‘ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto’, prevê o seguinte:
“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.”

No caso vertente, a recorrente / contrainteressada cumpriu o ónus que sobre si impendia, ao especificar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados e os concretos meios probatórios que impõem decisão diversa sobre aqueles pontos, e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre tais questões de facto.
Está em causa o teor de nove deliberações e nove despachos do Conselho Diretivo do Infarmed, que se pronunciam sobre questões jurídicas em causa nos presentes autos.
Como é consabido, os factos respeitam à ocorrência de acontecimentos históricos, afastando-se de tal qualificação os juízos de natureza valorativa, que comportam antes conclusões sobre factos.
No caso vertente, pretende a recorrente / contrainteressada que se dê como assente o conteúdo de uma deliberação de 2015 do Conselho Diretivo da entidade demandada, que incide sobre a necessidade de parecer do município nos procedimentos de transferência de farmácia entre concelhos limítrofes, o conteúdo de um Aviso relativo a deliberação de 2008 do Conselho Diretivo da entidade demandada, que anuncia a lista referente ao regime excecional de transferência de farmácias para concelhos limítrofes, bem como o conteúdo de sete deliberações e nove despachos do Conselho Diretivo da entidade demandada, de 2008, 2012, 2013, 2014, 2015, 2016, 2017 e 2018, a considerarem aptos pedidos de transferência de farmácias entre os concelhos de Lisboa e Almada, Lisboa e Montijo, Porto e Vila Nova de Gaia, Lisboa e Barreiro, Lisboa e Moita e Lisboa e Seixal.
À evidência, tais deliberações e despachos comportam juízos de natureza valorativa. Contudo, a circunstância da entidade demandada emitir deliberações ou despachos sobre os assuntos em questão configura uma ocorrência factual, um acontecimento histórico.
E do ponto de vista da solução jurídica apresentada pela contrainteressada, que independentemente do seu acerto, deve ter-se como plausível, os factos agora invocados relevam e como tal devem constar do elenco da matéria de facto dada como assente, nos pontos H) a Y).
Procede, pois, a impugnação da decisão de facto, aditando-se ao probatório o teor das referidas deliberações e despachos, como segue:
H)
A Deliberação do Conselho Directivo do INFARMED n.º ...../CD/2015, de 29 de Janeiro, tem o teor seguinte:
«Desde a entrada em vigor da Lei n.° 26/2011, de 16 de julho (“Lei 26/2011”) o INFARMED tem entendido que a autorização de transferência de farmácias para concelhos limítrofes estava dependente da emissão de pareceres favoráveis por parte das câmaras municipais dos concelhos de origem e de destino da farmácia a transferir, por aplicação analógica do artigo 26.º/3 do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de agosto, na redação dada pela Lei 26/2011 (“DL 307/2007”).
Este entendimento do INFARMED teve como fundamento o facto de que só com os pareceres das câmaras municipais é que poderia atestar a pertinência da transferência de uma farmácia para um concelho limítrofe para a defesa do interesse público, interesse esse que se consubstancia na boa distribuição de medicamentos e serviços farmacêuticos pela população e pelo território.
Na verdade, porém, e após reanálise desta questão, o INFARMED concluiu que, pelos motivos que de seguida se enunciarão, esse entendimento não é o que melhor se coaduna com a letra e o espírito da lei.
Vejamos.
O regime de transferência de farmácias encontra-se consagrado no artigo 26.° do DL 307/2007, e no artigo 2.º da Lei 26/2011, sendo que, aquele artigo consagra a transferência de farmácias dentro do mesmo concelho, enquanto que este consagra o regime das transferências de farmácias para os concelhos limítrofes da localização original.
O artigo 26.°/1 do DL 307/2007, na redação dada pela Lei 26/2011, estatui que, “sem prejuízo do disposto nos números seguintes, a proprietária pode, dentro do mesmo município, transferir a localização da farmácia, desde que observe as condições de funcionamento.”
Isto é, nos termos do referido artigo, uma farmácia pode transferir-se para uma localização dentro do mesmo concelho desde que observe as condições de funcionamento previstas nos artigos 27.º e seguintes do DL 307/2007) e respeite os demais requisitos materiais e procedimentais constantes do artigo 26.º do DL 307/2007.
Por outro lado, no artigo 2.º da Lei 26/2011, uma farmácia pode transferir-se para um dos concelhos limítrofes do concelho onde se encontra instalada, desde que, para além de serem observadas as condições de funcionamento (previstas nos artigos 27.º e seguintes do DL 307/2007), se verifiquem as seguintes condições: i) a transferência seja para um concelho limítrofe cuja capitação seja superior á capitação mínima, ii) existam farmácias a menos de 350 metros do local onde a farmácia originariamente se encontra instalada, e iii) a capitação no município de origem não se torne superior ao mínimo legalmente exigível para a abertura de novas farmácias.
Note-se que, da análise do regime de transferência de farmácia para concelhos limítrofes não resulta que os requisitos materiais e procedimentais constantes do artigo 26.º do DL 307/2007, sejam avaliados pelo INFARMED no âmbito deste procedimento, porquanto o artigo 2.º da Lei 26/2011 é totalmente omisso a qualquer remissão para o regime de transferência de farmácias dentro do mesmo município.
Posto isto, refira-se que, nos termos do artigo 9.º/1 do CC, “a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições especificas do tempo em que é aplicada”, sendo que, o artigo 9.º/2 do CC estatui que, “não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei o mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso”.
Ou seja, nos termos do Código Civil, a interpretação das normas legais deve ser efetuada tendo por base a consideração dos elementos históricos e sistemáticos, desde que, da consideração desses elementos resulte o mínimo de correspondência verbal com a letra da norma a interpretar.
