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Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1422/16.0BELRA
Secção:CT
Data do Acordão:01/31/2019
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:NORMAS RELATIVAS À RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. CARÁCTER SUBSTANTIVO.
DEFINIÇÃO DE CONTRIBUIÇÕES PARA A SEGURANÇA SOCIAL.
APLICAÇÃO DO REGIME DE RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA CONSAGRADO NO ARTº.24, DA L.G.T.
CONCEITO DE GERÊNCIA E DE ACTOS DE GERÊNCIA.
O GERENTE GOZA DE PODERES REPRESENTATIVOS E DE PODERES ADMINISTRATIVOS FACE À SOCIEDADE.
REGIME DE RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA PREVISTO NO ARTº.24, Nº.1, DA L.G.TRIBUTÁRIA.
ÓNUS DA PROVA DO EFECTIVO EXERCÍCIO DA GERÊNCIA/ADMINISTRAÇÃO COMPETE À A. FISCAL.
MÉTODO DE AFERIÇÃO DA CULPA DO RESPONSÁVEL SUBSIDIÁRIO PREVISTO NO ARTº.24, Nº.1, AL.B), DA L.G.T.
Sumário:1. As normas com base nas quais se decide a responsabilidade subsidiária, inclusivamente aquelas que determinam as condições da sua efectivação e o ónus da prova dos factos que lhe servem de suporte, devem considerar-se como normas de carácter substantivo, pois a sua aplicação tem reflexos materiais na esfera jurídica dos revertidos. Nestes termos, a aplicação do regime previsto na L.G.Tributária aos requisitos da reversão da execução fiscal contra responsáveis subsidiários apenas tem suporte legal quando os factos que servem de fundamento à mesma reversão ocorreram depois da sua entrada em vigor (cfr.artº.12, do C.Civil; artº.12, da L.G.Tributária).
2. As contribuições para a segurança social podem definir-se, actualmente, como prestações pecuniárias de carácter obrigatório e definitivo, afectas ao financiamento de uma ampla categoria de despesas do sistema previdencial de segurança social e de outras (designadamente das políticas activas de emprego e de formação profissional), pagas a favor de uma entidade de natureza pública e tendo em vista a realização de um fim público de protecção social.
3. Às contribuições/quotizações para a segurança social, as quais se devem considerar verdadeiros impostos, aplica-se o regime de responsabilidade subsidiária consagrado no artº.24, da Lei Geral Tributária (cfr.anteriormente o artº.13, do C.P.Tributário).
4. A gerência é, por força da lei e salvo casos excepcionais, o órgão da sociedade criado para lhe permitir actuar no comércio jurídico, criando, modificando, extinguindo, relações jurídicas com outros sujeitos de direito. Estes poderes não são restritos a alguma espécie de relações jurídicas; compreendem tantas quantas abranja a capacidade da sociedade (cfr.objecto social), com a simples excepção dos casos em que as deliberações dos sócios produzam efeitos externos.
5. O gerente goza de poderes representativos e de poderes administrativos face à sociedade. A distinção entre ambos radica no seguinte: se o acto em causa respeita às relações internas entre a sociedade e quem a administra, situamo-nos no campo dos poderes administrativos do gerente. Pelo contrário, se o acto respeita às relações da sociedade com terceiros, estamos no campo dos poderes representativos. Por outras palavras, se o acto em causa tem apenas eficácia interna, estamos perante poderes de administração ou gestão. Se o acto tem eficácia sobre terceiros, verifica-se o exercício de poderes de representação.
6. Na previsão da al.a), do artº.24, nº.1, da L.G.Tributária, pretendem-se isolar as situações em que o gerente/administrador culpado pela diminuição do património societário será responsável pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou de entrega tenha terminado depois deste, competindo à Administração Fiscal fazer a prova de que foi por culpa sua que o património se tornou insuficiente. Já na al.b), do preceito o gerente é responsável pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou de entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, recaindo sobre o mesmo o ónus da prova de que não foi por culpa sua que o pagamento não se efectuou. Por outras palavras, nas situações em que o gestor exerce, efectivamente, as suas funções e é no decurso desse exercício que se forma o facto tributário ou se inicia o prazo para o pagamento, mas antes que tal prazo se esgote, o gestor cessa as suas funções, o ónus da prova, de que o património da sociedade se tornou insuficiente para a satisfação da dívida por acto culposo do gestor, corre por conta da Fazenda Pública (cfr.alínea a), do artigo 24, da L.G.T.). Se é no decurso do exercício efectivo do cargo societário de gerente que se esgota o prazo para o pagamento do imposto, não vindo ele a acontecer (o pagamento não se efectuou no prazo devido), o ónus da prova inverte-se contra o gerente, sendo ele quem tem de provar que não lhe foi imputável a falta de pagamento (o gestor está obrigado a fazer prova de um facto negativo, poupando-se a Fazenda Pública a qualquer esforço probatório - cfr.al.b), do normativo em exame). Na alínea b), do nº.1, do artº.24, da L. G. Tributária, consagra-se, portanto, uma presunção de culpa, pelo que a Administração Fiscal está dispensada de a provar.
