Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:638/11.0BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:01/16/2020
Relator:CRISTINA SANTOS
Descritores:CADUCIDADE DA ADJUDICAÇÃO – NÃO ADJUDICAÇÃO – PARALISAÇÃO DA TUTELA DA CONFIANÇA POR FACTO IMPUTÁVEL AO ADJUDICATÁRIO
Sumário:1. Atingido o termo ad quem do prazo de 5 dias úteis notificado ao adjudicatário para comprovação documental da titularidade das habilitações legais exigidas, mostrando-se em falta o alvará para o exercício da actividade de protecção pessoal constante do objecto do contrato, dá-se por verificada uma irregularidade formal essencial relativa ao comprovativo documental habilitante, cujo efeito se traduz na declaração de caducidade da adjudicação, vd. artº 86º nº 1 CCP.
2. Verificada a falta de apresentação do alvará que titula a prestação de serviços de protecção pessoal, deve, o órgão competente para a decisão de contratar deve, primeiro, notificar o adjudicatário para se pronunciar por escrito, vd. artº 86º nº 2 CCP e, segundo, caso as razões invocadas pelo interessado sejam de molde a concluir que a omissão de entrega dos documentos não lhe é imputável (imputação culposa), deve fixar um prazo adicional para o adjudicatário efectivar a junção dos documentos de habilitação pessoal em falta, vd. artº 86º nº 3 CCP.
3. Provado que o adjudicatário não apresentou o alvará para a modalidade de “protecção pessoal”, modalidade integrante do objecto do contrato, tal significa que o adjudicatário não observou o dever imposto pelos artºs. 77º nº 2 a) e 81º nº 6 CCP.
4. A inobservância de cumprimento de formalidades essenciais por parte de entidade adjudicante, no domínio do subprocedimento de caducidade da adjudicação, prescritas no artº 86º nºs. 2 e 3 CCP, não tem a virtualidade de, no domínio indemnizatório de tutela da confiança previsto no artº 79º nº 4 CCP sanar a incumprimento antecedente por parte do adjudicatário ao não apresentar o alvará exigido nos termos do artº 2º nº 1, b) DL 35/2004, 21.02 e Portaria nº 1085/2009, 21.09 para serviços de segurança privada para “protecção pessoal”.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:E…… –…….., EM, com os sinais nos autos, inconformada com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Beja dela vem recorrer, concluindo como segue:

