Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:507/19.6BELLE
Secção:CT
Data do Acordão:09/17/2020
Relator:ISABEL FERNANDES
Descritores:VENDA EM EXECUÇÃO FISCAL;
ENTREGA DO BEM.
Sumário:I – Nos termos previstos no nº2 do artigo 256º do CPPT, o adquirente pode, com base no título de transmissão, requerer ao órgão de execução fiscal, contra o detentor e no próprio processo, a entrega dos bens.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a 1ª Sub-Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

I – RELATÓRIO

A..., veio deduzir reclamação contra o despacho proferido pela Chefe do Serviço de Finanças de Faro, em regime de substituição, em 13 de Junho de 2019, que determinou a data e hora da entrega efectiva do prédio misto vendido no processo de execução fiscal n.° 105... e apensos, sito em Vale da Rosa, freguesia de Estoi, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.° 5.../2008..., composto por prédio urbano inscrito na matriz predial sob o art. 3... e o prédio rústico inscrito na matriz predial sob o art. 1..., secção AP, ambos da freguesia de Estoi, concelho de Faro, para o dia 11 de Julho de 2019.

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, por decisão de 14 de Janeiro de 2020, i) absolveu da Fazenda Pública dos pedidos de declaração de nulidade do processo de execução fiscal n.° 105... e outros, do pedido de declaração de nulidade dos despachos proferidos em 21.10.2013 e em 25.09.2014 e ii) julgou a reclamação improcedente.

O presente recurso foi dirigido ao STA, que se julgou incompetente em razão da hierarquia, por Acórdão proferido em 25 de Junho de 2020, tendo sido determinada a remessa dos autos para este TCAS.

Não concordando com a sentença, a A... veio interpor recurso da mesma, tendo nas suas alegações, formulado as seguintes conclusões:

«A) Com o devido e merecido respeito, ao contrário da douta decisão de não pronuncia sobre a nulidade da venda do imóvel em causa, o tribunal recorrido tem legitimidade para se pronunciar.

B) Pois, as nulidades são invocáveis a todo o tempo e declaradas oficiosamente pelo tribunal. Ou seja,

C) São imprescritíveis (mormente artigos 285° e seguintes do Código Civil e 165° do CPPT). Deveria assim, o douto tribunal recorrido ter-se pronunciado sobre as nulidades invocadas.

D) Em nossa opinião, andou mal, o douto tribunal recorrido, como decidiu quanto ao despacho de 13/6/2019.

E) A douta decisão recorrida deu como fato provado (aliena c) dos factos provados) que, por dívidas de IVA, IMI, IRS e coimas, o reclamante e sua mulher I... são executados.

F) Este facto nunca deveria ter sido provado. Dado que,

G) A mulher do executado A..., nunca foi notificada/citada como executada. Aliás,

H) Nem sequer foi alguma vez, no processo de execução fiscal em apreço tratada como executada.

I) Neste processo de execução fiscal a cônjuge mulher do executado/reclamante foi notificada/citada tão e só apenas da penhora do imóvel sub iudice e na qualidade de cônjuge (facto provado D).

K) Ao ser notificada/citada da penhora na qualidade de cônjuge, não pode significar que foi notificada (citada na qualidade de executada).

L) Diga-se em abono da verdade, que nunca a administração tributária, a tratou como executada. Tanto assim,

M) Que a mulher do executado não foi notificada/citada v.g. do despacho que ordenou a venda. Assim,

N) Forçoso é de concluir que a dita I..., nunca foi citada na qualidade de executada, não podendo a mesma como proprietária do imóvel objeto da venda ter exercido plenamente o seu direito de defesa.

O) Na sua reclamação, o reclamante A..., alega que não foi notificado/citado do despacho de 13/06/2019. Alega sim, que a sua mulher I..., não o foi.

P) Ao abrigo do disposto no artigo 828° e 866° do CPC, impunha- se á AT, que notificasse, para tal fim, o detentor do bem (AC do TC Administrativo do Norte processo n° 00526/11.BECER de 18/04/2012).E,

Q) Nos termos do artigo 861 n° 3 do CPC, deve ser efetuada notificação ao executado, aos arrendatários e a quaisquer detentores caso existam.

R) Resulta assim da referida norma que a notificação da AT deveria ter sido efetuado ao executado e a quaisquer detentores do imóvel, que na data determinada irá ser entregue o bem ao adquirente.

S) O que não se verificou, apenas e só o executado A... foi notificado.

T) A douta decisão ora recorrida, na sua fundamentação aduz, que a fazenda pública invocou que a mandatária do executado foi notificada do douto despacho recorrido (o que é verdade). Mas,

U) O que já não é verdade é que a eventual nulidade invocada deixa de se verificar atento ao disposto no artigo 40° da LGT, pois tal normativo não respeita a nulidades.

V) A mulher do executado era detentora do bem (residia lá) e deveria ter sido notificada e não o foi, com vista á efetivação da entrega do bem imóvel em causa. Pelo que,

W) Andou mal, a douta decisão recorrida ao decidir que tem que improceder a invocada nulidade do despacho de 13/06/2019.

X) Com o devido respeito, também decidiu mal a decisão ora posta em causa, quanto ao ponto 2 das questões a decidir - O despacho reclamado é nulo por violar o disposto nos artigos 861° n° 3, 863° e 864° do CPC.

Y) Não podia a mulher do executado reagir contra o despacho, dado que, do mesmo não foi notificada/citada.

Z) A mulher do executado, reagiu, contra o dito despacho por dele ter tido conhecimento, através do seu marido, posteriormente, á citação deste. E,

AA) No caso da entrega do bem vendido, ao abrigo do disposto nos artigos 828°, 866°, 861°, todos do CPC e 268° n° 3 da CRP, impunha-se ao órgão de execução fiscal que notificasse para tal fim, a mulher do executado como detentora do bem em causa. Ora,

BB) Esta notificação do detentor do bem à mulher do executado, jamais foi efetuada no processo de execução fiscal. E,

CC) Na qualidade de detentora deveria ter sido a mesma notificada/citada, com vista á entrega do bem imóvel em causa.