7. Ao abrigo do regime examinado é pressuposto da responsabilidade subsidiária o exercício de facto da gerência, cuja prova impende sobre a Fazenda Pública, enquanto entidade que ordena a reversão da execução.
8. A culpa em causa no artº.24, nº.1, da L.G.T., deve aferir-se pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias do caso concreto - isto, quer se entenda que a responsabilidade em causa tem natureza contratual ou extra-contratual (cfr.artºs.487, nº.2, e 799, nº.2, do C.Civil) - e em termos de causalidade adequada, a qual não se refere ao facto e ao dano isoladamente considerados, mas ao processo factual que, em concreto, conduziu ao dano. Sabido que são os administradores ou gerentes quem exterioriza a vontade da sociedade nos mais diversos negócios jurídicos, através dos quais se manifesta a sua capacidade de exercício de direitos, a responsabilidade subsidiária assenta na ideia de que os poderes de que estavam investidos lhes permitiam uma actuação determinante na condução da sociedade. Assim, há que verificar, operando com a teoria da causalidade, se a actuação do gestor da sociedade originária devedora, concretizada quer em actos positivos quer em omissões, foi adequada à insuficiência do património societário para a satisfação dos créditos exequendos. E, nesse juízo, haverá que seguir-se o processo lógico da prognose póstuma. Ou seja, de um juízo de idoneidade, referido ao momento em que a acção se realiza ou a omissão ocorre, como se a produção do resultado se não tivesse ainda verificado, isto é, de um juízo “ex ante”. Por outras palavras, o acto ilícito e culposo que se presume praticado pelo gestor não se fica pela omissão de pagamento do imposto vencido. O que se presume é que o gestor não actuou com a diligência de um “bonus pater familiae”, com a observância das disposições legais aplicáveis aos gestores, em especial ao do artº.64, do C.S.Comerciais, que lhe impõe a observância de deveres de cuidado, de disponibilidade, de competência técnica, de gestão criteriosa e ordenada, de lealdade, no interesse da sociedade e dos sócios que sejam relevantes para a sustentabilidade da sociedade. Apesar da dificuldade que existe na prova de um facto negativo, como é o caso da ausência de culpa, o oponente não pode deixar de alegar e provar factos concretos de onde se possa inferir que a insuficiência patrimonial da empresa se deveu a circunstâncias que lhe são alheias e que não lhe podem ser imputadas. Para afastar a responsabilidade subsidiária por dívidas de impostos cujo prazo de pagamento terminou durante a gestão, o gestor tem pois que demonstrar que a devedora originária não tinha fundos para pagar os impostos e que a falta de meios financeiros não se deveu a qualquer conduta que lhe possa ser censurável.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
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RELATÓRIO
X
J……., com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do T.A.F. de Leiria, exarada a fls.89 a 93-verso do presente processo que julgou totalmente improcedente a oposição intentada pelo recorrente, visando a execução fiscal nº…..-2010/….. e apensos, a qual corre seus termos no “Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP.”, Secção de Processo de Leiria, contra o opoente/recorrente revertida e instaurada para a cobrança de dívidas de quotizações e contribuições à Segurança Social, relativas aos períodos de Janeiro e Fevereiro de 2010, tal como de juros referentes a Novembro de 2009, tudo no montante global de € 11.476,07.
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O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.127 a 136 dos autos) formulando as seguintes Conclusões (após convite para sintetizar as mesmas):
1-A douta sentença que aqui se recorre considerou que “Deste modo, é ao Oponente que cabe a demonstração de que a situação de insuficiência se ficou a dever exclusivamente a factores exógenos e que o exercício da gerência se pautou pela diligência de um bónus pater familie no sentido de evitar essa situação" Acrescentando ainda que “Nestes termos, impõe-se concluir pela legitimidade do Oponente para a execução julgando improcedente a oposição.”;
2-O RECORRENTE foi citado, na qualidade de responsável subsidiário, no âmbito do processo de Execução instaurado pelo Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social - Secção de Processos de Leiria, contra a sociedade S……. - Comércio e Indústria de Plásticos, S.A., sujeito passivo originário, com vista à cobrança coerciva de dívidas de cotizações e contribuições devidas e não entregues dos anos de 2009 e 2010, no montante total de € 8.847,80;
3-O posicionamento do período de exercício do cargo de gestor na sociedade devedora originária, para efeitos de identificação do regime jurídico aplicável, é feito por referência à data do termo do prazo legal de pagamento ou entrega da dívida tributária;
4-Se a gestão foi exercida em momento anterior à data do termo do prazo legal de pagamento ou entrega da dívida tributária aplica-se o regime constante da alínea a) do nº 1 do artigo 24º da LGT. Ao invés, tendo o prazo legal de pagamento da dívida tributária durante o período do exercício do cargo de gestor, já é aplicável o regime da responsabilidade do gestor previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 24º da LGT;