A. Vem a E............ recorrer, em primeiro lugar, do Despacho de fls..., no qual foi indeferida a produção de prova testemunhal oportunamente requerida pela E............, por se entender que "o presente processo fornece os elementos necessários molde a que o tribunal possa - fundamentadamente -, com base nestes últimos, conceder a solução mérito que o presente litígio convoca".
B. Na sua contestação, a E............ alegou um conjunto de factos que, uma vez provados, permitiriam demonstrar que, por um lado, a P....... foi ouvida oralmente sobre o facto que determinou a caducidade da adjudicação, como manda o artigo 86º do CCP, e que, por outro lado, a E............ comunicou à Recorrida os fundamentos da possível declaração de caducidade (cf. os factos alegados nos artigos 29º a 31º, 40º, 41.9, 45.9 a 47.9 e 49.9, todos da contestação, acima reproduzidos no capítulo 2.1. das presentes alegações).
C. E alegou também, no artigo 32º da contestação, que "a Autora não possuía os alvarás para o exercício da actividade de protecção pessoal e de transporte de valores" — facto que, se provado, habilitaria o Tribunal a, em honra ao princípio do aproveitamento do ato administrativo, afastar um eventual efeito anulatório da decisão de declaração de caducidade da adjudicação, ainda que apurasse padecer esta de falta de fundamentação ou ter sido preterida a audiência prévía.
D. O Tribunal o quo reconhece, na Sentença recorrida, a relevância do facto acabado de citar, na medida em que não só o considerou não provado (cf. p. 18 da Sentença) — quando, estranhamente, em momento anterior à prolação da Sentença, impediu a E............ de sobre ele produzir prova — como também sublinha que se tratava de um facto suscetível de influir na decisão da causa (cf. pp. 31 e 36 da Sentença).
E. É manifesto, como ficou demonstrado no capítulo 2.1. destas alegações, que a prova dos factos alegados pela E............ constituía um elemento essencial da sua defesa, com vista a que o Tribunal a quo pudesse concluir pela plena validade dos atos de impugnados nestes autos ou, num outro plano, pela irrelevância, no caso concreto, da existência de um vício de natureza formal, valendo aí o princípio do aproveitamento do ato administrativo.
F. Estando demonstrado que (i) a E............ pretendia produzir prova sobre factos alegados na sua contestação, (ii) que esses factos eram relevantes para a boa decisão da causa, de acordo com as várias soluções plausíveis de Direito, e que (iii) é admissível, quanto aos factos em causa, o recurso à prova testemunhal, então, sendo tudo isto assim, (iv) importa concluir que o Tribunal a quo errou, ao indeferir a requerida inquirição das testemunhas oportunamente arroladas pela E............, violando as normas postas nos n.ºs 1 e 2 do artigo 90º do CPTA (na versão aplicável) bem como nos artigos 410º e e 411º do CPC.
G. Requer-se, assim, a este TCA Sul que revogue o Despacho recorrido, proferindo-se Acórdão que determine a baixa do processo ao TAF de Beja para abertura de um período de instrução destinado, nomeadamente, à produção de prova testemunhal sobre os factos alegados pela E............ e que são relevantes para a boa decisão da causa.
H. No que respeita à segunda parte do recurso ora interposto, incide o mesmo sobre Sentença de 07.06.2018 proferida pelo TAF de Beja. 
I. O primeiro erro de julgamento cometido na Sentença em crise respeita à anulação, por invalidade consequente, do ato de não adjudicação (e de anulação do procedimento, por se tratar de um concurso com normas ilegais).
J. Como se viu no capítulo 3.2., esse ato de não adjudicação não é um ato consequente da decisão, anterior, de declaração da caducidade da adjudicação a favor da P....... — são, pelo contrário, atos perfeitamente autónomos, não sendo este último base, pressuposto ou causa daquele primeiro, sendo manifesto que, se não tivesse sido declarada a caducidade da adjudicação a favor da P......., a E............ poderia, ainda assim, ter determinado a anulação do concurso e decidido pela não adjudicação.
K. O pressuposto, a base, a causa da adoção da decisão de não de adjudicação (e anulação do concurso) não radica na decisão prévia através da qual a E............ declarou a caducidade da adjudicação a favor da Recorrida, mas sim na existência de normas procedimentais ilegais, impondo-se assim que o concurso fosse anulado (proferindo- se decisão de não adjudicação e não havendo lugar à celebração de um contrato).
L. A anulação da declaração de caducidade da adjudicação, por preterição de audiência prévia e falta de fundamentação, nunca poderia ter determinado a anulação do ato de não adjudicação e de anulação do procedimento concursal — trata-se, esta segunda decisão, de um ato plenamente autónomo, que "sobrevive" perfeitamente na ordem jurídica ainda que seja anulada a declaração de caducidade da adjudicação.
M. Incorreu, assim, o TAF de Beja, em erro de direito, ao proceder à anulação da decisão da E............ de não adjudicação (e de anulação do concurso), por invalidade consequente, impondo-se a revogação da Sentença, nesta parte, concluindo ser válido o ato através do qual a E............ decidiu não adjudicar e anular o concurso, por ilegalidade de determinadas normas procedimentais.
N. Imputou-se ainda à Sentença recorrida, no capítulo 3.3. das alegações, um outro erro de julgamento, resultante do facto de — embora com algumas dúvidas — parecer que o TAF de Beja procedeu também à anulação do ato de não adjudicação (e anulação do concurso) com base num vício próprio, o de falta de fundamentação.
O. Como foi demonstrado, trata-se de erro de Direito: o próprio Tribunal a quo deu como provado que através de informação colocada na plataforma electrónica, os concorrentes foram informados da referida decisão de não adjudicação [cf. alínea P) da factualidade provada, a pp. 17 da Sentença).
P. Tendo em consideração o Acórdão do TCA Sul de 12.07.2012 (proc. 04268/08) e que só se pode discordar daquilo que se compreende, basta ler a petição inicial apresentada nestes autos para concluir que a P....... apreendeu a motivação que determinou a não adjudicação do contrato concursado: a necessária compatibilização entre o objeto do contrato e os alvarás exigidos e a ilegalidade daí decorrente.
Q. Nos casos em que assim é, e como bem se decidiu no Acórdão do TCA Sul de 12.07.2012, já citado, obviamente que "[n]ão procede a falta de fundamentação do ato, enquanto vício de natureza formal, se for possível conhecer, ainda que de forma sucinta e abreviada, quer a fundamentação de facto, quer a fundamentação de direito, sendo essa fundamentação compreendida pelo destinatário direto do ato, que se dispõe a impugná-lo contenciosamente, organizando a sua defesa de forma racional".
R. Concluindo-se assim que o TAF de Beja, ao ter também (aparentemente) anulado o ato de não adjudicação (e de anulação do concurso) com fundamento em vício próprio deste, por falta de fundamentação, incorreu em erro de Direito, por violação do artigo 125º do CPA (correspondente ao: atual artigo 153º), devendo por isso a Sentença recorrida ser revogada nesta parte.
S. Alegou-se ainda, a título subsidiário, um outro erro de julgamento, na medida em que, ainda que padecesse de falta de fundamentação ou de invalidade consequente, nunca poderia o TAF de Beja ter anulado a decisão de não adjudicação e de anulação do procedimento.
