Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:04290/10
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:10/26/2010
Relator:EUGÉNIO SEQUEIRA
Descritores:ARRESTO
FUNDAMENTOS
IVA
Sumário:1. Decretado o arresto dispõe o arrestado, em alternativa, de dois meios de reapreciação dessa decisão: o recurso jurisdicional quando apenas pretenda que se proceda a um reexame da decisão recorrida ou, a oposição, quando pretenda alegar factos ou produzir meios de provas não tidos em conta pelo tribunal e que possam afastar os fundamentos da providência ou determinar a sua redução;
2. Em matéria tributária, ao arresto aplicam-se as disposições correspondentes do Código de Processo Civil, mas só na parte em que não for especialmente regulado no Código de Procedimento e de Processo Tributário;
3. Para ser decretado o arresto, têm de se mostrar preenchidos cumulativamente todos os requisitos que a lei prevê para o efeito, ainda que de forma indiciária, bastando a não demonstração, do perigo de garantia de cobrança dos tributos, relativamente a qualquer um deles (devedor originário, solidário ou subsidiário) para que o arresto não possa ter lugar;
4. No pressuposto para ser decretado o arresto (fundado receio da diminuição de garantia de cobrança do crédito), relativo a impostos que o devedor esteja obrigado a reter ou a repercutir a terceiros e não haja entregue nos prazos legais, como em certos casos de liquidação de IVA, a lei estipulou a favor da AT uma presunção legal da sua existência.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul:


A. O Relatório.
1. A..., identificado nos autos, dizendo-se inconformado com a sentença proferida pelo M. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que julgou improcedente a oposição ao arresto que havia sido decretado em bens da sua pertença, veio da mesma recorrer para este Tribunal formulando para tanto nas suas alegações as seguintes conclusões e que na íntegra se reproduzem:


1°- Não nega o Recorrente que existe uma situação de débito da empresa da qual é sócio "B..., Lda." para com a Recorrida.
No entanto,
2°- Omite a Recorrida que o Recorrente é um empresário sem quaisquer problemas a nível comercial, bancário ou tributário, conforme documentação junta aos autos (doc. 15) pela Recorrida.
De igual modo,
3°- Conforme aceitou o Mmº. Juiz a quo no depoimento da testemunha Francisco Macedo toco, coerente, sem evasivas, isento e convincente, caracterizou-se o Recorrente como pessoa conceituada que não foge das suas obrigações ou fuga a pagamento, tão somente existe uma divergência fundamentada no quantitativo.
4°- Esta situação está a causar sérios danos na imagem bancária do Recorrente, o que causa prejuízos que poderão vir a afectar a própria Recorrida na sua intenção de cobrança.
Assim,
5°- O Recorrente exerce a sua actividade laboral de forma pública podendo ser contactado e localizado a qualquer momento.
Mais,
6°- Não existe qualquer comprovativo de que o Recorrente esteja a dissipar o seu património pessoal que coloque em causa a boa cobrança pretendida pela Recorrida.
E,
7°- A pretensão da Recorrida apenas terá viabilidade quando a dívida da dita "B..." estiver definitivamente assente, quando o Recorrente for notificado da responsabilidade subsidiária pela dita dívida e uma vez esgotados os seus meios de defesa.
8°- Quais são os elementos informativos que a Recorrida possui e que determinam tais supostas intenções na normal actividade do Recorrente e que não se encontram vertidas na douta decisão em apreço?
Para tanto,
9°- Não se coibiu a Recorrida de forma gratuita em passar publicamente junto da banca e de terceiros a mensagem de que os bens do Recorrente estavam arrestados.
Posteriormente,
10°- Não se queixe a Recorrida de ser a responsável pelo fecho da actividade empresarial do Recorrente e pela determinação da sua incapacidade de se aguentar no mercado.
11°- O dano que a Recorrida procurou evitar com o presente procedimento cautelar é incomparavelmente superior para o lado do Recorrente.
Acresce que,
12°- Tendo o arresto sido requerido em 18 de Novembro de 2009, sem audição do Recorrente, nada consta que no prazo legal tenha sido movida pela Administração Tributária qualquer tipo de acção contra o ora visado.
13°- A Recorrida não atentou que a presente providência cautelar deve ser proporcional ao dano a evitar e não causar prejuízo de impossível ou difícil recuperação.
Pelo que,
14°- A persistir o presente arresto, como pretende a Recorrida que o Recorrente exerça a sua normal actividade empresarial e a sua consequente sobrevivência pessoal.
15°- A continuar esta situação, o Recorrente é e continuará a ser persona non grata no sistema bancário.
13°- Com relevância para a decisão a formular, a Mmº. Juiz “a quo" não apreciou correctamente os factos julgados provados em sede de produção de prova testemunhal e documental, violando-se o teor do art.º 136°. Nº.5 do C.P.P.T., do art°. 51°. Da L.G.T.,