5-Do que antecede, terá de se concluir que o REVERTIDO não pode ser responsabilizado - como considerou, erroneamente, o Excelentíssimo Chefe da Secção de Processos de Leiria do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, no despacho que determinou a reversão com base no fundamento da alínea b) do nº 1 do artigo 24º da Lei Geral Tributária, isto é, não podia ser responsabilizado pela falta de pagamento das dívidas tributárias;
6-Perante as duas alíneas do nº 1 do artigo 24º da Lei Geral Tributária, resulta de forma evidente que o ordenamento jurídico apenas permite uma responsabilização do REVERTIDO que seja proporcional à culpa evidenciada no âmbito do exercício das funções de gerência que, em concreto, tenham concorrido para a subsistência da dívida revertida;
7-Com efeito, de acordo com o regime previsto na alínea a) do nº1 do artigo 24º da Lei Geral Tributária, o gestor só pode ser responsabilizado pelas dívidas tributárias da sociedade quando a administração tributária logre provar que o património daquela se tornou insuficiente para a satisfazer as dívidas por culpa;
8-A responsabilidade tributária subsidiária resultante deste normativo é responsabilidade civil de natureza contratual dado que o estatuto do gerente/administrador lhe advém por virtude da sua relação negocial com a sociedade iniciada com a sua nomeação para o exercício do cargo de gerente e consequentemente aceitação do mesmo, em consequência do que assume uma situação de garante das dívidas sociais, embora com direito à prévia excussão dos bens sociais (Cfr. Artigo 153º do CPPT);
9-Da leitura do artigo 24º nº 1 alínea a) e b) resulta enquanto na alinea a) não se prevê qualquer presunção de culpa do gerente da sociedade, ficando, por isso, a cargo da fazenda pública o ónus da prova de que tenha sido culpa daquele que o património social se tornou insuficiente para a satisfação das dividas tributárias, já na alínea b) onera-se o responsável subsidiário com a prova de que não lhe foi imputável a falta de pagamento;
10-O que quer dizer que só relativamente às dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do cargo se impõe ao gerente ou administrador o ónus da prova que a falta de pagamento da sociedade lhe é imputável;
11-Portanto, da análise da gerência de facto, é preliminar à culpa pela falta de pagamento, sendo certo que, a prova dos pressupostos da facto da gerência compete à A. Fiscal, a qual deverá por referência a atos praticados pelos potenciais revertidos, suscetíveis de demonstrar tal efetividade do exercício de funções de gestão da devedora originária, entendendo-se como tal a pratica de atos com caráter de continuidade e com poder de decisão para o exercício das funções respetivas;
12-Na sequência deste entendimento, unânime na Jurisprudência atual, que se adere, decorre que cabe, em primeira linha, à Segurança Social, demonstrar cabalmente que o revertido exerceu, nos termos consignados no nº.1 do artº.24 da LGT, efetivas funções de administração entendidas como funções de gestão e representação da sociedade nos termos previstos no Código das Sociedades Comerciais. Ora, no caso dos autos, tal não resulta evidenciados;
13-Não tendo sido demonstrado pela A. Fiscal o exercício efetivo por parte do revertido das funções de gerente da devedora originária, sendo que era seu o ónus de tal demonstração, resulta que não estão reunidos os pressupostos para a reversão, pelo que verificou-se a falta de verificação dos pressupostos de gerência de facto;
14-Compete pois à exequente demonstrar a verificação dos pressupostos que permitam reverter a execução fiscal contra o gerente da sociedade originária devedora e, entre eles, os respeitantes à existência de gestão de facto e ao abrigo da regra geral de quem invocar um direito tem que provar os respetivos factos constitutivos, consagrada no artº.342, nº.1, do C.Civil, e também no artº.74, nº.1, da LGT;
15-Com efeito, como já dissemos, que não há presunção legal alguma que faça decorrer da qualidade de gerente de direito o efetivo exercício da função. E só quem tem a seu favor uma presunção legal é que não necessita de provar o facto a que ela conduz, como prevê o artigo 350º nº 1 do Código Civil, sendo que da inscrição no registo comercial da nomeação de alguém como gerente resulta a presunção legal de que o gerente o é de direito (Cfr. Artigo 11º do Código de Registo Comercial) não de que exerce funções;
16-Daí que, ainda que se mostre provada a gerência de direito, continua a caber à Segurança Social, a prova de que a designação de direito do gerente correspondeu o efetivo exercício da função, uma vez que a lei não se basta para responsabilizar o gerente com mera designação desacompanhada de qualquer concretização desse exercício;
17-Nesta medida, e porquanto, no caso sub iudice, está demonstrado, à saciedade, a falta dos pressupostos, de facto e de direito, da responsabilidade tributária subsidiária, terá que se reconhecer que o revertido não é responsável pelo pagamento das dividas tributárias ao processo de execução em epígrafe;
18-NESTES TERMOS E NOS MAIS DE DIREITO SEMPRE COM O MUI DOUTO SUPRIMENTO DE V/ EXAS. DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE POR PROVADO E CONSEQUENTEMENTE SER DECLARADO NULO O ATOS DE NOTIFICAÇÃO PRATICADO.
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Não foram produzidas contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do não provimento do presente recurso (cfr.fls.141 a 143 dos autos).
