Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06122/12
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:06/11/2013
Relator:PEDRO VERGUEIRO
Descritores:IRC. CADUCIDADE. MÉTODOS INDIRECTOS. QUANTIFICAÇÃO DA MATÉRIA COLECTÁVEL.
Sumário:I) O prazo de caducidade do direito à liquidação é, em regra, de quatro anos contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário. Tal prazo suspende-se com a notificação ao contribuinte de início de acção inspectiva externa, mas esse efeito suspensivo cessa caso esta ultrapasse o período de seis meses contados a partir daquela notificação.
II) Se a acção inspectiva se concluir antes de decorridos aqueles seis meses, o efeito suspensivo do prazo de caducidade mantém-se até à notificação ao contribuinte da conclusão do procedimento inspectivo, pela elaboração do relatório final.
III) Cabendo à AF o ónus de provar os pressupostos da tributação por métodos indiciários, é a ela que cumpre demonstrar que a liquidação não pode assentar nos elementos fornecidos pelo contribuinte e que o recurso àquele método se tornou a única forma de calcular o imposto, competindo-lhe, por isso, especificar os motivos da impossibilidade da comprovação e quantificação directa e exacta da matéria colectável e indicar os critérios utilizados na sua determinação, fazendo assentar o volume da matéria colectável presumida em dados objectivos, racionais e fundamentados, aptos a inferir os factos tributários [...].
IV) Só então passará a caber, ao contribuinte e como acima referido, demonstrar a falta de aderência à realidade da matéria colectável que veio a ser fixada, e sendo caso disso, a medida em que tal sucedeu, sob pena de a dúvida sobre tal matéria se ter de revelar desfavorável à sua pretensão, já que, como é axiomático a sua existência não será, então, mais do que o resultado de uma conduta violadora do princípio da colaboração, que lhe está imposto, com transparência e verdade e que, nessa medida, a tornam infundada.
V) Tendo em consta as razões a que se arrimou a FP para lançar mão da avaliação indirecta e traduzidas, particularmente, na circunstância de, tendo procedido a diligência de averiguação junto dos adquirentes das fracções em causa, do total de 81 adquirentes no exercício em análise, 34 declararam um valor real de transacção diferente do valor contabilizado e pagaram a SISA correspondente a esse valor, o que em percentagem corresponde a 42% do total de adquirentes, e se traduz numa correcção ao lucro tributável já apurada de € 1.302.668,44 e que representa um acréscimo 28,60% ao valor contabilizado pela sociedade, traduz a afirmação de circunstâncias anómalas e indiciadoras da falta de aderência à realidade entre os valores declarados nas respectivas escrituras e os efectivamente pagos pela aquisição de tais fracções, sendo que neste domínio a situação foi devidamente quantificada com referência ao que pagaram a mais, tendo liquidado adicionalmente a SISA devida pela referida diferença, de modo que, o que se não vislumbra, sequer, é como é que se possa sustentar, que os mesmos não preencham os requisitos legitimadores do recurso à avaliação indirecta, por banda da AT, na medida em que se revelam absolutamente eloquentes da falta de aderência à realidade dos valores declarados como relativos às transacções das fracções acima referenciadas.
VI) O resultado é impressivo, na medida em que quase metades dos adquirentes declararam um valor real de transacção diferente do valor contabilizado e pagaram a SISA correspondente a esse valor, o que, como é óbvio, não deixa de trazer uma “confissão” implícita de que a vendedora se “encontrava aberta” a manobras de evasão fiscal deste teor, sendo que a demonstração daquele circunstancialismo é bastante para a AT lançar mão de métodos indirectos, desde logo porque é de todo irracional que um conjunto de indivíduos, que compraram outras fracções, tenham de peito feito e sem qualquer aparente interesse, decidido enriquecer o Estado através do pagamento de quantias de imposto se elas não correspondessem de facto, a diferenciais dos valores de aquisição, mas, antes, que o tenham feito para obter outros benefícios, seja em acréscimos legais, seja em sede contra-ordenacional, face às suspeitas da AT.
VII) A casuística escolha do método de avaliação indirecta da matéria tributável, sem concessões, é uma atribuição/competência, exclusiva, da AT, cujos serviços, actuando no estrito cumprimento da legalidade, têm de eleger e operar o que considerem mais adequado, apropriado, à quantificação necessária, recaindo sobre os tribunais a tarefa de verificação da sua correcta interpretação e aplicação, quando se regista o desacordo e a crítica do sujeito passivo.
VIII) A partir daqui, não se vislumbra a virtualidade do exposto pela Recorrente no sentido de afectar a validade do referido critério da permilagem, quando recorre à comparação de fracções autónomas que, à luz daquele, deveriam apresentar resultados divergentes e inversos daqueles de que se veio a servir a AF, na medida em que, apresentando-se, em si mesmo, tal critério, como justo e adequado, à luz de parâmetros de aferição pautados por juízos de normalidade e probabilidade, aquelas apontadas divergências em resultado da comparação feita, não teve em linha de conta que a AT apenas presumiu e, por consequência, apenas deles se serviu, nos casos em que os compradores nada vieram dizer de diferente ao teor do preço referenciado nas respectivas escrituras de compra, já que nos restantes casos em que tais compradores vieram revelar ter pago um preço superior ao declarado nos respectivos instrumentos de compra, foi esse o preço atendido.
IX) Nesta sequência, estando definitivamente decidido que, no caso, a AF demonstrou a ocorrência dos necessários pressupostos legais à utilização de métodos indirectos, por um lado e, por outro, apresentando-se adequadamente fundamentados, como adequados e pertinentes, os critérios de que a AT se serviu na tarefa de quantificação, era à impugnante que se impunha demonstrar que a utilização de tais critérios conduziu, sem margem para dúvidas fundamentadas, a um resultado final sem qualquer aderência à realidade, demonstração essa que, como temos por manifesto e na linha do acima referido, não logrou fazer, sem olvidar que, mesmo a subsistir qualquer dúvida, o que se postula por comodidade de raciocínio, ela sempre teria de desfavorecer a recorrente.
*
O Relator
Pedro Vergueiro
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul:

1. RELATÓRIO
“A..., S.A.” devidamente identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, datada de 18-06-2012, que julgou improcedente a pretensão pela mesma deduzida na presente instância de IMPUGNAÇÃO, relacionada com o indeferimento tácito da reclamação graciosa, apresentada relativamente à liquidação adicional de IRC e juros compensatório, referente ao exercício de 2002, no montante global de 1.222.681,54€.

Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 1859-1956), as seguintes conclusões que se reproduzem:
“ (…)
I) A ora recorrente foi inspecionada, no âmbito de um procedimento de inspeção externa, pela inspeção tributária da AT, com referência ao exercício de 2002, tendo por objeto, entre outros impostos, o IRC.
II) Com base na fundamentação constante do Relatório emitido e notificado, a matéria coletável da ora recorrente relativa a IRC e respeitante ao exercício de 2002, foi determinada por recurso a métodos indiretos.
III) Consequentemente foi efetuada e notificada à ora recorrente uma liquidação adicional de IRC no montante de 1.222.681,54 €, que já inclui 162.475,10 € de juros compensatórios.
IV) Contra a referida liquidação, a ora recorrente deduziu reclamação graciosa que foi indeferida tacitamente.
V) Do indeferimento tácito da reclamação graciosa deduziu a ora recorrente impugnação judicial, a que juntou Parecer emitido pelo PROF. Doutor JOSÉ LUÍS SALDANHA SANCHES e Mestre JOÃO TABORDA GAMA.
VI) A, aliás, douta sentença proferida na impugnação judicial julgou totalmente improcedente a impugnação da ora recorrente.
VII) É desta sentença que vem interposto o presente recurso jurisdicional.
VIII) Foram três os fundamentos da impugnação judicial: (i) notificação da liquidação fora do prazo de caducidade previsto no artigo 45.º, n.º 1, da LGT; (ii) inverificação do pressuposto e do requisito para aplicação de métodos indiretos na determinação da matéria coletável; (iii) erro na quantificação da matéria coletável.
IX) No probatório, a, aliás, douta sentença recorrida transcreveu e deu como provado todos os factos constantes do Relatório da inspeção tributária, fundada na prova documental junta aos autos, no processo administrativo em apenso.
X) Releva de notória parcialidade esta posição julgadora, porquanto, sob a forma de certidão emitida pela AT, a ora recorrente junto aos autos algumas centenas de páginas de documentos com igual força probatória e que sufragam as posições por si defendidas na p. i.
XI) Releva igualmente de parcialidade esta posição julgadora, porquanto, sob a forma de documentos particulares, a ora recorrente comprovou cada uma das 81 vendas efetuadas em 2002, mediante cópias simples das escrituras públicas celebradas com os respetivos adquirentes e dos meios de pagamento recebidos para pagamento dos preços declarados em documento público.
XII) A matéria relativa à notificação da liquidação por inexigibilidade da dívida por notificação para além do prazo de caducidade está em recurso no STA, cuja, aliás, douta decisão se aguarda.
XIII) Em conformidade com o recurso interposto no STA, respetivas conclusões, que aqui se dão como integralmente reproduzidas, a, aliás, douta sentença recorrida é, quanto a esta motivação, ilegal por violação do disposto no n.º 1 do artigo 45.º da LGT e violação do disposto no n.º 1 do artigo 46.º da mesma LGT.
XIV) A Inspeção tributária fundamenta o pressuposto da aplicação de métodos indiretos, no plano legal, de modo enviesado e inicialmente irregular. E, no plano factual, em torno de «declarações» obtidas de 34 dos 81 adquirentes e do posterior comportamento destes em matéria de regularização de sisa, de três ou quatro cheques emitidos a favor de um então seu empregado pelos adquirentes e da obtenção de empréstimos bancários de valor superior ao valor de aquisição constante das correspondentes escrituras de compra e venda.
XV) A estrutura conceptual utilizada pela Inspeção tributária é confusa, ininteligível e mesmo imprecisa e não distingue onde devia distinguir: indício, indício fundado e indício objetivamente demonstrável são conceitos subjacentes a toda a descrição factual do Relatório, que, porém, são todos eles integrados numa só categoria, a categoria dos indícios fundados, e que a sentença recorrida, erradamente, na perspetiva da ora recorrente, assumiu também de modo acrítico.
XVI) As meras declarações dos adquirentes, mesmo que acompanhadas da regularização da situação tributária simétrica ou correspondente a essas declarações, são apenas indícios objetivamente comprováveis, que carecem, para serem qualificados na categoria de indícios fundados, um adicional labor probatório da AT que, em nenhum caso, houve.
XVII) A ora recorrente comprovou, caso por caso, nas 34 situações sindicadas, que, independentemente de estar ou não reunido o binómio termo de declarações/regularização de sisa, em nenhum houve labor probatório próprio e adicional da Inspeção tributária que materializasse ou permitisse materializar a requalificação do indício objetivamente comprovável em indício fundado, quando, em seu entender, sufragado no PARECER junto e na doutrina citada, deveria ter existido.
XVIII) A ora recorrente comprovou que, em nenhuma das 34 situações sindicadas, qualquer dos adquirentes fez «prova plena» das suas declarações, sendo que essa prova plena seria constituída pela apresentação dos comprovativos dos meios de pagamento do «novo» preço declarado de aquisição à ora recorrente. Essa «prova plena» constituiria, sem dúvida, para efeitos legais e suas consequências, um indício fundado. Esta seria mais uma razão para que a Inspeção tributária se não tivesse remetido a uma posição passiva, descurando toda a diligência provatória que, segundo a distribuição do ónus da prova lhe cabe neste domínio.
XIX) A ora recorrente tem fundadas dúvidas de que a «regularização em sede de sisa» valha o que quer que seja (seria sempre uma decorrência automática das auto declarações), tanto mais que, como se comprovou, o direito de liquidação encontrava-se caducado e pelo menos quatro dos adquirentes que pediram a liquidação da sisa adicional a viram posteriormente anulada.
XX) De entre os cheques apresentados pelos adquirentes cujo valor foi imputado ao pagamento do preço, num caso o cheque está emitido a B...PORTUGAL, entidade sem qualquer relação com a ora recorrente. Acriticamente, veio a verificar-se, por via da certidão junta aos autos pela oras recorrente, que este cheque «comprova» parte do pagamento do preço declarado.
XXI) No caso dos três «adquirentes» que emitiram cheques a favor de C..., à data dos factos mero empregado da ora recorrente, constata-se que apenas está estabelecida a relação emitente/adquirente no caso dos dois cheques emitidos por D..., tendo a ora recorrente demonstrado que nos outros dois casos essa relação não está estabelecida, isto é, não foram os adquirentes que emitiram os cheques a favor de C....
XXII) E em nenhum dos casos se mostra estabelecida a relação material que importava comprovar, isto é, que o valor de tais cheques poderia ser imputado ao preço efetivamente pago, porque a beneficiária efetiva das respetivas importâncias tinha sido a ora recorrente.
XXIII) Contra as duas situações de contração de empréstimos de valor superior ao valor de aquisição constante das correspondentes escrituras de compra e venda, a própria recorrente indica seis, recolhidas da certidão obtida junto da AT, em que tal circunstância não foi igualmente valorada, não se percebendo a diferença de critérios.
XXIV) Por outro lado, é por demais pública e conhecida a generosidade das avaliações bancárias feitas a imóveis com o objetivo de fazer empréstimos com garantia real de valor muito superior ao bem dado em garantia e que redundaram, internacionalmente, na crise no sub prime, o mesmo sucedendo em Portugal, como é do domínio público.
XXV) Em conclusão e como bem se refere no PARECER junto aos autos pela ora recorrente: Repita-se que uma declaração de alguém vale como indício na medida da sua comprovabilidade objetiva que neste caso existe. Se trinta e quatro compradores afirmam ter pago mais a uma empresa, o dever provatório da Administração é investigar a veracidades destas afirmações.
XXVI) Ora, tudo o que se encontra no Relatório da Inspeção tributária, além de factualmente não comprovado, é uma concretização da grosseiramente vaga alusão aos pressupostos de aplicação da avaliação indireta.
XXVII) Não pode, assim, considerar-se indiciado fundadamente, muito menos cumprido o ónus da prova da sua verificação imposto pela regra de repartição constante do n.º 3 do artigo 74.º da LGT, do pressuposto legal exigido para a aplicação de métodos indiretos na determinação do lucro tributável da ora recorrente previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 88.º da mesma LGT, sendo ilegal a sentença recorrida por violação das duas normas mencionadas.
XXVIII) De igual modo, a Inspeção tributária em nada demonstrou que se verificava o da indispensabilidade, consagrado na al. b) do n.º 1 do artigo 88.º da LGT, do recurso a métodos indiretos para a determinação da matéria coletável de IRC à ora recorrente relativamente ao exercício de 2002.
XXIX) E consequentemente a decisão de tributação por métodos indiretos não especificou, nos termos impostos pelo n.º 4 do artigo 77.º da LGT, os motivos da impossibilidade da comprovação e quantificação diretas e exatas da matéria tributável, o que a doutrina denomina de requisito da impossibilidade da tributação segundo a contabilidade da empresa.
XXX) Termos em que a sentença recorrida é ilegal por violação do disposto nos artigos 88.º, n.º 1 e 77.º n.º 4 da LGT.
XXXI) Em sede de aspeto quantitativo, mostra-se desde logo violada a regra do n.º 3 do artigo 84.º da LGT, porquanto, colhendo-se do Relatório da Inspeção tributária a indicação dos critérios utilizados na quantificação do lucro por métodos indiretos, a fundamentação é totalmente omissa quanto à ponderação dos fatores que influenciaram a determinação do seu resultado.
XXXII) A Inspeção tributária utilizou diversos critérios para quantificar o lucro por métodos indiretos, sem fundamentar por que motivos utilizou aqueles e não outros, nomeadamente num setor em que o critério comummente reconhecido como válido ou mais adequado ao fim em vista é o valor do preço por metro quadrado, seja o de construção acrescido da margem de comercialização, seja o de venda para o mesmo tipo de construções.
XXXIII) O critério da permilagem é inadequado e inservível para o fim visado porque a permilagem é um negócio jurídico unilateral cujo principal objetivo é o de determinar a participação de cada condómino nos encargos legais do condomínio. Podendo ter alguma proporcionalidade com a área de cada fração autónoma, não a tem necessariamente.
XXXIV) A sua utilização correta, admitindo, sem conceder, a adequabilidade de tal critério, implicar sempre, em primeiro lugar, a determinação do valor total do prédio, para só depois se calcular o valor médio da unidade de permilagem.
XXXV) Face ao modelo utilizado, os valores médios da unidade de permilagem estão mal calculados.
XXXVI) De uma maneira ou de outra, verificam-se erros grosseiros no cálculo de tal valor médio que, como consequência lógica, afetam de modo excessivo, seja qual for a sua expressão quantitativa, a determinação do lucro tributável tal como foi efetuada.
XXXVII) Como afeta de modo excessivo, seja qual for a sua expressão quantitativa, a determinação do lucro tributável a atribuição, a frações com idêntica permilagem, do maior dos «preços declarados» e não, por exemplo, um preço médio.
XXXVIII) Um critério a que Inspeção tributária denomina «margem média de omissão de proveitos» e que a sentença recorrida traduz por «diferença entre o total dos custos incorridos até à conclusão da construção e o valor real da transação declarada pelos adquirentes» é, semântica e tecnicamente incompreensível, pelo que nem sequer é suscetível de integrar uma relação congruente e justificada entre os factos apurados e a situação concreta do contribuinte.
XXXIX) O que tudo viola o disposto no n.º 2 do artigo 85.º e no artigo 90.º, ambos da LGT.
XL) Pelo que, em matéria de erro de erro na quantificação da matéria coletável, a sentença recorrida é ilegal por violação do disposto no n.ºs 3 do artigo 84.º, no n.º 2 do artigo 85.º e no artigo 90.º, todos da LGT
NESTES TERMOS, e nos mais que V. Ex.ª doutamente suprirá, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e, em consequência, deve a, aliás, douta sentença recorrida ser revogada, com todas as legais consequências, assim se fazendo JUSTIÇA!