Deve, pois, a douta sentença ser revogada e substituída por douto acórdão que consagre a posição articulada do Recorrente com as legais consequências.
Assim se fará
JUSTIÇA.


Foi admitido o recurso para subir imediatamente, nos próprios autos e no efeito meramente devolutivo.


Também a recorrida Fazenda Pública veio a apresentar as suas alegações e nestas as respectivas conclusões, as quais igualmente na íntegra se reproduzem:


1. A única questão suscitada pelo Recorrente, subsume-se ao erro na apreciação da prova produzida.
2. Constata-se que das declarações prestadas pela testemunha, não se conseguiu afastar a presunção legal que confere que o fundado receio da diminuição de garantia de cobrança no caso de dívidas por impostos que o devedor seja responsável esteja obrigado a reter ou a repercutir a terceiros e não haja entregue em prazo.
3. Para afastar essa presunção, o recorrente, teria, necessariamente, de demonstrar perante o Tribunal, que, efectivamente, pelo facto de ter omitido imposto de IVA que estava obrigado a reter ou a repercutir a terceiros e o qual não entregou nos cofres do Estado, nunca estaria em causa o fundado receio da diminuição de garantia desses créditos perante a AT, afastando, assim, a presunção legal subsumida ao fundado receio.
4. Também, não logrou demonstrar nos autos a inverificação dos pressupostos da sua existência, designadamente quanto á falta de entrega do referido imposto no prazo legal.
5. No caso sub judice, provado ficou pela AT que a liquidação já existia quando pedido o arresto, pelo que esse pressuposto legal se mostrou desde logo preenchido, e, consequentemente,
6. a existência de perigo logicamente justificado, probabilidade séria de que o património do titular dos bens que servem de garantia á cobrança de créditos tributários, poderia ser posto em causa.
7. Donde, quanto ao IVA, é inequívoca a existência da presunção do justo receio, a que atrás aludimos (artº 136° n° 5 do CPPT)
8. A testemunha limitou-se a responsabilizar o sócio do ora recorrente, bem como a assacar a responsabilidade do contabilista da sociedade executada/devedora originária, que deveria ter demonstrado a existência dos documentos de suporte, existentes na contabilidade da sociedade executada/devedora originária, comprovativos da compra de veículos em 2ª mão, aos quais corresponderiam cheques passados com as mesmas importâncias monetárias mencionadas naqueles.
9. O facto do Tribunal ter considerado que o recorrente dispõe de prestígio no local onde vive com a sua família - Benavente -, não o exonera das responsabilidades inerentes ao cargo de gerente da sociedade executada/devedora originária.
10. Quanto ao "justo receio" de perda de garantia patrimonial de um crédito, tem por finalidade impedir que o devedor subtraia o seu património ao cumprimento das obrigações que o oneram – artºs 601 e 619° do Cód. Civil conjugado com o artº 406 do Cód. Proc. Civil.
11. Sendo a Administração Tributária é titular de créditos já vencidos, sobre a sociedade executada/devedora originária B... Lda, e seus responsáveis subsidiários, enquanto sócios-gerentes daquela sociedade, nos termos do disposto nos artºs artºs 23 e 24 ambos da LGT.
12. Naqueles créditos estão implícitos, como é obvio, todas as garantias e receios que a posição creditícia aponta.
13. O legislador estabelece no seu n° 5, a presunção legal de verificação do 1° pressuposto em determinados casos, como sejam: "fundada receia", havendo "dívidas por impostos que o devedor ou o responsável esteja obrigado a reter ou a repercutir a terceiros e não haja entregue nos prazos legais", como in casu se verifica.
14. Sendo certo que, a única garantia de cobrança dos referidos créditos, seria precaver a sua eventual frustração no recebimento pela AT, através da presente providência cautelar, relativamente aos bens existentes na esfera patrimonial do responsável subsidiário, António Ramalho - que constituem uma garantia de cobrança dos créditos tributários - uma vez que esta se trata de uma medida cautelar preventiva de boa execução, atento o receio de perda da garantia patrimonial – artº 407/2 do CPC.
15. Já no que concerne á prova produzida, enquanto demonstração da realidade de factos com a finalidade do seu tratamento jurídico que importa e interessa ao julgador da causa, in casu, foi essencialmente, com base na prova documental constante dos autos, que serviu de base à matéria de facto assente como provada, que o Tribunal a quo fundamentou a sua convicção.
16. Bem como, do teor das declarações prestadas pela testemunha arrolada pelo recorrente, Dr. Francisco Macedo Touco, apenas resultou em audiência o irrepreensivelmente retratado no primeiro parágrafo de fls. 2 da decisão recorrida (que aqui se dá por reproduzida para todos os efeitos legais).
17. Donde, absolutamente nada, nos permite concluir que o tribunal a quo tenha feito uma incorrecta aplicação do princípio da livre apreciação da prova consagrado no artº 127° do CPP, isto é, que tenha apreciado mal a prova.
18. Não se evidencia, pois, que o tribunal a quo tenha violado qualquer regra jurídica na apreciação da prova.
19. O Tribunal recorrido, no seu livre exercício de convicção, indicou os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela convicção sobre o julgamento do facto como provado ou não provado.
20. Efectivamente, a convicção expressa pelo tribunal recorrido não deixa de ter suporte razoável naquilo que de probatório contêm os autos;
21. nem o Recorrente logrou provar o invocado erro na apreciação das mesmas.
22. Donde, falece a pretensão do recorrente ao pretender que a sentença recorrida padeça do vício de erro na apreciação da prova, quando a mesma é inabalável, pelo que, subsequentemente, se defende a improcedência do presente recurso.

