Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:235/08.8BESNT
Secção:CT
Data do Acordão:12/16/2020
Relator:ANA PINHOL
Descritores:IRC ;
PROVISÕES ;
ENCARGOS BANCÁRIOS COM LETRAS;
DESPESAS NÃO DOCUMENTADAS.
Sumário:I.A letra não é um documento autónomo e tem sempre uma relação subjacente à sua emissão.

II.Os encargos bancários que o portador das letras teve de suportar relacionados com o pagamento desses títulos não podem deixar de se inserirem no conceito de actividade normal da Impugnante.

III.Despesas não documentadas, são aquelas em relação às quais não existe prova documental, embora não haja ocultação da sua natureza, origem ou finalidade.

IV.As despesas não documentadas são sujeitas a tributação autónoma.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACÓRDÃO

I.RELATÓRIO

A FAZENDA PÚBLICA e a E..........., S.A. recorrem na parte em que cada uma delas ficou vencida na sentença proferida pelo TRIBUNAL ADMINISTRATIVO E FISCAL DE SINTRA que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra o acto de liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), referente ao exercício de 2003, no montante global de 1.243.856,30 €.

A recorrente, Fazenda Pública, finalizou as suas alegações recursórias com as seguintes conclusões:

«a) Salvo o devido respeito, entendemos que a douta sentença enferma de erro de julgamento quando dá como provados os factos constantes das alíneas H. e J, do probatório.

b) A impugnante não declarou como valor da alienação das quotas da sociedade “A..........., SA.” o montante de 14.461.860,29€, por ter procedido a uma cessão de crédito de suprimentos no valor de 1.244.150,87€.

c) Valor da cessação dos suprimentos foi de 3.319.159,27€.

d) Resulta do depoimento da testemunha da impugnante Sr. A..........., que os valores das ajudas de custo não eram discriminadas nas facturas emitidas aos clientes porque não era pratica no sector da Construção Civil.

e) Existindo centros de custos das obras nos quais constam todos os custos incorridos com as mesmas, não é materialmente impossível a sua discriminação nas facturas emitidas aos clientes, nem tal acarrete custos acrescidos à impugnante.

f) De acordo com o depoimento da testemunha Sr. R..........., os imóveis a que aí se alude não se destinavam apenas aos trabalhadores da impugnante como também aos seus familiares, pelo que, tal facto deveria ter sido levado ao probatório.

g) No que respeita às mais-valias referentes à alienação da sua participação social na sociedade “ A..........., SA.”, a impugnante não actuou em conformidade com as normas aplicáveis, nomeadamente o artº 46º, nº 2 do CIRC.

h) Contrariamente ao decidido o prejuízo que a impugnante teve com a alienação dos suprimentos, ou seja, dos créditos que detinha sobre a sociedade “A..........., SA.”, não concorre para a formação das mais-valias.

i)Tal como se refere e bem no relatório de inspecção são negócio completamente independentes e cuja relevância fiscal é tratada de diferente forma.

j) Conforme resulta de todos os elementos constantes dos autos e assumido pela impugnante as ajudas de custo não foram facturadas aos clientes.

k) Assim, verifica-se que tais encargos não reúnem os requisitos da dedutibilidade, pelo que, é de aplicar o disposto no artº 42º, nº 1, al. f) do CIRC.

l) Correcção efectuada pela Administração Fiscal apenas não aceitou como custo, relativamente às ajudas de custo, o valor de 20% do montante dispendido pela impugnante a esse titulo e isto porque a impugnante possuía os mapas de controlo legalmente exigidos, em conformidade com o artº 42º, nº 1 al. f) do CIRC.

m) Porquanto de acordo com aquele preceito legal não basta a existência dos mapas de controlo é necessário também que as ajudas de custo se encontrem facturas ao clientes e isso só é possível de verificar quando estejam devidamente discriminadas.

n) No que respeita aos custos com as rendas habitacionais a impugnante em momento algum veio justificar a razão de tais despesas, quando procedia ao pagamento de ajudas de custo aos seus trabalhadores.

o) Não se encontrando as referidas despesas devidamente justificadas não podem as mesmas serem consideradas como custos nos termos do artº 23º do CIRC.

p) Face ao exposto, verifica-se que, salvo o devido respeito, a sentença recorrida ao decidir como decidiu enferma de erro de julgamento, viola o disposto no artº 43º, nº 2, o disposto no artº42º, nº 1, al. f) e o artº 23º todos do CIRC.

Termos em que, com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente Recurso ser provido e, consequentemente ser revogada a sentença proferida pelo Douto Tribunal “a quo”, assim se fazendo a costumada Justiça.»

A E..........., S.A., terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

«A sentença recorrida julgou parcialmente improcedente a impugnação judicial deduzida pela ora Recorrente contra o acto tributário consubstanciado na liquidação de IRC n.º ..........., na liquidação de juros compensatórios n.º ........... e na demonstração de acerto de contas n.º ..........., do exercício de 2003;

No que concerne à correcção referente a provisões não aceites fiscalmente – dívidas tituladas por letras, no montante de € 1.348.240,96, entendeu o Tribunal Recorrido que, no caso vertente, a data de vencimento dos créditos deverá corresponder à data de vencimento das letras, porquanto houve uma conversão dos créditos não titulados em créditos titulados;

Por sua vez, quanto à correcção referente a mais-valias fiscais – alienação da participação na S.........., no montante de € 113.202,53, entendeu o Tribunal Recorrido que não foi demonstrada a correcta contabilização do montante de € 113.202,53;

Por fim, no que concerne à correcção referente ao cálculo do imposto, nomeadamente tributação autónoma de despesas não documentadas, no montante de € 109.775,90, entendeu o Tribunal Recorrido que as despesas em que a Recorrente incorreu em Angola não se encontram devidamente documentadas;

Ora, a sentença recorrida não deve, desde logo, proceder porquanto incorre em nulidade por falta de fundamentação no que concerne à apreciação da violação dos princípios da especialização, da tributação pelo lucro real e da justiça previstos, respectivamente, nos artigos 18.º do Código do IRC, artigos 104.º, n.º 2 e 266.º da CRP, e artigo 55.º da LGT, conforme alegado pela Recorrente;

Com efeito, atento o disposto no artigo 205.º, n.º 1 da CRP, e nos artigos 158.º e 659.º, n.º 2 do CPC, aplicáveis ex vi artigo 2.º, alínea e), do CPPT, as decisões judiciais devem ser devidamente fundamentadas, contendo a indicação das razões de facto e de direito que levaram o julgador a decidir em determinado sentido;

Como se aludiu, não resulta da sentença proferida pelo Tribunal a quo, com interesse para a decisão proferida e na parte recorrida a indicação das razões de facto e de direito que levaram a concluir pela não violação daqueles princípios;

De facto, o Tribunal Recorrido limita-se a concluir pela não “(…) violação dos princípios invocados pela impugnante (…)”(cf. página 35 da sentença recorrida), suportando tal conclusão na circunstância do artigo 102.º, n.º 1, alínea f), do CPPT, permitir considerar como aberto o prazo para a impugnação judicial das liquidações subsequentes, sem, contudo, aquele Tribunal proferir qualquer juízo que permita à ora Recorrente conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido na apreciação do invocado quanto à violação daqueles princípios;

Impunha-se ao Tribunal Recorrido que, em face do invocado pela ora Recorrente quanto à violação daqueles princípios, fundamentasse expressamente em que medida o citado artigo 102.º, n.º 1, alínea f), do CPPT ao prever a possibilidade de interpor impugnação judicial na sequência do conhecimento de acto lesivo, obsta à violação daqueles princípios, uma vez que tal alusão àquele direito de impugnação não foi sequer referida pela Impugnante;

10ª Pelo que, a sentença recorrida incorre em vício de falta de fundamentação, o que conduz à nulidade da sentença recorrida, em face do disposto no artigo 125.º do CPPT, e do artigo 668.º, n.º 1, alínea b) do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT;

11ª Acresce que, mesmo que se admita que a sentença recorrida não incorre em vício de falta de fundamentação na apreciação da questão relativa à violação dos princípios da especialização e da tributação pelo lucro real e da justiça, o que apenas por dever de patrocínio se concebe, ainda assim dúvidas não subsistem de que aquele vício de falta de fundamentação ocorre no que concerne à apreciação da violação do princípio da justiça;

12ª De facto, da referência ao artigo 102.º, n.º 1, alínea f), do CPPT apenas resulta que poderá ser apresentada impugnação judicial, sem que daí se extraia qualquer conclusão quanto à improcedência da violação ao princípio da justiça;

13ª Ora, a invocação do princípio da justiça pela ora Recorrente, não se refere à possibilidade de ser deduzida impugnação judicial, ou seja, não se refere à (in)existência de mecanismos de reacção posteriores à consolidação na ordem jurídica de determinada correcção, mas tão-só ao impedimento que daquele princípio advém para a administração tributária em proceder àquela correcção;

14ª Razão pela qual não pode deixar de concluir-se que aquela sentença incorre, nesta parte, em vício de falta de fundamentação, o que conduz à nulidade;

15ª Sem prejuízo do exposto, e admitindo-se que o vício acima invocado não seria procedente, o que apenas por dever de patrocínio se concebe, ainda assim seria de anular a sentença recorrida com fundamento em erro de julgamento decorrente da insuficiência da matéria de facto;

16ª Efectivamente, na factualidade dada como provada na douta sentença recorrida nenhuma menção é feita à matéria de facto respeitante à correcção provisões não aceites fiscalmente – dívidas tituladas por letras, no montante de € 1.348.240,96 relativamente à qual o Tribunal a quo julgou a impugnação judicial apresentada improcedente, devendo, contudo, para além dos factos indicados na fundamentação da sentença recorrida, ter sido dados como provados outros factos, atenta a prova produzida nos próprios autos, a qual não foi integralmente valorada pelo Tribunal a quo, designadamente no que se refere à prova testemunhal;

17ª Deste modo, não pode a Recorrente deixar de impugnar as alienas A) a K) do probatório da sentença recorrida, por manifesta insuficiência, na medida em que, concomitantemente com os factos ali descritos, deveriam ter sido dados como provados os factos seguidamente descritos:

a)Não foi estabelecido com os clientes devedores da Impugnante qualquer acordo no sentido da extinção do crédito subjacente às letras de câmbio em apreço;

b)Não foi, também, estabelecido com os clientes da Impugnante a dilação da mora do crédito subjacente em consequência da reforma das letras de câmbio em apreço.

18ª De igual modo, e para os devidos efeitos, dá-se como impugnada a matéria de facto não provada na parte em que se consideraram implicitamente como não provados os factos acima indicados;

19ª Pelo que, em suma, deverão ser relevados como factos provados os supra evidenciados e, em conformidade com o exposto, ser proferida uma nova decisão que julgue a impugnação judicial deduzida pela Recorrente integralmente procedente;

20ª Com efeito, sempre se impõe, por força do disposto no artigo 712.º do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º do CPPT, que os autos baixem à 1.ª instância para ampliação da matéria de facto, caso esse Ilustre Tribunal considere que não dispõe de elementos que lhe permitam a reapreciação da matéria de facto, por impossibilidade de o Tribunal ad quem julgar em substituição;

21ª Sem prejuízo do acima exposto, e ainda que não se considerem procedentes os vícios acima invocados, o que apenas por cautela e dever de patrocínio se concede, cumpre referir que a decisão recorrida incorre também em erro de julgamento da matéria de direito, porquanto os fundamentos em que a mesma se alicerça são improcedentes;

22ª Com efeito, no que se refere à correcção provisões não aceites fiscalmente - dívidas tituladas por letras, no montante de € 1.348.240,96, não pode a Recorrente concordar de forma manifesta com a sentença recorrida, na medida em que, contrariamente ao pugnado pelo Tribunal a quo a data de vencimento das facturas manteve-se inalterada, não tendo sido substituída pela data de vencimento da letra que a titula;

23ª De facto, as letras de câmbio caracterizam-se, essencialmente, pela sua “abstracção” em relação à sua relação subjacente – a relação fundamental;

24ª Deste modo, a existência de uma letra de câmbio não implica a extinção ou novação do crédito, uma vez que, para tal é necessário o acordo das partes;

25ª Pelo que, não tendo existido qualquer acordo naquele sentido improcedente o entendimento pugnado pela administração tributária e pelo Tribunal a quo;

26ª Acresce que, o artigo 35.º do Código do IRC (actual artigo 36.º) não impõe qualquer limitação no que se refere à constituição de provisões quando sejam sacadas letras relativamente aos créditos em mora;

27ª Para o legislador fiscal aquilo que verdadeiramente releva é que o crédito – isto é, o crédito subjacente – esteja em mora há mais de seis meses e tenham sido efectuadas diligências para o seu recebimento, sendo, de todo, irrelevante o facto de, devido à obrigação cartular, o pagamento poder ser feito posteriormente;

28ª Efectivamente, as letras apenas constituem meios adicionais que os credores têm à sua disposição no sentido de providenciar a satisfação dos créditos de que são titulares;

29ª Sem prejuízo do acima exposto, admitindo-se que as referidas provisões não fossem aceites fiscalmente, o que apenas por cautela e dever de patrocínio se concede, cumpre referir que a provisão para o crédito sobre a Q.........., no valor de € 162.018,77, foi reposta no exercício de 2005, originando um proveito líquido que foi objecto de tributação, razão pela qual sempre se imporia que o proveito contabilizado com tal reposição tivesse de ser deduzido nesse exercício;

30ª De facto, tal como tem entendido a administração tributária (cf. Ofício-Circulado n.º 14/1993, de 23 de Novembro), quando a administração tributária efectua correcções ao resultado tributável com impacto em exercícios subsequentes, compete-lhe concretizar as correspondentes correcções nesses exercícios, por sua própria iniciativa;

31ª Assim, a correcção sub judice não pode traduzir-se numa simples operação de anulação mas sim numa anulação de um proveito ou de um custo num exercício e no reconhecimento de igual valor em sentido inverso no exercício a que o mesmo respeita, sob pena de violação dos princípios da especialização dos exercícios, da tributação pelo lucro real e da justiça previstos, respectivamente, no artigo 18.º do Código do IRC, nos artigos 104.º, n.º 2 e 266.º da CRP, e no artigo 55.º da LGT;

32ª Pelo que, em face do exposto, deve a liquidação adicional ser anulada nesta parte e, consequentemente, revogada nessa medida a sentença recorrida;

