Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03637/09
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:11/09/2011
Relator:PEDRO VERGUEIRO
Descritores:IRC.
CADUCIDADE DO DIREITO À LIQUIDAÇÃO.
DEVER DE AUDIÇÃO E FUNDAMENTAÇÃO.
CRIAÇÃO LÍQUIDA DE EMPREGO.
BENEFÍCIO FISCAL.
Sumário:I) No caso de um imposto periódico, como o IRC, o prazo de caducidade da liquidação conta-se a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário, o que que significa que, considerando a data de 31-03-2001 neste âmbito, é o dia 31-12-2001 que marca o início do prazo em apreço, o que equivale a dizer que a AF tinha de proceder à sua liquidação e notificar esta ao sujeito passivo até 31-12-2005 por força do regime estabelecido no art. 45º nºs 1 e 4 da LGT que é o aplicável.

II) O cumprimento do dever de audição supõe que a realidade apontada pela Recorrente foi considerada, ainda que sem a virtualidade de alterar o realidade vertida no âmbito do relatório final, impondo-se notar que, neste domínio, a AF não tem de responder ponto por ponto a todas as impugnações dos administrados, já que não vigoram aqui as regras adjectivas relacionadas com ónus de impugnação ou com omissões de pronúncia.

III) Em sede de fundamentação, com referência ao relatório da inspecção, o mesmo está também devidamente fundamentado a partir do momento em que nele se indicam não só os factos que determinaram as correcções introduzidas à matéria colectável, como também as normas legais a que obedeceram essas mesmas correcções.

