Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03964/10
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:06/22/2010
Relator:JOSÉ CORREIA
Descritores:IMPUGNAÇÃO DE IVA
ALTERAÇÃO DO PROBATÓRIO
EXTENSÃO DA INFORMAÇÃO VINCULATIVA PRESTADA PELA AT
TRANSMISSÃO DE INFORMAÇÕES TECNOLÓGICAS ("KNOW HOW")
COMPENSAÇÃO
Sumário:I) -Não é de atender a alteração e ampliação da factualidade pretendida pela recorrente, ao abrigo do disposto no artigo 712°/1/a) do CPC quando a sentença recorrida fez uma rigorosa apreciação e análise da matéria de facto, fixando toda a factualidade com interesse para a decisão causa segundo as várias soluções de direito plausíveis e é patente dos elementos de suporte da fundamentação da sentença que não é correcto afirmar-se, como faz a recorrente, que a AT, na informação vinculativa suscitada sobre a tributação do contrato em causa não tenha referido que a sustentada não tributação não abrangia o IVA.
II) -O carácter vinculativo da informação apenas vale para o caso concreto que lhe deu origem já que os efeitos derivados da resposta da administração tributária não se podem estender a outras situações, uma vez que a análise feita parte da ponderação de uma situação concreta e específica (doutrina para o caso concreto).
III) -Decorrendo da informação vinculativa suscitada pela recorrente sobre a tributação do contrato em causa que não estava abrangida a tributação em sede de IVA mas, apenas, clara e expressamente a sustentada não tributação, apenas se reportava ao IRC, não procede a alegação da recorrente de que actuou em conformidade com a informação prestada, agindo de boa-fé ao entender que a não sujeição a tributação constante do despacho envolveria todo e qualquer tributo, designadamente o IVA.
IV) -Fluindo da matéria fáctica provada a existência de um contrato titulado de "assistência técnica" celebrado entre a recorrente e uma empresa com sede em Lausanne, na Suíça, do qual, além do mais e no seu art°.4, é consagrada uma remuneração, a pagar pela recorrente, no montante equivalente a 2,5% das suas receitas brutas realizadas, deve qualificar-se tal acordo como verdadeiro contrato de transmissão de informações tecnológicas preexistentes e não reveladas ao público, em si mesmas consideradas ("Know how"), no caso, as informações relativas à pesquisa e afinação dos processos de fabrico e produção já utilizados, tal como a introdução, lançamento ou exploração de qualquer outro novo processo de fabrico ou de produção de que a empresa suíça venha a dispor.
V) -Assim, os pagamentos consagrados no dito acordo referem-se a verdadeiros "royalties", derivados de contrato de "Know how", consubstanciando-se em percentagens (2,5%) associadas ao lucro bruto tido pela sociedade impugnante e, sendo verdadeiros "royalties" pagos pela sociedade impugnante a empresa sem sede, direcção efectiva ou estabelecimento estável em Portugal, estavam os respectivos montantes sujeitos a tributação em sede de I.R.C., atento o disposto no art°.69, n°.2, al.a), do C.I.R.C., e sendo a sua retenção na fonte consagrada no art°.75, n°.1, al.a), do mesmo diploma (na redacção em vigor em 1998 - cfr.art0.12, do C.Civil).
VI) -E no que respeita ao IVA, imposto em causa nos autos, as prestações de serviços questionadas pelo Fisco estão sujeitas a I.V.A. nos termos do art°.6, n°.8, al.a), do C.I.V.A., dado que não se verifica a excepção à excepção prevista no n°.9 do mesmo artigo o que quer dizer que a sociedade impugnante, enquanto adquirente dos serviços em causa, não se enquadra na previsão das normas constantes das als. a) e b), do n°.9, do art°.6, do C.I.V.A., pelo que deveria ter procedido à autoliquidação do imposto em causa, incidente sobre o pagamento das prestações de serviços efectuadas pela empresa suíça, mediante a emissão, para efeitos contabilísticos, de uma nota de lançamento que evidenciasse o valor do imposto relativo à mesma prestação de serviços obtida de entidade não residente em Portugal.
VII) -Não colhe o entendimento da recorrente de que o imposto assim autoliquidado pode ser por si deduzido nos termos do art°.19, n°.1, al.c), do C.I.V.A., e, assim, que da falta de liquidação atempada de I.V.A. não resultou qualquer prejuízo para o Estado, já que nenhuma quantia havia a entregar nos seus cofres pois, da não liquidação atempada do I.V.A. incidente sobre as prestações de serviços em causa podem derivar prejuízos para a Fazenda Pública expressos em eventuais juros compensatórios (cfr.art°.89, do C.I.V.A.), acrescendo que a liquidação impugnada, na data em que foi efectuada (30/7/2001), estava devidamente fundamentada na lei, visto que a impugnante somente em 10/9/2001 apresentou declarações periódicas de I.V.A. de substituição (mod.C), relativas aos períodos de Março, Junho, Setembro e Dezembro de 1998.
VIII) -E, como decorre do disposto no art°.19, n°.1, do C.I.V.A., o regime de dedução do I.V.A. reveste a natureza de um direito do sujeito passivo, inversamente ao que sucede no regime de liquidação do mesmo tributo que constitui uma obrigação da Fazenda Pública estando sujeito a prazos, nomeadamente de caducidade, como claramente resulta dos art°s.88, do C.I.V.A. e 45º da LG.T., pelo que a liquidação ou autoliquidação do tributo constitui uma obrigação ou dever legal, indisponível, sujeito, nomeadamente, a prazos de caducidade (artigos 88.° do CIVA e 45.° da LGT), sendo, em contrapartida, o direito à dedução um direito do sujeito passivo, disponível dado que tal direito à dedução é efectuado nos termos do disposto no artigo 19.° e seguintes do CIVA, não devendo a AT através do seus serviços de fiscalização substituir-se ao sujeito passivo, apurando o seus créditos perante o Estado, tanto assim que o artigo 82.° do CIVA manda, tão somente, averiguar as deduções superiores às devidas e não as inferiores.
IX) -Tendo a AT constatado que recorrente contabilizou mais custos e deduziu mais I.V.A. do que o facturado, através de recibo, pela comissionista, tendo, ao abrigo do art°.19, n°.2, do C.I.V.A., concluído que houve dedução em excesso de imposto no montante total de €1.249,33, distribuído pelos períodos mensais de Maio, Julho e Dezembro de 1998, isso significa que o imposto exigido pela Fazenda Pública respeita unicamente à diferença entre o montante de I.V.A. facturado, através de recibo, pela comissionista e a quantia, mais elevada, de I.V.A. deduzido pela recorrente, o que corresponde à diferença de taxas de I.V.A. utilizadas pelo sujeito passivo e pelo seu comissionista, pelo que nenhuma censura merece o agir da mesma AF.
X) -A compensação consubstancia uma das formas de extinção das obrigações prevista no direito privado (cfr.art°.847, do C.Civil), sendo que no regime especial ínsito no direito tributário, a compensação de dívidas de tributos por iniciativa da A. Fiscal está consagrada no art°.89, n°.1, do C. P. P. Tributário por referência também ao art°.40, n°.2, da LG.T., a qual faz depender da seguinte requisitagem: (i)existência de um crédito de que é titular um contribuinte e devedor a Fazenda Pública; (II) tal crédito resulte de reembolso, revisão oficiosa, reclamação graciosa, impugnação judicial ou de outro meio, administrativo ou contencioso, de contestação; (iii) que o mesmo contribuinte seja, simultaneamente, devedor de tributos cujo prazo de cobrança voluntária já tenha transcorrido e (iv) que esta dívida não esteja garantida ou, estando-o, não estiver pendente reclamação graciosa, impugnação judicial, recurso contencioso ou oposição à execução tendo por objecto a mesma dívida do contribuinte, nem estar a ser paga em prestações.
XI) -Segundo o regime especial do I.V.A., o art°.83-B, do C.I.V.A. na redacção que lhe foi introduzida pela Lei nº 39-B/94, de 27/12, consagra a obrigação de a Fazenda Pública efectuar a compensação de quaisquer importâncias que estejam em dívida, devidamente apuradas ou confirmadas pelos serviços da A. Fiscal, no âmbito da análise dos pedidos de reembolso formulados pelo sujeito passivo e quer tais montantes (devidos pelo sujeito passivo) respeitem ao mesmo período de imposto a que se refere o pedido de reembolso ou a período diferente.
XII) –No caso concreto verificam-se todos os pressupostos de actuação da Fazenda Pública ao abrigo do aludido art°.83-B, do C.I.V.A., dado que, a liquidação impugnada, na data em que foi efectuada (30/7/2001), estava devidamente fundamentada na lei, visto que a impugnante somente em 10/9/2001 apresentou declarações periódicas de I.V.A. de substituição (mod.C), relativas aos períodos de Março, Junho, Setembro e Dezembro de 1998, verificando-se, pois, todos os pressupostos da questionada compensação de dívidas por iniciativa da Fazenda Pública, a qual reveste características obrigatórias (cfr.art°.89, n°.1, do C.P.P.Tributário).
