Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:12760/15
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:01/14/2016
Relator:PEDRO MARCHÃO MARQUES
Descritores:CONCURSO; GESTÃO DE RESÍDUOS; ALVARÁ DE OPERADOR; ADJUDICAÇÃO
Sumário:i) As operações de gestão de resíduos, submetidas à concorrência no âmbito do Concurso Público n.º 4691/2013, para a prestação de serviços de recolha, encaminhamento e armazenagem de resíduos provenientes dos navios, da carga e dos resíduos não urbanos gerados nas áreas portuárias dos Portos da Região Autónoma da Madeira, sob gestão da APRAM, SA, encontram-se sujeitas a licenciamento.

ii)Não tendo o concorrente apresentado o alvará respectivo, a que se referia o ponto 8.1., al. f) do Programa do Concurso, e exigido pelo artigo 23.º, n.º 1 do Decreto-lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro (que aprovou o Regime Geral da Gestão de Resíduos - RGGR), o qual dispõe que “a actividade de tratamento de resíduos está sujeita a licenciamento por razões de saúde pública e de protecção do ambiente, nos termos do presente capítulo”, sendo esta entendida como “qualquer operação de valorização ou de eliminação de resíduos, incluindo a preparação prévia à valorização ou eliminação e as actividades económicas referidas no anexo iv do presente decreto-lei, do qual faz parte integrante” (cfr. artigo 3º, al. oo) do RGGR), inevitavelmente, a falta de apresentação desse documento de habilitação – o alvará de licença de operador de gestão de resíduos –, constituiu causa legal de caducidade da adjudicação que lhe havia sido feita, de acordo com o disposto no artigo 86.º, n.º 1, al.s a) e b) do CCP.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. Relatório

H…………… – Gestão ……………, SA (Recorrente), interpôs recurso jurisdicional do acórdão do TAF do Funchal de 15.09.2015, proferido na sequência de anterior acórdão deste TCAS, que julgou improcedente a reclamação da decisão que havia sido proferida por juiz singular. No acórdão recorrido foi julgada totalmente improcedente a acção de contencioso pré-contratual por si intentada contra a demandada A………. - …………………, SA. (Recorrida).

As alegações de recurso que apresentou culminam com as seguintes conclusões:

1. Através da presente acção, é impugnado o acto do Conselho de Administração da APRAM, ora recorrida, notificado por ofício com a referência 193, de 13.02.2014, pelo qual se decidiu que as adjudicações que foram outorgadas à H..........., ora recorrente, relativamente aos Lotes 1e 3 no "Concurso Público para Prestação de Serviços de Recolha de Resíduos" lançado pela APRAM, se consideravam caducadas ao abrigo do 86.º do CCP.

2. Pede ainda a ora recorrente a declaração de invalidade de quanto posteriormente processado a esse acto e, bem assim, a condenação da Entidade recorrida à prática de acto devido que, no caso, implicará a celebração do contrato adjudicado para a execução dos serviços estabelecidos para os Lotes 1 e 3 do concurso supra identificado, cujo objecto principal consiste na "aquisição de serviços de recolha, encaminhamento e armazenagem de resíduos para destino autorizado ou licenciado nos termos do Decreto-Lei n.º 73/2011, de 17 de Junho provenientes dos navios, da carga e dos resíduos não urbanos gerados nas Áreas Portuárias dos Portos da Região Autónoma da Madeira, sob gestão da APRAM, S.A., visando garantir o cumprimento da legislação ambiental nacional, comunitária e internacional".

3. Visando o cumprimento das regras relativas aos documentos de habilitação, e dentro do prazo estabelecido, a H........... apresentou os documentos exigidos, nestes se destacando, por específicos do procedimento em causa (cfr. art.º 8.1,alíneas f) e g) do Programa), a lista dos operadores a quem serão entregues os resíduos para efeitos de tratamento e as respectivas licenças ambientais e de operador de resíduos.

4. A APRAM decide então determinar a caducidade da adjudicação, por entender que a H........... não juntou os documentos de habilitação exigidos, posto que devia ter demonstrado ser ela própria titular de uma licença de operador de resíduos.

5. Impugnada esta decisão, o Tribunal a quo manteve-a, declarando a mesma legalmente justificada e fundamentada por decisão singular, a qual foi confirmada por acórdão do Colectivo de Juízes do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal.

6. Ora, a decisão recorrida viola o disposto nos art.ºs 81.º e 86.º do CCP, porquanto a H........... entregou todos os documentos de habilitação necessários e que lhe eram exigíveis nos termos da lei, pelo que nenhum motivo existia para manter uma decisão que, ilegalmente, decidiu julgar caducas as adjudicações antes concedidas.

7. Viola ainda a decisão o disposto no regime legal aplicável, interpretando-o incorrectamente, em particular o disposto nos art.ºs 23.º e 43.º do RGGR, posto que, para recolher e transportar os resíduos produzidos e descarregados nos portos sob jurisdição da APRAM nenhuma licença carece o operador de recolha e transporte deter, bastando-lhe, nos termos do próprio Concurso, indicar as entidades a quem entregará esses resíduos, devendo estas, como é evidente, ter as licenças necessárias para o efeito, o que igualmente foi demonstrado.