Termos em que:
1. Deverá improceder o recurso interposto pelo Recorrente António Ramalho, uma vez que a invocada arguição do vício ou nulidade da sentença não se comprovou, não sendo a sentença recorrida merecedora da apontada censura, devendo antes, ser confirmada na íntegra.
Com o que se fará JUSTIÇA.


O Exmo Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, pronuncia-se por ser negado provimento ao recurso, por ter inexistido erro na apreciação das provas, já que no caso de IVA a existência do justo receio da diminuição de garantia de cobrança do imposto se presume nos termos legais, cabendo ao ora recorrente efectuar a prova do contrário, o que não fez.


Por se tratarem de autos classificados de urgentes, vêm os mesmos à Conferência sem a prévia recolha dos vistos dos Exmos Adjuntos.


B. A fundamentação.
2. A questão decidenda. São as seguintes as questões a decidir: Se no caso se verificavam todos os pressupostos para que o arresto fosse decretado em bens do responsável subsidiário pelo pagamento dos impostos exequendos em causa; E se em tal arresto não foi respeitado o princípio da proporcionalidade e o mesmo lhe causa prejuízos de difícil ou impossível reparação, sendo mesmo para si, o prejuízo resultante do arresto superior ao prejuízo que se visava alcançar com a garantia da cobrança da dívida.