T. Na verdade, e como vimos no capítulo 3.4. supra, seja da perspetiva da E............, seja mesmo da perspetiva do Tribunal a quo (cf. pp. 26 e 27 da Sentença), existiam duas ilegalidades no Programa do Procedimento — ilegalidades que, por um lado, restringiam o universo de potenciais concorrentes (restringia a concorrência, portanto) e, por outro lado, tratavam de forma desigual os operadores económicos que estavam habilitados a prestar os serviços de vigilância humana e vigilância remota — que impunham que se pusesse termo a um concurso ilegal.
U. Apurada a existência de um procedimento ilegal, a entidade adjudicante está obrigada a proceder à sua anulação, ou seja, a não adjudicar. E é assim independentemente do momento em que a entidade adjudicante se aperceba da natureza ilegal do procedimento de contratação — salvo, claro, se já tiver sido celebrado o contrato concursado.
V. Independentemente de se entender que a decisão de não adjudicação e de anulação do procedimento, proferida pela E............, não estaria exaustivamente fundamentada, ou de se entender que teria havido preterição de audiência prévia, ou, ainda de se poder entender padecer ela de invalidade consequente, independentemente disso tudo, a verdade é que não havia outra opção: se um concurso é ilegal, impõe-se a reposição da legalidade, sendo que o único meio de atingir esse fim é mediante a anulação do procedimento (a adoção de uma decisão de não adjudicação).
W. Trata-se, portanto, de um caso em que vale plenamente o princípio do aproveitamento do ato administrativo, ou seja, de um caso de "actividade vinculada da Administração", podendo afirmar-se, “com inteira segurança, que o novo acto a praticar pela Administração, em execução de julgado anulatório, teria forçosamente o conteúdo decisório idêntico ao do acto anulado" (cf. Acórdão do STA de 22.11.2006, proc. 0425/06) — e isto independentemente de a nova decisão, a proferir em execução da sentença anulatória, poder estar melhor fundamentada e ser sujeita a audiência prévia.
X. Mesmo que tivesse concluído pela existência de um vício formal (a falta de fundamentação ou a preterição de audiência prévia), deveria o Tribunal a quo ter afastado o efeito anulatório do ato de não adjudicação — erro de julgamento que se requer a V. Exas. Que reparem, concluindo-se pela validade do acto administrativo em apreço.
Y. Acresce que, no cenário em equação (em que a decisão de não adjudicação e de anulação do procedimento é válida e produz efeitos), a anulação do ato de declaração da caducidade da adjudicação a favor da P....... não traduz qualquer vantagem real nem tem qualquer alcance prático para a aqui Recorrida: é que os efeitos decorrentes da anulação da declaração de caducidade são inutilizados pela decisão, posterior, de não adjudicação — decisão esta que, portanto, destrói, inutiliza, os efeitos dos atos praticados no âmbito do procedimento incompatíveis com aquele ato, incluindo os efeitos da declaração da caducidade da adjudicação.
Z. Assim sendo, vale também aqui o conhecido princípio «utile per inutile non vitiatur», concluindo-se que, sendo válido o ato de não adjudicação (e anulação do concurso), a eventual anulação, pelo Tribunal, do anterior ato que declarou a caducidade da adjudicação a favor da P......., não produziria qualquer vantagem para a Recorrida nem teria qualquer efeito prático, requerendo-se a V. Exas. que assim concluam.
AA. Incorreu também o TAF de Beja num outro erro de julgamento, demonstrado no capítulo 3.5. supra, quando, depois de proceder à anulação dos dois atos em apreço, apreciou a possibilidade de "adjudicação da proposta da Autora e, consequentemente, da celebração do contrato de prestação de serviços de segurança e vigilância (humana e remota) com a ora Demandada" (cf. p. 34 da Sentença), concluindo a esse propósito que se estava perante um caso de impossibilidade absoluta, nos termos do artigo 102º/5 do CPTA, pelo que convidou as partes a acordarem no montante da indemnização a que a aqui Recorrida teria alegadamente direito.
BB. Na verdade, atentos os fundamentos estritamente formais que determinaram a anulação da decisão de declaração da caducidade da adjudicação (e da decisão de não adjudicação, suposto ato consequente daquela), a Recorrida não é titular de um direito subjetivo à adjudicação e à celebração do contrato — ela tem direito, isso sim e apenas, à fundamentação e a ser ouvida em momento prévio à adoção de tal decisão (ou decisões).
CC. Assim, os efeitos que resultam da anulação decretada na Sentença recorrida passam por respeitar os "direitos" (de audiência prévia e à fundamentação) da P......., podendo até a E............, em execução da sentença anulatória, proceder, designadamente, à substituição ou renovação do(s) ato(s) declarado(s) ilegal(is), sem reincidir nas ilegalidades anteriormente cometidas, como consagrado na parte inicial do nº 1 do artigo 173º do CPTA.
DD. Neste sentido, deveria o TAF de Beja ter concluído pela improcedência do pedido condenatório formulado pela P......., não com base no artigo 102º/5 do CPTA, mas sim com fundamento na alínea a) do artigo 68º/l daquele Código, na medida em que, como vimos, a ora Recorrida não é titular de um direito subjetivo à adjudicação — erro de julgamento que se requer a V. Exas. seja reparado.
EE. Incorreu ainda o Tribunal o quo num outro erro na decisão tomada quanto ao pedido em apreço: antes de averiguar se, no plano dos factos, a sentença poderia ser executada — ou se, pelo contrário, poderia haver impossibilidade absoluta — deveria o TAF de Beja ter concluído pela improcedência do pedido condenatório por o mesmo colidir (ou não ser compatível) com os efeitos do ato de não adjudicação e de anulação do concurso, adotado pela E.............
FF. Com efeito, a existência do ato de não adjudicação (e anulação do concurso) — um ato válido, como, espera-se, V. Exas. concluirão — impede, por si só, a procedência do pedido de condenação à adoção de um novo ato de adjudicação: nunca seria possível praticar novo ato de adjudicação (nem celebrar um contrato) no contexto de um concurso que foi anulado, com fundamento na respetiva ilegalidade.
GG. Nesta medida, e ao invés do decidido na Sentença recorrida, o pedido formulado pela P......., no sentido de a E............ proferir novo ato de adjudicação, deve ser julgado improcedente pelo motivo acima exposto e não por impossibilidade absoluta, não havendo lugar à aplicação do regime do artigo 102º/5 do CPTA.
HH. Acresce que, ao entender, sem mais, estar-se perante um caso de impossibilidade absoluta, o Tribunal a quo neutralizou o poder que a lei confere à E............ de renovar os atos por si praticados (e anulados judicialmente), sem reincidir nas mesmas causas de invalidade — em violação do disposto no artigo 173.9 do CPTA.
II. Impondo-se, também por aqui, a revogação da Sentença recorrida, sendo proferida nova decisão que permita à E............ proceder à execução da Sentença de acordo com os poderes que lhe assistem e em cumprimento dos princípios a que está adstrita.
Nestes termos, e nos mais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência:
(i) Deve ser revogada a decisão que indeferiu a produção de prova testemunhal requerida pela E............, proferindo-se Acórdão que determine a baixa do processo ao TAF de Beja para abertura de um período de instrução destinado à produção de prova sobre os factos alegados pela E............ e que são relevantes para a boa decisão da causa;
E, em qualquer caso,
(ii) Deve ser revogada a Sentença recorrida, com os fundamentos e nos termos expostos no presente recurso, proferindo-se Acórdão no qual se conclua pela total improcedência da ação intentada pela P........