8. Por outro lado, dado que o tratamento dos resíduos se encontra fora do objecto dos contratos adjudicados, a entrega dos resíduos a essas entidades não constitui uma sub-contratação que determine a necessidade de as entidades que procederão ao tratamento dos resíduos apresentem declarações de compromisso no Concurso.

9. Para o Lote 3 a H........... indicou, como devia, uma entidade que na Ilha da Madeira está licenciada para receber e tratar todos os resíduos que constituem aquele Lote: a V………………..

10. Para o Lote 1, para além de a referida V…………… estar habilitada para receber alguns dos resíduos, a H........... também indicou uma outra entidade que, ainda que no Continente, possui na sua licença todos os outros Códigos LER em falta.

11. Estas entidades não são subcontratadas para os efeitos do CCP, dado que aquilo que elas farão não se integra no objecto do contrato em apreço.

12. No entanto, cabe à APRAM certificar-se que o prestador de serviços de recolha dos resíduos de que ela é responsável os entrega a entidades devidamente credenciadas.

13. Nesse sentido, nenhum documento de habilitação estava em falta.

14. A H..........., para executar estes contratos, não carece ser titular de qualquer licença.

15. O RGGR (nem as Directivas Comunitárias que o mesmo transpõe) não impõe o licenciamento da actividade de recolha e transporte dos resíduos que constituem os lotes 1e 3 que foram adjudicados à H............

16. As entidades a quem o prestador deste tipo de serviços entrega os resíduos recolhidos é que estão sujeitas a licenciamento, nomeadamente das instalações onde se procede ao seu efectivo tratamento (por eliminação ou por valorização), podendo dar-se o caso de, antes destas operações finais, ser necessário armazenar os resíduos por determinado período de tempo.

17. No entanto, tal armazenagem é sempre feita no âmbito da operação de tratamento.

18. A operação de recolha e transporte não admite armazenagem dos resíduos.

19. A H........... simplesmente fará a recolha desses resíduos e o seu encaminhamento a destino final, respeitando as melhores práticas ambientais, e todas as regras legais e regulamentares aplicáveis, utilizando equipamentos e veículos devidamente homologados e que garantem total segurança no transporte desses resíduos.

20. Pelo que, não lhe podia ser exigida uma licença que de nada serviria para a execução do contrato que lhe foi adjudicado.

21. Nem faria sentido que assim fosse, pelo que a única interpretação das regras do Concurso compatível com a Lei conduz àquilo que a H........... apresentou em sede de habilitação no Concurso: a indicar as entidades a quem iria entregar os resíduos que recolheria; e a demonstrar que tais entidades estavam devidamente licenciadas para o tratamento dos resíduos que lhes seriam entregues.

22. A decisão ora recorrida interpreta e aplica incorrectamente o regime legal aplicável, ao concluir que para a prestação destes serviços era necessário possuir uma licença de operador de gestão de resíduos, quando a lei, em especial o RGGR, não o exige, antes o isenta.

23. Fazendo uma incorrecta interpretação e aplicação da lei, e mantendo a consequência de tal leitura - que levou á decisão de caducidade da adjudicação dos lotes 1e 3 á H........... - deve ser a sentença recorrida revogada, e, em consequência, proceder a acção proposta pela H..........., declarando-se a ilegalidade do acto impugnado e condenar-se a APRAM a celebrar os devidos contratos com a H........... quanto aos Lotes 1e 3.



A Recorrida contra-alegou, produzindo as seguintes alegações:

A - Não merece qualquer censura a douta Decisão recorrida, quando, concluindo que "(i.) no âmbito do concurso público lançado pela E.D. para a Prestação de Serviços de Recolha de Resíduos é legalmente necessária a licença de operador de gestão de resíduos; (ii.) o acto que declarou a caducidade da adjudicação não padece do vício de violação de lei que lhe foi imputado; (iii.) consequentemente, a A. não tem direito à manutenção da adjudicação dos lotes n.º l e n.º 3 e à respectiva celebração do contrato", julgou totalmente improcedente a presente acção e absolveu do pedido a Entidade Demandada e os Contra-Interessados.

B - Está assente: - que a Recorrida, como Entidade Adjudicante, submeteu a Concurso Público "a prestação de serviços de recolha de resíduos" (fls. 20-22 dos autos);- que os resíduos em causa neste processo, que foram inicialmente adjudicados à Recorrente, tratam-se de Resíduos de Hidrocarbonetos [Lote 1] e de Lixos [Lote 3] - cf. Programa do Concurso e Caderno de Encargos, fls 20-22 e 91-95 dos autos; - que o Programa do Concurso sujeitou à concorrência a "aquisição de serviços de [l.°] recolha, [2.º] encaminhamento e [3.°] armazenagem de resíduos "

(cf. Ponto 3. dos Factos Provados e cláusula 1.ª do Caderno de Encargos -Parte 1, fls. 45 e 54 dos autos); - que os resíduos a concurso são ''provenientes dos navios, da carga e dos resíduos não wbanos gerados nas Áreas Portuárias dos Portos da Região Autónoma da Madeira" (cf. Ponto 3. dos Factos Provados e cláusula 1.ª do Caderno de Encargos - Parte 1, fls. 45 e 54 dos autos); e - que o Programa do Concurso Público vertente dispõe, sob ponto 8.1, alíneas f) que "Devem ser apresentados, no prazo de 10 (dez) após a notificação da decisão de adjudicação, os seguintes documentos de habilitação: (...) f) Alvará de Licença de operador de gestão de resíduos com excepção do lote n.º2" (cf. fls. 23-61 dos autos).

