Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:05009/11
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:10/11/2011
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:INSTITUTO DA PRESCRIÇÃO. PRESCRIÇÃO DA DÍVIDA EXEQUENDA.
SUSPENSÃO E INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO.
APLICAÇÃO DE DIFERENTES REGIMES DE PRESCRIÇÃO. ARTº.297, Nº.1, DO C.CIVIL.
ARTº.49, NºS.3 E 4, DA L.G.T., NA REDACÇÃO RESULTANTE DA LEI 53-A/2006, DE 29/12.
Sumário:1. A prescrição da dívida exequenda constitui fundamento de oposição à execução (cfr. artº.176, al.d), do C.P.C.Impostos; artº.286, nº.1, al.d), do C.P.Tributário; artº.204, nº.1, al.d), do C.P.P.Tributário), consubstanciando excepção peremptória de conhecimento oficioso no âmbito do processo tributário.

2. De acordo com os ensinamentos da doutrina e jurisprudência, o I.R.C. deve considerar-se um imposto periódico, dado assentar num facto tributário de carácter duradouro que se reporta a um determinado período de tempo e se renova em cada novo período. O período de imposto é, precisamente, o critério temporal pelo qual a lei fragmenta no tempo um facto duradouro, via de regra correspondente ao período anual. O período de imposto surge, assim, como elemento essencial do facto tributário, de tal modo que nos factos duradouros periódicos a cada período (anual) corresponde uma obrigação nova e autónoma, tudo por contraposição aos impostos de obrigação única que têm por base facto tributário instantâneo.

3. Como se conclui do preceituado nos artºs.318 a 320, do C.Civil, a suspensão da prescrição tem como efeito que esta não comece a correr ou não corra, depois de iniciado o prazo, enquanto se verificar o facto, de natureza duradoura, a que é atribuído efeito suspensivo. Os factos suspensivos são de natureza duradoura, obstando ao começo e ao decurso do prazo de prescrição enquanto perdurarem, como se infere dos citados artºs. 318, 319 e 320, do C.Civil. Nas leis tributárias prevêem-se factos especiais a que é atribuído efeito suspensivo, pelo que serão essas as regras a aplicar em matéria de prescrição da obrigação tributária (cfr.v.g.artº.49, nº.4, da L.G.Tributária).

4. Por sua vez, a interrupção da prescrição tem sempre como efeito a inutilização para o respectivo regime de toda o tempo decorrido anteriormente, sendo esse efeito instantâneo o único próprio da interrupção, presente em todas as situações (cfr.artº.326, nº.1, do C.Civil). Porém, em certos casos, designadamente quando a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (cfr.artº.327, nº.1, do C.Civil).

5. A aplicação de diferentes regimes no tocante aos prazos prescricionais, em resultado da previsão normativa do artº.297, nº.1, do C.Civil, não impõe a aplicação de um ou outro regime em bloco, pois só se refere tal normativo à lei que altere o prazo e não aos termos em que se conta, nem a tudo o que releva para o seu curso. O texto do artigo e a respectiva epígrafe revelam que se tem em vista apenas as leis que alteram prazos e não as que alteram os efeitos das causas interruptivas ou suspensivas da prescrição. Por isso, as leis que alteram causas de suspensão ou interrupção não sendo leis sobre “alteração de prazos”, não estão abrangidas na previsão do referido artº.297, do C.Civil. Estas leis seguem a regra de aplicação no tempo do artº.12, nº.2, do mesmo diploma.

6. Conforme mencionado supra, a suspensão da prescrição tem como efeito que esta não comece a correr ou não corra, depois de iniciado o prazo, enquanto se verificar o facto, de natureza duradoura, a que é atribuído efeito suspensivo, sendo este o efeito a atribuir à citada suspensão da execução fiscal decretada em 29/10/2003, em virtude da apresentação de garantia bancária nesse sentido (cfr.artº.49, nº.3, da L.G.T., na redacção resultante da Lei 100/99, de 26/7).