A Recorrida Fazenda Pública não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer nos seguintes termos:
“(…)
I - “A..., S.A.” veio interpor recurso da sentença do Mmo Juiz do TT de Lisboa que julgou improcedente a impugnação deduzida contra as liquidações de IRC referente ao exercício de 2002.
Refere que a sentença incorreu em erro de julgamento da matéria de facto e de direito.
A sentença recorrida deu por assentes e provados, os factos que se mostram a fls.1819/1832.
II - Na conclusão VIIIa veio a recorrente referir quais os fundamentos da impugnação judicial sendo:
1° fundamento: - Notificação da liquidação fora do prazo de caducidade previsto no art. 45º nº l da LGT não concordando a recorrente com o decidido.
Analisados os elementos de prova constantes dos autos teremos de acompanhar a fundamentação do decidido, uma vez que se verificou a suspensão do prazo de caducidade do direito à liquidação nos termos do art. 46º nº 1 da LGT, por ter havido notificação da recorrente a 10.10.2006 da ordem de serviço referente ao inicio da acção inspectiva, sendo notificada do relatório final a 30.03.2007 e da liquidação do imposto a 29.05.2007, sendo certo que descontado o tempo da suspensão do prazo de caducidade, este só terminaria a 20.06.2007.
Deve improceder este argumento apresentado pela recorrente (concl. XIXa a XIIIa).
2º fundamento: - Inverificação do pressuposto e do requisito para aplicação de métodos indirectos na determinação da matéria colectável.
Atenta a matéria factual fixada no probatório da sentença e que deriva de uma correcta interpretação dos documentos juntos aos autos, afigura-se-me difícil acompanhar a argumentação da recorrente, sendo certo que a prova que diz ter carreado para os autos não se mostrou suficiente para contrariar a análise feita pela AT aos elementos contabilísticos encontrados durante a inspecção levada a efeito.
Dos autos, nomeadamente do relatório da fiscalização, resulta que os elementos contabilísticos da impugnante não mereceram credibilidade, atentas as incorrecções e omissões encontradas, e que foram devidamente pormenorizadas pela AT, de molde a justificar a utilização do uso de métodos indirectos
A recorrente entende ainda que o Tribunal a quo aplicou incorrectamente a lei ao caso concreto, cometendo um erro de julgamento ao julgar improcedente a impugnação por considerar lícito o recurso pela AT, a métodos indirectos de determinação da matéria colectável.
A recorrente alega que não há fundamento por parte da AT para aplicação dos métodos indirectos, tendo a sentença recorrida violado os art. 88º n° l e 77º nº 4º da LGT ao julgar legitimo tal uso pela recorrida, como decorre da respectiva fundamentação (concl. XIVa a XXXa).
3° fundamento : - Erro na quantificação da matéria colectável.
Relativamente a esta questão suscitada pela recorrente na petição inicial de impugnação, teremos de referir que se à AT cabe o ónus de provar a utilização de métodos indirectos na liquidação, e se baseou na existência de pressupostos de facto e de direito suficientes, cabe à impugnante o ónus de provar que deu cumprimento aos preceitos legais que fundamentaram as operações contabilísticas postas em causa pela fiscalização tributária (concl. XXXIa a XIa).
Dos autos resulta que a recorrente não apresentou prova suficiente, pelo que não há que imputar vícios ou ilegalidades à actuação da AT, nem erros de apreciação à sentença recorrida, por violação dos preceitos legais invocados pela recorrente, pelo que se entende que o recurso não merece provimento.
(…)”

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO –QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelas Recorrentes, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que as questões suscitadas resumem-se, em suma, em indagar da questão da notificação da liquidação fora do prazo de caducidade previsto no artigo 45.º n.º 1 da LGT bem como apreciar a existência do pressuposto e do requisito para aplicação de métodos indiretos na determinação da matéria coletável e bem assim a existência de erro na quantificação da matéria coletável.