DD) Como é por demais consabido o direito à notificação dos atos administrativos e tributários que afetem direitos e interesses, legalmente protegidos é princípio constitucional consagrado no artigo 268° n° 3 da CRP. Por assim ser,

EE) Não se pode acompanhar o entendimento seguido na douta sentença recorrida, por violar o disposto nos artigos 861° n° 3 862°, 866° todos do Código de Processo Civil e 268° n° 3 da Constituição da República Portuguesa.

FF) O ora reclamante, pelas razões supra expostas, teve que fazer a defesa que cabia á sua cônjuge. E,

GG) Sem condescender, ainda que o executado não tivesse legitimidade, sempre o despacho reclamado de 13/06/2019, sofria de nulidade. Dado que,

HH) O mesmo não observou, relativamente á cônjuge do executado, o disposto nos citados artigos do 861° n° 3 862°, 866° todos do Código de Processo Civil e 268° n° 3 da Constituição da República Portuguesa.

II) Relativamente aos pontos 3 e 4 das questões a decidir, o douto tribunal, decidiu que o despacho proferido pelo Chefe da Repartição de Finanças de Faro (datado de 13 de Junho de 2019) se encontra fundamentado por se estribar na decisão proferida no processo n° 48/19.1BELLE.

JJ) O despacho da AT em causa, não teve por fundamento a douta decisão exarado no dito processo 48/19.1BELLE. Pois,

KK) Esta decisão não se pronunciou, nem tinha que se pronunciar, face ao pedido que lhe foi formulado, sobre os fundamentos/motivos que presidiram ao despacho de entrega do bem.

LL) O que a douta sentença proferida, do dito processo 48/19.1BELLE, decidiu, foi única e apenas a autorização do auxílio das autoridades policiais. Pelo que,

MM) O despacho reclamado nunca poderia ter-se fundamento nesta decisão jurisdicional.

OO) O despacho reclamado, como é afirmado pelo executado/reclamante, no articulado da reclamação (artigo 14°), teve origem no requerimento apresentado pelo executado em 9/11/2018. E,

PP) No dito requerimento, o adquirente que não justificou o motivo da necessidade de entrega do bem. Pelo que,

QQ) Não tendo havido motivação por parte do adquirente, no seu dito requerimento, a AT não deveria ter proferido o despacho que proferiu. Dado que,

RR) O impulso para o despacho, dado pelo adquirente, não estava motivado. Razão pelo qual,

SS) Como alega o executado/reclamante, na sua reclamação o despacho em causa, carece de validade substancial (artigo 22° da dita reclamação).Por,

TT) Ter sido proferido a partir de um requerimento infundamentado (artigo 23° da reclamação apresentada).E,

UU) Sobre este requerimento, que deu origem a que a AT requerer-se perante o Tribunal o auxílio das autoridades policiais, deveria a administração ter ordenado as diligências necessárias com vista á justificação do motivo de necessidade da entrega do bem, o que não o fez.

VV) Pois, o oficio- circulado n° 60080 de 201.12.14, define o modo como os Serviços de Finanças devem proceder em face dos pedidos de entrega efetiva dos imóveis, estatuindo no requerimento onde seja pedida a entrega efetiva de bens imóveis vendidos pela AT efetuado pelo adquirente, este tem de fundamentar a necessidade de intervenção dos serviços daquela entidade e o motivo porque pretende a entrega do bem.

WW) Em parte alguma da sua reclamação, o executado invocou que o despacho reclamado enfermou de vício de falta de fundamentação ao contrário do que é afirmado na douta sentença recorrida.

XX) O que, o reclamante, ora recorrente, alega é que o despacho em causa viola o entendimento do Senhor Diretor Geral de serviços de Gestão dos Créditos Tributários, para uniformização de procedimentos (artigo 21° da reclamação apresentada).

YY) Requerendo-se como consequência, a nulidade do dito despacho. Pois,

ZZ) O mesmo, ao contrário do que é alegado da douta de decisão que ora se recorre, não se encontra fundamentado em virtude de não alegar, que o adquirente requereu a entrega do bem por requerimento e qual o fundamento o motivo da entrega do mesmo ( pois o mesmo não existe).

AAA) No que concerne ao ponto 5 das questões a decidir na douta sentença, de que ora se recorre, é verdade, que a AT obteve autorização do Tribunal previamente à determinação da entrega do bem. Contudo,

BBB) Tal autorização, teve em vista apenas, a autorização do auxílio das forças públicas, na entrega do imóvel, relativamente apenas ao executado.

CCC) I..., cônjuge do executado, não foi notificada/ citada, da douta decisão do Tribunal, que determinou a autorização do auxílio das forças públicas, uma vez que a mesma era detentora do bem, e encontra-se lá a residir.

DDD) Andou mal a decidir o douto tribunal ad quo, pois, relativamente ao cônjuge do executado, a douta decisão ora posta em causa, violou sem margem de dúvida o artigo 34° da CRP.

EEE) Em face do exposto deve o despacho de que o ora executado/ reclamante, reclamou ser declarado nulo, nomeadamente por violar o disposto nos normativos legais supra citados, artigos 34° e 268° da CRP, artigos 861° n° 3 862°, 866° do CPC.

Termos em que com o douto suprimento de V. Exas. Colendos Juízes Conselheiros, deve a douta decisão recorrida ser revogada por douto acórdão proferido, pelo Venerando Tribunal de Recurso, que determine que o tribunal a quo se pronuncie sobre as nulidades inovadas relativamente á venda, por as mesmas serem de conhecimento oficioso e que determine a nulidade do despacho da Administração Tributária reclamado, devido á invalidade de que a mesma enferma, que determina a sua insusceptibilidade para produzir efeitos jurídicos que pretendia.

Só assim se deliberando se fará a HABITAUL JUSTIÇA!»


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A Recorrida, devidamente notificada para o efeito, optou por não contra-alegar.

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O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo, devidamente notificado para o efeito, ofereceu aos autos o seu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Com dispensa de vistos, vem o processo submetido à conferência desta 1ª Sub-Secção do Contencioso Tributário para decisão.