C -O Programa do Concurso [cf. ponto 8.1, al. g) "Listados operadores a quem serão entregues para efeitos de tratamento de resíduos"] apenas exige, de modo claro e inequívoco, que seja apresentada a lista - não as licenças, porque essas deveriam ser detidas pelos concorrentes - dos operadores a quem seriam entregues os resíduos para efeitos de tratamento, donde improcede a alegação e conclusão da Recorrente de que, apresentando a lista e as licenças ambientais e as licenças de operação de gestão de resíduos que apresentou da CARMO …………… e da V…………………..e não dela própria, estaria a cumprir - porque não está - a exigência de ser titular e ter de apresentar a licença prevista no ponto 8.1, f) do Programa do Concurso [cf. doe. de fls. 23-61 dos autos].

D -Contrariamente ao que propugna a Recorrente, e tal como bem decidido na douta Decisão em crise, a lei exige, para a prestação dos serviços de recolha de resíduos sob os Lotes 1 e 3 objecto do concurso ajuizado, que o operador concorrente fosse/seja titular da licença de operador de gestão de resíduos.

E - Efectivamente, tendo presente o objecto do aludido Concurso Público ["aquisição de serviços de recolha, encaminhamento e armazenagem de resíduos provenientes dos navios, da carga e dos resíduos não urbanos gerados nas Áreas Portuárias dos Portos da Região Autónoma da Madeira, sob gestão da APRAM. S.A. "-sublinhado nosso] e o disposto nos artigos 43.º, 23.º em conjugação com o estatuído nos artigos 6.º e 3.º alíneas oo)- e anexo IV para o qual remete - e cc), todos do RGG resulta inequívoco e completamente demonstrado, tal como doutamente decidido, que a prestação de serviços de recolha de resíduos a concurso carece de licenciamento dos operadores concorrentes, pelo que nem o acto impugnado nem as normais concursais que consagram tal exigência padecem de qualquer vício que os inquine ou invalide.

F -Acresce que, além da recolha e encaminhamento, foi também submetido à concorrência a prestação dos serviços de "armazenagem", e não os serviços de "armazenagem preliminar", daqui decorrendo que os serviços de armazenagem teriam de ser prestados pelo concorrente fora do local da respectiva produção, de onde os resíduos deveriam ser encaminhados pelo mesmo, com destino, repete-se, a armazenamento -cf. cláusula 1.ª do Caderno de Encargos -Parte I, fls. 20-22 dos autos, e alíneas b) e c) do artigo 3.º do RGGR.

G - Ademais, a Recorrente alega desenvolvidamente o modo como faria a recolha dos resíduos sob os mencionados Lotes 1 e 3, ou melhor, como "simplesmente fará a recolha desses resíduos e o seu encaminhamento a destino final" [ponto 19. das Conclusões de Recurso], olvidando, por um lado, que tal 'recolha” que descreve não corresponde à "recolha, encaminhamento e armazenagem de resíduos " submetidos à concorrência, e que, por outro lado, sem embargo, o modo como invoca que faria a 'recolha' e 'transporte' dos resíduos, constitui invocação de factos que não estão demonstrados nem assentes neste processo, pelo que não poderão ser atendidos para procedência da pretensão recursiva.

H- Nos termos concursais a juízo, a armazenagem dos resíduos seria, pois, sempre feita e assegurada pelo concorrente até a respectiva expedição ou até entrega para transformação [valorização ou eliminação] -e não por outrem, no âmbito da operação de tratamento.

I -De outro passo e como bem descortinado na Decisão prejudicada, não pode a Recorrente, salvo contradição inquinante do seu raciocínio e pretensão recursiva, entender que a licença de operador de gestão de resíduos só deveria ser detida pelas entidades que viesse a subcontratar para a execução do contrato a celebrar no âmbito do procedimento concursal em causa, e não deveria ser detida por si própria; além de contraditório, tal entendimento, porquanto permitiria à Recorrente apresentar documentos de habilitação de subcontratados antes de a entidade adjudicante ter autorizado tal subcontratação, constituiria uma violação ao que dispõe a Cláusula 17.ª do Caderno de Encargos, que impede de forma expressa a subcontratação sem prévia autorização daquela entidade.

J - Foi à luz do regime legal exposto e em obediência ao estatuído no n.º 6 do artigo 81.º do CCP, que o Programa do Concurso exigiu, e bem, que os concorrentes adjudicatários fossem titulares e apresentassem o alvará de licença de operador de gestão de resíduos, não merecendo tal exigência qualquer censura, pelo que a falta de apresentação de tal documento de habilitação pela Recorrente, constituiu causa legal de caducidade da adjudicação que lhe havia sido feita dos apontados Lotes 1 e 3, ao abrigo do disposto no artigo 86.º n.º 1, alíneas a) e b) do CCP.