7. Não tendo ocorrido o termo final do prazo de um ano, previsto no revogado artº.49, nº.2, da L. G. Tributária, até ao pretérito dia 1/1/2007, não se aplica ao processo de execução fiscal em causa a norma revogada, assim não podendo aproveitar-se o recorrente do regime de cessação do efeito interruptivo da prescrição e consequente transformação em efeito suspensivo, previsto na mesma norma, sendo certo que um novo prazo de prescrição só se iniciará após o trânsito em julgado de uma decisão que ponha termo à mesma execução fiscal (v.g.declaração em falhas), pelo que se impõe finalizar que a obrigação tributária de I.R.C. de 1999 não se encontra prescrita (cfr.artº.49, nºs.3 e 4, da L.G.T., na redacção resultante da Lei 53-A/2006, de 29/12).
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
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RELATÓRIO
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“BANCO ……………, S.A.”, o qual assumiu todos os direitos e obrigações e absorveu todo o património do extinto “C……….. - Banco de …………, S.A.”, com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pela Mma. Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls.219 a 230 do presente processo, através da qual julgou improcedente a reclamação de acto do órgão de execução fiscal deduzida pela sociedade recorrente no âmbito do processo de execução fiscal nº………….. que corre seus termos no 3º. Serviço de Finanças de ………….
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O recorrente termina as alegações (cfr.fls.235 a 248 dos autos) do recurso formulando as seguintes Conclusões:
1-Na vigência da redacção do artº.49, da L.G.T., anterior à Lei 53-A/2006, de 29/12 (portanto na vigência do seu anterior número 2), a suspensão prevista no artº.49, nº.3, do mesmo diploma legal, cessava sempre que o processo estivesse parado por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte, nos termos do número 2, pois só essa interpretação se afigurava como plausível à luz das regras vigentes, na medida que era a única interpretação que garantia a coerência do sistema;
2-Da conjugação dos artºs.49, nºs.2 e 3, da L.G.T., na redacção da Lei 100/99, de 26/7, e 169, do C.P.P.T., verifica-se que não é conferida à prestação de garantia a virtualidade de suspender o prazo de prescrição, facto que apenas passou a ser alcançado com a Lei 53-A/2006, de 29/12;
3-A Lei 53-A/2006, de 29/12, que determina que os efeitos suspensivos previstos no artº.49, nºs.1 e 4, da L.G.T., se mantêm até ao termo do processo a que respeitam, desde que tenha sido prestada garantia idónea, não se aplica ao caso dos autos porquanto, à data da entrada em vigor da mesma (1 de Janeiro de 2007), o prazo de prescrição voltara a correr em virtude da paragem do processo de reclamação graciosa por mais de um ano por facto não imputável ao contribuinte (entre 20 de Janeiro de 2004 e 20 de Janeiro de 2005);
4-Em suma, a dívida tributária subjacente ao processo de execução fiscal nº……………. encontra-se prescrita desde 21 de Março de 2010;
5-A decisão recorrida viola, assim, o disposto nos artºs.48 e 49, da L.G.T., na redacção vigente antes da publicação da Lei 53-A/2006, de 29/12, devendo ser anulada e, em consequência, deverá ser conhecida e declarada a prescrição da dívida em apreço, em virtude de a prescrição ser uma vicissitude de conhecimento oficioso, o que se invoca nos termos do artº.175, do C.P.P.T.;
6-Mais deverá ser declarada a extinção do processo de execução fiscal nº……………………., nos termos do artº.176, do C.P.P.T.;
7-Termina, pugnando pela procedência do presente recurso e, consequentemente, pela revogação da decisão recorrida, conhecendo-se e declarando-se a prescrição da dívida subjacente ao processo de execução fiscal nº………………….. e extinguindo-se o referido processo, o que se requer nos termos dos artºs.175 e 176, do C.P.P.T.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido da total improcedência do presente recurso (cfr.fls.273 dos autos).