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II – FUNDAMENTAÇÃO

- De facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

«A) A..., Reclamante nos presentes autos e I..., são casados sob o regime de comunhão de adquiridos - cf. cópia de certidão de casamento junta como documento 1 com a petição inicial, fls. 33 dos autos no SITAF (a que correspondem futuras referências sem menção de origem);

B) Em 2 de Maio de 2004 foi instaurado pelo Serviço de Finanças de Faro contra A..., o processo de execução fiscal n.° 105... por dívida de IVA no valor de €1.382,84 - cf. fls. 346 dos autos;

C) No processo de execução fiscal n.° 105... e apensos (n.°s 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058... e 1058...), cujas dívidas exequendas são de IVA, IMI, IRS e coimas, são executados o Reclamante e sua mulher I... - cf. cópias dos processos de execução fiscal constantes de fls. 346 dos autos;

D) Em 15.02.2018 foi emitido pela ARS do Algarve o atestado médico de incapacidade multiuso, referente a I..., do qual consta o seguinte:

“(...) Avaliação da incapacidade

Atento que de acordo com a TNI - Anexo I, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 352/2007, de 23 de Outubro, o utente é

portador de deficiência que, nesta data e conforme o quadro seguinte, lhe confere uma incapacidade permanente global de 25% (vinte e cinco por cento), susceptível de variação futura, devendo ser reavaliado no ano de 2023.” - cf. atestado médico de incapacidade multiuso junto como documento 3 com a petição inicial, cujo teor se dá integralmente por reproduzido, a fls. 37 dos autos;

E) Em 30 de Março de 2019 foi proferido despacho decisório no processo que correu termos neste Tribunal sob o n.° 48/19.1BELLE, destinado à “passagem de mandado judicial e determinar o auxílio das autoridades policiais em diligência de arrombamento e/ou substituição de fechaduras do imóvel vendido na execução fiscal”, tendo sido dados como provados os factos que a seguir se produzem:

“A) Em 28-02-2012, no âmbito do processo de execução fiscal n.° 105... e apensos, instaurado contra A..., foi penhorado o prédio misto, propriedade do executado, sito em Vale da Rosa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Faro, freguesia de Estoi sob o n.° 5.../2008..., composto por prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 3... e prédio rústico inscrito na matriz predial sob o artigo 1..., secção AP, ambos da freguesia de Estoi, concelho de Faro (cfr. fls. 6 do Documento n.° 004… dos autos, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido);

B) Em 12-03-2012, através da AP. 2…, foi registada na Conservatória do Registo Predial de Faro, a penhora identificada em A) supra, (cfr. fls. 7 a 9 do Documento n.° 004… dos autos, idem);

C) Por ofício n.° 2643, de 28-03-2012, do Serviço de Finanças de Faro, o executado foi notificado/citado da penhora identificada em A) supra, e de que fora nomeado fiel depositário (cfr. fls. 10 a 11 do Documento n.° 004… dos autos, ibidem);

D) Por ofício n.° 2644, de 28-03-2012, do Serviço de Finanças de Faro, a cônjuge do executado foi notificada/citada da penhora identificada em A) supra (cfr. fls. 12 a 13 do Documento n.° 004… dos autos, ibidem);

E) Em 23-04-2013, foi proferido despacho pelo Chefe do Serviço de Finanças de Faro, em regime de substituição, a determinar a venda do bem identificado em A) supra, a realizar, tendo designado como data limite para aceitação das licitações o dia 0507-2013 (cfr. fls. 14 do Documento n.° 0044… dos autos, ibidem);

F) Por ofício n.° 2870, de 29-04-2013, do Serviço de Finanças de Faro, foi notificado o executado e fiel depositário dos bens penhorados, de que se iria proceder à venda por meio de leilão electrónico (cfr. fls. 15 a 16 do Documento n.° 004… dos autos, ibidem);

G) Em 05-07-2013 foi realizada a venda judicial do imóvel identificado em A), tendo o mesmo sido adjudicado ao preferente Sr. M...(cfr. fls. 21 do Documento n.° 004… dos autos, ibidem);

H) Em 05-07-2013, o adjudicatário efectuou o depósito do preço da venda e pagou os impostos devidos pela transmissão (cfr. fls. 17 a 22 do Documento n.° 004… dos autos, ibidem);

I) Em 15-07-2013, o executado entregou no Serviço de Finanças de Faro, requerimento de anulação de venda (cfr. fls. 23 a 29 do Documento n.° 004… dos autos, ibidem);

J) Em 09-08-2013, foi proferido despacho pelo Director de Finanças de Faro a indeferir o pedido de anulação de venda identificado em I) supra (cfr. fls. 35 a 36 do Documento n.° 004… dos autos, ibidem);

K) Por ofício n.° 5294, de 03-09-2013, do Serviço de Finanças de Faro, o executado foi notificado da decisão identificada em J) supra e, de que da mesma podia apresentar reclamação nos termos do disposto no artigo 276.° do CPPT (cfr. fls. 37 a 40 do Documento n.° 004… dos autos, ibidem);

L) Por ofícios n.°s 5292 e 5293, de 03-09-2013, foram os mandatários do executado notificados da decisão identificada em J) supra e, de que da mesma podiam apresentar reclamação nos termos do disposto no artigo 276.° do CPPT (cfr. fls. 41 a 48 do Documento n.° 004… dos autos, ibidem);

M) Em 07-10-2013, o adquirente M...requereu ao Chefe do Serviço de Finanças de Faro a entrega efectiva do imóvel adquirido (cfr. fls. 49 a 50 do Documento n.° 004… dos autos, ibidem);

N) Em 21-10-2013, o Executado e fiel depositário foi notificado para no prazo de 5 dias entregar as chaves do imóvel identificado em A) supra, no Serviço de Finanças de Faro (cfr. fls. 53 a 54 dos autos, ibidem);

O) Em 12-11-2013, foi proferido despacho pelo Chefe do Serviço de Finanças de Faro, a solicitar a presença da GNR para se proceder ao arrombamento do imóvel identificado em A) supra, no dia 22 de Novembro, pelas 11 horas (cfr. fls. 55 do Documento n.° 004… dos autos, ibidem);

P) Em 26-11-2013, o executado apresentou impugnação judicial neste Tribunal, na qual requereu que fosse declarada nula a venda do imóvel identificado em A) supra, a qual correu termos sob o processo n.° 921/13.0BELLE (cfr. consulta do SITAF, fls. 1 a 7 da Impugnação Judicial n.° 921/ 13.0BELLE, ibidem);