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Os Recorridos não apresentaram contra-alegações.

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Com dispensa legal de vistos substituídos pela entrega das competentes cópias aos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem para decisão em conferência.

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Pelo Senhor Juiz foi julgada provada a seguinte factualidade:

A. Mediante o Anúncio de procedimento n.° 5488/2010, publicado no Diário da República n.° 232, 2ª Série, de 30.11.2010, a Entidade ora Demandada declarou aberto Concurso Público Internacional tendente à celebração de contrato de “Prestação de Serviços de Vigilância e Segurança” - cfr. Documento n.°s 1 e 2 juntos com a petição inicial;
B. Em 07.01.2011, a Autora apresentou-se ao Concurso identificado em A), o qual correu os seus termos na plataforma electrónica WWW.Compraspublicas.com - cfr. por acordo e, ainda, artigo 16 ° da petição inicial;
C. Os serviços incluídos na vigilância humana deveriam ser prestados nos seguintes locais: Loja E............ I - Rua P……, 19; Av. de B……, 1; Rua S……, 3 - Piso Intermédio e garagem; Rua S……, 3 - Piso Intermédio e garagem; Parque de Viaturas Rebocadas de S……; Parque do Instituto Hidrográfico; Parque M…… - cfr. Documentos n.°s 2 e 3 juntos com a petição inicial e, ainda, artigo 13.° da Contestação;
D. Os serviços de vigilância remota deveriam ser prestados nos seguintes locais: Av. de B……, 1; Rua S……, 3 - garagem; Parque T……; Loja E............ I - Rua P……, 19 - cfr., Documentos n.°s 2 e 3 juntos com a petição inicial e, ainda, artigo 13.° da Contestação;
E. No ponto 2. (sob o título “funções a desempenhar”), da Parte II (intitulada “especificações técnicas”), do Caderno de Encargos estatuiu-se que “no âmbito dos serviços de vigilância humana, incumbe aos vigilantes designados pelo adjudicatário (...) o seguinte:
c) Intervir nas situações que extravasem a normalidade, nomeadamente em situações de defesa da integridade física dos utentes das instalações, situações de incêndio ou de ameaça de bomba nas quais possa ser requerida uma evacuação parcial ou total das instalações;
d) Monitorizar os sistemas activos de controlo e segurança das instalações, tais como alarmes de intrusão, de detecção de incêndios e outros, quando existam;
e) Supervisionar o comportamento das pessoas no interior e em toda a área da instalação;
f) Supervisionar o acesso aos diferentes locais da instalação impedindo a entrada e permanência de pessoas sem direito de admissão e em locais não autorizados;
g) Apaziguar conflitos” - cfr. Documento n.° 2 junto com a petição inicial;
F. De acordo com a Cláusula 13ª do Programa do Concurso identificado em A) constituía critério de adjudicação o do “mais baixo preço” - cfr. Documento n.° 3 junto com a petição inicial;
G. De acordo com o disposto na Cláusula 16ª do Programa do Concurso, sob a epígrafe "Documentos de habilitação”, estipulou-se que:
Quando notificado pela E............ para o efeito, o adjudicatário deverá apresentar, no prazo máximo de 5 (cinco) dias úteis, os seguintes documentos de habilitação;
a) Declaração a que diz respeito o artigo 81° n° 1 alínea a) do DL 18/2008, de 29 de Janeiro, constante do Anexo II; disponível no portal https://www.compraspublicas.com, e os documentos referidos na alínea b), d), e) e i) do artigo 55° do CCP;
b) cópia da Certidão do registo comercial ou código de acesso a certidão permanente.
c) Fotocópia do(s) alvará(s) e licenças (Portaria nº1085/2009, de 21 de Setembro) que habilitem o concorrente ao exercício das actividades que se propõem executar em conformidade com o disposto no artigo 22º e descritas nas alíneas a), b), c) e d) do nº l do artigo 2º do Decreto-Lei nº 35/2004, de 21 de Fevereiro (com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n° 198/2005, de 10 de Novembro e na Lei n° 38/2008, de 08 de Agosto).
d) Fotocópia das apólices de seguros de responsabilidade civil e de acidentes de trabalho e dos recibos de pagamento dos respectivos prémios devidamente actualizados, - cfr., Documento n.° 3 junto com a petição inicial;
H. De acordo com o disposto na Cláusula 24ª do Programa do Concurso , podiam concorrer ao procedimento identificado em A) todas as entidades, públicas ou privadas, que possuíssem alvará para o exercício da actividade de vigilância humana, válido em Portugal, emitido pelo Ministério da Administração Interna - cfr., de novo Documento n.° 3 junto com a petição inicial;
I. A actividade de “transporte de valores” não estava incluída no objecto inicial do contrato de prestação de serviços a celebrar na sequência do procedimento concursal identificado em A) -_ por confissão (cfr. artigo 23.° da Contestação);
J. Em 09.02.2011, o júri do concurso identificado em A) aprovou o “Relatório Final de Análise das Propostas - Procedimento para Celebração de um Contrato de Prestação de Serviços de Segurança e Vigilância (Humana e Remota)”, no qual se lê que:
3, O júri constatou, assim, que a proposta de mais baixo preço foi a apresentada pelo Concorrente nº 7 – P....... – V……, UNIPESSOAL, LDA
9. Nestes termos, e em conformidade com o disposto no artigo 124º do Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo Decreto-Lei na 18/2008, de 29 de Janeiro, o Júri, composto pelo Sr, Eng. C…… como Presidente do Júri do procedimento acima identificado, a Sra. Dra, E…… e Sr. J……, como vogais efectivos propõe, por unanimidade, ao órgão competente para a decisão de contratar, manter as conclusões do relatório final de 30 de Janeiro de 2011, do qual resultou a classificação, em primeiro lugar, e de acordo com o critério de adjudicação adaptado, da proposta apresentada pelo concorrente n° 7 P....... – V……, UNIPESSOAL, LDA, com o valor de €523,300,00. (Quinhentos e vinte e três ml e trezentos euros) - cfr. Documento n.° 4 junto com a petição inicial;
K. Em 17.02.2011, sob o assunto “Procedimento por Concurso Público Internacional para Serviços de Vigilância”, a Entidade Demandada expediu o ofício nº …/DFA/…/11, mediante o qual informou a Autora como se segue:
Cumprido o disposto no artigo 126º n° 4 do Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo Decreto-Lei n° 18/2008, de 29 de Janeiro, informamos V/Exas, que foi decidido adjudicar-vos o procedimento por Concurso Público Internacional para Serviços de Vigilância, com o valor da proposta de € 523,300,00 (Quinhentos e vinte e três mil e trezentos euros), ao qual acresce IVA à taxa legal em vigor.
Nesta conformidade e com base no artigo 77° do CCP, ficam V/Exas. notificados para no prazo máximo de 5 dias úteis apresentarem a respectiva caução, bem como os documentos de habilitação constantes no programa de concurso - cfr. Documento nº 5 junto com a petição inicial;
L. A Autora não procedeu à entrega dos alvarás para o exercício das actividades de “transporte de valores” e de “protecção pessoal” - cfr. Documento constante a fls. 53 no proc. cautelar apenso / por acordo;
M. Em 25.02.2011, sob o assunto “Publicação dos documentos de habilitação”, mediante mensagem de correio electrónico remetida às 16:42 horas, a Autora foi informada que:
Vimos por este meio, informar-lhe que foram publicados os Documentos de Habilitação correspondentes ao Procedimento com a referência «CP 07/10 - Serviços de vigilância» e a designação «Prestação de serviços de vigilância». Poderá consultá-los no menu "Adjudicação" acedendo à Plataforma www.compraspublicas.com com os seus dados de acesso,
Com os melhores cumprimentos,
E............, EMPRESA PÚBLICA MUNICIPAL DE ESTACIONAMENTO DE LISBOA, E.E.M. - cfr. Documento nº 6 junto com a petição inicial;
N. Em 25.02.2011, sob o assunto “Notificação de Decisão de Adjudicação Caducada”, mediante mensagem de correio electrónico remetida às 17:11 horas, a Autora foi informada que:
Vimos por este meio, informar-lhe que a Decisão de Adjudicação, correspondente ao Procedimento com a referência «CP 07/10 - Serviços de vigilância» e a designação «Prestação de serviços de vigilância» foi caducada.
Poderá consultá-la no menu "Adjudicação", acedendo à Plataforma Compras Públicas, com os seus dados de acesso.
Com os melhores cumprimentos,
E............, .-..................................................................., E.E.M. - cfr. Documento n.° 7 junto com a petição inicial;
O. Em 25.02.2011, sob o assunto “Notificação de Decisão de Não Adjudicação”, mediante mensagem de correio electrónico remetida às 17:54 horas, a Autora foi informada que:
Vimos por este meio, informar-lhe que o Procedimento com a referência «CP 07/10 - Serviços de vigilância» e a designação «Prestação de serviços de vigilância» foi Não Adjudicado.
Poderá consultá-lo no menu "Adjudicação", acedendo à Plataforma Compras Públicas, com os seus dados de acesso.
Com os melhores cumprimentos,
E............, ………………, E.E.M. - cfr. Documento n.° 8 junto com a petição inicial;
P. Na respetiva plataforma na qual correu termos o concurso público identificado em A), sob o assunto “Não Adjudicação”, foi exarada a seguinte Informação:
"(...) 3. Não adjudicar a coberto da alínea c), do nº 1, do art. 79º do Código dos Contratos Públicos, conjugado com o nº 3, desse artigo, e com o artigo 80º do CCP; Mantendo-se a necessidade de contratar e de se proceder a uma alteração de aspectos fundamentais das peças do procedimento (no caso concreto, a compatibilização entre o objecto do Contrato e os alvarás exigidos), com base no nº 3 do artigo 79º do CCP, repetição do procedimento, no prazo máximo de 6 meses e nos termos da regra geral de escolha do procedimento (previsto no artigo 18.° do CCP) e do valor máximo do benefício económico que pode ser obtido pelo adjudicatário com a execução do contrato a celebrar (de acordo com os limites ao valor do contrato constantes dos artigos 19.° a 21.° do CCP), propõe-se a adopção de um novo Concurso Público Internacional.
Este acto pratica-se com a revogação da Decisão de Contratar, segundo o disposto no artigo 80º do CCP.” - cfr. Documento n.° 9 junto com a petição inicial;
Q. A Entidade Demandada procedeu à abertura de novo concurso público internacional, com a referência nº 07A/2010, tendente à aquisição dos mesmos serviços que constituíam o objecto do concurso identificado em A) - por acordo e, ainda, fls. 470-501 dos autos;
R. A Autora apresentou-se ao concurso público internacional (CPI) n.° 07A/2010 - por acordo;
S. Em 09.03.2011, foi intentada a presente acção de contencioso pré-contratual - cfr. fls. fls. 2 dos autos;
T. Em 24.06.2011, no âmbito do CPI nº 07A/2010, foi adjudicada à Concorrente “R........, Lda.” a celebração do contrato de prestação de serviços ali posto a concurso - cfr. Documento n.° 1 junto a fls. 470-501 dos autos;
U. Em 31.07.2014, o contrato de prestação de serviços mencionado em T) cessou os seus efeitos - cfr. Documento n.° 2 junto a fls. 470-501 dos autos;