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo:

1. –A...– A..., Ldª, veio interpor recurso da douta sentença proferida pelo M° Juiz do TT de 1ª Instância de Lisboa, que julgou improcedente a impugnação judicial que havia deduzido contra a liquidação adicional de IVA referente ao exercício de 1998.
Após alegações, a recorrente formulou as seguintes conclusões:
“1ªO recurso em apreço é interposto da sentença que julgou improcedente a impugnação judicial identificada em epígrafe, deduzida contra a liquidação adicional de IVA do exercício de 1998.
2.ª - Constituem objecto do recurso as seguintes correcções realizadas pela Administração Fiscal (AF), mantidas na sentença recorrida: a), a liquidação de IVA sobre pagamentos feitos a uma sociedade suíça, a B..., S.A., que a AF entende ser devido; b), a liquidação de IVA referente a pagamento realizado a uma comissionista, em virtude de a AF ter entendido que o IVA incidente foi deduzido em excesso.
3.ª - A decisão recorrida considerou provados os factos constantes dos n.°s 1 a 10 (a fls. 3 a 5) que se dão aqui por reproduzidos para todos os legais efeitos.
4ª - Foi produzida prova testemunhal que o Meritíssimo Juiz a quo não levou em consideração "...dado não conferem factualidade necessária à decisão da causa" (sentença, a fls. 5 in fine).
5ª - Ocorrem omissões nos factos considerados provados na decisão recorrida.
6.a - Com efeito, deveria ter sido levado ao probatório, a seguir ao n.° 2, o que se alega nos artigos. 3.°, 4.° e 6.° da p.i. comprovado pelo teor dos docs. n.°s4 e 5 com aquela juntos, isto é, que celebrado o contrato a que se alude no n.° 2 do probatório, a impugnante tomou a iniciativa de solicitar à AF o respectivo enquadramento tributário, para o que lhe remeteu o aludido contrato.
7.a - Só depois deveria referir-se o despacho proferido pelo Subdirector-Geral dos Impostos sobre o pedido de informação da impugnante, conforme n.° 3 do probatório.
8.a - Em consequência, e de acordo com o que se dispõe no art. 712.° do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi art. 2.°, ai. e) do CPPT, deve ser alterada a matéria de facto, ampliando-a, no sentido de ali incluir o que consta dos docs. 4 e 5 juntos com a p.i.: a impugnante solicitou à AF o enquadramento tributário do contrato em apreço que, para esse efeito, submeteu à apreciação daquela.
9.ª - Acresce que o facto levado ao n.° 3 do probatório contém uma inexactidão, a qual influencia, decisivamente, a solução a dar à primeira questão controvertida.
10.a - Com efeito, refere-se na sentença que o despacho do Subdirector-Geral dos Impostos, proferido sobre a informação da Direcção de Serviços dos Benefícios Fiscais considerou que "...a remuneração a pagar pela sociedade impugnante (...) não está sujeita a tributação em IRC ..." .
11.a - Sucede que o despacho não trata do IRC , nem de qualquer outro imposto, limitando-se a declarar que a situação em causa "...não está sujeita a tributação ..." (vd. doc. n.° 6 junto com a p.i.) (sublinhado nosso).
12.a - Assim sendo, deve, nos termos do disposto no art. 712.°, n.° 1, al. a) do CPC, ser alterada a matéria de facto levada ao n.° 3 do probatório dele devendo constar "não está sujeita a tributação" em vez de "não está sujeita a tributação em IRC".
13.a - Aliás, a questão controvertida prende-se exactamente com o que se refere na conclusões 6.a e 9.° a 11 .a supra.
14.a - Com efeito, a ora recorrente teve o elementar cuidado de solicitar aos Serviços da AF informação sobre o regime tributário aplicável, agindo com total empenho e transparência.
15.a - E não se limitou a ora recorrente a descrever os termos desse contrato, antes o submeteu à apreciação dos Serviços com a intenção de obter uma indicação, clara e rigorosa, sobre o cumprimento das suas obrigações tributárias.
16.ª - Os Serviços pronunciaram-se nos termos constantes do despacho do Subdirector-Geral dos Impostos de 1994, nada mais restando à sociedade ora recorrente que não fosse actuar em conformidade com a informação prestada.
17ª. - A ora recorrente, agiu de boa-fé e, nessa medida, entendeu que a não sujeição a tributação constante do despacho envolveria todo e qualquer tributo, designadamente o IVA.
18.a - A AF, em acção de inspecção realizada no ano de 2001, adoptou entendimento contrário ao do despacho de 1994 do Subdirector-Geral dos Impostos, passando a considerar devida a retenção de IRC sobre os pagamentos efectuados à B... e, bem assim, a respectiva sujeição a IVA.
19.a -Por isso, no decurso da acção inspectiva a ora recorrente foi notificada para proceder à regularização do IVA do exercício de 1998, apresentando, para o efeito, as declarações de substituição mod. C (vd. doc. n.° 9, a fls. 5, junto com a p.i.).
20.a - O que fez, autoliquidando e deduzindo simultaneamente o imposto, conforme se estabelece nos arts. 6.°, n.° 8, al. a) e 19.°, n.° l, al. c) do CIVA.
21.° - Isto porque o regime aplicável é o plasmado nos arts. 6.°, n.° 8, al. a) e 19.°, n.° 1, al. c) do CIVA, que constitui uma excepção ao princípio da territorialidade em matéria de localização das serviços.
22.ª - Excepção essa, que conduz à autoliquidação do imposto por parte do adquirente do serviço, a ora recorrente TOUL.
23.ª - Conforme F. PINTO FERNANDES e outro in Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, IVA, anotado e comentado, 4° edição, 1997, nota 2.10 ao artigo 6.°, p. 116: "... o adquirente dos serviços deverá proceder à autoliquidação do imposto, mediante a emissão, para efeitos contabilísticos, de uma nota de lançamento, que evidenciará o valor do imposto relativo à prestação de serviços obtida de entidades não residentes em Portugal (...) o imposto autoliquidado por via da aplicação deste n.° 8 não é, afinal, suportado pelo sujeito passivo, uma vez que o Código prevê a sua dedução, nos termos definidos na alínea c) do n.°1 do arigo 19.°. Assim, esta operação terá apenas reflexos contabilísticos, traduzindo-se num acréscimo de igual montante nos saldos das contas de (IVA - liquidado n e de «IVA - dedutível»" (sublinhados nossos).
24ª - De tudo resulta que as operações em causa não determinaram qualquer prejuízo para o Estado porquanto o imposto autoliquidado pela ora recorrente é integralmente dedutível, nos termos da lei.
25ª - A ora recorrente cumpriu o que havia a cumprir, nada mais podendo ser-lhe exigido.
26ª - Acresce que se o despacho de 1994 tivesse determinado a sujeição a IVA dos pagamentos efectuados à B..., nenhum montante do imposto autoliquidado teria sido entregue nos cofres do Estado porque ele teria sido integralmente deduzido.
27ª - Em suma: a ora recorrente entende que a liquidação impugnada é ilegal porque contraria entendimento anterior expresso pela AF e vinculativo para esta, nos termos dos então vigentes arts. 72.° e 73.° do Código do Processo Tributário (CPT) e também em obediência ao que se prescreve no art. 266.°, n.° 2 da Constituição da República Portuguesa (CRP).
28.ª - Mas, ainda que se aceitasse a sujeição a IVA dos pagamentos efectuados no âmbito do contrato em apreço, a liquidação adicional correspondente seria ainda ilegal porque o imposto autoliquidado podia ser integralmente deduzido, conforme resulta do disposto no art. 19.°, n.° 1, al. c) do CIVA.
29.ª - Apenas porque o problema da tributação em IRC (retenções na fonte) é referido na douta sentença sob recurso [als. a) e b) do n.° 5 do probatório, a fls. 4], cumpre esclarecer que as impugnações judiciais deduzidas contra as liquidações adicionais de IRC dos exercícios de 1996 e 1997 foram decididas favoravelmente à recorrente e já transitaram em julgado, respectivamente nos Procs. n.°s 532/04-5/02.3.2 e 978/04-57/02.3.l, ambos da 4.a Unidade Orgânica do Tribunal Tributário de Lisboa.
30.a - Em qualquer daqueles casos, o Tribunal considerou que a AF estava vinculada pela informação escrita que prestara ao contribuinte, tudo de acordo com o disposto nos arts. 72.° e 73.° do CPT, art. 266.°, n.° 2 da CRP e também em consequência do que se estabelece no 6.°-A, n.° 2, al. a) do CPA.