Q) Por ofício n.° 7767, de 04-12-2013, do Serviço de Finanças de Faro, o adquirente M..., foi notificado do despacho proferido em 03-12-2013, pelo Chefe daquele Serviço de Finanças, de que dado estar a decorrer impugnação judicial apresentada pelo executado junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, só poderia entregar as chaves do prédio adquirido depois da sentença judicial, e de que poderia reclamar daquela decisão, nos termos do artigo 276.° do CPPT (cfr. fls. 61 do Documento n.° 004… dos autos, ibidem);

R) Em 27-12-2013, o adquirente M..., apresentou no Serviço de Finanças de Faro, reclamação nos termos do artigo 276.° do CPPT, do despacho identificado em Q) supra (cfr. fls. 58 a 60 do Documento n.° 004… dos autos, ibidem);

S) A reclamação identificada em R) supra, correu termos neste Tribunal sob o processo n.° 36/ 14.4BELLE (facto que se extrai do PEF e da consulta ao SITAF);

T) Em 16-01-2014, foi proferida sentença a rejeitar liminarmente a impugnação judicial identificada em P) supra, por se verificar a existência de erro na forma de processo, insusceptível de sanação (cfr. consulta do SITAF, fls. 59 a 63 da Impugnação Judicial n.° 921/13.0BELLE, ibidem);

U) Em 31-03-2014, foi proferida sentença a julgar improcedente a reclamação judicial identificada em R) supra (cfr. fls. 83 a 93 do Documento n.° 004… dos autos, ibidem);

V) Em 18-06-2014, foi proferido Acórdão pelo Supremo Tribunal Administrativo no processo n.° 566/14, o qual concedeu provimento ao Recurso, tendo revogado a sentença proferida no processo de reclamação n.° 36/14.4BELLE e, em substituição julgou a reclamação judicial procedente e anulou a decisão do Chefe do Serviço de Finanças de Faro que determinou a suspensão da entrega efectiva (cfr. fls. 111 a 124 do Documento n.° 004… dos autos, ibidem);

W) Em 25-09-2014, o executado foi notificado do despacho proferido pela Chefe do Serviço de Finanças de Faro em 23-092014, para no prazo de 5 dias entregar as chaves do imóvel identificado em A) supra, com a advertência de que, não o fazendo naquele prazo, seria solicitado o auxílio das forças policiais (cfr. fls. 126 a 128 do Documento n.° 004… dos autos, ibidem);

X) Em 15-10-2014, o executado apresentou no Serviço de Finanças de Faro, oposição à execução para entrega de coisa certa, dirigida ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, na qual se opunha à ordem de entrega das chaves do imóvel identificado em A) supra (cfr. fls. 129 a 141 do Documento n.° 0044… dos autos, ibidem);

Y) A oposição identificada em X) supra, correu termos neste Tribunal sob o processo n.° 893/ 14.4BELLE (facto que se extrai da consulta ao SITAF);

Z) Em 17-12-2014, foi proferido Acórdão pelo Supremo Tribunal Administrativo no Recurso n.° 362/14-30, a negar provimento ao recurso e a confirmar a decisão proferida no processo de impugnação judicial n.° 921/13.0BELLE, identificado em T) supra (cfr. fls. 194 a 202 do Documento n.° 004… dos autos, ibidem);

AA) Em 28-01-2015, foi proferida sentença no processo de oposição n.° 893/14.4BELLE, a indeferir liminarmente a petição inicial identificada em X) supra, por “existência da exceção dilatória de erro na forma do processo” (cfr. consulta do SITAF, fls. 60 a 65 do processo de oposição n.° 893/ 14.4BELLE, ibidem);

BB) Em 19-05-2016, foi proferido Acórdão pelo Tribunal Central Administrativo Sul no processo n.° 09192/15, a negar provimento ao recurso e a confirmar a decisão proferida no processo de oposição n.° 893/ 14.4BELLE, referida em AA) supra (cfr. fls. 1... a 182 do Documento n.° 004... dos autos, ibidem);

CC) Em 26-09-2018, foi proferido Acórdão pelo Pleno do Supremo Tribunal Administrativo, no Processo n.° 1365/17-50-17, a julgar findo o recurso por oposição de julgados, do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul identificado em BB) supra, por não existir entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento, contradição sobre a mesma questão fundamental de direito (cfr. fls. 150 a 166 do Documento n. ° 004... dos autos, ibidem);

DD) O Acórdão identificado em DD) supra foi notificado ao mandatário do executado por correio registado sob n. ° RE7…9PT, entregue em 02-10-2018 (cfr. consulta do SITAF, fls. 281 do processo de oposição n.° 893/14.4BELLE e site dos CTT, ibidem);

EE) Em 30-06-2017, executado intentou neste Tribunal Acção para Reconhecimento de um Direito ou interesse Legítimo em Matéria Tributária, a que coube o processo n.° 351/17.5BELLE, na qual requer a anulação da venda do prédio identificado em A) supra (facto que se extrai da consulta ao SITAF);

FF) Em 11-09-2018, foi proferida sentença no processo n.° 351/ 17.5BELLE, a rejeitar a acção (cfr. consulta do SITAF, fls. 113 a 119 do processo n.° 351/ 17.5BELLE, ibidem);

GG) Em 02-10-2018, o executado interpôs recurso judicial a decisão proferida no processo n.° 351/ 17.5BELLE (cfr. consulta do SITAF, fls. 124 do processo n.° 351/ 17.5BELLE, ibidem);

HH) O executado tem a sua residência no imóvel identificado em A) supra (cfr. fls. 238 dos autos, ibidem);

II) O executado não procedeu até ao momento à entrega efectiva do imóvel vendido (cfr. informação de fls. 1 a 5 do Documento n. ° 004... dos autos, ibidem); (...)”.