3. A matéria de facto.
Em sede de probatório o M. Juiz do Tribunal “a quo” fixou a seguinte factualidade, a qual igualmente na íntegra se reproduz:
1- No seguimento da Ordem de Serviço Externa 01200701367, foi efectuada acção de inspecção à contabilidade da sociedade B... - COMÉRCIO DE VEÍCULOS AUTOMÓVEIS, LDA., funcionários da Divisão de Inspecção Tributária II da Direcção de Finanças de Santarém, em sede de IRC e IVA, relativamente aos exercícios de 2004, 2005 e 2006 (Doc. 4)
2- A referida sociedade foi notificada pessoalmente da mesma em 06/11/2008- (Doc.4)
3- A acção de inspecção teve início em 06/11/2008 e culminou a 03/04/2009 e deu origem ao Relatório de Inspecção Tributária que foi notificado aos seus interessados -(cfr. fls. 3 do RIT junto como Doc. 5 e Docs. 5-A, 5-B, 5-C e 5-D)
4- No âmbito da referida acção constatou-se que a empresa B... - COMÉRCIO DE VEÍCULOS AUTOMÓVEIS, LDA., omitiu do registou na sua contabilidade vendas de viaturas, nos montantes de € 286.693,71 e € 29.012,00, respectivamente, dos exercícios de 2004 e 2005, que se traduziram na omissão de resultados em sede de IRC e na falta de liquidações de IVA.
5- Assim, e em sede de IRC foram efectuadas correcções nos montantes de € 29.868,46 para o exercício de 2004 e de € 4.107,59 para o exercício de 2005.
6- E no que concerne ao IVA foram efectuadas correcções nos montantes de € 54.471,80 para o exercício de 2004 e de € 5.512,28 para o exercício de 2005.
7- Os automóveis foram importados da Alemanha para a B..., LDA., e nesta, o seu sócio-gerente, António Ramalho, arranjava o nome de um amigo ou conhecido, que utilizava para a legalização do veículo, que posteriormente, vinha a ser vendido pela empresa, cfr. relatório.
8- Os veículos legalizados desta forma não foram registados na contabilidade da empresa B..., LDA., e o produto da sua venda foi depositado em conta bancária particular, existente em nome de seus sócios-gerentes, Luís Filipe Rodrigues Dias e A....
9- Os mesmos receberam veículos de retoma, os quais foram depois vendidos a clientes da B..., LDA., cfr. relatório,
10- Operaram-se assim, omissões de vendas, que se apuraram pelo facto do contribuinte proceder à venda de viaturas nos exercícios de 2004 e 2005, não tendo procedido à emissão das respectivas facturas de venda, tendo-as por isso, omitido da contabilidade, e, consequentemente, das declarações fiscais
11- Dos documentos contabilísticos da sociedade verificou-se que foram contabilizados documentos referentes a inspecções, reparações e aquisição de chapas de matrícula, nos quais estão mencionadas matrículas de viaturas diferentes das constantes das facturas emitidas pelo contribuinte
12- Algumas matrículas de viaturas comercializadas pela B..., LDA., não fazem parte do mapa do activo imobilizado da empresa, nem constam das facturas emitidas pelo contribuinte.
13- Donde, os serviços de inspecção procederam às correcções do valor tributável das operações, com recurso a métodos indirectos, em sede de IRC,
14- Os sócios que exerciam de facto a gerência eram os A... e Luís Filipe Rodrigues Dias, sendo que o primeiro controlava todos os valores monetários que entravam na esfera da sociedade e o segundo assinava, igualmente, cheques das contas existentes na Caixa Geral de Depósitos, da actividade exercida pela referida empresa,
15- Da consulta às aplicações informáticas da DGCI, constata-se que em nome do sujeito passivo já existem dívidas fiscais decorrentes das liquidações de IRC e IVA, relativamente aos valores corrigidos no âmbito da acção de inspecção, no montante global de € 75.272,46 à qual acrescem juros de mora e custas legais. (Doc. 6)
16- No âmbito dessas execuções fiscais, o Serviço de Finanças de Benavente procedeu à penhora automática de saldos bancários em nome da sociedade, que resultou frustrada. (Doc. 7)
17- As instalações onde a sociedade exercia actividade estão encerradas (informação prestada pelo Serviço de Finanças de Benavente)
18- A sociedade não exerce actividade desde o início do ano 2006 (cfr. relatório da acção de inspecção)
19- Inexistem bens em nome da sociedade, bem como instalações e exercício de actividade,
20- Os sócios-gerentes/responsáveis subsidiários da referida sociedade - Luís Filipe Rodrigues Dias e A... - possuem na sua esfera patrimonial, bens susceptíveis de poder vir a garantir a boa cobrança dos créditos da sociedade perante a AT,
21- A) - Bens em nome do sócio-gerente A...:
a) Consultada a aplicação informática do "Património" e em nome do requerido, A... consta o seguinte imóvel (Doc. 10, 11 e 12 e 13 ex vi Doc. 8):
Localização: Artigo: Compropriedade: VTP:
Benavente 4547-C 1/1 € 30.830,45
Sobre este imóvel foi constituída uma hipoteca voluntária no montante de € 84.795,64 em 1994- (Doc.11)
b) Possui ainda o veículo automóvel a seguir identificado:
Matrícula Marca Cilindrada Tipo Ano
95-CE-11 AUDI 1896 Passageiros 2006
c) Rendimentos de trabalho do Requerido A...:
Consultado o sistema informático da DGCI verifica-se que o sujeito passivo aufere, rendimentos profissionais da sociedade GEROTROCAS, LDA., da qual é, também, sócio-gerente - (Doc. 14).
d) Participações sociais do Requerido A...:
Para além dos citados rendimentos, possui também, quotas das sociedades a seguir indicadas: (Doc. 8):
- Quota no valor de € 2.500,00 da sociedade AJUDA MINUTO, LDA (NIF 508.471.052);
- Quota no valor de € 5.000,00 da sociedade GEROTROCAS, LDA (NIF 507.839.412).
e) Cumprimento de obrigações:
O sujeito passivo tem cumprido com as suas obrigações declarativas de IR, não lhe sendo conhecidos quaisquer valores por regularizar - (Doc. 15)
22- B) - Bens em nome do sócio-gerente LUIS FILIPE RODRIGUES DIAS:
a) Consultado o sistema informático da DGCI, constam em nome do Requerido, Luís Filipe Rodrigues Dias, os veículos automóveis a seguir identificados (Doc. 10):
Matrícula Marca Cilindrada Tipo
LX-62-49 HONDA 1084 Motociclo de Passageiros
29-56-XX VOLKSWAGEN 1896 Passageiros
b) Rendimentos de trabalho do Requerido Luís Filipe Rodrigues Dias:
Consultado o sistema informático da DGCI verifica-se que o sujeito passivo aufere, rendimentos do Instituto da Segurança Social IP e da Caixa Geral de Aposentações- (Doc.16).
c) Cumprimento de obrigações:
O sujeito passivo tem cumprido com as suas obrigações declarativas de IR, não lhe sendo conhecidos quaisquer valores por regularizar - (Doc. 17)
23- No mais, desconhece-se o valor a atribuir aos veículos referidos, que está desde logo dependente da sua idade e actual estado de conservação
24- O VTP do prédio atrás referido, pertença do sócio António Ramalho, tem o VPT de € 30.830,45 por avaliação feita no ano 2006, (Doc. 18)


