Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:149/07.9BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:04/11/2019
Relator:MÁRIO REBELO
Descritores:IRS;
MAIS VALIAS;
REINVESTIMENTO.
Sumário:1. Antes da revogação da alínea d) do n.º 5 do art.º 10º do CIRS operada pelo artigo 1º do Decreto-Lei n.º 211/2005, de 7 de dezembro, o sujeito passivo que reinvestiu montante diverso do declarado como intenção de reinvestimento, está obrigado a entregar declaração de substituição, com os valores efetivamente reinvestidos, dentro do prazo normal que ocorra após o termo do período de 24 meses a que se refere a alínea a) do n.º 5.
2. A aquisição total ou parcial com recurso a crédito bancário não constitui reinvestimento, na parte mutuada.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:

RECORRENTE: M.....
RECORRIDO: Autoridade Tributária e Aduaneira.
OBJECTO DO RECURSO: Sentença proferida pelo MMº juiz do TAF de Lisboa que julgou improcedente a impugnação deduzida contra o indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa da liquidação.

CONCLUSÕES DAS ALEGAÇÕES:
1ª Com base na apresentação da declaração de rendimentos da impugnante, ora recorrente do ano de 2003, a AT, assentou a sua tributação em pressupostos inexistentes, uma vez que, com base no disposto na al.c) do n.° 5 do art. 10.° do CIRS, levou em linha de conta o valor de €159.615,00 declarado no campo 504, do quadro 5, do anexo G (facto provado 5)), como sendo um valor reinvestido, e não como a lei refere, de forma clara e inequívoca, como um valor declarado com a mera intenção de proceder ao reinvestimento...”, para efeitos do estabelecido na al.a) do n.° 5 do art. 10.° CIRS.
2ª Foi perante estes factos que foi efetuada a liquidação, aqui impugnada.
3ª Assentou ainda em pressupostos inexistentes, pois a lei exige, para efeitos de tributação, que os pressupostos sejam de facto e de direito.
4a Estamos perante uma tributação que se demitiu de aplicar a norma de incidência, prevista na al. a) do n.° 5 do art. 10.° do CIRS.
5ª Tendo sido evitado se cumprido fosse o terminus dos 24 meses, estabelecido na al. a) daquele n.° 5, para proceder, em termos reais e objectivos, á respetiva tributação.
6a A liquidação viola o estabelecido no n.° 1 e 2, al. a) do art. 8.° da LGT;
7a Desta forma, se a Impugnada tivesse aguardado pelos 24 meses, a liquidação iria recair sobre valores certos e reais, mostrando-se provado o facto que resultou como não provado.
VI. Do Pedido:
Termos em que, em face do efetivamente provado e do aqui agora alegado, sequencialmente ao pedido inicial, se requer a V. Exa. Sr. Dr. Juiz que a final seja lavrada sentença que defira “in totum” o peticionado “ab initio” e assim anulada a liquidação e, consequentemente a restituição do imposto e dos juros compensatórios pagos, acrescidos de juros indemnizatórios à taxa de 4%, para que, como, sempre, se espera, seja feita
JUSTIÇA.

CONTRA ALEGAÇÕES.
Não houve.

PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO.

O Exmo. Procurador-Geral Adjunto neste TCA emitiu esclarecido parecer concluindo pela procedência do recurso pois comprovando-se que a Recorrente aplicou totalmente o valor da habitação antiga terá sido demonstrado o reinvestimento total. Para além disso, estando pendente impugnação subsequente (da segunda liquidação) deveria merecer despacho de apensação.


II QUESTÕES A APRECIAR.
O objecto do presente recurso, delimitado pelas conclusões formuladas (artigos 635º/3-4 e 639º/1-3, ambos do Código de Processo Civil, «ex vi» do artº 281º CPPT), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 608º/ 2, in fine), consiste em saber se a sentença errou ao julgar improcedente a impugnação deduzida contra o indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa de liquidação de IRS-Mais valias.

III FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.
A sentença fixou os seguintes factos provados e respetiva motivação:
1. A Impugnante, M...., vendeu no dia 24 de setembro de 2003, pelo preço de €187.050, a fração autónoma destinada a habitação, designada pela letra «F», correspondente ao primeiro andar direito do prédio situado na Rua B…. n.os6……, na então freguesia de C….., em Lisboa, inscrito na matriz predial urbana daquela freguesia sob o art.1350, descrito na respetiva Conservatória sob a ficha 1…., onde até então mantinha a sua casa de morada.

2. No dia 29 de julho de 2005 a Impugnante comprou, pelo preço de €194.531,18, que logo pagou ao casal que lha vendeu, uma moradia composta por cave e rés do chão, com alpendre e logradouro, situada na Rua do C…. 7, em F…., P…., no concelho de Torres Vedras, inscrito na matriz predial urbana daquela freguesia sob o art.P2...°, descrito na respetiva Conservatória do Registo Predial sob a ficha 3…..

3. Neste novo espaço habitacional, pelo menos desde então, passou a Impugnante a residir de forma habitual - fixando aí o seu domicílio fiscal.

4. Aquando daquela aquisição em 2005 a Impugnante, aquando da respetiva escritura pública, igualmente celebrou logo aí, com a C..., S A., um contrato de mútuo, garantido por hipoteca da casa ao banco, o qual lhe emprestou, para aquele fim, €55.000.

5. Aquando da entrega da declaração de rendimentos para efeitos de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, relativamente a 2003, o que fez a 30 de abril de 2004, como tinha já então intenção de vir a comprar uma nova casa de morada, a Impugnante anexou ao modelo oficial 22, a declaração do rendimento auferido com a alienação referida no ponto 1., um «anexo G - mais valias» no qual expôs o valor dessa alienação, bem como o mês e o ano em que por sua vez havia comprado esse apartamento e o preço que por ele pagara então [respetivamente: dezembro de 1989 e €9.975,96] e, bem assim, declarou pretender reinvestir, desse rendimento, na aquisição de uma nova casa para morar, o valor de €159.615 e, ainda, ter liquidado com parte desse rendimento o remanescente em dívida, de €5.636, do empréstimo contratado aquando da sua aquisição, em 1989.

6. Com base nisso, ser-lhe-ia então elaborada pela Administração Tributária, em 25 de setembro de 2004, a liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares relativa a 2003, com o n°[2004]50041….., sustando a tributação sobre o rendimento referido no ponto 1., mas parcialmente, em conformidade com a intenção manifestada pela Impugnante.

7. Assim, essa liquidação, de que resultou uma dívida de imposto de €3.578,02, com termo do prazo de pagamento no dia 8 de janeiro de 2004, teve em conta o rendimento do trabalho dependente auferido nesse ano, conforme declarado, no montante de €40.752,46 e a mais valia, na parte em que não havia sido expressa intenção de reinvestimento, no valor €10.057,36, sendo esta calculada nos seguintes termos:
• mais valia global da alienação apurada:

€187.050 (preço de venda), subtraído de €19.652,64 (preço de aquisição) [este valor decorre de o preço de aquisição,
€9.975,96, ser atualizado em função do coeficiente de desvalorização monetária desse valor de dezembro de 1998, o qual é de 1,97 ('); assim: €9.975,96x1,97=619.652,64];

Donde, uma mais valia global obtida no valor de €167.397,36 [=€187.050-619.652,64].

• mais valia na proporção em que é tributável (/. e.,
onde não houve manifestação da intenção de reinvestimento e subtraído o encargo satisfeito para sua obtenção (2))*,

Cfr. Portaria 287/2003 de 3 de abril.
2 Ou seja, o valor do remanescente em dívida do empréstimo contraído para aquisição do apartamento, no valor de €5.636,00.

intenção expressa de reinvestimento, €159.615,00 =
87,98% de €181.414, donde, uma mais valia global só tributável em 12,02% do seu valor:
€20.114,74 [=€167.397,36x0,1202].

• a tributação incidiu sobre metade deste último valor, sobre €10.057,36.

8. Notificada desta liquidação, a Impugnante procedeu à satisfação da mencionada dívida de imposto no dia 30 de dezembro de 2004.