31.ª - No que respeita ao IVA incidente sobre comissões pagas a comissionista (artigos 19.° a 27.° da p.i.), é incorrecta a conclusão ínsita na decisão recorrida segundo a qual a recorrente deduziu imposto em excesso por aplicação de taxas diferentes das adoptadas pela comissionista.
32.ª - Com efeito, e conforme se demonstrou, designadamente pelo depoimento das testemunhas inquiridas, a comissionista preencheu incorrectamente os recibos que emitiu.
33.a - É suficiente, para o efeito, a análise do doc. n.° 13 (declaração de rendimentos mod.10, fl., penúltima linha) junto com a p.i.: os rendimentos pagos à comissionista C...no ano de 1998 cifraram-se em Esc. 8 378 450$00.
34.a - Considerada a taxa de 17% de IVA aplicável, resulta que aquele imposto ascendeu a Esc. 1.424 336$50, que é o montante dedutível pela impugnante.
35.a - Verifica-se nos autos que a impugnante deduziu Esc. 1.486 278$00.
36.a - Daí decorre que foi contabilizada e deduzida em excesso a quantia de Esc. 61 942$00 e não de Esc. 250 469$00, como pretende a AF.
37.a - Sendo ilegais, como são, as liquidações adicionais de IVA sub judice, carecem de fundamento legal as compensações operadas pelos Serviços do IVA nos pedidos de reembolso a que a impugnante tinha direito, provenientes da situação de crédito de imposto.
38.ª - Assim, determinando-se a ilegalidade das liquidações efectuadas pela AF, por violação, ora dos arts. 72.° e 73.° do CPT e 266.°, n.° 2 da CRP, ora do disposto no art. 19.°, n.°1 do CIVA, não pode senão concluir-se serem indevidas, porque ilegais, as compensações operadas pelos Serviços de Reembolsos do IVA.
Termos em que, com o Douto suprimento de Vossas Excelências, que se solicita, deve a sentença recorrida ser revogada por violação, nomeadamente, do preceituado nos arts 72.° e 73.° do CPT, 266.°, n.° 2 da CRP e 19.°, n.° l, al. c) do CIVA e, assim, ser concedido provimento ao Recurso, com as demais consequências legais, designadamente a devolução das quantias de IVA indevidamente compensadas, acrescidas dos correspondentes juros indemnizatórios, nos termos do art. 43.° da LGT, assim se fazendo JUSTIÇA!”
Não foram apresentadas contra – alegações.
O EPGA emitiu o douto parecer no sentido de que o recurso não merece provimento pelas razões a que infra se fará alusão.
Satisfeitos os vistos legais, cumpre decidir.


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2.- Na sentença recorrida, com fundamento nos documentos juntos aos autos, assentou-se a seguinte matéria de facto provada, não provada e respectiva motivação:

“Factos provados:
1-No ano de 1998, a sociedade impugnante, "A...- A..., L.da.", com o n.i.p.c. ..., encontrava-se colectada em I.R.C. no regime geral e pelo Serviço de Finanças de Azambuja e, em I.V.A., no regime normal mensal, devido ao exercício da actividade de indústria de desidratação, C.A.E. 15332 (cfr. relatório da A. Fiscal cuja cópia se encontra junta a fls.78 a 95 do processo administrativo apenso; certidão da C.R.Comercial junta a fls.92 a 98 dos presentes autos);
2-Em 24/2/1992, a sociedade impugnante celebrou acordo intitulado de "contrato de assistência técnica" com a empresa "B..., S.A.", com sede em Lausanne, na Suiça, do qual, além do mais e no seu art°.4, é consagrada uma remuneração, a pagar pela "A...- A..., L.da.", no montante equivalente a 2,5% das suas receitas brutas realizadas, tudo conforme documento que se encontra junto a fls.19 e 20 dos presentes autos e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido (cfr. factualidade admitida pelo impugnante na p.i.);
3-Em 17/1/1994, mediante despacho do Subdirector-Geral dos Impostos, é sancionada informação da Direcção de Serviços dos Benefícios Fiscais, solicitada pela recorrente, considerando que a remuneração a pagar pela sociedade impugnante e identificada no n°.2, dado se considerar uma situação de assistência técnica, não está sujeita a tributação em I.R.C., visto que os serviços são prestados por empresa sem sede ou estabelecimento estável em Portugal (cfr. ofício e documentos juntos a fls.120 e 127 dos presentes autos);
4-Em 19/6/2001, como resultado de acção de inspecção interna incidente sobre a declaração de rendimentos apresentada pela sociedade impugnante e relativa ao ano de 1998, a A. Fiscal estruturou relatório cuja cópia se encontra junta a fls.78 a 95, estando a cópia dos sete anexos junta a fls.96 a 133, tudo do processo administrativo apenso, as quais se dão aqui por integralmente reproduzidas (cfr. factualidade admitida pelo impugnante na p.i.);
5-No relatório identificado no n°.4 refere-se, nomeadamente e no que aos presentes autos interessa:
a) que o disposto no contrato identificado no n°.2 supra vai para além da simples assistência técnica, a que corresponderia uma avença mensal, antes pela natureza dos direitos e deveres estabelecidos e pela forma de remuneração, uma percentagem dos proveitos totais, estamos perante a figura de royalties;
b) que os rendimentos de royalties estão sujeitos a retenção na fonte conforme o previsto no art°.75, n°.1, al.a), do C.l.R.C., no caso do beneficiário ser uma pessoa colectiva;
c) que os royalties constituem prestações de serviços sujeitas a I.V.A. nos termos do art°.6º, n°.8, al. a), do C.I.V.A., mais cabendo, no caso do prestador ser não residente e sem estabelecimento estável em Portugal, ao adquirente dos serviços que seja sujeito passivo, de acordo com o art°.29, n°.3, do mesmo diploma, o cumprimento das obrigações previstas na lei;
d) que deve o sujeito passivo regularizar o I.V.A. em falta relativo ao exercício de 1998, apresentando para o efeito as respectivas declarações de substituição, e sendo o montante em falta na quantia de € 34.295,76, distribuído pelos períodos mensais de Março, Junho, Setembro e Dezembro do mesmo ano;
e) que, relativamente ao mesmo ano fiscal, foi detectada outra irregularidade, a qual consiste no facto da sociedade inspeccionada ter deduzido I.V.A. em valor mais elevado do que a comissionista Elsa Maria Almeida Rocha Durão que lhe presta serviços e que emitiu recibos desconformes com o facturado pelo sujeito passivo;
f) mais exactamente, quer a comissão, quer o I.V.A. considerados pelo comissionista são diferentes dos valores contabilizados pelo sujeito passivo, isto é, a sociedade inspeccionada contabilizou mais custos e deduziu mais I.V.A. do que o facturado, através de recibo, pela comissionista, tudo de acordo com a documentação contabilística a que se teve acesso;
g) em consequência do que, ao abrigo do art°.19, n°.2, do C.I.V.A., se conclui que houve dedução em excesso de imposto no montante total de €1.249,33, distribuído pelos períodos mensais de Maio, Julho e Dezembro de 1998;
6-Em 19/6/2001, com base no relatório identificado no n°.4 supra, a A. Fiscal estruturou a nota de apuramento mod.382, relativa ao ano de 1998 e incidente sobre a actividade da sociedade impugnante, na qual apura o I.V.A. em falta no montante total de €35.545,10, apuramento esse efectuado com base em correcções meramente aritméticas, tudo conforme cópia que se encontra junta a fls.137 do processo administrativo apenso;
7-Em 30/7/2001, com base no relatório e nota de apuramento identificados nos n°s.4 e 6 supra, a A. Fiscal estruturou uma liquidação adicional de I.V.A. e respectivos juros compensatórios, relativa ao ano de 1998, no montante total de €44.752,66 e da qual surge como sujeito passivo a sociedade impugnante, tendo-se fixado o termo final do prazo de cobrança voluntária no pretérito dia 30/9/2001 (cfr. documentos juntos a fls.12 a 18 dos presentes autos; informações exaradas a fls.154 e 156 a 158 do processo administrativo apenso);
8-Em 10/9/2001, a sociedade impugnante apresentou declarações periódicas de I.V.A. de substituição (mod.C), relativas aos períodos de Março, Junho, Setembro e Dezembro de 1998, tudo levando em consideração as conclusões do relatório da A. Fiscal identificado nos n°s.4 e 5 supra (cfr. documentos juntos a fls.63 a 66 dos presentes autos; informações exaradas a fls.154 e 156 a 158 do processo administrativo apenso);
9-Através de ofício datado de 23/11/2001, a A. Fiscal notificou a sociedade impugnante de que, ao abrigo do disposto no art°.83-B, do C.I.V.A., além do mais, procedera à dedução, a título de compensação, dos montantes de imposto e juros compensatórios por si apurados e relativos à liquidação identificada no n°.7 supra, no âmbito dos pedidos de reembolso formulados pela recorrente, tudo no montante de €44.752,66 (cfr. documentos juntos a fls. 69 e 70 dos presentes autos; informação exarada a fls. 154 e 156 a 158 do processo administrativo apenso);
10-Em 2/1/2002, a sociedade "A...- A..., L.da." apresentou junto do Serviço de Finanças de Azambuja a impugnação que deu origem ao presente processo (cfr. carimbo de entrada aposto a fls. 2 destes autos).