3. FUNDAMENTOS
3.1 DE FACTO
Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte:
“…
A) A impugnante exerce a actividade de construção de edifícios, correspondente ao CAE n.º 45211 (cfr. fls. 136 dos autos).
B) A Impugnante, em sede de IRC, encontra-se enquadrada no regime geral (cfr. fls. 136 dos autos).
C) A impugnante foi objecto de uma acção de inspecção externa, ao exercício de 2002, em sede de IRC, no âmbito da qual foram efectuadas correcções à matéria colectável, por métodos indirectos, no montante de 3.235.942,43€ (cfr. fls. 134 dos autos).
D) A Impugnante recebeu a 10/10/2006, a ordem de serviço nº OI200605378 que determinou a acção de inspecção mencionada na alínea anterior (cfr. fls. 136 e 161 dos autos).
E) Em 02/03/2007, pelo administrador da impugnante, foi assinada a nota de diligências prevista no art. 61.º do RCPIT, n.º NDO200727911 (cfr. fls. 163 dos autos).
F) Em 30/03/2007 foi emitida certidão de notificação pessoal, nos termos do art.º 240º/2 do CPC, em nome da impugnante, acompanhada do relatório final da inspecção, em cumprimento do art.º 77º da LGT e do art.º 62º do RCPIT (cfr. fls. 126 dos autos).
G) Em 26/04/2007 a impugnante apresentou pedido de revisão da matéria colectável, ao abrigo do art.º 91º/1 da LGT, da fixação da matéria colectável, referente ao exercício de 2002, por de métodos indirectos, nos termos dos artigos 87º a 90º da LGT, e 54.º do CIRC (cfr. fls. 313 do processo administrativo).
H) Em 15/05/2007 reuniram os peritos da AT, conjuntamente com o perito indicado pelo sujeito passivo, sem terem concluído qualquer acordo, tendo cada um deles lavrado o respectivo laudo, e o Director de Finanças de Lisboa determinado a fixação da matéria colectável respeitante ao IRC de 2002, no montante de 3.669.245,72€, ao abrigo do art.º 92º/6 da LGT (cfr. documentos a fls. 184 e ss dos autos).
I) Em 12/06/2007 foi emitida certidão de notificação pessoal, nos termos do art.º 41º/1 do CPPT, em nome da impugnante, dando conhecimento do teor do ofício nº 40063, de 17/05/2007, da Direcção de Finanças de Lisboa, respeitante à conclusão do procedimento de revisão, acompanhado dos respectivos documentos e indicando o meio de reacção previsto no art.º 102.º do CPPT (cfr. documento de fls. 181 dos autos).
J) As correcções mencionadas na alínea C) foram efectuadas com o seguinte fundamento, que aqui se transcreve na parte com interesse para a decisão: “A sua contabilidade está organizada de acordo com as normas comerciais e fiscais. O sujeito passivo tem cumprido com as suas obrigações declarativas e tem pago os impostos quando há lugar a auto liquidação e faz entrega nos cofres do Estado do imposto retido. Relativamente ao exercício de 2002 foram-nos apresentados os elementos contabilísticos que comprovam os valores constantes das declarações entregues. O dossier fiscal está organizado e contém elementos discriminativos das obras que foram concluídas neste exercício e das que constituem Existências Finais, com a imputação dos respectivos custos. Os fluxos financeiros da empresa estão de acordo com os lançamentos efectuados nas outras contas e sendo o pagamento das fracções, ou outros imóveis, a principal fonte de receita verificou-se que, normalmente, os seus clientes faziam uma entrega monetária que correspondia a um adiantamento relativamente ao imóvel que pretendiam adquirir e, à data da escritura, era feito o acerto de acordo com o valor nela mencionado, ficando assim a conta do cliente saldada, por contrapartida do registo no Diário de Vendas do valor atribuído ao imóvel pela escritura. O financiamento da actividade da empresa era efectuado mediante empréstimos contraídos junto da Banca, nomeadamente no E...Geral e F...de Mafra, tendo os empréstimos dos sócios, relevados nas subcontas 25512 e 25513, pouca expressão. Apesar do disposto no ponto anterior, a Contabilidade da empresa não reflecte todos os movimentos relativos à sua actividade, conforme indícios de fuga ao valor declarado, recolhidos na fase de planeamento desta acção e mais tarde confirmados, e outros elementos comprovativos do valor real de compra/venda dos imóveis, recolhidos por cruzamento de informação com os adquirentes, que regularizaram a sua situação relativamente à SISA e declararam um valor real de aquisição superior ao valor de escritura e consequentemente superior ao valor contabilizado como vendas da "A..., SA" e que passamos a descrever.
III. 2 - Recolha de informação efectuada pela Equipa de Análise Prévia, relativamente aos adquirentes da "A..., SA" No âmbito da análise prévia efectuada constatou-se que, G..., NIF ..., adquiriu a fracção "Q" do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o art.º 6762, da Freguesia da Ericeira, concelho de Mafra, cujo valor declarado para efeitos de liquidação de Imposto Municipal de Sisa, nos termos do n.º, 2.º do art.º 19.º do Código do LM.S.LS.S., foi de € 115.000,00.
No entanto, nos termos do art.º 63.º-B da Lei Geral Tributária, resultante de autorização concedida pelo sujeito passivo para levantamento do sigilo bancário, obtiveram cópias de cheques bancários no valor de € 147.145,38. Este valor está subdividido em três cheques: um, no valor de € 115.000,00 emitido à ordem de A..., SA e dois emitidos a I..., um no valor de € 17.956,72 e outro no valor de € 14.188,66, (…)
Mais tarde, em finais de 2003, como já foi referido no ponto I1-4, voltou a integrar o capital da empresa quando esta passou de sociedade por quotas a sociedade anónima.
Em face do constatado - possível omissão de valores nas transacções de imóveis - foi notificada a sociedade "A..., SA" na pessoa do responsável pela sua gestão e em termo de declarações, lavrado em 28/07/2006, afirmou "desconhecer susceptíveis omissões de valores na alienação de imóveis".
Em consequência das situações que foram constatadas, foi proposta acção externa de inspecção à empresa, e mais uma vez foi solicitada a comparência dos responsáveis pela gestão da sociedade pelo nosso oficio n.º 74028 de 15/09/2006, (Anexo III, pág. 39 a 40), para no dia 29/09/2006 comparecerem nestes serviços com a finalidade de apresentarem esclarecimentos sobre a actividade exercida nos anos de 2002 e seguintes, reunião à qual não compareceram.
Nestes termos foi desencadeada a acção externa de inspecção, com base na emissão da presente Ordem de Serviço no âmbito da qual foram contactados todos os adquirentes das fracções ou outros imóveis adquiridos no ano de 2002, cujos elementos recolhidos são analisados nos pontos seguintes.
111.3 - Valor de transacção dos imóveis declarado pelos adquirentes
Em face da situação detectada pela análise prévia, descrita no ponto anterior, procedeu-se à notificação de todos os adquirentes de imóveis à empresa A... SA, no exercício de 2002, com o objectivo de confirmar o valor de aquisição da(s) fracção(ões) contabilizadas na conta 71.2.1.10 - Vendas Isentas, (conforme extracto de conta corrente, Anexo IV, pág. 41 a 45). Como resultado da audição dos compradores abaixo mencionados, constatou-se que dos 81 adquirentes, 34 (42% do total) declararam valores de aquisição superiores ao constante das respectivas escrituras, como se exemplifica no quadro a seguir:
(…)
IV. Motivos e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos
Face ao exposto nos capítulos anteriores, verifica-se desde logo que os registos contabilísticos da empresa e respectivos documentos de suporte não reflectem a sua real situação tributária ficando demonstrada a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta, quanto à correcta determinação da matéria tributável, tanto mais que tendo o representante da empresa sido confrontado com a existência de divergências relativas aos seus registos contabilísticos declarou-nos que "admitia algumas dessas divergências, contudo não lhe era possível quantificá-las, dado que a pasta que continha mais elementos relativos à venda dos imóveis, nomeadamente contratos promessa de compra e venda tinha-se extraviado". Estes factos, e os que a seguir se indicam passam a constituir fundamentação da tributação com recurso a métodos indirectos conforme previsto nos artigos 87.º a 89.º da LGT por força do disposto no art.º 52.odo CIRC.
1. Como foi descrito no capítulo anterior, a contabilidade não reflecte o valor correcto das vendas relativamente aos adquirentes mencionados.
2. Os imóveis em que os respectivos adquirentes declararam o valor de compra igual ao valor de escritura, e os dos adquirentes que não compareceram para prestar declarações sobre a sua aquisição, tudo indica que também não estão contabilizados na conta de "proveitos" pelo seu valor real, nomeadamente pelos seguintes factos constatados:
a) Do total de 81 adquirentes no exercício em análise, 34 declararam um valor real de transacção) diferente do valor contabilizado e pagaram a SISA correspondente a esse valor, o que em percentagem corresponde a 42% do total de adquirentes, e se traduz numa correcção ao lucro tributável já apurada de € 1.302.668,44 e que representa um acréscimo 28,60% ao valor contabilizado pela sociedade A....
b) Verificou-se que a omissão foi sistemática, atendendo á data das escrituras e ronda os 30% do valor declarado. As escrituras relativamente aos adquirentes que declararam um valor real superior, foram celebradas: Uma em Janeiro, uma em Março, oito em Abril, cinco em Maio, uma em Junho, quatro em Julho, três em Agosto, uma em Setembro, uma em Outubro e três em Novembro. As restantes escrituras celebradas também se encontram dispersas por todo o exercício de 2002;
c) Verifica-se que fracções com a mesma tipologia foram transaccionadas por valores idênticos dentro do mesmo edifício. Podemos referir como exemplo:
- No Edifício Neptuno, as fracções "D", "G" e "U", todas com a tipologia T-2 c/ terraço e logradouro, em que o valor de escritura foi €85.000,00 e os adquirentes declararam valores reais próximos dos €125.000,00;
- No Edifício Belo Horizonte - loteI8 - verificou-se que para a tipologia T-2, o valor de escritura foi de €85.000,00 e os adquirente que regularizam, fizeram-no por valores próximos dos €120.000,00.
d) Comprovou-se ainda, que alguns adquirentes, dos que regularizaram a sua situação tributária, efectuaram o pagamento da diferença entre o valor declarado e o real valor de transacção dos imóveis, através de cheques, emitidos à ordem do Sr. C..., funcionário da empresa A... e antigo Gerente, conforme se exemplifica:
1. O sujeito passivo H..., NIF ..., adquirente da fracção "R" do imóvel inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 6880 da freguesia da Ericeira, do Concelho de Mafra, declarou como valor de aquisição, da referida fracção, € 157.500,00 (conforme termo de declarações - Anexo VI, pág. 161 a 170) ao invés do valor escriturado de € 115.000,00. O valor de € 157.500,00 foi pago da seguinte forma:
- Através do cheque n.º 4969610749 sobre a Caixa Geral de Depósitos, S.A. o valor de € 78.750,00 pagos a título de sinal em 13.04.2002 aquando da celebração do contrato promessa de compra e venda;
- Através do cheque n.º 4939895579 sobre a Caixa Geral de Depósitos, S.A. o valor de € 36.250,00 pagos no acto da escritura em 22.07.2002;
- O valor de € 42.500,00 foi pago através do cheque n." 4039895580 sobre a Caixa Geral de Depósitos, S.A., emitido à ordem do Sr. I..., NIF ...no acto da escritura em 22.07.2002;
Os elementos acima indicados, comprovados pelas fotocópias dos referidos cheques, constam de termo de declarações lavrado no dia 03/0112007, (Anexo VI, pág. 162 a 165 )
2. O sujeito passivo J..., NIF ..., adquirente da fracção "A" do imóvel inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 6762 da freguesia da Ericeira, do Concelho de Mafra, declarou como valor de aquisição, da referida fracção, € 115.000,00 (conforme termo de declarações - Anexo VI, pág. 165 a 167) ao invés do valor escriturado de € 85.000,00:
- A diferença entre o valor de escritura e o valor real da transacção cifra-se em 30.000,00€
O sujeito passivo, remeteu a estes serviços cópia de cheque no valor de € 28.000,00, emitido à ordem do Sr. I..., NIF ...no acto da escritura em 03.10.2002;
Os elementos acima indicados, comprovados pelas fotocópias dos referidos cheques, constam de termo de declarações lavrado no dia 24/10/2006, (Anexo VI, pág. 166 a 170)
3. O sujeito passivo K..., NIF ..., adquirente da fracção "Q" do imóvel inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 6762 da freguesia da Ericeira, do Concelho de Mafra, de acordo com o exposto no ponto III.2 deste relatório.
4. No tratamento da informação relativa a escrituras de compra e venda, verificou-se, em alguns casos, que para além do empréstimo para aquisição da fracção, foi contraído um segundo empréstimo denominado "Multi-opções/Obras", cuja garantia é a hipoteca da mesma fracção. Verificou-se, ainda outra situação, em que apesar de existir um único empréstimo este continha um valor destinado á aquisição do imóvel e o restante destinado a obras de beneficiação do mesmo. Nas duas situações descritas constatou-se que o segundo empréstimo não se destinava aos fins referidos na escritura, mas antes ao pagamento do valor real de aquisição das habitações, conforme Anexo VII, pág. 171 a 197
Em face do exposto, consideramos que existem fortes indícios de que a Contabilidade, não reflecte a exacta situação patrimonial do sujeito passivo nem o resultado efectivamente obtido o que impossibilita a comprovação e quantificação directa dos elementos indispensáveis à correcta determinação do resultado fiscal nos termos do art. 17.°, n.º 3, do Código do IRC, pelo que se propõe a determinação do lucro tributável por métodos indirectos nos termos do art.º 52.º do mesmo Código do IRC, com observância do disposto nos artigos 87.º a 90.º da Lei Geral Tributária, como foi referi no início deste capitulo.
V - Critérios e cálculos dos valores corrigidos com recurso a métodos indirectos
Constatando-se a omissão de proveitos, para efeitos de cálculo do valor presumido de venda, o mais aproximado daquele que efectivamente tinha sido praticado pela empresa, tendo sempre como referência os dados conhecidos para determinar o valor desconhecido (art." 85.° da LGT), utilizamos como ponto de partida os seguintes critérios de avaliação indirecta nos termos do art.º 84.º da LGT:
Atribuímos às fracções com a mesma permilagem, os mesmos valores de transacção daquelas cujos adquirentes regularizaram voluntariamente a sua situação tributária;
Para as fracções não directamente comparáveis com outras em que os adquirentes tenham regularizado a sua situação tributária, utilizámos o valor unitário médio de permilagem, calculado com base nos valores declarados pelos adquirentes que regularizaram;
Relativamente às moradias, apurou-se a margem média de omissão de proveitos, considerando para esse cálculo a diferença entre o total dos custos incorridos até à conclusão da construção e o valor real da transacção declarado pelos adquirentes.
V.1 - Artigo 6762 - Freguesia da Ericeira (Edifício Belo Horizonte - Lote 18).
Tendo por base os valores declarados para efeitos de regularizações voluntárias de Imposto Municipal de SISA, pelos contribuintes indicados, constantes no quadro infra:
(…)
O total de omissão apurado relativamente às fracções do artigo 6762, no valor de € 741.630,97, compreende € 446.781,72 de correcções técnicas, apuradas no quadro n.º 1.
V.2 - Artigo 6761 da Freguesia da Ericeira (Edifício Belo Horizonte Lote 19)
Tendo por base os valores declarados para efeitos de regularizações voluntárias de Imposto Municipal de SISA, pelos contribuintes indicados, apurou-se o valor unitário médio de permilagem para as fracções do artigo 6761.
(…)
Valor unitário médio de permilagem = [(Valor Real Declarado / Permilagem)] / N.º total fracções
Valor unitário médio de permilagem = [(157.500,00/44) + (110.000,00 / 35) + (127.000,00 / 41) + (140.000,00/49) + (115.000,00/35) + (132.181,44/41)] /6 = €3.197,79
Para a determinação do presumível valor de venda das fracções "C", "D", "K", "T", "X'te "Z", cujas permilagens não são directamente comparáveis com as permilagens das fracções em que os adquirentes regularizaram voluntariamente a sua situação tributária, procedeu-se da seguinte forma:
Valor de venda presumido por fracção = (Valor unitário médio de permilagem ) x ( permilagem da fracção)
Relativamente às fracções, "G", "H","I", "L","P" "U" e "8", o seu valor de venda presumido foi calculado atribuindo às fracções com a mesma permilagem (Anexo VIII, pág 200), o valor de transacção mais elevado das fracções cujos adquirentes regularizaram voluntariamente a sua situação tributária. Como se demonstra no quadro seguinte.
(…)
o total de omissão apurado relativamente às fracções do artigo 6761, no valor de €745.764,75, compreende €217.150,26 de correcções técnicas, apuradas no quadro n.º 3.
V.3 - Artigo 6382 da Freguesia da Ericeira (Edifício Neptuno)
Tendo por base os valores declarados para efeitos de regularizações voluntárias de Imposto Municipal de SISA, constantes no quadro infra, efectuadas pelos contribuintes indicados, apurou-se o valor médio unitário de permilagem para as fracções do artigo 6382.
Na presunção do valor de transacção para as restantes fracções do artigo 6382, recorrendo ao valor unitário médio de permilagem (Anexo VIII, pág. 201), procedeu-se da seguinte forma:
Valor unitário médio de permilagem = [ (Valor Real Declarado / Permilagem)] / N.º total fracções
Valor unitário médio de permilagem [(129.680,00/24)+(137.170,00/ 27)+(125.000,00/26)+(127.193,46/26)+(124.500,00/25) + (162.000,00/28) + (125.000,00/27] / 7 = € 5.082,68
Valor de venda presumido por fracção = ( Valor unitário médio de permilagem ) x ( permilagem da
(…)
o total de omissão apurado relativamente às fracções do artigo 6382, no valor de €422.599,92, compreende €315.753,46 de correcções técnicas, apuradas no quadro n.º 5.
V.4 - Artigo 6880 da Freguesia da Ericeira ( Edifício Sete Mares)
Tendo por base os valores declarados para efeitos de regularizações voluntárias de Imposto Municipal de SISA, constantes no quadro infra, bem como as declarações prestadas pelos adquirentes indicados, apurou-se o valor médio da respectiva permilagem para as fracções do artigo 6880. Para as restantes fracções, e uma vez que existem valores comparáveis resultantes de regularizações voluntárias efectuadas pelos adquirentes, optou-se por presumir o valor real da transacção tendo por base o valor mais elevado das regularizações efectuadas para fracções com a mesma permilagem (Anexo VIII, pág. 202), designadamente:
(…)
o valor de venda presumido das fracções, do artigo 6880 - Edifício Sete Mares, vendidas em 2002, recorrendo ao valor unitário médio de permilagem, será o seguinte:
Valor unitário médio de permilagem = (Valor Real Declarado / Permilagem) / n.º total fracções
Valor unitário médio de permilagem = [(157.500,00 / 50) + (125.000,00 / 37)+(120.000,00/37) + (130.000,00150) + (129.000,00/41) + (115.000,00/37)] 16 = €3.104,35
Relativamente às fracções "G", "H" e "Q" que tem uma permilagem coincidente com a das fracções cujos adquirentes declararam o valor real da transacção e regularizaram voluntariamente a sua situação tributária, optou-se por considerar o valor de venda presumido o mesmo para todas as fracções com a mesma permilagem.
(…)
V.S - Artigos, 6768, 6274, 6276, 6805, 6806 e 6808 da Freguesia da Ericeira ( Moradias ).
Tendo por base os valores declarados para efeitos de regularizações voluntárias de Imposto Municipal de SISA, constantes no quadro infra, efectuadas pelos contribuintes indicados, apurou-se o valor médio de omissão de proveitos. considerando para esse calculo a diferença entre o total dos custos incorridos até à conclusão da construção e o valor real da transação (Anexo VIII. pág 203), resultante dos valores das regularizações voluntárias efectuadas pelos adquirentes, dos prédios urbanos inscritos na matriz sob os artigos 6804 e 6807.
(…)
o valor de venda presumido dos artigos 6274, 6276, 6805, 6806, 6808 e 6768, vendidos em 2002, recorrendo à diferença média entre o valor real da venda dos respectivos artigos conhecida e o total dos custos incorridos na sua construção de acordo com informação fornecida pela empresa, será o seguinte:
Percentagem de Margem Real = (Valor Real de Transacção - Total dos Custos Incorridos) / Total dos Custos.
Artigo 6804 = (207.000,00-112.734,09) /112.734,09 = 84%
Artigo 6807 = (214.000-103.825,00) /103.825,00 = 106%
Percentagem Média de Margem Real = (84%+ I 06%) / 2 = 95%
A determinação do valor de transacção presumido, resulta da multiplicação do valor total de custos por 1,95 = (Total dos custos x 1,95), como se demonstra no mapa seguinte:
(…)
o total de omissão apurado no valor de €672.900,84, compreende €171.483,00 de correcções técnicas, apuradas no quadro n.º 9.
V.6 - Valor total das correcções apurado por métodos indirectos
Em conclusão e de acordo com o exposto nos pontos anteriores deste capítulo, o valor total de €3.235.942,43 de correcção ao lucro tributável apurado por métodos indirectos, inclui €1.302.668,44 "~" de correcções técnicas.
Por outro lado, na reconstituição do lucro presumido como real, consideram-se verdadeiros os valores declarados pelos adquirentes dos imóveis e confirmados com a respectiva regularização de SISA, pelo que tendo sido aplicados métodos indirectos estes subsumem todas as correcções técnicas. (…)” (cfr. relatório de inspecção tributária a fls. 137 e ss dos autos).
K) Em 22/05/2007 foi emitida a liquidação adicional nº 20078310013507, respeitante ao IRC de 2002, no valor de 1.222.681,54 € (cfr. documento de fls. 165 dos autos).
L) A liquidação mencionada na alínea anterior foi recebida pela Impugnante em 29/05/2007 (cfr. fls. 165 a 179 dos autos).
M) Em 16/10/2007 a Impugnante apresentou reclamação graciosa da liquidação mencionada na alínea anterior (cfr. fls. 80 e ss dos autos; e requerimento a fls. 1 e ss. do processo de reclamação graciosa).
N) A Impugnação foi apresentada em 29/04/2008 (cfr. fls. 2 dos autos).