IV) A majoração a que aludia o art. 48.º-A do Estatuto dos Benefícios Fiscais introduzido pela Lei n.º 72/98, de 3 de Novembro não pode deixar de sem entendida como um encargo fiscal, sendo que o normativo em apreço ( no seu nº 2 ) limita o montante máximo dos encargos mensais, não fazendo a ressalva de que os encargos em apreço são apenas os encargos anteriores à majoração.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário ( 2ª Secção ) do Tribunal Central Administrativo Sul:
1. RELATÓRIO
“………………. – C…………. Pessoais, S.A.”, devidamente identificada nos autos, identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, datada de 15-12-2008, que julgou improcedente a pretensão pela mesma deduzida na presente instância de IMPUGNAÇÃO relacionada com o indeferimento tácito da reclamação graciosa deduzida contra a liquidação de IRC nº…………………., referente ao exercício de 2000.
Formulou as respectivas alegações (cfr. fls. 223-243 ) nas quais conclui no sentido do provimento do presente recurso, revogando-se a sentença recorrida, bem como o acto tributário referente a IRC do exercício de 2000, tudo com as demais consequências legais, para o que enuncia as seguintes conclusões:
“(…)
(A) A Recorrente adoptou, no exercício de 2000, ao abrigo do disposto no artigo 8.º do CIRC, um período de tributação diferente do ano civil, com início a 1 de Abril e término a 31 de Março do ano seguinte;
(B) A 28 de Novembro de 2005, a Recorrente foi notificada da liquidação n.º ……………………, referente a IRC do ano de 2000 ( período de 1 de Abril de 2000 a 31 de Março de 2001), nos termos da qual foi apurado imposto a pagar no montante de EUR 328.295,65;
(C) Nos termos do artigo 45.º da LGT, o prazo de caducidade do direito de liquidação de tributos é de 4 anos a contar, no caso de impostos periódicos (como é o caso em apreço), do último dia do período de tributação;
(D) De acordo com o número 9 do artigo 8.º do CIRC, “O facto gerador do imposto considera-se verificado no último dia do período de tributação”;
(E) Atento o período de tributação adoptado pela Recorrente, é inequívoco que o prazo de caducidade se consumaria a 31 de Março de 2005, i.e., passados 4 anos sobre a data em que se verificou o facto gerador de imposto referente a IRC do exercício de 2000, salvo ocorrência de causa legal de suspensão do prazo de caducidade;
(F) A admitir-se a bondade da posição sustentada pelo Tribunal a quo, teríamos de concluir que haveria distintos prazos de caducidade consoante o período de tributação adoptado, bem como um alargamento do prazo de caducidade nos casos em que o exercício fiscal não coincide com o ano civil, o que naturalmente carece de qualquer base legal;
(G) Conforme resulta da factualidade assente pelo Tribunal a quo, o procedimento de inspecção foi iniciado a 6 de Janeiro de 2004 - com a entrega da ordem de serviço, tal como preceituado no n.º 2 do artigo 46.º da LGT e n.º 1 do artigo 51.º do RCPIT - tendo sido concluído a 6 de Julho de 2004, data da notificação do relatório final de inspecção, em obediência ao preceituado no n.º 1 do artigo 62.º do RCPIT;
(H) Não tendo o procedimento de inspecção excedido o prazo máximo de duração de seis meses, parece inequívoco que o prazo legal de caducidade esteve suspenso por idêntico período, i.e., esteve suspenso entre 6 de Janeiro de 2004 e 6 de Julho de 2004, pelo que o prazo de caducidade se consumou a 31 de Setembro de 2005, sendo esta a data limite para a Administração Tributária validamente notificar a Recorrente da liquidação ora sindicada (4 anos + 6 meses de suspensão);
(I) Conforme prova produzida nos presentes autos, o acto tributário referente a IRC do exercício de 2000 foi notificado à Recorrente a 28 de Novembro de 2005, sendo, pois, inequívoco que na referida data já se mostrava decorrido o prazo legal de caducidade, o que se invoca para os devidos efeitos legais, mormente para efeitos de revogação da sentença objecto do presente recurso e anulação do acto de liquidação de imposto em apreço;
(J) No que diz respeito à violação do n.º 7 do artigo 60.º da LGT, a ora Recorrente suscitou, em sede de audição prévia, a legalidade da correcção referente à criação líquida de emprego, tendo invocado, como elemento interpretativo, a alteração do quadro legal por via da Lei de Orçamento para o ano de 2003, bem como a prolação de orientação administração susceptível de dar provimento à posição sustentada pela Recorrente;
(K) Não obstante as objecções formuladas pela Recorrente, a Administração Tributária emitiu o relatório final de inspecção, sem que, contudo, se tenha pronunciado expressamente ou mesmo ponderado os argumentos de facto e de direito invocados pela Recorrente, tendo-se limitado a referir que não foram apresentados elementos novos em sede de audição (ver página 33 do relatório de inspecção e reproduzido no ponto 5 da matéria assente pelo Tribunal a quo);
(L) Assim, a falta de fundamentação decorre da circunstância de, determinando o número 7 do artigo 60.º da LGT a obrigatoriedade de a Administração Tributária levar em conta na fundamentação da decisão final os elementos novos suscitados na audição dos contribuintes, a desvalorização de tais elementos gera inevitavelmente um vício da decisão procedimental passível de enfermar os actos tributários subsequentes;
(M) Ao contrário do entendimento plasmado pelo Tribunal a quo na douta sentença de que ora se recorre, em nenhum momento do relatório final de inspecção a Administração Tributária se pronuncia sobre os elementos de direito trazidos pela Recorrente em sede de audiência prévia, sendo inequívoca a relevância interpretativa e procedimental de tais elementos na decisão final do procedimento;