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Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para deliberação.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A decisão recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.89-verso e 90 do processo físico):
1-Em 7/08/2010, contra a sociedade “S…….. - Comércio e Indústria de Plásticos, Lda.”, foi instaurado o processo de execução fiscal nº……-2010/….. e apensos, pela secção de processo executivo de Leiria, do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, IP, por dívidas à Segurança Social, na quantia exequenda de € 10.573,88 e acrescido de € 902,19, referentes a juros de 2009/11, conforme certidão ……./2010 de 07.08.2010, referentes a cotizações de 2010/01 e 2010/02, conforme certidão ……/2010 de 07.08.2010, e referentes a contribuições de 2010/01 e 2010/02, conforme certidão ……./2010 de 07.08.2010 (cfr.documentos juntos a fls.20 a 24 do processo físico);
2-Em 24.01.2011, no PEF identificado no ponto 1, foi apresentado requerimento pelo ora oponente, J……, na qualidade de representante da “S…… - Comércio e Industria de Plásticos, Lda”, para pagamento da dívida em 36 prestações (cfr.documento junto a fls.26 do processo físico);
3-Em 18.10.2012, no mesmo PEF, foi proferido despacho “DESPACHO REVERSÃO” que integra, além do mais, o seguinte teor (cfr.documento junto a fls.32 e verso do processo físico):
“(…)
Em resultado das diligências efectuadas no processo 1001………… e apensos concluiu-se pela insuficiência de bens na titularidade da executada, uma vez que as penhoras ordenadas às contas bancárias da devedora originária e aos créditos dos respectivos clientes não resultaram valores penhorados suficientes para cobrança da dívida exequenda e acrescidos legais; por outro lado, também de acordo com a informação disponível nos autos, a devedora originária não é proprietária de qualquer bem imóvel, nem são conhecidos quaisquer outros tipos de bens penhoráveis nem sequer indicados à penhora pela própria devedora originária (…). De acordo com informação constante da base de dados da Segurança Social, bem como dos demais elementos dos autos, verifica-se ser responsável subsidiário pelo pagamento da dívida J………..., porquanto era gerente/administrador da executada nos períodos a que a dívida se refere.
(…)
Em conclusão, e atendendo aos elementos constantes no processo, encontram-se preenchidos os requisitos exigidos no n.º 2 do art.º 23.º da LGT, em conjugação com o art.º 153.º do CPPT, para efectivação da reversão contra o responsável subsidiário de acordo com o definido artigo 24.º, n.º 1 alínea b) da LGT (…)”;
4-Em 20.10.2012, foi recebido na pessoa de terceiro, ofício de “CITAÇÃO (REVERSÃO)” remetido ao ora oponente, respeitante ao processo executivo identificado no ponto 1, pelo valor da quantia exequenda de € 7.049,30 e acrescido de € 1.798,50, tudo no total de € 8.847,80 (cfr.documentos juntos a fls.33 a 35 do processo físico);
5-Em 19.11.2012, foi remetida à secção de processo executivo de Leiria do IGFSS o articulado inicial do presente processo (cfr.data de registo postal constante de fls.19 do processo físico).
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A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Com interesse, não se apuraram outros factos, provados ou não provados…”.
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Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…Os factos provados assentam no teor das peças processuais e na apreciação da prova documental, integrada nos autos, referenciada junto a cada um dos factos assentes…”.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou improcedente a oposição à execução, devido ao decaimento dos seus fundamentos, mais mantendo o processo de execução fiscal quanto ao opoente e enquanto revertido.
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Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artº.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O recorrente defende, em síntese, que competia à Segurança Social demonstrar que o recorrente exerceu, nos termos consignados no artº.24, nº.1, da L.G.T., efectivas funções de administração, entendidas como funções de gestão e representação da sociedade executada originária. Que não se verifica tal prova no presente processo. Que se apura a falta de pressupostos, de facto e de direito, da responsabilidade tributária subsidiária, pelo que se deve reconhecer que o apelante não é responsável pelo pagamento das dívidas tributárias revertidas no processo de execução (cfr.conclusões 1 a 17 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar um erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Vejamos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
No exame do presente recurso, desde logo, se deve recordar que o apelante não impugna a factualidade provada constante da sentença recorrida no âmbito do salvatério que deduz para este Tribunal (cfr.artº.640, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6), nos termos previstos na lei.
Avancemos.
O vício em causa envolve a análise do fundamento de oposição previsto no artº.204, nº.1, al.b), do C.P.P.Tributário (ilegitimidade devido a falta de responsabilidade pelo pagamento da dívida exequenda - cfr.artº.286, nº.1, al.b), do anterior C.P.Tributário).
Antes de mais, diremos que as normas com base nas quais se decide a responsabilidade subsidiária, inclusivamente aquelas que determinam as condições da sua efectivação e o ónus da prova dos factos que lhe servem de suporte, devem considerar-se como normas de carácter substantivo, pois a sua aplicação tem reflexos materiais na esfera jurídica dos revertidos. Nestes termos, a aplicação do regime previsto na L.G.Tributária aos requisitos da reversão da execução fiscal contra responsáveis subsidiários apenas tem suporte legal quando os factos que servem de fundamento à mesma reversão ocorreram depois da sua entrada em vigor (cfr.artº.12, do C.Civil; artº.12, da L.G.Tributária; ac.S.T.A.-2ª. Secção, 28/9/2006, rec.488/06; ac.S.T.A.-Pleno da 2ª. Secção, 24/3/2010, rec.58/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 8/5/2012, proc.5392/12; ac.T.C.A. Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6732/13; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.456 e seg.).