K - Sem prescindir, ainda que se admitisse que o quadro legal exposto não exige que a Recorrente fosse titular da licença de operador de gestão de resíduos para o concurso em causa, o que só hipoteticamente se admite, sem, todavia, conceder, sempre tal exigência teria suporte e consagração legal em razões de interesse público, interesse que estrutura toda a contratação pública.

L -Com efeito, no Concurso Público dos autos, estamos perante resíduos de Hidrocarbonetos [Lote 1] e de Lixos [Lote 3], que exigem particulares cuidados técnicos quanto à sua adequada recolha, encaminhamento e armazenagem [até tratamento final], sob pena de poder ser posta em risco a saúde pública e o ambiente - basta pensar, v.g., nos combustiveis e óleos, cujo inerente risco de poluição e de efeitos nocivos para a saúde é evidente, se não forem devidamente manuseados, transportados e acondicionados.

M - Ora, a salvaguarda da saúde pública e do ambiente constituem razões de interesse público supremo que sempre justificariam - como também justificaram - a exigência de que os concorrentes fossem titulares da licença de operação de gestão de resíduos, deste modo se garantindo que os adjudicatários estivessem aptos a proceder à recolha, encaminhamento e armazenagem dos resíduos submetidos à concorrência, munidos dos processos, métodos e meios que melhor protegessem a integridade daqueles interesses (cf. artigos 27.º e ss do RGGR)

N - Assim, a Recorrida, enquanto entidade adjudicante e em ordem a proteger o ambiente da Região Autónoma da Madeira e a saúde pública de todos quantos nela habitam e a visitam, tinha e tem margem de liberdade decisória para exigir -como exigiu -que os concorrentes em referência fossem titulares da licença de operador de gestão de resíduos, posto que, assim, melhores garantias teria de que tais interesses públicos seriam salvaguardados [a propósito da discricionariedade e liberdade administrativa, vide, por todos, Ac. do Tribunal Central Administrativo Sul, de 21-11-2013, Processo: 04502/08, in www.dgsi.pt. e doutrina af citada, para a qual também se remete].

O -De tudo quanto fica aduzido, resulta que o acto impugnado que determinou a caducidade do acto de adjudicação dos Lotes 1 e 3 à Recorrente, não padece de qualquer ilegalidade, e que, outrossim, a douta Decisão recorrida não violou o disposto nos artigos 81.º e 86.º do CCP, nem o disposto nos artigos 23.º e 43.º do RGGR, nem fez, tão-pouco, uma interpretação incorrecta deste regime legal aplicável ao caso.



Remetidos os autos a este Tribunal Central Administrativo em 16.11.2015, foi a Exma. Procuradora-Geral Adjunta notificada nos termos e para os efeitos do disposto no art. 146.º, n.º 1, e 147.º do CPTA, nada tendo dito.


Com dispensa de vistos, atenta a sua natureza urgente, vem agora o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Administrativo para decisão.


I. 2. Questões a apreciar e decidir:

As questões suscitadas pelo Recorrente, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, traduzem-se em apreciar se o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de direito, ao ter concluído que a ora Recorrente não entregou todos os documentos de habilitação necessários, concretamente a licença de operador de gestão de resíduos, o que determinou a caducidade da adjudicação impugnada.



II. Fundamentação

II.1. De facto

É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal, a qual se reproduz ipsis verbis:

1. Em 19/09/2013 a E.D. fez publicar em Diário da República o Anúncio de Procedimento de Concurso Público n.º 4691/2013, nos termos do qual consta, entre o mais:

“ (…)

2 – Objecto do Contrato

Designação do contrato: Prestação de serviços de recolha de resíduos. Tipo de Contrato: Aquisição de Serviços.

(…)

5 – Divisão em Lotes, se for o caso. Lote n.º 1

Designação do lote: Hidrocarbonetos (…)

Lote n.º 2

Designação do lote: Águas Residuais (…)

Lote n.º 3

Designação do lote: Lixos (…)

Lote n.º 4

Designação do lote: Óleos Alimentares (…)”


Cfr. doc. junto aos autos a fls . 20-22.

2. Do Programa do Concurso Público referido em 1. supra, consta entre o mais, que:

“ (…)

8. Documentos de habilitação, a apresentar pelo concorrente a quem vier a ser feita a adjudicação

8.1 Devem ser apresentados, no prazo de 10 (dez) dias após a notificação da decisão de adjudicação, os seguintes documentos de habilitação:

f) Alvará de Licença de operador de gestão de resíduos, com excepção do lote n.º 2;”


Cfr. doc. junto aos autos a fls . 23-61.

3. Das cláusulas gerais do Caderno de Encargos do concurso público referido em 1. supra, consta, entre o mais, que:

“Cláusula 1.ª – Objecto

1. O presente Caderno de Encargos compreende as cláusulas a incluir no contrato a celebrar na sequência do procedimento pré-contratual que tem por objecto principal a aquisição de serviços de recolha, encaminhamento e armazenagem de resíduos provenientes dos navios, da carga e dos resíduos não urbanos gerados nas áreas Portuárias dos Portos da Região Autónoma da Madeira, sob gestão da APRAM S.A., visando garantir o cumprimento da legislação ambiental nacional, comunitária e internacional.

