Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06885/10
Secção:CA - 2º. JUÍZO
Data do Acordão:11/06/2014
Relator:NUNO COUTINHO
Descritores:CASAS DE FUNÇÃO
APOSENTAÇÃO DE FUNCIONÁRIO.
DESOCUPAÇÃO
Sumário:1. O Conselho de Gestão do Instituto de Reinserção Social tinha competência, face ao disposto no nº 3 do artº 68º e nº 1 do artº 74º do D.L. nº 204-A/2001, de 26 de Julho para ordenar a desocupação de casas de função habitadas por funcionários, que passaram à situação de aposentados.
2. As casas de função são atribuídas em função de determinado interesse, como o interesse do Estado, não sendo aplicável o regime previsto no artº 107º do Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pelo D.L. nº 321-B/90, de 15/10, nem, no caso presente, o artigo 7º do Decreto Regulamentar nº 56/79, de 22 de Setembro.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I – Relatório

M…..-. e Outros, melhor identificados nos autos interpuseram contra o Instituto de Reinserção Social, recurso contencioso de anulação visando deliberações proferidas pelo Conselho de Gestão do Instituto de Reinserção Social, datadas de 12 de Março de 2003 e 24 de Outubro de 2004, nos termos das quais, respectivamente, foi decidido fixar um prazo de 4 meses para desocupação das casas de funções que ocupam e decidido desencadear as diligências necessárias com vista à desocupação coerciva das casas de função.

Por sentença proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, em 4 de Março de 2010, foi julgado improcedente o recurso contencioso de anulação.

Inconformado com o decidido, os Recorrentes recorreram para este TCA Sul, tendo formulado as seguintes conclusões:

“A. Não se conformam os Recorrentes com a douta sentença que julga improcedente o Recurso apresentado junto do Tribunal Administrativo de Circulo de Lisboa;

B. Mantêm a convicção de que as deliberações do Conselho de Gestão do Instituto de Reinserção Social, vertidas nos ofícios que lhes foram enviados e que se impugnam, são ilegais, padecem do vício de incompetência absoluta e, por isso, são nulas.

C. Nessa conformidade, não podem produzir quaisquer efeitos e muito menos conduzirem ao despejo dos Recorrentes das casas que vêm habitando desde que iniciaram funções ao serviço do C….. e que continuaram a habitar até à presente data.
D. A Recorrente M…… habita a casa onde reside, no seguimento de um despacho do Senhor Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça de 03-05-89, pelo que não pode tal despacho ser revogado por deliberação do Conselho de Gestão do Instituto de Reinserção Social.

E. Verificam-se diversas situações, idênticas quanto à natureza das habitações e do título que legitima a ocupação, e que tiveram diferente desfecho, isto é, os funcionários continuaram a habitar, mediante acordo com as instituições a que estão afectas.

F. Não se conformam os Recorrentes, que, ao arrepio da Constituição da República Portuguesa, contrariando as normas contidas nos Art° 13° e 65, n° 1 da CRP, venham a ser considerados válidos actos que colocam em risco a sua habitação, sem qualquer solução para o problema dos Recorrentes, quando a obrigatoriedade de ocupar tais casas decorre da função que exerceram ao serviço do Estado.

G. Encontrando-se os demais Recorrentes em situação análoga à da Recorrente M……, e tendo presentes as várias exposições efectuadas junto dos serviços do Instituto de Reinserção Social, do Governo e da Presidência da República, devem ser considerados como "casos especiais", ao abrigo do que estabeleceu o despacho do Senhor Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça de 03-05-89.

H. Devem ser declarados nulos os actos administrativos impugnados, os quais não poderão produzir os efeitos pretendidos na esfera jurídica dos Recorrentes, atento o vício de que padecem.

I. Mantêm os Recorrentes a posição assumida de que se aplica às situações em apreço, no que respeita à manutenção das suas habitações, o Decreto- Regulamentar n° 56/79, de 22 de Setembro, aplicável in casu, (Artº7°,n° 2), que refere: o inquilino que cesse funções, deixa de ser obrigado a proceder à devolução da casa, e passa-se a transcrever: '"se a cessão de funções for motivada por incapacidade permanente, doença, reforma (...) enquanto não for posta à disposição deste (...) outra casa adequada para efeitos de realojamento".

J. Dispõe o Regime do Arrendamento Urbano, (Art° 107°, n°1, a) que o direito de denúncia não pode ser exercido por parte do senhorio quando o arrendatário tiver mais de sessenta e cinco anos de idade.

K. Verificando-se omissão, nesta matéria, nas normas que regulam a desocupação das casas de função, conforme resulta dos termos de entrega (cfr.Doc.1 nos autos), "aplicam-se das regras gerais do inquilinato", à situação dos Recorrentes.

L. Não se pronunciou a douta sentença recorrida acerca destes argumentos expendidos pelos Recorrentes, quando o deveria ter feito.

Contra-alegou o Recorrido nos seguintes moldes:

“A. Os Recorrentes, a quem as casas de função, constantes dos autos, foram facultadas, através dos termos de entrega, comprometeram-se a dar inteira e total realização às disposições contidas nas instruções publicadas pela Direcção-Geral da Fazenda Pública, no Diário do Governo, II Série, de 31 de Dezembro de 1956.