33ª No que concerne à correcção referente a mais valias – alienação da participação na sociedade S.........., no montante de € 113.202,53, também não pode a Recorrente manifestamente concordar com o entendimento do Tribunal a quo, porquanto tendo esta suportado custos no montante de € 133.202,53, o valor de alienação da referida participação social foi apenas de € 5.904.887,47;

34ª Apesar do penhor ter respeitado ao montante de € 6.018.090,00, o valor efectivo de realização correspondeu apenas a € 5.904.887,47, respeitando a diferença à assunção de um saldo devedor daquela entidade, reflectido na conta #26;

35ª Com efeito, a regularização deste saldo resulta de um acerto de contas efectuado relativamente a obras realizadas respeitante ao CAL, constituído entre a S.......... a Recorrente, e outros;

36ª No âmbito deste consórcio, a S.......... constitui-se devedora do CAL em € 622.849,63 (Pte. 124.870.140$00);

37ª Posteriormente, e no âmbito das negociações, entre Recorrente e S.........., para a constituição de um outro consórcio para construção de um empreendimento designado por “Colina de S. Gonçalo”, a Recorrente viu-se forçada a renunciar a qualquer crédito anterior de que fosse titular sobre aquele a S..........;

38ª Em consequência daquela renúncia, essencial à constituição do consórcio, a Recorrente apurou uma perda de € 133.202,53;

39ª No âmbito deste consórcio, a S.......... celebrou com a Recorrente o identificado contrato de penhor de títulos mobiliários como garantia do reembolso de um adiantamento no valor de € 6.018.090,00 efectuado por aquela Sociedade à Recorrente no contexto daquela obra;

40ª Em virtude de a Recorrente não ter procedido ao seu reembolso, a S.......... executou o referido contrato e adquiriu as acções empenhadas pelo valor em dívida, pelo que a dedução efectuada através de débito na conta #79, daquela perda ao montante de realização apurado com a execução do citado penhor respeita a uma perda decorrente da actividade normal;

41ª Refira-se, ainda, que de acordo com o depoimento da testemunha S.......... (Técnica de Inspecção) o pressuposto essencial que está na origem da correcção em apreço, não é a falta de demonstração da indispensabilidade do custo, mas sim a circunstância de, embora poder constituir aquele encargo um verdadeiro custo fiscal, ser o mesmo insusceptível de ser relevado no âmbito do apuramento de uma mais ou menos-valia;

42ª Em face do exposto, encontrando-se este custo devidamente demonstrado, e correctamente contabilizado, conclui-se que a correcção sub judice é ilegal devendo, em consequência, ser anulada e revogada a sentença recorrida, nessa parte;

43ª No que concerne à correcção do cálculo do imposto, nomeadamente quanto a despesas não documentadas no montante de € 109.775,90, também não pode a Recorrente manifestamente concordar com o entendimento do Tribunal a quo, porquanto as despesas em causa estão devidamente documentadas;

44ª Ora, no âmbito da estratégia de diversificação de mercados e internacionalização da actividade levada a cabo pela ora Recorrente, esta decidiu investir no mercado angolano, tendo aliás desenvolvido algumas actividades de prospecção, que levaram à adjudicação de várias empreitadas;

45ª Com efeito, para fazer face aos custos suportados com aquelas actividades de prospecção e construção, a Recorrente efectuava transferências de fundos para Luanda;

46ª No entanto, em face dos desenvolvimentos políticos de 2002, a Recorrente viu-se obrigada a cessar precocemente sua actividade em Angola;

47ª Assim, em consequência daquela cessação foi apurada uma perda resultante da regularização de saldos constantes da conta #26, reflexo do não retorno financeiro de alguns investimentos efectuados naquele país, designadamente no âmbito das actividades de prospecção desenvolvidas, reconhecendo, deste modo, um custo do exercício;

48ª Encontrando-se, deste modo, justificados e documentados os custos em apreço através dos documentos de suporte juntos com a impugnação judicial apresentada;

49ª Considera a Recorrente que os mesmos só poderiam, no limite, ser qualificados como custos indevidamente documentados, mas nunca, como consideraram os serviços de inspecção tributária, como despesas não documentadas, razão pela qual seriam insusceptíveis de tributação autónoma nos termos do artigo 81.º do Código do IRC (actual artigo 88.º);

50ª De acordo com o disposto no artigo 81.º, n.º 1, do Código do IRC, na redacção à data aplicável, são as despesas não documentadas e as despesas confidenciais que se encontram sujeitas a tributação autónoma, pelo que parecem os serviços de inspecção tributária confundir aqueles conceitos;

51ª De facto, para existir tributação autónoma nos termos em que o pretende a inspecção tributária, teríamos que estar na presença de despesas que são efectuadas sem identificação do beneficiário ou da sua natureza ou de despesa sem suporte documental, o que não sucede no caos vertente, porquanto a Recorrente dispõe dos documentos comprovativos da despesa suportada com os referidos pagamentos;

52ª Pelo que, não pode senão concluir-se que a despesa em questão não é uma despesa não documentada, resultando, assim, evidente a ilegalidade, nesta parte, da liquidação adicional, razão pela qual deve, em consequência, ser anulada a sentença recorrida.

Por todo o exposto, e o mais que o ilustrado juízo desse Tribunal suprirá, deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, com a consequente revogação da sentença recorrida e, nessa medida, o acto tributário em crise nos termos peticionados, assim se cumprindo com o DIREITO e a JUSTIÇA!»

Foram admitidos ambos os recursos, mas somente a E.........., S.A.,veio apresentar as suas contra- alegações e nestas as respectivas conclusões, que infra se reproduzem:

«1.ª A sentença proferida nos presentes autos julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida pela ora Recorrida contra o acto tributário consubstanciado na liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) n°..........., na liquidação de juros compensatórios n°..........., e na demonstração de acerto de contas n°..........., todas datadas de 21 de Novembro de 2007, do exercício de 2003;

2.ª Com efeito, no que ao presente recurso concerne, o Tribunal Recorrido determinou a anulação do "(...) acto de liquidação adicional de IRC do exercício de 2003 e respectivos furos compensatórios, na parte que respeita às correcções provenientes de provisões não dedutíveis (encargos com descontos de letra), no valor de €72.132.39, mais-valias fiscais (A..........., S.A.), no valor de €1.244.150,87, ajudas de custo (facturas a clientes), no valor de €393.756,16, e custos referentes a rendas habitacionais, no valor de €157,290,55.” (cf. página 50 da sentença recorrida);

3.ª Invoca a Ilustre Representante da Fazenda Pública que a sentença sob recurso incorre em a) erro de julgamento da matéria de facto e em b) erro de julgamento quanto à decisão de mérito proferida;

4.ª Sucede que, não assiste qualquer razão à Ilustre Representante da Fazenda Pública, devendo manter-se a decisão recorrida;

5.ª Considerou o Tribunal a quo provado que "H) No valor de realização decorrente da alienação da participação detida na sociedade «A........... - Concessão Rodoviária de Portugal, SA.», a impugnante declarou o montante de 14.461.860,29€, por ter procedido a uma cessão de crédito de suprimentos no valor de 1.244.150,87€." (cf. página 24 da sentença recorrida);

6.ª Considerou, ainda, o Tribunal a quo provado que "J) Os montantes relativos a estas ajudas de custo foram relevados nos valores totais a orçamentar e nos débitos efectuados aos clientes, mas não foram discriminadas na respectiva facturação, dada a sua materialidade e o respectivo custo administrativo." (cf. página 25 da sentença recorrida);

7.ª A Ilustre Representante da Fazenda Pública e ora Recorrente, discordando do decidido, invoca, desde logo, que "(...) a impugnante não declarou como valor da alienação das quotas da sociedade «A..........., SA.» o montante de 14.461.860,29 € (...)"(cf. página 3 das alegações de recurso);

8.ª Invoca, ainda, a Ilustre Representante da Fazenda Pública que "(...) resulta do depoimento da testemunha da impugnante Sr. A..........., que os valores das ajudas de custo não eram discriminadas nas facturas emitidas aos clientes (…)"(cf. página 3 das alegações de recurso);

9.ª No entanto, não merece qualquer censura a factualidade dada como provada pelo Tribunal a quo face à prova constante dos autos;

10.ª No que concerne à supra citada alínea H) do probatório, em face da prova produzida nos presentes autos, dúvidas não subsistem de que o valor de realização da alienação da participação detida pela ora Recorrida na sociedade A.........., S.A., foi de € 14.461.860,29;

11.ª Por sua vez, no que concerne à supra citada alínea J), contrariamente ao invocado pela Recorrida, o contrário não resulta do depoimento da testemunha A..........;

12.ª Alega, ainda, a Recorrente que "No que respeita ao facto constante da alínea K, de acordo com o depoimento da testemunha Sr. R..........., os imóveis a que aí se alude não se destinavam apenas aos trabalhadores da impugnante como também aos seus familiares, pelo que, tal facto deveria ter sido levado ao probatório." (cf. página 4 da sentença recorrida), todavia, também neste ponto não assiste qualquer razão à Recorrente, uma vez que aqueles imóveis, conforme demonstrado nos presentes autos, se destinavam apenas à utilização pelos trabalhadores da ora Recorrida durante o período em que estivessem deslocados;

13.ª Pelo que, inexistindo nos autos quaisquer elementos que infirmem a factualidade dada como provada nas alíneas H), J) e K) do probatório e menos ainda que imponham a sua alteração, improcede o presente recurso, devendo manter-se a sentença recorrida;

14.ª Mesmo que se considerasse que a sentença recorrida fez errado julgamento da matéria de facto face à prova constante dos autos, no que não se concede e apenas por cautela de patrocínio se admite, ainda assim improcederia o recurso no que concerne ao alegado erro de julgamento quanto à decisão de mérito proferida;

15.ª No que concerne à correcção relativa às mais-valias fiscais - alienação da participação na sociedade A........... S.A., invoca a Recorrente que, o prejuízo que a ora Recorrida teve com a alienação dos suprimentos não concorre para a formação da mais-valia;

16.ª Ora, a Recorrida adquiriu 8.99% do capital da sociedade A........... S.A. e realizou suprimentos no valor de € 4.563.310,13;

17.ª Posteriormente, a Recorrente e os demais accionistas da A.........., S.A., decidiram alienar as suas participações, tendo, para o efeito, celebrado um contrato-promessa de compra e venda de acções e de cessão de suprimentos (cf. doc. n°12 junto com a p.i.);

18.ª Deste modo, e em conjunto, os accionistas, entre os quais a ora Recorrida, venderam as suas participações e cederam os créditos por suprimentos que detinham na A........... S.A., determinando-se o valor destes últimos de acordo com o disposto na alínea w) da cláusula 1.ª do referido contrato;

19.ª Assim, de acordo com aquele critério, definido por acordo entre as partes, atribuiu-se aos suprimentos outrora constituídos pela Recorrida, no valor total de € 4.563.310,13, o valor de € 3.319.159,27. apurando-se, assim, uma perda no valor de € 1.244.150,87 conforme extracto da conta # 2549;

20.ª A Recorrida considerou esta perda incorrida com a cessão do crédito de suprimentos de € 1.244.150,87 como fiscalmente dedutível em sede do IRC;

21.ª Contrariamente ao pugnado pela Ilustre Representante da Fazenda Pública os acordos supra referidos não são negócios completamente distintos, ao invés e como bem julgou o Tribunal a quo são acordos não cindíveis, razão pela qual não podem ser relevados fiscalmente de forma diferente;

22.ª Adicionalmente, entende a Recorrente que os suprimentos efectuados pela Impugnante poderiam ser considerados como custo do exercício desde que se mostrasse indispensável à realização de proveitos;

23.ª Ora, conforme ficou amplamente demonstrado nos presentes autos, aquele custo é indispensável para a realização dos proveitos pela ora Recorrida, existindo, aliás, no caso sub judice uma relação de causalidade directa entre o custo incorrido pela ora Recorrente na cessão e o proveito da própria venda da participação social detida no capital social da sociedade A........... S.A., uma vez que aquela venda e, consequente realização dos proveitos, estava dependente da cessão dos créditos por suprimentos;

24.ª Pelo que, também com este fundamento, deverá improceder o presente recurso e manter-se a anulação da liquidação sub judice:

25.ª No que concerne à correcção relativa a ajudas de custo e compensação pela deslocação em viatura própria - ajudas de custo facturadas a clientes, entende a Recorrente que não tendo a Recorrida facturado discriminadamente aos clientes aqueles montantes não são dedutíveis fiscalmente, de acordo com o artigo 42°, n°1, alínea f) do Código do IRC, na redacção à data aplicável;

26.ª A ora Recorrida registou ajudas de custo pagas a funcionários no valor de € 1.968.780.80;

27.ª Não obstante a Recorrida dispor de todos os mapas de controlo legalmente exigidos, os quais lhe permitem um controlo obra a obra daqueles encargos de modo a viabilizar a repercussão do seu valor aos adquirentes dos respectivos imóveis, nas facturas emitidas aos clientes a Recorrida não efectuou qualquer referência expressa aos valores respeitantes àquelas ajudas de custo;

28.ª Ora, independentemente do juízo sobre procedimento adoptado pela Recorrida, refira-se que a administração tributária entendeu, através do Ofício-circulado n°40.676/1999, de 23 de Junho, que desde que as empresas possuam mapas com todos os elementos “(…) a facturação a emitir ao cliente poderá apresentar o preço global do serviço prestado, não sendo pois, necessário evidenciar os vários componentes que constituem o mesmo (...)":

29.ª De facto, a lei não impõe uma discriminação individualizada daquelas ajudas de custo, mas tão-somente, que as mesmas sejam facturadas a clientes, como sucedeu no caso vertente;

30.ª Em face do exposto, não resultando da lei a exigência da discriminação na facturação ao cliente das ajudas de custo, sendo, aliás este entendimento corroborado pela doutrina administrativa, deve considerar-se improcedente este fundamento do recurso e confirmar-se a sentença recorrida, nesta parte;

31.ª Importa, ainda, referir que, entendeu o Tribunal Recorrido que "Cremos então subsistir desde logo uma situação de dúvida de estarmos perante ajudas de custo, que será desfavorável à administração tributária e implica a anulação do acto tributário nesta parle, nos termos previsto no artigo 100° do CPPT." (cf. página 43 da sentença recorrida);

32.ª Não obstante a Recorrida ter demonstrado que os custos em que incorreu são indispensáveis à actividade e que foram facturados a clientes, ainda que se considerasse estar perante uma situação de dúvida, o que por mera cautela de patrocínio se equaciona, sem conceder, não poderia deixar de ser dado cumprimento ao disposto no artigo 100° do CPPT, conforme pugnado pelo Tribunal Recorrido, e, deste modo, determinada a anulação do acto tributário em crise, nesta parte;