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Factos não Provados

Dos factos, com interesse para a decisão da causa, constantes da impugnação e objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam da factualidade supra descrita.

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Motivação da Decisão de Facto

A decisão da matéria de facto efectuou-se com base no exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos e apenso constam, tal como na análise dos mecanismos de admissão de factualidade por parte da impugnante, enquanto espécie de prova admitida no âmbito da relação jurídico-fiscal, embora de livre apreciação pelo Tribunal (cfr.art°.361, do C. Civil), tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.
Os depoimentos das testemunhas arroladas pelo impugnante, constantes de gravação áudio apensa aos presentes autos, não foram levados em consideração pelo Tribunal, dado não conterem factualidade necessária à decisão da causa.
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3. - Perante esta factualidade, cumpre decidir de direito as questões postas e que se enunciam:

a) -Omissão/Inexactidão na sentença de factos relevantes para a decisão (conclusões 5ª a 12ª);
b) - Extensão da Informação prestada pela AT e ilegalidade da liquidação por contrariar o entendimento anterior expresso pela AF e vinculativo para esta e da dedução do IVA (conclusões 13ª a 36ª);
c) -Ilegalidade das compensações (conclusões 37ª e 38ª).

Assim:

Da omissão/Inexactidão na sentença de factos relevantes para a decisão:
Funda-as a recorrente em que deveria ter sido levado ao probatório, a seguir ao n.° 2, o que se alega nos artigos. 3.°, 4.° e 6.° da p.i. comprovado pelo teor dos docs. n.°s 4 e 5 com aquela juntos, isto é, que celebrado o contrato a que se alude no n.° 2 do probatório, a impugnante tomou a iniciativa de solicitar à AF o respectivo enquadramento tributário, para o que lhe remeteu o aludido contrato, só depois devendo referir-se o despacho proferido pelo Subdirector -Geral dos Impostos sobre o pedido de informação da impugnante, conforme n.° 3 do probatório.
Por assim ser, entende que de acordo com o que se dispõe no art. 712°do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi art. 2.°, al. e) do CPPT, deve ser alterada a matéria de facto, ampliando-a, no sentido de ali incluir o que consta dos docs. 4 e 5 juntos com a p.i.: a impugnante solicitou à AF o enquadramento tributário do contrato em apreço que, para esse efeito, submeteu à apreciação daquela.
Por outro lado, segundo a recorrente, o facto levado ao n°3 do probatório contém uma inexactidão, a qual influencia, decisivamente, a solução a dar à primeira questão controvertida, ao referir-se na sentença que o despacho do Subdirector-Geral dos Impostos, proferido sobre a informação da Direcção de Serviços dos Benefícios Fiscais considerou que "...a remuneração a pagar pela sociedade impugnante (...) não está sujeita a tributação em IRC...", quando é certo que o despacho não trata do IRC, nem de qualquer outro imposto, limitando-se a declarar que a situação em causa "...não está sujeita a tributação ..." (vd. doc. n.° 6 junto com a p.i.), pelo que, nos termos do disposto no art. 712.°, n.° 1, al. a) do CPC, deve ser alterada a matéria de facto levada ao n.° 3 do probatório dele devendo constar "não está sujeita a tributação" em vez de "não está sujeita a tributação em IRC".
Saber se os factos em relação aos quais a Recorrente considera que houve omissão no probatório deviam ou não ter sido objecto de apreciação na sentença, designadamente para serem julgados provados ou não provados, por serem relevantes para o enquadramento jurídico das questões a apreciar e decidir, é matéria que se coloca claramente no âmbito da validade substancial da sentença, que não no da sua validade formal. Ou seja, o facto de na sentença não ter sido considerada a factualidade – provada e não provada - referida pela Recorrente poderá constituir erro de julgamento.
Mesmo que se considere que a alegação da Recorrente é no sentido de que na sentença não foi apreciada a questão de saber se dados factos – provados e não provados - de que partiu correspondem à realidade e imporiam a procedência da impugnação, sempre haverá que ter em conta que, em relação às questões suscitadas pelo contribuinte, só há obrigação de conhecer daquelas cuja apreciação não tenha ficado prejudicada pela resposta dada a outras (cfr. art. 660.º, n.º 2, do CPC).
Todavia, a nosso ver, os factos essenciais, e com interesse para a decisão da causa, foram, provados uns e não provados outros, analisados na sentença aos quais, depois, se aplicou o direito.
Todas as questões pertinentes, quer de facto quer de direito, foram objecto de apreciação, sendo que na hipótese de erro de julgamento em virtude de os factos indicados pela recorrente como tendo sido omitidos na sentença e que se verificaram como decorre, segundo alega, dos documentos juntos aos autos (erro de julgamento da matéria de facto) só nesse âmbito cabendo apreciar se foram preteridos os principio da verdade material que afastaram o principio da objectividade.
É que a questão dos meios probatórios é uma questão processual, prévia e instrumental em relação à decisão final, pelo que a omissão na sentença do de­ferimento ou indeferimento de um meio probatório e/ou a sua insuficiente fundamentação, sendo nossa inabalável convicção que não assiste qualquer razão à recorrente porquanto no probatório da sentença se vê que o Mº Juiz «a quo» julgou com base nos autos valorando e interpretando os factos apurados no julgamento à luz dos interesses e finalidades que o legislador quis defender, presentes nas normas jurídicas aplicáveis a cada hipótese.
Essa indagação não foi feita pelo MºJuiz «a quo» mediante a apreciação crítica da prova com base nas normas que regulam nesta jurisdição o direito probatório material e o princípio da aquisição processual diz-nos que o material necessário à decisão e aduzido ao processo por uma das partes - sejam alegações, sejam motivos de prova pode ser tomado em conta mesmo a favor da parte contrária àquela que o aduziu. Reputa-se adquirido para o processo; pertence à comunidade dos sujeitos processuais. (Castro Mendes, Dir. Proc. Civil, 1980, III-209. No mesmo sentido veja-se, do mesmo autor Do Conceito de Prova em Processo Civil. l 66).
Ora, tudo isto foi respeitado na sentença recorrida em que se ponderaram todos os elementos de prova, não procedendo a questão da insuficiência probatória, fundada na existência de documentos e que se conecta com a pretensa divergência factual quanto ao conteúdo dos referidos documentos, o que envolve, necessariamente, a discussão sobre a boa ou má fixação dos respectivos conteúdos no probatório.
Nesse sentido, diga-se que o ónus de prova incumbe, por via de regra, à parte que toma a iniciativa de peticionar a concessão da providência jurisdicional no caso concreto que submete a juízo.
Seguindo Anselmo de Castro, in "Direito Processual Civil Declaratório", Vol-III, Almedina/1982, págs, 352/353, temos que "[...] o ónus de prova aparece sempre como inerente à própria norma jurídica a aplicar, devidamente interpretada, circunstância que igualmente tem que ser tomada em conta na aplicação, no tempo e no espaço, da lei reguladora do mesmo ónus. Assim, será aplicada em cada caso a lei vigente ao tempo do nascimento da relação jurídica controvertida [...] O que para um direito ou no domínio de uma relação jurídica é facto impeditivo, para outro bem pode ser facto constitutivo. É, pois, à respectiva norma ou normas aplicáveis e só a elas, que há que recorrer."
O ónus de alegação e, portanto, a causa de pedir em sede de impugnação judicial do acto tributário por erro de facto sobre os pressupostos e quantificação do facto tributário é consequência do regime de ónus de prova a cargo do impugnante que, por sua vez, se determina pelo regime substantivo que enforma a relação jurídica controvertida e a que se reporta o pedido de anulação da liquidação de imposto no caso concreto.
Rege aqui o princípio geral estatuído no artº 342º nº 1 C. Civil - a parte que invoca o direito é onerada com a prova dos respectivos factos constitutivos - na medida em que a reacção contra o acto tributário para apreciação da sua correspondência com a lei no momento em que foi praticado é da iniciativa de quem exerce o direito de acção, ou seja, do autor da causa.
Consequentemente, a parte que deve exercer a actividade probatória relativamente aos factos que servem de fundamento à acção, de acordo com o princípio do dispositivo e sob pena de correr o risco de ver repelida a pretensão que deduziu em juízo (artº 516º CPC) é, precisamente, a parte que exerce esse direito de acção, no caso, de impugnação do acto tributário.