Assim, cabe fazer uma interpretação histórica e sistemática da norma em análise e posteriormente verificar se a mesma tem correspondência, ainda que imperfeita, com a letra da lei
Ora, fazenda uma interpretação histórica e sistemática do artigo 2.° da Lei 26/2011 resulta que não há qualquer elemento que faça aplicar o artigo 26.º do DL 307/2007, ao procedimento para transferência de farmácias para o concelho limítrofe. Isto porque, antes da entrada em vigor da Lei 26/2011, o DL 307/2007 era omisso quanto à possibilidade da transferência das farmácias de oficina para concelhos limítrofes, na medida em que o artigo 26.º do DL 307/2007, na sua redação inicial, dispunha simplesmente que, “a proprietária pode, dentro do mesmo município, transferir a localização da farmácia, desde que observe as condições de funcionamento”; isto ainda que, nos termos do artigo 38.º da Portaria n.º 1430/2007, de 2 de novembro (“Portaria 1430/2007”) fosse previsto um procedimento administrativo para a transferência de farmácias para os concelhos limítrofes.
Com a entrada em vigor da Lei 26/2011, o legislador para além de modificar os requisitos para a transferência de farmácias dentro do mesmo município, criou a possibilidade de transferência de farmácias para os concelhos limítrofes daqueles em que estão instaladas, isto é, o legislador, a par do regime geral de transferências de farmácias dentro do mesmo concelho, criou um novo regime de transferência de farmácias para concelhos limítrofes.
Ou seja, o legislador, com a entrada em vigor da Lei 26/2011, teve o cuidado de criar um novo regime de transferência de farmácias, regime esse que é absolutamente autónomo do já existente, na medida em que tem os seus requisitos próprios e não faz qualquer remissão para o regime já existente.
Sendo que, da leitura do artigo 2.º da Lei 26/2011, não resulta que haja qualquer omissão por parte do legislador nos requisitos necessários para a transferência de farmácias para concelhos limítrofes. Aliás, nos termos do artigo 9.º/3 do CC o intérprete deve presumir que o legislador consagrou as soluções acertadas e que soube exprimir o seu pensamento, pelo que, nunca seria possível considerar-se que o legislador foi omisso na elaboração do artigo 2.º da Lei 26/2011.
Ou seja, fazendo uma interpretação histórica e sistemática do artigo 2.º da Lei 26/2011 ter-se-á de concluir que o legislador teve o cuidado de separar ambos os regimes de transferência de farmácias, criando para cada um desses regimes os seus requisitos próprios.
E contra o que agora se disse, não se argumente que a artigo 26.º do DL 307/2007, na redação dada pela Lei 26/2011, é aplicável ao regime de transferência de farmácias para os concelhos limítrofes onde estão instaladas, pelo facto de serem aplicáveis a este último regime os artigos 20.º e seguintes da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro (“Portaria 352/2012”) referentes à tramitação procedimental dos pedidos de transferência de farmácias dentro do mesmo concelho.
Isto porque, os artigos 20.° e seguintes da Portaria 352/2012 são aplicáveis aos pedidos de transferência de farmácias para os concelhos limítrofes ex vi artigo 31.° da mesma portaria, artigo este que estatui que “a tramitação do pedido de transferência no artigo 2.º da Lei n.° 26/2011, de 16 de junho, obedece ao disposto nos artigos 20.° e seguintes, com as necessárias adaptações” (ênfase nosso).
Ou seja, a referida Portaria 352/2012 definiu claramente que a tramitação de ambos os procedimentos não é igual ainda que se apliquem os mesmos artigos, na medida em que a aplicação dos artigos 20.° e seguintes da Portaria 352/2012 ao regime de transferência de farmácias para concelhos limítrofes carece de ajustamentos por parte do intérprete /aplicador daquelas normas.
Acresce que, fazendo uma análise sistemática entre o artigo 2.° da Lei 26/2011 e os artigos 20.° e seguintes da Portaria 352/2012, concluiremos que as “necessárias adaptações” referidas pelo legislador no artigo 31º daquela portaria, são referentes precisamente à não aplicação do artigo 26.° do DL 307/2007, na versão dada pela Lei 26/2011.
De facto, com exceção do artigo 20.°/1/e) e f) da Portaria 352/2012 - que no âmbito do regime para transferência de farmácias dentro do mesmo concelho é relevante para determinar o cumprimento dos requisitos materiais e procedimentais previstos no artigo 26.° do DL 307/2007, na redação dada pela Lei 26/2011 - os demais artigos constantes daquele capítulo da Portaria 352/2012 são relevantes para aferir do cumprimento das condições de funcionamento das farmácias que se pretendem transferir, assim como dos requisitos de distância previstos no artigo 3.° da Lei 26/2011.
Isto é, com exceção do artigo 20.º/1/e) e f) da Portaria 352/2012, todos os demais artigos aplicáveis são relevantes para que o INFARMED possa apurar se, nos termos do artigo 3° da Lei 26/2011 estão reunidos os requisitos para que uma farmácia se possa transferir para um concelho limítrofe, pelo que, forçoso será concluir que as “necessárias adaptações” referidas pelo legislador no artigo 31.º da Portaria 352/2012 pressupõem a não aplicação do artigo 26.º do DL 307/2007, na redação dada pela Lei 26/2011, ao regime da transferência de farmácia para concelhos limítrofes.
Ou seja, é absolutamente inequívoco que, fazendo uma interpretação sistemática do artigo 2.º da Lei 26/2011, não é aplicável o artigo 26.º do DL 307/2007, ao regime da transferência de farmácia para concelhos limítrofes, motivo pelo qual o INFARMED, no âmbito dos procedimentos de transferência de farmácias para concelhos limítrofes, deve abandonar o entendimento de que é necessário a emissão de pareceres positivos por parte das câmaras municipais dos concelhos de origem e destino da farmácia a transferir.
I)
«O Aviso n.º 15115/2008, no Diário da República, 2.ª série, n.º 94, de 15 de Maio de 2008, considera concelhos limítrofes do concelho de Lisboa, com capitação superior prevista na lei (concelhos de destino), os concelhos seguintes:
o Moita (Setúbal);
o Amadora;
o Loures;
o Odivelas;
o Almada (Setúbal); o Seixal (Setúbal); o Barreiro (Setúbal); o Oeiras;
o Alcochete (Setúbal).
O Aviso n.º 15115/2008, no Diário da República, 2.ª série, n.º 94, de 15 de Maio de 2008, considera concelhos limítrofes do concelho do Porto, com capitação superior prevista na lei (concelhos de destino), os concelhos seguintes:
o Matosinhos;
o Maia;
o Gondomar;
o Vila Nova de Gaia, separado do concelho do Porto pelo Rio Douro.