33.ª Por sua vez, no que concerne à correcção relativa a custos não indispensáveis à actividade - custos referentes a rendas habitacionais, entende a Ilustre Representante da Fazenda Pública que a Recorrida não justificou tais despesas;

34.ª Com efeito, propugna a Ilustre Representante da Fazenda Pública que, uma vez que a ora Recorrida tem centros de controlo dos custos com as obras, nos quais se incluem as ajudas de custo, deveria ter sido disponibilizado à administração tributária a informação relativa aos trabalhadores que beneficiavam com o arrendamento dos referidos imóveis;

35.ª Ora, numa lógica de redução de custos, a Recorrida optou por arrendar imóveis destinados à utilização temporária e indiscriminada dos seus trabalhadores que, porque deslocados às respectivas obras, aí se alojavam;

36.ª Atento o disposto no artigo 23° do Código do IRC "Consideram-se gastos os que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para manutenção da fonte produtora (...)”,

37.ª De facto, o alojamento dos trabalhadores era indispensável à realização das obras desenvolvidas pela Recorrida, e, como tal, essencial à obtenção de proveitos pela mesma, nos termos daquele preceito legal e, como tal, dedutíveis fiscalmente;

38.ª Contrariamente ao propugnado pela Ilustre Representante da Fazenda Pública, a indispensabilidade do custo, para efeitos daquele preceito legal, não é prejudicada pelo facto da Recorrida não ter identificado quais os trabalhadores que trabalhadores que beneficiavam com o arrendamento dos referidos imóveis, pelo que estando demonstrada a indispensabilidade daquele custo, deve o mesmo ser relevado fiscalmente;

39.ª Nem se alegue para o efeito, como resulta do depoimento da técnica de inspecção S.........., que subjaz à presente correcção o facto de, ao não ter identificado os alegados "beneficiários" a Recorrida terá inviabilizado uma eventual correcção em sede de Imposto Sobre Rendimento das Pessoas Singulares uma vez que se estaria em presença de rendimento em espécie;

40.ª Pelo que, neste âmbito, bem andou o Tribunal a quo ao pugnar que no caso vertente as rendas devem ser consideradas como custos nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 23° do Código do IRC;

41.ª Razão pela qual deve a sentença recorrida ser mantida, julgando-se improcedente o recurso da Fazenda Pública, com as demais consequências legais.

Por todo o exposto, e o mais que o ilustrado juízo desse Venerando Tribunal suprirá, deve o presente recurso ser julgado improcedente, mantendo-se a douta sentença recorrida, assim se cumprindo com o DIREITO e a JUSTIÇA!»


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Foi dada vista ao MINISTÉRIO PÚBLICO e a Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer a fls. 875vº/876 dos autos, no qual, a final, se pronuncia no sentido da procedência do recurso interposto pela Fazenda Pública e na «manutenção do julgado na parte recorrida pela E........... S.A».


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Colhidos os vistos dos Exmos Desembargadores adjuntos, cumpre apreciar e decidir em conferência.


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II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Face às conclusões em cada um dos recursos interpostos as questões submetidas à nossa apreciação são as seguintes:

- Recurso interposto pela Fazenda Pública

(i) Erro de julgamento da matéria de facto;

(ii) se a sentença fez correcta interpretação e aplicação do artigo 43.º, nº 2, artigo 42.º, nº 1, alínea f) e artigo 23.º todos do CIRC.

- Recurso interposto pela Impugnante

(i) nulidade da sentença recorrida, em face do disposto no artigo 125.º do CPPT, e do artigo 668.º, n.º 1, alínea b) do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e) do CPPT;

(ii) se a sentença incorreu em erro de julgamento ao considerar que os encargos e descontos de letras não consubstanciam um crédito decorrente da actividade normal da empresa;

(iii) se a sentença fez correcta interpretação e aplicação do artigo 23.º do CIRC;

(iv) se a sentença recorrida fez errado julgamento quanto à sujeição ao regime de tributação autónoma.


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III. FUNDAMENTAÇÃO

A. DOS FACTOS

Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto e indicou-se a fundamentação respectiva que nos seguintes termos:

«A. Em cumprimento da Ordem de Serviço n.º 0I200600467, foi ordenada acção inspectiva referente ao exercício de 2003 da impugnante, de âmbito geral (fls. 418/425 do PAT apenso).

B. A inspecção culminou com a elaboração do relatório de fls. 418/425 do PAT apenso, datado de 16/11/2007 e que se dá aqui por integralmente reproduzido, juntamente com os respectivos doze anexos de fls. 426/447 do PAT apenso, e de onde se destaca o seguinte:

“O total de correcções ao nível do lucro tributável da sociedade E..........., SA ascende a € 4.296.951,98, conforme se passa a discriminar: (…)

1.3.1.1.3. Provisões não dedutíveis ou para além dos limites legais (art.s 34° e 35° do CIRC) € 1.687.243,37

Valor referente a provisões para créditos de cobrança duvidosa, não dedutíveis para efeitos fiscais, nos termos do disposto no artigo 34° n.º 1 alínea a), e no artigo 35° n.ºs 1 e 2, ambos do CIRC, relativos a:

A) Encargos com descontos de letras (ver 3.1.1.3.1.) € 72,132,39

B) Dívidas tituladas por letras-data de vencimento dos valores em dívida (ver 3.1.1.3.2.) € 1.348.240,96

C) Inexistência de provas da realização de diligências (ver 3.1.1.3.3.) € 3063,94

D) Provisões além dos limites legais (ver 3.1.1.3.4.) € 263,806,08

1.3.1.1.4. Despesas não documentadas (art. 42° n.º 1 alínea g) do CIRC) € 219.551,79

O sujeito passivo registou na conta 692 - Custos perdas extraordinárias - dívidas incobráveis, o custo de € 219,551,79, para o qual não apresentou documentos de suporte. Assim nos termos da alínea g) do nº 1 do art. 42° do CIRC este custo não é aceite fiscalmente, sendo de acrescer ao lucro tributável o valor de € 219,551,79 (ver 3.1.1.4).

1.3.1.1.5. Mais-valias fiscais (art. 43° do CIRC) € 1.357.353,40

No cálculo do apuramento das mais-valias fiscais referentes à alienação de participações sociais, o sujeito passivo considerou um valor de realização no total de € 20.366.747,76, quando deveria ter sido considerado o valor de realização total de € 21.724,101,16, correspondente ao valor constante dos contratos de alienação das participações nas sociedades S.........., S.A e A............ SA, pelo que apurou uma mais-valia fiscal inferior (€ 13.535 297,41) à devida (€ 14.892.650,81). Assim, nos termos do n.º 3 do art. 43° do CIRC é de acrescer o valor de € 1.357.353,40, que corresponde à diferença entre a mais-valia fiscal correcta, apurada nos termos do referido art 43° e o valor apurado pelo sujeito passivo no mapa 31 - Mapa das mais e menos valias fiscais - Investimentos financeiros (ver 3.1.1.5.)

1.3.1.1.6. Anulação do efeito do método da equivalência patrimonial (art.18° n.º 7 do CIRC) € 362.507,57

O sujeito passivo não acresceu ao lucro tributável o montante de € 400.239,91, relativo a perdas em empresas do grupo e associadas, e não deduziu o valor de € 37.732,34 referente a ganhos em empresas do grupo e associadas, em consequência da utilização do método de equivalência patrimonial, contrariando o disposto no n° 7 do art. 18° do CIRC

1.3.1.1.7. Ajudas de custo e compensação pela deslocação em viatura própria (art. 42.°, n.º1, al.f) do CIRC) € 509.850,38

Valor a acrescer ao lucro tributável, referente a: A) Ajudas de custo pagas aos órgãos sociais

O saldo da conta 6418 - Rem.orgãos sociais - Ajudas custo no montante de € 145.117,78, diz respeito ao pagamento de ajudas de custo aos órgãos sociais da empresa, sendo estas despesas suportadas com mapas de ajudas de custo, incorrectamente preenchidos, não permitindo verificar, nomeadamente, o motivo da deslocação, a natureza do serviço, as horas de inicio e regresso da deslocação e abono diário.

Assim este custo não é aceite fiscalmente nos termos da alínea f) do nº1 do art.42° do CIRC, sendo de acrescer o montante de € 116.094,22 (80% x € 145 117,78, dado que os restantes 20% já tinham sido acrescidos ao lucro tributável pelo sujeito passivo) (ver 3.1.1.7. A).

B) Ajudas de custo facturadas a clientes

O sujeito passivo registou nas contas 64281 - Rem.pess. - ajudas de custo e 64282 Rem.pess - ajudas de custo, o total de € 1.968.780,80, referente a ajudas de custo pagas a funcionários e que o sujeito passivo considerou como facturadas a clientes.

Foi solicitado à empresa para apresentar as facturas emitidas a clientes onde se discriminasse a totalidade das ajudas de custo no valor de € 1.968.780,80, não tendo no entanto apresentado esses documentos.

Desta forma é de acrescer o montante de € 393.756,16 (correspondente a 20% x € 1.968.780,80), nos termos da alínea f) do nº1 do art. 42° do CIRC, uma vez que as despesas com as ajudas de custo não foram facturadas a clientes, e visto que existiam mapas através dos quais é possível efectuar o controlo das deslocações a que se referem essas despesas (ver 3.1.1.7. S).

1.3.1.1.8. Custos não indispensáveis à actividade (art. 23° n.º 1 do CIRC) € 157.290,55

Na execução da contabilidade, a empresa efectuou lançamentos apoiados em documentos que não podem ser aceites como custo para efeitos fiscais, nos termos do n.º 1 do artigo 23.° do CIRC, por não serem comprovadamente indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto nem para a manutenção da fonte produtora, ou por não estarem adequadamente apoiados em documentos justificativos, contrariando o disposto na alínea a) do n.º 3 do art. 115° do CIRC, referentes a rendas habitacionais.

Não acresceu o valor de € 157.290,55 de rendas habitacionais, cujos beneficiários não foram identificados. Notificado o sujeito passivo para fornecer informação adicional, que justificasse o pagamento das rendas habitacionais, de forma a demonstrar a sua indispensabilidade para a realização dos proveitos, o mesmo não identificou os utilizadores/beneficiários dessas habitações, logo o custo não pode ser aceite fiscalmente nos termos do n.º 1 do art. 23° do CIRC (ver 3.1.1.8.). (…)

1.3.1.2 - CORRECÇÕES AO NÍVEL DO APURAMENTO DO CÁLCULO DO IMPOSTO

O total de correcções ao nível do cálculo do imposto da sociedade E..........., SA, ascende a € 109.849,18, conforme se passa a discriminar:

1.3.1.2.1 - Tributações autónomas - Despesas não documentadas (art. 81 ° n.º 1 do CIRC) € 109.775,90

No cálculo do imposto a pagar, o sujeito passivo não considerou, como deveria, de acordo com o n.º 1 do artigo 81.° do CIRC, o valor de € 109.775,90, correspondente à tributação autónoma à taxa de 50% (€ 219.551,79 x 50% = € 109.775,90) de despesas consideradas como não documentadas nos termos da alínea g) do nº 1 do artigo 42° do CIRC, referidas anteriormente no ponto 1.31.14. (ver 3.1.2.1). (…)

3 - DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS À MATÉRIA TRIBUTÁVEL

3.1 -IRC -Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas

3,1.1. - CORRECÇÕES AO NÍVEL DO LUCRO TRIBUTÁVEL

O total de correcções ao nível do lucro tributável, ascende a € 4.296.951,98, conforme se passa a discriminar:

3.1.1.1. Imobilizado - Amortizações não aceites como custo (art.s 30° n.º 1 e 33° n.º 1 aI. c) do CIRC) € 1.132,44

O sujeito passivo contabilizou na conta 662 - Amortizações do Exercício, o total de € 1.926.747,14, referente a reintegrações e amortizações de elementos do activo imobilizado corpóreo. (…)

3.1.1.3. Provisões não dedutíveis ou para além dos limites legais (art.s 34° e 35° do CIRC) € 1.687.243,37

O sujeito passivo contabilizou na conta 67 - Provisões do Exercício, provisões para cobrança duvidosa, o total de € 5.352.896,41 (ver Anexo 2 - folhas 1 e 2) sendo que o valor de € 1.687.243,37 (ver Anexo 2 - folhas 3 a 5) não é dedutível para efeitos fiscais nos termos dos artigos 34° e 35° do CIRC.

Da análise ao Mapa 30 - Mapa das Provisões, balancete analítico de antiguidade de saldos e outros elementos apresentados pelo sujeito passivo em resposta a solicitações de elementos/esclarecimentos e à notificação, verificámos as seguintes situações:

3.1.1.3.1. Provisões não aceites fiscalmente - Encargos com descontos de letras € 72.132.39

No reforço da provisão para créditos de cobrança duvidosa, o sujeito passivo considerou indevidamente o montante de € 72.132,39, correspondente a encargos com o saque/desconto de letras, relativamente aos quais a empresa emitiu notas de débito aos seus clientes (ver Anexo 2 – fls 6).

Considerando que os créditos referentes à liquidação de juros e encargos com o saque de letras não resultam da actividade normal da empresa, as provisões constituídas sobre os mesmos não são dedutíveis para efeitos fiscais nos termos da alínea a) do n.º 1 do art. 34° do CIRC.

3.1.1.3.2. Provisões não aceites fiscalmente - Dívidas tituladas por letras - data de vencimento dos valores em dívida € 1.348.240,96

O sujeito passivo considerou indevidamente como custo fiscal o total de € 1.348.240,96 (ver Anexo 2 - fls 3 a 5) referente a provisões para clientes de cobrança duvidosa, não dedutíveis para efeitos fiscais nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 35° do CIRC, relativamente a valores em dívida de clientes, em que a empresa teve em conta, para cálculo da provisão a constituir, a data de vencimento da factura e não a data de vencimento das letras que titulavam essas dívidas.

A conversão de um crédito não titulado em titulado, no caso em concreto, através de letras, implica que se deixa de considerar a data de vencimento anterior (que seria a data de vencimento das facturas que deram origem ao crédito sobre os clientes), para se aceitar uma nova data de vencimento, que corresponderá à data de vencimento das letras que titulam a dívida.