(N) É hoje pacífico que a fundamentação abrange elementos de facto e de direito, pelo que a não ponderação e apreciação crítica, ainda que sumária, em sede do relatório final de inspecção é passível de constituir uma violação expressa do disposto no n.º 7 do artigo 60.º da LGT, constituindo causa de anulabilidade do acto tributário que lhe sobreveio;
(O) Assim, ao omitir por completo na “fundamentação” da decisão as razões que a levaram a desconsiderar os argumentos e razões trazidas pela Recorrente em sede do direito de audição prévia, sempre se há de concluir que a Administração Tributária não cumpriu o dever de fundamentação conforme preceituado nos artigos 60.º, n.º 7 e 77.º da Lei Geral Tributária, o que se invoca para os devidos efeitos legais, nomeadamente, de ilegalidade do procedimento tributário, bem como do acto de liquidação que lhe sobreveio, o que implica a necessária revogação da Douta sentença objecto do presente recurso;
(P) No período de tributação em análise, a Recorrente deduziu como custo fiscal os encargos suportados com a criação liquida de postos de trabalho para jovens com menos de 30 anos, aplicando, para o efeito, o benefício fiscal concedido por via do artigo 17.º do EBF (antigo artigo 48.º-A), apurando um valor de EUR 688.540,93, o qual veio a ser objecto de correcção por parte da Administração Tributária;
(Q) Ao abrigo da disposição legal acima referida, a ora Recorrente majorou todos os encargos suportados em 50%, na medida em que cada um dos encargos mensais individualmente considerado não excedesse o limite de 14 vezes o salário mínimo nacional mais elevado;
(R) Na óptica da Administração Tributária, tal como plasmada no relatório final de inspecção “(…) o montante máximo dos encargos mensais, por posto de trabalho, é de 14 vezes o ordenado mínimo nacional, ou seja, a majoração de 150% dos encargos está incluída neste limite, dado que esta majoração é considerada como um encargo fiscal. Assim, aceita-se como custo fiscal a majoração, desde que não ultrapasse o valor correspondente a 14 vezes o referido salário”;
(S) O entendimento propugnado pela Administração Tributária carece, em absoluto, de base legal, violando de forma ostensiva o artigo 48.º-A do EBF, bem como os princípios da legalidade e da irretroactividade das normas fiscais;
(T) Da análise e interpretação do referido preceito legal parece claro que o limite de catorze vezes o salário mínimo nacional é somente aplicável aos encargos mensais e não aos encargos acrescidos da majoração de 50%, como pretende fazer crer a Administração tributária e conforme entendimento defendido pelo Tribunal a quo;
(U) Com efeito, uma análise e interpretação com um mínimo de correspondência com a letra e espírito da norma não permitirá extrair outra conclusão que não seja a de que o limite de catorze vezes o salário mínimo nacional é somente aplicável aos encargos mensais e não aos encargos acrescidos da majoração de 50%, conforme entendimento da Administração Tributária que está na base da emissão do acto tributário ora sindicado;
(V) A própria Administração Tributária já defendeu esta posição através da Direcção de Serviços dos Benefícios Fiscais, em sede de resposta ao pedido de informação vinculativa relativo ao processo n.º 3885/01, de 17 de Outubro;
(W) Por via da Lei do OE/2003, o legislador procedeu a uma alteração do número 2 do artigo 17.º do EBF estabelecendo que “Para efeitos do disposto no número anterior, o montante máximo da majoração anual, por posto de trabalho, é de 14 vezes o salário mínimo nacional mais elevado”;
(X) Ao alterar a norma de incidência tributária, de modo a referir-se, expressamente, ao valor de majoração anual, o legislador pretendeu restringir a abrangência do benefício fiscal previsto naquela disposição legal, estabelecendo expressamente que o limite legal se aplica ao montante anual de encargos, após majoração em 50%;
(Y) É inequívoco o carácter inovador da nova redacção do artigo 17.º do EBF, uma vez que é introduzida uma redacção claramente mais restritiva da referida norma;
(Z) Ora, considerando o carácter inovador da norma alterada por via do OE/2003, bem como o princípio constitucional da irretroactividade das normas fiscais, parece inequívoco que o referido preceito legal apenas se mostrará aplicável aos factos tributários ocorridos após a sua entrada em vigor, i.é., após 1 de Janeiro de 2003, o que não é manifestamente o caso em apreço;
(AA) Esta matéria já foi objecto de apreciação por parte do Exmo. Sr. Subdirector Geral do IRC - Despacho n.º 1016/04, de 9 de Junho de 2004, o qual faz referência expressa à introdução de um quadro legal menos favorável e à manutenção de aplicação do regime legal anterior para as situações de criação líquida de emprego ocorridas em anos anteriores à entrada em vigor da nova redacção do actual 17.º do EBF, assim se evidenciando a bondade do entendimento propugnado pela Recorrente;
(BB) Termos em que se conclui pela manifesta ilegalidade da correcção respeitante à criação líquida de emprego, o que determinará a procedência do presente recurso e a consequente revogação parcial do acto tributário referente a IRC do exercício de 2000, por violação os artigos 103.º da CRP, 48.º-A do EBF e 68.º da LGT;
(CC) Em virtude da anulação total ou parcial do acto tributário objecto do presente recurso, fica a Recorrente constituída ao pagamento de uma indemnização por prestação indevida das garantias bancárias n.º G118840 e n.º G119387 para efeitos de suspensão do processo de execução fiscal instaurado para cobrança coerciva do acto tributário ora sindicado, conforme prova realizada em sede do processo de impugnação judicial, matéria que ficou prejudicada na análise efectuada na sentença recorrida, atenta a manutenção do acto tributário na ordem jurídica ao contrário do peticionado pela ora Recorrente.