- cf. documento de fls. 40 dos autos, cujo teor se dá integralmente por reproduzido;


F) Do despacho referido em E) consta o seguinte do seu segmento decisório: “(...)Nestes termos, e ao abrigo dos artigos 757.°, n.° 3 e 4 do CPC e artigo 34.°, n.° 2 da CRP, autorizo o auxílio das autoridades policiais para a entrega efectiva do seguinte bem imóvel: “Prédio misto, sito em Vale da Rosa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Faro sob o n.° 5.../2008..., composto por prédio urbano destinado a habitação, inscrito na matriz predial sob o artigo 3... e prédio rústico inscrito na matriz predial sob o artigo 1..., secção AP, ambos da freguesia de Estoi, concelho de Faro”. (...)” - cf. documento de fls. 40 dos autos;

G) Em 13 de Junho de 2019, a Chefe do Serviço de Finanças de Faro, em regime de substituição, proferiu o seguinte despacho (acto reclamado): “(...) Atento todo o processado junto aos autos, dado o executado e fiel depositário se recusar em proceder voluntariamente á entrega das chaves do bem objecto da venda supra identificada e em face da Decisão nos autos Outros Processos n.° 48/19.1 BELLE onde è proferido despacho judicial prévio autorizando o auxilio das autoridades policiais para a entrega do bem transmitido nos presentes autos e devidamente identificado na informação que antecede, designo o próximo dia 11 de julho pelas 10: 30 horas para se proceder á diligência de arrobamento e/ou substituição de fechadura e entrega efetiva do imóvel ao adquirente M....

Notifique-se o executado e fiel depositário, o adquirente e as forças de autoridade - Guarda Nacional Republicana de todo o conteúdo do presente Despacho e informação que antecede, remetendo cópia da Sentença proferida nos autos Outros Processos n ° 48/19.1 BELLE do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé.

Notifique-se o adquirente de que os custos com o arrombamento ficarão a seu cargo, podendo, caso pretenda, fazer-se acompanhar de pessoa que proceda ao arrombamento e consequente troca de fechadura, o que deverá informar atempadamente este Serviço de Finanças.

Mais, por se tratar de domicílio do executado e do seu agregado familiar, e prevendo-se sérias dificuldades no eventual realojamento dos ocupantes, informe-se do presente Despacho á Câmara Municipal e às competentes Autoridades Assistenciais, em conformidade com o disposto no artigo 49° do Código de Procedimento e de Processo Tributário e artigo 861.° do código de Processo Civil.” - cf. documento de fls. 40 dos autos, cujo teor se dá integralmente por reproduzido;

H) O despacho acima identificado foi enviado ao Reclamante por carta registada com aviso de recepção, a coberto do ofício n.° 1948. Porém, aquela carta não foi reclamada - cf. documento aviso de recepção dos CTT constante de fls. 40 dos autos;

I) Em 13.06.2019 foi enviado a coberto do ofício n.° 1964 por carta registada com aviso de recepção o despacho identificado em G) à mandatária do Reclamante - cf. documento de fls. 40 dos autos;

J) Em 22.06.2019 a mandatária do Reclamante recebeu o ofício identificado em I) - cf. aviso de recepção dos CTT de fls. 40 dos autos;

K) Em 24.06.2019 foi emitido pelo Médico A... da Unidade de Saúde USF Golfinho - Estoi, Região de Saúde do Algarve, do Ministério da Saúde um atestado de doença referente a I..., do qual consta o seguinte: “(...) A..., médico(a), portador(a) da cédula profissional n.°4..., atesta por sua honra profissional, que I... nascido(a) a ...-...-..., portador(a) do BI/CC n.° 6..., sofre de doença osteoarticular cronica, em espera da cirurgia que pode acontecer nos próximos anos. Assim actualmente não pode desocupar a casa sob pena de por em risco a própria vida.

Por ser verdade e lhe ter sido pedido passa o presente atestado que data e assina. (...)” - cf. documento de fls. 36 dos autos;

L) Em 1 de Julho de 2019 foi reenviado ao Reclamante, por carta registada com aviso de recepção, o despacho proferido pela Chefe do Serviço de Finanças de Faro, em regime de substituição, em 13 de Junho de 2019 identificado na alínea G), a coberto do ofício n.° 2052 - cf. documento de fls. 40 dos autos;

M) Em 3 de Julho de 2019, o Reclamante recebeu o ofício acima identificado, acompanhado do despacho proferido pela Chefe do Serviço de Finanças proferido em 13 de Junho de 2019 - cf. aviso de recepção assinado por aquele, fls. 40 dos autos;

N) O Reclamante e sua mulher, I... têm domicílio em Vale da Rosa, Cxp. 1…, em Estoi - cf. cópia do processo de execução fiscal n.° 1058..., apenso ao processo de execução fiscal n.° 105... e informação do Serviço de Finanças de 10.07.2012, ambos fls. 346 dos autos;

O) Em 8 de Junho de 2019, I... apresentou no Serviço de Finanças de Faro uma reclamação relativa ao despacho aqui reclamado, notificado ao Reclamante em 3 de Julho de 2019, que deu origem ao processo que corre termos neste Tribunal sob o n.° 487/19.8BELLE, de cujo petitório se transcreve o seguinte: “(...) o presente despacho de que a ora reclamante, reclama, seja declarado nulo e ineficaz por falta de citação da ora reclamante (...)” - cf. fls. 22 do autos que correm termos sob o n.° 487/19.8BELLE neste Tribunal, da mesma titular dos presentes autos.

P) Em 18 de Junho de 2019 foi recepcionado na Câmara Municipal de Faro o ofício n.° 1951, enviado pelo Serviço de Finanças de Faro, dirigido ao Presidente daquela edilidade, no âmbito do processo de execução fiscal n.° 105... e apensos, do qual se transcreve o seguinte: “(...) ASSUNTO: ENTREGA EFECTIVA DE IMÓVEL VENDIDO EM PROCESSO DE EXECUÇÃO FISCAL

(...)

Para os devidos efeitos, nomeadamente os constantes do n.° 6 do art.° 861 do Código de Processo Civil, informa-se que por Despacho da Sr.a Chefe de Finanças de Faro desta data, foi determinado para o próximo dia 11 de julho, pelas 10:30 horas, diligencia de entrega efectiva ao adquirente da venda acima identificada, Sr. M...do imóvel - prédio misto sito no Vale da Rosa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Faro sob o n.° 5.../2008... da freguesia de Estoi.