Ao reformar constantemente as letras, o prazo de vencimento das mesmas é automaticamente prorrogado, para a data de vencimento da nova letra, havendo assim um acordo explícito entre o credor (neste caso a E..........) e os devedores (os clientes em causa), que estabelece um novo prazo para vencimento dos créditos em dívida, não estando, consequentemente, os créditos em mora.

Assim sendo, a substituição de uma data de vencimento por outra posterior, alteração essa que tem o acordo do credor, o crédito só se poderá considerar em mora a partir da data em que seja ultrapassada a última data de vencimento acordada, sem que tenha havido o estabelecimento de nova data e sem que o devedor pague a sua dívida, que acontecerá, quando o credor não aceite a nova reforma das letras que titulam a mesma.

Deste modo, para as situações em apreço, atendendo que a contagem do tempo em que o crédito está em mora efectuar-se-á apenas a partir da data de vencimento das letras, verifica-se que em 31/12/2003, a mora era inferior a 6 meses, pelo que o valor de € 1.348.240,96, não é de aceitar como custo fiscal nos termos da alínea c) do n. 1 do artigo 35° do CIRC.

3.1.1.3.3. Provisões não aceites fiscalmente - Inexistência de provas da realização de diligências € 3.063,94

O sujeito passivo considerou indevidamente como custo fiscal o total de € 3.063,94 (ver Anexo 2 - fls 3 a 5) referente a provisões para clientes de cobrança duvidosa, não dedutíveis para efeitos fiscais nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 35° do CIRC, uma vez que não comprovou terem sido efectuadas diligências para o recebimento dos créditos sobre os quais constituiu a provisão. O sujeito passivo foi notificado para apresentar comprovativos das diligências por si efectuadas, no exercício de 2003, para o recebimento dos créditos em dívida, não tendo, contudo, apresentado os mesmos. Consequentemente, é de acrescer ao lucro tributável o montante de € 3.063,94, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 35° do CIRC, conjugada com a alínea a) do n.º 1 do artigo 34° do mesmo código.

3.1.1.3.4. Provisões não aceites fiscalmente - Provisões além dos limites legais € 263.806,08

O sujeito passivo constituiu provisões por um valor superior à percentagem aceite fiscalmente, no total de € 263.806,08, relativas a créditos sobre clientes, por ter considerado um período de mora incorrecto (ver Anexo 2 - folhas 3 a 5).

Da análise dos elementos entregues pelo sujeito passivo relativamente à constituição de provisões para clientes de cobrança duvidosa, constatou-se que:

A) Alguns desses créditos, relativos a dois clientes, se encontravam em mora por prazos entre 6 a 12 meses, pelo que a provisão só poderia ser constituída em 25%, conforme alínea a) do n. 2 do artigo 35° do CIRC apesar da empresa ter constituído provisão em 50% do valor em dívida (ver Anexo 2 - fls 7 a 9), pelo que a diferença no montante de € 51.931,08 (ver Anexo 2 - fls 3 a 5) não é aceite fiscalmente;

C) Foi constituída provisão por 25% do valor em dívida referente à factura n.º 10500105, emitida em nome do cliente GTSL, cujo prazo de vencimento era Julho de 2003 (ver Anexo 2 - fls 10), pelo que a 31/12/2003, não se encontrava em mora há mais de 6 meses, contrariando o disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 35° do CIRC, que estipula que só pode ser constituída provisão para os créditos que estejam em mora há mais de 6 meses, desde a data do respectivo vencimento, e existam provas de terem sido efectuadas diligências para o seu recebimento. Consequentemente. a provisão constituída no montante de € 211.875,00 não é de aceitar como custo fiscal, nos termos da referida alínea c) do n.? 1 do artigo 35° do CIRC. uma vez que a dívida além de estar em mora há menos de 6 meses, a 31/12/2003, não existem comprovativos de diligências efectuadas pelo sujeito passivo, para cobrança do valor em dívida.

Assim sendo, o excesso entre a provisão constituída pelo sujeito passivo e o valor aceite fiscalmente nos termos do disposto na alínea c) do n.º 1, e no disposto no n.º 2, ambos do artigo 35° do CIRC, no total de € 263.806,08 (ver Anexo 2 - fls.3 a 5), não é dedutível para efeitos fiscais, pelo que é de acrescer ao lucro tributável, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 34° do CIRC.

3.1.1.4. Despesas não documentadas (art. 42° n.º 1 alínea g) do CIRC) € 219.551,79

O sujeito passivo registou na conta 692 - Custos perdas extraordinárias - dívidas incobráveis, o montante de € 219.551,79. Notificado a apresentar os documentos de suporte do custo considerado pela empresa, bem como a justificar a dedutibilidade fiscal do mesmo (ver anexo 3 - folha 1 ), o sujeito passivo em resposta à notificação (ver anexo 3 - folha 7 ) referiu que se tratou de um custo com actividades de prospecção de negócios em Angola que a E.......... desenvolveu antes de 2003, e que dada a instabilidade política e militar que ocorreu no território, foram obrigados a descontinuar a actividade, não tendo por esse facto um retorno daquele investimento, não apresentando no entanto, nenhum documento de suporte que justificasse o referido custo.

Assim, e dado que apenas foi apresentado pela empresa o movimento contabilístico relativo a este custo e nenhum documento de suporte, o mesmo, no montante de € 219.551,79 não é aceite fiscalmente, de acordo com a alínea g) do nº1 do art. 42° do CIRC.

3.1.1.5. Mais-valias fiscais (art. 43° do CIRC) € 1.357.353,40

Da análise ao mapa modelo 31 - mapa das mais-valias e menos-valias fiscais, relativamente ao apuramento das mais ou menos valias fiscais em resultado da alienação de participações sociais detidas pelo sujeito passivo, constataram-se as seguintes situações:

A) alienação da participação na sociedade S..........

O sujeito passivo celebrou um contrato de penhor de títulos mobiliários com a sociedade S.........., S.A. em 18 de Dezembro de 2002, no qual ficou estabelecido que o primeiro recebia um adiantamento no total de € 6.018.090,00 por parte do segundo. Como garantia da devolução do adiantamento o sujeito passivo dava de penhor à sociedade S.......... 448.966 acções que detinha no capital da própria S.........., no valor de € 6.018.090,00 correspondente ao valor total do adiantamento (ver anexo 4 folhas 1 e 2 )

Findo o prazo de devolução do adiantamento, por parte do sujeito passivo, a 30 de Outubro de 2003, foi executado o penhor em 2 de Novembro de 2003. Conforme previsto no contrato, a carta executória do penhor estabelece que as acções dadas em penhor têm o valor de € 6.018.090,00 (ver anexo 4 - folhas 3 e 4)

No apuramento da mais valia fiscal resultante da alienação desta participação que a empresa detinha na S.........., o sujeito passivo considerou como valor de realização, inscrito neste campo do mapa modelo 31 - mapa das mais-valias e menos-valias fiscais, o total de € 5.904.887 47, apurando uma mais valia fiscal de € 4.569.213,62 (ver anexo 4 - folha 5).

De acordo com o estipulado no n.° 2 do art. 43° do CIRC, as mais-valias e as menos valias são dadas pela diferença entre o valor de realização, liquido dos encargos que lhe sejam inerentes, e o valor de aquisição (deduzido das reintegrações ou amortizações praticadas), sendo que nos termos do n.º 1 do art. 44° do mesmo código o valor de aquisição será actualizado mediante aplicação dos coeficientes de desvalorização da moeda publicados anualmente em Portaria. No nº 3 do art. 43° do CIRC vem definido o conceito de valor de realização. e de uma forma geral considera-se que este é o valor de mercado ou ainda a contra prestação atribuída ao elemento alienado. De acordo com esta caracterização, no caso em análise considera-se valor de realização o valor de € 6.018.090,00 atribuído em contrato às acções dadas em penhor, e não o valor de € 5.904.887,47 utilizado no Mapa 31 indevidamente pelo sujeito passivo para apuramento da mais-valia fiscal relativa à alienação desta participação social.

Assim sendo é de acrescer o valor de € 113.202,53, que corresponde à diferença entre a mais valia fiscal indicada pelo sujeito passivo no mapa de mais-valias e menos-valias fiscais (€ 4.569.213,62), e aquela apurada pelos serviços com o valor de realização de € 6.018.090,00, correspondente a € 4.682.416,15, nos termos do preceito legal acima referido.

B) Alienação da participação na sociedade A..........., S.A

O sujeito passivo alienou a participação que detinha na sociedade A..........., SA pelo valor total de € 15.706.011,16 às sociedades S.........., SA (€ 3.884.792,17), M.........., S..A (€ 3.884.800,37), C.........., S.A. (€ 3.968.209,31) e N.........., S.A. (€ 3.968.209,31), conforme contrato assinado pelas partes em 27 de Dezembro de 2002 (ver anexo 4 - folhas 6 a 8). No apuramento da mais valia fiscal relativo à alienação desta participação que a empresa detinha na A..........., SA, o sujeito passivo considerou como valor de realização, inscrito neste campo do mapa modelo 31 - mapa das mais-valias e menos valias fiscais. o total de € 14.461,860,29, apurando uma mais valia fiscal de € 8.966.083,79 (ver anexo 4 - folha 9).

De acordo com o estipulado no n.º 2 do art. 43° do CIRC, as mais valias e as menos valias são dadas pela diferença entre o valor de realização, liquido dos encargos que lhe sejam inerentes, e o valor de aquisição (deduzido das reintegrações ou amortizações praticadas), sendo que nos termos do n.º 1 do art. 44° do mesmo código, o valor de aquisição será actualizado mediante aplicação dos coeficientes de desvalorização da moeda publicados anualmente em Portaria. Tal como referido, no nº3 do art. 43° do CIRC (que define o que é considerado valor de realização), na sua alínea f), o valor de realização corresponde ao valor da respectiva contraprestação atribuída ao elemento alienado. De acordo com esta caracterização, no caso em análise considera-se valor de realização, o total de € 15.706.011,16 que corresponde ao somatório dos valores de venda às quatro sociedades compradoras.

Assim sendo é de acrescer o valor de € 1.244.150,87, que corresponde à diferença entre a mais valia fiscal apurada pelo sujeito passivo no mapa de mais-valias e menos-valias fiscais (€ 8.966.083,79), e aquela apurada pelos serviços com o valor de realização de € 15.706.011,16, correspondente a € 10.210.234,66, nos termos do preceito legal acima referido. Tendo em consideração os factos acima expostos é de acrescer ao lucro tributável o total de € 1.357.353,40 (€ 113.202,53 + € 1.244.150,87), respeitante à diferença das mais valias fiscais apuradas nos termos do art. 43° do CIRC e as mais-valias fiscais consideradas pelo sujeito passivo, relativamente à alienação das suas participações financeiras nas sociedades S.........., S.A e A..........., SA.

Pela utilização do mesmo método, contabilizou igualmente na conta 7821 - Ganhos em empresas do grupo e associadas, o valor de € 37.732,34.

De acordo com o art. 18° n.º 7 do CIRC, os proveitos ou ganhos e os custos ou perdas, relevados na contabilidade derivados da utilização do método de equivalência patrimonial, não concorrem para a determinação do lucro tributável, pelo que devem ser considerados como proveitos ou ganhos, os lucros distribuídos no exercício em que se verifica o direito aos mesmos. Assim, é de acrescer ao lucro tributável o valor de € 400.239,91, por não ser aceite como custo para efeitos fiscais nos termos daquele normativo, e de deduzir ao lucro tributável o valor de € 37.732,34, que da mesma forma não é considerado como proveito para efeitos fiscais. (…)

B) Ajudas de custo facturadas a clientes

O sujeito passivo registou nas contas 64281 - Rem.pess - ajudas de custo e 64282 _ Rern.pess - ajudas de custo o total de € 1.968.780,80, referente a despesas com ajudas de custo pagas a funcionários, relativamente às quais a empresa apresentou os respectivos mapas justificativos das deslocações e que o sujeito passivo considerou como facturadas a clientes. A empresa foi solicitada a apresentar as facturas emitidas a clientes onde estivessem discriminadas a totalidade das ajudas de custo no valor de € 1968.780,80. Em resposta à referida solicitação, vem o mesmo esclarecer que "( .. ) a empresa não menciona nas facturas emitidas a clientes, qualquer referência às ajudas de custo atribuídas aos trabalhadores envolvidos na execução dos contratos de empreitada." (Anexo 6 - folha 1). Isto implica que não é efectuada, no próprio documento emitido pela empresa ao cliente, menção da inclusão das ajudas de custo (deveria haver inclusão explícita do montante das ajudas de custo) no preço do serviço, contrariando assim o disposto na alínea f) do n.º 1 do artigo 42° do CIRC. Assim sendo, e tendo em conta que o sujeito passivo não apresentou documentos onde conste a facturação discriminada das ajudas de custo facturadas a clientes, o valor de ajudas de custo indicado como "facturado" a clientes não poderá ser fiscalmente dedutível para efeito de determinação do lucro tributável.

Assim é de acrescer ao lucro tributável o valor de € 393.756,16 correspondente a 20% do total do valor de ajudas de custo não facturadas a clientes, nos termos da primeira parte da alínea f) do n.1 do art. 42° do CIRC.

3.1.1.8. Custos não indispensáveis à actividade (art. 23° n.º 1 alínea a) do CIRC) € 157.290,55

Na execução da contabilidade, a empresa efectuou lançamentos apoiados em documentos que não podem ser aceites como custo para efeitos fiscais, nos termos do n.º 1 do artigo 23.° do CIRC, por não serem comprovadamente indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto nem para a manutenção da fonte produtora, ou por não estarem adequadamente apoiados em documentos justificativos, contrariando o disposto na alínea a) do n.º 3 do art. 115° do CIRC referentes a rendas habitacionais. O sujeito passivo contabilizou nas contas 622193 Fornecimentos e Serviços Externos Rendas G/R e 622194 - Fornecimentos e Serviços Externos - Rendas S/R o total de € 157.290,55, com base nos documentos constantes no Anexo 7 folhas 1 a 4. Foi o mesmo notificado para justificar quem foram os beneficiários dos alugueres que a empresa suportou como custo, no sentido de comprovar a indispensabilidade do mesmo para a obtenção dos proveitos, conforme disposto no n.? 1 do artigo 23° do GIRC (ver anexo 3 - folha 2). Em resposta à notificação a empresa informou que se tratam de imóveis destinados à utilização dos seus funcionários, não identificando os mesmos, nem apresentando qualquer justificação da necessidade do custo.