O recorrido não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal pronunciou-se no sentido da procedência do presente recurso.

Colhidos os vistos legais juntos dos Exmos. Juízes-Adjuntos foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.


2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

As questões suscitadas pela recorrente resumem-se, em suma, em indagar da caducidade do direito à liquidação de IRC, do cumprimento do dever de audição e fundamentação e da legalidade da correcção respeitante à criação líquida de emprego por referência ao benefício fiscal concedido por via do artigo 17º do EBF (antigo artigo 48º-A) quanto aos limites a considerar.

3. FUNDAMENTOS
3.1. DE FACTO
Resulta da decisão recorrida como assente a seguinte factualidade:

1. A impugnante foi objecto de uma acção de fiscalização por parte dos serviços da Direcção de Serviços de Inspecção Tributária, incidente sobre os exercícios de 2000 e 2001, e no âmbito da qual a administração tributária procedeu a correcções à matéria tributável em sede de IRC no montante de Euros 798.768,89 relativamente ao período de tributação de 1 de Abril de 2000 a 31 de Março de 2001, de que resultou a liquidação de IRC n.º ………………………… com o valor a pagar de Euros 328.295,65 incluindo juros compensatórios no valor de Euros 45.074,79 (cf. fls. 89, 91 e 49 a 87 dos autos).

2. A ordem de serviço n.º 03/1/347, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, relativa ao procedimento de inspecção, foi assinada por representante da impugnante em 6 de Janeiro de 2004 (cf. fls. 32, dos autos).

3. A correspondente note de diligência cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, foi entregue em 3 de Maio de 2004 (cf. fls. 34, dos autos).

4. O impugnante exerceu o seu direito de audiência prévia através de requerimento entrado na direcção de serviços prevenção a 15 de Maio de 2004, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido ( cf. fls. 36-47, dos autos).

5. No ponto 6 do relatório de inspecção tributária, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, lê-se o seguinte (cf. fls. 83, dos autos):

6. DIREITO DE AUDIÇÃO - FUNDAMENTAÇÕES

Face aos artigos 60º da Lei Geral Tributária e 60º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária, aprovado pelos Decretos Lei n.º 398/98 de 17/12 e 413/98 de 31/12, notificou-se o sujeito passivo, através do Ofício n.º 1413 de 4 de Maio de 2004, para exercer no prazo de 10 dias o direito de audição sobre o projecto de relatório de inspecção tributária.

O direito de audição foi exercido pelo sujeito passivo, conforme petição que deu entrada neste serviço em 17/05/2004 (Entrada n.º 1961) não tendo concordado total ou parcialmente com os seguintes pontos:

> Incentivos à criação de emprego (Pontos 3.1.1.1,1., 3.1.2.1.1 e 3.2.1.1.)

O sujeito passivo vem alegar nos pontos 5 a 21 do direito de audição, que “o limite de catorze vezes o salário mínimo nacional é aplicável somente aos encargos mensais, e não a esses encargos da majoração de 50%”.

