Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:08060/14
Secção:CT- 2º JUÍZO
Data do Acordão:11/27/2014
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO.
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA.
ERRO DE JULGAMENTO DE FACTO.
IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE 1ª. INSTÂNCIA RELATIVA À MATÉRIA DE FACTO. ÓNUS DO RECORRENTE.
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA. PROVA TESTEMUNHAL.
EMBARGOS DE TERCEIRO.
REQUISITOS DE DEDUÇÃO NO PROCESSO TRIBUTÁRIO.
ÓNUS DA PROVA.
REGRAS DO REGISTO PREDIAL.
REGISTO AUTOMÓVEL. DEC.LEI 54/75, DE 12/2.
Sumário:1. Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).

2. Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas (cfr. artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6). Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação.

3. O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida.

4. No que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário). Tal ónus rigoroso ainda se pode considerar mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6.

5. Se a decisão do julgador, no que diz respeito à prova testemunhal produzida, estiver devidamente fundamentada e for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção.

6. No Código de Processo Civil, a partir do dec.lei 329-A/95, de 12/12, os embargos de terceiro deixaram de ter a natureza de processo especial, passando a ser configurados como modalidade do incidente de oposição, ampliando-se os pressupostos da sua admissibilidade, assim deixando de estar ligados, necessariamente, à defesa da posse do embargante. Isto é, face a este novo regime, o embargante, através dos embargos, além da posse, pode defender qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência judicial, que se traduza num acto de agressão patrimonial (cfr.artºs.351 e seg., do C.P.Civil; relatório constante do dec.lei 329-A/95, de 12/12).

7. Os requisitos da dedução dos embargos de terceiro, de acordo com a lei processual tributária, são os seguintes (cfr.artº.237, do C.P.P.Tributário):
a-A tempestividade da petição de embargos;
b-A qualidade de terceiro face ao processo de execução no âmbito do qual se verificou a diligência judicial ofensiva da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da mesma diligência;
c-A ofensa da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência judicial, que se traduza num acto de agressão patrimonial.

8. A prova de que o ora recorrente tinha a posse do móvel em data anterior à do registo da penhora cabe-lhe a ele, nos termos do disposto nos artºs.237, do C.P.P.T., 74, nº.1, da L.G.T., e 342, nº.1, do Código Civil, como facto constitutivo do direito a que se arroga.

9. Deve levar-se em consideração as regras do registo predial (cfr.artºs.2, nº.1, als.a) e n), e 5, nº.1, do C.R.Predial), tal como o disposto no artº.819, do C.Civil, normas que consagram a ineficácia face ao exequente dos actos de disposição ou oneração dos bens penhorados registados depois da mesma penhora. É que o registo, tendo em regra valor meramente declarativo, será indispensável quando as partes quiserem tornar eficaz o seu direito contra terceiros.