****
Quanto aos factos provados a convicção do Tribunal fundou-se na prova documental junta aos autos, no processo administrativo em apenso.
Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados.”
3.2 DE DIREITO
Assente a factualidade apurada cumpre, agora, entrar na análise da realidade que envolve o presente recurso jurisdicional, impondo-se, desde logo, indagar da pertinência do exposto pela Recorrente quanto à matéria relativa à notificação da liquidação por inexigibilidade da dívida por notificação para além do prazo de caducidade, sendo que em conformidade com o recurso interposto no STA, respetivas conclusões, que aqui se dão como integralmente reproduzidas, a, aliás, douta sentença recorrida é, quanto a esta motivação, ilegal por violação do disposto no n.º 1 do artigo 45.º da LGT e violação do disposto no n.º 1 do artigo 46.º da mesma LGT.
Pois bem, seguindo a metodologia da Recorrente, e quanto a esta realidade, cumpre ter presente o exposto no Ac. do S.T.A. de 03-04-2013, Proc. nº 0103/12, www.dgsi.pt, - a tal decisão aguardada pela Recorrente -, onde se ponderou que:
“…
Os nºs. 1 e 4 do art. 45º da LGT dispunham, à data (redacção introduzida pelo art. 43º da Lei nº 32-B/2002,de 30/12):
«1 - O direito de liquidar os tributos caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro.
(…)
4 - O prazo de caducidade conta-se, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação única, a partir da data em que o facto tributário ocorreu, excepto no imposto sobre o valor acrescentado e nos impostos sobre o rendimento quando a tributação seja efectuada por retenção na fonte a título definitivo, caso em que aquele prazo se conta a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou, respectivamente, a exigibilidade do imposto ou o facto tributário.»
Por sua vez, o nº 1 do art. 46º da mesma LGT dispunha (também na redacção da citada Lei nº 32-B/2002):
«1 - O prazo de caducidade suspende-se com a notificação ao contribuinte, nos termos legais, da ordem de serviço ou despacho no início da acção de inspecção externa, cessando, no entanto, esse efeito, contando-se o prazo do seu início, caso a duração da inspecção externa tenha ultrapassado o prazo de seis meses após a notificação.»
Já no âmbito do Regulamento Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT) – aprovado pelo DL nº 413/98, de 31/12, e republicado na Lei nº 50/2005, de 30/8) dispõe-se, no que aqui releva:
«Artigo 13º - Lugar do procedimento de inspecção
Quanto ao lugar da realização, o procedimento pode classificar-se em:
a) Interno, quando os actos de inspecção se efectuem exclusivamente nos serviços da administração tributária através da análise formal e de coerência dos documentos;
b) Externo, quando os actos de inspecção se efectuem, total ou parcialmente, em instalações ou dependências dos sujeitos passivos ou demais obrigados tributários, de terceiros com quem mantenham relações económicas ou em qualquer outro local a que a administração tenha acesso.»
«Artigo 36° - Início e prazo do procedimento de inspecção
1 - O procedimento de inspecção tributária pode iniciar-se até ao termo do prazo de caducidade do direito de liquidação dos tributos ou do procedimento sancionatório, sem prejuízo do direito de exame de documentos relativos a situações tributárias já abrangidas por aquele prazo, que os sujeitos passivos e demais obrigados tributários tenham a obrigação de conservar.
2 - O procedimento de inspecção é contínuo e deve ser concluído no prazo máximo de seis meses a contar da notificação do seu início.
3 - O prazo referido no número anterior poderá ser ampliado por mais dois períodos de três meses, nas seguintes circunstâncias:
(...)»
«Artigo 60º - Audição prévia
1 - Concluída a prática de actos de inspecção e caso os mesmos possam originar actos tributários ou em matéria tributária desfavoráveis à entidade inspeccionada, esta deve ser notificada no prazo de 10 dias do projecto de conclusões do relatório, com a identificação desses actos e a sua fundamentação.
(…)»
«Artigo 61º - Conclusão dos actos
1 - Os actos de inspecção consideram-se concluídos na data de notificação da nota de diligência emitida pelo funcionário incumbido do procedimento.
(…)»
«Artigo 62º - Conclusão do procedimento de inspecção
1 - Para conclusão do procedimento é elaborado um relatório final com vista à identificação e sistematização dos factos detectados e sua qualificação jurídico-tributária.
2 - O relatório referido no número anterior deve ser notificado ao contribuinte por carta registada nos 10 dias posteriores ao termo do prazo referido no nº 4 do artigo 60º, considerando-se concluído o procedimento na datada notificação.
(…)»
Perante tal quadro legal cremos ser de manter o sentido da jurisprudência constante dos acs. deste STA, de 16/9/2009, rec. nº 473/09, 20/10/2010, rec. nº 112/10 e 30/11/2010, rec. nº 669/10 e mais recentemente ao acórdão de 21/11/2012 rec. 0594/12 o qual, embora tirado com um voto de vencido, encerra fundamentação na qual nos revemos, a qual seguimos de perto e que aqui expressamos. Assim, é certo que ainda que se possa aceitar que o conceito de «procedimento de inspecção» seja mais amplo do que o conceito de «actos» ou «acção de inspecção» (aquele pode exigir actos preparatórios internos da acção de inspecção externa propriamente dita, como exige actos subsequentes a esta), é o procedimento que pode classificar-se como interno ou externo - art. 13º do RCPIT (consoante os actos de inspecção se efectuem exclusivamente nos serviços da AT ou em instalações e dependências do sujeito passivo); e é a data da assinatura, por parte do sujeito passivo, da ordem de serviço, que determina o «procedimento de inspecção» e que, «para todos os efeitos, determina o início do procedimento externo de inspecção» (nº 2 do art. 51º do RCPIT), como é, igualmente, na data de notificação da nota de diligência emitida pelo funcionário incumbido do procedimento que ficam concluídos (apenas) os «actos de inspecção» (nº 1 do art. 61º do RCPIT); ou seja, com a notificação desta nota de diligência conclui-se apenas uma das fases do procedimento de inspecção.
Sendo que, como se salienta no ac. de 20/10/2010, rec. nº 112/10 (criticamente referenciado pela recorrente) «procedendo o relatório final à identificação e sistematização dos factos detectados e à sua qualificação jurídico-tributária, designadamente descrevendo os factos fiscalmente relevantes que alterem os valores declarados ou a declarar sujeitos a tributação, a AT está impedida, antes da elaboração desse relatório final, de exercer o direito de liquidação, por desconhecimento dos pressupostos fácticos em que se deve basear (art. 62° nºs. 1/2 al. i) RCPIT).»
Ora, como se refere no também citado acórdão de 16/9/2009, atentando no disposto nos arts. 45º e 46º da LGT e 60º e 61º do RCPIT, «nada da letra nem do espírito daqueles normativos permite distinguir, com relevo para a contagem do prazo de suspensão do prazo de caducidade do direito de liquidar, actos internos de inspecção e actos externos de inspecção e muito menos permite se confira apenas a estes últimos a eficácia suspensiva.
Da interpretação conjugada dos referidos preceitos legais decorre apenas e só (…) que o prazo de caducidade do direito de liquidar impostos periódicos, que é de quatro anos e se conta a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário - artigo 45º da LGT -, se suspende com a notificação ao contribuinte de início de acção inspectiva externa, cessando este efeito suspensivo, contando-se aquele prazo de caducidade desde o início, caso a inspecção ultrapasse seis meses contados a partir daquela notificação.
Nos demais casos, isto é, quando a acção inspectiva se conclua antes daqueles seis meses, o efeito suspensivo do prazo de caducidade mantém-se até à notificação ao contribuinte da conclusão do procedimento inspectivo, pela elaboração do relatório final, notificação que, assim, o legislador elegeu como termo do prazo de suspensão do prazo de caducidade do direito de liquidar o imposto respectivo, tudo conforme dispõe o artigo 60º nº 1 e 2 do RCPIT.»
E nem se diga (como faz a recorrente) que daqui decorre uma interpretação extensiva do nº 1 do art. 46º da LGT, não consentida em matéria de garantias nem consentânea com os elementos sistemático e teleológico do preceito.
Por um lado, não se vê que tal interpretação leve a solução não contida no texto da lei e apenas abrangida no espírito desta.
Por outro lado, mesmo que se reconduzisse aquela interpretação a uma interpretação extensiva, nem por isso a mesma estaria vedada. Independentemente da questão de saber se a caducidade do direito à liquidação dos tributos constitui, ainda, elemento essencial da relação jurídica tributária, integrando matéria relativa às garantias dos contribuintes (já que tal caducidade extingue o direito de liquidação do tributo por parte da AT, daí resultando para o contribuinte o direito de recusar a correspondente prestação e incidindo), o princípio da legalidade fiscal admite, contudo, nessa matéria, tal como se aceita para o caso dos benefícios fiscais, a interpretação extensiva, proibindo apenas a integração analógica de lacunas (cfr. Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, II, Cadernos de CTF, 174, Lisboa, 1996, pp. 97 e 384 e ss.; Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, 3ª ed., Coimbra Editora, 2007, pp. 134 e ss.; ac. da Secção do Contencioso Tributário do STA, de 17/5/2000, rec. nº 24873).
Neste entendimento, face ao disposto no nº 1 do art. 46º da LGT, tendo o prazo de caducidade ficado suspenso durante o período decorrido entre 10/10/2006 (data em que a recorrente foi notificada do início da inspecção) e 30/03/2007 (data em que a recorrente foi notificada do relatório final da acção de inspecção), bem decidiu a sentença recorrida ao concluir que, no caso, aquando da notificação da liquidação do tributo exequendo, ainda, não havia decorrido o prazo de caducidade do direito de liquidação do tributo …”.
Em suma, perante os elementos presentes nos autos e em conformidade com a jurisprudência afirmada pelo S.T.A., não tendo a argumentação da Recorrente a virtualidade de afastar o que ficou exposto, não pode afirmar-se um qualquer juízo de censura sobre a decisão recorrida nos termos propostos pela Recorrente neste domínio.