Face ao acima exposto, é de acrescer ao lucro tributável o valor de € 157.290,55 respeitante a custos relativos a rendas habitacionais utilizadas por funcionários da empresa não identificados pela mesma, não aceites fiscalmente nos termos do n.º 1 do art. 23.º do CIRC, por não serem comprovadamente indispensáveis para a realização de proveitos ou ganhos sujeitos a imposto, nem para a manutenção da fonte produtora. (…)

3,1.1.10. Ajustamento à dedução de prejuízos € 621.825,38

Em resultado das correcções ao lucro tributável do exercício de 2002 e consequente ajustamento à dedução dos prejuízos fiscais, conforme dispõe o n ° 4 do art. 47° do CIRC. o sujeito passivo só poderia deduzir o valor de € 47.380,35 de prejuízos fiscais, no exercício de 2003, nos termos do n.º 1 do art. 47° do mesmo código. Consequentemente. e considerando que a empresa. para apuramento da matéria colectável do exercício de 2003, deduziu o montante de € 669.205,73, ter-se-á que fazer uma correcção a favor do Estado de € 621.825,38, conforme estipulado no art. 47° do CIRC.

3.1.2 - CORRECÇÕES AO NÍVEL DO CÁLCULO DO IMPOSTO

O total de correcções ao nível do cálculo do imposto, ascende a € 109.849,18, conforme se passa a discriminar

3.1.2.1 - Tributações autónomas - Despesas não documentadas (n.º 1 do art. 81° do CIRC) € 109.775,90

No cálculo do imposto a pagar, o sujeito passivo não considerou, como deveria, de acordo com o n.º 1 do artigo 81.° do CIRC, o valor de € 109.775,90, correspondente à tributação autónoma à taxa de 50% (€ 219.551,79 x 50% = €109775,90) de despesas consideradas como não documentadas nos termos da alínea g) do n. 1 do artigo 42° do CIRC, referidas anteriormente no ponto 31.1.4.

Ponto 3.1.1.1. - Imobilizado - Amortizações não aceites como custo (art.s 30° n.ºs 1,3 e 6 e 33° n. 1 al. c) do CIRC)

Foi proposta a correcção no total de € 25.543,90 relativa a reintegrações e amortizações não aceite fiscalmente nos termos do art.30º n.os 1, 3 e 6 e art. 33° n. 1 al. c), ambos do CIRC. No direito de audição o sujeito passivo apresentou elementos, nomeadamente fichas de imobilizado dos elementos relativos aos quais tinha sido proposta a correcção, que permitiram verificar o cálculo das reintegrações de acordo com o previsto na legislação acima citada, relativamente ao total de € 24.411,46. Face ao acima exposto, do total de € 25.543,90 da correcção inicialmente proposta é de retirar o montante de € 24.41…, e manter os restantes € 1,132,44.

Ponto 3.1.1.3,1. - Provisões não dedutíveis - Encargos com desconto de letras

Neste ponto do projecto de relatório foi referido que a empresa considerou indevidamente, no reforço da provisão para créditos de cobrança duvidosa, o montante de € 72.132,39 correspondente a encargos com saque/desconto de letras, relativamente aos quais foram emitidas notas de débito aos clientes, por se entender que os mesmos não resultam da actividade normal da empresa, pelo que as provisões não seriam dedutíveis para efeitos fiscais, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 34° do CIRC. A empresa não concorda com a correcção proposta, apresentando, entre outros, os seguintes argumentos: - "as despesas em apreço são acessórias de dívidas de clientes (...) as letras titulam dívidas (já existentes) dos respectivos clientes, e como tal, tratam-se de dívidas decorrentes do desenvolvimento normal da actividade - os créditos sobre clientes, relativos a encargos com letras, porque se tratam de créditos acessórios dos créditos principais, decorrentes da actividade normal, devem seguir o regime fiscal do crédito principal (…)

Ponto 3.1.1.3.2. - Provisões não dedutíveis - Dívidas tituladas por letras - data de vencimento dos valores em dívida

Em projecto de correcções referiu-se que o sujeito passivo considerou indevidamente como custo fiscal, o total de € 1.348.240,96 relativo a provisões para clientes de cobrança duvidosa, não dedutíveis para efeitos fiscais nos termos da alínea c) do n o 1 do artigo 35.º do CIRC, respeitante a valores em dívida de clientes em que o sujeito passivo teve em conta para o cálculo da provisão a constituir, a data de vencimento da factura e não a data de vencimento das letras que titulavam essas dívidas.

O sujeito passivo vem alegar que: " Importa antes de mais referir que as letras de câmbio se caracterizam pela sua "abstracção" relativamente à relação subjacente (…). a causa da dívida - o negócio celebrado entre as duas partes, sacador e sacado na relação cenuter - é autónoma do negócio cambiário. (…) Daí também que o risco de incobrabilidade do crédito perdure enquanto a divida subjacente não se encontrar prescrita.";

- "Na realidade, não foi estipulado com os clientes devedores da Recorrente nenhum acordo no sentido da extinção da relação extra-cartular às letras de câmbio em apreço, nem da dilação da mora do crédito subjacente em consequência da reforma das mesmas, tendo persistido a mora relativamente às facturas emitidas. ";

.: Com o saque de letras o que sucede é que, para além do vencimento do crédito da relação subjacente, passa a existir simultaneamente um outro vencimento ("autónomo') do titulo de crédito. Deste modo, sendo estes dois prazos de vencimentos autónomos, o facto de um deles ser dilatado ou prorrogado não implica necessariamente que o outro também o seja. Por essa razão se afirma que a "operação de reforma de uma letra nenhuma influência tem na relação subjacente" uma vez que a mora da relação subjacente se mantém intacta" (…)

Consequentemente, a letra titula o crédito (valor em dívida pelo devedor) o que implica, essencialmente, a passagem de um crédito não titulado para um crédito titulado. Assim sendo, deixa de ser considerada a data de vencimento anterior (do crédito não titulado) para se considerar a data de vencimento do crédito titulado, ou seja, a data de vencimento da letra. Se as letras forem consecutivamente reformadas, a sua data de vencimento é prorrogada, pois corresponderá à data de vencimento da nova letra. O crédito só passará a estar em mora, quando a data de vencimento da ultima letra aceite pela empresa acabar, sem que a letra tenha sido paga pelo devedor e não haja lugar a nova reforma.

Assim sendo, face ao exposto, a correcção proposta em direito de audição é de manter-se.

Quanto à pretensão da empresa de que, caso a projectada correcção se mantenha, então seja efectuado o devido ajustamento favorável ao sujeito passivo, ao lucro tributável do exercício de 2005, no montante de € 162.018,77, relativo ao cliente A.........., por redução de provisões tributadas em exercícios anteriores, cabe-nos referir que o mesmo só poderá ser concretizado em sede de IRC quando o acto tributário de liquidação adicional referente ao exercício de 2003 tiver adquirido a estabilidade necessária, e também depois de ter sido efectivamente comprovada a efectiva contabilização em proveitos da redução da provisão referida no exercício em causa.

Ponto 3.1.1.3.4. - Provisões além dos limites legais

Mantém-se a correcção proposta em projecto de relatório, no montante de € 263.806,08, referente à constituição de provisões em valor superior à percentagem aceite fiscalmente conforme disposto no artigo 35° n.º 3 do CIRC, -relativamente aos clientes Z….; C.........., e G………., uma vez que sujeito passivo não vem contestar a mesma, mas apenas referir que as provisões indicadas foram em parte, num total de € 51.931,08, repostas em exercícios posteriores (nomeadamente € 9.221,94 respeitantes ao cliente S…………., no exercício de 2004, e € 42.709,14 relativos ao cliente Z….., no exercício de 2005), pelo que a manter-se as correcções propostas, devem os proveitos resultantes das reposições daquelas provisões ser deduzidos no exercício em que as mesmas se verifiquem.

Como referido anteriormente, qualquer ajustamento ao lucro tributável de exercícios posteriores a 2003, favorável ao sujeito passivo, relativo a redução de provisões tributadas no exercício a que diz respeito o presente relatório, só poderá ser efectuado quando a liquidação do imposto referente às correcções propostas ao exercício de 2003, tiver tomado a respectiva estabilidade e seja confirmada a contabilização dos referidos proveitos nos anos respectivos.

Ponto 3.1.1.5. - Mais-valias fiscais (art, 43° do CIRC)

A) Alienação da participação na sociedade S..........

Neste ponto do projecto de relatório foi proposta a correcção no valor de € 113.202,53, referente à diferença no apuramento da mais valia fiscal, da alienação da participação que a empresa detinha na S.........., dado que o sujeito passivo considerou como valor de realização o montante de € 5.904.887,47 em vez de € 6.018.090,00, conforme previsto no contrato de alienação, de acordo com o n.º 3 do art.º 43° do CIRC. O sujeito passivo no exercício do direito de audição vem esclarecer que a diferença apurada no valor de € 113.202,53 diz respeito "( ... ) à assunção de um saldo devedor daquela entidade (S..........), reflectido na conta # 26(..,)" e ainda "( ... ) o penhor foi executado após acordo entre as partes relativamente à execução da obra acima referida e à regularização das dividas àquela data existentes ( .. )"

De acordo com o contrato de penhor das acções, o valor de realização, definido nos termos do n.º 3 do art° 43° do CIRC, é de € 6.018.090,00, sendo este o valor que deve ser considerado no apuramento da mais valia fiscal. Neste caso a diferença no valor € 113.202,53, conforme o próprio sujeito passivo afirma, diz respeito a uma regularização de saldo da conta corrente da sociedade alienada, não aceite como custo fiscal, por não se enquadrar no artigo 23° do CIRC.

Face ao exposto, e dado que o sujeito passivo não apresentou novos elementos, é de manter a correcção proposta no valor de € 113.202,53

B) Alienação da participação na sociedade A..........., S.A

O sujeito passivo alienou a participação que detinha na sociedade A..........., SA pelo valor de realização de € 15.706.011,16. conforme estipulado no contrato de venda. No entanto, no apuramento da mais valia fiscal o mesmo considerou o valor de realização de € 14.461.860,29

No exercício do direito de audição o sujeito passivo vem justificar a diferença no montante de € 1.244.150,87 alegando que "Acontece que a Respondente já efectuou suprimentos na sociedade identificada num valor total de € 4.563.310,13 (conforme extrato da conta # 2549), tendo contudo apenas recebido como preço pela respectiva cessão, de acordo com o contrato promessa de compra e venda de acções e cessão de suprimentos, o montante de € 3.319.159,27 ( ... ). Assim, apurou-se uma perda na cessão dos suprimentos de € 1.244.150,87, ( ... )". Vem ainda na sua alegação demonstrar a fórmula de cálculo do valor a receber dos suprimentos no montante de € 3.319.159.27

Relativamente à argumentação apresentada, importa referir que o valor de € 1.244.150,87 diz respeito à diferença entre o total de suprimentos que haviam sido registados na conta 2549 - ACC.O.Emp.Part.üut.Operações (€ 4563310,13) e o valor estipulado pelas partes para cedência dos suprimentos no total de € 3.319.159.27, conforme previsto no contrato de venda das acções e de cessão de suprimentos.

Ora pelo facto de a empresa ter estipulado ceder o total dos suprimentos, que detinha na sociedade alienada, pelo montante de € 3.319.159,27, valor esse inferior aquele pelo qual estavam contabilizados (€ 4.563.310,13), não implica a aceitação como custo fiscal, antes assumindo uma liberalidade da empresa à qual a Administração Fiscal é alheia.

Face ao exposto é de manter a correcção no montante de € 1 244.150,87

Ponto 3.1.1.7. - Ajudas de Custo e compensação pela deslocação em viatura própria - 8) Ajudas de Custo facturadas a clientes

Relativamente a este ponto, vem o sujeito passivo alegar que:

.:" (...) as ajudas de custo pagas a funcionários ( .. ) são efectivamente debitadas aos seus clientes. Todavia, tal ocorre de forma implícita, sendo que os serviços prestados são facturados na globalidade (…) ";

- No ramo da construção civil é prática que as empresas não discriminem as ajudas de custo, tal como todos os custos suportados com determinada obra ( ) "

- "(...) os custos incorridos são progressivamente reflectidos nos centros de custo das obras em curso e incluídos no valor facturado ao cliente (…)",

- "(…) sendo prática no ramo da construção civil o cumprimento do procedimento adoptado pela Respondente na facturação global dos seus clientes, devem os custos em apreço ser considerados incluídos nos valores facturados e, consequentemente ser desconsiderada a correcção proposta." Importa salientar que a letra da lei exige dois requisitos para que as despesas com ajudas de custo sejam fiscalmente dedutíveis, a saber, que essas ajudas de custo sejam facturadas aos clientes e que a empresa possua, por cada pagamento efectuado, um mapa através do qual seja possível efectuar o contraio das deslocações a que se referem aquelas despesas. No caso em concreto, apesar da empresa possuir os mapas através dos quais seja possível efectuar o contrário das deslocações, ela não incluiu nas suas facturas emitidas aos clientes a menção explícita dos valores respeitantes a ajudas de custo, contrariando assim o disposto na redacção da alínea f) do n.º 1 do artigo 42° do CIRC, conforme referido em projecto de relatório.

A empresa alega que as ajudas de custo estão incluídas implicitamente na factura, pois estão incluídas no preço global facturado ao cliente, tal como é prática entre as empresas do ramo da construção civil, uma vez que todos os custos incorridos (incluindo as despesas com ajudas de custo) são progressivamente reflectidos nos centros de custo das obras em curso e incluídos no valor facturado ao cliente.

Independentemente da alegação do sujeito passivo de que o procedimento adoptado pela empresa se enquadrar no que é supostamente a prática entre as empresas do ramo da construção civil, convém salientar que, existindo na lei uma norma que estabelece à partida que as ajudas de custo sejam facturadas aos clientes (sendo que, de acordo com o Dicionário Universal de Língua Portuguesa da Texto Editora, facturar se entende por mencionar em factura) para que as mesmas sejam fiscalmente dedutíveis, não pode o sujeito passivo vir pretender que lhe seja considerado um tratamento fiscal diferente do que está estipulado na lei.

Consequentemente, é de manter a correcção proposta em projecto de relatório, no total de € 393.756,16 tendo em conta o acima exposto.

Ponto 3.1.1.8. - Custos não indispensáveis à actividade (art. 23° n.º 1 alínea a) do CIRC)

A) Rendas habitacionais

No ponto 31 1 8, alínea A do projecto de relatório efectuou-se a correcção no valor de € 157 290,55 relativa a rendas habitacionais, pagas pelo sujeito passivo, não aceites fiscalmente nos termos do n.º 1 do artigo 23° do CIRC.