Assim, corria pela impugnante, ora recorrente, o encargo de demonstrar a realidade do facto alegado, melhor dizendo, o encargo de produzir prova de modo a atingir o grau de verosimilhança suficiente para formar a convicção de existência do facto que fundamenta a decisão de direito peticionada em Tribunal.
Ónus subjectivo que não preclude, atento o princípio da aquisição processual e do inquisitório (artº 515º CPC) C), que o impugnante beneficie da actividade probatória alheia, seja da parte contrária, seja do Tribunal. Com os critérios legais da repartição do ónus de prova importa conjugar os critérios legais da eficácia probatória (regras probatórias fixadas em abstracto), na medida em que o ónus de contraprova ou carece de prova principal, a chamada prova do contrário em oposição à prova legal plena nos termos do artº 347º C. Civil, ou de simples contra-prova indirecta, nos termos do artº 346º C. Civil, bastando, neste caso, que a parte não sujeita ao ónus subjectivo lance a dúvida sobre os factos que ao outro incumbe provar.
De acordo com estes princípios, e sendo seguro que o ónus de prova da factualidade alegada na petição em vista da anulação da liquidação incumbia à Recorrente, a força probatória da documentação que ela agora suscita nas conclusões sob análise para peticionar a alteração/correcção do probatório, torna questionável a relevância e, por isso, a utilidade da indagação sobre as questões factuais que atrás se apontaram em resultado das alegações da recorrente.
Assim, nos pontos 2 e 3 do probatório, consignou-se que em 24/2/1992, a sociedade impugnante celebrou acordo intitulado de "contrato de assistência técnica" com a empresa "B..., S.A.", com sede em Lausanne, na Suiça, do qual, além do mais e no seu art°.4, é consagrada uma remuneração, a pagar pela "A...- A..., L.da.", no montante equivalente a 2,5% das suas receitas brutas realizadas, tudo conforme documento que se encontra junto a fls.19 e 20 dos presentes autos e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido (cfr. factualidade admitida pelo impugnante na p.i.).
Tendo isso em conta, em 17/1/1994, mediante despacho do Subdirector-Geral dos Impostos, é sancionada informação da Direcção de Serviços dos Benefícios Fiscais, solicitada pela recorrente, considerando que a remuneração a pagar pela sociedade impugnante e identificada no n°.2, dado se considerar uma situação de assistência técnica, não está sujeita a tributação em I.R.C., visto que os serviços são prestados por empresa sem sede ou estabelecimento estável em Portugal (cfr. ofício e documentos juntos a fls.120 e 127 dos presentes autos).
Na verdade e como se vê da informação prestada a fls. 121, a contribuinte solicitara “informação relativamente à forma da tributação relativa aos rendimentos derivados de um contrato de assistência técnica, tendo em conta a Convenção sobre dupla tributação celebrada entre Portugal e a Suiça”, tendo em conta a situação especificada no ponto 2 do probatório, isto é, a celebração, em 24/2/1992, pela recorrente e a empresa "B..., S.A.", com sede em Lausanne, na Suiça, do acordo intitulado de "contrato de assistência técnica".
Na dita informação (cfr. fls. 121 a 123) identifica-se a questão colocada como sendo a “…relativa à tributação da remuneração a pagar à B... ou, de outra forma, se o pagamento da assistência técnica a outra empresa estrangeira sem estabelecimento estável em Portugal (presume-se) é sujeito de IRC.”
Logo a seguir é referido que “Para a resposta cabal a esta questão torna-se necessário delimitar o conceito de assistência técnica para efeitos de tributação do rendimento, em especial no que respeita aos rendimentos provenientes de assistência técnica prestada por não residentes em Portugal”.
Assim delimitado o objecto da informação a prestar, sobre a mesma veio a ser adoptado o entendimento de que “Face ao artigo 4º do Código do IRC verificamos que estes rendimentos comerciais só serão tributados se for possível a sua imputação a um estabelecimento estável, o que não é o caso”.
Destarte, sobre a alegada alteração e ampliação da factualidade pretendida pela recorrente, ao abrigo do disposto no artigo 712°/1/a) do CPC a mesma não é de atender, uma vez que a sentença recorrida fez uma rigorosa apreciação e análise da matéria de facto, fixando toda a factualidade com interesse para a decisão causa segundo as várias soluções de direito plausíveis pois é patente dos elementos de suporte da fundamentação da sentença acabados de analisar que não é correcto afirmar-se, como faz a recorrente, que a AT, na informação vinculativa suscitada sobre a tributação do contrato em causa não tenha referido que a sustentada não tributação não abrangia o IVA.
É que, como acabámos de demonstrar, clara e expressamente a sustentada não tributação, apenas se reporta ao IRC.
Do que vem dito e conforme salienta o EPGA no seu douto parecer, cai por base toda argumentação avançada pela recorrente e conexionada com este facto objectivo e indesmentível.
Termos em que improcedem as conclusões sob análise.
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Da extensão da Informação prestada pela AT
Nas conclusões 13ª a 17ª sustenta a recorrente que teve o elementar cuidado de solicitar aos Serviços da AF informação sobre o regime tributário aplicável, agindo com total empenho e transparência, não se limitando a descrever os termos desse contrato, antes o submeteu à apreciação dos Serviços com a intenção de obter uma indicação, clara e rigorosa, sobre o cumprimento das suas obrigações tributárias. E os Serviços pronunciaram-se nos termos constantes do despacho do Subdirector -Geral dos Impostos de 1994, nada mais restando à sociedade ora recorrente que não fosse actuar em conformidade com a informação prestada, agindo de boa-fé e, nessa medida, entendeu que a não sujeição a tributação constante do despacho envolveria todo e qualquer tributo, designadamente o IVA.
Em boa medida a solução desta questão encontra-se na que foi dada supra sobre a insuficiência probatória assacada pela recorrente à sentença recorrida e em que se concluiu que a AT, na informação vinculativa suscitada sobre a tributação do contrato em causa não tenha referido que a sustentada não tributação não abrangia o IVA.
Não obstante, ao nível da eficácia probatória ou, melhor dizendo, da extensão e limites da informação prévia vinculativa em vista do caso concreto, há que proceder a várias precisões.
É que na origem da informação prévia vinculativa está, por um lado, a intenção de facilitar o cumprimento das obrigações fiscais por parte dos contribuintes, atenta a complexidade e diversidade da legislação fiscal e, por outro lado, alcançar uma maior transparência na relação fisco – contribuinte.
A obtenção da informação vinculativa, está condicionada a alguns formalismos que têm de ser cumpridos (art. 68° n.º s l, 2, e 3).
Assim, o contribuinte interessado poderá solicitar uma informação vinculativa à administração tributária. A lei refere expressamente o interessado ou o seu representante legal como sendo as pessoas que poderão efectuar essa solicitação, mas do n.° 3 do art. 68.° da LGT decorre que é permitida a prestação de informações vinculativas a advogados ou outras entidades legalmente habilitadas a exercer consultadoria fiscal, relativamente à concreta situação jurídico -tributária dos seus representados.
O pedido de informação vinculativa deverá ser dirigido, por escrito, ao dirigente máximo do serviço, o Director Geral dos Impostos, entidade hierarquicamente mais elevada da DGCI, o que bem se compreende, atentos os efeitos que lhe estão associados. Em regra, esses pedidos são objecto de parecer prévio da Direcção de Serviços que tem a seu cargo o imposto em causa (DSIRS, DSIRC, DSIVA, DSCA ou outro) e só posteriormente são submetidos à consideração do Director Geral dos Impostos ou da entidade a quem o mesmo delegou competência.
Acresce que além da correcta identificação do requerente (NBF/NIPC, nome completo/designação social e residência/sede) o pedido deve ser acompanhado da descrição dos factos cuja qualificação jurídico -tributária se pretenda.
Estes elementos são essenciais ao nível do instituto da informação vinculativa porquanto, para informar e decidir em casos concretos é necessário que a descrição dos factos seja o mais clara e completa possível, até para mais tarde poder associar esse mesmo caso concreto à informação vinculativa e assim mais facilmente beneficiar dos efeitos consignados na lei.
Destarte, a administração tributária é chamada a pronunciar-se sobre as situações tributárias dos contribuintes e sobre os pressupostos ainda não concretizados de quaisquer benefícios fiscais. (1)
A lei não restringe o âmbito quanto ao tipo de situações tributárias que podem ser objecto de informação vinculativa pelo que um contribuinte com dúvidas pertinentes ao nível do enquadramento jurídico -fiscal de uma certa realidade tributária, pode colocá-las à administração tributária, em vez de, ele próprio, assumir uma posição sobre a questão e conformar-se com as consequências que daí poderiam advir.