2. (…).

3. O objecto do contrato abrange todos os trabalhos necessários à prestação de serviços, nomeadamente a recolha, encaminhamento e armazenagem de resíduos para destino autorizado ou licenciado nos termos do Decreto-Lei n.º 73/2011, de 17 de Junho.”

Cláusula 17.ª – Subcontratação e cessão da posição contratual

A subcontratação pelo prestador de serviços e a cessão da posição contratual por qualquer das partes depende da autorização da outra, nos termos do Código dos Contratos Públicos.”


Cfr. docs . a fls . 45 e 54 dos autos .

4. Das cláusulas técnicas do Caderno de Encargos do concurso público referido em 1. supra, consta, entre o mais, que:

“Cláusula 1.ª – Objecto

É objecto deste caderno de encargos as condições estabelecidas para a adjudicação da prestação de serviços para a recolha, encaminhamento e armazenagem dos resíduos gerados em navios, da carga, bem como os resíduos não urbanos gerados nas áreas portuárias sobre gestão da APRAM, S.A.”


Cfr. docs . a fls . 56 dos autos .

5. A A. apresentou uma proposta no procedimento de concurso público referido em 1. supra, tendo concorrido aos 4 lotes.

Cfr. docs . a fls . 62-78 dos autos .

6. No âmbito do concurso público referido em 1. supra, em 25/10/2013 a E.D. deliberou adjudicar à A. o Lote n.º 1 (Resíduos de Hidrocarbonetos) e o Lote n.º 3 (Lixos).

Cfr. doc. junto aos autos a fls . 91-95.

7. A A. não apresentou o alvará de licença de operador de gestão de resíduos aquando da adjudicação dos lotes n.º 1 e n.º 3.

Vide motivação infra.

8. A A. apresentou duas licenças de operadores de gestão de resíduos referentes à empresa Valor Ambiente – Gestão e Administração de Resíduos da Madeira, S.A., tituladas pelos alvarás n.º 07/2010/DRAMB e n.º 13/2010/DRAMB.

Cfr. docs . junto aos autos a fls . 96-101 e 107 - 108.

9. Em 14/02/2014, a A. foi notificada do acto praticado pela E.D. datado de 13/02/2014, que declarou a caducidade das adjudicações dos lotes 1 e 3.

Cfr. docs . a fls . 182-192 do s autos e fls . 301- 311 do processo administrativo. Vide motivação infra.

B - Motivação de facto

A matéria de facto dada como assente nos presentes autos foi a considerada relevante para a decisão da causa controvertida segundo as várias soluções plausíveis das questões de direito. A formação da nossa convicção para efeitos da fundamentação dos factos atrás dados como provados teve por base os documentos juntos aos autos aí referidos, bem como os constantes do processo administrativo, os quais foram analisados segundo as regras da experiência comum e que não foram impugnados. Deu-se como provado o facto vertido em 7. supra, pelo acordo das partes resultante dos respectivos articulados. Deu-se como provado os factos vertidos em 9. supra pelo acordo das partes expresso nos respectivos articulados e pelos documentos aí referidos.




II.2. De direito

A ora Recorrente impugnou no TAF do Funchal, através da presente acção de contencioso pré-contratual, o acto praticado pela ora Recorrida que determinou a caducidade das adjudicações que lhe haviam sido outorgadas relativamente aos lotes n.ºs 1 e 3, no âmbito do procedimento relativo ao Concurso Público n.º 4691/2013, para prestação de serviços de recolha de resíduos, com fundamento na falta de apresentação do alvará de licença de operador de gestão de resíduos.

Considera a Recorrente que a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento ao ter julgado improcedente a acção, uma vez que entende que apresentou toda a documentação exigida e que para prestar os serviços para os quais foi designada adjudicatária, não carece de deter licença de operador de gestão de resíduos. Alega ainda que a referida licença deve ser detida por aqueles a quem entregará os resíduos que recolherá.

No Tribunal a quo, ao que aqui importa, escreveu-se o seguinte:

Verifica-se que, de acordo com as regras do Concurso Público, nomeadamente do Caderno de Encargos o objecto do contrato a celebrar compreende a aquisição de serviços de recolha, encaminhamento e armazenagem de resíduos, vide 3. dos Factos Provados.

Vejamos, em primeiro lugar, por pertinente para a presente decisão, se as operações de gestão de resíduos, que constituem o objecto do contrato a celebrar, carecem legalmente de licenciamento.

De acordo com o disposto no art. 23.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 73/2011, de 17 de Junho, “a actividade de tratamento de resíduos está sujeita a licenciamento por razões de saúde pública e de protecção do ambiente, nos termos do presente capítulo.”

Dispõe ainda o art. 32.º, n.º 1, alínea b), do regime jurídico supra referido que “São licenciados em procedimento de regime simplificado, analisado e decidido no prazo de 30 dias pela entidade licenciadora a armazenagem de resíduos, quando efectuadas no próprio local de produção, no respeito pelas especificações técnicas aplicáveis e por período superior a um ano.”