Avançando, cumpre ter presente que a Recorrente questiona a conduta da AT ao nível da aplicação de métodos indirectos, apontando que a Inspeção tributária fundamenta o pressuposto da aplicação de métodos indiretos, no plano legal, de modo enviesado e inicialmente irregular. E, no plano factual, em torno de «declarações» obtidas de 34 dos 81 adquirentes e do posterior comportamento destes em matéria de regularização de sisa, de três ou quatro cheques emitidos a favor de um então seu empregado pelos adquirentes e da obtenção de empréstimos bancários de valor superior ao valor de aquisição constante das correspondentes escrituras de compra e venda, sendo que a estrutura conceptual utilizada pela Inspeção tributária é confusa, ininteligível e mesmo imprecisa e não distingue onde devia distinguir: indício, indício fundado e indício objetivamente demonstrável são conceitos subjacentes a toda a descrição factual do Relatório, que, porém, são todos eles integrados numa só categoria, a categoria dos indícios fundados, e que a sentença recorrida, erradamente, na perspetiva da ora recorrente, assumiu também de modo acrítico.
As meras declarações dos adquirentes, mesmo que acompanhadas da regularização da situação tributária simétrica ou correspondente a essas declarações, são apenas indícios objetivamente comprováveis, que carecem, para serem qualificados na categoria de indícios fundados, um adicional labor probatório da AT que, em nenhum caso, houve, além de que a ora recorrente comprovou, caso por caso, nas 34 situações sindicadas, que, independentemente de estar ou não reunido o binómio termo de declarações/regularização de sisa, em nenhum houve labor probatório próprio e adicional da Inspeção tributária que materializasse ou permitisse materializar a requalificação do indício objetivamente comprovável em indício fundado, quando, em seu entender, sufragado no PARECER junto e na doutrina citada, deveria ter existido.
A ora recorrente comprovou ainda que, em nenhuma das 34 situações sindicadas, qualquer dos adquirentes fez «prova plena» das suas declarações, sendo que essa prova plena seria constituída pela apresentação dos comprovativos dos meios de pagamento do «novo» preço declarado de aquisição à ora recorrente. Essa «prova plena» constituiria, sem dúvida, para efeitos legais e suas consequências, um indício fundado. Esta seria mais uma razão para que a Inspeção tributária se não tivesse remetido a uma posição passiva, descurando toda a diligência provatória que, segundo a distribuição do ónus da prova lhe cabe neste domínio, sendo que a ora recorrente tem fundadas dúvidas de que a «regularização em sede de sisa» valha o que quer que seja (seria sempre uma decorrência automática das auto declarações), tanto mais que, como se comprovou, o direito de liquidação encontrava-se caducado e pelo menos quatro dos adquirentes que pediram a liquidação da sisa adicional a viram posteriormente anulada e de entre os cheques apresentados pelos adquirentes cujo valor foi imputado ao pagamento do preço, num caso o cheque está emitido a B...PORTUGAL, entidade sem qualquer relação com a ora recorrente. Acriticamente, veio a verificar-se, por via da certidão junta aos autos pela oras recorrente, que este cheque «comprova» parte do pagamento do preço declarado e no caso dos três «adquirentes» que emitiram cheques a favor de C..., à data dos factos mero empregado da ora recorrente, constata-se que apenas está estabelecida a relação emitente/adquirente no caso dos dois cheques emitidos por D..., tendo a ora recorrente demonstrado que nos outros dois casos essa relação não está estabelecida, isto é, não foram os adquirentes que emitiram os cheques a favor de C... e em nenhum dos casos se mostra estabelecida a relação material que importava comprovar, isto é, que o valor de tais cheques poderia ser imputado ao preço efetivamente pago, porque a beneficiária efetiva das respetivas importâncias tinha sido a ora recorrente.
Contra as duas situações de contração de empréstimos de valor superior ao valor de aquisição constante das correspondentes escrituras de compra e venda, a própria recorrente indica seis, recolhidas da certidão obtida junto da AT, em que tal circunstância não foi igualmente valorada, não se percebendo a diferença de critérios.
Por outro lado, é por demais pública e conhecida a generosidade das avaliações bancárias feitas a imóveis com o objetivo de fazer empréstimos com garantia real de valor muito superior ao bem dado em garantia e que redundaram, internacionalmente, na crise no sub prime, o mesmo sucedendo em Portugal, como é do domínio público.
Em conclusão e como bem se refere no PARECER junto aos autos pela ora recorrente: Repita-se que uma declaração de alguém vale como indício na medida da sua comprovabilidade objetiva que neste caso existe. Se trinta e quatro compradores afirmam ter pago mais a uma empresa, o dever provatório da Administração é investigar a veracidades destas afirmações.
Ora, tudo o que se encontra no Relatório da Inspeção tributária, além de factualmente não comprovado, é uma concretização da grosseiramente vaga alusão aos pressupostos de aplicação da avaliação indireta, de modo que, não pode, assim, considerar-se indiciado fundadamente, muito menos cumprido o ónus da prova da sua verificação imposto pela regra de repartição constante do n.º 3 do artigo 74.º da LGT, do pressuposto legal exigido para a aplicação de métodos indiretos na determinação do lucro tributável da ora recorrente previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 88.º da mesma LGT, sendo ilegal a sentença recorrida por violação das duas normas mencionadas.
De igual modo, a Inspeção tributária em nada demonstrou que se verificava o da indispensabilidade, consagrado na al. b) do n.º 1 do artigo 88.º da LGT, do recurso a métodos indiretos para a determinação da matéria coletável de IRC à ora recorrente relativamente ao exercício de 2002 e consequentemente a decisão de tributação por métodos indiretos não especificou, nos termos impostos pelo n.º 4 do artigo 77.º da LGT, os motivos da impossibilidade da comprovação e quantificação diretas e exatas da matéria tributável, o que a doutrina denomina de requisito da impossibilidade da tributação segundo a contabilidade da empresa, o que significa que a sentença recorrida é ilegal por violação do disposto nos artigos 88.º, n.º 1 e 77.º n.º 4 da LGT.

Nesta matéria, a decisão recorrida ponderou que:
“…
In casu, de acordo com o relatório de inspecção, o recurso aos métodos indirectos, em termos de fundamentação legal, baseou-se no art.º 52.º do CIRC e nos art.ºs 87.º a 89.º, da LGT.
Vejamos, pois, se se encontra devidamente explanado e fundamentado o recurso a métodos indirectos, atendendo às regras do ónus da prova já referidas supra, ou seja, aferir se, no relatório de inspecção, são identificadas situações de onde resulte a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável.
Compulsado o relatório de inspecção que esteve na base da liquidação impugnada a circunstância motivadora do recurso a métodos indirectos foi o facto de terem apurado que relativamente a vários adquirente de fracções, que o valor real da transmissão difere do valor da escritura celebrada.
Apurou-se na acção de inspecção que “Do total de 81 adquirentes no exercício em análise, 34 declararam um valor real de transacção diferente do valor contabilizado e pagaram a SISA correspondente a esse valor, o que em percentagem corresponde a 42% do total de adquirentes, e se traduz numa correcção ao lucro tributável já apurada de € 1.302.668,44 e que representa um acréscimo 28,60% ao valor contabilizado pela sociedade A....”
A conclusão tirada pela AT da divergência de valores encontra-se suportada de forma sólida a partir da prova documental constante do relatório de inspecção, após várias diligências que foram efectuadas junto dos adquirentes.
Com efeito, na sequência de diligências efectuadas junto dos vários adquirentes das fracções, a AT recolheu vários elementos indiciadores da simulação nos preços de venda dos imóveis, como por exemplo, elementos obtidos a partir de contas bancárias, cheques e regularizações em sede de Sisa. É com base nesses elementos recolhidos que se concluiu pela descredibilização da escrita da Impugnante, que no âmbito da acção de inspecção limitou-se a aceitar que haveria algumas divergências, mas nada mais esclareceu pois os contratos-promessa se tinham extraviado.
Por outro lado, apurou-se ainda que “alguns adquirentes, dos que regularizaram a sua situação tributária, efectuaram o pagamento da diferença entre o valor declarado e o real valor de transacção dos imóveis, através de cheques, emitidos à ordem do Sr. C..., funcionário da empresa A... e antigo Gerente”
Face a situação fáctica que se encontra descrita de forma suficiente e consistente no relatório de inspecção, cessa a presunção de veracidade da contabilidade da impugnante, o que legitima a AT à utilização de métodos indirectos na fixação da matéria colectável (art.º 88.º, da LGT), tanto mais que não obteve a colaboração dos adquirentes das demais fracções do prédio em causa.
Como decorre do relatório de inspecção, os indícios de omissão do valor real de aquisição foram comprovados, através dos dados obtidos pela colaboração dos adquirentes das fracções já referidas, e encontram-se suficientemente fundamentados.
As provas obtidas fizeram concluir pela existência de omissão do preço real nas vendas das fracções do prédio em causa. Cabia, então, à Impugnante alegar factos e circunstâncias concretas que infirmassem a prova carreada pela AT, por forma a que se pusesse em causa tal prova, o que não logrou fazer.
Por outro lado, não procede o invocado pela Impugnante de que os adquirentes das fracções em causa limitaram-se a afirmar que pagaram um preço superior ao constante da escritura pública, e que teriam de provar que efectivamente pagaram um preço superior, na medida em que a lei o que exige é que se recolham indícios fundados, e não a prova do facto. Por isso não procede toda a argumentação da Impugnante relativamente a força probatória das “confissões”.
Assim sendo, bastando indícios, o facto de vários adquirentes afirmarem valor superior constitui de per si um indício, e que se revelam fundados, pois porque razão quereriam tantos compradores de forma concertada dizer que pagaram um preço superior se assim não sucedeu? O facto de o fazerem não lhes advém qualquer vantagem, muito pelo contrário, para além de imposto de Sisa que tiveram de pagar pela diferença, ainda se sujeitaram a aplicação de coimas. Ou seja, não existem razões para crer que as suas declarações não correspondem à verdade, e que não possam ser consideradas como indícios.
Assim, sendo, também a AT não teria de ir mais longe nos seus deveres de investigação, como entende a Impugnante, as regularizações em sede de Sisa, conjugados com as declarações efectuadas constituem indícios suficiente para colocar em causa a credibilidade da contabilidade da impugnante.
De igual modo, é irrelevante o alegado quanto à eventual caducidade do direito do liquidação da sisa referente às fracções dos adquirentes, e a ilegalidade da actuação da AT relativamente a esses contribuintes, pois nos presentes autos apenas se discute o acto de liquidação em crise, e nenhum outro.
Por conseguinte, não assiste razão à Impugnante quanto ao invocado, encontrando-se reunidos os pressupostos para o apuramento da matéria colectável com recurso a métodos indirectos. …”.