No entanto, tal como está devidamente fundamentado no presente relatório, os encargos em termos fiscais contemplam o custo contabilístico registado nas respectivas contas de custos, acrescido da majoração respectiva.

Assim, após analisar a fundamentação do direito de audição, verificou-se que o sujeito passivo não acrescentou elementos novos ao processo, pelo que se mantêm as referidas correcções, tal como está demonstrado nos Anexos I, II e VI já referidos e devidamente fundamentados nos pontos 3.1.1.1.1., 3.1.2.1.1. e 3.2.1.1. do presente relatório

(…)

6. O impugnante foi notificado, por carta registada, da liquidação impugnada em 28 de Novembro de 2005 (cf. fls. 89, 91 e 111 dos autos, e 114 do PAT).

7. A impugnante prestou garantia para efeitos de suspensão do processo de execução fiscal subjacente às liquidações impugnadas (cf. fls. 104 a 109 dos autos).
Ao abrigo do disposto no art. 712º nº 1 al. a) do C. Proc. Civil, adita-se ao probatório o seguinte:
8. A Recorrente adoptou, no exercício de 2000, ao abrigo do disposto no artigo 8.º do CIRC, um período de tributação diferente do ano civil, com início a 1 de Abril e término a 31 de Março do ano seguinte.
9. No período de tributação em análise, a Recorrente deduziu como custo fiscal os encargos suportados com a criação liquida de postos de trabalho para jovens com menos de 30 anos, aplicando, para o efeito, o benefício fiscal concedido por via do artigo 17.º do EBF (antigo artigo 48.º-A), apurando um valor de EUR 688.540,93, o qual veio a ser objecto de correcção por parte da Administração Tributária.


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3.2. DE DIREITO

Assente a factualidade apurada cumpre, agora, entrar na análise da realidade que envolve o presente recurso jurisdicional, impondo-se, desde logo, abordar a questão de saber se ocorre a caducidade do direito à liquidação, ou seja, coloca-se nos autos um problema de configuração do elemento temporal do facto tributário havendo que precisar, nesse sentido, que os impostos instantâneos ou de obrigação única, porque têm na base do facto tributário um elemento temporal cuja definição dispensa critérios jurídicos já que se basta com meros critérios naturalísticos, são simples de solucionar; ao invés, os impostos duradouros ou periódicos, uma vez que têm na base do facto tributário um elemento temporal que tendencialmente se mantém ou se reitera, levanta a problemática do fraccionamento jurídico do facto, o qual se considera naturalisticamente unitário no tempo, coincidindo o período do imposto com o ano civil.

Constitui uma garantia dos contribuintes a caducidade do poder de determinação do montante do imposto e de outras prestações tributárias, pelos serviços da AT, quando o valor dessa determinação não for notificado ao contribuinte no prazo fixado na lei, nos impostos periódicos, a partir do termo daquele em que ocorreu o facto tributário.

Assim, a caducidade do direito de liquidação, como a caducidade em geral, serve-se de prazos pré - fixados, caracterizados pela peremptoriedade e, no ensinamento de Aníbal de Castro, A Caducidade na Doutrina, na Lei e na Jurisprudência, pág. 41, visa «limitar o lapso de tempo a partir do qual ou dentro do qual há-de exercer-se o direito...», havendo sido invocada logo na petição inicial como fundamento da impugnação.

De acordo com o disposto no art. 45º n°s l e 4 da LGT o direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única a partir da data em que o facto tributário ocorreu.

Nesta sequencia, a Recorrente aponta que, atento o período de tributação adoptado pela Recorrente, é inequívoco que o prazo de caducidade se consumaria a 31 de Março de 2005, i.e., passados 4 anos sobre a data em que se verificou o facto gerador de imposto referente a IRC do exercício de 2000, salvo ocorrência de causa legal de suspensão do prazo de caducidade, sendo que, a admitir-se a bondade da posição sustentada pelo Tribunal a quo, teríamos de concluir que haveria distintos prazos de caducidade consoante o período de tributação adoptado, bem como um alargamento do prazo de caducidade nos casos em que o exercício fiscal não coincide com o ano civil, o que naturalmente carece de qualquer base legal.