O Aviso n.º 15115/2008, no Diário da República, 2.ª série, n.º 94, de 15 de Maio de 2008, considera concelhos limítrofes do concelho de Santarém, com capitação superior prevista na lei (concelhos de destino), o concelho de Almeirim, separado do concelho de Santarém pelo Rio Tejo.
J)
Por deliberação de 24 de novembro de 2017, do Conselho Diretivo do INFARMED
– Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia B....., sita na Avenida ..... n.º ....., freguesia de Avenidas Novas, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Estrada ..... n.º ..... e n.º ....., União das freguesias de Laranjeiro e Feijó, concelho de Almada, distrito de Setúbal.
K)
Por despacho de 10 de outubro de 2013, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia C....., sita na Rua ..... n.ºs ....., freguesia de São Nicolau, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Rua ..... n.º ....., localidade ....., freguesia Charneca de Caparica, concelho de Almada, distrito de Setúbal.
L)
Por despacho de 27 de fevereiro de 2015, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia M....., sita na Avenida ..... n.º ....., freguesia de Anjos, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a localidade ....., Rua ..... n.º 5, Loja ....., União das freguesias de Laranjeiro e Feijó, concelho de Almada, distrito de Setúbal.
M)
Por despacho de 30 de março de 2015, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia I....., sita na Avenida ..... n.º ....., freguesia de Alvalade, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Rua ..... n.º ..... e n.º ....., União das freguesias de Laranjeiro e Feijó, concelho de Almada, distrito de Setúbal.
N)
Por deliberação de 15 de maio de 2017, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia G....., sita na Avenida ..... n.º ....., freguesia de Areeiro, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Rua ..... n.º ....., União das freguesias de Alto do Seixalinho, Santo André e Verderena, concelho do Barreiro, distrito de Setúbal. Publicado em 19.05.2017.
O)
Por despacho de 02 de Dezembro de 2008, do Conselho Directivo do INFARMED
– Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 24.º da Portaria n.º 1430/2007, de 2 de Novembro de 2007, no que se refere ao local, ao espaço e ao quadro farmacêutico, o pedido de transferência da Farmácia G..... Lda, sita na Rua ..... n.º ....., freguesia de Encarnação, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Avenida ..... n.º ..... e ....., freguesia de Corroios, concelho de Seixal, distrito de Setúbal.
P)
Por deliberação de 09 de junho de 2016, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia S....., sita na Rua ..... n.º ....., freguesia de Santa Maria Maior, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Praceta ..... n.º ….. e ….., ....., União das freguesias do Seixal, Arrentela e Aldeia de Paio Pires, concelho de Seixal, distrito de Setúbal.
Q)
Por deliberação de 13 de julho de 2018, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia P....., sita no Campo ....., n.º ....., freguesia de Arroios, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Avenida ....., n.º ....., União das freguesias do Seixal, Arrentela e Aldeia de Paio Pires, concelho do Seixal, distrito de Setúbal.
R)
Por despacho de 11 de janeiro de 2016, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia C....., sita na Av. ..... n.º ....., freguesia de Avenidas Novas, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Rua ....., ....., Loja ….., freguesia de Alhos Vedros, concelho da Moita, distrito de Setúbal.
S)
Por deliberação de 20 de dezembro de 2017, do Conselho Diretivo do INFARMED
– Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia S....., sita na Avenida ....., n.º ....., freguesia de Avenidas Novas, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Rua ....., n.º … e …, localidade de ....., freguesia de Alhos Vedros, concelho da Moita, distrito de Setúbal.
T)
Por despacho de 09 de novembro de 2012, do Conselho Directivo do INFARMED
– Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia ....., sita na Avenida ..... n.º ....., freguesia de São João de Deus, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para o Fórum Montijo, Loja n.º ....., Zona ..... – Rua ....., freguesia de Afonsoeiro, concelho de Montijo, distrito de Setúbal.
U)
Por despacho de 02 de dezembro de 2013, do Conselho Diretivo do INFARMED
– Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia C....., sita na Rua ..... n.º ....., freguesia de São Jorge de Arroios, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Rua ..... n.º ....., freguesia do Montijo, concelho do Montijo, distrito de Setúbal.
V)
Por despacho de 08 de janeiro de 2014, do Conselho Diretivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia S....., sita na Rua ..... n.ºs ....., freguesia de Santos o Velho, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Praça ..... n.º ....., freguesia de Afonsoeiro, concelho do Montijo, distrito de Setúbal.
W)
Por deliberação de 03 de agosto de 2017, do Conselho Diretivo do INFARMED
– Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia E....., sita na Rua ..... n.º ....., freguesia de Penha de França, concelho de Lisboa, distrito de Lisboa, para a Avenida ....., ....., União das freguesias do Montijo e Afonseiro, concelho do Montijo.
X)
Por deliberação de 30 de março de 2016, do Conselho Diretivo do INFARMED
– Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia B....., sita na Praça ..... n.º ….., freguesia de Santo Ildefonso, concelho do Porto, distrito do Porto, para a Avenida ..... n.º ....., freguesia de Arcozelo, concelho de Vila Nova de Gaia, distrito do Porto.
Y)
Por despacho de 08 de janeiro de 2013, do Conselho Directivo do INFARMED – Autoridade Nacional do Medicamento e Produtos de Saúde I.P foi considerado apto, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do Artigo 21.º da Portaria n.º352/2012, de 30 de outubro de 2012, no que se refere à proposta de nova localização da farmácia, o pedido de transferência da Farmácia G....., sita na Rua ..... n.º ....., freguesia de Cedofeita, concelho do Porto, distrito do Porto, para a Rua ..... n.º ....., freguesia de São Félix da Marinha, concelho de Vila Nova de Gaia.»