B. Todos os Recorrentes passaram à condição de aposentados e, embora se tenham sujeito a despejar as casas de função onde ainda habitam, quando, superiormente lhes fosse determinado, designadamente, por motivo de aposentação, os Recorrentes insistem em ocupar de forma abusiva as casas de função, e duma forma ilegal, sem pagarem qualquer importância por viverem nas casas mencionadas.

C. Foi o interesse público que obrigou a uma legislação especial para atribuição e despejo de casas de função do Estado, conforme consta do Decreto-Lei n° 23 465, de 18 de Janeiro de 1934 e artigo 68° do Decreto-Lei n° 204-A/2001, de 26 de Julho.

D. A atribuição duma casa integrada no domínio privado do Estado a funcionário, mediante entrega duma renda, não constitui contrato de arrendamento, mas cessão a título precário, livremente revogável e sujeito ao direito administrativo.

E. A atribuição de casas de função tem sempre por fundamento a utilidade pública - n°1 do artigo 1° do Decreto Regulamentar n°56/79, de 22 de Setembro, por essa razão a cessão caduca logo que deixa de ser executado o cargo que motivou a atribuição das casas, conforme se apreende no n°1 do artigo 7° do mesmo Decreto - Regulamentar.

F. No que diz respeito à Recorrente M……., não se alcança sequer, a que título, a mesma ocupa a casa de função.

G. Independentemente dos motivos expostos no que toca à idade avançada e depauperamento físico dos Recorrentes, que também nos sensibilizam, o certo é que, não entrevemos qualquer ilegalidade na ordem emitida a fixar prazo para a entrega das casas, nem nas subsequentes ordens de despejo.

H. Durante o ano de 2002, nos meses de Março, Abril e Maio, os Recorrentes receberam ofícios, nos termos dos quais eram informados de que "em cumprimento de deliberação do Conselho de Gestão de 21 de Março de 2002, lhes foi fixado o prazo de 60 dias, contados nos termos do artigo 72° do CPA (...) para desocupar a (...) casa de função e entregar as chaves nos Serviços Centrais (...)" do Instituto de Reinserção Social.

I. O Conselho de Gestão do Instituto de Reinserção Social, decidiu desencadear as diligências que se demonstrassem necessárias, com vista à desocupação coerciva das casas de função (ocupadas pelos ora Recorrentes) ao abrigo do disposto no artigo 8° do Decreto-Lei n° 23 465, de 18 de Janeiro de 1934 e do artigo 68° do Decreto-Lei n° 202 - A/2001, de 26 de Julho.

J. O Decreto-Lei n° 204 -A/2001, de 26 de Julho reestruturou, então, o Instituto de Reinserção Social e aprovou a respectiva Lei Orgânica.

K. O Conselho de Gestão do Instituto de Reinserção Social era um órgão do Instituto, nos termos da alínea b) do artigo 4° do Decreto-Lei n° 204 -A/2001, de 26 de Julho, ao qual competia designadamente "assegurar a gestão corrente do património afecto ao Instituto", conforme se pode confirmar na alínea g) do artigo 7° do mesmo diploma.
L. A afectação ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade prevista no artigo 74° do Decreto-Lei n° 204 -A/2001, de 26 de Julho, respeita apenas a bens imóveis "do Estado" onde funcionou o "ex – C……", bem como bens móveis nele existente. A afectação não se refere nem a pessoal, nem às casas afectas aos centros educativos. Ou seja, para que tais casas afectas ao Instituto de Reinserção Social passassem a estar afectas ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade, era fundamental que a norma declaradamente se referisse a tal afectação. O que não sucede.

M. Nos termos do artigo 68° do Decreto-Lei n° 204-A/2001, de 26 de Julho, as casas afectas aos centros educativos, e em específico, as indispensáveis como casas de função, eram, património afecto ao Instituto de Reinserção Social. Cuja gestão corrente competia ao conselho de gestão garantir. Não tendo tais imóveis sido afectos ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade nos termos do artigo 74° daquele diploma (que apenas se refere ao imóvel onde operou o ex-c……, em Lisboa).

N. Não se vislumbram, quaisquer questões suscitadas pelos Recorrentes, relativamente às quais, o Tribunal não se tenha pronunciado.

O. Conclui-se, assim, que os actos praticados pelo Instituto de Reinserção Social não se encontram feridos de vício de incompetência absoluta e usurpação, contrariamente ao alegado pelos Recorrentes.

O EMMP emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso


II) Na sentença recorrida foram dados como assentes os seguintes factos:

A) M…… assinou em 16 de Abril de 1972 "Termo de entrega" de casa de função com O seguinte teor: "Aos dezasseis dias do mês de Abril de mil novecentos e setenta e dois, estando perante a Licenciada em Direito M……, Directora do Instituto de São Domingos de Benfica, compareceu a escriturária dactilógrafa de primeira classe, interina, M……, com o vencimento mensal de dois mil e seiscentos escudos, autorizada por despacho ministerial de sete de Abril do corrente ano, e por despacho de sua excelência o Secretário de Estado do Tesouro de trinta de Janeiro de mil novecentos e setenta, a habitar com sua irmã M……, em comum, um quarto da residência do B… número …., primeiro …., do Bairro dos Funcionários afecta a este Instituto, em interesse do Estado e da funcionária, não mobilado, nas condições seguintes:
PRIMEIRA: A entrega é feita a título precário, mediante o pagamento da renda mensal de vinte e seis escudos, feito adiantadamente por meio de desconto nas folhas de vencimento.
SEGUNDA:O segundo outorgante obriga-se a dar inteiro e fiel cumprimento às disposições contidas nas instruções publicadas pela Direcção-Geral da Fazenda Pública no Diário do Governo número trezentos e cinco, segunda série, de trinta e um de Dezembro, de mil novecentos e cinquenta e seis, de que tem inteiro e perfeito conhecimento e, bem assim, a entregar a dependência no estado em que se encontrava à data deste termo.
Quanto ao mais aqui expressamente estipulado, serão observadas as disposições gerais sobre o inquilinato (...)".Cfr. documento junto ao processo administrativo.