Por outro lado, conforme resulta da factualidade assente pelo Tribunal a quo, o procedimento de inspecção foi iniciado a 6 de Janeiro de 2004 - com a entrega da ordem de serviço, tal como preceituado no n.º 2 do artigo 46.º da LGT e n.º 1 do artigo 51.º do RCPIT - tendo sido concluído a 6 de Julho de 2004, data da notificação do relatório final de inspecção, em obediência ao preceituado no n.º 1 do artigo 62.º do RCPIT, de modo que, não tendo o procedimento de inspecção excedido o prazo máximo de duração de seis meses, parece inequívoco que o prazo legal de caducidade esteve suspenso por idêntico período, i.e., esteve suspenso entre 6 de Janeiro de 2004 e 6 de Julho de 2004, pelo que o prazo de caducidade se consumou a 31 de Setembro de 2005, sendo esta a data limite para a Administração Tributária validamente notificar a Recorrente da liquidação ora sindicada (4 anos + 6 meses de suspensão).
Assim, conforme prova produzida nos presentes autos, o acto tributário referente a IRC do exercício de 2000 foi notificado à Recorrente a 28 de Novembro de 2005, sendo, pois, inequívoco que na referida data já se mostrava decorrido o prazo legal de caducidade, o que se invoca para os devidos efeitos legais, mormente para efeitos de revogação da sentença objecto do presente recurso e anulação do acto de liquidação de imposto em apreço.
Neste domínio, é ponto assente que estamos manifestamente perante um imposto periódico (IRC) em que a caducidade da liquidação se conta a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário, que significa que, considerando a data de 31-03-2001 neste âmbito, é o dia 31-12-2001 que marca o início do prazo em apreço, o que equivale a dizer que a AF tinha de proceder à sua liquidação e notificar esta ao sujeito passivo até 31-12-2005 por força do regime estabelecido no art. 45º nºs 1 e 4 da LGT que é o aplicável.
Perante a factualidade apurada nos autos, é manifesto que o contribuinte tomou conhecimento da liquidação numa altura em que não haviam decorrido os 4 anos previstos para o exercício do direito à liquidação, pelo que a sentença recorrida não merece qualquer censura nesta matéria, pois que a norma citada no parágrafo anterior retira qualquer virtualidade à tese defendida pela Recorrente.