O sujeito passivo contabilizou nas contas 622193 Fornecimentos e Serviços Externos Rendas C/R e 622194, Fornecimentos e Serviços Externos - Rendas S/R o valor de € 157.290,55 relativo a rendas que o sujeito passivo identificou, no direito de audição sobre o Projecto de Relatório de Inspecção Tributária, como "( ... ) são rendas de imóveis destinados à utilização temporária e indiscriminada dos seus trabalhadores que, porque deslocados às respectivas obras, aí se alojaram.( ... )" Foi o sujeito passivo notificado em 22 de Outubro de 2007, para justificar quem foram os beneficiários dos alugueres destas habitações, que serviram de dormitórios de pessoal, e que o mesmo suportou como custo, a fim de se comprovar a indispensabilidade deste custo para a obtenção dos proveitos. Não foi apresentada pelo sujeito passivo, nem na resposta a esta notificação nem no exercício do direito de audição sobre o Projecto de Relatório de Inspecção Tributária, nenhuma justificação para a necessidade do custo, limitando-se o mesmo a informar que as habitações se destinam à utilização de funcionários temporariamente afectos a obras, não tendo sido contudo identificados os mesmos, acrescentando ainda na resposta ao direito de audição que "(.,) tal demonstração (de indispensabilidade do custo) se afigura desnecessária porquanto, como é evidente, os imóveis arrendados encontravam-se exclusivamente afectos à actividade da Respondente." Desta forma, como exposto anteriormente, e dado que o sujeito passivo não apresentou elementos nem durante o procedimento inspectivo, nem durante o exercício do direito de audição, é de manter a correcção no total de € 157.290,55, relativo ao custo com rendas habitacionais, não aceite fiscalmente nos termos do n° 1 do artigo 23° do CIRC, uma vez que continua a não ser possível à Administração Fiscal saber quem foram os utilizadores das habitações que originaram as rendas contabilizadas como custo, e assim avaliar a indispensabilidade desse custo para a formação dos proveitos.

B) Valores pagos a titulo de Quotizações

No projecto de relatório foi proposta a correcção ao lucro tributável do total de € 2.793,00, relativo a valores pagos e registados como quotizações, para os quais o sujeito passivo não apresentou os respectivos documentos, por não se enquadrarem no n° 1 do art. 41 ° do CIRC, e por não serem indispensáveis para a manutenção da fonte produtora, nos termos do n. 1 do art. 23.° do mesmo código.

No exercício do direito de audição, o sujeito passivo, apresentou os documentos de suporte de pagamento de quotizações a uma entidade empresarial no total de € 2.793,00, pelo que é de retirar a correcção proposta” (Doc. 2 da PI e fls. 418/447 do PAT apenso).

C. No dia 16/11/2007, o Director de Serviços de Inspecção Tributária da Direcção-Geral dos Impostos (DGCI) proferiu o despacho que consta de fls. 109, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, concordando com o teor do relatório da inspecção tributária (fls. 109).

D. Após elaboração do documento de correcção (DCU), no dia 21/11/2007 foram emitidas a demonstração de liquidação de IRC do exercício de 2003 com o n.º .........., a demonstração de liquidação dos respectivos juros compensatórios com o n.º .........., e a demonstração de acerto de contas n.º .........., contendo a compensação n.º .........., donde resultou o valor a pagar pela impugnante de € 1.861.246,40, com data limite de pagamento no dia 31/12/2007 (fls. 191/193).

E. No dia 14/02/2008, a impugnante procedeu ao pagamento do valor de € 639.358,21, por referência ao valor liquidado e indicado no ponto D (fls. 195).

F. No cálculo da mais-valia apurada na alienação de participações sociais de que era titular na sociedade “S........... S.A.”, a impugnante abateu o montante de € 133.202.53, invocando acerto de contas relativamente a obras realizadas em anos anteriores respeitantes ao Consórcio do Alto do Lumiar (CAL) constituído entre a S.........., a impugnante, a E…… e a S.........., no âmbito do qual a S.......... se constituiu devedora do montante de € 622.849.63 (Docs. 9 e 10 da PI).

G. Nas negociações com a S.......... para constituição de um outro consórcio para construção de um empreendimento designado por "Colina de S. Gonçalo", concluídas em 18/12/2002, a impugnante renunciou a qualquer crédito anterior de que fosse titular sobre a S.......... (Docs. 9 e 10 da PI).

H. No valor de realização decorrente da alienação da participação detida na sociedade “A........... -………. S.A.”, a impugnante declarou o montante de € 14.461.860.29, por ter procedido a uma cessão de crédito de suprimentos no valor de € 1.244.150.87 (Doc. 12 da PI).

I. A Impugnante apresentou os mapas de controlo relativos às ajudas de custo pagas a funcionários no valor de € 1.968.780.80 (Doc. 2 da PI).

J. Os montantes relativos a estas ajudas de custo foram relevados nos valores totais a orçamentar e nos débitos efectuados aos clientes, mas não foram discriminadas na respectiva facturação, dada a sua materialidade e o respectivo custo administrativo.

K. No exercício de 2003, a impugnante dispendeu o valor de € 157.290,55 em rendas habitacionais, relativas a imóveis destinados à utilização temporária dos seus trabalhadores deslocados em obras fora dos seus locais de residência.

Factos Não Provados

Não se provaram quaisquer outros factos, com relevância para a decisão da causa.

Motivação da decisão de facto

A decisão da matéria de facto quanto aos pontos A a I efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório, sem prejuízo da sua pontual conjugação com a prova testemunhal que de seguida se analisa, que não os infirmou.

Neste particular, a prova testemunhal ouvida nestes autos serviu, no essencial, para corroboração dos factos já resultantes dos aludidos documentos, sendo que, em face da matéria fáctica em causa, tais depoimentos relevaram ainda para a prova do facto constante dos pontos J e K. Assim, as testemunhas A........... e R..........., funcionários da impugnante que se deslocavam às obras efectuadas no exercício de 2003, depuseram com credibilidade e demonstraram conhecimento das razões que levaram à não discriminação das ajudas de custo e ao seu efectivo pagamento, bem como das rendas pagas para colocação dos trabalhadores das obras em causa.

No mais, as testemunhas L.......... e S.......... limitaram-se a corroborar as opções contabilísticas da impugnante e conclusões jurídicas suportadas por esta, em oposição à Fazenda Pública, não relevando para a prova de qualquer facto concreto.

Quanto as despesas incorridas em Angola, a argumentação da impugnante sustenta-se em conclusões jurídicas, que não em factos, sendo certo que, não obstante os funcionários daquela confirmarem a sua existência, a prova testemunhal se afigurou insuficiente para infirmar a indocumentação de tais despesas.».


**


B.DE DIREITO

A presente impugnação judicial foi apresentada junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra visando a anulação acto tributário de liquidação de IRC do exercício de 2003 e respectivos juros compensatórios que teve a sua génese numa acção de inspecção da qual resultaram correcções técnicas ao lucro tributável por referência àquele exercício.

O Tribunal «a quo» julgou parcialmente procedente a impugnação judicial.

Desta decisão recorrem a Fazenda Pública e a Impugnante na parte que lhe cada uma delas decaiu.

Do recurso interposto pela Fazenda Pública

Nas suas Conclusões a), b) e c), a recorrente pretende a impugnação do julgamento da matéria de facto de modo a demonstrar um eventual erro de julgamento e a modificação da matéria de facto no que respeita às alíneas H. e J, da matéria de facto assente.

A apreciação desta questão (impugnação da matéria de facto fixada pelo Tribunal de 1.ª Instância por este Tribunal «ad quem») pressupõe que a recorrente cumpra determinados ónus, conforme dispõe o artigo 640.º do CPC ex vi do artigo 2.º alínea e) do CPPT.

Sobre a impugnação da decisão relativa à matéria de facto dispõe o artigo 640.º do seguinte:

«1. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:

a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;

b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;

c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.(…)».

Analisadas as alegações e respectivas conclusões de recurso constata-se que elas não observaram todos os pressupostos estabelecidos pelo artigo 640.º, do CPC, para a impugnação da decisão da matéria de facto.

Com efeito, pese embora, a recorrente proceda à referência dos concretos pontos da matéria de facto que considera incorrectamente julgados, não indica, porém, qual deveria ter sido a redacção que os factos em causa deveriam conter, no seu entender.

Por outro lado, limitou-se, tanto na alegação como nas conclusões, a afirmar genericamente que a pretendida impugnação se mostra sustentada no documento n.º 12 junto à petição de impugnação, sem indicar em concreto as razões de tal entendimento.

A recorrente refere também que «Resulta do depoimento da testemunha da impugnante Sr. A..........., que os valores das ajudas de custo não eram discriminadas nas facturas emitidas aos clientes porque não era prática no sector da Construção Civil[Conclusão d)] e que: «De acordo com o depoimento da testemunha Sr. R..........., os imóveis a que aí se alude não se destinavam apenas aos trabalhadores da impugnante como também aos seus familiares, pelo que, tal facto deveria ter sido levado ao probatório.» [Conclusão e)]. Todavia, não efectuou a indicação exigida pelo enunciado preceito legal quanto às passagens da gravação (cfr. artigo 640.º, nº 2, alínea a) do CPC), limitando-se nas suas alegações de recurso, a enunciar o juízo valorativo que efectuou sobre o depoimento das testemunhas A........... e R........... para alcançar a pretendida alteração da matéria de facto.

Assim, não tendo a recorrente dado cumprimento ao disposto na alínea c) do nº 1, e alínea a) do nº 2 do artigo 640.º do CPC, impõe-se a rejeição do recurso respeitante à impugnação da matéria de facto.

(i) Mais-valias - «A..........., S.A.»

A Administração Tributária entendeu que o valor de realização decorrente da alienação da participação que a recorrida detinha na sociedade «A………………, S.A.» é de 15.706.01,16€, e não o valor por aquela declarado de 14.461.860,29€, não tendo, por isso, sido aceite como custo fiscal o montante de 1.244.150,87€, correspondente à diferença entre aqueles valores, por assumir uma liberalidade da recorrida à qual a Administração Tributária entende ser é alheia.

No segmento relevante para o conhecimento da correcção em análise, a sentença recorrida fundou-se na seguinte argumentação facto-jurídica: « O valor da alienação da participação foi de € 15.706.011,16 e foi esse o preço que se teve em consideração para efeito de cálculo das mais valias, no âmbito da acção inspectiva.

Contudo, não se afigura cindível o acordo feito na parte tocante à cessão dos suprimentos. Com efeito, no acordo entre os contratantes referente à alienação da participação, atribuiu-se aos suprimentos antes constituídos pela impugnante o valor de € 3.319.159,27, configurando assim uma perda de € 1.244.150,87, justificada no contexto do negócio.

E não disputando a administração tributária que a parte não recuperada de suprimentos, em resultado de um acordo negocial, configura um custo indispensável para a realização dos proveitos nos termos do artigo 23.º do CIRC, deveria o mesmo ter sido considerado no apuramento das mais valias.».

Contra este entendimento se insurge a recorrente, argumentando em suma, que o prejuízo que a recorrida teve com a alienação dos suprimentos, ou seja, dos créditos que detinha sobre a sociedade «A.........., SA.», não concorre para a formação das mais-valias.

Esta argumentação não convence para o efeito pretendido, pelas razões que adiante se explicitará.

Em primeiro lugar, o conceito a que se reporta o artigo 23.º do CIRC tem sido ligado aos custos incorridos no interesse da empresa ou suportado no âmbito das actividades decorrentes ao seu escopo societário.

Em segundo lugar, a Administração Tributária nunca questionou a validade do acordo de cessão de crédito nem que o respectivo preço tenha sido negociado entre partes independentes e não relacionadas.

Sendo assim, para além de não ter ficado demonstrada a alegada «liberalidade» do negócio, o certo é que, não colocando em causa a operação económica nem a sua conformidade aos valores de mercado, não pode a Administração Tributária deixar de considerar a perda na cessão do crédito como dedutível para efeitos do IRC.

A sentença recorrida mostra-se acertada e nesta parte o recurso improcede.

(ii) Custos - Rendas Habitacionais

Conforme se extrai do discurso fundamento da correcção em apreço, a desconsideração da verba contabilizada na rubrica «Rendas habitacionais» foi a seguinte: « [é] de acrescer ao lucro tributável o valor de € 157.290,55 respeitante a custos relativos a rendas habitacionais utilizadas por funcionários da empresa não identificados pela mesma, não aceites fiscalmente nos termos do n.º 1 do art. 23.º do CIRC, por não serem comprovadamente indispensáveis para a realização de proveitos ou ganhos sujeitos a imposto, nem para a manutenção da fonte produtora. (…)».

Considerou o Mmº. Juiz do Tribunal «a quo», em síntese, que o conjunto da prova produzida resultou provado que os questionados verbas respeitam a rendas de imóveis que se destinaram a alojar trabalhadores deslocados da área da sua residência, para cumprirem as suas funções em obras a cargo da recorrida.

No entendimento da recorrente, ao invés do decidido, «[a]s referidas despesas devidamente justificadas não podem as mesmas serem consideradas como custos nos termos do artigo 23.º do CIRC.».

Nesta matéria cabe, desde logo, notar, como já dissemos, no acórdão de 19.03.2015, proferido no processo 03546/04, de que fomos relatora « [A] Constituição da República Portuguesa prevê no seu artigo 104º algumas regras sobre a tributação do rendimento, do património e do consumo.

No que se refere à tributação do rendimento das empresas, estatui que ela incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real, não excluindo, portanto, que outros princípios – por exemplo, universalidade, igualdade, praticabilidade e operacionalidade - possam ser invocados para justificar algum desvio àquela tributação do rendimento real, visando atingir o objectivo do sistema fiscal que é o de satisfazer «as necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas» e obter «uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza» (cfr. artigo 103º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa).

A tributação das empresas, como se deu nota, incide fundamentalmente sobre o seu rendimento real. A expressão «rendimento real» não se contrapõe a rendimento presumido, mas a «rendimento normal», englobando quer o rendimento efectivo, quer o presumido. Em ambos os casos se trata de um rendimento líquido (Principio do rendimento liquido objectivo) na definição do artigo 3.º n.º 2 do CIRC, «o lucro consiste na diferença entre os valores do património líquido no fim e no início do período de tributação».