4. Para julgar verificados os pressupostos do arresto contra os requeridos, considerou o M. Juiz do Tribunal “a quo”, em síntese, que as vendas dos automóveis efectuadas aos seus clientes em 2004 e 2005, sem qualquer facturação e nem declaração dos rendimentos delas provenientes, pela sociedade também requerida, eram susceptíveis de colocar em causa os créditos da AT, já que não eram conhecidos outros bens à mesma sociedade, tendo integrado tal situação na presunção do justo receio quanto ao IVA em causa, por força do mecanismo da repercussão (mas não quanto ao IRC, parte em que o arresto não foi decretado), que os montantes dos bens arrestados não são desproporcionais ao valor das dívidas, desta forma tendo decretado o arresto dos bens indicados na matéria dos pontos 21 e 22 do probatório fixado na sentença recorrida, dos sócios e gerentes da sociedade também requerida.

Para o requerido e ora recorrente A..., de acordo com a matéria das conclusões das alegações do recurso e que delimitam o seu objecto, desde logo, na matéria da sua conclusão 6.º, invoca que “não existe qualquer comprovativo de que o Recorrente esteja a dissipar o seu património pessoal que coloque em causa a boa cobrança pretendida pela Recorrida”, de que o dano causado pelo arresto é superior ao dano que se visa acautelar, que depois disso não foi intentada pela AT qualquer acção contra o mesmo e que os factos provados não se encontram correctamente julgados.