B) L…… assinou em 3 de Julho de 1991 "Termo de Entrega" de casa de função, com o seguinte teor: "Aos três dias do mês de Julho de mil novecentos e noventa e um, estando presente a Chefe de repartição O……, servindo de Directora do Instituto de São Domingos de Benfica, por despacho de 14/91 do Exmo Senhor Director-Geral, compareceu a 1ª Oficial L…., com o vencimento mensal de noventa e quatro mil e quinhentos escudos, autorizada por despacho de dois de Julho de mil novecentos e noventa e um do Sr.° Director-Geral dos Serviços Tutelares de Menores em subdelegação de competência a habitar, no interesse comum do Estado e do funcionário, a moradia n°.. do Bairro dos Funcionários, afecta a este Instituto, composta de três quartos, uma sala comum, cozinha, casa de banho, incluindo retrete, despensa e corredor, não mobilada, nas condições seguintes:
PRIMEIRA: A entrega é feita a título precário, mediante o pagamento da renda mensal de três mil setecentos e oitenta escudos, feito adiantadamente por meio de desconto nas folhas de vencimento.
SEGUNDA: O segundo outorgante obriga-se a dar inteiro e fiel cumprimento às disposições contidas nas instruções publicadas pela Direcção-Geral da Fazenda Pública no Diário do Governo n° trezentos e cinco, segunda série, de trinta e um de Dezembro de mil novecentos e cinquenta e seis, de que tem inteiro e perfeito conhecimento e, bem assim, a entregar a moradia no estado em que se encontrava à data deste termo.
Quanto ao mais aqui não expressamente estipulado, serão observadas as disposições gerais sobre lei e inquilinato em vigor. (...)".Cfr. documento junto ao processo administrativo.

C) M…… assinou em 10 de Julho de 1979 "Termo de entrega" de casa de função com o seguinte teor: "Aos dez dias do mês de Julho de mil novecentos e setenta e nove, estando presente a Lie. B……, servindo de Directora, deste estabelecimento, (...) com a monitora-vigilante de segunda classe M…… com o vencimento mensal de oito mil e novecentos escudos, e dois mil escudos correspondentes a quatro diuturnidades (totalizando dez mil e novecentos escudos), autorizada, por despacho de quatro de Julho de mil novecentos e setenta e nove, do senhor Director-Geral dos Serviços Tutelares de Menores, nos termos do artigo vigésimo do Decreto-Lei número quarenta e quatro mil duzentos oitenta e sete, de vinte de Abril de mil novecentos e setenta e dois, a habitar no seu interesse e do Estado, a moradia número …., não mobilada, afecta ao Bairro do Instituto de São Domingos de Benfica, a qual consta de uma casa de banho/retrete, uma cozinha, uma despensa, uma sala e três quartos, nas seguintes condições:
PRIMEIRA: A entrega é feita a título precário, mediante o pagamento de renda mensal de quatrocentos e trinta e seis escudos, paga adiantadamente, por meio de desconto nas folhas de vencimento.
SEGUNDA: O segundo outorgante obriga-se a dar inteiro e fiel cumprimento às disposições contidas nas instruções publicadas pela Direcção-Geral da Fazenda Pública, no Diário do Governo número trezentos e cinco, segunda série, de trinta de Dezembro de mil novecentos cinquenta e seis, de que tem inteiro conhecimento, bem assim, a entregar a moradia no estado em que encontrava à data deste termo." Cfr. documento junto ao processo administrativo.
D) M…… assinou em 24 de Julho de 1975 "Termo de entrega" de casa de função, com o seguinte teor: "Aos vinte e quatro dias do mês do mês de Julho de mil novecentos e setenta e cinco, estando presente a educadora de segunda classe M…… (...) Directora do Instituto de S. Domingos de Benfica, compareceu a auxiliar de enfermagem de primeira classe M…… (...) o vencimento de cinco mil escudos, autorizada por despacho de seis de Julho corrente ano e pelo disposto no artigo sexagésimo nono do Decreto-Lei número quinhentos e vinte e três de dezanove de Dezembro de mil novecentos e setenta e dois, a habitar, no interesse do Estado a residência do Bloco número … primeiro …., afecta ao (...) estabelecimento, composto por uma sala, três quartos, cozinha, casa de banho, incluindo retrete, despensa e corredor, não mobilada, nas condições seguintes:
PRIMEIRA: A entrega é feita a título precário, mediante o pagamento de renda mensal de cem escudos, paga adiantadamente, por meio de desconto nas folhas de vencimento.
SEGUNDA: O segundo outorgante obriga-se a dar inteiro e fiel cumprimento às disposições contidas nas instruções publicadas pela Direcção-Geral da Fazenda Pública, no Diário do Governo número trezentos e cinco, segunda série, de trinta de Dezembro de mil novecentos cinquenta e seis, de que tem inteiro conhecimento, bem assim, a entregar a moradia no estado em que encontrava à data deste termo." Cfr. documento junto ao processo administrativo.