b) do erro de julgamento de direito quanto à improcedência da exceção de ilegitimidade ativa da recorrida

A recorrente / entidade demandada apresenta, em síntese, o seguinte argumentário:
- a farmácia da contrainteressada vai transferir-se para um local a mais de 350 metros da farmácia da recorrida, distância utilizada como critério legal para assegurar que cada farmácia tem a clientela necessária para ser um negócio atrativo e assim se manter aberta em funcionamento;
- pelo que não tem qualquer interesse direto e pessoal nos presentes autos;
- caso contrário, qualquer farmácia do país, independentemente da distância, teria legitimidade para requerer a suspensão do ato de transferência.
A recorrida entende ter um interesse tutelado por lei em sindicar a legalidade do ato que autoriza a transferência de uma farmácia para o mesmo concelho em que explora a sua, com fundamento na ilegalidade desse ato e nos prejuízos que daí para si resultam, devendo a legitimidade e o interesse para a impugnação de atos administrativos ser interpretados à luz da garantia constitucional de impugnação de atos administrativos lesivos e dos princípios antiformalista, pro actione e in dubio pro favoritatae instantiae.
Concluiu-se na sentença sob recurso, após excurso pelas reflexões da doutrina e jurisprudência a propósito do conceito de interesse direto e pessoal, que na sua configuração da ação, a autora pode vir a beneficiar da sua procedência, caso obtenha ganho de causa, pois a instalação da farmácia num lugar próximo da sua irá causar-lhe prejuízos, resultantes da concorrência que se irá estabelecer.
Vejamos se esta decisão é de manter.
Releva aqui, para lá da previsão genérica do artigo 9.º, n.º 1, do CPTA (de formulação semelhante à do artigo 30.º, n.º 3, do CPC), relativa à titularidade da relação material controvertida, que no âmbito da impugnação de atos administrativos, confere a lei legitimidade ativa a quem é titular de um interesse direto e pessoal, nos termos previstos no artigo 55.º, n.º 1, al. a), do CPTA.
Expande-se, pois, o conceito de legitimidade ativa a quem possa não ser titular da relação material controvertida, desde que alegue ser titular de um interesse direto e pessoal, lesado pelo ato.
Fala-se em interesse pessoal quando está em causa a utilidade, benefício ou vantagem, de natureza patrimonial ou meramente moral, que poderá advir da anulação do ato impugnado, sem que corresponda necessariamente à titularidade de um direito subjetivo ou interesse legalmente protegido, podendo até resultar da simples invocação de um mero interesse de facto (cf. Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2017, p. 373, e vg o acórdão do STA de 29/10/2009, proc. n.º 01054/08, disponível em www.dgsi.pt).
Já o interesse direto implica que o mesmo seja atual e efetivo na anulação ou declaração de nulidade do ato administrativo, excluindo as situações de interesse reflexo ou meramente hipotético (cf. op.cit., p. 374).
Ora, tal como a autora configura a ação, afigura-se evidente e atual o benefício que lhe poderá advir da anulação do ato impugnado, na medida em que explora estabelecimento de farmácia nas imediações do local em que iria ocorrer a instalação da farmácia objeto de transferência, com a inerente sujeição a um decréscimo dos proveitos, por via da concorrência que se irá necessariamente estabelecer (veja-se o decidido pelo TCAN em situação semelhante, acórdão de 13/09/2013, proc. n.º 00224/13.0BECBR, com revista negada pelo STA em acórdão de 27/11/2013, proc. n.º 01759/13, disponíveis em www.dgsi.pt).
Diga-se ainda que não impressiona o argumento da entidade demandada quanto ao critério legal previsto no artigo 2.º, n.º 1, al. b), da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro, porquanto aí apenas se fixa um requisito de distância mínima de 350 metros entre farmácias, nada nos dizendo quanto à possível afetação do negócio dos estabelecimentos situados nas imediações, embora para lá da referida distância.
E veja-se que distinto critério legal é utilizado no artigo 6.º do D-L n.º 171/2012, de 1 de agosto, no qual se permite ao Infarmed, em casos devidamente fundamentados, autorizar a abertura, transferência ou manutenção em funcionamento de uma farmácia, desde que em local situado a mais de dois quilómetros da farmácia mais próxima (distância superior ao do caso dos autos) e independentemente da capitação do respetivo município.
Conclui-se, pois, que a autora tem interesse direto e pessoal na anulação do ato em questão, não merecendo censura o julgamento de improcedência da exceção de ilegitimidade da autora, decidido em primeira instância.


c) do erro de julgamento de direito quanto à procedência do vício de preterição de parecer obrigatório

Nesta sede, defende a recorrente / entidade demandada, em síntese:
- antes da entrada em vigor da Lei n.º 26/2011, que alterou o D-L n.º 307/2007, este era omisso quanto à transferência das farmácias de oficina para concelhos limítrofes;
- no artigo 2.º da Lei 26/2011 não se encontra prevista a necessidade de pedir parecer prévio aos municípios de origem e destino da farmácia a transferir, nem se remete para os requisitos materiais e procedimentais do artigo 26.º do D-L n.º 307/2007.
A recorrente / contrainteressada juntou parecer quanto à presente questão e sustenta, em síntese:
- interpretar o artigo 31.º da Portaria n.º 352/2012 no sentido de estender aos procedimentos de transferência de farmácias para um concelho limítrofe todo o regime aplicável à transferência dentro do mesmo concelho ofende o princípio da proporcionalidade, por restringir direito fundamental da recorrente, a liberdade de iniciativa privada, viola a exigência constitucional de reserva de lei, e faz prevalecer norma regulamentar sobre norma legal, o que, no limite, configura violação do princípio da separação de poderes;
- os pressupostos aplicáveis à transferência de uma farmácia para outro concelho limítrofe são apenas os que constam daquele artigo 2.º, não havendo lugar à emissão de parecer prévio da câmara municipal competente em razão do território
- ainda que se equacionasse a obrigatoriedade de parecer, a sua falta apenas configuraria a preterição de formalidade não essencial.