A informação prestada pela administração tributária tem carácter vinculativo, ou seja, não pode a mesma proceder de forma diversa em relação ao sentido da informação prestada (art. 68° nº2 da LGT). Quis o legislador, ao fazer com que a administração tributária ficasse vinculada à resposta que prestou, garantir ao contribuinte que, naquele caso concreto, a mesma não procederia de forma diversa (estabilidade e segurança na relação fisco -contribuinte).
A essa luz, o contribuinte, ao actuar de acordo com a informação vinculativa (embora a informação não seja vinculativa para si) prestada pela administração tributária relativamente a uma concreta situação tributária, não pode ser responsabilizado por essa conduta. Significa que o contribuinte ao cumprir e seguir estritamente a informação vinculativa, não pode, por exemplo, vir a ser responsabilizado pela prática de uma infracção fiscal de tipo contra -ordenacional. E se, eventualmente, os Serviços de Inspecção Tributária ou outros da DGCI, por diferentes critérios que não os resultantes da informação vinculativa, alterarem o sentido desta última, o contribuinte pode defender-se, alegando ter cumprido o estabelecido nessa mesma informação, aliás vinculativa para todos os serviços da administração tributária. Porém, quando esses serviços constatam que a situação factual que esteve na origem da informação vinculativa, não corresponde inteiramente à realidade, a DGCI não tem que ficar vinculada à informação que havia prestado anteriormente visto que a mesma teve por base uma errónea descrição dos factos.
Saliente-se que a isenção de responsabilidade foi alargada para outras situações que não só as de informação vinculativa, concretamente as instruções escritas transmitidas pela administração tributária e as orientações genéricas constantes de circulares, regulamentos ou instrumentos de idêntica natureza emitidas sobre a interpretação das normas tributárias (art. 68° n°4 da LGT).
Aqui chegados, importa referir, com relevo para a questão das consequências da informação, que o carácter vinculativo da informação apenas vale para aquele caso concreto que lhe deu origem isso porque os efeitos derivados da resposta da administração tributária, não se podem estender a outras situações, uma vez que a análise feita parte da ponderação de uma situação concreta e específica (doutrina para o caso concreto).
E, mais importante ainda, os Tribunais, como órgãos de soberania independentes não estão subordinados às decisões tomadas em matéria fiscal pela administração, ainda que vinculativas para esta, na medida em que aos Tribunais compete interpretar e aplicar a lei fiscal sem qualquer dependência dos critérios adoptados pela administração e daí que, sendo proferida decisão judicial em sentido diverso daquele que foi seguido na informação vinculativa, a administração tenha de a respeitar e fazer executar.
Na verdade, tal como as circulares administrativas não vinculam os contribuintes, mas apenas os respectivos serviços.
É que, se é certo que os tribunais estão apenas sujeitos à lei, pelo que não os vincula qualquer orientação administrativa de que decorra uma certa interpretação da mesma, as circulares administrativas (bem como as informações prévias) não vinculam os contribuintes, mas apenas os respectivos serviços e, face à lei, os procedimentos definidos, «maxime» o “direito circulado” da AF não podem derrogar o princípio da legalidade tributária pelo que, a essa luz, será possível afirmar a desconformidade do conteúdo do acto recorrido com as normas legais referidas e, deste modo, que os pressupostos realmente existentes impunham a decisão administrativa de sinal contrário, sendo certo que o Juiz, mesmo que tivesse conhecimento da informação prévia vinculativa, não estava vinculada àquela decisão administrativa.
Assim sendo, porque, como já ex abundantis se demonstrou, na informação vinculativa suscitada sobre a tributação do contrato em causa não estava abrangida a tributação em sede de IVA mas, apenas, clara e expressamente a sustentada não tributação, apenas se reportava ao IRC, não procede a alegação da ora recorrente de que actuou em conformidade com a informação prestada, agindo de boa-fé ao entender que a não sujeição a tributação constante do despacho envolveria todo e qualquer tributo, designadamente o IVA.
Já no que tange à sustentada não ocorrência de prejuízos para o Estado, na sequência, nomeadamente, da entrega de declarações de substituição modelo c e consequente autoliquidação e simultânea dedução do tributo, concorda-se com o que nessa matéria se expende na sentença recorrida.
No ponto, a recorrente admite serem os serviços prestados pela empresa "B..., SA" passíveis de inclusão no âmbito de incidência dos direitos análogos a que alude o art°.6, n°.8, al. a), do C.I.V.A., em virtude do que deveria a mesma proceder à autoliquidação do imposto mediante a emissão de uma nota de lançamento que evidencie, para efeitos contabilísticos, o valor do I.V.A. relativo à prestação de serviços obtida de entidade não residente em Portugal. Todavia, pretende a impugnante que o imposto assim autoliquidado pode ser deduzido pela recorrente nos termos do art°.19, n°.1, al.c), do C.I.V.A., pelo que conclui que da falta de liquidação atempada de I.V.A. não resultou qualquer prejuízo para o Estado, já que nenhuma quantia havia a entregar nos seus cofres. Por outro lado, a liquidação do I.V.A. alegadamente em falta e a correspondente dedução já foram realizadas pela impugnante, através da entrega das declarações de substituição relativas a quatro meses do ano de 1998, pelo que, nada mais se lhe pode exigir no que diz respeito a esta vertente da liquidação ora impugnada.
Ora, como bem salienta o Mº Juiz «a quo», a recorrente parece concordar com a posição da Fazenda Pública de enquadrar, para efeitos de tributação em I.V.A., os serviços prestados pela sociedade "B..., S.A." no âmbito de incidência dos direitos análogos a que alude o art°.6, n°.8, al.a), do C.I.V.A., assim não se podendo dizer que discorda desta correcção efectuada pela A. Fiscal.
Não obstante, em plena concordância com a sentença recorrida, impõe proceder à análise da liquidação impugnada, o que passa pela determinação da natureza do contrato identificado no n°.2 da matéria de facto provada e celebrado em 24/2/1992 entre a sociedade impugnante e a citada "B..., S.A.".
Ora, a FP fundamenta a correcção em exame na factualidade constante do n°.5, als. a) a d), do probatório, a saber:
a) que o disposto no contrato identificado no n°.2 supra vai para além da simples assistência técnica, a que corresponderia uma avença mensal, antes pela natureza dos direitos e deveres estabelecidos e pela forma de remuneração, uma percentagem dos proveitos totais, estamos perante a figura de royalties;
b) que os rendimentos de royalties estão sujeitos a retenção na fonte conforme o previsto no art°.75, n°.1, al.a), do C.l.R.C., no caso do beneficiário ser uma pessoa colectiva;
c) que os royalties constituem prestações de serviços sujeitas a I.V.A. nos termos do art°.6º, n°.8, al. a), do C.I.V.A., mais cabendo, no caso do prestador ser não residente e sem estabelecimento estável em Portugal, ao adquirente dos serviços que seja sujeito passivo, de acordo com o art°.29, n°.3, do mesmo diploma, o cumprimento das obrigações previstas na lei;
d) que deve o sujeito passivo regularizar o I.V.A. em falta relativo ao exercício de 1998, apresentando para o efeito as respectivas declarações de substituição, e sendo o montante em falta na quantia de € 34.295,76, distribuído pelos períodos mensais de Março, Junho, Setembro e Dezembro do mesmo ano.
Impõe-se, por isso, determinar se in concreto o objecto do contrato em causa versa sobre assistência técnica por parte da empresa "B..., SA" à sociedade impugnante (conforme as partes fizeram constar como título do mesmo acordo) ou, ao invés, tal acordo revela uma prestações de serviços paga em royalties e tributável pela lei fiscal portuguesa, além do mais, em sede de I.V.A.
Neste passo excerta-se a sentença por se considerar que nela se faz um correcto enfoque:
“É grande a ambiguidade que rodeia na legislação comparada os conceitos de "contrato de Know-how", de "contrato de prestação de serviços técnicos" e de "contrato de assistência técnica", todos relacionados com uma ampla e confusa noção de "transferência de tecnologia". E dizemos ampla e brumosa porque o conceito de "transferência de tecnologia" tem sido consagrado na lei com finalidades muito distintas. Umas vezes, visando a disciplina do regime de remessas cambiais relacionadas com o investimento estrangeiro. Outras, no âmbito da legislação "anti-trust" ou de defesa da concorrência. Outras ainda, para efeitos tributários. De tal modo, que pode afirmar-se, sem hesitação, não existir um conceito técnico-jurídico uniforme relativo a tal noção de "transferência de tecnologia" (cfrAlberto Xavier, Direito Tributário Internacional, 2a. edição actualizada, Almedina, Março de 2007, pág.694 e seg.).