E) M…… assinou em 20 de Outubro de mil — novecentos e noventa e um "Termo de entrega" de casa de função, com o seguinte teor: "No dia 20 de Outubro de mil novecentos e noventa e um, estando presente O……, Chefe de Repartição, compareceu neste Instituto M……, auxiliar técnica de educação, com o vencimento mensal de setenta e oito mil e cem escudos, autorizado, por despacho de onze de Outubro de mil novecentos e noventa e um, do Senhor Director-Geral dos Serviços Tutelares de Menores, proferido no Uso da Subdelegação de competência conferida por despacho de Sua Excelência o Secretário de Estado Adjunto do Ministério da Justiça, publicado no Diário da República, segunda série, numero cinquenta e um, de dois de Março de mil novecentos e noventa e um, e pelo disposto no artigo sessenta e quatro do Decreto-Lei número quinhentos e seis barra oitenta, de vinte e um de Outubro, a habitar, no interesse exclusivo do Estado, a residência número …., do bloco …, primeiro …, sita Bairro anexo a este Instituto, com uma sala, três quartos, cozinha e uma casa de banho, não mobilada, nas condições seguintes:
PRIMEIRA: A entrega é feita a título precário, mediante o pagamento da renda mensal de mil quinhentos e sessenta e dois escudos, paga adiantadamente por meio de desconto nas folhas de vencimento.
SEGUNDA: O segundo outorgante obriga-se a dar inteiro e fiel cumprimento às disposições contidas nas "instruções" publicadas pela Direcção-Geral da Fazenda Pública no Diário do Governo, número trezentos e cinco, segunda série, de trinta e um de Dezembro de mil novecentos e cinquenta e seis, de que tem direito e perfeito conhecimento e, bem assim, a entregar no estado em que se encontrava à data deste Termo.
Quanto ao mais aqui não expressamente estipulado, serão observadas as disposições gerais sobre o inquilinato." Cfr. documento junto ao processo administrativo.

F) A……a assinou em 24 de Julho de 1975 "Termo de entrega" de casa de função, com o seguinte teor: "Aos vinte e quatro dias do mês de Julho de mil novecentos e setenta e cinco, estando presente a educadora de segunda classe M…… servindo de Directora do Instituto de São Domingos de Benfica, compareceu o serventuário A……., com o vencimento mensal de três mil e novecentos escudos, autorizado por despacho de sete de Julho do corrente ano, a habitar no interesse comum do Estado e do funcionário, a residência do bloco número …, rés do chão…, afecta a este Estabelecimento, composta de uma sala, três quartos, cozinha, casa de banho, incluindo retrete, despensa e corredor, não mobilada, nas condições seguintes:
PRIMEIRA: A entrega é feita a título precário, mediante o pagamento da renda mensal de cento e cinquenta e seis escudos, feito adiantadamente por meio de desconto nas folhas de vencimento.
SEGUNDA: O segundo outorgante obriga-se a dar inteiro e fiel cumprimento às disposições contidas nas instruções publicadas pela Direcção Geral da Fazenda Pública no Diário do Governo número trezentos e cinco, segunda série, de trinta e um de Dezembro de mil novecentos e cinquenta e seis, de que tem inteiro e perfeito conhecimento e, bem assim, a entregar a dependência no estado em que se encontrava à data deste termo.
Quanto ao mais a que não expressamente estipulado, serão observadas as disposições gerais sobre o inquilinato."Cfr. documento junto ao processo administrativo.

G) A……. assinou em 20 de Janeiro de 1986 "Termo de entrega" de casa de função com o seguinte teor: "Aos vinte dias do mês de Janeiro de mil novecentos e oitenta e seis, estando presente a Senhora Directora do Instituto de São Domingos de Benfica Licenciada M……, compareceu A……, motorista de ligeiros de 2a classe do Instituto Navarro de Paiva, abonado de vencimento mensal de vinte e quatro mil e setecentos escudos, acrescido de mil e quinhentos escudos de diuturnidades e de dois mil seiscentos e vinte e escudos de participação emolumentar, num total de vinte e oito mil oitocentos e vinte escudos (28520$00) autorizado por despacho do Excelentíssimo senhor Director-Geral dos Serviços Tutelares de Menores de dezassete de Janeiro de mil novecentos e oitenta e seis de harmonia com o artigo 64°, n°1 do Decreto-Lei n°506/80, de vinte e um de Outubro de mil novecentos e oitenta, a habitar no interesse exclusivo do Estado, residência número .. (..) do Bloco n°.. r/c ..., não mobilada, afecta ao Instituto de S. Domingos de Benfica, constituída por uma cozinha, uma casa de banho, três quartos e uma sala, nas seguintes condições:
PRIMEIRA: A entrega é feita a título precário, mediante o pagamento da renda mensal de quinhentos e setenta e sete escudos (577$00), paga adiantadamente por meio de desconto nas folhas de vencimento. Esta habitação foi atribuída a A….., enquanto este desempenhar as funções de motorista de ligeiros de 2a classe do Instituto Navarro de Paiva.
SEGUNDA: O segundo outorgante obriga-se a dar inteiro e fiel cumprimento às disposições contidas nas instruções publicadas pela Direcção-Geral da Fazenda Pública, no Diário da República n°305 - II Série, de trinta e um de Dezembro de mil novecentos e cinquenta e seis, de que tem direito e perfeito conhecimento e, bem assim entregar a moradia no estado em que se encontrava à data do termo.
Quanto ao mais aqui não expressamente estipulado, serão observadas as disposições gerais sobre o inquilinato." Cfr. documento junto ao processo administrativo.