Na sentença entendeu-se ser obrigatório o referido parecer camarário, concluindo o seguinte:
De acordo com o disposto no artigo 31.° da Portaria n.° 352/2012, de 30 de Outubro expressamente estatui que ‘a tramitação do pedido de transferência previsto no artigo 2.° da Lei n.° 26/2011, de 16 de junho — a transferência para concelho limítrofe -, obedece ao disposto nos artigos 20.° e seguintes, com as necessárias adaptações’, sendo que o parecer das câmaras municipais se apresenta como um parecer obrigatório em face do disposto no art.° 26.°, n.° 3 do citado Decreto-Lei n.° 307/2007 e o próprio artigo 21.°, n.° 1 daquela Portaria se refere a necessidade de ‘obtenção dos pareceres obrigatórios, sobre a aptidão ou inaptidão da proposta de nova localização da farmácia, de acordo com os requisitos e condições previstos na lei...’. Assim, terá que concluir-se que a decisão de transferência de uma farmácia para outro concelho limítrofe terá de ser antecedida do necessário parecer prévio dos órgãos autárquicos.
O Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de agosto, que veio estabelecer o regime jurídico das farmácias de oficina, prevê o seguinte no respetivo artigo 26.º, sob a epígrafe ‘transferência’:
“1 - Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, a proprietária pode, dentro do mesmo município, transferir a localização da farmácia, desde que observe as condições de funcionamento.
2 - Na apreciação do pedido de transferência da localização da farmácia ter-se-á em atenção os seguintes critérios:
a) A necessidade de salvaguardar a acessibilidade das populações aos medicamentos, a sua comodidade, bem como a viabilidade económica da farmácia, cuja localização o proprietário pretenda transferir;
b) A melhoria ou aumento dos serviços farmacêuticos de promoção de saúde e do bem-estar dos utentes.
3 - A autorização da transferência de farmácia está sujeita a parecer prévio da câmara municipal competente em razão do território, a emitir no prazo de 60 dias a contar da data da entrada do pedido nos respectivos serviços.
4 - Quando desfavorável, o parecer a que se refere o número anterior é vinculativo.
5 - A não emissão do parecer a que se refere o n.º 3, no prazo fixado para o efeito, entende-se como parecer favorável.
6 - Sem prejuízo da observância do disposto nos números anteriores, o requisito da distância mínima entre farmácias, tal como definido em diploma próprio, não é aplicável no caso de transferência dentro da mesma localidade, desde que:
a) Seja previsível a melhoria da qualidade da assistência farmacêutica;
b) Não ocorra alteração da cobertura farmacêutica;
c) Os proprietários das farmácias situadas a distância inferior à definida no diploma a que se refere o presente número declarem por escrito a sua não oposição;
d) A nova localização da farmácia respeite as áreas e divisões legalmente exigíveis para aqueles estabelecimentos.
7 - O disposto na alínea c) do número anterior apenas é aplicável no caso de a transferência resultar numa maior proximidade geográfica entre a farmácia a transferir e as existentes.”
A redação do artigo foi dada pelo artigo 1.º da Lei n.º 26/2011, 16 de junho, diploma que tem como sumário ‘transferência de farmácias (primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de agosto)’.
Contudo, o artigo 2.º desta Lei n.º 26/2011 não introduz, prima facie, qualquer alteração ao D-L n.º 307/2007, prevendo o seguinte, sob a epígrafe ‘pressupostos a verificar na transferência nos concelhos limítrofes’:
“As farmácias situadas em municípios com uma capitação inferior à exigível, nos termos definidos em diploma próprio do Governo, para a abertura de novas farmácias, podem transferir-se para os concelhos limítrofes com capitação superior, desde que sejam observadas as condições de funcionamento e se verifiquem, cumulativamente, os seguintes pressupostos no município de origem:
a) Existam farmácias a menos de 350 m da farmácia que se pretende transferir;
b) A capitação nesse município não se torne superior à legalmente exigível para a abertura de novas farmácias.”
Atente-se ainda que, segundo o artigo 31.º da Portaria n.º 352/2012, de 30 de outubro, com a epígrafe ‘pedido de transferência para concelhos limítrofes’, a tramitação do pedido de transferência previsto no artigo 2.º da Lei n.º 26/2011 obedece ao disposto nos artigos 20.º e seguintes, com as necessárias adaptações.
Aí se prevendo o seguinte:
“Artigo 20.º
Pedido de transferência
1 - O proprietário de farmácia que pretenda transferi-la dentro do mesmo município deve apresentar um pedido ao INFARMED, I. P., instruído com os seguintes documentos:
a) Fotocópia do respetivo bilhete de identidade ou cartão do cidadão, no caso de se tratar de uma pessoa singular, ou fotocópia do contrato de sociedade e certidão do registo comercial, no caso de se tratar de uma sociedade comercial;
b) Identificação da farmácia a transferir, incluindo o nome da rua e o número de polícia ou lote;
c) Planta de localização do edifício ou fração para onde se pretende a transferência, à escala de 1:2000, incluindo o nome da rua e o número de polícia, de lote, ou de indicação do prédio com projeto de construção licenciado, ou dele dispensado, que represente a área envolvente da farmácia numa distância de 350 m contada dos limites exteriores da farmácia;
d) Certidão camarária relativa ao preenchimento dos requisitos respeitantes à distância previstos nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 2.º;
e) Demonstração do preenchimento dos critérios estabelecidos nas alíneas a) e b) do n.º 2 do artigo 26.º do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de agosto, na redação dada pela Lei n.º 26/2011, de 16 de junho;
f) Se aplicável, as declarações previstas na alínea c) do n.º 6 do artigo 26.º do Decreto-Lei n.º 307/2007, de 31 de agosto, na redação dada pela Lei n.º 26/2011, de 16 de junho;
g) Identificação do diretor técnico e de outro farmacêutico, quando exigível, e declaração da Ordem dos Farmacêuticos da respetiva inscrição, bem como certidão do registo criminal;
h) Memória descritiva do edifício ou fração para onde se pretende a transferência, incluindo a descrição das instalações das divisões e das respetivas áreas, conforme regulamento do INFARMED, I. P.
2 - Em simultâneo com a apresentação dos documentos, o proprietário da farmácia deve proceder ao pagamento da quantia indicada na alínea b) do n.º 2 do artigo 28.º, sob pena de se considerarem os documentos como não apresentados.
