Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:15/17.0BELSB
Secção:CA-2º JUÍZO
Data do Acordão:02/14/2017
Relator:PAULO PEREIRA GOUVEIA
Descritores:TRIBUNAL ARBITRAL DO DESPORTO
MATÉRIA DE FACTO
FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE
Meio Processual:DECISÃO SUMÁRIA
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:DESPACHO

1.

- S..................... FUTEBOL, SAD, vem recorrer da DECISÃO ARBITRAL de colégio arbitral do Tribunal Arbitral do Desporto, datada de 05-12-2016.

São partes recorridas:

- FEDERAÇÃO ...............OL,

- S........ ................, FUTEBOL, SAD, e o seu presidente B............................

2.

A decisão do tribunal arbitral necessário designado por lei como “Tribunal Arbitral do Desporto”, decisão aqui recorrida, tem uma organização estranha e irregular; com efeito, naquilo que designa expressamente como “fundamentação de facto” existem quase somente opiniões, adjetivos, conclusões e matéria de direito.

Além disso, o TAD não expôs de modo suficiente e claro o teor da decisão da C.I.I. da L.P.F.P. e, pior ainda, o teor da decisão por si apreciada, a do C.D. da F.P.F.

Como suposta “matéria de facto” fundamentadora da decisão do TAD consta o seguinte:

“As declarações do presidente da S........ SAD denunciaram e expressaram como objetivo ver apreciadas pelos órgãos disciplinares competentes as (entretanto confirmadas) ofertas realizadas pela B........ SAD às equipas de arbitragem, aos observadores e aos delegados, em todos os jogos das competições nacionais que as suas equipas principal e B disputaram na condição de visitadas, de uma caixa contendo, entre outras coisas, quatro vouchers de refeição para cada um daqueles agentes desportivos.

Não obstante o suprarreferido, as expressões/afirmações proferidas não atingiram diretamente a vertente pessoal, ou seja, não denegaram aquele respeito de que toda a pessoa é credora por força da sua dignidade humana ou de entidade jurídica e socialmente reconhecida, como é o caso em apreço.

Acresce, que a motivação das sucessivas intervenções teve origem em factos comprovadamente fundamentados (oferta de presentes a agentes desportivos), e, portanto, suscetíveis de análise e crítica públicas, originando as sucessivas intervenções mediáticas.

Desta forma, não está em causa a emissão de nenhum juízo de valor sobre a honra e consideração da B........ SAD, ou ate o cerne da sua dignidade, pelo que, não se mostra quebrada, afrontada, desproporcionada e desnecessariamente, a harmonização prática da honra e bom nome, por um lado, e da liberdade de ex­pressão, por outro.

Aliás, o estilo repetitivo e exagerado das afirmações proferidas, faz parte de uma personalidade com uma conceção de urbanidade sui generis, eventualmente cen­surável no plano da vivência e da convivência social, mas não para além desse plano. Ê um comportamento censurável, eticamente, mas não ferido de ilegali­dade.

Assim, as declarações do presidente da S........ SAD originaram a instauração do Inquérito n.0 6-15/16, que, para além da finalidade de averiguar a relevância disciplinar das referidas ofertas, teve também por objeto, averiguar a eventual carga ofensiva das próprias declarações que as denunciaram.

O inquérito foi arquivado nessa parte pela CII; foi deduzida reclamação pela Ben-fica SAD, e o CD da FPF, confirmou o acerto da deliberação de arquivamento, tendo sucedido o mesmo no Pleno do CD da FPF.

Atente-se que, corno resulta das três decisões já proferidas, o desígnio subjacente às declarações públicas proferidas pelo presidente da S........ SAD, nunca terá sido o de difamar qualquer entidade ou agente desportivo, mas sim o de solicitar a apreciação de uma determinada conduta, pelas instâncias competentes para o efeito.

O presidente da S........ SAD limitou-se a denunciar publicamente uma situação que reputou de grave, por ser suscetível de colocar em causa princípios de ética desportiva, e evidenciou a necessidade de os órgãos competentes analisarem a si­tuação.

Estes factos foram assumidos como verdadeiros e foram confirmados (os essen­ciais, pelo menos) pela B........ SAD.

Além disso, não se pode impedir o livre exercício do direto de manifestar a opinião de que determinados factos — verdadeiros -- são eticamente reprováveis e pare­cem dever merecer censura disciplinar.

Contrariamente ao pretendido pela B........ SAD, o presidente da S........ SAD não manifestou nenhum juízo de valor sobre a B........ SAD. Quando muito, ex­pressou um juízo de valor sobre o procedimento adotado pela B........ SAD, o que é usual nestes "fóruns".

Desta forma, não se pode afirmar que a crítica dirigida ao comportamento que alguém, assumidamente teve, seja ofensivo da sua honra e reputação.

Aliás, conforme já referido, parece-nos que a crítica do presidente da S........ SAD, nunca se dirigiu à B........ SAD, mas ao comportamento em si mesmo, pelo que nunca colocou em causa a honra ou a reputação daquela — ou pelo menos não o fez de um modo intolerável, que excedesse os limites do direito à critica e invadisse o núcleo essencial dos direitos da B........ SAD.

Acresce que, quase toda a prova em que a B........ SAD fundamenta a sua pre­tensão, se fundamenta em meras noticias de jornais, cuja Fidedignidade não está garantida, não havendo registo imediato em discurso direto, das declarações proferidas que lhes dera origem, o que exige um cuidado redobrado na sua valoração.

Isto porque, nem sempre as publicações jornalísticas se pautam por critérios de rigor informativo e objetividade factual, e infelizmente, isso é recorrente no fu­tebol.

Mas as publicações jornalísticas são regularmente sensacionalistas e deturpam aquilo que foi dito, truncando discursos, parafraseando e exagerando, umas vezes de forma mais ou menos inocente, outras nem tanto, e com o nítido objetivo de tornar a notícia mais "atrativa", sendo suscetível de afetar o sentido global das declarações de qualquer pessoa. Tal sucede, principalmente nas publicações generalistas e desportivas.

Ora, o suprarreferido é suficiente para que não estejamos perante qualquer ilícito disciplinar, considerando-se que o presidente da S........ SAD se moveu nos li­mites ou de acordo com os parâmetros do direito de critica, no âmbito da liberdade de expressão que o ordenamento jurídico de uma sociedade democrática confere.

Portanto, somos da opinião que o CD decidiu bem, não merecendo o Acórdão qualquer censura quanto ao seu conteúdo.

Além disso, o Acórdão recorrido está devidamente fundamentado, não se verifi­cando a violação de nenhuma norma jurídica aplicável, tendo-se procedido à subsunção dos factos às normas de forma clara”.

A decisão recorrida não contém, pois, fundamentação de facto minimamente expressa e clara.

Não sabemos sobre que factos concretos o TAD se debruçou para os qualificar juridicamente, fazendo o respetivo enquadramento jurídico, nos termos imperativos e consabidos do silogismo judiciário.

Pelo que também não sabemos exatamente qual o juízo de direito que foi feito, já que este só adquire sentido racional quando reportado a factos concretos, que desconhecemos.

É, portanto, uma decisão deficiente e obscura quanto à sua fundamentação.

3.

Assim e ao abrigo do artigo 662º/2/c) do Código de Processo Civil, ex vi artigo 1º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (ex vi artigo 8º/2 da Lei reguladora do TAD), decide-se anular a decisão recorrida, não se conhecendo, por isso, do objeto deste recurso.

Custas a cargo dos contra-alegantes.

d.s.