H) M… V…. aposentou-se em Agosto de 2001. Cfr. documento de folhas 199 dos autos.
I) L……. aposentou-se em Maio de 2001. Cfr. documento de folhas 199 dos autos.
J) M…. A…. aposentou-se em Setembro de 1996. Cfr. documento de folhas 199 dos autos.
K) M…. F…. aposentou-se em Dezembro de 1987. Cfr. documento de folhas 199 dos autos.
L) M…. A…. aposentou-se em Fevereiro de 1995. Cfr. documento de folhas 199 dos autos.
M) A…. aposentou-se em Junho de 2001. Cfr. documento de folhas 199 dos autos.
N) M…. C…. aposentou-se em Novembro de 1998. Cfr. documento de folhas 199 dos autos.
O) A…. J…. aposentou-se em Maio de 1999. Cfr. documento de folhas 199 dos autos.
P) Durante o ano de 2002, nos meses de Março Abril e Maio os recorrentes receberam ofícios com a menção "Pelo Conselho de Gestão" assinados por Vice-Presidentes do Instituto de Reinserção Social nos termos dos quais eram notificados de que "em cumprimento de deliberação do Conselho de Gestão de 21 de Março de 2002, lhe foi fixado o prazo de 60 dias, contados, nos termos do artigo 72° do CP A, a partir da recepção do (...) oficio, para desocupar a (...) casa [de função] e entregar as chaves nos Serviços Centrais (Divisão de Gestão e Administração do Património" do Instituto de Reinserção Social. Cfr. documento de folhas 36 a 42 dos autos e juntos ao processo administrativo.
Q) No Instituto de Reinserção Social foi em 20 de Fevereiro de 2003, elaborada "Informação/Proposta/Parecer n°26/DGFP/DIGAP" relativa ao assunto "Casas de Função afectas ao extinto C……. Exposição dirigida a sua Excelência a Ministra da Justiça" com o seguinte teor: "Em cumprimento do despacho da Senhora Presidente de 13 de Janeiro de 2003, citando informação sobre o teor da exposição dirigida à Senhora Ministra da Justiça por um grupo de cinco ocupantes de casas de função do extinto C……. tem-se a dizer o seguinte:
1. Os subscritores da referida exposição são antigos funcionários deste Instituto ou da extinta Direcção-Geral dos Serviços Tutelares de Menores, aos quais foram atribuídas casas de função e que, tendo passado à situação de aposentados, não as desocuparam com era sua obrigação.
Três deles foram notificados, no primeiro semestre de 2002, dos despachos do Presidente deste Instituto que os mandavam abandonar as casas e entregar as chaves nos Serviços Centrais. Recusaram-se a fazê-lo, alegando, de um modo geral, razões de saúde e debilidade económica.
Os dois restantes nunca foram notificados por este Instituto para procederem à devolução das casas que lhes haviam sido atribuídas.
2. Os beneficiários das casas de função ficam obrigados ao pagamento de renda, calculada segundo a fórmula estabelecida no n°2 das Instruções que regem a atribuição de casas do Estado a funcionários públicos, aprovadas por despacho do Subsecretário de Estado do Tesouro de 14 de Dezembro de 1956, e, presentemente, no artigo 5° do Regulamento das Casas de Função, aprovado por deliberação do Conselho de Gestão de 10 de Abril de 2000, para casas de função afectas a este Instituto.
As rendas são descontadas antecipadamente nos vencimentos dos beneficiários. Porém, logo que são aposentados e passam a ser abonados pela Caixa Geral de Aposentações, cessam os descontos respeitantes às rendas.
Portanto, os subscritores do documento enviado à Senhora Ministra da Justiça, tal como todos os que ocupam indevidamente casas de função, não pagam renda pela sua utilização.
A todos os beneficiários é dado conhecimento, no momento da assinatura dos termos de entrega, de que a atribuição tem carácter precário e caduca logo que estes deixem de exercer as funções que a justificam, em conformidade, com o disposto no n°20 das Instruções e no art.12° do Regulamento.
3- As casas de função destinam-se a proporcionar alojamento aos funcionários no activo e, de acordo com o n°1 das instruções atrás citadas, ainda em vigor, só poderão ser atribuídas a funcionários públicos, civis e militares, desde que haja concordância do Ministério a que está afecto o imóvel e tenham sido aprovados pelo Ministério das Finanças os respectivos termos de entrega.
No que respeita às casas de função afectas ao Instituto de Reinserção Social, dispõe o n°1 do artigo 68° do Decreto-Lei n°204-A/2001, de 26 de Julho (LOIRS), que a atribuição de residência junto dos centros educativos é fixada, por despacho do Presidente, em função do interesse do serviço e da natureza das funções desempenhadas.
Acrescenta o n°2 daquele preceito que quando não necessárias como casas de função serão afectas à prossecução das atribuições da Instituição, designadamente unidades residenciais de menores e jovens, unidades de aprendizagem, formação ou outras.
Face ao exposto, a concretização do objectivo visado pelos subscritores do documento já referido, adquirem as casas por si ocupadas, só seria viável havendo orientação superior no sentido de as mesmas serem desafectadas dos fins legalmente previstos, para posterior alienação.
Sendo bens do domínio privado do Estado, a venda deveria observar necessariamente as regras aplicáveis às vendas de imóveis do Estado. A regra geral, neste caso, é a venda em hasta pública, a que pode apresentar-se qualquer interessado. A venda directa só é admissível a título excepcional.
Não sendo arrendatários, não dispondo de qualquer título legítimo de ocupação, nem havendo norma legal que lhes reconheça o direito de preferência, a venda seria feita ao licitante que oferecesse melhor preço.
Há a ter em conta que o bairro das casas de função afectas ao extinto C……. é constituído por 23 fogos, todos ocupados, e que a decisão de alienar deveria ser extensiva a todos eles.
Alguns desses fogos situam-se em blocos de seis, o que significa que a venda aos respectivos moradores implicaria sempre a necessidade da sua prévia constituição em propriedade horizontal." Cfr. documento junto ao processo administrativo.