FACTOS NÃO PROVADOS - Nos presentes autos, com relevo para a decisão da causa, não foi provado:

A) Que a Autora não possuísse, no período compreendido entre 30 de novembro de 2010 e 25 de fevereiro de 2011, alvará para o exercício da actividade de “protecção pessoal” - cfr. artigo 342º nº 2, do Código Civil;



DO DIREITO

Vem assacada a sentença proferida de incorrer em:
a. violação primária de direito probatório por não inclusão de factualidade alegada e julgada relevante em sede de sentença, antecedentemente objecto de indeferimento de produção de prova por meio testemunhal .……………. itens A a G das conclusões;
b. violação primária de direito substantivo por erro de julgamento em matéria de:
a. natureza autónoma dos actos de declaração de caducidade da adjudicação (por não apresentação de documentos de habilitação) e decisão de não adjudicação (por necessidade de alteração do programa do concurso) … itens H a M;
b. fundamentação da decisão de não adjudicação …………. itens N a R;
c. validade da anulação do procedimento mediante decisão de não adjudicação ………………………………………………………………. itens S a Z;
d. legitimidade activa para o pedido indemnizatório ………… itens AA a DD;
e. insubsistência do pedido condenatório no contexto de um concurso anulado ……………………………………………………………….. itens EE a II.

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Nos presentes autos a Recorrida P....... – V……, Lda. deduziu pedido múltiplo anulatório de diversos actos praticados no procedimento concursal, em ordem à manutenção da situação jurídica de adjudicatária e consequente parte outorgante no contrato de prestação de serviços de vigilância e segurança levado ao probatório na alínea A; subsidiariamente; peticionou, ainda, a condenação da Recorrente a pagar-lhe a título indemnizatório o valor de 66.107,90 €.
Conforme referido no primeiro acórdão deste TCAS de que fomos Relatora, que ordenou a baixa do processo ao TAF de Lisboa para prosseguimento da instância (procº nº 8655/12), a Autora e ora Recorrida discute a bondade dos termos em que a habilitação para a execução do contrato se mostra expressa no artº 16º c) do Programa do Concurso e, consequentemente, a bondade da decisão de caducidade da adjudicação, bem como da subsunção dos pressupostos da decisão de não adjudicação na previsão do artº 79º nº 1 c) CCP, concluindo, como referido, pela condenação da entidade adjudicante a celebrar o contrato de acordo com a primitiva adjudicação a seu favor ou, em via subsidiária e na impossibilidade de celebração do citado contrato, a atribuição de indemnização por danos emergentes e lucros cessantes no valor de 66.107,90 €.
Por despacho de 11.01.2013 ordenou-se a remessa dos autos ao TAF de Beja.

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De acordo com o probatório, a ora Recorrida foi notificada da adjudicação (17.02.2011) da proposta por si apresentada e, na qualidade de adjudicatária, para apresentar os documentos de habilitação no prazo legal (5 dias), apresentação notificada a todos os concorrentes via plataforma electrónica - alíneas K e M do probatório.
A ora Recorrida não fez entrega dos alvarás relativos ao exercício das actividades de “transporte de valores” e de “protecção pessoal” – alínea L do probatório.
A declaração de caducidade da adjudicação foi notificada à Recorrida via plataforma electrónica em 25.02.2011, 17:11 h - alínea N do probatório.
A decisão de não adjudicação, notificada à Recorrida via plataforma electrónic em 25.02.2011, 17:54h, fundou-se na verificação de circunstâncias imprevistas impositivas de alteração das peças fundamentais do procedimento, no caso “a compatibilização entre o objecto do contrato e os alvarás exigidos” no Programa do Concurso, louvando-se a entidade adjudicante, ora Recorrente, no regime do artº 79º nºs. 1 c) e 3 CCP alíneas O e P do probatório.
Também decorre do probatório que a entidade adjudicante, ora Recorrente, abriu novo procedimento (artº 79º nº 3 CCP) findo por adjudicação e mostrando-se o respectivo contrato integralmente executado – alíneas Q, R, T e U do probatório.

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A acção foi julgada parcialmente procedente, tendo sido anulados os actos de declaração de caducidade da adjudicação (25.02.2011, 17:11 h) e de não adjudicação (25.02.2011, 17:54 h) por vícios, respectivamente, de preterição de audiência prévia e falta de fundamentação – vd. páginas 30-31 e 33- 34 da motivação de direito da sentença e alíneas B) e C) do segmento decisório – e à luz do regime dos artºs.45º e 102º nº 5 CPTA convidadas as Partes a acordar no montante indemnizatório, com fundamento na impossibilidade absoluta de celebração do contrato a que se refere a alínea A do probatório.


1. declaração de caducidade da adjudicação - decisão de não adjudicação;

Atento o elenco de questões trazidas a recurso por violação primária de direito substantivo cabe analisar os erros de julgamento imputados em sede de declaração de caducidade da adjudicação (25.02.2011, 17:11 h) e decisão de não adjudicação (25.02.2011, 17:54h), itens H a M, N a R e S a Z das conclusões, actos levados ao probatório nas alíneas N, O e P.
Trata-se de actos administrativos juridicamente autónomos nos seus pressupostos, conteúdo e efeitos, conforme decorre dos respectivos regimes em sede de CCP, atento o quadro factual resultante do probatório, a saber,

(I) caducidade da adjudicação por não apresentação imputável ao adjudicatário dos documentos comprovativos da titularidade das habilitações legais exigidas, vd. artºs. 77º nº 2 a), 81º nº 6, 132º nº 1 f), 86º nºs 1 a), 2 e 3 CCP, dando lugar, por um lado,
a. à extinção ab initio dos efeitos constituídos pelo acto de adjudicação originalmente praticado e, por outro - na hipótese de propostas “adjudicáveis” no procedimento -,
b. à abertura do sub-procedimento de adjudicação subsequente posto que o acto de adjudicação inicial cai, como é o caso, por fundamentos alheios a razões de invalidade, vd. artº 86º nº 4 CCP; (1)

(II) decisão de não adjudicação por necessidade imprevista (não ponderada aquando da elaboração das peças do procedimento) de “alteração de aspectos fundamentais das peças do procedimento (no caso concreto, a compatibilização entre o objecto do Contrato e os alvarás exigidos)” e verificada após notificação da adjudicação homologada, rectius, homologação do relatório final, vd. artº 79º nº 1 c) CCP, determinante
a. da extinção do procedimento por revogação da decisão de contratar, vd. artº 80º nº 1 CCP, e
b. abertura (decisão de contratar) de novo procedimento (com as peças reformuladas) adjudicatório de contrato com o mesmo objecto, nos 6 meses contados da notificação da não adjudicação, vd. artºs 79º nº 3 CCP (2)
Em correlação com a caducidade da adjudicação por facto imputável à Recorrida coloca-se, ainda, a questão dos efeitos indemnizatórios da não adjudicação por factos imputáveis à entidade adjudicante, vd. artº 79º nº 4 CCP, neste caso efeitos restritos ao adjudicatário ora Recorrido posto que a revogação do procedimento é declarada posteriormente à notificação efectiva do acto positivo.