Vejamos então.
Nos termos do disposto no art.º 136.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), pode o representante da Fazenda Pública requerer arresto de bens do devedor de tributos ou do responsável solidário ou subsidiário, desde que reunidos os requisitos constantes das suas duas alíneas, a) e b) – fundado receio da diminuição de garantia de cobrança de créditos tributáveis e estar o tributo liquidado ou em fase de liquidação – ou depois de instaurada a execução fiscal nos termos do n.º1 do art.º 214.º do mesmo CPPT, havendo justo receio de insolvência ou de ocultação ou alienação de bens, quer por parte do executado, quer por parte do responsável subsidiário, solidário ou sucessor, norma esta que deve ser concatenada com a disciplina contida no art.º 51.º da LGT, que, em geral, limita o âmbito das providências cautelares no campo tributário.

O arresto é decretado sem audiência da parte contrária – art.º 408.º n.º1 do CPC ex vi do art.º 139.º do CPPT – só se abrindo para o arrestado a via contraditória depois de ser notificado da decisão, podendo em alternativa este optar por uma das duas vias contenciosas possíveis: o recurso da decisão que decretou o arresto «quando entenda que, face aos elementos apurados, ela não devia ter sido deferida» ou a oposição à mesma decisão, «quando pretenda alegar factos ou produzir meios de prova não tidos em conta pelo tribunal e que possam afastar os fundamentos da providência ou determinar a sua redução», nos termos do disposto nos art.ºs 388.º e 392.º n.º1 do CPC.
A oposição tem assim por objecto, a alegação de factos ou produção de meios de prova não tidos em conta pelo tribunal e que possam afastar os fundamentos da providência ou determinar a sua redução.

Sendo o arresto uma providência cautelar substanciada numa apreensão judicial de bens (art.º 406.º n.º2 do CPC) destina–se ela, além do mais, a garantir a cobrança dos créditos tributários, podendo ser requerida relativamente a bens do devedor de tributos ou do responsável solidário ou subsidiário.
Mas para tal devem verificar-se cumulativamente, as circunstâncias previstas na citada norma do art.º 136.º n.º1 do CPPT, de fundado receio da diminuição de garantia de cobrança de créditos tributáveis e estar o tributo já liquidado ou em fase de liquidação.

Decorre deste regime legal que, à Fazenda Pública cabe provar os factos dos quais resultam, além da existência (ou provável existência) do tributo, que este esteja liquidado ou em fase de liquidação e que há receio de diminuição de garantias de créditos tributários.

No caso, tendo em conta que o arresto foi decretado em bens do ora recorrente e do outro sócio e gerente, mas que este não veio de deduzir oposição ou recurso contra o mesmo arresto, o objecto do presente recurso cinge-se, apenas, na parte dos bens arrestados ao ora recorrente, tendo em conta o disposto no art.º 684.º, n.º4 do Código de Processo Civil (CPC), de que os efeitos do julgado, na parte não recorrida, não podem ser prejudicados pela decisão do recurso nem pela anulação do processo, pelo que será apenas quanto a este recorrente que a decisão a proferir valerá, tendo transitado em julgado no restante julgado, por versar sobre questões autónomas relativamente a cada um dos arrestados e nem, os mesmos, se encontrarem numa situação de litisconsórcio necessário – cfr. art.ºs 682.º e 683.º do mesmo CPC.

Aquelas normas dos art.ºs 51.º da LGT e 136.º do CPPT, estendem a sujeição a tais medidas cautelares, a requerer pela AT contra os sujeitos passivo do imposto, quer quanto aos demais obrigados tributários, como sejam os responsáveis solidários ou subsidiários, desde que ocorram os pressupostos cumulativos do fundado receio da diminuição da garantia de cobrança de créditos tributáveis, já liquidados ou em fase de liquidação, fundado receio este que, em princípio, tem de ser invocado e indiciado pela AT, receio de lesão, como é próprio da natureza das providências cautelares – cfr. art.º 284.º, n.º1 do CPC - sendo que quanto aos gerentes ou administradores das sociedades ou outros entes colectivos, os mesmos só podem ser responsáveis subsidiários pelo pagamento das dívidas delas, face à inexistência de bens conhecidos da sociedade originária devedora e à possível reversão contra os mesmos, desde que se demonstre perfunctoriamente que os mesmos foram gerentes de direito e também de facto – cfr. art.ºs 23.º e 24.º da LGT - e se verificariam os demais requisitos legais para o decretamento de tal arresto, verificados em função desse próprio arrestado e dessa sua concreta qualidade, em relação à dívida desse imposto.