R) O Conselho de Gestão do Instituto de Reinserção Social deliberou, por referência ao teor daquela Informação, em 13 de Março de 2003 "continuar a aplicar o Regulamento em vigor, voltando a notificar os residentes que ocupam ilegalmente as casas para a respectiva desocupação no prazo de 4 meses". Cfr. documentos junto ao processo administrativo.

S) Os ora recorrentes foram notificados por ofícios de Abril de 2003 e Setembro de 2003 de que "por deliberação do Conselho de Gestão [do Instituto de Reinserção Social] lhes havia sido fixado o prazo de quatro meses para desocupar a [respectiva] casa ocupada. Cfr. documentos de folhas 43 a 57 e 85 a 92 dos autos.

T) O Conselho de Gestão do Instituto de Reinserção Social em reunião de 24 de Outubro de 2003 deliberou desencadear as diligências que se mostrassem necessárias com vista à desocupação coerciva das casas de função (ocupadas pelos ora recorrentes) ao abrigo do disposto no artigo 8° do Decreto-Lei n° 23 465, de 18 de Janeiro de 1934 e do artigo 68° do Decreto-lei n° 202-A/2001, de 26 de Julho. Cfr. documento juntos ao processo administrativo.

U) Os ora recorrentes foram notificados do teor de tal deliberação por ofícios de 28 de Outubro de 2003. Cfr. documentos junto ao processo administrativo.
*
Não se provou que M……. tenha assinado "Termo de entrega" idêntico aos acima reproduzidos ou qualquer título escrito que titulasse o facto de habitar o 1° andar, .., do lote n°.. do Largo de ……, em Lisboa.

Ao abrigo do artº 662 nº 1 do C.P.C. adita-se o seguinte facto:

V) Foi remetido ofício ao Chefe de Gabinete do Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça, assinado pelo Director Geral dos Serviços Tutelares de Menores do qual se transcreve o seguinte:
(…)
“Pedido de venda das casas do Bairro do Ministério da Justiça junto do Instituto de S. Domingos de Benfica
(…)
1. O Bairro de casas do Estado, construído junto ao Instituto de S. Domingos de Benfica fica a uma escassa centenas de metros deste, é constituído por 23 habitações, 19 das quais estão ocupadas por pessoal em exercício de funções, a quem foram atribuídas.
2. Há duas casas ocupadas irregularmente:
(…)
2.4. A nº .., pela ex-enfermeira M……, aposentada desde 19-07-1987, cuja permanência tem sido admitida por se tratar de um dos casos especiais a que faz referência o despacho de 03-05-89 de Sua Excelência o Secretário de Estado Adjunto.” (…) – cfr. doc. 3 junto com a p.i..

III) Fundamentação jurídica

Tendo presente que o objecto do recurso é fixado e delimitado pelas conclusões das alegações importa conhecer do mesmo.

Como primeiro fundamento de recurso alegaram as AA. que os actos recorridos padecem de vício de incompetência absoluta, dado que à data em que foram proferidos já o recorrido não dispunha de competência para a prática dos mesmos, alegação refutada pelo referido sujeito processual, que estribou a sua posição no disposto no artº 74º do D.L. nº 204-A/2001, de 26 de Julho.

Apreciando as teses antagónicas em liça, para o que se revela útil transcrever os seguintes preceitos do D.L. nº 204-A/2001, de 26 de Julho:
Artigo 1.º
Natureza
O Instituto de Reinserção Social, adiante designado por Instituto, é um instituto público, dotado de personalidade jurídica e de autonomia administrativa e financeira, sujeito à superintendência e tutela do Ministro da Justiça.
Artigo 3.º
Atribuições
1 - São atribuições do Instituto:
a) Contribuir para a definição da política criminal, em particular nos domínios da reintegração social de jovens e adultos e de prevenção da delinquência;
b) Assegurar, nos termos da lei, o apoio técnico aos tribunais na tomada de decisões no âmbito dos processos penal e tutelar educativo e dos processos tutelares cíveis;

c) Assegurar, nos termos da lei, a execução de medidas tutelares educativas;
d) Assegurar, nos termos da lei, a execução de penas e medidas alternativas à pena de prisão, incluindo a liberdade condicional e a liberdade para prova;
e) Participar em programas e acções de prevenção do crime, em especial nos domínios da delinquência juvenil;

f) Assegurar a gestão dos centros educativos de menores e de outros equipamentos e programas para apoio à reintegração social de jovens e adultos
(….)