Finalmente o art. 43.º refere que “(…) as operações de gestão de resíduos gerados em navios (…) encontram-se sujeitas a licenciamento (…).”

Compulsado o regime legal, concluímos que as operações de gestão de resíduos, submetidas à concorrência no âmbito do Concurso Público em causa, encontram-se sujeitas a licenciamento.

Desde logo, as operações de gestão de resíduos gerados em navios, nomeadamente as de armazenagem fora do local de produção e que claramente ficam abrangidas pelo contrato a celebrar, cfr. cláusula 4.ª do Caderno de Encargos. Sucede ainda que o Caderno de Encargos submeteu à concorrência os serviços de armazenagem e não os de armazenagem preliminar, cfr. art. 3.º, alínea b) e c).

Por outro lado, mesmo a armazenagem de resíduos quando efectuada no próprio local de produção, encontra-se sujeita a licenciamento quando efectuada por período superior a um ano, circunstância que embora não expressamente prevista no Caderno de Encargos, não deve ser afastada do objecto do contrato e da respectiva execução, atenta a amplitude com que o seu objecto aparece definido.

Acresce que a própria A. admite que a prestação dos serviços para a qual foi designada adjudicatária carece de licença de operador de gestão de resíduos. No entanto, entende que essa mesma licença deve ser detida pelas entidades a subcontratar, e não por si própria, vide arts. 15. e 16. da petição inicial.

Ora, se entende que as subcontratadas necessitam de licença de operador de gestão de resíduos, para a execução do contrato a celebrar, o mesmo é dizer que admite a exigência legal desse mesmo licenciamento. E, em conformidade, juntou os documentos comprovativos das respectivas licenças de operadores de gestão de resíduos.

É, efectivamente, contraditória a posição assumida pela A.

Sucede ainda que o raciocínio da A. levaria a que, na fase de formação do contrato, os concorrentes subcontratantes ficassem dispensados da apresentação dos documentos de habilitação desde que apresentassem os documentos de habilitação dos potenciais subcontratados, tudo isto previamente à autorização da subcontratação pelo contraente público.

Finalmente, a subcontratação carece de autorização nos termos da Cláusula 17.ª do Caderno de Encargos.

Pelo que não se concebe que os documentos de habilitação exigidos pelas regras do concurso, não tenham que ser apresentados pela adjudicatária.

Nestes termos, a E.D. actuou em conformidade com o previsto no n.º 8.1, alínea f) do Programa do Concurso exigindo à A. a apresentação dos documentos de habilitação, nomeadamente o alvará de licença de operador de gestão de resíduos, após a adjudicação do lote n.º 1 e do lote n.º 3.

Sucede que a não apresentação pelo adjudicatário dos documentos de habilitação exigidos no programa do procedimento, constitui causa legalmente prevista de caducidade da adjudicação, vide art. 86.º, n.º 1, alínea a) e b), do Código dos Contratos Públicos (CCP).

Assim, o acto impugnado que determinou a caducidade do acto de adjudicação dos lotes 1 e 3 à A., não é passível da censura jurídica que lhe é assacada pela mesma, produzindo todos os efeitos que lhe são inerentes, nomeadamente quanto à cessação de direitos e deveres constituídos por força da adjudicação, v.g. quanto ao direito da adjudicatária à celebração do contrato.

Concluindo, em conformidade com o supra exposto:

(i) no âmbito do concurso público lançado pela E.D. para a Prestação de Serviços de Recolha de Resíduos é legalmente necessária a licença de operador de gestão de resíduos;

(ii) o acto que declarou a caducidade da adjudicação não padece do vício de violação de lei que lhe foi imputado;

(iii) consequentemente, a A. não tem o direito à manutenção da adjudicação dos lotes n.º 1 e n.º 3 e à respectiva celebração do contrato.

Pelo que a presente acção tem necessariamente de improceder.

E o assim decidido, podemos já adiantar, é de confirmar. Vejamos porquê.

De acordo com a factualidade que vem provada e que não é sujeita a qualquer impugnação, temos que o Concurso Público em questão tem como objecto a “prestação de serviços de recolha de resíduos”, que os resíduos em causa e que foram inicialmente adjudicados à Recorrente, tratam-se de “Hidrocarbonetos” (Lote l) e de “Lixos” (Lote 3).

De igual modo, resulta do provado em 3. supra que nas cláusulas gerais do Caderno de Encargos, se prevê o seguinte:

“Cláusula 1.ª – Objecto

1. O presente Caderno de Encargos compreende as cláusulas a incluir no contrato a celebrar na sequência do procedimento pré-contratual que tem por objecto principal a aquisição de serviços de recolha, encaminhamento e armazenagem de resíduos provenientes dos navios, da carga e dos resíduos não urbanos gerados nas áreas Portuárias dos Portos da Região Autónoma da Madeira, sob gestão da APRAM S.A., visando garantir o cumprimento da legislação ambiental nacional, comunitária e internacional.

2. (…).