Artigo 21.º
Decisão de aptidão
1 - O INFARMED, I. P., analisa os documentos referidos no artigo anterior, decide, no prazo de 30 dias a contar da respetiva apresentação e descontado o período necessário para a obtenção dos pareceres obrigatórios, sobre a aptidão ou inaptidão da proposta de nova localização da farmácia, de acordo com os requisitos e condições previstos na lei, e notifica, em 10 dias, o proprietário da farmácia.
2 - O INFARMED, I. P., na mesma data da notificação, divulga no seu sítio da Internet a decisão sobre o pedido de transferência da farmácia e de aptidão ou inaptidão da proposta referida no número anterior.
Artigo 22.º
Pedidos conflituantes
1 - Os pedidos são conflituantes quando reúnam, cumulativamente, os seguintes requisitos:
a) Sejam apresentados no mesmo dia;
b) Sejam objeto de decisão de aptidão;
c) As novas localizações das farmácias distem menos de 350 m entre si.
2 - De entre os pedidos conflituantes, o INFARMED, I. P., seleciona um, através de sorteio.
3 - O INFARMED, I. P., notifica os proprietários das farmácias que apresentem pedidos conflituantes da data, da hora e do local da realização do sorteio.
Artigo 23.º
Vistoria e averbamento
1 - O proprietário da farmácia deve requerer ao INFARMED, I. P., a realização de uma vistoria às novas instalações, no prazo de seis meses a contar da decisão de aptidão referida no artigo 21.º ou da seleção referida no artigo anterior.
2 - O INFARMED, I. P., pode prorrogar o prazo referido no número anterior por período não superior a 120 dias, mediante requerimento, devidamente fundamentado, do concorrente selecionado.
3 - Em simultâneo com o requerimento referido no n.º 1, o proprietário da farmácia deve proceder ao pagamento da quantia indicada na alínea c) do n.º 2 do artigo 28.º, sob pena de se considerar o requerimento como não apresentado.
4 - O INFARMED, I. P., dispõe do prazo de 30 dias para realizar a vistoria requerida.
5 - Se o INFARMED, I. P., considerar que a farmácia cumpre as normas legais e regulamentares, notifica o proprietário da farmácia, no prazo de 5 dias, para, no prazo de 10 dias, proceder ao pagamento da quantia referida na alínea e) do n.º 2 do artigo 28.º
6 - No prazo de cinco dias a contar do pagamento referido no número anterior, o INFARMED, I. P., averba a nova localização da farmácia no respetivo alvará.
7 - A farmácia deve abrir ao público, nas novas instalações, no prazo de 20 dias a contar da receção do alvará, que lhe é remetido pelo INFARMED, I. P., por via postal.
8 - Decorridos os prazos previstos nos n.os 1 e 2 do presente artigo sem que seja solicitada a vistoria às novas instalações, caduca a autorização concedida para a transferência de localização da farmácia.
Artigo 24.º
Encerramento
O proprietário da farmácia pode encerrar a farmácia a transferir a partir da decisão de aptidão referida no n.º 1 do artigo 21.º, pelo período que considerar necessário, para efeitos de reinstalação no novo local.
Artigo 25.º
Impossibilidade de transferência e de instalação
Desde a decisão de aptidão, prevista no n.º 1 do artigo 21.º, até ao termo do prazo para abrir a farmácia ao público, previsto no n.º 7 do artigo 23.º, são indeferidas, por inaptidão do local para a abertura ao público, a transferência e a instalação de novas farmácias que, em relação à nova localização da farmácia que se pretende transferir, conduzam à violação das regras aplicáveis à transferência de farmácias.”
Na tese da decisão sob recurso, na sequência da remissão do artigo 31.º para os artigos 20.º e seguintes, ocorrerá uma segunda remissão, em concreto do artigo 21.º, n.º 1, da Portaria para o artigo 26.º, n.º 3, do D-L n.º 307/2007, onde o parecer das câmaras municipais se apresenta como obrigatório.
Pelo que se concluiu que a decisão de transferência de uma farmácia para outro concelho limítrofe terá de ser antecedida do necessário parecer prévio dos órgãos autárquicos. Mais se salientando que tese contrária esvaziaria as competências do órgão autárquico no que diz respeito ao estabelecimento e transferência de uma farmácia, que o legislador pretendeu estabelecer ao impor a necessidade da sua pronúncia através da emissão de um parecer.
A questão está longe de ser líquida, como decorre da errática e muito pouco clara legislação que se vem de citar.
Impõe-se ainda assim, com as balizas definidas pelo artigo 9.º do Código Civil, retirar da lei a melhor interpretação.
Segundo o respetivo n.º 1, “a interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos jurídicos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada”. Impondo o n.º 2 que “não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso”. Finalmente, diz-nos o n.º 3 que “o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados”, na fixação do sentido e alcance da lei.
A tarefa que se impõe é então a de identificar a intenção do legislador (mens ou voluntas legislatoris), quer do ponto de vista do elemento gramatical, o texto da lei, quer do ponto de vista do elemento lógico, o espírito da lei.
O texto da lei é o que se encontra supra enunciado no citado artigo 2.º da Lei n.º 26/2011, que tem de ser conjugado com o disposto nos artigos 31.º e 20.º e seguintes da Portaria n.º 352/2012, e 26.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 307/2007.
O elemento lógico subdivide-se em 3 elementos distintos, o racional, a razão de ser da lei, o sistemático, a norma integrada no sistema jurídico e em particular com as que regulam situações semelhantes, e o histórico, os antecedentes legislativos da norma e o seu processo de elaboração.
Como se observa no parecer do Ministério Público, os elementos decorrentes do processo legislativo que levou à elaboração da Lei n.º 26/2011, de 16 de junho, nada nos dizem, pois todos os projetos de lei previam a exigência de pareceres prévios das câmaras municipais para a transferência de farmácias dentro dos mesmos municípios, desconhecendo-se quais os argumentos ou fundamentos que levaram à fixação da redação do respetivo artigo 2.º.
Já os elementos racional e sistemático permitem sustentar algo mais, como de algum modo se constatou na sentença recorrida.
Sabemos, quanto à evolução histórica dos normativos, que o legislador previu inicialmente a possibilidade desta transferência dentro do mesmo concelho, e mais tarde a possibilidade de transferência para concelho limítrofe.
