Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:10819/14
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:04/02/2014
Relator:ANTÓNIO VASCONCELOS
Descritores:INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO.
QUESTÃO NOVA.
Sumário:I – A exceção de prescrição consiste numa exceção perentória que, nos termos dos artigos 304º nº 1 do Código Civil e 579º do atual Código de Processo Civil, não é de conhecimento oficioso.

II - A questão da alegada interrupção da prescrição assume a natureza de questão nova na medida em que não foi anteriormente suscitada, designadamente na réplica, ao abrigo do disposto no artigo 502º nº1 do Código de Processo Civil à data vigente.

III - Por conseguinte, está a mesma questão subtraída do conhecimento deste tribunal de recurso, pois além de não ser de conhecimento oficioso, também não foi alegada em 1ª instância, não integrando o objeto da sentença recorrida e, consequentemente o objeto do recurso.
Recorrente:<
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:8

Acordam, em Conferência , na Secção de Contencioso Administrativo, 2º Juízo , do Tribunal Central Administrativo Sul:


José …………… e Laurinda ……………, com sinais nos autos, inconformados com o saneador – sentença proferido pelo TAC de Lisboa, em 5 de setembro de 2013, que julgou procedente por provada a exceção perentória da prescrição e absolveu os Réus do pedido, dele recorreram e, em sede de alegações, formularam as seguintes conclusões:

“ A) De acordo com a douta sentença ora recorrida foi julgada procedente a excepção de prescrição do direito indemnizatório e, consequentemente foram os ora recorridos absolvidos do pedido.

B) Alega, em suma, o Tribunal “a quo” que de acordo com o disposto no artº 498 nº 1 do C. Civil o direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito.

C) No caso vertente os ora recorrentes interpuseram a presente acção em 26 de maio de 2006

D) E já tinham conhecimento da situação de retirada de portas e janelas do imóvel em apreço pelo menos desde 15 de março de 2002.

E) Ora, salvo o devido respeito, não podem os ora recorrentes, concordar com o conteúdo de tal sentença, pois

F) Resulta claro do relatório junto aos autos que existia uma degradação do imóvel, mas que o mesmo não havia sido ainda demolido

G) Pelo que havia necessidade de o tribunal “a quo” apurar qual a data de demolição do imóvel para poder decidir da prescrição, o que não fez.

H) Antes da interposição da presente acção os ora recorrentes interpuseram recurso contencioso do despacho proferido pela Câmara Municipal de Lisboa onde era peticionada a revogação do despacho que ordenou a demolição do imóvel.

I) A Câmara Municipal de Lisboa foi citada no âmbito desse recurso que correu termos na 2ª Secção do Tribunal Administrativo do Circulo de Lisboa sob o nº 115/2002.

J) Tendo essa citação interrompido a prescrição do direito de acordo com o disposto no nº 1 do artº 323 do C. Civil.

K) Pelo que no que diz respeito à Câmara Municipal de Lisboa houve uma interrupção da prescrição do direito que não foi apurada.

L) Entende-se assim, face ao supra exposto que o Tribunal “a quo” não estava na posse dos elementos necessários para decidir da excepção de prescrição , sem pelo menos apurar qual a efectiva data da demolição do imóvel.

M) Pelo exposto deve ser dado provimento ao presente recurso e ordenado o prosseguimento dos autos, dado violar a douta sentença recorrida o disposto no artº 4598, nº 1 do C. Civil e no artº 323 do C. Civil.”

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Os ora Recorridos contra alegaram pugnando pela manutenção do decidido.

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O Exmo. Magistrado do Ministério Publico junto deste TCAS emitiu douto parecer no sentido de ser negado provimento ao presente recurso jurisdicional e confirmada a decisão recorrida.

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Colhidos os vistos legais foi o processo submetido à conferência para julgamento.

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A decisão recorrida deu como assentes os seguintes factos, que se passam a transcrever:


- Em 17.7.2001, o Vereador do pelouro da habitação da CML proferiu despacho determinativo da demolição das edificações clandestinas implantadas no terreno sito na Travessa ……………, nº ……… – 2º, propriedade dos Autores;

- Pelo oficio nº 2568/DEP/01, datado de 26.12.2001, os Réus notificaram os Autores do ato supra identificado;

- Em 15.3.2002, foi efetuada uma avaliação imobiliária ao imóvel em causa, onde se regista ter sido arrancadas portas e janelas, após o realojamento dos inquilinos, nos moldes melhor explicitados no doc. a fls. 16 e seg., aqui dado por reproduzido na integra;

- Em 26.5.2006, os Autores interpuseram a presente ação indemnizatória.

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Tudo visto cumpre decidir.

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Veio o presente recurso jurisdicional interposto do saneador – sentença proferido pelo TAC de Lisboa que julgou procedente por provada a exceção perentória da prescrição e absolveu os Réus do pedido.