3. O objecto do contrato abrange todos os trabalhos necessários à prestação de serviços, nomeadamente a recolha, encaminhamento e armazenagem de resíduos para destino autorizado ou licenciado nos termos do Decreto-Lei n.º 73/2011, de 17 de Junho.”

Cláusula 17.ª – Subcontratação e cessão da posição contratual

A subcontratação pelo prestador de serviços e a cessão da posição contratual por qualquer das partes depende da autorização da outra, nos termos do Código dos Contratos Públicos.”

Assente está que os resíduos a concurso são provenientes dos navios, da carga e dos resíduos não urbanos gerados nas Áreas Portuárias dos Portos da Região Autónoma da Madeira.

E assente está, ainda, que o Programa do Concurso Público vertente dispõe, no ponto 8.1, alínea f), que: "Devem ser apresentados, no prazo de 10 (dez) após a notificação da decisão de adjudicação, os seguintes documentos de habilitação: (…) //f) Alvará de Licença de operador de gestão de resíduos com excepção do lote n.º 2”.

Tendo ficado igualmente provado que a ora Recorrente não apresentou o alvará de licença de operador de gestão de resíduos no momento da adjudicação dos ditos lotes n.ºs 1 e 3, tendo sim apresentado duas licenças de operadores de gestão de resíduos referentes a empresas terceiras (cfr, o provado em 7. e 8.).

Ora, analisando as normas concursais em apreço, concretamente a contida na alínea f) do ponto 8. do Programa do Concurso, resulta que era exigido que o concorrente, enquanto operador, deveria ser titular do alvará de licença de operador de gestão de resíduos. Com efeito, a referência feita na citada alínea f) ao Alvará de Licença de operador de gestão de resíduos” (com excepção do lote n.º 2), tem, desde logo no contexto da declaração contratual, como único destinatário o adjudicatário, não se prevendo sequer a possibilidade de virem a ser apresentadas licenças de operadores terceiros.

E tal como salientado pela Recorrida nas suas contra-alegações, o Programa do Concurso (cf. ponto 8.1, al. g) a propósito da “Lista dos operadores a quem serão entregues para efeitos de tratamento de resíduos", apenas é pedida, de modo claro e inequívoco, que seja apresentada a lista e não as licenças dos operadores a quem seriam entregues os resíduos para efeitos de tratamento. Donde não poderá proceder a alegação e conclusão da Recorrente de que, apresentando a lista e as licenças ambientais e as licenças de operação de gestão de resíduos que apresentou de empresas terceiras, e não dela própria, estaria a cumprir a exigência de ser titular e ter de apresentar a licença prevista no referido ponto 8.1. al. f) do Programa do Concurso.

Por outro lado, também não tem razão a Recorrente quando alega que a lei não exige, para a prestação dos serviços de recolha de resíduos sob os Lotes l e 3 objecto do concurso, que o concorrente seja titular da licença de operador de gestão de resíduos.

Dispõe o artigo 43.º do Regime Geral da Gestão de Resíduos, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro a "[as operações de] gestão de resíduos gerados em navios, encontram-se sujeitas a licenciamento nos termas da legislação e regulamentação respectivamente aplicáveis, aplicando-se o disposto no presente capítulo em tudo o que não estiver nela previsto”. Constando do n.º l do artigo 23.º do mesmo diploma, que se insere no mesmo capítulo, que a "actividade de tratamento de resíduos está sujeita a licenciamento por razões de saúde pública e de protecção do ambiente".

Sendo que aquele n.º 23.º do RCGR isenta de licenciamento as seguintes operações de tratamento:

a) Valorização energética de resíduos vegetais fibrosos provenientes da produção de pasta virgem e de papel, se forem co-incinerados no local de produção;

b) Valorização energética de resíduos de madeira e cortiça, com excepção daqueles que possam conter compostos orgânicos halogenados ou metais pesados resultantes de tratamento com conservantes ou revestimento, incluindo, em especial, os provenientes de obras de construção e demolição;

c) Valorização energética da fracção dos biorresíduos provenientes de espaços verdes;

d) Valorização energética da fracção dos biorresíduos de origem vegetal provenientes da indústria de transformação de produtos alimentares;

e) Valorização não energética de resíduos não perigosos, quando efectuada pelo produtor dos resíduos resultantes da sua própria actividade, no local de produção ou em local análogo ao local de produção pertencente à mesma entidade;

f) Valorização não energética de resíduos perigosos, quando efectuada pelo produtor dos resíduos, desde que abrangida por normas técnicas previstas nos n.os 2 e 3 do artigo 20.º

Por outro lado, como também alegado pela Recorrida, o artigo 32.º do RGGR prevê que possam ser licenciadas, em procedimento de regime simplificado, as operações de tratamento, armazenagem, armazenamento, triagem e valorização de resíduos descritas nas alíneas do n.º 1 daquele artigo, sendo que em nenhuma delas se integra os serviços de recolha de resíduos a concurso, nem mesmo na al. b), dado que não estamos perante armazenagem de resíduos efectuadas no próprio local de produção.