Artigo 74.º
Afectação de bens ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade
1 - Os bens imóveis do Estado onde funcionaram o ex-C…… da Infanta, em Lisboa, e os ex-Lares de …., em Viseu, de Castelo Branco e da M……, em Lisboa, bem como os bens móveis neles existentes, são afectos ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade.
2 - As referências feitas aos serviços referidos no número anterior ou ao IRS, mas relativos aos mesmos serviços, em acordos que se mantenham em vigor, contratos ou outros instrumentos jurídicos, passam a entender-se feitas ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade, precedida da necessária apreciação e concordância dos serviços deste Ministério com competência em matéria de gestão de equipamentos de acolhimento de crianças e jovens.

Por sua vez, de acordo com a alínea g) do artº 7º do mesmo diploma competia ao Conselho de Gestão do Instituto de Reinserção Social “...assegurar a gestão corrente do património afecto ao Instituto”.

Questionaram os recorrentes a competência dos órgãos do recorrido para a prática dos actos recorridos, alegação que está votada ao insucesso face ao disposto no nº 1 do artº 74º do D.L. nº 204-A/20001, de 26 de Julho, dado os imóveis que ocupam não estarem afectos ao Ministério do Trabalho e da Solidariedade, dado nos mesmos não ter funcionado, por estar em causa nos autos casas de funções ocupadas pelos recorrentes, o ex-C……., em Lisboa, pelo que competindo ao Conselho de Gestão do Instituto de Reinserção Social assegurar a gestão corrente do património afecto ao Instituto os actos recorridos foram praticados pelo órgão para tal competente, dado estar em causa casas de função afectas ao recorrido, devendo as mesmas ser desocupadas face ao disposto no nº 3 do artº 68º do diploma em apreço, nos termos do qual “Após a cessação das funções que justificaram a atribuição de residência, a casa de função é obrigatoriamente desocupada, sob pena de despejo pelo Instituto ou pela autoridade policial, nos termos da legislação aplicável.”

A conclusão supra expendida não é prejudicada pelo invocado artigo 8º do D.L. nº 23 465, de 18 de Janeiro de 1934 nos termos do qual 'As pessoas colectivas ou os particulares que tenham para seu uso bens do Estado, cedidos a título precário, e ainda os que ocuparem sem título são obrigados a entregá-los dentro do prazo de sessenta dias a contar do aviso postal que receberem da repartição competente, sob pena de serem despejadas imediatamente pela autoridade administrativa ou policial, sem direito a qualquer indemnização” e do entendimento vertido no Parecer do Conselho Procuradora Geral da República, votado em 21 de Novembro de 1991, publicado na IIª Série do D.R. de 28 de Abril de 1995, dado a segunda deliberação recorrida apenas ter decidido no sentido de serem desencadeadas as diligências que se mostrarem necessárias à desocupação coerciva das casas em apreço, não se retirando da mesma qualquer violação da norma em apreço.

No que diz respeito à concreta situação da recorrente M…… – invocada na conclusão D das alegações – importa referir que, ao contrário do alegado a mesma não ocupa a casa de função – a casa 18 – por força de um despacho do Secretário de Estado Adjunto do Ministro da Justiça de 03 de Maio de 1989, mas sim, conforme se retira do facto descrito no item V) dos factos apurados – por a permanência da requerente na aludida casa ter sido admitida por se tratar de um dos casos especiais a que faz referência o despacho de 03-05-89 de Sua Excelência o Secretário de Estado Adjunto, pelo que os actos impugnados não revogam, no que estritamente concerne à referida recorrente, ao contrário do alegado, o referido despacho do Secretário de Estado Adjunto, não tendo os recorrentes alegado, em sede da petição de recurso contencioso, factos que permitam concluir enquadrarem-se nos casos especiais mencionados no despacho em apreço.

Relativamente à aplicação do disposto no artigo 107º do Regime do Arrendamento Urbano (1), revogado pela Lei nº 6/2006, de 27 de Fevereiro., e analisando os argumentos que os recorrentes referem não terem sido tratados em sede de decisão recorrida, importa começar por transcrever o mesmo:
Artigo 107º
Limitações
1 - O direito de denúncia do contrato de arrendamento, facultado ao senhorio pela alínea a) do n.º 1 do artigo 69.º, não pode ser exercido quando no momento em que deva produzir efeitos ocorra alguma das seguintes circunstâncias:
a) Ter o arrendatário 65 ou mais anos de idade ou, independentemente desta, se encontre na situação de reforma por invalidez absoluta, ou, não beneficiando de pensão de invalidez, sofra de incapacidade total para o trabalho;
b) Manter-se o arrendatário no local arrendado há 30 ou mais anos, nessa qualidade.
2 - Para efeitos da alínea b) do número anterior, considera-se como tendo a qualidade de arrendatário o cônjuge a quem tal posição se transfira, nos termos dos artigos 84.º e 85.º, contando-se a seu favor o decurso do tempo de que o transmitente já beneficiasse.”