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Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo (cfr.artº.707, nº.4, do C.P.Civil; artº.278, nº.5, do C.P.P.T.), vêm os autos à conferência para decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.220 a 222 dos autos):
1-O processo de execução fiscal nº……………… foi instaurado em 31/10/2002, com base nas certidões nºs.2002/………. e 2002/……….., correspondentes a I.R.C., dos anos de 1998 e 1999, respectivamente (cfr.documentos juntos a fls.3 a 5 dos presentes autos);
2-Em 6/8/2002, foi deduzida reclamação graciosa das liquidações de I.R.C. nº……………….., efectuadas por dívidas de 1999 (cfr.data de entrada aposta a fls.2 do apenso de reclamação);
3-O processo de reclamação graciosa esteve parado desde 10/9/2002 a 15/1/2004 e de 20/1/2004 a 7/7/2008 tendo merecido decisão parcialmente favorável por despacho de 13/3/2009 (cfr.processo apenso);
4-A decisão do deferimento parcial da reclamação graciosa foi notificada à reclamante pelo ofício nº.21648, de 18/3/2009, tendo o aviso de recepção sido assinado em 24/3/2009 (cfr.documentos juntos a fls.100 e 101 do processo apenso);
5-Em 25/6/2003, a reclamante veio requerer a suspensão da execução referindo que tinha sido notificada das liquidações de I.R.C. nºs……………. e ………………, efectuadas em 22/3/2002 por dívidas de 1998 e 1999 e deduziu reclamação das mesmas (cfr.documento junto a fls.6 a 8 dos presentes autos);
6-Em 20/10/2003, foi prestada garantia bancária no valor de € 202.468,69 (cfr.documento junto a fls.45 dos presentes autos);
7-Por despacho de 29/10/2003, foi declarada válida a garantia bancária prestada nos autos, e suspensa a execução identificada no nº.1 supra (cfr.documento junto a fls.46 dos presentes autos);
8-Em 22/12/2006, a reclamante requereu o levantamento da garantia prestada (cfr. documentos juntos a fls.52 a 54 dos presentes autos);
9-Por despacho de 8/6/2007 foi levantada a garantia bancária (cfr.documento junto a fls.61 dos presentes autos);
10-Com base nas decisões proferidas no âmbito dos processos de reclamação graciosa nºs…………. e ……………., na primeira decidiu-se a anulação total da nota de liquidação nº……………, enquanto na segunda foi anulada parcialmente a liquidação nº…………… (cfr.informação exarada a fls.154 e 155 dos presentes autos, cujo conteúdo não foi controvertido);
11-O órgão da execução fiscal remeteu à reclamante o ofício com o nº.7614, de 29/07/2010 com o seguinte teor:
“Assunto execuções fiscais - Na sequência das decisões proferidas no âmbito dos processos de reclamação: …………. e ………………, que correram termos neste s.f., foi anulada (parcialmente) a certidão de divida n°…………….., correspondente à nota de liquidação …………….. (IRC/1999) e totalmente nota n°……………… (IRC/1998). Resulta dali, que a nota de cobrança de IRC de 1999, processada, inicialmente, pelo valor de 121.499,16 €, foi reduzida de 80.788,27 €, prosseguindo o processo de execução fiscal n°………………, pela diferença de 40.730,89 €, a que acrescem juros de mora de 4.887,72€ e de custas 618.51 €. Como não se vislumbra que tenha sido interposto recurso hierárquico, relativamente à parte não atendida, fica essa instituição por este meio notificada para, no prazo de 15 dias, efectuar o pagamento dos valores acima identificados, juntando para o efeito o DUC respectivo. Caso não o façam ou não demonstrem a pendência de recurso hierárquico e/ou contencioso, o processo prossegue a tramitação normal, através da penhora de bens porquanto, a garantia bancária n°……………, incorporada no mesmo, foi objecto de despacho de cancelamento, conforme oficio n°.6297, de 2007.06.11, deste s.f. Com os melhores cumprimentos O Chefe de Finanças” (cfr.documento junto a fls.65 dos presentes autos);
12-A reclamante assinou o aviso de recepção que acompanhou o ofício nº.7614, de 29/7/2010, em 2/8/2010 (cfr.documentos juntos a fls.65 a 67 dos presentes autos);
13-O processo de execução esteve parado desde 11/6/2007 a 27/4/2009, data da emissão de um documento único de anulação (cfr.documentos juntos a fls.62 e 63 dos presentes autos);
14-Em resposta aos factos referidos no ponto 4 da petição inicial o órgão da execução informou “que o processo ……………. foi objecto de migração informática para uma nova aplicação que entrou em vigor em Março de 2006, que obrigou à reinstalação (no caso, datada de 24-6-2006) de todos os processos que, à data, se encontrassem pendentes, sendo estes identificados pelo digito "9" entre o ano da instauração e número que identifica o tipo de processo, ou seja, o nº. 4 no caso de reclamação graciosa. Assim …………… e …………….. referem o mesmo processo, conforme se pode ver face ao print informático que se anexa, da reinstalação do processo, que tem por base a mesma petição, a que corresponde o documento (Entrada Geral) 13956, de 6-8- 2002.” (cfr.documento junto a fls.163 dos presentes autos);
15-A reclamação que originou o presente processo foi apresentada em 11/8/2010 no 3º. Serviço de Finanças de ………. (cfr.data de entrada aposta a fls.68 dos presentes autos).