Alega, porém, a Recorrente que simplesmente fará a recolha desses resíduos e o seu encaminhamento a destino final, respeitando as melhores práticas ambientais e todas as regras legais e regulamentares aplicáveis, utilizando equipamentos e veículos devidamente homologados e que garantem total segurança no transporte desses resíduos. Pelo que, nos termos da sua alegação, não lhe podia ser exigida uma licença que de nada serviria para a execução do contrato que lhe foi adjudicado.

Mas não é assim como se está a procurar demonstrar.

Na verdade, como se disse já, o artigo 23.º, n.º 1, do Decreto-lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro (que aprovou o Regime Geral da Gestão de Resíduos - RGGR), dispõe que “a actividade de tratamento de resíduos está sujeita a licenciamento por razões de saúde pública e de protecção do ambiente, nos termos do presente capítulo”, sendo esta entendida como “qualquer operação de valorização ou de eliminação de resíduos, incluindo a preparação prévia à valorização ou eliminação e as actividades económicas referidas no anexo iv do presente decreto-lei, do qual faz parte integrante” (artigo 3º, al. oo) do RGGR). Sendo que, como constante das clausulas gerais do Caderno de Encargos deste concurso público “o objecto do contrato abrange todos os trabalhos necessários à prestação de serviços, nomeadamente a recolha, encaminhamento e armazenagem de resíduos para destino autorizado ou licenciado [sublinhado nosso]” (cfr. cláusula 1.ª, n.º 3).

E, diremos nós, facilmente se percebe in casu a exigência de licença, considerando os resíduos em causa nos lotes: Resíduos de Hidrocarbonetos e Lixos. Com efeito, a necessidade de salvaguarda dos interesses de ordem pública em presença, de que se destaca a defesa da saúde pública e do ambiente, exige que os concorrentes neste concurso sejam titulares da licença de operação de gestão de resíduos, de modo a demonstrar e garantir a sua aptidão para a correcta prestação do serviço contratado consistente na recolha, encaminhamento e armazenagem daqueles resíduos, com a adequada comprovação técnica para o devido manuseamento, transporte e acondicionamento até ao tratamento final. Aliás, consta do Caderno de Encargos, como provado em 3., que o contrato a celebrar se visa garantir o cumprimento da legislação ambiental nacional, comunitária e internacional.

Por fim, relativamente à arguição que se alcança pela leitura das alegações de recurso no que tange à inutilidade/irrelevância da licença exigida quanto à Recorrente, o que conduziria à solicitação de habilitações desnecessárias e portanto violadoras do princípio da proporcionalidade, sempre se dirá que, independentemente do objecto do contrato a celebrar, à luz do art. 81.º, n.º 6 do CCP, os documentos de habilitação exigíveis são os que forem demonstrativos da detenção dos requisitos legais necessários ao exercício da actividade relevante objecto do contrato. Requisitos esses que são legalmente exigíveis e que, como provado, a ora Recorrente não detém.

Pelo que, inevitavelmente, a falta de apresentação desse documento de habilitação pela Recorrente – o alvará de licença de operador de gestão de resíduos –, constituiu causa legal de caducidade da adjudicação que lhe havia sido feita, de acordo com o disposto no artigo 86.º, n.º 1, al.s a) e b) do CCP.

Assim, terá que concluir-se, como se fez no TAF do Funchal, que a ora Recorrente não cumpriu o disposto no ponto 8.1., al. f) do Programa do Concurso, pelo que se impunha a declaração de caducidade das adjudicações que lhe foram outorgadas relativamente aos lotes 1 e 3 do concurso em causa, improcedendo, assim, todas as conclusões do recurso interposto.



III. Conclusões

Sumariando:

i) As operações de gestão de resíduos, submetidas à concorrência no âmbito do Concurso Público n.º 4691/2013, para a prestação de serviços de recolha, encaminhamento e armazenagem de resíduos provenientes dos navios, da carga e dos resíduos não urbanos gerados nas áreas portuárias dos Portos da Região Autónoma da Madeira, sob gestão da APRAM, SA, encontram-se sujeitas a licenciamento.

ii) Não tendo o concorrente apresentado o alvará respectivo, a que se referia o ponto 8.1., al. f) do Programa do Concurso, e exigido pelo artigo 23.º, n.º 1 do Decreto-lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro (que aprovou o Regime Geral da Gestão de Resíduos - RGGR), o qual dispõe que “a actividade de tratamento de resíduos está sujeita a licenciamento por razões de saúde pública e de protecção do ambiente, nos termos do presente capítulo”, sendo esta entendida como “qualquer operação de valorização ou de eliminação de resíduos, incluindo a preparação prévia à valorização ou eliminação e as actividades económicas referidas no anexo iv do presente decreto-lei, do qual faz parte integrante” (cfr. artigo 3º, al. oo) do RGGR), inevitavelmente, a falta de apresentação desse documento de habilitação – o alvará de licença de operador de gestão de resíduos –, constituiu causa legal de caducidade da adjudicação que lhe havia sido feita, de acordo com o disposto no artigo 86.º, n.º 1, al.s a) e b) do CCP.



IV. Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Administrativo deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 14 de Janeiro de 2016



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Pedro Marchão Marques


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Maria Helena Canelas


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António Vasconcelos