Porque existe a convicção de que a referida entrega irá levantar dificuldades, nomeadamente no realojamento do executado e agregado familiar, solicitamos a V.a Ex.a que se digne a tomar as medidas consideradas necessárias em conformidade com as disposições legais supramencionadas.”- cf. ofício e aviso de recepção de fls. 520 dos autos;

Q) Em 18 de Junho de 2019 foi recepcionado no Instituto da Segurança Social de Faro o ofício n.° 1952, dirigido ao Presidente daquele instituto, enviado pelo Serviço de Finanças de Faro, no âmbito do processo de execução fiscal n.° 105... e apensos, do qual se transcreve o seguinte: “(...) ASSUNTO: ENTREGA EFECTIVA DE IMÓVEL VENDIDO EM PROCESSO DE EXECUCÃO FISCAL

(...)

Para os devidos efeitos, nomeadamente os constantes do n.° 6 do art.° 861 do Código de Processo Civil, informa-se que por Despacho da Sr.a Chefe de Finanças de Faro desta data, foi determinado para o próximo dia 11 de julho, pelas 10:30 horas, diligencia de entrega efectiva ao adquirente da venda acima identificada, Sr. M...do imóvel - prédio misto sito no Vale da Rosa, descrito na Conservatória do Registo Predial de Faro sob o n.° 5.../2008... da freguesia de Estoi.

Porque existe a convicção de que a referida entrega irá levantar dificuldades, nomeadamente no realojamento do executado e agregado familiar, solicitamos a V.a Ex.a que se digne a tomar as medidas consideradas necessárias em conformidade com as disposições legais supramencionadas.”- cf. ofício e aviso de recepção de fls. 520 dos autos;

R) Em 11 de Julho de 2019, data da entrega efectiva do imóvel identificado em E), foi lavrado pelo Serviço de Finanças de Faro e assinado pelo Reclamante, o Auto de recebimento, do qual se transcreve o seguinte: “(...) Aos 11 dias do mês de julho e 2019, pelas10:30. Digo 10.40 comparecemos no sítio Vale Rosa, M..., substituta legal da Chefe do Serviço de Finanças de Faro, acompanhada do oficial de diligências, V..., e eu, E..., escrivã do processo, a fim de concretizar a entrega efetiva do prédio misto, descrito na conservatória do registo Predial de Faro, freguesia de Estoi sob o n.° 5.../2008..., transmitido nos autos de execução fiscal acima identificados na venda 1058.2013.64, ao adquirente.

Encontram-se presentes os advogados de ambas as partes:

Dr. J..., mandatário do adquirente, os Dr°s L… e Dr. ° S…, mandatários dos executados.

Encontram-se presentes mais a representante da Segurança Social, Dr.a S… e os Agentes da Autoridade Guarda Nacional Republicana, Sr. Cabo B…, G19… e Guarda R…, G21….

Mais esteve presente em representação do Município de Faro, a Dr.a V… que depois de se inteirar da ocorrência, por entender não ser mais necessária a sua presença, se ausentou. Encontrava-se ainda presente o executado e fiel depositário e em representação do adquirente, H…, que apresentou procuração com poderes para receber, aceitar, representar o adquirente.

Verifiquei que depois de devidamente elucidado, o executado entregou as chaves e o prédio misto, acima identificado, tendo- o feito de forma voluntária, as quais ficam a guarda do Serviço de Finanças, aguardando o prazo extraordinário para posterior verificação da desocupação e entrega efetiva ao adquirente.

Mais e por se verificar que o prédio não se mostrava desocupado, foi, e com a anuência, digo, sem oposição do representante do adquirente, concedido o prazo extraordinário de 10 dias (dez) para desocupação do imóvel.

Mais ficou advertido que não o fazendo incorre em prática de infiel depositário e de crime de desobediência, tendo, no entanto declarado considerar o prazo dado de 10 dias, insuficiente.

E de tudo se lavrou Auto que vai ser assinado pelos intervenientes.” - cf. auto de recebimento de fls. 633 dos autos;

S) Em 20 de Dezembro de 2019 o Reclamante ainda se encontrava na posse do imóvel identificado na alínea E). - cf. informação constante de fls. 706 dos autos.

4.2. FACTOS NAO PROVADOS

Compulsados os autos, analisados os articulados e atenta a prova documental constante dos mesmos, não existem quaisquer factos com relevância para a decisão, atento o objecto do litígio, que devam julgar-se como não provados.

4.3. FUNDAMENTAÇAO DA MATÉRIA DE FACTO

Os factos acima enunciados encontram-se todos eles comprovados pelos documentos acima discriminados que não foram impugnados pelas partes nem há indícios que ponham em causa a sua genuinidade e foram tidos em consideração por haverem sido articulados pelas partes, ou por deles serem instrumentais.»



*

- De Direito

Conforme entendimento pacífico dos Tribunais Superiores, são as conclusões extraídas pelo recorrente, a partir da respectiva motivação, que operam a fixação e delimitação do objecto dos recursos que àqueles são submetidos, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que, face à lei, sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer.

Assim, lidas as conclusões de recurso, verificamos que o Recorrente entende que a sentença enferma de erro de julgamento por:

i) Ter dado como provado o facto constante da alínea c) do probatório;

ii) Não ter conhecido das nulidades imputadas ao processo de execução fiscal e ao procedimento de venda, que ocorreu no âmbito deste;

iii) Não ter sido considerada verificada a nulidade por falta de notificação ao cônjuge do despacho reclamado;

iv) Não ter considerado nulo o despacho reclamado;


Está em causa, nos presentes autos, a legalidade do despacho proferido em 13 de Junho de 2019, pela Chefe do Serviço de Finanças de Faro, em regime de substituição, designando dia e hora para se proceder à diligência de arrobamento e/ou substituição de fechadura e entrega efectiva do imóvel ao adquirente M....

O ora Recorrente discorda do decidido pelo TAF de Loulé, começando por dizer que o tribunal tem legitimidade para se pronunciar quanto às nulidades assacadas ao procedimento da venda. Afirma que as nulidades são invocáveis a todo o tempo e declaradas oficiosamente pelo tribunal, concluindo que são imprescritíveis.