A questão que se coloca prende-se com o sentido a conferir à expressão ínsita nos documentos intitulados “termo de entrega”, referidos nos itens A) a G) dos factos assentes: “Quanto ao mais aqui não expressamente estipulado, serão observadas as disposições gerais sobre lei e inquilinato em vigor”, expressão que não pode ter o sentido pretendido pelos recorrentes dado os referidos “termo de entrega” terem a seguinte redacção:
(…)
SEGUNDA: O segundo outorgante obriga-se a dar inteiro e fiel cumprimento às disposições contidas nas instruções publicadas pela Direcção-Geral da Fazenda Pública, no Diário do Governo número trezentos e cinco, segunda série, de trinta de Dezembro de mil novecentos cinquenta e seis, de que tem inteiro conhecimento, bem assim, a entregar a moradia no estado em que encontrava à data deste termo.”

O artigo 20º das aludidas instruções refere o seguinte: “«Os beneficiários das casas do Estado atribuídas nos termos destas Instruções obrigam-se a despejá-las no prazo de trinta dias, quando superiormente lhes for determinado, por motivo de conveniência de serviço, exoneração, aposentação ou falecimento do seu titular", sendo assim legítimo concluir, dado os ora recorrentes se encontrarem na situação de aposentados, impender sobre os mesmos a obrigação de desocupar as casas assim que cesse o motivo que levou à sua atribuição: a circunstância de serem funcionários do Estado e se reconhecer a necessidade de, por motivos de interesse público – repare-se que as casas em apreço foram atribuídas aos recorrentes “…em função do interesse do Estado…”, nos termos constantes dos “termos de entrega” lhes ser atribuída uma casa de função, interesse que já não se verifica quando o funcionário se aposenta.

Está-se assim perante regime que afasta o consagrado no Regime de Arrendamento Urbano, nomeadamente quanto à aplicação do supra transcrito artigo 107º, face ao teor do artigo 20 das supra referidas instruções.

Por último importa analisar a aplicabilidade à situação das requerentes do disposto no artigo 7º nº 2 do Decreto Regulamentar nº 56/79, de 22 de Setembro, preceito que se transcreve:


“Artigo 7º
Cessação de contratos
1 - Os contratos de arrendamento caducam logo que o inquilino deixe de exercer na localidade as funções que determinaram a atribuição da casa, devendo aquele proceder à devolução da mesma, completamente devoluta, no prazo de noventa dias.

2 - Não se aplica o disposto no número anterior se a cessação de funções for motivada por incapacidade permanente, doença, reforma ou morte do inquilino, enquanto não for posta à disposição deste, do cônjuge ou dos elementos do agregado familiar que dele dependam economicamente e que com ele coabitam outra casa adequada para efeitos de realojamento.

(…)

Constitui entendimento do Tribunal que o nº 2 do artigo 7º não se aplica à situação dos recorrentes por duas ordens de razões: a primeira porque, de acordo com o nº 3 do artigo a declaração de interesse público – prevista no nº 2 – “…será feita, para efeitos deste diploma, pelas entidades que tenham a seu cargo o licenciamento das correspondentes actividades económicas ou que, de qualquer forma, as apoiem ou tutelem.”, prevendo o nº 2 que “a atribuição a que se refere o n.º 1(2) destina-se a funcionários e agentes da Administração Central, Regional e Local ou a trabalhadores de empresas quando a deslocação resulte da criação de actividades económicas declaradas de interesse público.”; ora, os recorrentes, conforme referem no item 1º da p.i., trabalharam inicialmente no Instituto de São Domingos de Benfica, posteriormente no extinto C……., igualmente em São Domingos de Benfica, pelo que não está em causa a criação de actividades económicas declaradas de interesse público e que constitui, nos termos do diploma em apreço o fundamento para atribuição de casas; sendo que o segundo motivo pelo qual o nº 2 do artigo 7º não é aplicável às recorrentes está plasmado no nº 3 do artº 68º do D.L. nº 204-A/20001, de 26 de Julho, nos termos do qual “Após a cessação das funções que justificaram a atribuição de residência, a casa de função é obrigatoriamente desocupada, sob pena de despejo pelo Instituto ou pela autoridade policial, nos termos da legislação aplicável.”, cuja redacção permite concluir, linearmente, que a desocupação deve ter lugar sem que o recorrido tenha de, previamente, assegurar aos requerentes outra casa adequada para efeitos de realojamento.

Por último importará referir que o Tribunal não se pronunciará sobre a invocada violação dos artigos 13º e 65º nº 1 da C.R.P., dado tal questão não ter sido suscitada na petição de recurso contencioso pelos ora recorrentes, não tendo a sentença, logicamente, conhecido da mesma, o que impende o Tribunal, em sede de recurso – dirigido a uma sentença –, de conhecer da violação dos invocados preceitos constitucionais, dado a mesma não integrar o objecto do recurso.
IV) Decisão

Assim, face ao exposto, acordam em conferência os juízes da secção de contencioso administrativo do TCA Sul em julgar improcedente o recurso.
Custas pelos recorrentes.
Lisboa, 6 de Novembro de 2014


Nuno Coutinho


Carlos Araújo


Rui Belfo Pereira
1) Na redacção vigente à data da prática dos actos impugnados - D.L. nº 321-B/90, de 15/10, revogado pela Lei nº 6/2006, de 27 de Fevereiro.
2)Atribuição das casas