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Considera-se um lapso material manifesto a data inserta no nº.7 da matéria de facto constante da douta sentença recorrida (29/10/2009), a qual já foi alterada para “29/10/2003”, no nº.7 da matéria de facto provada supra exarada, dado ser esta a data correcta do despacho a suspender a execução fiscal nº………………. (cfr.artº.667, do C.P.Civil; artº.249, do C.Civil).
Recorde-se que o conteúdo deste número da matéria de facto não é impugnado pela recorrente.
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A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte “…Dos factos, com interesse para a decisão da causa, constantes da oposição, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade…”.
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Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte “…A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame das informações e dos documentos, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório…”.
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Levando em consideração que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos e apenso este Tribunal julga provada a seguinte matéria de facto que se reputa igualmente relevante para a decisão e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.712, nºs.1, al.a), e 2, do C. P. Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário):
16-No pretérito dia 22/5/2003, a sociedade “C………. - Banco …………….., S.A.” foi citada no âmbito da execução fiscal identificada no nº.1 supra (cfr.documentos juntos a fls.6 e 9 dos presentes autos);
17-A dívida exequenda actualmente objecto do processo de execução fiscal nº…………………., relativa a I.R.C., de 1999, é no montante de € 46.237,12 (cfr.documento junto a fls.65 dos presentes autos).
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Alicerçou-se a convicção do Tribunal, no que diz respeito à matéria de facto aditada, no teor dos documentos referidos nos números acrescentados ao probatório.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida considerou, em síntese, julgar improcedente a reclamação, mantendo o despacho reclamado, com as legais consequências, assim não julgando prescrita a dívida exequenda actualmente objecto do processo de execução fiscal nº………………., relativa a I.R.C., de 1999 e no montante de € 46.237,12.
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Antes de mais, refira-se que são as conclusões das alegações do recurso que, como é sabido, definem o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artºs.684 e 690, do C.P.Civil, então em vigor; António Santos Abrantes Geraldes, Recurso em Processo Civil, Novo Regime, 2ª. Edição Revista e Actualizada, 2008, Almedina, pág.89 e seg.; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.41).
O recorrente discorda do decidido sustentando, em síntese e como supra se alude, que a dívida tributária subjacente ao processo de execução fiscal nº………………….. se encontra prescrita desde 21 de Março de 2010, ao abrigo do regime previsto nos artºs.48 e 49, da L.G.T., na redacção vigente antes da publicação da Lei 53-A/2006, de 29/12, (cfr.conclusões 1 a 6 do recurso), pelo que deve ser declarada a prescrição e extinto o processo de execução fiscal, tudo nos termos dos artºs.175 e 176, do C.P.P.T. Com base em tal alegação pretendendo, supõe-se, consubstanciar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tal vício.
A prescrição da dívida exequenda constitui fundamento de oposição à execução (cfr. artº.176, al.d), do C.P.C.Impostos; artº.286, nº.1, al.d), do C.P.Tributário; artº.204, nº.1, al.d), do C.P.P.Tributário), consubstanciando excepção peremptória de conhecimento oficioso no âmbito do processo tributário (cfr.artº.27, §2 e 3, do C.P.C.Impostos; artº.259, do C.P.Tributário; artº.175, do C.P.P.Tributário).