A sentença recorrida entendeu que os presentes autos não eram o meio processual próprio para conhecer dos pedidos referentes à nulidade do processo de execução fiscal e de nulidade da venda, já que o que estava submetido à apreciação do tribunal era apenas o despacho datado de 13/06/2019 que fixou data e hora para a entrega do imóvel.

Adiantemos que carece de razão o Recorrente.

Como é sabido, o meio processual adequado para reagir contra nulidades ou irregularidades ocorridas no âmbito da execução fiscal é o requerimento dirigido ao Chefe do Serviço de Finanças, cabendo, da decisão que venha a recair sobre tal requerimento, reclamação nos termos previstos nos artigos 276º e seguintes do CPPT, pelo que entendemos que a sentença recorrida decidiu com acerto.

E o mesmo se diga relativamente à apreciação das nulidades invocadas e, alegadamente, ocorridas no procedimento de venda do bem, já que o meio processual adequado seria o de anulação de venda, previsto no artigo 257º do CPPT, a apresentar junto do serviço periférico regional da AT, nos termos do nº4 do mesmo.

Assim, concluímos que não se verifica o invocado erro de julgamento, improcedendo este segmento do recurso.

Prossigamos.

O Recorrente assaca à sentença erro de julgamento quanto à matéria de facto, uma vez que entende que o facto constante da alínea c) do probatório não deveria ter sido considerado provado, já que a sua mulher nunca foi notificada/citada como executada.

A sentença recorrida deu como provado o facto constante da alínea c) do probatório, nos seguintes termos:

“No processo de execução fiscal n.° 105... e apensos (n.°s 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058..., 1058... e 1058...), cujas dívidas exequendas são de IVA, IMI, IRS e coimas, são executados o Reclamante e sua mulher I... - cf. cópias dos processos de execução fiscal constantes de fls. 346 dos autos;”

O que se retira do facto constante da alínea c) é que, nos processos de execução fiscal identificados, são executados o Recorrente e sua mulher. E a circunstância de terem sido instaurados os processos de execução fiscal não se confunde com a ocorrência da citação, que é o acto pelo qual se dá conhecimento ao executado de que, contra si, foi proposta determinada execução, chamando-o ao processo para se defender. Ou seja, ainda que não tenha sido citado não deixa de ser executado.

Carece, pois, de razão, a argumentação do Recorrente no que respeita à sua discórdia com o facto constante da alínea c) do probatório.

Dissente o Recorrente do entendimento acolhido pela sentença recorrida no que se refere à invocada nulidade por omissão da notificação ao cônjuge do Recorrente do despacho ora reclamado.

Para tanto, refere que se impunha que a sua mulher fosse notificada do despacho que determinou a entrega do bem.

Vejamos.

A sentença recorrida entendeu o seguinte:

“(…)Resultou da alínea M) do probatório que o Reclamante foi notificado em 3 de Julho de 2019 do despacho proferido em 13 de Junho desse ano pela Chefe do Serviço de Finanças de Faro, pelo qual foi determinada que a entrega do bem seria efectuada em 7 de Julho, pelo que tem de improceder a invocada nulidade do despacho por falta de notificação do Reclamante.

Refira-se que nos termos do disposto no artigo 195.° do CPC, a omissão de notificação do despacho reclamado nunca seria causa de nulidade do mesmo, pois tratar-se-ia apenas da omissão de uma formalidade processual, a qual a lei não comina expressamente com nulidade.

Acresce que a referida omissão de notificação também não influiria na decisão da causa pois resultou das alíneas I) e J) do probatório que a mandatária do Reclamante foi notificada de despacho reclamado, logo, de acordo com o previsto no artigo 40.°, n.° 1, alínea b) do CPPT, este teria sempre de considerar-se validamente notificado - “1 - As notificações aos interessados que tenham constituído mandatário são feitas na pessoa deste da seguinte forma: (...) b) Nos processos judiciais tributários, nos termos previstos nas normas sobre processo nos tribunais administrativos.”.

O Reclamante invoca também como causa de nulidade do despacho reclamado a falta de citação da sua mulher, I....

Dispõem os números 1 e 4 do CPPT o seguinte: “1 - Têm legitimidade no procedimento tributário, além da administração tributária, os contribuintes, incluindo substitutos e responsáveis, outros obrigados tributários, as partes dos contratos fiscais e quaisquer outras pessoas que provem interesse legalmente protegido. (...)

4 - Têm legitimidade no processo judicial tributário, além das entidades referidas nos números anteriores, o Ministério Público e o representante da Fazenda Pública.”.

A inovada ilegalidade por falta de notificação a verificar-se teria de ter sido arguida pela própria, pois trata-se de um acto processual destinado a dar-lhe conhecimento de um facto. Assim, de acordo com o que resulta da conjugação do n.° 4 e do n.° 1 do artigo 9.° do CPPT, no qual se estabelece que têm legitimidade para intervir no processo judicial tributário os contribuintes, incluindo substitutos e responsáveis, outros obrigados tributários, as partes dos contratos fiscais e quaisquer outras pessoas que provém interesse legalmente protegido, verifica-se que apenas aquela tem legitimidade activa para arguir a referida causa de pedir, razão pela qual não se conhecerá da mesma.

Acresce que, foi instaurada pela mulher do Reclamante, acima identificada, neste Tribunal um processo de Reclamação que corre termos sob o n.° 487/19.8BELLE, para apreciação da legalidade do mesmo despacho, em que são invocadas as mesmas causas de pedir - cf. alínea O) do probatório.(…)”

Adiante-se que não se verifica o invocado erro de julgamento. Se é certo, como se disse na sentença, que o Recorrente carecia de legitimidade para invocar a eventual falta de notificação do despacho ao seu cônjuge, também não é menos verdade que, como resulta da alínea o) dos factos provados, a mulher do Recorrente deduziu reclamação do despacho em causa, apresentada em 8 de junho de 2019 (processo nº 487/19.8BELLE), pelo que não carece de dúvida que teve conhecimento do referido despacho, razão para que improceda este esteio do recurso.

Finalmente, dissente o Recorrente do decidido relativamente à nulidade do despacho reclamado. Afirma que não existiu motivação por parte do adquirente, no requerimento apresentado por este com vista à entrega do em, pelo que a AT não deveria ter proferido o despacho reclamado. Considera que o despacho viola o Ofício-Circulado nº 60080, pelo que é nulo.