9. No dia 13 de junho de 2006 a Impugnante apresentou um pedido de revisão daquela liquidação, fundamentando-se em que não havia sido respeitada a sua declaração de reinvestimento do rendimento obtido com a alienação mencionada no ponto 1. e declaração conexa, referida no ponto 5.

10. Nunca tendo sido decidido tal pedido de revisão, quando pôde presumir o seu
indeferimento, a Impugnante apresentou então a petição na origem dos presentes autos, a 7 de março de 2007.

Não há outra matéria com interesse para a causa que tivesse resultado provada e não há factos não provados com essa relevância, salvo que não resultou provado:

1. Que a impugnante haja declarado pretender reinvestir todo o rendimento obtido com a venda referida no ponto 1 . da matéria de facto provada, aquando da apresentação da declaração de rendimentos como mencionado no ponto 5. daquela matéria de facto.

Pese embora os factos sejam consensuais - à exceção de um só, contido no ponto 5. da matéria de facto julgada provada foi a partir da análise da prova documental reunida que o Tribunal formou a convicção positiva acerca da matéria de facto provada. Assim, o descrito nos pontos 1.-4. (o ponto 3., também dos dados de domiciliação fiscal da Impugnante constantes) extraiu-se das cópias das certidões das escrituras públicas de compra e venda, com mútuos associados, de fls. 16-34 destes autos; o facto provado sob o ponto 5., que se revela o cerne da impugnação, retirou-se, sem qualquer margem para dúvidas, do teor do citado anexo G, constante do processo administrativo a suas fls.61- 62, onde clara e explicitamente a Impugnante declara pretender reinvestir apenas o valor mencionado e não a totalidade; os factos nos pontos 6. e 7. resultam do teor da demonstração de liquidação e da exposição feita no processo administrativo sobre o cálculo das mais valias e da sua tributação na tributação global elaborada à Impugnante, por aquele ato, tendo ainda presentes os extratos retirados ambos dos arquivos de suporte informático da própria Administração Tributária. O facto consignado no ponto 8., resulta de fls.12 destes autos. O teor dos pontos 9.-10. resulta da menção dos carimbos de entrada de cada uma das petições, a do pedido de revisão, inserta com o mais que lhes respeita, no processo administrativo organizado, e a destes autos, de suas fls.2.

No valor probatório da documentação aludida assentou o juízo probatório, que se suporta na origem pública dos documentos ou sua certificação, ou constituindo-se eles mesmos documentos públicos, conforme o valor que lhes confere o disposto no art.387º do Código Civil, tendo em conta que não oferece dúvidas a sua fidedignidade, não tendo sido, de resto, questionada, tanto mais que documenta factos consensuais à exceção de um, vindo nesse sentido em seu auxílio o disposto nos arts.369°n°l, 370°n°l e 371°n°l do mesmo corpo de normas, enquanto tomados no seu estrito poder probatório, como cópias não autenticadas que são. Já relativamente à documentação com origem em cópias de documentos da própria Administração Tributária, sob o mesmo raciocínio, teve-se em conta o disposto no art.34°n°2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário.

Os factos que resultaram não provados ficaram a dever tal juízo negativo sobre a sua verificação à ausência de prova sobre o invocado e, antes disso, à contradição dessa invocação com a prova do consignado no ponto 5. da matéria de facto provada.

ADITAMENTO OFICIOSO DE FACTOS:
Ao abrigo do disposto no art.º 662º do CPC aditamos oficiosamente os seguintes factos:
11. A Impugnante apresentou declaração de rendimentos relativa ao ano de 2005, em 11 de maio de 2006, via internet, com o respetivo anexo G tendo preenchido o campo 508 do quadro 5 com o valor reinvestido de € 181 414,00 na aquisição do artigo 2251 da freguesia de P…., concelho de Torres Vedras, titulada pela escritura de compra e venda e mútuo com hipoteca lavrada em 29 de julho de 2005, pelo valor de € 194531,18 e 55 000,00, respetivamente. (informação de fls. 59 do apenso e escritura de fls. 16 dos autos)
12. O empréstimo concedido à impugnante destinou-se à aquisição do imóvel (escritura de compra e venda outorgada em 29/7/2005 junta fls. 16 e clausula 2ª do documento complementar de fls. 21).
13. Tendo-se constatado a existência de recurso a crédito para aquisição da nova habitação foi emitida nova liquidação em 2007 no valor de € 7.457,77 que a Impugnante contestou no processo de impugnação n.º 1451/08.8BELRS (fls. 61 dos autos).
14. Nos autos foi requerida a apensação da ação n.º 1451/08.8BELRS a qual foi indeferida por despacho de fls. 25 dos autos, sem interposição de recurso.