2. titularidade de habilitação legalmente exigida;

Efectivamente, ao arrepio do regime estabelecido nos artºs.77º nº 2, 81º nº 6, 83º nº 1 e 132ºnº 1 f) CCP, a Recorrida não apresentou no prazo de 5 dias úteis de que foi notificada a comprovação documental da titularidade das habilitações legais exigidas, maxime, o alvará para o exercício da actividade de protecção pessoal, objecto do contrato - vd. alíneas K e L do probatório.
As cláusulas correspondentes às especificações técnicas do objecto do contrato de “Prestação de Serviços de Vigilância e Segurança” constam do ponto 2 do Caderno de Encargos – vd. alínea D do probatório - na veste de termos e condições, logo, constituindo matéria subtraída à concorrência e vinculativa das propostas sob pena de exclusão (artº 70º nº 2 b) CCP) tendo presente que no procedimento em causa o único atributo é o preço – vd. alínea F do probatório.

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Trata-se de serviços de segurança privada prestados a terceiros, atenta a descrição do conceito vazada no artº 1º nº 3 alínea a) DL 35/2004, 21.02, como segue:
. “3 — Para efeitos do presente diploma, considera-se actividade de segurança privada:
a) A prestação de serviços a terceiros por entidades privadas com vista à protecção de pessoas e bens, bem como à prevenção da prática de crimes;”
Quanto ao conteúdo, dispõe o artº 2º nº 1 als. a), b), c) e d) do DL 35/2004, 21.02:
“1 — A actividade de segurança privada compreende os seguintes serviços:
a) A vigilância de bens móveis e imóveis e o controlo de entrada, presença e saída de pessoas, bem como a prevenção da entrada de armas, substâncias e artigos de uso e porte proibidos ou susceptíveis de provocar actos de violência no interior de edifícios ou locais de acesso vedado ou condicionado ao público, designadamente estabelecimentos, certames, espectáculos e convenções;
b) A protecção pessoal, sem prejuízo das competências exclusivas atribuídas às forças de segurança;
c) A exploração e a gestão de centrais de recepção e monitorização de alarmes;
d) O transporte, a guarda, o tratamento e a distribuição de valores.”
O exercício da actividade de segurança privada a terceiros descrita no artº 1º nº 3 alínea a) DL 35/2004 depende de autorização ministerial, tendo esta como facto integrativo de eficácia a passagem de alvará, vd. artºs. 6º nºs. 1, 2 e 3 e 22º nº 1 DL 35/2004.
Ainda por referência ao conteúdo do conceito de “actividade de segurança privada” descrito no artº 2º nº 1 als. a), b), c) e d) do DL 35/2004, os pressupostos do acto autorizativo e respectivo alvará mostram-se regulados na Portaria nº 1085/2009, 21.09 passando pelo dever imposto às entidades requerente de instalações operacionais adequadas segundo descrição constante do artº 3º e da permanência dos meios humanos e materiais descritos no artº 4º da citada Portaria.
Cabe referir que se a entidade adjudicante se basta pela titularidade das habilitações pessoais que permitem a titulação jurídica para executar o contrato, há-de exigir no programa do concurso os documentos de habilitação “directamente relacionados com o objecto do contrato a celebrar” – vd. artºs 81º e 132º nº 1 f) CCP.
Neste caso a questão procedimental resolve-se em sede de habilitação confinando-se à “(..) existência e apresentação de títulos (certificados, registos) constitutivos ou comprovativos da posse de habilitações de qualquer natureza, académicas, profissionais, técnicas ou empresarias, que permitem o exercício legítimo de uma determinada actividade – mesmo que, para obtenção dos mesmos, tenha sido necessário demonstrar possuir-se determinados requisitos, recursos ou qualidades daquela índole, não podendo a entidade adjudicante questionar se tais requisitos, recursos ou qualidades justificavam efectivamente a atribuição daquele título ou habilitação.
A questão é, portanto, aqui, de certificação. (..)” (3)


3. titularidade de habilitação legal - caducidade da adjudicação - formalidades absolutamente essenciais – princípios da concorrência e transparência;

No caso em apreço, atentas as especificações técnicas na veste de termos e condições, levadas ao caderno de encargos, cabe concluir que o objecto do contrato a que se reporta o procedimento concursal consubstancia uma actividade de prestação de serviços de segurança privada a terceiros com o conteúdo descrito no artº 2º nº 1 alíneas a), b) e c) DL 35/2004.
E conclui-se, também, que ao não apresentar o alvará para a modalidade de “protecção pessoal” descrita no artº 2º nº 1, b) DL 35/2004 – vd. alínea L do probatório - a adjudicatária e ora Recorrida não observou o dever imposto pelos artºs. 77º nº 2 a) e 81º nº 6 CCP.
Neste quadro, em caso de imputação culposa do facto omissivo ao adjudicatário, dar-se-ia por verificada uma irregularidade formal essencial relativa ao comprovativo documental habilitante, que, no limite, tem como efeito jurídico a declaração de caducidade da adjudicação, vd. artº 86º nº 1 CCP.

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Todavia, no tocante ao sub-procedimento de declaração de caducidade da adjudicação decorre do probatório que a entidade adjudicante ora Recorrente não observou os termos legais consignados, desde logo porque antes de emitir a declaração de caducidade da adjudicação mediante o acto levado à plataforma electrónica em 25.02.2011 e com selo temporal de 17:11 h de “… a decisão de adjudicação … foi caducada …” omitiu totalmente as formalidades essenciais de tramitação procedimental que a lei manda observar no artº 86º nºs 2 e 3 CCP, acrescendo que a omissão de fundamentação é absoluta – vd. alínea N do probatório.
Efectivamente, atingido o termo ad quem do prazo de 5 dias úteis notificado à ora Recorrida para comprovação documental da titularidade das habilitações legais exigidas, mostrando-se em falta o alvará para o exercício da actividade de protecção pessoal constante do objecto do contrato, dá-se por verificada uma irregularidade formal essencial relativa ao comprovativo documental habilitante, cujo efeito se traduz na declaração de caducidade da adjudicação, vd. artº 86º nº 1 CCP.
Consequentemente, o órgão competente para a decisão de contratar – e não o júri concursal – uma vez verificada a falta de apresentação do alvará que titula a prestação de serviços de protecção pessoal, deve, primeiro, notificar o adjudicatário, via plataforma electrónica, para se pronunciar por escrito ao abrigo do direito de audiência prévia, vd. artº 86º nº 2 CCP e, segundo, caso as razões invocadas pelo interessado sejam de molde a concluir que a omissão de entrega dos documentos não lhe é imputável (imputação culposa), deve a entidade adjudicante fixar um prazo adicional para o adjudicatário efectivar a junção dos documentos de habilitação pessoal em falta, vd. artº 86º nº 3 CCP. (4)
Apenas na circunstância de o adjudicatário não responder à notificação ou de as razões por si invocadas serem julgadas irrelevantes em ordem a afastar a imputação culposa da não entrega dos documentos de habilitação pessoal, há lugar à declaração de caducidade da adjudicação.