De acordo com a matéria provada fixada nas várias alíneas do probatório e não colocada em causa de forma válida pela recorrente – cfr. art.º 685.º-B do CPC, na redacção actual, e a aplicável – e nem pela recorrida – 684.º-A do mesmo Código – e que também se não vê necessidade da sua alteração oficiosa, ao abrigo do disposto no art.º 712.º, n.º1, do mesmo Código, as dívidas exequendas respeitam apenas ao IVA (quanto ao IRC, como acima se frisou, encontram-se fora do âmbito do presente recurso), dos anos de 2004 e de 2005, para além dos juros compensatórios, ou seja em data em que o ora recorrente era gerente de direito e também, indiciariamente, gerente de facto – cfr. matéria dos pontos 7., 8.º e 9., 14. e 17. fixada no probatório da sentença recorrida e respectiva fundamentação de direito constante na mesma sentença - pelo que a reversão no caso se mostrava possível e cabendo ao ora recorrente ter infirmado essa possibilidade, cujo ónus probatório lhe cabia, ao abrigo do n.º1 do art.º 74.º da LGT, já que nada veio provar ou sequer articular, quanto à falta de liquidação e pagamento desses impostos enquanto gerente da devedora originária não lhe ser imputável, designadamente na sua petição inicial de oposição ao arresto ou nas presentes alegações.

Em suma, este pressuposto não pode deixar de se encontrar preenchido como igualmente se fundamentou na sentença recorrida.

Como também se fundamentou na sentença recorrida, para haver lugar ao decretamento e manutenção do arresto, é necessário que sejam preenchidos todos pressupostos erigidos pela lei para o efeito, os quais são cumulativos, como claramente se refere na norma do n.º1 do art.º 136.º do CPPT, onde avulta, o de haver fundado receio da diminuição de garantia de cobrança de créditos tributáveis – sua alínea a) – requisito este que o M. Juiz do Tribunal “a quo”, na fundamentação da mesma sentença, não deixou de ter considerado como verificado, para além de em relação à sociedade originária devedora, também em relação ao ora recorrente, desta forma tendo vindo a decretar o arresto também em bens deste requerido.

Nos termos do n.º4 do mesmo art.º 136.º, o RFP alegará os factos que demonstrem o tributo ou a sua provável existência e os fundamentos do receio de diminuição de garantias de cobrança de créditos tributários, sendo que esse receio deve ser logicamente presente e actual.

Como refere Jorge Lopes de Sousa(1), deverá haver um perigo logicamente justificado, uma probabilidade séria, de que os patrimónios dos titulares de bens que servem de garantia à cobrança de créditos tributários (devedor originário, responsável solidário e responsável subsidiário) diminuam de valor a ponto de se tornarem insuficientes para a cobrança dos créditos tributários.
Bastará, para afastar a possibilidade de arresto, que em relação a um só dos patrimónios se não verifique esse perigo de insuficiência para garantia do pagamento dos créditos tributários.

Contudo, estas normas do art.º 136.º do CPPT vieram a ter uma alteração pela redacção introduzida pelo art.º 7.º da Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, tendo-lhe sido acrescentado um n.º 5, com a seguinte redacção:
As circunstâncias referidas na alínea a) do n.º1 presumem-se no caso de dívidas por impostos que o devedor ou responsável esteja obrigado a reter ou a repercutir a terceiros e não haja entregue nos prazos legais.