Estamos claramente perante disposições que regulam situações paralelas, pelo que surpreende ter o legislador detetado a necessidade de um parecer autárquico, com caráter obrigatório e vinculativo, num caso e no outro não. Em ambas as situações o papel da(s) autarquia(s) seria, à partida, igualmente relevante, levando em linha de conta o interesse público na acessibilidade dos cidadãos à dispensa de medicamentos.
Questiona-se, pois, se terá sentido o legislador exigir o parecer da autarquia na transferência de estabelecimentos de farmácia dentro do mesmo concelho e não o exigir na transferência de estabelecimentos de farmácia para concelhos limítrofes e a razão de ser da norma relativa aos requisitos.
Contudo, como impõe o citado artigo 9.º, n.º 2, do Código Civil, a identificação da intenção do legislador terá de encontrar na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso.
Realce-se, antes do mais, a duvidosa técnica legislativa, que na Lei n.º 26/2011 trata de concretizar no respetivo artigo 1.º a alteração do regime jurídico das farmácias de oficina, estabelecendo novas regras para a sua transferência dentro do mesmo município, ao passo que no respetivo artigo 2.º estabelece separadamente novas regras para a transferência de farmácia para o concelho limítrofe. Ao invés da evidente e cristalina solução jurídica de fazer constar ambas as possibilidades do mesmo diploma que ali se alterou e que disciplina o regime jurídico das farmácias de oficina.
O artigo 2.º da Lei n.º 26/2011 veio prever inovatoriamente os pressupostos a verificar na transferência nos concelhos limítrofes, de forma aparentemente, passe a profusão adverbial, exaustiva.
E a Portaria n.º 352/2012 veio regulamentar, designadamente, a transferência da localização de farmácias, prevendo no artigo 31.º da Portaria que a tramitação do pedido de transferência para concelhos limítrofes obedece ao disposto nos artigos 20.º e seguintes, com as necessárias adaptações, sublinhe-se.
Nestes normativos, a única alusão ao parecer autárquico consta do artigo 21.º, n.º 1, estatuindo que o Infarmed analisa os documentos referidos no artigo anterior e decide, no prazo de 30 dias a contar da respetiva apresentação e descontado o período necessário para a obtenção dos pareceres obrigatórios, sobre a aptidão ou inaptidão da proposta de nova localização da farmácia, de acordo com os requisitos e condições previstos na lei.
Havendo que presumir que o legislador soube exprimir com correção o seu pensamento, verifica-se que, para além da tramitação do pedido obedecer ao disposto nos citados normativos com as necessárias adaptações, em boa verdade não se consegue vislumbrar aqui a imposição de ser obtido parecer ao pedido de transferência de farmácia para concelho limítrofe.
Como tal recortado o alcance da lei, não se pode acompanhar a decisão sob recurso, ao concluir que a decisão de transferência de uma farmácia para outro concelho limítrofe terá de ser antecedida do necessário parecer prévio dos órgãos autárquicos.
O que implica a sua revogação, nesta parte.


d) do erro de julgamento de direito quanto à improcedência do vício de invalidade relativo à consideração do Município de Almada como concelho limítrofe do Município de Lisboa

Sustenta aqui a recorrente / autora, em síntese, o seguinte:
- Almada e Lisboa não são concelhos limítrofes, para efeitos de aplicação do regime excecional de transferência de farmácias, pois tal expressão não significa muito próximos ou vizinhos, como fez a sentença recorrida, convocando um sentido figurado, funcionalmente válido apenas para coisas que não têm limites definidos, o que não é o caso dos concelhos, constituindo estes circunscrições territoriais com limites cartograficamente definidos;
- a solução expressa no artigo 2.º da Lei n.º 26/2011 constitui um equilíbrio delicado entre os fins de salvaguarda da acessibilidade das populações aos medicamentos, de viabilidade económica das farmácias ou de melhoria dos serviços farmacêuticos de promoção de saúde e do bem-estar dos utentes e os princípios da concorrência e da igualdade, tendo o legislador entendido que a transferência de farmácias para concelhos limítrofes era, conjuntamente com a transferência intraconcelho, a solução que implicava um melhor equilíbrio dos interesses em jogo, porque entre concelhos limítrofes (com mercados tendencialmente semelhantes e concorrentes entre si) não havia o risco de introduzir distorções na concorrência ou de abrir fugas ao regime concursal de licenciamento;
Já a contrainteressada invoca, em síntese, que
- o artigo 2.º da Lei n.º 26/2011 se limita a condicionar a transferência de uma farmácia ao facto de ela ser feita para um “concelho limítrofe”, nunca exigindo que ela seja transferida para um concelho identificado pela Carta Administrativa Oficial de Portugal identifique, em mapa cartográfico, com linhas divisórias contíguas, o que configuraria uma interpretação corretiva daquele artigo;
- os concelhos são limítrofes quando entre eles não se interpõe outro concelho, como tem vindo a entender a entidade demandada em sucessivas decisões administrativas;
- são discricionários os poderes de autorizar a transferência de farmácia para um concelho limítrofe, não podendo este Tribunal conhecer dessa questão;
- o artigo 2.º da Lei n.º 26/2011 não restringe a expressão aos concelhos que mantêm uma ligação terrestre contígua, pelo que interpretá-lo restritivamente configura uma restrição implícita a um direito fundamental, no caso, a liberdade de iniciativa económica;
A entidade demandada invoca que:
- uma interpretação sistemática do conceito “concelho limítrofes” leva a entender que o legislador pretendeu que houvesse uma maior possibilidade de garantir a sustentabilidade e a sobrevivência de farmácias através do recurso à transferência de farmácias para outros concelhos;
- a distância de 350 metros é a distância que o legislador considera necessária para a sustentabilidade financeira de uma farmácia, donde decorre que só as farmácias em situação de dificuldade é que estão autorizadas a transferir-se para concelhos limítrofes, já que é fundamental garantir a sua sobrevivência e a continuidade do exercício da sua atividade de interesse público;
- a expressão tem de ser interpretada no sentido de permitir o máximo de soluções possíveis para a sustentabilidade e defesa das farmácias de oficina e permitir, dessa forma, um maior equilíbrio entre concelhos limítrofes, pois uma farmácia só se pode transferir para outro concelho limítrofe se o concelho de origem tiver e continuar com uma capitação inferior à legalmente estabelecida.