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Ou seja, por força do princípio da legalidade - decorrente dos artºs. 2º e 266º nº 2 da CRP com consagração legal no artº 3º CPA - o regime do artº 86º nºs 2 e 3 CCP configura matéria que extravasa do âmbito dos poderes de auto-regulação das entidades adjudicantes, não podendo estas dispor contra legem, cumprindo-lhes, antes, observar os termos previstos no CCP para regularização e/ou suprimento de uma irregularidade formal essencial respeitante à forma e modo de apresentação dos documentos de habilitação, no caso, falta dos comprovativos documentais relativos à titularidade (alvarás) de exercício das actividades de segurança privada objecto do contrato de prestação de serviços levado a concurso.
E trata-se, como referido, de uma irregularidade formal essencial porque, a não ser regularizada segundo o regime estabelecido no artº 86º nºs. 2 e 3 CCP,centrado na verificação e apreciação d de a falta imputável ao adjudicatário de documentos de habilitação afecta a estabilidade dos efeitos constitutivos do acto de adjudicação, por caducidade desta nos termos do artº 86º º 1 a) CCP.
Pelo que vem de ser dito, a inobservância do regime prescrito no artº 86º nºs 2 e 3 CCP constitui um vício de procedimento imputável à Entidade Adjudicante, na medida em que não foi observado o regime normativo de regularização de formalidade essencial preterida em sede de habilitação pessoal do adjudicatário.
Matéria imperativamente regulada no CCP, tanto quanto ao conteúdo como quanto aos efeitos da permanência da irregularidade ou omissão documental, maxime, de imputação culposa do facto omissivo ao adjudicatário e consequente declaração de caducidade da adjudicação, correspondente à extinção reportada à data dos efeitos positivos constituídos na esfera jurídica do adjudicatário pelo respectivo acto administrativo, no caso dos autos a adjudicação notificada em 17.02.2011 - vd. alínea K do probatório.
Isto porque a declaração de caducidade é, também ela, uma declaração com efeitos constitutivos posto que, como nos diz a doutrina, “(..) é um efeito ou consequência inelutável da ocorrência de factos que, segundo a lei, a produzem … mas não se trata de um efeito produzido exclusivamente ope legis, independentemente de uma declaração ou de um acto jurídico em que se dê como verificada a causa que a determinou (mesmo que o efeito extintivo deva ser reportado ao momento da ocorrência dessa causa).
Note-se que as questões da caducidade da adjudicação (..) interessando directamente à entidade adjudicante e ao adjudicatário, interessam também aos outros concorrentes, que podem vir a ser beneficiados por uma eventual adjudicação subsequente, facto que deve ser tido em linha de conta no respectivo tratamento jurídico. (..)”. (5)
Exactamente porque este regime não se restringe aos sujeitos do processo directamente envolvidos, a entidade adjudicante e os adjudicatários, mas reflecte-se no tocante a todos os concorrentes do procedimento, tal significa que nesta matéria das causas de caducidade da adjudicação se convocam os princípios da concorrência e transparência das compras públicas em mercado aberto, com consagração legal no artº 1º nº 4 CCP.


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Concluindo e acompanhando nesta parte a decisão anulatória formulada em 1ª Instância - vd. páginas 30-31 da motivação de direito da sentença e alínea B) do segmento decisório – temos que a decisão de caducidade da adjudicação levada à plataforma (25.02.2011, 17:11h – alínea N do probatório) constitui um acto administrativo eivado de vício de violação de lei por preterição de formalidades absolutamente essenciais prescritas no sub-procedimento de caducidade da adjudicação legalmente exigido, vd. artº 86º nºs 2 e 3 CCP e, portanto, acto passível a de anulação nos termos do artº 163º nº 1 CPA (135º CPA/1991).


4. decisão de não adjudicação - revogação do procedimento – suficiência da fundamentação;

Mas, tal não envolve a renovação da eficácia dos efeitos constitutivos do acto de adjudicação (17.02.2011 – alínea K do probatório) na medida em que, ao abrigo do regime do artº 79º nº 1 c) CCP com fundamento na necessidade de “alteração de aspectos fundamentais das peças do procedimento (no caso concreto, a compatibilização entre o objecto do Contrato e os alvarás exigidos)”, a ora Recorrente revogou o procedimento mediante decisão de não adjudicação (25.02.2011, 17:54h), acto que, ex legis, determina a revogação da decisão de contratar, vd. artº 80º nº 1 CCP e, nos termos do artº 79º nº 3 CCP obriga a que, como foi observado, se dê início a outro procedimento adjudicatório de contrato com o mesmo objecto – vd. alíneas O, P e Q do probatório). (6)

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Nesta parte, pois, não se acompanha a sentença sob recurso que anulou o acto de não adjudicação (25.02.2011, 17:54 h) por vício de falta de fundamentação – vd. páginas 33- 34 da motivação de direito da sentença e alínea C) do segmento decisório.
No que tange à obrigação de fundamentar, impressa constitucionalmente no artº 268° n° 3 CRP e no CPA, artºs. 152º/153º (124°/125º CPA/1991), para efeitos de considerar preenchidos os requisitos legais da fundamentação do acto administrativo, impõem-se, entre outros requisitos, os de indicação expressa, clara, suficiente e congruente, embora sucinta, dos fundamentos, tendo por finalidade assegurar que o respectivo texto permita ao destinatário entender a que propósito aquele acto concreto foi praticado, em que medida afecta a sua esfera jurídica e em que medida pode atacá-lo contenciosamente
Tendo presente a problemática que necessáriamente acompanha a delimitação concreta do conteúdo da fundamentação formal no tocante aos critérios gerais de suficiência ou insuficiência formal “(..) a suficiência terá de ser avaliada na perspectiva do destinatário da declaração.
Na realidade, se a fundamentação é uma declaração justificativa, não bastará ter em conta o momento decisório em abstracto, impondo-se a consideração do "auditório" a quem o discurso se destina.
A divergência surge, todavia, na identificação do destinatário: deverá tratar-se do destinatário concreto da medida, de um destinatário normal ou razoável, ou da entidade com poderes de controlo de legitimidade do acto? Ou, por outras palavras, deverá julgar-se a suficiência pela cognoscibilidade, pela compreensibilidade ou pela controlabilidade da fundamentação ? (..)”.
Sem prejuízo de aceitarmos todas as insuficiências que a doutrina assaca, optamos claramente pelo segundo critério de “(..) compreensibilidade das razões da decisão por um destinatário normal ou razoável, ainda que colocado na situação concreta. (..)
(..) A objectivização do juízo da suficiência possibilita não só um modelo de declaração única para todos os destinatários, seja qual for o interesse ou papel que representem, como também uma comunicabilidade entre o emissor e o receptor pela via da racionalidade linguística - que são, afinal, os requisitos de uma obrigatoriedade formal-contextual de fundamentação. (..)
(..) o critério corresponde às exigências práticas que se colocam, em especial, no âmbito do controle jurisdicional: as razões que devem ser declaradas (..) são as (..) determinantes, isto é, aquelas que sejam, ao mesmo tempo, justificativas (..) e decisivas por terem sido entre todas, aquelas que serviram de causa impulsiva do agir da Administração. (..)” (7)

Feito o enquadramento doutrinário, voltemos ao caso concreto.