Como é sobejamente sabido, o nosso ordenamento jurídico consagra o princípio do sistema declarativo, como meio de apuramento do valor tributável, surgindo as outras vias da sua determinação, da iniciativa da AF, como meios subsidiários ou residuais.
De facto e como é bem de ver o sistema jurídico tinha, necessariamente de prever meios alternativos ao apuramento da matéria colectável dos impostos, no caso daquele princípio não operar por motivos imputáveis ao contribuinte. É que, se por um lado o sistema parte do princípio da boa fé dos contribuintes na revelação dos seus reais e efectivos rendimentos tributáveis, por outro, não pode ignorar que a simples existência de regras parte do pressuposto da possibilidade do seu incumprimento que, nessa medida, não pode deixar de se mostrar acautelada pelo legislador.
Por isso que o referido sistema do princípio da veracidade do declarado pelos distintos sujeitos passivos seja «temperado» velo verdadeiro dever de cooperação que, sobre eles, impende de prestarem todos os esclarecimentos e revelarem todos os elementos que, nos casos menos “transparentes”, desde logo por inusuais, permitam esclarecer e eventualmente confirmar, dentro do que lhes seja exigível, a aderência do declarado à realidade. Daí que, nos casos em que se mostre ilegitimamente violado aquele dever de cooperação, como será, v.g. e designadamente, o caso de não se não disponibilizar, sem justificação atendível, os elementos necessários ao controlo da sua situação tributária, por parte da AT, no exercício do poder vinculado que a esta está conferido por lei, se dê a automática legitimação desta entidade no recurso aos referidos meios alternativos disponibilizados por lei, desde que com observância dos restantes pressupostos, por esta, estipulados.
Ou seja e sinteticamente, o alcançar da tributação dos rendimentos reais auferidos, por via do aludido sistema declarativo pressupõe que os contribuintes disponibilizem à AT todos e quaisquer elementos que lhes sejam exigíveis e que se apresentem como indispensáveis ao correcto apuramento dos mesmos.
E, como se referiu, quando assim não suceda, isto é, quando ocorra a quebra daquele dever de colaboração, designadamente pela não apresentação daqueles referidos elementos, cujo ónus impende sobre o contribuinte como meio de assegurar a presunção de aderência á realidade do declarado, inviabilizando a concretização, por parte da AT, do dever estritamente vinculado a que esta, por seu turno, está obrigada pelo princípio da legalidade, do controle e apuramento do efectivo valor tributável, a AF ficará legitimada automaticamente a recorrer a meio alternativo de tributação, designadamente através de correcções técnicas, como sucedeu no caso vertente.
Isto tendo presente que nos movemos no âmbito tributário, em que, por um lado e por força de aí imperarem os princípios do inquisitório e, por consequência, o da oficialidade na investigação, tendo por desiderato último, a descoberta da verdade material é inexistente uma particular incumbência de provar, por parte de quem quer que seja, por outro, tal não significa que neste contencioso, em particular, não exista um direito probatório que regulamente quem tem que provar o quê para que se alcance uma qualquer pretensão formulada. Daí que, porque a questão que se controverte não pode deixar de ser objecto de definição, se os factos relevantes se não provarem, seja por iniciativa das partes, seja por iniciativa do Tribunal, ela não possa deixar de ser decidida de forma que seja desfavorável àquele sobre quem impender, nos termos legais, o respectivo ónus probatório Neste sentido, entre muitos outros e a título meramente exemplificativo, veja-se o Ac. deste Tribunal de 99.12.14, Rec. Nº. 2.467/99..
Assim, por princípio e sempre que a conduta da AT se consubstancie na prática de actos positivos e constitutivos do direito a que se arrogue com consequências negativas na esfera dos direitos dos contribuintes, é a ela que cabe a obrigação de demonstrar da factualidade relevante ou dito de outra forma é à AT que cabe fazer a “...prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável) ...” pertencendo, por contrapartida, “...ao administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do acto, quando se mostrem verificados esses pressupostos ...” Cfr. Ac. deste Tribunal, de 02.06.04, tirado no Rec. 3.279/00..
Do que resulta que, tendo os elementos contabilísticos do contribuinte de se encontrar organizados segundo os sãos princípios da lei comercial e fiscal, quer do ponto de vista da forma, quer do ponto de vista substancial, casos em que gozam de uma presunção de veracidade, tal não implica, no entanto e “a contrario”, como já acima se referiu, - pela circunstância de tais elementos se encontrarem organizados correctamente do ponto de vista meramente formal -, a inibição da AT, no uso daqueles poderes de controlo, de se servir dos meios legais alternativos ao declarativo no apuramento da matéria colectável, já que o que importa é apurar, tanto quanto possível e ao que aqui releva, o rendimento tributável efectivo.
Tal, contudo não preclude o princípio de que o lançar mão de qualquer dos meios alternativos disponíveis, - correcções técnicas/avaliação indirecta -, e de um deles em detrimento do outro, não depende de um critério discricionário da AT, antes, qualquer deles constitui um seu poder vinculado, sendo que, ao que aqui nos importa considerar, a AT se encontra vinculada ao recurso às correcções técnicas, quando, apesar da violação dos deveres de cooperação do contribuinte, se encontre, sem embargo, em condições de apurar com efectividade os rendimentos a tributar e, ao invés, se e na medida em que tal apuramento se venha a revelar inviável, não pode, então, deixar de lançar mão da metodologia indirecta, o que vale por dizer que esta pressupõe uma situação que se mostre “Marcada por uma inultrapassável incerteza e exigindo uma cuidadosa fundamentação”, revelando-se como “uma última ratio fisci, ...” Cfr. JLSaldanha Sanches em “A Quantificação da Obrigação Tributária”, 302/303..
Importa, também, referir que a demonstração dos necessários pressupostos legais ao recurso a metodologia alternativa, designadamente a indiciária, cabe à AFUma vez que nos termos das regras do ónus da prova em sede de direito administrativo tributário, -onde, há luz dos vigentes princípios de descoberta da verdade material e, da consequente, oficiosidade de investigação e indagação das provas, não há uma particular incumbência de provar, por parte de quem quer que seja, sem embargo de, pela impossibilidade de manutenção de um “non liquet”, a ausência de prova de factos relevantes não possa deixar de desfavorecer quem com ela estava onerado-, é à AT que cabe a obrigação “... da prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável) ...” pertencendo, por contrapartida, “...ao administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do acto, quando se mostrem verificados esses pressupostos ...”.
/ Cfr. Ac. de 02.06.18, Rec. Nº. 6.388/02., sendo certo que, em caso de utilização de metodologia indirecta, ainda e apesar da opção do legislador em abdicar de um grau de certeza na tributação - inerente á maior subjectividade própria da mesma em que, só por circunstâncias meramente fortuitas, a quantificação apurada será aderente à realidade - ela não deixa, no entanto, de ter como baliza, o princípio, com assento constitucional, de que a sua utilização há-de permitir alcançar, na medida do possível, as circunstâncias de facto mais próximas da realidade, com susceptibilidade de apreciação, nomeadamente, jurisdicional Cfr. Prof. Saldanha Sanches in “A Quantificação da Obrigação Tributária”, 305..
E, quando se verifiquem – isto é, quando a AT demonstre a ocorrência - (d)os necessários e legais pressupostos para se lançar mão da avaliação indirecta, o eventual excesso da quantificação, por tal via, operada passa a impender sobre o contribuinte.
Contudo o que se vem de dizer não esgota o tema relativo aos princípios que regem o regime jurídico da avaliação indirecta, particularmente no que concerne ao ónus que vincula a AT.
Isto porque, em sede de avaliação indirecta, o ónus da AT não se consome na necessidade do elencar, e provar, das razões que lhe subjazem, enquanto conduta vinculada que lhe está imposta. Na realidade, o ónus que impende sobre a AF, em tais casos, para além do da demonstração dos necessários e legais pressupostos do recurso à avaliação indirecta, exige, ainda e também, que, simultânea e complementarmente, fundamente adequada e criteriosamente as circunstâncias em que faça suportar a matéria tributável que, no uso daqueles, vier a quantificar.
Na realidade e como já acima se teve oportunidade de referir, sendo embora, em tais casos, opção do legislador abdicar de um grau de certeza na tributação, por falta de colaboração do contribuinte, como única solução de evitar a evasão fiscal e de fazer repartir, na medida do possível, a carga fiscal entre todos os súbitos nacionais que revistam, casuisticamente, a qualidade de sujeitos passivos, não deixa, a actuação da AT, neste domínio, no entanto, de ter como baliza, o princípio de que a metodologia em causa há-de permitir alcançar, na medida do possível, a tributação daquele pelo seu lucro real/efectivo.
Apelando, à jurisprudência deste Tribunal Cfr. Ac. de 02.06.18, Rec. nº. 6.388/02./ Ainda que por reporte ao aludido art.º 81.º do CPT, mas, como decorre do que acima se mencionou, com aplicabilidade ao preceituado no art.º 84.º/3 da LGT. “... cabendo à AF o ónus de provar os pressupostos da tributação por métodos indiciários, é a ela que cumpre demonstrar que a liquidação não pode assentar nos elementos fornecidos pelo contribuinte e que o recurso àquele método se tornou a única forma de calcular o imposto, competindo-lhe, por isso, especificar os motivos da impossibilidade da comprovação e quantificação directa e exacta da matéria colectável e indicar os critérios utilizados na sua determinação, fazendo assentar o volume da matéria colectável presumida em dados objectivos, racionais e fundamentados, aptos a inferir os factos tributários [...].
Na verdade, tendo a determinação da matéria tributável por métodos indiciários de ser feita por aproximação à realidade que se procura apurar, é necessário que se demonstre que teve por suporte elementos de facto possíveis e prováveis, extraídos de parâmetros gerais e comuns, adequados à situação. E, por isso, a AF tem de utilizar elementos de facto conhecidos que, segundo as regras da experiência, pautadas por critérios de razoabilidade e de normalidade e tendo em linha de conta as especificidades próprias da actividade do contribuinte, conduzam à extrapolação dos factos conhecidos ou à aproximação da realidade que se procura alcançar.
A AF tem, assim, de indicar e justificar os critérios que utiliza na determinação da matéria tributável por métodos indiciários, por forma a que o contribuinte deles fique ciente e apto a discutir a valorimetria aplicada, isto é, para que possa provar que os critérios utilizados são desadequados e/ou inadmissíveis para a sua actividade, que houve erro ou manifesto excesso na matéria tributável quantificada.” (sublinhados da nossa responsabilidade), e que, acrescentamos agora, que permitam extrapolar uma adequada ponderação da decisão.
Só então passará a caber, ao contribuinte e como acima referido, demonstrar a falta de aderência à realidade da matéria colectável que veio a ser fixada, e sendo caso disso, a medida em que tal sucedeu, sob pena de a dúvida sobre tal matéria se ter de revelar desfavorável à sua pretensão, já que, como é axiomático a sua existência não será, então, mais do que o resultado de uma conduta violadora do princípio da colaboração, que lhe está imposto, com transparência e verdade e que, nessa medida, a tornam infundada.