O decurso do prazo de prescrição extingue o direito do Estado à cobrança do imposto. O instituto da prescrição, tal como o da caducidade, tem na sua base o interesse da certeza e segurança jurídicas, encontrando aquele igualmente fundamento na negligência do credor (cfr.Pedro Soares Martínez, Direito Fiscal, Almedina, 1996, pág.274 e seg.; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.98 e seg.).
O prazo de prescrição das obrigações tributárias em geral é actualmente de oito anos (cfr.artº.48, da Lei Geral Tributária), sendo anteriormente de dez anos (cfr.artº.34, do C.P.Tributário), e antes de vinte anos nos termos do artº.27, do C. P. C. Impostos. Embora mais favorável ao contribuinte, o prazo actual não é de aplicação retroactiva, devendo, em tal situação, lançar-se mão dos princípios consagrados no artº.297, do C. Civil, no que diz respeito ao cômputo do mesmo. Nestes termos, o prazo de dez anos consagrado no artº.34, do C. P. Tributário, ou o prazo de oito anos consagrado no artº.48, da Lei Geral Tributária, somente se contam a partir da entrada em vigor dos respectivos diplomas (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 28/4/93, Acórdãos Doutrinais, nº.385, pág.461; ac.T.T.2ª.Instância, 29/10/91, C.T.F.365, pág.243 e seg.; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.98).
O termo inicial do prazo de prescrição conta-se em função da ocorrência do facto tributário (início do ano seguinte àquele em que ocorreu o facto gerador do imposto nos impostos periódicos e data em que o facto tributário ocorreu nos tributos de obrigação única - cfr.artº.48, nº.1, da L.G.Tributária).
Este o regime face à L. G. Tributária.
Já quanto ao C. P. Tributário o prazo de prescrição conta-se desde o início do ano seguinte àquele em que tiver ocorrido o facto tributário, independentemente da natureza periódica ou de obrigação única do tributo em causa (cfr.artº.34, nº.2, do C.P.T.).
A instauração de processo de execução fiscal contra o devedor principal, consubstancia facto interruptivo da prescrição, quer quanto ao mesmo devedor principal, quer quanto aos responsáveis subsidiários, independentemente do momento em que estes vierem a ser citados para a execução ou em que se vier a operar a reversão (cfr.artº.34, nº.3, do C.P.Tributário). Cessa, no entanto, o efeito interruptivo da prescrição a que se alude, o qual se transforma em efeito suspensivo, quando o processo (v.g.execução fiscal) estiver parado durante mais de um ano devido a facto não imputável ao sujeito passivo, caso em que se soma o prazo decorrido após esse período de um ano ao que se tiver verificado até à autuação dos autos (cfr.artº.49, nº.2, da L.G.Tributária, na redacção anterior à Lei 53-A/2006, de 29/12; artº.34, nº.3, do C.P.Tributário; artº.27, §1, do C.P.C.Impostos; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 5/6/96, rec.17809; ac.T.C.A.-2ª.Secção, 23/5/2000, proc………./00).
“In casu”, a dívida exequenda actual objecto do processo de execução fiscal nº……………….., é relativa a I.R.C., no montante de € 46.237,12 e referente ao ano de 1999 (cfr.nº.17 da matéria de facto provada).
De acordo com os ensinamentos da doutrina e jurisprudência, o I.R.C. deve considerar-se um imposto periódico, dado assentar num facto tributário de carácter duradouro que se reporta a um determinado período de tempo e se renova em cada novo período. O período de imposto é, precisamente, o critério temporal pelo qual a lei fragmenta no tempo um facto duradouro, via de regra correspondente ao período anual. O período de imposto surge, assim, como elemento essencial do facto tributário, de tal modo que nos factos duradouros periódicos a cada período (anual) corresponde uma obrigação nova e autónoma, tudo por contraposição aos impostos de obrigação única que têm por base facto tributário instantâneo (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 14/11/2007, rec.861/07; ac.T.C.A. Sul, de 27/4/2006, proc.320/04; Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, Rei dos Livros, volume I, 1996, pág.130 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2010, pág.45 e seg.).
“In casu”, sendo o I.R.C. relativo ao ano 1999, o termo inicial do prazo de prescrição ocorreu no dia 1/1/2000, atento o disposto no artº.48, nº.1, da L. G. Tributária (diploma e regime aplicáveis ao caso dos autos - cfr.artº.12, do C.Civil).