Embora do texto levado à plataforma a título de fundamentação da decisão de adjudicação – vd. alínea P do probatório - não concretize em que consiste a mencionada “incompatibilidade entre o objecto do contrato e os alvarás exigidos” a verdade é que o seu conteúdo não suscita problemas de compreensibilidade, mormente para a adjudicatária, ora Recorrida.
Tanto assim que do articulado inicial se retira que a Recorrida percebeu perfeitamente que tal incompatibilidade se traduzia, pelo menos, em que no Programa do Concurso o artº 16º faz referência expressa à apresentação pelo adjudicatário dos documentos de habilitação exigidos na alínea d) do nº 1 do artº 2º DL 35/2004 que, como acima transcrito, se refere ao alvará para exercício da actividade de segurança privada na modalidade de “transporte, a guarda, o tratamento e a distribuição de valores” – vd. alínea G do probatório – referência contraditória com a circunstância de esta modalidade não fazer parte do objecto do contrato de prestação de serviços descrito nas especificações técnicas levadas ao ponto 2 do Caderno de Encargos a título de termos e condições – vd. alíneas D e I do probatório.
Pelo que se conclui em favor da validade e eficácia do acto de não adjudicação, com os efeitos consignados de extinção do procedimento, com frustração do respectivo objecto por revogação da decisão de contratar, vd. artº 80º nº 1 CCP.


5. efeitos indemnizatórios decorrentes da não adjudicação – dano de confiança – inoperância de tutela da confiança por facto do adjudicatário;

Como referido de início, coloca-se a questão dos efeitos indemnizatórios da não adjudicação por factos imputáveis à entidade adjudicante, vd. artº 79º nº 4 CCP, neste caso efeitos restritos ao adjudicatário ora Recorrido posto que a revogação do procedimento é declarada posteriormente à notificação efectiva do acto positivo de adjudicação.(8)
No caso em apreço a decisão de não adjudicação, embora assente em causa legítima para não adjudicar, prevista no artº 79º nº 1 c) CCP - que é a necessidade de alterar o PC por contradição com o CE em matéria de titularidade de habilitação pessoal do adjudicatário, tendo já sido ultrapassada a fase procedimental em que a rectificação das peças ainda é possível nos termos do artº 50º CCP - é consequência de facto imputável à entidade adjudicante ora Recorrente.
Efectivamente, deriva do erro de conteúdo na elaboração do programa do concurso no tocante à comprovação da titularidade de alvará para exercício da actividade de segurança privada objecto do contrato, em contradição com a natureza das prestações dos serviços de segurança privada a contratar, totalmente descritas nos termos e condições do caderno de encargos.
Todavia, resulta provado que o adjudicatário, ora Recorrido, não apresentou o alvará para a modalidade de “protecção pessoal” descrita no artº 2º nº 1, b) DL 35/2004, modalidade integrante do objecto do contrato - vd. alíneas E e L do probatório.
O que significa, como já referido supra, que o adjudicatário e ora Recorrido não observou o dever imposto pelos artºs. 77º nº 2 a) e 81º nº 6 CCP.
Este incumprimento de dever legal por parte do adjudicatário assume relevância em sede de relação jurídica indemnizatória na exacta medida em que, por razões exclusivamente a si atinentes, o ora Recorrido paralisou a relevância jurídica da tutela da confiança do adjudicatário na celebração do contrato, dano de confiança que o artº 79º nº 4 CCP visa ressarcir em termos de indemnização equitativa pelo interesse contratual negativo, com fundamento na perda da oportunidade de celebrar o contrato.
Dito de outro modo, a inobservância de cumprimento de formalidades essenciais por parte de entidade adjudicante, ora Recorrente, no domínio do subprocedimento de caducidade da adjudicação, prescritas no artº 86º nºs. 2 e 3 CCP, não tem a virtualidade de, no domínio indemnizatório de tutela da confiança previsto no artº 79º nº 4 CCP sanar a incumprimento antecedente por parte do Recorrido adjudicatário ao não apresentar o alvará exigido nos termos do artº 2º nº 1, b) DL 35/2004, 21.02 e Portaria nº 1085/2009, 21.09 para serviços de segurança privada para “protecção pessoal”.
De quanto vem de ser dito conclui-se que não há lugar a indemnização por dano de confiança no domínio do artº 79º nº 4 CCP nem, consequentemente à operatividade do regime previsto nos artºs. 45º e 102º nº 5 CPTA.

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Tudo visto, procedem as questões trazidas a recurso nos itens H a M, N a R, S a Z e EE a II das conclusões, julgando-se prejudicadas pela solução das antecedentes as questões sob os itens A a G a AA a DD.


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Tudo visto acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em julgar procedente o recurso e revogar a sentença proferida.

Custas em 2ª Instância pelo Recorrido.

Lisboa, 16.JAN.2020


(Cristina dos Santos) ………………………………………..

(Sofia David) ……………………………………………….

(Dora Lucas Neto) ………………………………………….



[1] Mário/Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos e outros procedimentos de contratação pública, Almedina/2011, págs. 1030-1031;
[2] Mário/Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos e outros procedimentos…, págs. 783, 807, 1048 e 1061. [3] Mário e Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos … págs. 450, 485/486, 1065.
[4] Mário/Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos…, págs. 488, 552/553, 1036 a 1040; sustentando conformação distinta, no sentido de “convite ao cumprimento” ou “nova oportunidade de cumprimento” seguido de audiência prévia nos termos do CPA, Pedro Costa Gonçalves, Direito dos contratos públicos, 2ª ed. Almedina/2018, págs. 896/897 e 903.
[5] Mário/Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos …, págs. 1034-1045;
[6] Mário/Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos…, págs. 1041/1043 e 1047; Pedro Costa Gonçalves, Direito dos contratos públicos, 2ª ed. , págs. 589, 865, 868 e 873.
[7] Vieira de Andrade, O dever de fundamentação expressa de actos administrativos, Almedina/1991, págs. 241,247/248.
[8] Mário/Rodrigo Esteves de Oliveira, Concursos…, pág. 1062.