No processo vertente, a eventual responsabilidade subsidiária do oponente deve ser analisada à luz do regime previsto no artº.24, da L.G.Tributária, diploma que entrou em vigor no pretérito dia 1/1/1999 (cfr.artº.6, do dec.lei 398/98, de 17/12), levando em consideração o período temporal (anos de 2009 e 2010) a que respeitam as dívidas à Segurança Social que constituem o débito exequendo revertido - cfr.nºs.1 e 4 do probatório (cfr.por todos ac.S.T.A.-2ª. Secção, 22/9/93, C.T.F.376, pág.211 e seg.).
As contribuições para a segurança social podem definir-se, actualmente, como prestações pecuniárias de carácter obrigatório e definitivo, afectas ao financiamento de uma ampla categoria de despesas do sistema previdencial de segurança social e de outras (designadamente das políticas activas de emprego e de formação profissional), pagas a favor de uma entidade de natureza pública e tendo em vista a realização de um fim público de protecção social (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 6/11/2012, proc.5760/12; ac. T.C.A.Sul-2ª.Secção, 21/05/2015, proc.5665/12; Nazaré da Costa Cabral, Contribuições para a Segurança Social, Natureza, Aspectos de Regime e de Técnica e Perspectivas de Evolução num Contexto de Incerteza, Cadernos do IDEFF, nº.12, 2010, pág.81 e seg.).
Às contribuições/quotizações para a segurança social, as quais se devem considerar verdadeiros impostos (cfr.Nazaré da Costa Cabral, ob.cit., pág.83; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 1/2/2011, proc.4395/10; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 6/11/2012, proc.5760/12), aplica-se o regime de responsabilidade subsidiária consagrado no artº.24, da Lei Geral Tributária (cfr.anteriormente o artº.13, do C.P.Tributário).
Mas que responsabilidade é esta. Segundo a opinião que defendemos, a responsabilidade do gerente pela violação das normas que impõem o cumprimento da obrigação fiscal radica no instituto da responsabilidade por facto ilícito assente em culpa funcional, isto é, em responsabilidade civil extracontratual (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 9/12/2004, rec.28/04, in Revista Fiscal, Vida Económica, Fevereiro, 2006, pág.28; ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 8/5/2012, proc.5392/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6732/13).
O estatuto do gerente/administrador advém-lhe por virtude da sua relação negocial com a sociedade, iniciada com a sua nomeação para o exercício do cargo de gerente e consequente aceitação do mesmo, em virtude do que assume uma situação de garante das dívidas sociais, embora com direito à prévia excussão dos bens da empresa (cfr.artº.146, do C.P.C.Impostos; artº.239, nº.2, do C.P.Tributário; artº.153, nº.2, do C.P.P. Tributário).
A lei não define precisamente em que é que se consubstanciam os poderes de gerência, mas, em face do preceituado nos artºs.259 e 260, do Código das Sociedades Comerciais, parece dever entender-se que serão típicos actos de gerência aqueles que se consubstanciam na representação da sociedade perante terceiros e aqueles através dos quais a sociedade fique juridicamente vinculada e que estejam de acordo com o objecto social (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 3/5/1989, rec.10492; ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 8/5/2012, proc.5392/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6732/13; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.465 e seg.).
É no artº.64, do C. S. Comerciais, que se encontra consagrado o dever de diligência dos administradores/gerentes de sociedade, nos termos do qual estes devem actuar com a diligência de um gestor criterioso e ordenado, no interesse da sociedade, tendo em conta os interesses dos sócios e dos trabalhadores.
A gerência é, por força da lei e salvo casos excepcionais, o órgão da sociedade criado para lhe permitir actuar no comércio jurídico, criando, modificando, extinguindo, relações jurídicas com outros sujeitos de direito. Estes poderes não são restritos a alguma espécie de relações jurídicas; compreendem tantas quantas abranja a capacidade da sociedade (cfr.objecto social), com a simples excepção dos casos em que as deliberações dos sócios produzam efeitos externos (cfr.artºs.260, nº.1, e 409, nº.1, do C.S.Comerciais). O gerente/administrador goza de poderes representativos e de poderes administrativos face à sociedade. A distinção entre ambos radica no seguinte: se o acto em causa respeita às relações internas entre a sociedade e quem a administra, situamo-nos no campo dos poderes administrativos do gerente. Pelo contrário, se o acto respeita às relações da sociedade com terceiros, estamos no campo dos poderes representativos. Por outras palavras, se o acto em causa tem apenas eficácia interna, estamos perante poderes de administração ou gestão. Se o acto tem eficácia sobre terceiros, verifica-se o exercício de poderes de representação (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 8/5/2012, proc.5392/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6732/13; Raúl Ventura, Comentário ao Código das Sociedades Comerciais, Sociedades por Quotas, III, Almedina, 1991, pág.128 e seg.; Rui Rangel, A vinculação das sociedades anónimas, Edições Cosmos, Lisboa, 1998, pág.27 e seg.).
Analisada a plêiade de actos que o gerente/administrador pode exercer, enquanto representante da sociedade, passemos à responsabilidade subsidiária do mesmo.