Analisemos agora os factos interruptivos e suspensivos do prazo de prescrição, para tanto havendo que convocar o disposto no artº.49, da L. G. Tributária. A suspensão da prescrição tem o seu regime civil previsto nos artºs.318 e seg., do C. Civil. Por sua vez, a interrupção da prescrição está regulada nos artºs.323 e seg., do C. Civil.
Como se conclui do preceituado nos artºs.318 a 320, do C.Civil, a suspensão da prescrição tem como efeito que esta não comece a correr ou não corra, depois de iniciado o prazo, enquanto se verificar o facto, de natureza duradoura, a que é atribuído efeito suspensivo. Os factos suspensivos são de natureza duradoura, obstando ao começo e ao decurso do prazo de prescrição enquanto perdurarem, como se infere dos citados artºs. 318, 319 e 320, do C.Civil. Nas leis tributárias prevêem-se factos especiais a que é atribuído efeito suspensivo, pelo que serão essas as regras a aplicar em matéria de prescrição da obrigação tributária (cfr.v.g.artº.49, nº.4, da L.G.Tributária). Concluindo, para além da especificidade dos factos a que é atribuído efeito suspensivo, o regime da suspensão da prescrição da obrigação tributária não tem especialidades no domínio do direito tributário, pelo que, face a qualquer facto com natureza suspensiva, enquanto este surtir efeitos, a prescrição não começa nem corre.
Por sua vez, a interrupção da prescrição tem sempre como efeito a inutilização para o respectivo regime de toda o tempo decorrido anteriormente, sendo esse efeito instantâneo o único próprio da interrupção, presente em todas as situações (cfr.artº.326, nº.1, do C.Civil). Porém, em certos casos, designadamente quando a interrupção resultar de citação, notificação ou acto equiparado, ou de compromisso arbitral, o novo prazo de prescrição não começa a correr enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (cfr.artº.327, nº.1, do C.Civil). Resultam, assim, destes artºs.326 e 327, do C. Civil, dois conceitos de interrupção da prescrição: um que se traduz exclusivamente num efeito instantâneo sobre o prazo de prescrição (inutilização para a prescrição do tempo decorrido); outro que se consubstancia no mesmo efeito instantâneo acrescido de um efeito suspensivo (é eliminado o período decorrido e a prescrição não corre enquanto o processo durar, efeito duradouro este que é próprio dos factos suspensivos da prescrição). Nas leis tributárias prevêem-se factos a que é atribuído efeito interruptivo da obrigação tributária, pelo que não há que fazer apelo às normas do C. Civil, no que concerne a determinar os factos interruptivos. Porém, os efeitos da interrupção da prescrição não estão completamente regulados, assim devendo aplicar-se, quanto a estes, subsidiariamente o regime do Código Civil (cfr.Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2ª. edição, 2010, pág.52 e seg.).
Todavia, a aplicação de diferentes regimes no tocante aos prazos prescricionais, em resultado da previsão normativa do artº.297, nº.1, do C.Civil, não impõe a aplicação de um ou outro regime em bloco, pois só se refere tal normativo à lei que altere o prazo e não aos termos em que se conta, nem a tudo o que releva para o seu curso. O texto do artigo e a respectiva epígrafe revelam que se tem em vista apenas as leis que alteram prazos e não as que alteram os efeitos das causas interruptivas ou suspensivas da prescrição. Por isso, as leis que alteram causas de suspensão ou interrupção não sendo leis sobre “alteração de prazos”, não estão abrangidas na previsão do referido artº.297, do C.Civil. Estas leis seguem a regra de aplicação no tempo do artº.12, nº.2, do mesmo diploma (cfr. ac.S.T.A.-2ª.Secção, 2/2/2011, rec.807/10; Jorge Lopes de Sousa, Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, Áreas Editora, 2ª. edição, 2010, pág.92).