A Recorrente refere depois que suscitou, em sede de audição prévia, a legalidade da correcção referente à criação líquida de emprego, tendo invocado, como elemento interpretativo, a alteração do quadro legal por via da Lei de Orçamento para o ano de 2003, bem como a prolação de orientação administração susceptível de dar provimento à posição sustentada pela Recorrente, sendo que, não obstante as objecções formuladas pela Recorrente, a Administração Tributária emitiu o relatório final de inspecção, sem que, contudo, se tenha pronunciado expressamente ou mesmo ponderado os argumentos de facto e de direito invocados pela Recorrente, tendo-se limitado a referir que não foram apresentados elementos novos em sede de audição (ver página 33 do relatório de inspecção e reproduzido no ponto 5 da matéria assente pelo Tribunal a quo).
Assim, ao omitir por completo na “fundamentação” da decisão as razões que a levaram a desconsiderar os argumentos e razões trazidas pela Recorrente em sede do direito de audição prévia, sempre se há de concluir que a Administração Tributária não cumpriu o dever de fundamentação conforme preceituado nos artigos 60.º, n.º 7 e 77.º da Lei Geral Tributária, o que se invoca para os devidos efeitos legais, nomeadamente, de ilegalidade do procedimento tributário, bem como do acto de liquidação que lhe sobreveio, o que implica a necessária revogação da Douta sentença objecto do presente recurso.
Neste domínio, importa apurar se no relatório da inspecção levada a cabo pela Administração Tributária, foram ou não levados em conta os elementos novos fornecidos pela impugnante aquando do exercício do direito de audição prévia e se o referido relatório inspectivo se encontra devidamente fundamentado.
A análise do exposto pela ora Recorrente no exercício do seu direito de audição a fls. 36-37 destes autos e o relatório da inspecção para facilmente se concluir que a realidade apontada pela Recorrente foi considerada, ainda que sem a virtualidade de alterar o realidade vertida no âmbito do relatório final, impondo-se notar que, neste domínio, a AF não tem de responder ponto por ponto a todas as impugnações dos administrados, já que não vigoram aqui as regras adjectivas relacionadas com ónus de impugnação ou com omissões de pronúncia.
Deste modo, é manifesto que o exercício do direito de audiência não se mostra diminuído ao ponto de ficar descaracterizado, sendo de concluir pela não verificação do vício formal correspondentemente arguido, até porque a AF apreciou a relevância da tese da ora Recorrente, na sua essência, sendo de notar que, nesta sede, a Recorrente não alude a nenhuma orientação administrativa e a referida alteração legal é apenas um argumento apontado em abono da tese da Recorrente, não podendo dizer-se que a AF não considerou a situação exposta pela Recorrente.
Por outro lado, é também patente que o referido relatório e no que a esta parte diz respeito, está também devidamente fundamentado, nele se indicando não só os factos que determinaram as correcções introduzidas à matéria colectável, como também as normas legais a que obedeceram essas mesmas correcções.
Se o fizeram bem ou mal isso não se traduzirá em qualquer vício de forma, mas em algo mais substancial e que constitui a matéria que será abordada em seguida, aproveitando a descrição feita pela Recorrente.
Com efeito, é sabido que no período de tributação em análise, a Recorrente deduziu como custo fiscal os encargos suportados com a criação liquida de postos de trabalho para jovens com menos de 30 anos, aplicando, para o efeito, o benefício fiscal concedido por via do artigo 17.º do EBF (antigo artigo 48.º-A), apurando um valor de EUR 688.540,93, o qual veio a ser objecto de correcção por parte da Administração Tributária.
Assim, ao abrigo da disposição legal acima referida, a ora Recorrente majorou todos os encargos suportados em 50%, na medida em que cada um dos encargos mensais individualmente considerado não excedesse o limite de 14 vezes o salário mínimo nacional mais elevado, sendo que na óptica da Administração Tributária, tal como plasmada no relatório final de inspecção “(…) o montante máximo dos encargos mensais, por posto de trabalho, é de 14 vezes o ordenado mínimo nacional, ou seja, a majoração de 150% dos encargos está incluída neste limite, dado que esta majoração é considerada como um encargo fiscal. Assim, aceita-se como custo fiscal a majoração, desde que não ultrapasse o valor correspondente a 14 vezes o referido salário”.
Para a Recorrente, o entendimento propugnado pela Administração Tributária carece, em absoluto, de base legal, violando de forma ostensiva o artigo 48.º-A do EBF, bem como os princípios da legalidade e da irretroactividade das normas fiscais, pois que da análise e interpretação do referido preceito legal parece claro que o limite de catorze vezes o salário mínimo nacional é somente aplicável aos encargos mensais e não aos encargos acrescidos da majoração de 50%, como pretende fazer crer a Administração tributária e conforme entendimento defendido pelo Tribunal a quo.
A própria Administração Tributária já defendeu esta posição através da Direcção de Serviços dos Benefícios Fiscais, em sede de resposta ao pedido de informação vinculativa relativo ao processo n.º 3885/01, de 17 de Outubro.
Além disso, por via da Lei do OE/2003, o legislador procedeu a uma alteração do número 2 do artigo 17.º do EBF estabelecendo que “Para efeitos do disposto no número anterior, o montante máximo da majoração anual, por posto de trabalho, é de 14 vezes o salário mínimo nacional mais elevado”, sendo que ao alterar a norma de incidência tributária, de modo a referir-se, expressamente, ao valor de majoração anual, o legislador pretendeu restringir a abrangência do benefício fiscal previsto naquela disposição legal, estabelecendo expressamente que o limite legal se aplica ao montante anual de encargos, após majoração em 50%;
Assim, considerando o carácter inovador da norma alterada por via do OE/2003, bem como o princípio constitucional da irretroactividade das normas fiscais, parece inequívoco que o referido preceito legal apenas se mostrará aplicável aos factos tributários ocorridos após a sua entrada em vigor, i.é., após 1 de Janeiro de 2003, o que não é manifestamente o caso em apreço.
Esta matéria já foi objecto de apreciação por parte do Exmo. Sr. Subdirector Geral do IRC - Despacho n.º 1016/04, de 9 de Junho de 2004, o qual faz referência expressa à introdução de um quadro legal menos favorável e à manutenção de aplicação do regime legal anterior para as situações de criação líquida de emprego ocorridas em anos anteriores à entrada em vigor da nova redacção do actual 17.º do EBF, assim se evidenciando a bondade do entendimento propugnado pela Recorrente.
Pois bem, é sabido que a Lei n.º 72/98, de 3 de Novembro, introduziu no Estatuto dos Benefícios Fiscais um art. 48.º-A, com a seguinte redacção:

Artigo 48.º-A
Criação de empregos para jovens
1 - Para efeitos do imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC), os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho para trabalhadores admitidos por contrato sem termo com idade não superior a 30 anos são levados a custo em valor correspondente a 150%.
2 - Para efeitos do disposto no número anterior, o montante máximo dos encargos mensais, por posto de trabalho, é de 14 vezes o ordenado mínimo nacional.
Com a renumeração operada pela Lei n.º 198/2001, de 3 de Julho, este artigo passou a ser o art. 17º do E.B.F.
Com este pano de fundo, entende-se que bem andou a sentença recorrida ao considerar que a majoração não pode deixar de sem entendida como um encargo fiscal, sendo que o normativo em apreço ( o nº 2 ) limita o montante máximo dos encargos mensais, não fazendo a ressalva de que os encargos em apreço são apenas os encargos anteriores à majoração.
Com efeito, a descrição dos encargos feita pelo nº 1 não estabelece qualquer distinção ao nível da sua consideração, nomeadamente nos termos propostos pela Recorrente, sendo que em relação às posições da Administração, o PAT apenso apresenta a fls. 200 cópia do despacho ministerial de 05-03-99 onde se aponta que, para efeitos do nº 2 da norma agora em análise, o montante máximo dos encargos por posto de trabalho não pode exceder esc. 858.200$00, isto é, 14 vezes o ordenado mínimo nacional mais elevado que para 1999 ficou fixado pelo DL nº 49/99, de 16.02 em 61.300$00 e bem assim até fls. 211 esclarecimentos e informações que apontam numa outra direcção que não a defendida pela Recorrente.
No mais, e quanto ao facto de a Lei do OE/2003, ter procedido a uma alteração do número 2 do artigo 17.º do EBF, dispondo que “Para efeitos do disposto no número anterior, o montante máximo da majoração anual, por posto de trabalho, é de 14 vezes o salário mínimo nacional mais elevado”, mostra-se assertiva a sentença recorrida quando refere que tal não permite concluir que o legislador ao referir-se, anteriormente a esta alteração, a encargos, não pretendesse referir-se à totalidade dos encargos, não se evidenciando o carácter inovador da norma nos termos referidos pela Recorrente, mas sim uma clarificação da situação em função dos esclarecimentos e várias informações prestadas, que até estarão em rota de colisão com outro tipo de posições assumidas pela Administração de que dá nota a Recorrente ( conclusão V), embora tal elemento não tenha sido junto aos autos )
Daí que na improcedência das conclusões da alegação da recorrente, se impõe, nos termos acima expostos, confirmar a decisão aqui sindicada, com todas as legais consequências.
Improcede, por conseguinte, o presente recurso jurisdicional.
4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.
Custas pela Recorrente.
Notifique-se. D.N..
Lisboa, 9 de Novembro de 2011
Pedro Vegueiro
Lucas Martins
Magda Geraldes