A decisão em crise, para justificar a invocada prescrição do direito de indemnização dos Autores, entendeu o seguinte que se passa a transcrever:
Resulta, por conseguinte, inequívoco da factualidade assente que os Autores tinham conhecimento da situação de retirada de portas e janelas do imóvel e apreço, pelo menos, desde 15.03.2002, data em que foi realizada a avaliação imobiliária da qual dão conta ao tribunal a fls. 16 e seg.
Pelo que, não tendo sido invocada nem demonstrada qualquer causa de suspensão ou de interrupção da prescrição, impõe-se concluir que a presente ação foi proposta após se ter esgotado o prazo fixado no artigo 491º do Código Civil, atenta a data em que os autores tiveram conhecimento do direito que lhe competia, ainda que com eventual desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos.
Consequentemente, procede a exceção invocada de prescrição do direito indemnizatório reclamado”.

Discordam deste entendimento os aqui Recorrentes ao alegarem que “ Resulta claro do relatório junto aos autos que em 15.03.2002 a demolição do imóvel ainda não havia sido efetuada. Existia apenas uma degradação do mesmo, sendo que a respetiva demolição veio a verificar-se muito mais tarde (…)”.
Entendem por isso que “não poderia o Tribunal a quo decidir da prescrição sem antes apurar qual a data em que efetivamente ocorreu a demolição do imóvel. Dado que só a partir dessa data se poderá iniciar a contagem do prazo de prescrição, pois só com a efetiva demolição do imóvel surge o direito dos Autores a reclamar o direito a uma indemnização”.
Acrescentam por ultimo que “antes da interposição da presente ação, em 2de maio de 2002 (…) interpuseram recurso contencioso do despacho proferido pela CM de Lisboa (…) em 8 de fevereiro de 2002 (…) onde era peticionado a revogação

do despacho que ordenou a demolição do imóvel, que correu termos no Proc. nº 115/2002, 2ª Secção do TACL, no qual a CML foi citada, o que, no entendimento dos Autores, constitui causa de interrupção da prescrição”.

Vejamos o que se nos oferece dizer.
A invocada exceção de prescrição consiste numa exceção perentória que, nos termos dos artigos 304º nº 1 do Código Civil e 579º do atual Código de Processo Civil, não é de conhecimento oficioso.
Assim, por se tratar de uma exceção cuja invocação a lei coloca na disponibilidade daquele a quem aproveita, no caso os aqui Recorridos, foi a mesma expressamente alegada na contestação, ao abrigo do artigo 487º do Código de Processo Civil à data em vigor.
Notificados da contestação, os ora Recorrentes replicaram não tendo, contudo, invocado, nem sequer comprovado, a existência de qualquer facto suscetível de interromper a prescrição, como seja a invocada (em sede de alegações de recurso) interposição de recurso contencioso de anulação, que correu termos no TACL, no âmbito do processo nº 115/2002 supra referenciado.
Estando, pois, em causa uma exceção que não é de conhecimento oficioso, de igual modo não é de conhecimento oficioso o conhecimento de eventual facto interruptivo da mesma, pelo que forçosamente a atual invocação de interrupção da prescrição não pode ser atendida por extemporaneidade.
Aliás, a questão da alegada interrupção da prescrição assume a natureza de questão nova na medida em que não foi anteriormente suscitada, designadamente na réplica, ao abrigo do disposto no artigo 502º nº1 do Código de Processo Civil à data vigente.


Por conseguinte, está a mesma questão subtraída do conhecimento deste tribunal de recurso, pois além de não ser de conhecimento oficioso, também não foi alegada em 1ª instância, não integrando o objeto da sentença recorrida e, consequentemente o objeto do recurso – cfr. neste sentido o Acórdão deste TCAS de 10 de janeiro de 2013 in Proc. nº 9516/13.
Por isso concluímos que constitui finalidade desta instancia de recurso reapreciar decisões judicias, na parte em que hajam sido impugnadas e não conhecer pela primeira vez de questões anteriormente não suscitadas pelas partes.
Por ultimo, cabe esclarecer que a circunstância invocada na alegação dos Recorrentes nem sequer é um facto comprovadamente superveniente para que pudesse ser alegado posteriormente aos articulados, ao abrigo do artigo 506º do Código de Processo Civil então vigente, porquanto o mesmo já havia ocorrido no momento da entrada em juízo da petição dos presentes autos, sendo igualmente certo que os aqui Autores foram os Recorrentes contenciosos no mencionado processo nº 115/2002.
Conclui-se, pelos fundamentos expostos, que a arguição da interrupção da prescrição não pode ser acolhida pela intempestividade na sua invocação, além de que o Tribunal a quo não se encontrava obrigado a averiguar da mesma, nem o Tribunal ad quem poderá sequer conhecer.
Assim, estando assente que, ao menos, em 15.03.2002, os ora Recorrentes tomaram conhecimento do direito que lhes assistia, necessariamente, nessa data, iniciou-se o prazo prescricional previsto no artigo 498º do Código Civil, o qual , à data da propositura da presente ação – em 26.05.2006 – já havia sido ultrapassado.


Termos em que improcedem as conclusões da alegação dos Recorrentes, sendo de negar provimento ao presente recurso jurisdicional e confirmar o saneador sentença recorrido.

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Acordam, pois, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Administrativo, 2º Juízo, deste TCAS, em negar provimento ao presente recurso jurisdicional e confirmar o saneador sentença recorrido.
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Custas pelos Recorrentes.


Lisboa, 2 de Abril de 2014
António Vasconcelos
Ana Celeste Carvalho
Carlos Araújo