IV FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO.
A Impugnante deduziu impugnação judicial contra o indeferimento presumido do pedido de revisão oficiosa da liquidação relativa ao ano de 2003, na importância de € 3.578,02, paga em 30/12/2004.
Alegou ter adquirido por compra em dezembro de 1989, pelo valor de € 9.975,96, com recurso a crédito bancário, uma casa para sua habitação própria e permanente, que vendeu em 15/9/2003 pelo preço de € 187.050,00.
Na declaração mod. 3 de IRS relativa ao ano de 2003 declarou que pretendia reinvestir o valor de € 159.615,00.
Mas por compra do artigo matricial 2251 efetuada em 29 de julho de 2005, reinvestiu todo o valor da realização (187.050,00) deduzido do montante do empréstimo bancário ainda em dívida no valor de € 5.636,00, de que resultou um valor de € 181 414,00.
A AT com base na declaração de intenção de reinvestimento e no seu rendimento colectável apurou imposto a pagar no montante de € 3.578,2 relativo a 2003.

Entende, no entanto, que tendo reinvestido a totalidade do valor realizado na aquisição de imóvel para habitação própria e permanente antes de decorridos 24 meses após a realização, existe ilegalidade na liquidação na parte em que incluiu no seu rendimento colectável uma mais valia que se sabia, poderia não ser tributável, desde que viesse a ocorrer até aos 24 meses seguintes o reinvestimento efetivo do valor realizado com a venda da casa em 2003, reinvestimento que realmente aconteceu em julho de 2005.

Por sentença de 14/3/2012 a impugnação foi julgada manifestamente intempestiva por ter sido deduzida no seguimento de presunção de indeferimento tácito de revisão oficiosa apresentado fora do prazo de impugnação administrativa.

Interposto recurso para o STA, foi revogada a sentença e ordenada a baixa dos autos ao tribunal "a quo" para que prossigam, se a tal nada mais obstar.

Prosseguindo os autos, foi proferida nova sentença que julgou improcedente a impugnação com os seguintes fundamentos:
“ Em face da factualidade julgada provada, a questão dos autos resolve-se pelo que eles mesmos descrevem. Com efeito, ao invés do que a Impugnante invoca, ela em momento algum expressou ter intenção de reinvestir todo o rendimento auferido da venda da sua antiga casa de morada, mas sim parte desse rendimento, mais exatamente, €159.615 dos €187.050.

Em face disso, no respeito pelo que declarara, a Administração Tributária elaborou-lhe a liquidação mediatamente impugnada, «normalmente», isto é, seguindo o que ela disse no tal anexo G à declaração de rendimentos para efeitos de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, modelo 22. Como é sabido, na conjugação das normas contidas do art.l0°n.osl corpo e alínea a) [, 4 corpo e alínea a)] e 5 corpo e alínea a) do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares coevo, no qual o Legislador estabelecia já como que uma suspensão de tributação do rendimento que constitua mais valias advindas da alienação da casa de morada, as quais não são objeto de tributação se e na medida em que o respetivo produto for, em certo lapso de tempo, 24 meses após a venda da antiga casa, empregue na aquisição de uma nova morada, o que a verificar-se conduz a uma exclusão [definitiva] de tributação de tais rendimentos, em homenagem ao benefício social que se reconhece à aquisição de casa própria, em conjugação com a equivalência patrimonial que resulta da aplicação daquela tipologia de rendimento num bem com a mesma função socioeconómica.