O "contrato de Know-how" tem por objecto a transmissão de informações tecnológicas preexistentes e não reveladas ao público, em si mesmas consideradas, na forma de cessão temporária ou definitiva de direitos, para que o adquirente as utilize por conta própria e sem que o transmitente intervenha na aplicação da tecnologia cedida ou garanta o seu resultado. Ao invés, o contrato de prestação de serviços técnicos (engineering) tem por objecto a execução de serviços que pressupõem, por parte do prestador, uma tecnologia, a qual, porém, não se destina a ser transmitida, mas antes a ser meramente aplicada ao caso concreto mediante ideias, concepções e conselhos baseados num estudo pormenorizado de um projecto. Por outras palavras, no contrato de Know-how transfere-se tecnologia, enquanto no contrato de prestação de serviços técnicos (engineering) se aplica tecnologia. Para efeitos fiscais, a remuneração do "Know how" (royalties) constitui um rendimento de capital, uma vez que visa retribuir um capital tecnológico previamente acumulado que é posto à disposição do beneficiário, enquanto a remuneração da prestação de serviços técnicos deve considerar-se um preço de venda do serviço em si mesmo considerado e não a retribuição de um factor de produção ou de uma tecnologia cuja transmissão não é, em si, objecto do contrato (cfr.Alberto Xavier, ob.cit, pág.696 e 699; ac.S.T.A.-2a.Secção, 8/3/2006, rec.845/05; ac.T.C.A.Sul-2a. Secção, 5/5/2009, proc.2414/08).
Feita a distinção entre os contratos de "Know how" e de prestação de serviços técnicos (engineering), importa agora caracterizar os contratos de assistência técnica, os quais se devem diferenciar destes últimos, os de "engineering". Desde logo, se deve dizer que o substantivo feminino "assistência" revela que a prestação de serviços que é objecto do contrato em causa não tem carácter autónomo e independente, antes sendo complementar ou acessória de outra operação prevista no mesmo contrato ou em contrato separado. Com efeito, em certos casos a transmissão de informação (Know how) não se esgota na simples cessão de direitos, antes exigindo complementarmente uma actividade continuada de prestação de serviços, permanentes ou periódicos, pela qual a informação tecnológica seja plenamente colocada à disposição do cessionário. Ora, é precisamente nestes casos que ocorre a figura da "assistência técnica". A "assistência distingue-se da prestação de serviços técnicos (engineering), pois enquanto neste último caso a prestação de serviços se constitui como objecto principal do contrato em causa, no primeiro a prestação de serviços é meramente instrumental relativamente ao objecto principal do contrato que consiste na transmissão de uma informação tecnológica (Know how). No contrato de prestação de serviços técnicos as partes querem a própria execução de um determinado serviço e não uma "assistência" na aquisição de informação tecnológica; no contrato de "assistência técnica" as partes querem uma informação tecnológica, a qual é conjugada com a prestação de um serviço complementar ou instrumental (cfr.Alberto Xavier, ob.cit, pág.702 e seg.; ac.S.T.A.-2a.Secção, 8/3/2006, rec.845/05; ac.T.C.A.Sul-2a. Secção, 29/3/2005, proc.2113/99; ac.T.C.A.Sul-2a. Secção, 5/5/2009, proc. 2414/08).
Ora, é precisamente o carácter complementar ou instrumental da assistência técnica relativamente à transmissão de informação resultante de experiência adquirida que levou a lei portuguesa a submeter a respectiva remuneração ao mesmo regime tributário do "Know how", ou seja, a considerá-la como rendimento de capital. Mas a referida complementaridade ou acessoriedade, leva também e por outro lado, a concluir que somente podem ser qualificados como de assistência técnica, para efeitos fiscais, os contratos que, seja qual for a sua qualificação, tenham natureza complementar ou instrumental de contratos de transferência de capital tecnológico ou de outra realidade tributável em sede de "royalties". Pelo contrário, a "assistência técnica" não pode, de modo algum, abranger os contratos em que o objecto principal seja a prestação de serviços, ainda que de conteúdo técnico, pois a remuneração destes não é, por natureza, rendimento de capital, antes devendo considerar-se como rendimento do trabalho. Em suma, só pode falar-se em "assistência técnica" (no sentido em que a expressão é utilizada pela lei fiscal portuguesa -cfr.art°.6, n°.1, al.m), do C.I.R.S.; art°.69, n°.2, al.a), do C.I.R.C.) quando exista um nexo de complementaridade ou instrumentalidade em relação a uma operação que aquela visa "assistir" e que consiste numa transmissão de "Know how" em si mesmo considerado. Mais se devendo referir que a tributação da assistência técnica em sede de "royalties" deve ser interpretada de forma restritiva (cfr.Alberto Xavier, ob.cit., pág.705 a 708).”
Sob esse prisma e ainda na esteira da sentença, atenta a matéria fáctica provada sob o n°.2 do probatório em que se titula de "assistência técnica" o contrato com a empresa "B..., S.A.", com sede em Lausanne, na Suiça, do qual, além do mais e no seu art°.4, é consagrada uma remuneração, a pagar pela "A...- A..., L.da.", no montante equivalente a 2,5% das suas receitas brutas realizadas, deve concluir-se que o acordo celebrado pela sociedade impugnante com a empresa "B..., S.A." se deve qualificar como verdadeiro contrato de transmissão de informações tecnológicas preexistentes e não reveladas ao público, em si mesmas consideradas ("Know how"), no caso, as informações relativas à pesquisa e afinação dos processos de fabrico e produção já utilizados, tal como a introdução, lançamento ou exploração de qualquer outro novo processo de fabrico ou de produção de que a "B..., S.A." venha a dispor.
Donde que, os pagamentos consagrados no acordo em análise referem-se a verdadeiros "royalties", derivados de contrato de "Know how", consubstanciando-se em percentagens (2,5%) associadas ao lucro bruto tido pela sociedade impugnante.
Sendo verdadeiros "royalties" pagos pela sociedade impugnante a empresa sem sede, direcção efectiva ou estabelecimento estável em Portugal, estavam os respectivos montantes sujeitos a tributação em sede de I.R.C., atento o disposto no art°.69, n°.2, al.a), do C.I.R.C., e sendo a sua retenção na fonte consagrada no art°.75, n°.1, al.a), do mesmo diploma (na redacção em vigor em 1998 - cfr.art0.12, do C.Civil).
E no que respeita ao IVA – imposto em causa nos autos?
Há que salientar, como o sinaliza a sentença recorrida, que as regras de localização das prestações de serviços constantes do art°.6, do C.I.V.A., constituem uma das matérias de mais difícil resolução em sede de I.V.A., as quais se consubstanciam na transposição das normas consagradas no art°.9, da Sexta Directiva (cfr. Directiva 77/388/CEE, do Conselho, de 17/5/1977; Clotilde Celorico Palma, Introdução ao Imposto Sobre o Valor Acrescentado, Cadernos do I.D.E.F.F., n°.1, 2a.edição, Almedina, 2005, pág.85 e seg.).
Assim, o preceito em análise estabelece no seu nº 4 uma regra geral de localização das prestações de serviços, consagrando nos seus nºs 5,6,8,9 e 10 excepções àquela regra geral e, nos nºs 9,11 e 12 excepções às excepções.
Releva aqui a excepção prevista no n°.8 do que estende a área de incidência do tributo aos casos em que o adquirente (e não o prestador) dos serviços (serviços de natureza empresarial) seja sujeito passivo de imposto com sede, estabelecimento estável ou domicílio no território nacional.
Aqui estão abrangidas as prestações de serviços que tenham por objecto a cessão ou concessão de direitos de autor, licenças, marcas de fabrico e de comércio e outros direitos análogos, nos termos da al.a), do n°.8, do art°.6, do C.I.V.A. (cfr. Clotilde Celorico Palma, ob.cit, pág.88; F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, C.I.V.A. anotado e comentado, Editora Rei dos Livros, 4a. edição, 1997, pág.115).
«In casu» as prestações de serviços questionadas pelo Fisco estão sujeitas a I.V.A. nos termos do art°.6, n°.8, al.a), do C.I.V.A., dado que não se verifica a excepção à excepção prevista no n°.9 do mesmo artigo o que quer dizer que a sociedade impugnante, enquanto adquirente dos serviços em causa, não se enquadra na previsão das normas constantes das als.a) e b), do n°.9, do art°.6, do C.I.V.A., pelo que deveria ter procedido à autoliquidação do imposto em causa, incidente sobre o pagamento das prestações de serviços efectuadas pela empresa "B..., S.A.", mediante a emissão, para efeitos contabilísticos, de uma nota de lançamento que evidenciasse o valor do imposto relativo à mesma prestação de serviços obtida de entidade não residente em Portugal.
Donde que, a liquidação impugnada encontra-se devidamente fundamentada e tem suporte legal, tal como a própria recorrente admite na p.i.