Vejamos.

Atentemos no discurso adoptado pela sentença recorrida, quanto a esta questão:

“O referido ofício-circulado define o modo como os Serviços de Finanças devem proceder em face de pedidos de entrega efectiva de imóveis, estatuindo-se aí que no requerimento onde seja pedida a entrega efectiva de bens imóveis vendidos pela Administração Tributária efectuado pelo adquirente/adjudicatário, este tem de fundamentar a necessidade de intervenção dos serviços daquela entidade.

Contudo, nos presentes autos não está em causa um despacho da Chefe de Serviço de Finanças de Faro que tenha tido por fundamento um requerimento apresentado pelo adquirente do bem imóvel, mas sim uma decisão proferida por este Tribunal em 30 de Março de 2019, no âmbito do processo judicial que aqui correu termos sob o n.° 48/19.1BELLE.

Nestes termos e atento o exposto terá de improceder o alegado pelo Reclamante.”

Não oferece dúvida que o adquirente do bem requereu ao Chefe do Serviço de Finanças de Faro, em 07/10/2013, a entrega efectiva do imóvel adquirido, como consta da alínea m) do probatório.

E que o fez ao abrigo do preceituado no nº2 do artigo 256º do CPPT.

Ora, a apreciação judicial a efectuar não se compadece com o (in)cumprimento de orientações administrativas, não sendo de relevar o invocado incumprimento do ofício-circulado. O que interessa ao tribunal é a apreciação da legalidade, sendo certo que o despacho reclamado foi proferido na sequência de requerimento apresentado pelo adquirente do bem, nos termos previstos no nº2 do artigo 256º do CPPT, o qual estatui o seguinte:

“O adquirente pode, com base no título de transmissão, requerer ao órgão de execução fiscal, contra o detentor e no próprio processo, a entrega dos bens.”

Recuperamos, aqui, o Acórdão deste TCAS de 30/09/2019, proferido no âmbito do processo nº 894/18, onde se escreveu:

“Os despachos interpretativos, as instruções e as circulares dimanadas da Administração Fiscal para esclarecer ou uniformizar o entendimento da lei e o procedimento dos serviços [, tendo] de peculiar o facto de desenvolverem a sua eficácia exclusivamente na ordem interna da Administração de onde provêm. Não vinculam nem os contribuintes, nem os tribunais. E por isso, ao contrário do que com os regulamentos sucede, não são fonte de direito, mas meras resoluções administrativas” (cf. Alberto Xavier, Manual de Direito Fiscal, I, Lisboa, 1974, págs. 139 e 140).

“As chamadas orientações administrativas, tradicionalmente apresentadas [nas] mais diversas formas como instruções, circulares, ofícios-circulares, ofícios-circulados, despachos normativos, regulamentos, etc., e que são muito frequentes no direito dos impostos (...), por terem como destinatário apenas a administração tributária, só esta lhes deve obediência, sendo, pois, obrigatórios apenas para os órgãos situados hierarquicamente abaixo do órgão autor dos mesmos” (cf. José Casalta Nabais, Manual de Direito Fiscal, Coimbra, 2000, pág. 180).

De igual modo, é jurisprudência, nesta matéria, que as circulares não constituem fonte de direito, mas apenas a manifestação geral do entendimento da Administração tributária, cujo conteúdo só vincula os Serviços.

“As circulares administrativas em matéria tributária têm valor simplesmente administrativo, vinculando apenas os órgãos da Administração Fiscal mas sem carácter normativo directo para os contribuintes ou para os tribunais” (cf. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 15 de Novembro de 1995, Processo n.º 19.451, em idêntico sentido, mais recentemente, ac. do STA de 21/06/2017, Processo n.º 0364/14).”

Veja-se, quanto a esta matéria, o Acórdão do STA de 18/06/2014, proferido no âmbito do processo nº566/14:

“O adquirente pode pedir na própria execução fiscal a entrega do bem imóvel que lhe foi adjudicado em processo de execução fiscal, mediante requerimento endereçado ao chefe do órgão de execução fiscal e com base no despacho de adjudicação, seguindo-se os termos adaptados do processo para entrega de coisa, previsto nos arts. 861.º e seguintes do CPC, aplicável ex vi do art. 828.º do mesmo Código.”

E ainda, no Acórdão do STA, de 02/07/2018, processo nº 1293/14:

“(…) o artº 256 do CPPT regula expressamente nos seus números 2 e 3, aditados pela Lei n.º 55-A/2010, de 31 de Dezembro, um regime especial para concretização da entrega dos bens e que se consubstancia num incidente iniciado por um requerimento de entrega de bens contra o detentor, a apresentar ao órgão de execução fiscal e a tramitar no próprio processo de execução fiscal, podendo aquele solicitar o auxilio das autoridades policiais para entrega do bem adjudicado ao adquirente.

Trata-se de um regime especial, simplificado, o que se justificará porque, por um lado, o processo de execução fiscal está «estruturado em termos mais simples do que o processo de execução comum, com o objectivo de conseguir uma maior celeridade na cobrança dos créditos, recomendada pelas finalidades de interesse público das receitas que através dele são cobradas» (Cf. Jorge Lopes de Sousa, no seu Código de Procedimento e Processo Tributário, Áreas Edit., 6ª edição, Volume III, pag 28.) e por outro terá sido intenção do legislador concentrar no processo de execução fiscal a prática de todos os actos necessários para assegurar o resultado útil da venda executiva.
Assim, estando a questão em análise regulamentada, de forma especial, no CPPT, não há omissão de regulamentação que demande a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil.”

Não se vislumbra a necessidade de motivação especial para o pedido de entrega (que não a óbvia falta da mesma), pelo que improcede este segmento do recurso.


III- Decisão

Face ao exposto, acordam, em conferência, os Juízes da 1ª SubSecção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso.

Custas pelo Recorrente, sem prejuízo de apoio judiciário.

Registe e notifique.

Lisboa, 17 de Setembro de 2020


(Isabel Fernandes)

(Benjamim Barbosa)

(Ana Pinhol)