No caso presente, é sabido que a decisão recorrida entendeu que se encontravam reunidos os pressupostos para o apuramento da matéria colectável com recurso a métodos indirectos, impondo-se apreciar se, em face do probatório fixado, a sua decisão, ao dar cobertura ao agir da AT, se mostra, ou não, certeira e conforme à lei.
Ora, adiantando, desde já, a nossa posição, crê-se que a resposta não pode deixar de ser afirmativa.
Com efeito, do relatório de inspecção consta, além do mais, que:
“…
III. 2 - Recolha de informação efectuada pela Equipa de Análise Prévia, relativamente aos adquirentes da "A..., SA" No âmbito da análise prévia efectuada constatou-se que, G..., NIF ..., adquiriu a fracção "Q" do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o art.º 6762, da Freguesia da Ericeira, concelho de Mafra, cujo valor declarado para efeitos de liquidação de Imposto Municipal de Sisa, nos termos do n.º, 2.º do art.º 19.º do Código do LM.S.LS.S., foi de € 115.000,00.
No entanto, nos termos do art.º 63.º-B da Lei Geral Tributária, resultante de autorização concedida pelo sujeito passivo para levantamento do sigilo bancário, obtiveram cópias de cheques bancários no valor de € 147.145,38. Este valor está subdividido em três cheques: um, no valor de € 115.000,00 emitido à ordem de A..., SA e dois emitidos a I..., um no valor de € 17.956,72 e outro no valor de € 14.188,66, (…)
Mais tarde, em finais de 2003, como já foi referido no ponto I1-4, voltou a integrar o capital da empresa quando esta passou de sociedade por quotas a sociedade anónima.
Em face do constatado - possível omissão de valores nas transacções de imóveis - foi notificada a sociedade "A..., SA" na pessoa do responsável pela sua gestão e em termo de declarações, lavrado em 28/07/2006, afirmou "desconhecer susceptíveis omissões de valores na alienação de imóveis".
Em consequência das situações que foram constatadas, foi proposta acção externa de inspecção à empresa, e mais uma vez foi solicitada a comparência dos responsáveis pela gestão da sociedade pelo nosso oficio n.º 74028 de 15/09/2006, (Anexo III, pág. 39 a 40), para no dia 29/09/2006 comparecerem nestes serviços com a finalidade de apresentarem esclarecimentos sobre a actividade exercida nos anos de 2002 e seguintes, reunião à qual não compareceram.
Nestes termos foi desencadeada a acção externa de inspecção, com base na emissão da presente Ordem de Serviço no âmbito da qual foram contactados todos os adquirentes das fracções ou outros imóveis adquiridos no ano de 2002, cujos elementos recolhidos são analisados nos pontos seguintes.
111.3 - Valor de transacção dos imóveis declarado pelos adquirentes
Em face da situação detectada pela análise prévia, descrita no ponto anterior, procedeu-se à notificação de todos os adquirentes de imóveis à empresa A... SA, no exercício de 2002, com o objectivo de confirmar o valor de aquisição da(s) fracção(ões) contabilizadas na conta 71.2.1.10 - Vendas Isentas, (conforme extracto de conta corrente, Anexo IV, pág. 41 a 45). Como resultado da audição dos compradores abaixo mencionados, constatou-se que dos 81 adquirentes, 34 (42% do total) declararam valores de aquisição superiores ao constante das respectivas escrituras, como se exemplifica no quadro a seguir:
(…)
IV. Motivos e exposição dos factos que implicam o recurso a métodos indirectos
Face ao exposto nos capítulos anteriores, verifica-se desde logo que os registos contabilísticos da empresa e respectivos documentos de suporte não reflectem a sua real situação tributária ficando demonstrada a impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta, quanto à correcta determinação da matéria tributável, tanto mais que tendo o representante da empresa sido confrontado com a existência de divergências relativas aos seus registos contabilísticos declarou-nos que "admitia algumas dessas divergências, contudo não lhe era possível quantificá-las, dado que a pasta que continha mais elementos relativos à venda dos imóveis, nomeadamente contratos promessa de compra e venda tinha-se extraviado". Estes factos, e os que a seguir se indicam passam a constituir fundamentação da tributação com recurso a métodos indirectos conforme previsto nos artigos 87.º a 89.º da LGT por força do disposto no art.º 52.odo CIRC.
1. Como foi descrito no capítulo anterior, a contabilidade não reflecte o valor correcto das vendas relativamente aos adquirentes mencionados.
2. Os imóveis em que os respectivos adquirentes declararam o valor de compra igual ao valor de escritura, e os dos adquirentes que não compareceram para prestar declarações sobre a sua aquisição, tudo indica que também não estão contabilizados na conta de "proveitos" pelo seu valor real, nomeadamente pelos seguintes factos constatados:
a) Do total de 81 adquirentes no exercício em análise, 34 declararam um valor real de transacção) diferente do valor contabilizado e pagaram a SISA correspondente a esse valor, o que em percentagem corresponde a 42% do total de adquirentes, e se traduz numa correcção ao lucro tributável já apurada de € 1.302.668,44 e que representa um acréscimo 28,60% ao valor contabilizado pela sociedade A....
b) Verificou-se que a omissão foi sistemática, atendendo á data das escrituras e ronda os 30% do valor declarado. As escrituras relativamente aos adquirentes que declararam um valor real superior, foram celebradas: Uma em Janeiro, uma em Março, oito em Abril, cinco em Maio, uma em Junho, quatro em Julho, três em Agosto, uma em Setembro, uma em Outubro e três em Novembro. As restantes escrituras celebradas também se encontram dispersas por todo o exercício de 2002;
c) Verifica-se que fracções com a mesma tipologia foram transaccionadas por valores idênticos dentro do mesmo edifício. Podemos referir como exemplo:
- No Edifício Neptuno, as fracções "D", "G" e "U", todas com a tipologia T-2 c/ terraço e logradouro, em que o valor de escritura foi €85.000,00 e os adquirentes declararam valores reais próximos dos €125.000,00;
- No Edifício Belo Horizonte - loteI8 - verificou-se que para a tipologia T-2, o valor de escritura foi de €85.000,00 e os adquirentes que regularizam, fizeram-no por valores próximos dos €120.000,00.
d) Comprovou-se ainda, que alguns adquirentes, dos que regularizaram a sua situação tributária, efectuaram o pagamento da diferença entre o valor declarado e o real valor de transacção dos imóveis, através de cheques, emitidos à ordem do Sr. C..., funcionário da empresa A... e antigo Gerente, conforme se exemplifica:
1. O sujeito passivo H..., NIF ..., adquirente da fracção "R" do imóvel inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 6880 da freguesia da Ericeira, do Concelho de Mafra, declarou como valor de aquisição, da referida fracção, € 157.500,00 (conforme termo de declarações - Anexo VI, pág. 161 a 170) ao invés do valor escriturado de € 115.000,00. O valor de € 157.500,00 foi pago da seguinte forma:
- Através do cheque n.º 4969610749 sobre a Caixa Geral de Depósitos, S.A. o valor de € 78.750,00 pagos a título de sinal em 13.04.2002 aquando da celebração do contrato promessa de compra e venda;
- Através do cheque n.º 4939895579 sobre a Caixa Geral de Depósitos, S.A. o valor de € 36.250,00 pagos no acto da escritura em 22.07.2002;
- O valor de € 42.500,00 foi pago através do cheque n." 4039895580 sobre a Caixa Geral de Depósitos, S.A., emitido à ordem do Sr. I..., NIF ...no acto da escritura em 22.07.2002;
Os elementos acima indicados, comprovados pelas fotocópias dos referidos cheques, constam de termo de declarações lavrado no dia 03/0112007, (Anexo VI, pág. 162 a 165 )
2. O sujeito passivo J..., NIF ..., adquirente da fracção "A" do imóvel inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 6762 da freguesia da Ericeira, do Concelho de Mafra, declarou como valor de aquisição, da referida fracção, € 115.000,00 (conforme termo de declarações - Anexo VI, pág. 165 a 167) ao invés do valor escriturado de € 85.000,00:
- A diferença entre o valor de escritura e o valor real da transacção cifra-se em 30.000,00€
O sujeito passivo, remeteu a estes serviços cópia de cheque no valor de € 28.000,00, emitido à ordem do Sr. I..., NIF ...no acto da escritura em 03.10.2002;
Os elementos acima indicados, comprovados pelas fotocópias dos referidos cheques, constam de termo de declarações lavrado no dia 24/10/2006, (Anexo VI, pág. 166 a 170)
5. O sujeito passivo K..., NIF ..., adquirente da fracção "Q" do imóvel inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 6762 da freguesia da Ericeira, do Concelho de Mafra, de acordo com o exposto no ponto III.2 deste relatório.
6. No tratamento da informação relativa a escrituras de compra e venda, verificou-se, em alguns casos, que para além do empréstimo para aquisição da fracção, foi contraído um segundo empréstimo denominado "Multi-opções/Obras", cuja garantia é a hipoteca da mesma fracção. Verificou-se, ainda outra situação, em que apesar de existir um único empréstimo este continha um valor destinado á aquisição do imóvel e o restante destinado a obras de beneficiação do mesmo. Nas duas situações descritas constatou-se que o segundo empréstimo não se destinava aos fins referidos na escritura, mas antes ao pagamento do valor real de aquisição das habitações, conforme Anexo VII, pág. 171 a 197
Em face do exposto, consideramos que existem fortes indícios de que a Contabilidade, não reflecte a exacta situação patrimonial do sujeito passivo nem o resultado efectivamente obtido o que impossibilita a comprovação e quantificação directa dos elementos indispensáveis à correcta determinação do resultado fiscal nos termos do art. 17.°, n.º 3, do Código do IRC, pelo que se propõe a determinação do lucro tributável por métodos indirectos nos termos do art.º 52.º do mesmo Código do IRC, com observância do disposto nos artigos 87.º a 90.º da Lei Geral Tributária, como foi referi no início deste capitulo. …”.

Ora, tendo em consta as razões a que se arrimou a FP para lançar mão da avaliação indirecta e traduzidas, particularmente, na circunstância de, tendo procedido a diligência de averiguação junto dos adquirentes das fracções em causa, do total de 81 adquirentes no exercício em análise, 34 declararam um valor real de transacção diferente do valor contabilizado e pagaram a SISA correspondente a esse valor, o que em percentagem corresponde a 42% do total de adquirentes, e se traduz numa correcção ao lucro tributável já apurada de € 1.302.668,44 e que representa um acréscimo 28,60% ao valor contabilizado pela sociedade A..., traduz a afirmação de circunstâncias anómalas e indiciadoras da falta de aderência à realidade entre os valores declarados nas respectivas escrituras e os efectivamente pagos pela aquisição de tais fracções, sendo que neste domínio a situação foi devidamente quantificada com referência ao que pagaram a mais, tendo liquidado adicionalmente a SISA devida pela referida diferença, de modo que, o que se não vislumbra, sequer, é como é que se possa sustentar, que os mesmos não preencham os requisitos legitimadores do recurso à avaliação indirecta, por banda da AT, na medida em que se revelam absolutamente eloquentes da falta de aderência à realidade dos valores declarados como relativos às transacções das fracções acima referenciadas.
Neste ponto, a Recorrente defende que a actividade da AT não foi tão longe como devia, referindo que a matéria descrita é insuficiente para o efeito.
Tal análise, embora esforçada, não pode ser acolhida por este Tribunal, na medida em que a origem da realidade apontada radica nos primeiros elementos alinhados pela AT, situação que levou à notificação de todos os adquirentes de imóveis à empresa A... SA, no exercício de 2002, com o objectivo de confirmar o valor de aquisição da(s) fracção(ões) contabilizadas.
E o resultado é impressivo, na medida em que quase metades dos adquirentes declararam um valor real de transacção diferente do valor contabilizado e pagaram a SISA correspondente a esse valor, o que, como é óbvio, não deixa de trazer uma “confissão” implícita de que a vendedora se “encontrava aberta” a manobras de evasão fiscal deste teor.
Ora, a demonstração daquele circunstancialismo é bastante para a AT lançar mão de métodos indirectos, desde logo porque é de todo irracional que um conjunto de indivíduos, que compraram outras fracções, tenham de peito feito e sem qualquer aparente interesse, decidido enriquecer o Estado através do pagamento de quantias de imposto se elas não correspondessem de facto, a diferenciais dos valores de aquisição, mas, antes, que o tenham feito para obter outros benefícios, seja em acréscimos legais, seja em sede contra-ordenacional, face às suspeitas da AT.
Além disso, importa não olvidar que se trata das partes de um negócio, o que supõe o conhecimento da realidade em apreço, situação que confere especial credibilidade às respectivas declarações, não sendo aceitável a análise da Recorrente neste domínio, forçando de forma artificial uma análise que não pode ser sufragada.
Depois, sem surpresa, a pasta que continha mais elementos relativos à venda dos imóveis, nomeadamente contratos promessa de compra e venda extraviou-se.
Finalmente, não se vislumbra que o argumento de que deveria ter sido providenciado pela localização dos meios de pagamento utilizados por quem regularizou a SISA, para pagar os diferenciais do preço sirva os intentos da Recorrente, até porque, em última instância, nada garante que tal pagamento não possa ter sido feito em “cash”.