Temos, assim que a Lei Fundamental no que se reporta à tributação das pessoas colectivas, adoptou, como critério aferidor da capacidade contributiva das empresas, o seu lucro real, donde a tributação das empresas deve basear-se fundamentalmente na sua contabilidade, o que vem ao encontro do estabelecido no artigo 17º ao consagrar que «o lucro tributável (..) é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do exercício e das variações positivas e negativas verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos deste Código.».

Para que tal suceda, a contabilidade deverá, designadamente, estar organizada de acordo com a normalização contabilística e outras disposições legais em vigor para o respectivo sector de actividade e reflectir todas as operações realizadas pelo sujeito passivo (cfr. nº 1 do artigo 17º do CIRC).

Uma das regras de organização da contabilidade encontra-se prevista no artigo 115º do CIRC, nos termos da qual «Todos os lançamentos devem estar apoiados em documentos justificativos, datados e susceptíveis de ser apresentados sempre que necessário».

Estando a contabilidade organizada, «presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos da lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial ou fiscal.» (cfr. artigo 75.º da LGT).

Desta presunção da veracidade resulta a vinculação da Administração Tributária à realização da liquidação com base na declaração do contribuinte, sem prejuízo do direito que lhe é concedido de proceder, posteriormente, ao controlo dos factos declarados.

Por isso, o artigo 16.º do CIRC determina que «a matéria colectável é, em regra, determinada com base em declaração do contribuinte, sem prejuízo do seu controlo pela administração fiscal» (nº 1) e que «a determinação do lucro tributável por métodos indiciários só pode verificar-se nos termos e condições previstos na secção V» (nº 4).

Do que vem dito, podemos então assegurar que vigora no nosso ordenamento jurídico o princípio da declaração no apuramento da matéria tributável, presumindo-se a veracidade dos dados e apuramentos decorrentes caso o contribuinte disponha de contabilidade organizada segundo a lei comercial ou fiscal, excepto se se verificarem erros, inexactidões ou outros fundados indícios de que ela não reflecte a matéria tributável efectiva do contribuinte.

O princípio da tributação pelo rendimento líquido poderá, porém, sofrer limitações, por via da não aceitação total ou parcial de determinadas despesas incorridas pelo sujeito passivo. O legislador no CIRC instituiu, determinados desvios à tributação do rendimento liquido, quer limitando o montante das deduções especificas quer, procedendo á não consideração de custos fiscais.

Nos termos do disposto no artigo 23.° do CIRC consideram-se como custos fiscais ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.

Assim, para que os custos tipificados no artigo 23.° do CIRC sejam considerados dedutíveis para efeitos fiscais é necessário, que se verifique, dois tipos de requisitos, uns de natureza previa à analise da dedubilidade fiscal, a saber:

1. Que o custo foi efectivamente suportado pelo SP e não por terceiros, na medida em que o custo só poderá relevar fiscalmente e contabilisticamente se efectivamente incorrido pelo SP;

2. Inscrição do custo na contabilidade do SP.

E, a segunda categoria de requisitos, também de verificação cumulativa, respeitam:

1. Que sejam comprovados através de documentos emitidos nos termos legais;

2. Que sejam indispensáveis para a realização dos proveitos.

Sobre a questão da indispensabilidade dos gastos/custos, têm vindo a ser apontadas três interpretações possíveis a saber: indispensabilidade como sinónimo de absoluta necessidade ou de conveniência, ou identificando-se com a noção de interesse societário.

As duas primeiras linhas de entendimento, não merecem acolhimento, pois que a formulação dos juízos de necessidade e oportunidade dos gastos competem á empresa.

Acresce, que pese embora se tratar de uma despesa com um fim empresarial não significa que tenha desde logo um fim imediato e directamente lucrativo.

Com efeito, se a empresa decide fazer uma despesa de modo a prosseguir a sua actividade, não deixa por essa razão de ser um custo fiscal. O artigo 23.º do CIRC não refere que a despesa se apresente como condição sine qua nom dos proveitos, no que respeita á segunda, a admitir-se, estaremos, sem dúvida a permitir à Administração Tributária intrometer-se na gestão das empresas.

Assim, o critério da indispensabilidade não pode ser visto como “ lei habilitante” de modo a permitir à Administração Tributaria intrometer-se na gestão da empresa, como se de um verdadeiro “Administrador/Gestor” se trata-se. O que equivale dizer, que Administração Tributária não se encontra legitimada para emitir juízos de valor sobre a bondade da gestão empresarial, apenas poderá proceder à desconsideração como gastos fiscais, relativamente os gastos que escapem à actividade da empresa, o que não significa que em situações concretas, não nos custe a aceitar, que pese embora os gastos ocorridos não se enquadrarem no objecto societário, poderá suceder que ainda assim se mostrem ligados indirectamente com actividade exercida.

Defende-se, assim, que os custos indispensáveis serão aqueles que correspondam a gastos realizados no interesse da sociedade, sendo excluídos os que não se insiram no interesse da sociedade, isto é, que foram incorridos para outros fins.

No que tange à matéria do ónus da prova, encontra-se solidificado a nível jurisprudencial que se a contabilidade organizada goza da presunção de veracidade e, por isso, cabe à Administração Tributária o ónus de ilidir essa presunção, demonstrando que os factos contabilizados não são verdadeiros, já no que respeita à qualificação das verbas contabilizadas como custos dedutíveis, cabe ao contribuinte o ónus da prova da sua indispensabilidade para a obtenção dos proveitos ou para a manutenção da força produtora, se a ATA questionar essa indispensabilidade.

É que em tal desiderato, o encargo da prova deve recair sobre quem, alegando o facto correspondente, com mais facilidade, pode documentar e esclarecer as operações e a sua conexão com os proveitos (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 26.6.2001, Rec. nº 4736/01).»

Em função do que fica exposto, é ponto assente que um custo, para ser relevante fiscalmente, tem de ser afecto à exploração, no sentido de que deve existir uma relação causal entre tal custo e os proveitos da empresa, tendo em conta as normais circunstâncias do mercado, considerando o risco normal da actividade económica, em termos de adequação económica do acto à finalidade da obtenção maximizada de resultados.

Neste contexto, não basta que exista uma conexão entre custos e proveitos para que os primeiros tenham relevância fiscal, é pois necessário comprovar a sua indispensabilidade para a formação (dos) proveitos.

Assim sendo, questão do ónus da prova da indispensabilidade do custo passa ao lado da presunção de veracidade da escrita correctamente organizada (artigo 75.º da LGT) pois não se questiona a veracidade (existência e montante) da despesa contabilizada mas a sua relevância, face à lei, para efeitos fiscais, no caso, da sua qualificação como custo dedutível.

Dito isto, recordemos que ficou provado a verba (157.290,55€) suportada pela recorrida a título de rendas habitacionais, foi referente a imóveis destinados à utilização temporária dos seus trabalhadores deslocados em obras fora dos seus locais de residência ( cfr. al.K) do probatório).

Daí que, o discurso argumentativo da recorrente não abala o decidido pelo Tribunal «a quo», mostrando-se, assim, correcta a subsunção jurídica efectuada face à factualidade assente.

(ii) Ajudas de custo - facturas a clientes

A recorrente continua a defender que os encargos contabilizados pela recorrida com ajudas de custo não estão individualizados nas facturas processadas aos clientes, devendo por isso, contrariamente ao decidido pelo Tribunal « a quo» serem tributados na proporção de 20%, sob pena de violação viola do disposto no artigo 43.º, nº 2, artigo 42.º, nº 1, alínea f) e artigo 23.º todos do CIRC.

Mas sem razão.

Senão vejamos.

O artigo 42.º, n.º 1, al. f), do CIRC (na redacção à data dos factos) estabelecia o seguinte:

«[n]ão são dedutíveis, para efeito de determinação do lucro tributável os seguintes encargos, mesmo quando contabilizados como custos ou perdas do exercício: (…) [a]s despesas com ajudas de custo e com compensação pela deslocação em viatura própria do trabalhador, ao serviço da entidade patronal, não facturadas a clientes, escrituradas a qualquer título, na proporção de 20%, e a totalidade das mesmas sempre que a entidade patronal não possua, por cada pagamento efectuado, um mapa através do qual seja possível efectuar o controlo das deslocações a que se referem aquelas despesas, designadamente os respectivos locais, tempo de permanência e objectivo, excepto na parte em que haja lugar a tributação em sede de IRS na esfera do respectivo beneficiário.». (negrito da nossa autoria)

Ora, expressão “facturadas a clientes”, como significando que só são fiscalmente aceites na sua totalidade as ajudas de custo e deslocações desde que os respectivos montantes estejam discriminados na facturação emitida aos clientes, não é de acolher.

Ajudas de custo facturadas aos clientes são os encargos a esse título debitados aos clientes e incluídos no valor (global) da factura, não mais que isso. (Neste sentido, vide Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 5/04.2BEPNF, proferido no processo n.º 12.03.2015, disponível em texto integral em www.dgsi.pt)

Neste contexto, conforme se consignou na sentença recorrida « [i]mpunha-se à administração tributária demonstrar que os montantes alegadamente dispendidos a título de ajudas de custo não foram facturados a clientes.

E neste conspecto, sendo verdade que na facturação em causa não foram discriminados os montantes relativos a ajudas de custo, tal não se afigura suficiente para suportar a conclusão a que chegou.

É que não está em causa a qualificação destas despesas, nem a sua indispensabilidade para a realização dos proveitos sujeitos a imposto ou manutenção da fonte produtora, nos termos do artigo 23 do CIRC, antes se considerou que elas não podem ser aceites como tal por falta de um dos requisitos do suporte documental das mesmas.».

Concorda-se, com esta fundamentação e não se vislumbra, qualquer razão para alterar o que foi decidido pelo Tribunal «a quo».

O recurso improcede nos termos expostos.

Do recurso interposto pela Impugnante

Da nulidade da sentença

Entende a recorrente que a sentença sofre de nulidade por falta de fundamentação no que concerne à apreciação da violação dos princípios da especialização, da tributação pelo lucro real e da justiça previstos, respectivamente, nos artigos 18.º do Código do IRC, artigos 104.º, n.º 2 e 266.º da CRP, e artigo 55.º da LGT.

Preceitua o artigo 615.º do nº1 alínea b) do CPC, que « É nula a sentença quando: b) Não especifique os fundamentos de facto e de direitos que justifiquem a decisão».

Igualmente resulta do regime ínsito no artigo 123.º do CPPT, que na sentença «O juiz discriminará também a matéria provada da não provada, fundamentando as suas decisões.».

Por sua vez, nos termos do disposto no artigo 607.°, n.°4, do CPC, na fundamentação da sentença, o juiz deve declarar quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas e, entre o mais, especificando os fundamentos decisivos para a sua convicção.

Trata-se, com efeito, de uma expressão concreta do dever de fundamentação das decisões judiciais, consagrado no artigo 205.°, n.° 1, da Constituição da República Portuguesa, e ainda no artigo 154.°, n.°1, do CPC, correspondente a uma importante causa de legitimação da função soberana de julgar.

Como refere Alberto dos Reis: «[H]á que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.

Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade (…)» ( Código de Processo Civil anotado, Vol. V, pág. 140)

A nível jurisprudencial, desde há muito que os tribunais superiores, pacificamente, têm considerado que a nulidade prevista na alínea b) do nº 1 do artigo 615.º do CPC, apenas se verifica quando haja falta absoluta de fundamentos e não quando a fundamentação se mostra deficiente, errada ou incompleta (vide por todos: Acórdão da Relação de Évora, de 20/12/2012, P. 5313/11.3YYLSB-A.E1, disponíveis em www.dgsi.pt.).

Ora, no caso dos autos não ocorreu esta particularidade, para tanto basta atender ao decidido a fls. 35 e 36 da sentença, onde em resumo de concluiu que « (…) não se vislumbra a violação dos princípios invocados pela impugnante, posto que, como já sustentado em sede de contestação, se deve considerar em aberto o prazo de impugnação judicial dos exercícios subsequentes, em resultado da definitividade da correcção ao exercício aqui em causa, em face dos disposto no artigo 102.º, n.º, al.f), do CPPT».

Um eventual erro ou discordância quanto à fundamentação de facto e de direito constante da sentença não é gerador da nulidade prevista na alínea b) do nº 1 do artigo 615.º alínea b) do CPC, antes se incluindo no âmbito de eventual erro de julgamento.

Termos em que, se conclui que a sentença não enferma da apontada nulidade.

(i)Provisões não aceites fiscalmente - dívidas tituladas por letras-

Conforme resulta da fundamentação da correcção aqui em apreciação, a Administração Tributária considerou que não seriam de aceitar como custos fiscais ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do artigo 35.º do CIRC, os valores em dívida de clientes em que a recorrente sujeito teve em conta para o cálculo da provisão, a data de vencimento da factura e não a data de vencimento das letras que titulavam essas dívidas.

Para efeitos de IRC, consideram-se, nos termos do artigo 23.º n.º 1 CIRC, custos ou perdas «os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.». Segue-se, nas diversas alíneas em que se desdobra este n.º 1, uma indicação, exemplificativa, não taxativa, de encargos que assumem a categoria de custos ou perdas para efeitos do versado tributo, entre os quais, figuram, inequivocamente, “as provisões” - cfr. alínea h).

Como é sabido as provisões constituem um fundo criado pela empresa, levado a custos ou encargos do exercício, destinado a fazer face a prejuízos que se esperam, mas cujo valor não se conhece ainda com precisão.

Mais não são, pois, do que montantes retirados da matéria tributável de determinado exercício, que ficam afectos a compensar perdas de montantes incertos imputáveis ao mesmo exercício mas cuja concretização se apurará em exercícios posteriores, ou a fazer face a prejuízos previsíveis advindos da desvalorização das existências.

As provisões de um exercício são lançamentos que, nesse mesmo exercício, se fazem na conta de resultados, como valores negativos, correspondentes a factos nele ocorridos mas cuja concretização fica dependente de eventualidades que só nos exercícios seguintes podem ocorrer.

De acordo com o disposto na alínea a) do n.º1 do artigo 34.º do CIRC podem ser deduzidas para efeitos fiscais as provisões «que tiverem por fim a cobertura de créditos resultantes da actividade normal que no fim do exercício possam ser considerados de cobrança duvidosa e sejam evidenciados como tal na contabilidade» (negrito da nossa autoria).

No caso trazido a juízo, como limpidamente se retira do discurso que suporta a correcção em análise não estão em causa os dois últimos requisitos (cobrança duvidosa e sua evidência na contabilidade), e sendo assim, haverá de determinar se está ou não verificado o primeiro requisito (actividade normal).