No entanto, a impugnante entende que o imposto assim autoliquidado pode ser por si deduzido nos termos do art°.19, n°.1, al.c), do C.I.V.A., e, assim, sustenta que da falta de liquidação atempada de I.V.A. não resultou qualquer prejuízo para o Estado, já que nenhuma quantia havia a entregar nos seus cofres.
Ora, tal como demonstra o Mº Juiz « a quo», secundado pelo EPGA, visto que da não liquidação atempada do I.V.A. incidente sobre as prestações de serviços em causa podem derivar prejuízos para a Fazenda Pública expressos em eventuais juros compensatórios (cfr.art°.89, do C.I.V.A.), acrescendo que a liquidação impugnada, na data em que foi efectuada (30/7/2001 - cfr.n°.7 da matéria de facto provada), estava devidamente fundamentada na lei, visto que a impugnante somente em 10/9/2001 apresentou declarações periódicas de I.V.A. de substituição (mod.C), relativas aos períodos de Março, Junho, Setembro e Dezembro de 1998 (cfr.n°.8 da matéria de facto provada).
Assim, não sobram dúvidas de que podiam advir prejuízos para o Estado expressos em eventuais juros compensatórios, nos termos do estatuído no artigo 89.° do CIVA.
Por outro lado, como decorre do disposto no art°.19, n°.1, do C.I.V.A., o regime de dedução do I.V.A. reveste a natureza de um direito do sujeito passivo, inversamente ao que sucede no regime de liquidação do mesmo tributo que constitui uma obrigação da Fazenda Pública estando sujeito a prazos, nomeadamente de caducidade, como claramente resulta dos art°s.88, do C.I.V.A. e 45º da LG.T.
No ponto e como enfatiza o EPGA, a liquidação ou autoliquidação do tributo constitui uma obrigação ou dever legal, indisponível, sujeito, nomeadamente, a prazos de caducidade (artigos 88.° do CIVA e 45.° da LGT), sendo, em contrapartida, o direito à dedução um direito do sujeito passivo, disponível dado que tal direito à dedução é efectuado nos termos do disposto no artigo 19.° e seguintes do CIVA, não devendo a AT através do seus serviços de fiscalização substituir-se ao sujeito passivo, apurando o seus créditos perante o Estado, tanto assim que o artigo 82.° do CIVA manda, tão somente, averiguar as deduções superiores às devidas e não as inferiores.
Por outro lado e no que se refere ao I.V.A. em falta incidente sobre os pagamentos efectuados a título de comissões a uma comissionista da impugnante cujo tributo a A. Fiscal corrigiu na quantia de €1.249,33, por entender que foi deduzido imposto em excesso nesse montante, considera a mesma que, também neste caso, tem direito a deduzir o I.V.A. em causa nos termos do art°.19, n°.1, do C.I.V.A. Acresce ainda que, somente pode ser exigido à recorrente a diferença entre a aplicação da taxa de 20% e a de 17% no cálculo do imposto, não lhe podendo ser imputada responsabilidade quanto ao errado preenchimento dos recibos por parte da sua comissionista.
No entanto a Fazenda Pública fundamenta a correcção em exame na factualidade constante do n°.5, als. e) a g), do probatório, a saber:
e) que, relativamente ao mesmo ano fiscal, foi detectada outra irregularidade, a qual consiste no facto da sociedade inspeccionada ter deduzido I.V.A. em valor mais elevado do que a comissionista Elsa Maria Almeida Rocha Durão que lhe presta serviços e que emitiu recibos desconformes com o facturado pelo sujeito passivo;
f) mais exactamente, quer a comissão, quer o I.V.A. considerados pelo comissionista são diferentes dos valores contabilizados pelo sujeito passivo, isto é, a sociedade inspeccionada contabilizou mais custos e deduziu mais I.V.A. do que o facturado, através de recibo, pela comissionista, tudo de acordo com a documentação contabilística a que se teve acesso;
g) em consequência do que, ao abrigo do art°.19, n°.2, do C.I.V.A., se conclui que houve dedução em excesso de imposto no montante total de €1.249,33, distribuído pelos períodos mensais de Maio, Julho e Dezembro de 1998.
Ora, de tal factualidade decorre com segurança que o imposto exigido pela Fazenda Pública respeita unicamente à diferença entre o montante de I.V.A. facturado, através de recibo, pela comissionista C...e a quantia, mais elevada, de I.V.A. deduzido pela recorrente, tudo de acordo com a documentação contabilística a que teve acesso a A. Fiscal, o que corresponde à diferença de taxas de I.V.A. utilizadas pelo sujeito passivo e pelo seu comissionista, pelo que nenhuma censura merece o agir da mesma AF.
Improcedem, pois, as conclusões em apreço.
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Da ilegalidade das compensações
Por fim, nas conclusões 37ª e 38ª sustenta a recorrente que, sendo ilegais, como são, as ajuizadas liquidações adicionais de IVA, carecem de fundamento legal as compensações operadas pelos Serviços do IVA nos pedidos de reembolso a que a impugnante tinha direito, provenientes da situação de crédito de imposto pelo que, determinando-se a ilegalidade das liquidações efectuadas pela AF, por violação, ora dos arts. 72.° e 73.° do CPT e 266.°, n.° 2 da CRP, ora do disposto no art. 19.°, n.°1 do CIVA, não pode senão concluir-se serem indevidas, porque ilegais, as compensações operadas pelos Serviços de Reembolsos do IVA.
Também no que se refere à compensação de créditos operada pela AT a coberto do disposto no art°.83-B, do C.I.V.A., se entende que se verificavam os requisitos legais, como é demonstrado na sentença recorrida.
Como nesta se refere, a compensação consubstancia uma das formas de extinção das obrigações prevista no direito privado (cfr.art°.847, do C.Civil), sendo que no regime especial ínsito no direito tributário, a compensação de dívidas de tributos por iniciativa da A. Fiscal está consagrada no art°.89, n°.1, do C. P. P. Tributário por referência também ao art°.40, n°.2, da LG.T., a qual faz depender da seguinte requisitagem: (i)existência de um crédito de que é titular um contribuinte e devedor a Fazenda Pública; (II) tal crédito resulte de reembolso, revisão oficiosa, reclamação graciosa, impugnação judicial ou de outro meio, administrativo ou contencioso, de contestação; (iii) que o mesmo contribuinte seja, simultaneamente, devedor de tributos cujo prazo de cobrança voluntária já tenha transcorrido e (iv) que esta dívida não esteja garantida ou, estando-o, não estiver pendente reclamação graciosa, impugnação judicial, recurso contencioso ou oposição à execução tendo por objecto a mesma dívida do contribuinte, nem estar a ser paga em prestações.
Nesse sentido cfr.A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, 1a. edição, 2000, pág.206; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado, Vislis, 4a.edição, 2003, pág.398; ac.S.T.A.-2a.Secção, 10/11/2004, rec.877/04; ac.S.TA-2a.Secção, 7/11/2007, rec.513/07.
Ora, segundo o regime especial do I.V.A. diz respeito, o referido art°.83-B, do C.I.V.A. na redacção que lhe foi introduzida pela Lei nº 39-B/94, de 27/12, consagra a obrigação de a Fazenda Pública efectuar a compensação de quaisquer importâncias que estejam em dívida, devidamente apuradas ou confirmadas pelos serviços da A. Fiscal, no âmbito da análise dos pedidos de reembolso formulados pelo sujeito passivo e quer tais montantes (devidos pelo sujeito passivo) respeitem ao mesmo período de imposto a que se refere o pedido de reembolso ou a período diferente (cfr.F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, C.I.V.A. anotado e comentado, Editora Rei dos Livros, 4a. edição, 1997, pág.833).
Como doutamente demonstrado na sentença, verificam-se todos os pressupostos de actuação da Fazenda Pública ao abrigo do aludido art°.83-B, do C.I.V.A., dado que, a liquidação impugnada, na data em que foi efectuada (30/7/2001 - cfr.n°.7 da matéria de facto provada), estava devidamente fundamentada na lei, visto que a impugnante somente em 10/9/2001 apresentou declarações periódicas de I.V.A. de substituição (mod.C), relativas aos períodos de Março, Junho, Setembro e Dezembro de 1998 (cfr.n°.8 da matéria de facto provada).
Por assim ser, mostram-se verificados todos os pressupostos da questionada compensação de dívidas por iniciativa da Fazenda Pública, a qual reveste características obrigatórias (cfr.art°.89, n°.1, do C.P.P.Tributário).
Pelo exposto, improcedem, «in totum» as conclusões recursivas.
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4. - Termos em que acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 4 UCs.
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Lisboa, 22/06/2010
(Gomes Correia)
(Pereira Gameiro)
(Aníbal Ferraz)

1- De realçar que o art. 17.° do DL n.° 215/89 de l de Julho - Estatuto dos Benefícios Fiscais foi revogado pelo DL n.° 433/99 de 26 de Outubro que aprovou o CPPT).