Ora, se a Impugnante oportunamente manifestou, nos termos do art.57°n°4 do citado Código, na versão de então, a intenção de reinvestir parte daquele produto da venda da sua antiga casa na aquisição de uma nova casa de morada, citado art.l0°n°5 corpo e alínea a), com isso obteve a exclusão ou, em rigor, a suspensão da tributação sobre esse rendimento, na mesma proporção - como dito, até que tal reinvestimento se efetivasse adentro daquele lapso de tempo de 24 meses, ficando então liberto de qualquer tributação - foi exatamente com base nisso e seguindo o regime invocado que a Administração Tributária desenvolveu depois o procedimento tendente à liquidação do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares a si relativo e àquele ano de 2003.

Com efeito, englobaria no rendimento aquelas mais valias, mas proporcionalmente, tão só na parte em que a Impugnante não declarara intenção de reinvesti-las em bem com a mesma destinação que aquele que lhas proporcionara.

Em conclusão, em face do exposto, concluímos que nem a decisão presumida de indeferimento do pedido de revisão, diretamente impugnada, nem a liquidação mediatamente impugnada, são ilegais por procederem de erro ou lapso dos serviços, in casu por desrespeito ou por mera abstração do oportunamente declarado pela Impugnante. Ao invés, mostra-se que a liquidação elaborada seguiu exatamente o que ela declarou. Soçobra, pois, de pleno, esta impugnação, por se mostrarem conformes os atos impugnados, designadamente com o declarado pela Impugnante e com o regime em face disso aplicável à tributação de mais valias como aquelas, relevantes de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares. Por isso se mantêm os autos.(...)”

A Impugnante/Recorrente não se conforma e defende que a AT assentou a tributação, em pressupostos inexistentes. Considerou que o valor de € 159.615,00 declarado no campo 504 do quadro 5, do anexo G como sendo um valor reinvestido e não como um valor com a mera intenção de proceder ao reinvestimento, para efeitos do estabelecido na alínea a) do n.º 5 do art. 10º do CIRS.
A lei exige que os pressupostos da tributação sejam, de facto e de direito;
Se a Impugnada tivesse aguardado pelos 24 meses, a liquidação iria recair sobre valores certos e reais.
Não foi aplicada a norma de incidência prevista na alínea a) do n.º 5 do art.º 10º do CIRS.

Apreciando.
Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais resultem de (a) alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis (...).
Por seu turno, dispunha o n.º 4 do mesmo preceito que o ganho sujeito a IRS é constituído (a) Pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição líquidos da parte qualificada como rendimento de capitai, sendo caso disso, nos caos previstos nas alíneas a), b) e c) do n.º 1.

O n.º 5 do mesmo preceito excluía da tributação os ganhos provenientes da transmissão onerosa de imóveis destinados a habitação própria e permanente do sujeito passivo ou do seu agregado familiar, nas seguintes condições:
a) Se, no prazo de vinte e quatro meses contados da data de realização, o valor da realização, deduzido da amortização de eventual empréstimo contraído para a aquisição do imóvel, for reinvestido na aquisição da propriedade de outro imóvel, de terreno para a construção de imóvel, ou na construção, ampliação ou melhoramento de outro imóvel exclusivamente com o mesmo destino e desde que esteja situado em território português.
b) (...)
c) Para efeitos do disposto na alínea a), o sujeito passivo deverá manifestar a intenção de proceder ao reinvestimento, ainda que parcial, mencionando, na declaração de rendimentos respeitante ao ano da alienação, o valor que tenciona reinvestir;
d) Em caso de reinvestimento de montante diverso do declarado nos termos da alínea anterior, o sujeito passivo fica obrigado a entregar declaração de substituição, com os valores efetivamente reinvestidos, dentro do prazo normal que ocorra após o termo do período de 24 meses a que se refere a alínea a).

Esta alínea foi revogada pelo artigo 1º do Decreto-Lei n.º 211/2005, de 7 de dezembro, que, segundo o seu preâmbulo, teve “...em vista a simplificação e o aperfeiçoamento de obrigações acessórias declarativas, designadamente no que respeita às exigências de comprovação de elementos junto da administração tributária e aos formulários apresentados por não residentes que auferem rendimentos em território português”.