No domínio do artº.16, do C.P.C.Impostos, encontrávamo-nos perante responsabilidade “ex lege”, alicerçada num critério de culpa funcional presumida, assim dispensando a imputação subjectiva (ao nível do nexo de culpa) baseada num comportamento individual do gerente, antes se ligando ao mero exercício do cargo ou funções de gerência. Verificada a gerência de direito, presumia-se a gerência de facto, incumbindo ao responsável subsidiário, em sede de oposição à execução contra si revertida, o ónus de provar que, apesar da gerência de direito, não a exerceu de facto ou, por outro lado, que não a exerceu de forma culposa no que diz respeito à verificada insuficiência do património social (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 22/9/93, C.T.F.376, pág.211 e seg.; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 11/10/95, C.T.F.381, pág.311 e seg.; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.51 e seg.).
Com o dec.lei 68/87, de 9/2, o qual veio submeter a responsabilidade subsidiária consagrada no artº.16, do C. P. C. Impostos, ao regime previsto no artº.78, do C. S. Comerciais, de acordo com a jurisprudência dominante, passou a ser exigível a culpa dos administradores ou gerentes das sociedades para que a mesma se efectivasse. Por outro lado, onerou-se a Fazenda Pública, nos termos do artº.487, nº.1, do C. Civil, com o obrigação da alegação e prova da culpa do responsável subsidiário pela inexistência de bens do devedor originário com vista à satisfação dos créditos fiscais (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 22/1/97, C.T.F.386, pág.379 e seg.; ac.S.T.A.-Pleno da 2ª.Secção, 9/7/97, Acórdãos Doutrinais, nº.432, pág.1467 e seg.).
Com a entrada em vigor do C.P.Tributário (1/7/91), a responsabilidade subsidiária dos administradores ou gerentes de sociedades de responsabilidade limitada passa a estar consagrada no artº.13, deste diploma. Ao abrigo deste regime, desde logo, se dirá que a responsabilidade subsidiária dos administradores ou gerentes passou a estar restrita às dívidas ao Estado por contribuições e impostos, quando anteriormente a mesma responsabilidade podia abarcar também multas e quaisquer outras dívidas que não somente as aludidas contribuições e impostos. Por outro lado, contrariamente ao regime resultante do aludido dec.lei 68/87, de 9/2, volta o ónus da prova da actuação sem culpa a pender sobre os administradores ou gerentes. E não é pequena, para os mesmos, esta diferença de perspectiva legal, já que, se era difícil para a Fazenda Pública, face ao regime resultante do dec.lei 68/87, de 9/2, fazer a prova positiva da culpa, mais difícil será para os administradores ou gerentes fazerem a prova negativa de tal factualidade (cfr.A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.55).
No entanto, ao abrigo do regime em análise, o constante do artº.13, nº.1, do C.P. Tributário, já não existe qualquer presunção legal que imponha que, provada a gerência de direito, por provado se dê o efectivo exercício da função de gerente ou administrador, pelo que compete à Fazenda Pública o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária do gerente, neles se incluindo o exercício de facto da gerência, e apenas se podendo esta valer da presunção legal respeitante à culpa pela insuficiência do património social (cfr.ac.S.T.A.-Pleno da 2ª.Secção, 28/2/2007, rec. 1132/06; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 10/12/2008, rec.861/08; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6732/13).
Passemos, agora, à análise do regime consagrado no artº.24, da L.G.Tributária, o qual é aplicável ao caso concreto, conforme mencionado supra.
Do disposto no artº.22, da L.G.Tributária, retira-se que a regra geral da responsabilidade tributária originária sofre duas excepções, sendo elas a responsabilidade solidária (o responsável solidário é um condevedor solidário que, por força da lei, está em igualdade de circunstâncias com o responsável originário, o que implica que possam ser demandados ambos simultaneamente, ou qualquer um deles indistintamente, quanto ao cumprimento da prestação tributária) e a responsabilidade subsidiária (só a impossibilidade de cumprimento do responsável originário pode originar o subsequente chamamento do responsável subsidiário ao cumprimento da prestação tributária), constituindo esta última (a responsabilidade subsidiária) a regra nesta matéria, nos termos do preceituado no nº.3 do referido normativo.
A reversão contra o devedor subsidiário depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão prévia (cfr.artº.23, nº.2, da L.G.T.) e é sempre precedida da audição do responsável subsidiário (cfr.nº.4 do mesmo preceito). O nº.5 da disposição legal em causa atribui um privilégio ao devedor subsidiário que, sendo citado para o pagamento da dívida tributária e o efectuar no prazo de oposição, fica isento do pagamento de juros de mora e de custas. Este pagamento, de acordo com o artº.23, nº.6, da L. G. Tributária, tem efeito suspensivo (e não extintivo) da execução fiscal, pois no caso de virem a ser encontrados bens ao devedor principal ou ao responsável solidário, ficam estes obrigados ao pagamento de juros de mora e das custas.
Preceitua o nº.1, do artº.24, da L. G. Tributária, o seguinte (redacção introduzida pela Lei 30-G/2000, de 29/12):

“Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.”.