No caso, como se vê do respectivo relatório da inspecção tributária e nem o ora recorrente veio colocar em causa, as liquidações de IVA apuradas, tiveram a sua fonte na falta de liquidação e cobrança de IVA nas vendas de veículos automóveis pela sociedade em causa, ou seja o IVA que deveria ser feito constar nas facturas ou documentos equivalentes aquando dessas vendas, que a mesma deveria cobrar dos seus clientes e depois fazer reflectir nas respectivas declarações periódicas e proceder à respectiva entrega, ou seja imposto que a mesma deveria fazer repercutir a terceiros, assim subsumível àquele n.º5 do art.º 136.º do CPPT, onde existe presunção legal a favor da AT, da existência das condições referidas no n.º1 do mesmo artigo, pelo que a AT escusa de provar o facto a que ela conduz – cfr. art.º 350.º, n.º1 do Código Civil - ou seja o fundado receio de diminuição das garantias de cobrança de tal IVA, quer quanto ao devedor principal, quer quanto ao responsável subsidiário, passando a caber ao ora recorrente, no caso, a demonstração da inexistência de tal receio, nomeadamente por possuir bens desembaraçados suficientes para o pagamento de tais dívidas(2), o que o mesmo não fez e nem sequer, veio alegar que o teria de fazer, pelo que também este fundamento do arresto se não pode deixar de encontrar preenchido, mercê da existência de tal presunção legal.

Encontra-se pois, também este fundamento do arresto preenchido quanto ao ora recorrente, como bem se pronunciam, quer a recorrida nas suas contra-alegações, quer o Exmo Representante do Ministério Público (RMP), junto deste Tribunal, no seu parecer, improcedendo a matéria das conclusões das alegações do recurso que em contrário laboram.

Desta forma, ainda que esse perigo de diminuição das garantias de cobrança desses créditos, em relação ao devedor subsidiário e ora recorrente, não se mostre indiciado, na matéria de facto fixada no probatório da sentença recorrida, não tendo também sido sequer alegada pela Exma RFP na petição a requerer o arresto, onde não foram referenciados quaisquer concretos factos conducentes a esse perigo, mas apenas essa hipotética e abstracta possibilidade – cfr. matéria dos art.ºs 23., 47., 66. e 69. dessa mesma petição a fls 4 e segs dos autos – não tendo sido indicados quaisquer factos índice que demonstrem com um mínimo de segurança essa possível perda de garantia patrimonial em relação ao ora recorrente, como seja a alienação, sonegação, ocultação dos seus bens, o preenchimento de tal pressuposto, para este imposto, no caso, não é exigível à AT mas sim ao próprio responsável subsidiário, que por o não ter logrado alcançar, não pode o mesmo deixar de se mostrar preenchido, mercê de tal presunção legal estabelecida a favor da requerente.

Na matéria das conclusões 11º e 13.º continua o recorrente a esgrimir que o dano que a ora recorrida visou evitar é incomparavelmente superior ao que o mesmo veio a suportar, bem como não ter sido acautelado o prejuízo de impossível ou de difícil reparação, questões que a sentença recorrida não deixou de aquilatar para concluir pela sua inexistência, e até com alguma desenvoltura, segundo cremos, tendo concluído, para além do mais, pelo carácter não excessivo de tal arresto, tendo em conta o montante da dívida em cerca de € 75.272,46, pelos bens em que o foram, no bem imóvel de valor patrimonial de € 30.830,45, mas onerado com uma hipoteca constituída em 1994, pelo montante de € 84.795,64, e o veículo automóvel e as duas quotas sociais, bens estes, que de momento, não era possível determinar o respectivo valor, não tendo o ora recorrente vindo esgrimir quaisquer argumentos tendentes a reapreciar a fundamentação da mesma sentença, nesses esteios que a suportam, pelo que também não poderão deixar de improceder tais fundamentos do recurso.


Improcedem assim todas as conclusões do recurso, sendo de lhe negar provimento e de confirmar a sentença recorrida que no mesmo sentido decidiu.


C. DECISÃO.
Nestes termos, acorda-se, em negar provimento ao recurso e em confirmar a sentença recorrida na parte sob recurso.


Custas pelo recorrente.


Lisboa,26/10/2010

EUGÉNIO SEQUEIRA
ANÍBAL FERRAZ
PEREIRA GAMEIRA



1- In Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado, 2.ª Edição revista e aumentada, 2000, Vislis, pág. 612. Em sentido semelhante, cfr. o acórdão do STA de 17/12/2002, recurso n.º 7471/2002.
2- Cfr. neste sentido, João Valente Torrão, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 2005, Almedina, pág. 586, nota 513.