Assim sendo, as circunstâncias acima referidas apresentam-se como adequadas a extrapolar, qual método aproximativo ou por amostragem e, por isso, dispensador da revelação exaustiva de todos os mesmos elementos, relativamente a todas e cada uma das fracções em causa, de que, no exercício em questão, a Recorrente tinha, como prática negocial usual, a declaração de valores de venda inferiores aos efectivamente praticados através da colaboração dos adquirentes.
Na realidade, se em relação a 42% dos adquirentes foi possível detectar práticas reveladoras de falta de aderência entre os preços de venda declarados nas escrituras e os efectivamente pagos, está, a nosso ver e necessariamente, a AT legitimada a considerar que tal prática tenha sido seguida nos outros negócios realizados pela Recorrente, naquele mesmo exercício, pois que, segundo critérios de razoabilidade e normalidade adequada, à luz das regras da experiência, se não vislumbram razões justificadoras de que a divergências detectadas tenham tido carácter excepcional, o que significa que está condenado ao insucesso o esforço de alegação da Recorrente neste âmbito, impondo-se reconhecer a pertinência do exposto na decisão recorrida quando refere que “a AT não teria de ir mais longe nos seus deveres de investigação, como entende a Impugnante, as regularizações em sede de Sisa, conjugados com as declarações efectuadas constituem indícios suficiente para colocar em causa a credibilidade da contabilidade da impugnante”, que “é irrelevante o alegado quanto à eventual caducidade do direito do liquidação da sisa referente às fracções dos adquirentes, e a ilegalidade da actuação da AT relativamente a esses contribuintes, pois nos presentes autos apenas se discute o acto de liquidação em crise, e nenhum outro” e ainda que “não assiste razão à Impugnante quanto ao invocado, encontrando-se reunidos os pressupostos para o apuramento da matéria colectável com recurso a métodos indirectos”.

A Recorrente suscita ainda a questão da errónea quantificação, referindo que em sede de aspeto quantitativo, mostra-se desde logo violada a regra do n.º 3 do artigo 84.º da LGT, porquanto, colhendo-se do Relatório da Inspeção tributária a indicação dos critérios utilizados na quantificação do lucro por métodos indiretos, a fundamentação é totalmente omissa quanto à ponderação dos fatores que influenciaram a determinação do seu resultado, sendo que a Inspeção tributária utilizou diversos critérios para quantificar o lucro por métodos indiretos, sem fundamentar por que motivos utilizou aqueles e não outros, nomeadamente num setor em que o critério comummente reconhecido como válido ou mais adequado ao fim em vista é o valor do preço por metro quadrado, seja o de construção acrescido da margem de comercialização, seja o de venda para o mesmo tipo de construções, verificando-se que o critério da permilagem é inadequado e inservível para o fim visado porque a permilagem é um negócio jurídico unilateral cujo principal objetivo é o de determinar a participação de cada condómino nos encargos legais do condomínio. Podendo ter alguma proporcionalidade com a área de cada fração autónoma, não a tem necessariamente.
A sua utilização correta, admitindo, sem conceder, a adequabilidade de tal critério, implicar sempre, em primeiro lugar, a determinação do valor total do prédio, para só depois se calcular o valor médio da unidade de permilagem, sendo que face ao modelo utilizado, os valores médios da unidade de permilagem estão mal calculados, o que significa que de uma maneira ou de outra, verificam-se erros grosseiros no cálculo de tal valor médio que, como consequência lógica, afetam de modo excessivo, seja qual for a sua expressão quantitativa, a determinação do lucro tributável tal como foi efetuada, como afeta de modo excessivo, seja qual for a sua expressão quantitativa, a determinação do lucro tributável a atribuição, a frações com idêntica permilagem, do maior dos «preços declarados» e não, por exemplo, um preço médio.
Um critério a que Inspeção tributária denomina «margem média de omissão de proveitos» e que a sentença recorrida traduz por «diferença entre o total dos custos incorridos até à conclusão da construção e o valor real da transação declarada pelos adquirentes» é, semântica e tecnicamente incompreensível, pelo que nem sequer é suscetível de integrar uma relação congruente e justificada entre os factos apurados e a situação concreta do contribuinte, o que tudo viola o disposto no n.º 2 do artigo 85.º e no artigo 90.º, ambos da LGT, pelo que, em matéria de erro de erro na quantificação da matéria coletável, a sentença recorrida é ilegal por violação do disposto no n.ºs 3 do artigo 84.º, no n.º 2 do artigo 85.º e no artigo 90.º, todos da LGT.
Neste âmbito, a decisão recorrida apresenta a seguinte análise:
“…
In casu, para o cálculo do montante a apurar foram utilizados os critérios do art. 84.º da LGT, tal como vem referido no relatório de inspecção:
“Atribuímos às fracções com a mesma permilagem, os mesmos valores de transacção daquelas cujos adquirentes regularizaram voluntariamente a sua situação tributária;
Para as fracções não directamente comparáveis com outras em que os adquirentes tenham regularizado a sua situação tributária, utilizámos o valor unitário médio de permilagem, calculado com base nos valores declarados pelos adquirentes que regularizaram;
Relativamente às moradias, apurou-se a margem média de omissão de proveitos, considerando para esse cálculo a diferença entre o total dos custos incorridos até à conclusão da construção e o valor real da transacção declarado pelos adquirentes.”
Ou seja, foram utilizados vários critérios para o apuramento da matéria colectável, mas para que os montantes encontrados fossem o mais próximo possível dos reais. Por outro lado, nada na lei impõem que seja utilizado apenas um critério para o apuramento da matéria colectável com recurso a métodos indirectos.
Repare-se que a AT atendeu ao facto de as fracções com a mesma permilagem terem o mesmo valor de transacção. Certo que, eventualmente haverá variações nos valores em função de outros factores para além da permilagem, mas considerando que estamos um apuramento com recurso a métodos indirectos, os valores encontrados não têm de ser quantitativamente exactos. Na verdade, apenas um excesso manifesto na quantificação poderia levar à ilegalidade da correcção, o que não é demonstrado nos autos que tenha sucedido.
Por outro lado, a AT distinguiu ainda situações em que as fracções não eram directamente comparáveis, e para esses casos utilizou um valor médio de permilagem, calculando com base nos valores declarados pelos adquirentes que regularizaram a sua situação em sede de Sisa. No que se refere às moradias a AT considerou a diferença entre o total dos custos incorridos até a conclusão da construção e o valor real da transacção declarado pelos adquirentes.
Ou seja, a utilização dos diferentes critérios está suficientemente fundamentada em razão da igualdade ou diferença da permilagem, e do facto de se tratar de fracção ou de moradia, não resultando evidenciado um excesso manifesto na quantificação, pela utilização desses critérios.
Como já referimos, apenas uma diferença manifesta na quantificação poderia colocar em causa a legalidade da quantificação, ou um erro grosseiro, o que não foi demonstrado. Assim sendo, não se verificam os vícios invocados.
Por conseguinte, também não assiste razão à Impugnante quanto a este fundamento invocado, devendo, nesta medida, improceder a impugnação. …”.

No que concerne à invocada errónea quantificação, é à recorrente que incumbia demonstrar, de forma inequívoca, ainda que, eventualmente, indiciária, o alegado excesso de quantificação, sendo que se impõe um desempenho pautado pela concreta e circunstanciada alegação de factos que, uma vez provados, sejam idóneos a comprovar, a demonstrar, com uma certeza adequada e passível de ampla aceitação, a aduzida errónea ou excessiva quantificação da matéria tributável, até porque estão em causa situações em que o respectivo apuramento se mostra inviabilizado pela falta de credibilidade, inexistência ou insuficiência de elementos de contabilidade ou declaração da responsabilidade do sujeito passivo, de modo que, se esta é a causa primordial que determina a necessidade, conformada por lei, de a AT lançar mão dos métodos indirectos, também a mesma tem de servir para tolerar e justificar que na operância destes métodos ocorra alguma margem de discricionariedade no estabelecimento dos valores em que se há-de expressar a quantificação, não viabilizada com o apoio da contabilidade ou declaração do contribuinte. Isto é, a provável falibilidade, inverosimilhança, da quantificação é resultado da apontada inevitabilidade em accionar o método indirecto ou presuntivo, derradeira possibilidade de repor a legalidade e apurar uma determinante e insubstituível matéria tributável que, apenas por motivos, deficiências, imputáveis ao sujeito passivo, não pode estabelecer-se com recurso à via normal (directa) que é a contabilidade ou escrita comercial deste.
Nesta conformidade, conferida a ocorrência de discricionariedade, nomeadamente, de cunho técnico, na actuação de métodos indirectos de avaliação, torna-se muito provável que o valor, então, apurado seja “um valor probabilístico e não um valor absolutamente certo”. Contudo, tratando-se de uma inevitabilidade e de uma imposição legal, ainda que extrema e residual, o apelo aos métodos indirectos, necessariamente, a margem de discricionariedade, que assiste e comanda a respectiva actuação, é susceptível de controle judicial, o qual só pode decidir-se pelo afastamento dos resultados obtidos se, posta em causa a quantificação pelo impugnante, este, mediante a produção de provas adequadas e fortemente convincentes, conseguir demonstrar que o funcionamento daquele poder discricionário conduziu e traduziu-se na fixação de resultados, no apuramento de valores, objectiva e inquestionavelmente, fora dos limites da razoabilidade, da mais ampla e impressiva aceitabilidade.
Numa outra formulação, concentrada, a casuística escolha do método de avaliação indirecta da matéria tributável, sem concessões, é uma atribuição/competência, exclusiva, da AT, cujos serviços, actuando no estrito cumprimento da legalidade, têm de eleger e operar o que considerem mais adequado, apropriado, à quantificação necessária, recaindo sobre os tribunais a tarefa de verificação da sua correcta interpretação e aplicação, quando se regista o desacordo e a crítica do sujeito passivo (Ac. deste Tribunal de 18-10-2011, Proc. nº 04335/10, www.dgsi.pt).
A partir daqui, não se vislumbra a virtualidade do exposto pela Recorrente no sentido de afectar a validade do referido critério da permilagem, quando recorre à comparação de fracções autónomas que, à luz daquele, deveriam apresentar resultados divergentes e inversos daqueles de que se veio a servir a AF, na medida em que, apresentando-se, em si mesmo, tal critério, como justo e adequado, à luz de parâmetros de aferição pautados por juízos de normalidade e probabilidade, aquelas apontadas divergências em resultado da comparação feita, não teve em linha de conta que a AT apenas presumiu e, por consequência, apenas deles se serviu, nos casos em que os compradores nada vieram dizer de diferente ao teor do preço referenciado nas respectivas escrituras de compra, já que nos restantes casos em que tais compradores vieram revelar ter pago um preço superior ao declarado nos respectivos instrumentos de compra, foi esse o preço atendido.
Deste modo, reputa-se de pertinente o exposto na sentença recorrida quando refere que “a utilização dos diferentes critérios está suficientemente fundamentada em razão da igualdade ou diferença da permilagem, e do facto de se tratar de fracção ou de moradia, não resultando evidenciado um excesso manifesto na quantificação, pela utilização desses critérios”, sendo que “apenas uma diferença manifesta na quantificação poderia colocar em causa a legalidade da quantificação, ou um erro grosseiro, o que não foi demonstrado”.
Nesta sequência, estando definitivamente decidido que, no caso, a AF demonstrou a ocorrência dos necessários pressupostos legais à utilização de métodos indirectos, por um lado e, por outro, apresentando-se adequadamente fundamentados, como adequados e pertinentes, os critérios de que a AT se serviu na tarefa de quantificação, era à impugnante que se impunha demonstrar que a utilização de tais critérios conduziu, sem margem para dúvidas fundamentadas, a um resultado final sem qualquer aderência à realidade, demonstração essa que, como temos por manifesto e na linha do acima referido, não logrou fazer, sem olvidar que, mesmo a subsistir qualquer dúvida, o que se postula por comodidade de raciocínio, ela sempre teria de desfavorecer a recorrente.
Daí que na improcedência das conclusões da alegação da recorrente, se impõe, nos termos acima expostos, confirmar a decisão aqui sindicada, com todas as legais consequências.
Improcede, por conseguinte, o presente recurso jurisdicional.

4. DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, mantendo-se a decisão judicial recorrida.
Custas pela Recorrente.
Notifique-se. D.N..
Lisboa, 11 de Junho de 2013

PEDRO VERGUEIRO
PEREIRA GAMEIRO
JOAQUIM CONDESSO