Na previsão da al.a), do normativo em análise pretendem-se isolar as situações em que o gerente/administrador culpado pela diminuição do património societário será responsável pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou de entrega tenha terminado depois deste, competindo à Administração Fiscal fazer a prova de que foi por culpa sua que o património se tornou insuficiente. Já na al.b), do preceito o gerente é responsável pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou de entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, recaindo sobre o mesmo o ónus da prova de que não foi por culpa sua que o pagamento não se efectuou.
Por outras palavras, nas situações em que o gestor exerce, efectivamente, as suas funções e é no decurso desse exercício que se forma o facto tributário ou se inicia o prazo para o pagamento, mas antes que tal prazo se esgote, o gestor cessa as suas funções, o ónus da prova, de que o património da sociedade se tornou insuficiente para a satisfação da dívida por acto culposo do gestor, corre por conta da Fazenda Pública (cfr.alínea a), do nº.1, do artigo 24, da L.G.T.). Se é no decurso do exercício efectivo do cargo societário de gerente que se esgota o prazo para o pagamento do imposto, não vindo ele a acontecer (o pagamento não se efectuou no prazo devido), o ónus da prova inverte-se contra o gerente, sendo ele quem tem de provar que não lhe foi imputável a falta de pagamento (o gestor está obrigado a fazer prova de um facto negativo, poupando-se a Fazenda Pública a qualquer esforço probatório - cfr.al.b), do normativo em exame). Na alínea b), do nº.1, do artº.24, da L. G. Tributária, consagra-se uma presunção de culpa, pelo que a Administração Fiscal está dispensada de a provar. Concluindo, se a gestão real ou de facto cessa antes de verificado o momento em que se esgota o prazo para pagamento do imposto, o ónus da prova recai sobre a Fazenda Pública, se a gestão coincide com ele, o ónus volta-se contra o gestor (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 27/11/2012, proc.5979/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6732/13; Sérgio Vasques, A Responsabilidade dos Gestores na Lei Geral Tributária, Fiscalidade - Revista de Direito e Gestão Fiscal, nº.1, Janeiro de 2000, pág.47 e seg.; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, 4ª. edição, Encontro da Escrita, 2012, pág.236 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.465 e seg.).
A diferença de regimes, em termos de repartição do ónus da prova, prevista nas als.a) e b), do artº.24, da L.G.Tributária, decorre da distinção entre “dívidas tributárias vencidas” no período do exercício do cargo e “dívidas tributárias vencidas” posteriormente (cfr.al.c) do nº.15, do artº.2, da Lei 41/98, de 4/8 - autorização legislativa ao abrigo da qual foi aprovada a L.G.T. - ac.S.T.A.-2ª.Secção, 23/6/2010, rec.304/10; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 6/10/2010, rec.509/10; ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 8/5/2012, proc.5392/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6732/13).
No caso dos autos, a sentença recorrida concluiu pela improcedência da oposição, visto se verificarem os pressupostos do chamamento à execução do opoente, enquanto responsável subsidiário e ao abrigo do artº.24, nº.1, al.b), da L.G.T., mais não tendo o mesmo efectuado prova da falta de culpa na insuficiência patrimonial da sociedade executada originária com vista ao pagamento dos créditos fiscais exequendos.
O recorrente, pelo contrário, entende que não, que a Segurança Social, desde logo, não fez prova de que o apelante/responsável subsidiário exerceu, nos termos consignados no artº.24, nº.1, da L.G.T., efectivas funções de gestão e representação da sociedade executada originária.
Vejamos quem tem razão.
A reversão do recorrente fundamentou-se no citado artº.24, nº.1, al.b), da L.G.T., dado que a Segurança Social alegou que o recorrente exerceu funções de gerência da sociedade executada originária, “S…… - Comércio e Indústria de Plásticos, Lda.”, nos períodos a que a dívida revertida se refere (cfr.nº.3 do probatório).
Sendo as dívidas revertidas relativas aos períodos de Novembro de 2009 e Janeiro e Fevereiro de 2010 (cfr.nº.1 do probatório), mais alegando a entidade exequente que o apelante exerceu funções de gerência da sociedade executada originária, “S….. - Comércio e Indústria de Plásticos, Lda.”, nos períodos a que a dívida revertida se refere, certo é que o mesmo não nega, no articulado inicial, que tenha exercido funções de gerência da citada empresa, antes pondo a tónica da sua defesa na falta de fundamentação da reversão, alegadamente, porque a Segurança Social não terá efectuado prova da culpa do opoente quanto à insuficiência do património da sociedade para fazer face às suas obrigações (cfr.artºs.1 a 22 do articulado inicial constante de fls.3 a 10 do processo físico), assim admitindo, implicitamente, o exercício de funções de gerência.
Mais se deve ligar esta posição processual do opoente/recorrente, em sede probatória, com o conteúdo do nº.2 da matéria de facto, de onde se retira o concreto exercício de funções de gerência por parte do apelante, em momento posterior aos períodos a que a dívida revertida se refere (24/01/2011), através da prática de poderes de representação da dita sociedade.
Aqui chegados, deve concluir-se que, no caso concreto, a Segurança Social estava legitimada para operar o mecanismo de reversão por responsabilidade subsidiária do opoente/recorrente, ao abrigo do artº.24, nº.1, al.b), da L.G.T., perante a verificação da gerência de facto, ou seja, do exercício real e efectivo do cargo por parte do mesmo (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 11/3/2009, rec.709/08; ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 27/11/2012, proc.5979/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6732/13), quanto a este vector, se confirmando a decisão do Tribunal “a quo”.