Como quer que seja, considerando que as normas tributárias se aplicam aos factos posteriores à sua entrada em vigor (art.º 12º/1 LGT), a revogação da alínea d) do n.º 5 do CIRS não aproveita à Impugnante.

Queremos com isto dizer que se a Impugnante em cumprimento da alínea a) manifestou intenção de reinvestimento de um determinado valor [€ 159.615,00], mas depois reinvestiu a totalidade do valor realizado [€ 187.050,00, deduzido do montante do empréstimo hipotecário ainda em dívida à data da venda - € 5.636,00], deveria ter cumprido os seus deveres declarativos e apresentado declaração de substituição com os valores efetivamente reinvestidos, dentro do prazo normal que ocorra após o termo do período de 24 meses a que se refere a alínea a).

Simplesmente não consta dos autos que a Impugnante/Recorrente tenha cumprido tal dever declarativo, nem isso alega na petição inicial ou mesmo neste recurso.

O facto de em 11 de maio de 2006 ter entregue declaração de rendimentos relativa ao ano de 2005, com o respetivo anexo G tendo preenchido o campo 508 do quadro 5 com o valor reinvestido de € 181 414,00 na aquisição do artigo 2…. da freguesia de P…. do, concelho de Torres Vedras, não corresponde à declaração de substituição que a lei lhe impunha apresentar.

Mas mais importante do que isso, a alegação de que reinvestiu todo o valor da venda (valor de realização) é absolutamente falsa.
O valor de realização foi de € 187.050,00, mas se deduzirmos o valor do empréstimo bancário (€ 5.636,00) alegadamente ainda em dívida à data da venda, resulta um valor de € 181.414,00=(187.050,00-5.636,00).

Por seu turno, o artigo 2251 foi adquirido pelo valor declarado de 194.531,18. Mas para pagamento da aquisição contraiu empréstimo no montante de € 55.000,00, pelo que assim sendo, apenas reinvestiu € 139.531,18 = (194.531,18-55.000,00), entendendo-se pacificamente que a aquisição total ou parcial com recurso a crédito bancário não constitui reinvestimento, na parte mutuada(1).

Ou seja, ao contrário do que falsamente alegou, não só não reinvestiu a totalidade do valor realizado com a alienação como ainda reinvestiu menos do que manifestara inicialmente como intenção de reinvestimento (€ 159.615,00).
Por conseguinte, a sentença andou bem, a Recorrente não tem razão.

Por fim, quanto à questão da apensação da ação de impugnação judicial n.º 1451/08 a estes autos, referida pelo Exmo. PGA, a mesma é inviável pois o despacho que a indeferiu não foi objecto de recurso, constituindo, por isso, caso julgado formal (art. 620º/1 CPC).

V DECISÃO.

Termos em que acordam, em conferência, os juízes da secção de contencioso Tributário deste TCA em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas pela RECORRENTE.

Lisboa, 11 de abril de 2019.



(Mário Rebelo)


(Patrícia Manuel Pires)


(Vital Lopes)



(1) Cfr. ac. do STA n.º 01241/09 de 24-03-2010 -Relator: DULCE NETO
Sumário: I – Nos termos do disposto no artigo 10º nº 5 do CIRS (na redacção que lhe foi dada pela Lei nº 10-B/96, de 23 de Março) constitui um pressuposto da exclusão da tributação em IRS que o produto da alienação obtido na transmissão onerosa de imóvel destinado à habitação do sujeito passivo ou do seu agregado familiar seja reinvestido na aquisição de outro imóvel destinado exclusivamente ao mesmo fim no prazo de 24 meses.
II – O reinvestimento a que se reporta esse preceito é tão só o reinvestimento do produto da alienação e não o investimento através de empréstimo bancário, pelo que tendo a impugnante, para a aquisição de um novo imóvel, recorrido totalmente a crédito bancário, não pode ver as mais-valias excluídas de tributação.