No caso concreto, atenta a matéria de facto provada (cfr.nº.2 da matéria de facto provada), em 6/8/2002 foi deduzida reclamação graciosa, sendo este o primeiro evento interruptor do prazo de prescrição que se extrai da factualidade provada, nos termos do artº.49, nº.1, da L.G.T., na redacção resultante da Lei 100/99, de 26/7. Ocorrendo uma causa de interrupção e findos os efeitos da mesma, inicia-se uma nova contagem do prazo, ou seja, mais 8 anos, conforme mencionado acima.
O segundo facto interruptor da prescrição que se retira da matéria de facto provada consiste na citação da executada efectuada no âmbito do processo de execução fiscal nº. ………………., a qual ocorreu no pretérito dia 22/5/2003 (cfr.nº.16 da matéria de facto provada).
Passando a factos suspensivos do prazo de prescrição, da matéria de facto provada retira-se que em 29/10/2003 foi declarada válida a garantia bancária prestada e suspensa a execução fiscal nº………………, suspensão esta que se manteve até 8/6/2007, data em que foi levantada a garantia bancária que baseou a suspensão da mesma execução (cfr.nºs.7 e 9 da matéria de facto provada).
Conforme mencionado supra, a suspensão da prescrição tem como efeito que esta não comece a correr ou não corra, depois de iniciado o prazo, enquanto se verificar o facto, de natureza duradoura, a que é atribuído efeito suspensivo, sendo este o efeito a atribuir à citada suspensão da execução fiscal decretada em 29/10/2003, em virtude da apresentação de garantia bancária nesse sentido (cfr.artº.49, nº.3, da L.G.T., na redacção resultante da Lei 100/99, de 26/7).
Haverá, neste momento, que saber se tem aplicação ao caso presente o artº.49, nº.2, da L. G. Tributária, preceito que nos dizia que “a paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo faz cessar o efeito previsto no número anterior, somando-se, neste caso, o tempo que decorrer após esse período ao que tiver decorrido até à data da autuação”, conforme defende o recorrente. A norma em análise foi revogada pela Lei 53-A/2006, de 29/12 (O.E. de 2007), diploma que entrou em vigor em 1/1/2007 (cfr.artº.163, da Lei 53-A/2006, de 29/12). Ora, o acto de revogação em análise aplica-se a todos os prazos de prescrição em curso, objecto de interrupção, em que ainda não tenha decorrido o período superior a um ano de paragem do processo por facto não imputável ao sujeito passivo (cfr.artº.91, da lei 53-A/2006, de 29/12).
No caso concreto, conforme se retira da matéria de facto provada (cfr.nºs.7 e 9 da matéria de facto provada), entre 29/10/2003 e 8/6/2007 o processo de execução esteve suspenso devido a prestação de garantia. Mais se deve referir que quando ocorreu esta suspensão ainda não tinha decorrido um ano após a interrupção decorrente da instauração da execução.
Nestas condições, ainda não tendo ocorrido o termo final do prazo de um ano, previsto no revogado artº.49, nº.2, da L. G. Tributária, até ao pretérito dia 1/1/2007, não se aplica ao processo de execução fiscal nº…………………….. a norma revogada, assim não podendo aproveitar-se o recorrente do regime de cessação do efeito interruptivo da prescrição e consequente transformação em efeito suspensivo, previsto na mesma norma, sendo certo que um novo prazo de prescrição só se iniciará após o trânsito em julgado de uma decisão que ponha termo à mesma execução fiscal (v.g.declaração em falhas), pelo que se impõe finalizar que a obrigação tributária de I.R.C. de 1999 não se encontra prescrita (cfr.artº.49, nºs.3 e 4, da L.G.T., na redacção resultante da Lei 53-A/2006, de 29/12).
Em conclusão, dúvidas não podem restar de que até ao presente a dívida de I.R.C. em causa não se mostra prescrita, não se encontrando, sequer, a correr o prazo de prescrição da mesma, devido aos vectores apontados supra.
Finalizando, sem necessidade de mais amplas ponderações, julga-se improcedente este fundamento do recurso e, em consequência, mantém-se a decisão recorrida a qual não padece do vício de erro de julgamento de direito que lhe era assacada, ao que se procederá na parte dispositiva deste acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 11 de Outubro de 2011

(Joaquim Condesso - Relator)
(Lucas Martins - 1º. Adjunto)

(Magda Geraldes - 2º. Adjunto)