Fundando-se a reversão da execução no artº.24, nº.1, al.b), da L.G.T., tal faz impender o ónus da prova sobre o gerente/administrador revertido, no caso o opoente/recorrente, sendo ele quem tem de provar que não lhe foi imputável a falta de pagamento da dívida exequenda revertida (e não o contrário, como parece defender o apelante), conforme examinado supra (na alínea b), do nº.1, do artº.24, da L. G. Tributária, consagra-se, portanto, uma presunção de culpa, que onera o revertido, a aferir pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias do caso concreto - cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 8/5/2012, proc.5392/12; ac.T.C.A.Sul-2ª. Secção, 13/11/2014, proc.7549/14).
A culpa aqui em causa deve aferir-se pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias do caso concreto - isto, quer se entenda que a responsabilidade em causa tem natureza contratual ou extra-contratual (cfr.artºs.487, nº.2, e 799, nº.2, do C.Civil) - e em termos de causalidade adequada, a qual não se refere ao facto e ao dano isoladamente considerados, mas ao processo factual que, em concreto, conduziu ao dano. Sabido que são os administradores ou gerentes quem exterioriza a vontade da sociedade nos mais diversos negócios jurídicos, através dos quais se manifesta a sua capacidade de exercício de direitos, a responsabilidade subsidiária assenta na ideia de que os poderes de que estavam investidos lhes permitiam uma actuação determinante na condução da sociedade. Assim, há que verificar, operando com a teoria da causalidade, se a actuação do ora recorrente como gestor da sociedade originária devedora, concretizada quer em actos positivos quer em omissões, foi adequada à insuficiência do património societário para a satisfação dos créditos exequendos. E, nesse juízo, haverá que seguir-se o processo lógico da prognose póstuma. Ou seja, de um juízo de idoneidade, referido ao momento em que a acção se realiza ou a omissão ocorre, como se a produção do resultado se não tivesse ainda verificado, isto é, de um juízo “ex ante”. É que a causalidade não se refere ao facto e ao dano isoladamente considerados, mas ao processo factual que, em concreto, conduziu ao dano, não podendo existir causalidade adequada quando o dano se verificou apenas por virtude de circunstâncias excepcionais ou anómalas que, no caso concreto, se registaram e que interferiram no processo de causalidade, considerado este no seu conjunto.
Por outras palavras, o acto ilícito e culposo que se presume praticado pelo gestor não se fica pela omissão de pagamento do imposto vencido. O que se presume é que o gestor não actuou com a diligência de um “bonus pater familias”, com a observância das disposições legais aplicáveis aos gestores, em especial ao do artº.64, do C.S.Comerciais, que lhe impõe o cumprimento de deveres de cuidado, de disponibilidade, de competência técnica, de gestão criteriosa e ordenada, de lealdade, no interesse da sociedade e dos sócios que sejam relevantes para a sustentabilidade da sociedade. Apesar da dificuldade que existe na prova de um facto negativo, como é o caso da ausência de culpa, o oponente não pode deixar de alegar e provar factos concretos de onde se possa inferir que o não pagamento das dívidas tributárias revertidas se deveu a circunstâncias que lhe são alheias e que não lhe podem ser imputadas. Para afastar a responsabilidade subsidiária por dívidas de impostos cujo prazo de pagamento terminou durante a gestão, o gestor tem pois que demonstrar que a devedora originária não tinha fundos para pagar os impostos e que a falta de meios financeiros não se deveu a qualquer conduta que lhe possa ser censurável (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 12/3/2003, rec.1209/02; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 11/7/2012, rec.824/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 6/10/2009, proc.3267/09; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 20/11/2012, proc.5746/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 1/10/2014, proc.7689/14; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/11/2014, proc.6191/12; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.465 e seg.; Isabel Marques da Silva, A Responsabilidade Tributária dos Corpos Sociais, em Problemas Fundamentais do Direito Tributário, Vislis, Lisboa, 1999, pág.121 e seg.).
Revertendo ao caso dos autos, do exame da factualidade provada não se pode, manifestamente, retirar que o opoente/recorrente tenha produzido prova demonstrativa de que a situação de insuficiência patrimonial da sociedade executada originária “S….. - Comércio e Indústria de Plásticos, Lda.” se ficou a dever, exclusivamente, a factores exógenos e que, no exercício da administração, usou da diligência de um "bonus pater familias".
Donde, há que concluir, com o Tribunal "a quo", que é imputável a título de culpa à actuação do oponente/recorrente, J……., enquanto gerente da mesma sociedade, a insuficiência patrimonial desta empresa, verificando-se assim todos os requisitos legais para a reversão contra si das dívidas exequendas no âmbito do processo de execução fiscal nº…..-2010/……. e apensos.
Arrematando, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente o presente recurso e, consequentemente, mantém-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva deste acórdão.
X
DISPOSITIVO
X
Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
X
Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
X
Lisboa, 31 de Janeiro de 2019



(Joaquim Condesso - Relator)


(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)



(Vital Lopes - 2º. Adjunto)