A questão a dilucidar é de simples enunciação, saber o que a lei, em concreto o artigo 2.º da Lei n.º 26/2011, de 16 de junho, quis abranger com a utilização da expressão ‘concelhos limítrofes’.
Como ponto de partida, assinale-se que no preenchimento do conceito legal não está claramente em causa um poder discricionário da entidade demandada, como alvitra a contrainteressada, antes, à evidência, vinculado pelos requisitos legalmente definidos.
Assentes no ponto que antecede as regras da hermenêutica jurídica, haverá que discernir o significado do vocábulo empregue pelo legislador.
Limítrofe é um adjetivo de dois géneros, significa que estabelece limite ou fronteira com algo (ex.: regiões limítrofes), confinante, fronteiriço, que se situa ou que vive nos limites de uma extensão, de uma região, etc., que tem limites comuns, e em sentido figurado, que está muito próximo de algo (ex.: amor e ódio são sentimentos limítrofes), vizinho, muito próximo (cf. Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], e Dicionário Eletrónico Houaiss).
Temos, pois, o sentido literal, próprio da expressão, que a autora / recorrente veio invocar, ao passo que a entidade demandada vem de há muito adotando como certo o sentido figurado nas decisões relativas aos pedidos de transferência de farmácia para concelho limítrofe.
Não se justifica aqui apelar ao sentido figurado da expressão, pois como nota a autora a lei fala em concelhos limítrofes, ou seja, divisões administrativas com delimitações territoriais claramente definidas.
E nesta medida convocou com propriedade os limites administrativos dos municípios, identificados na ‘Carta Administrativa Oficial de Portugal’, aprovada pela Direção-Geral do Território e publicada na respetiva página eletrónica (www.dgterritorio.pt). Aí se identificando como limite territorial do concelho de Almada, a Norte, a margem do rio Tejo, e identificando-se como limite territorial do concelho de Lisboa, a Sul, o talvegue do rio Tejo, o ponto mais fundo do leito do rio.
O mesmo se impondo dizer quanto ao PROTALM (Plano Regional de Ordenamento do Território da Área Metropolitana de Lisboa), que não identifica o concelho de Almada entre os concelhos limítrofes de Lisboa.
Veja-se ainda que nos termos da Lei n.º 54/2005, de 15 de novembro, que estabelece a titularidade dos recursos hídricos o domínio público marítimo pertence ao Estado, artigos 3.º e 4.º, e o domínio público lacustre e fluvial igualmente pertence ao Estado ou, nas regiões autónomas, à respetiva região, artigos 5.º e 6.º.
Apenas pertencendo ao domínio público hídrico do município ou da freguesia os lagos e lagoas situados integralmente em terrenos municipais ou em terrenos baldios e de logradouro comum municipal, e as restantes águas ali situadas, artigo 6.º a 8.º.
Entre os concelhos de Lisboa e Almada interpõe-se, pois, domínio público fluvial, da titularidade do Estado.
Ademais, considerar como limítrofes os municípios entre os quais não se interponha nenhum outro município, como defendem a entidade demandada e a contrainteressada, tese igualmente sustentada na decisão recorrida, levaria a conclusões absurdas, como a de se terem como limítrofes concelhos situados no litoral de Portugal Continental e concelhos das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira.
De assinalar ainda que carece de sentido a invocação pela contrainteressada do artigo 152.º, al. d), do CPA, quando a entidade demandada manteve, equivocadamente, o sentido decisório que até então adotou. Como carece de sentido falar em interpretação restritiva ou corretiva, quando a letra da lei é clara, apenas cabendo ao intérprete / aplicador recorrer ao sentido próprio da expressão ‘limítrofe’.
Assiste, pois, razão à autora / recorrente, ao sustentar que os limites territoriais dos concelhos de Lisboa e de Almada não são confinantes ou contíguos, não são limites comuns, no sentido próprio da palavra, existindo entre tais limites uma porção territorial não integrada em Lisboa ou em Almada.
Não são, pois, concelhos limítrofes, no alcance da expressão legal, pelo que não era legalmente admissível a autorização do pedido de transferência da farmácia em questão.
Assim, ao considerar os referidos concelhos como limítrofes, a deliberação impugnada violou o disposto no artigo 2.º da Lei n.º 26/2011, de 16 de junho.
Verificada a violação do normativo em questão, impõe o disposto no artigo 163.º, n.º 1, do CPA, que se mantenha a determinação de anulação da deliberação impugnada, agora por verificação de vício distinto.

Em suma, o recurso da contrainteressada procede e o recurso da entidade demandada procede parcialmente, sendo de revogar a sentença recorrida na parte em que julgou procedente o vício de preterição de parecer obrigatório; igualmente procede o recurso da autora, cumprindo julgar procedente a ação, por verificação do vício de violação do disposto no artigo 2.º da Lei n.º 26/2011, de 16 de junho, e assim manter o juízo de anulação da deliberação impugnada.
Mais assiste razão à autora quanto ao pedido de reversão da condenação em custas na primeira instância, porquanto aí obteve vencimento de causa.
As custas nesta instância serão a cargo dos vencidos em cada recurso.

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III. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal Central Administrativo Sul em:
- conceder provimento ao recurso da contrainteressada e provimento parcial ao recurso da entidade demandada, e revogar a sentença recorrida na parte em que julgou procedente o vício de preterição de um parecer obrigatório;
- conceder provimento ao recurso da autora, julgar procedente a ação, por verificação de vício de violação de lei e determinar a anulação da deliberação impugnada.
Custas na primeira instância a cargo da contrainteressada e da entidade demandada.
Custas do recurso da entidade demandada a cargo da recorrente e autora/recorrida em partes iguais.
Custas do recurso da contrainteressada a cargo da autora/recorrida.
Custas do recurso da autora a cargo da contrainteressada e da entidade demandada.

Lisboa, 27 de fevereiro de 2020

(Pedro Nuno Figueiredo)

(Ana Cristina Lameira)

(Cristina dos Santos)