Assim, e antes de mais, os créditos têm que resultar da actividade normal da empresa e tem-se entendido que os créditos resultantes da actividade normal da empresa são os saldos devedores de clientes e fornecedores no final do exercício devidamente evidenciados em contas apropriadas.

É que, a lei não define o que são «créditos resultantes da actividade normal das empresas», mas a Administração Tributária vinha entendendo no domínio da Contribuição Industrial que eles abrangiam os saldos devedores de clientes e fornecedores mencionados no balanço reportado a 31 de Dezembro de cada ano.

Acentuando, J.A.R. Martins Barreiros, Manuel A. Costa Teixeira e Henrique Quintino Ferreira, no Boletim da Direcção Geral das Contribuições e Impostos, que «no cálculo das provisões previstas na alínea c) do art. 33° [do Código da Contribuição Industrial] [provisões para cobertura de créditos de cobrança duvidosa] entra-se em conta com as letras descontadas e não pagas pelos aceitantes até ao fim do exercício.». (Pág. 389 dos nºs 116-117 do Boletim, 1968, e pág. 101 do Boletim, n.0S 211-213, de julho I set. de 1976) (nosso sublinhado).

Mais, referem que «A provisão para letras descontadas deverá ser considerada como fazendo parte integrante da provisão para créditos de cobrança duvidosa e como tal pode ser objecto de reforço até ao limite de 4%6 previsto no ofício-circular n º 5520, de 21-6-65, não devendo a mesma ser considerada uma provisão autónoma, pois, neste caso, a sua constituição não poderia ir além de 3% a que se refere o mesmo ofício-circular (Desp. De 1-8-83, Proc. 7, E.G. 273/83, do C.E.F.)» (nosso sublinhado)

Ora, face à substância económica dos encargos bancários provisionados, ter-se-á de concluir que «os mesmos integram e têm a mesma natureza, das dívidas cujas letras visam garantir».

Na verdade a letra não é um documento autónomo e tem sempre uma relação subjacente à sua emissão. E, no caso vertente, como já foi dito, a Administração Tributária não põe em causa que os questionados encargos bancários com letras derivem da relação comercial e actividade desenvolvida pela recorrente, nem põe em causa o seu montante e momento em que foi constituída a provisão.

Assim, em nosso entender, não podem os encargos bancários com letras deixarem de estarem intimamente conexionados com o negócio causal, de que a letra é o simples escrito particular. Por isso, como bem afirma a recorrente, porque as letras não eliminam o risco de incobrabilidade que impõe a constituição da provisão, dada a sua autonomia relativamente à relação extra-cambiária, é manifesto que as provisões constituídas devem ser consideradas dedutíveis em sede do IRC porque conformes com o disposto no artigo 35.º do CIRC.

Com efeito, não obstante o saque das letras, o devedor continua a ser o mesmo, não constituindo estas de modo algum uma garantia adicional que altere a situação de risco de incobrabilidade.

Do que dissemos haverá de concluir-se pela procedência do recurso nesta parte.

(ii)Mais-valias fiscais – alienação da participação na S.......... Sociedade Gestora de Alta Lisboa

Está em causa o valor da mais – valia apurado pela recorrente na alienação de participações sociais de que era titilar na sociedade S..........- Sociedade Gestora da Alta Lisboa, S.A. Neste ponto considerou a Administração Tributária que a recorrente o valor da realização a considerar como realização deveria ter sido de 6.018.090,00€, por corresponder às acções empenhadas como garantia da devolução de uma aditamento que a S..........- Sociedade Gestora da Alta Lisboa, S.A. tinha efectuado à recorrente para aquisição de materiais e equipamentos.

E, foi neste contexto que os Serviços de Inspecção Tributária procederam ao acréscimo para efeitos fiscais da diferença entre aqueles valores no montante 133.202,53€.

O Tribunal «a quo» aderindo à posição da Administração Tributária veio a decidir que não foi demonstrada a correcta contabilização do montante de 113.202,53€, no que respeita ao saldo da conta corrente da sociedade alienada, o que foi determinante para a desconsideração fiscal deste custo.

Antes de ir mais adiante, começaremos por recordar que a nossa Ordem Jurídica não confere relevância à fundamentação a posteriori. O que significa que não releva para aferir da legalidade da correcção em análise do acto a fundamentação externada pela Administração Tributária na contestação apresentada à qual o Tribunal «a quo» deu guarida.

Há pois que ponderar a fundamentação externada no Relatório de Inspeção, pois que só esta se integra no próprio acto de liquidação sindicado, e como tal contemporânea ao mesmo.

Lido o Relatório de Inspecção verifica-se que não há qualquer referência quanto a uma eventual errada contabilização do montante de 113.202,53€, como se pode constatar da seguinte passagem: « O sujeito passivo no exercício do direito de audição vem esclarecer que a diferença apurada no valor de € 113.202,53 diz respeito "( ... ) à assunção de um saldo devedor daquela entidade (S..........), reflectido na conta # 26(..,)" e ainda "( ... ) o penhor foi executado após acordo entre as partes relativamente à execução da obra acima referida e à regularização das dividas àquela data existentes ( .. )"

De acordo com o contrato de penhor das acções, o valor de realização, definido nos termos do n.º 3 do art° 43° do CIRC, é de € 6.018.090,00, sendo este o valor que deve ser considerado no apuramento da mais valia fiscal. Neste caso a diferença no valor € 113.202,53, conforme o próprio sujeito passivo afirma, diz respeito a uma regularização de saldo da conta corrente da sociedade alienada, não aceite como custo fiscal, por não se enquadrar no artigo 23° do CIRC.».

Sendo para nós claro, que a Administração Tributária embora aceitando que o valor de 113.202,53€, corresponda a uma regularização de saldo de conta corrente da sociedade alienada, não aceitou essa quantia como custo fiscal por não se enquadrar no artigo 23.º do CIRC.

Face ao contexto descrito não se pode acompanhar a sentença recorrida quando adere na integra à argumentação expendida na contestação, que como já vimos, não obtém correspondência com a fundamentação que suporta a correcção.

Ora, se a correcção foi efectuada ao abrigo do artigo 23.º do CIRC, e considerando que só se consideram custos do exercício, os que comprovadamente foram indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos ou para a manutenção da fonte produtora não colocando a Administração Tributária em causa a efetiva existência do mesmo e que foi realizado no interesse da atividade empresarial da recorrente, naturalmente que a correcção não pode manter-se na Ordem Jurídica.

Pelo que, nesta parte, procede o recurso.

(iii)Despesas não documentadas

A Administração Tributária entendeu que as verbas contabilizadas na conta 692 - Custos perdas extraordinárias - dívidas incobráveis, o montante de € 219.551,79, constituíam encargos não documentados e sujeitos a tributação autónoma uma vez que apenas foi apresentado pela recorrida o movimento contabilístico relativo a este custo e nenhum documento de suporte. correcção fundamentou-se no disposto na alínea g) do n.º 1 do artigo 41.º do CIRC e no artigo 4.º do DL n.º 192/90, de 9 de Junho (cfr. alínea C) dos factos provados – ponto 4 do relatório).

O Tribunal «a quo» seguiu a mesma solução jurídica por entender que os extractos bancários apresentados não documentam os pagamentos efectuados com referência à actividade em Angola, nem tão pouco quaisquer despesas, nem existem quaisquer documentos de suporte para as importâncias em causa, que refiram quais as despesas inerentes a esses valores, nem quem recebeu as quantias em que as mesmas se consubstanciam.

A argumentação da recorrente não abala minimamente o decidido.

Vejamos, porquê.

Nos termos do estatuído no artigo 23.º do CIRC consideram-se como custos fiscais ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.

Estatui a alínea g) do n.º1 do artigo 41.º, n.º1 do CIRC, na redacção então vigente, que não são dedutíveis para efeito de determinação do lucro tributável, mesmo quando contabilizados como custos ou perdas do exercício, os encargos não devidamente documentados.

Para que os custos enumerados no artigo 23.º do CIRC sejam considerados dedutíveis para efeitos fiscais é necessário que se verifiquem dois requisitos cumulativos, a saber:

1.Que sejam comprovados através de documentos emitidos nos termos legais;

2.Que sejam indispensáveis para a realização dos proveitos.

Na ausência de definição legal destes «documentos justificativos», considera Tomás de Castro Tavares, ser adequada e bastante «uma qualquer forma externa de representação da operação (…) desde que explicite, de forma clara, as principais características da operação (os sujeitos, o preço, a data e o objecto da transacção)». (Da relação de dependência parcial entre a contabilidade e o direito fiscal na determinação do rendimento tributável das pessoas colectivas: algumas reflexões ao nível dos custos”, Ciência e Técnica Fiscal, 396, pp. 123 ss.).

A comprovação de custos, (ao invés do nº 5, do artigo 35.º CIVA - cfr. artigo 19.º, nº 2, do mesmo diploma legal), para efeitos de determinação do lucro tributável em sede de IRC, é possível, no caso de inexistência de documento de origem externa (nos casos em que este devesse existir), a prova dos custos através de documento interno, que deverá conter os elementos essenciais das facturas, desde que a veracidade da operação subjacente seja inequivocamente assegurada por outros meios de prova.

É aliás este o entendimento que vem sendo perfilhado pela jurisprudência, designadamente do Supremo Tribunal Administrativo, como é o caso, do Acórdão de 05.07.2012, proferido no processo n.º 648/11: «Em sede de IRC, o documento comprovativo e justificativo dos custos para efeitos do disposto nos arts. 23º, nº1, e 42º, nº 1, alínea g), do CIRC, não tem de assumir as formalidades essenciais exigidas para as facturas em sede de IVA, uma vez que a exigência de prova documental não se confunde nem se esgota na exigência de factura, bastando tão-só um documento escrito, em princípio externo e com menção das características fundamentais da operação, uma vez que ao contrário do que se passa com o IVA, em sede de IRC, a justificação do custo consubstancia uma formalidade probatória e, por isso, substituível por qualquer outro género de prova(disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

No mesmo sentido vai a doutrina, citando-se como mero exemplo, Rui Morais « o sujeito passivo deve ser admitido a complementar a prova da existência do custo através do recurso a quaisquer meios admitidos em direito», pois «a não aceitação, por razões de índole meramente formal, da dedutibilidade de um custo que efetivamente foi suportado, corresponderia à tributação por um lucro que não existe, a um imposto a que não subjaz a correspondente capacidade contributiva(Apontamentos ao IRC, Almedina, 2007, pp. 79-80).

O artigo 81.º, n.º 1, do CIRC, determinava, à data, que «As despesas confidenciais ou não documentadas são tributadas autonomamente, à taxa de 50%, sem prejuízo do disposto na alínea g) do n.º 1 do artigo 42.º.». Por sua vez, o artigo 42.º, n.º 1, alínea g), também do CIRC, referia que não são considerados como custo fiscal «Os encargos não devidamente documentados e as despesas de carácter confidencial».

As despesas confidenciais são aquelas despesas em relação às quais não se permite compreender a sua natureza, a sua origem e a sua finalidade, enquanto as despesas não documentadas serão aquelas relativamente às quais não existe prova documental, embora não haja ocultação da sua natureza, origem e finalidade.

Tal como nos dá conta o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 22/02/2017, proferido no processo nº 0837/15: «As despesas confidenciais podem até ser imprescindíveis para a manutenção ou desenvolvimento da actividade de um contribuinte, mas para poderem ser tidas como despesas para efeitos de determinação do seu rendimento tributável, têm que perder esse cariz confidencial, têm que assumir a transparência de dados com exactidão constantes da contabilidade que permitam seguir o seu curso desde a origem até à utilização( disponível em texto integral e www.dgsi.pt)

Tendo presente tudo quanto acaba de dizer-se, volvendo ao caso concreto, constata-se que estamos perante despesas não documentadas uma vez que dos extractos bancários apresentados não é possível aferir da natureza, origem e finalidade das saidas que os mesmos documentam.

Neste contexto, impõe-se a sua tributação autónoma, nos termos do artigo 81.º, n.º1 do CIRC, sem prejuízo obviamente da sua não consideração como gastos, nos termos do artigo 23.° do mesmo compendio legal.

Tudo, deste modo, leva a concluir que a sentença que assim decidiu não merece a censura que lhe foi apontada.

DA DISPENSA DO PAGAMENTO DE REMANESCENTE DE TAXA DE JUSTIÇA

Conforme entendimento expresso no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 07.05.2014, proferido no processo n.º 01953/13 a que aderimos: «A norma constante do nº7 do art. 6º do RCP deve ser interpretada em termos de ao juiz, ser lícito, mesmo a título oficioso, dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fracção ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa exceder o patamar de €275.000, consoante o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes),iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade.» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

Considerando que o valor da presente causa ultrapassa o patamar de 275.000€ e que a mesma não assumiu especial complexidade nem a conduta assumida por qualquer uma das partes, em recurso, pode considerar-se num nível reprovável, tendo-se limitado, como referido, grosso modo, à discussão de questões jurídicas centradas no âmbito do artigo 23.º e 35.º do CIRC.

Nada obsta que a recorrente seja dispensada, do pagamento do remanescente da taxa de justiça, atendo o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes), iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da igualdade.

IV.CONCLUSÕES

I.A letra não é um documento autónomo e tem sempre uma relação subjacente à sua emissão.

II.Os encargos bancários que o portador das letras teve de suportar relacionados com o pagamento desses títulos não podem deixar de se inserirem no conceito de actividade normal da Impugnante.

III.Despesas não documentadas, são aquelas em relação às quais não existe prova documental, embora não haja ocultação da sua natureza, origem ou finalidade.

IV.As despesas não documentadas são sujeitas a tributação autónoma.

V.DECISÃO

Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes que integram a 1.ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul em:

- negar provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública;

- julgar parcialmente procedente o recurso interposto pela Impugnante, revogando-se a sentença quanto às correcções indicadas em i) e ii), julgando nessa parte a impugnação procedente, e mantida quanto ao demais.

Custas a cargo recorrente Fazenda Pública e pela recorrente (impugnante) sendo esta na parte em que decaiu, com dispensa, por ambas as partes do pagamento do remanescente da taxa de justiça, ao abrigo do disposto no artigo 6.º n.º7, do Regulamento das Custas Processuais. RCP.


Lisboa, 16 de dezembro de 2020.


[Ana Pinhol]

[Isabel Fernandes]

[Jorge Cortês]