10. Especificamente, no que respeita ao registo automóvel, é a certidão de direitos ónus e encargos, emitida pela Conservatória do Registo Automóvel, nos termos do disposto no artº.112, nº.1, do Código do Registo Predial, "ex vi" do artº.29, do dec.lei 54/75, de 12/2, que faz a prova da existência de todas as inscrições em vigor à data em que é emitida a mesma e incidentes sobre a viatura em causa, sendo que, tanto a aquisição de propriedade, como a penhora incidentes sobre veículos automóveis constituem factos sujeitos a registo, nos termos do artº.5, do citado dec.lei 54/75, de 12/2.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
"W……. H………….. LIMITED - SUCURSAL EM PORTUGAL", com os demais sinais dos autos, deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmº. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls.126 a 133 do presente processo, através da qual julgou totalmente improcedentes os embargos de terceiro deduzidos pelo recorrente opondo-se a penhora de móvel levada a efeito no âmbito da execução fiscal nº……………… e apensos, a qual corre seus termos no 8º. Serviço de Finanças de Lisboa.
X
O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.156 a 179 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:
1-Conforme resultou provado os PEF's em causa reportam-se a dívidas de entidade diversa da recorrente, e em 31/10/2006 foi penhorado o veículo de passageiros de marca MERCEDES-BENZ - Cilindrada: 3199 cc Matrícula ……….. (Penhora ……..), sendo que, sobre a mesma viatura foi emitido certificado de matrícula em nome Winners Holdings Limited Sucursal em Portugal;
2-O veículo pertence, efectivamente, à recorrente, tendo sido, todavia, apreendido pela Polícia de Segurança Pública - Comando Metropolitano de Lisboa - Divisão de Trânsito - Brigada de Prevenção Criminal em 15/04/2012, após o que, tendo tomado conhecimento do acto que ofende a sua posse a Recorrente procurou proteger-se, tendo, para tanto, intentado os presentes embargos;
3-A recorrente adquiriu o bem penhorado "in casu", à executada, utilizando e dispondo do bem, em conformidade com a qualidade que assumiu, isto é, proprietária e possuidora do referido bem, e desde o momento da aquisição passado exclusivamente a recorrente a utilizar o bem para a sua exclusiva actividade social, tendo realizado o registo;
4-A recorrente é a única e exclusiva proprietária do automóvel, suportando todos os encargos gerados pelo mesmo;
5-A diligência de penhora e, eventual, venda judicial do bem móvel ofende a posse e propriedade da embargante, ora recorrente;
6-Laborou em erro o Tribunal "a quo" ao considerar, como factos não provados que: "Dos autos não resulta provados os factos enunciados nos pontos 1º a 4º e 6º, 7º, 12º, da petição inicial", salvo melhor entendimento, a alegação da recorrente foi provada quer por prova documental, quer por prova testemunhal produzida em audiência;
7-As testemunhas arroladas, inquiridas que foram na referida audiência, declararam ter conhecimento dos factos, tal como foram alegados pelo recorrente;
8-A testemunha José ……………….. declarou que foi o próprio quem efectuou o registo, tendo promovido o registo de titularidade da recorrente, após 2002;
9-Facto que foi fortificado pela Testemunha Manuel ………………, que inquirido, declarou ter conhecimento dos factos por ter sido presidente da executada, tendo o mesmo declarado que o automóvel em apreço é propriedade da recorrente, o que ocorreu na sequência das partilhas;
10-A testemunha Elsa ……., inquirida, declarou ter conhecimento dos factos, sendo que, a mesma na qualidade de Técnica administrativa recepcionava e abria a correspondência, tendo por esta via tomado conhecimento e transmitido a informação referente à penhora do automóvel;
11-As declarações das testemunhas supra indicadas aliada à prova documental junta aos lautos corrobora in totum a alegação do recorrente, razão pela qual, ocorreu uma errónea e insuficiente valoração da prova pelo Tribunal "a quo", ao dar como não provados os factos supra mencionados;
12-A isenção das testemunhas não se mostrou prejudicada, releve-se que, a primeira testemunha, José …….., declarou ter sido o próprio a promover o registo, em consonância com o declarado pela testemunha Manuel ………., que por sua vez, indicou como razão de ciência dos factos sub judice, a circunstância de ter sido presidente da executada;
13-Considerando tal facto não se afigura demonstrada a prejudicialidade da isenção das testemunhas, pois que, na verdade até pela natureza da forma de processo, embargos de terceiro, desde logo, se afigura previsível que haja relação entre embargante e executada, pois que, em algum momento estas tiveram de ter um encontro de vontades, o que ocorreu in casu pela transmissão da viatura da esfera da executada para a esfera da embargante;
14-A lei confere a possibilidade de defesa dos direitos da embargante quando esta, como é, seja terceira à relação processual/creditícia principal, o que ocorre, referiu a testemunha Manuel ……….., previamente à execução ocorreu um procedimento de partilha, mediante o qual, o automóvel saiu da esfera patrimonial da executada;
15-Ora, as testemunhas não revelaram em qualquer momento que houvesse simultaneidade na gestão de embargante e executada, na verdade, houve sim, um momento de partilha de bens, pelo qual, conforme declaração das duas primeiras testemunhas houve transmissão do veículo automóvel;
16-E, atento o volume de negócios da executada, a transmissão de bens referentes à transmissão de um automóvel sequer pode ser considerado um acto de relevo, nem de redução patrimonial significativa da executada;
17-Ora, nesta senda, não poderia o Tribunal ter concluído como concluiu, pela falta de isenção do testemunho carreado aos autos, pois que, o que aconteceu foi que, tendo a testemunha sido administrador da executada, mercê da cessação de tal relação, ocorreu uma partilha, pela qual, este adquiriu um veículo automóvel - facto que, não se afigura despiciendo, nem injustificado, o que, por ser verdade, veio a ser corroborado pelo presidente da executada, Exmo. Senhor Manuel ……………;
18-Assim, será forçoso reconhecer que mercê da prova documental, bem como, da prova testemunhal e ainda dos factos provados supra resulta que, no tangente aos factos, efectivamente, a recorrente adquiriu o automóvel, aquisição anterior às diligencias de penhora da embargada, tendo a referida aquisição recebido a competente publicidade legal, como facto sujeito a registo que é, razão que, consubstancia o núcleo duro dos requisitos e pressupostos para dedução de embargos pela mesma, na sequência dos actos de penhora do SF, para cobrança de dívidas do proprietário originário, executado naqueles autos;
19-E nesta medida, se alegaram os factos, bem como, decorreu a prova produzida, pelo que, nesta senda deve o Tribunal "ad quem" rectificar o dispositivo decisório em conformidade com a verificação positiva e concomitante dos pressupostos para decretamento dos embargos, que pugnamos existirem no caso vertente;
20-Os embargos são tempestivos, dispõe o artº.237º, nº3 do CPPT que os embargos de terceiro devem ser deduzidos no prazo de 30 dias contados desde o momento em que foi praticado o acto ofensivo da posse ou direito a recorrente teve conhecimento da penhora em 15/04/2012, data da apreensão do veículo, os embargos foram deduzidos em 24/04/20123, o que a Fazenda Publica, não contestou - termos em que, se deu este requisito por verificado;
21-Quanto ao requisito de qualidade de terceiro, a embargante ostenta a exigida qualidade de terceiro, porquanto nos autos de execução onde foi efectuada a penhora figuram como partes a Fazenda Pública (Exequente) e, R. M. Hotelaria ……….. SA., (Executada), não sendo feita qualquer referência à aqui embargante;
22-Quanto aos requisitos do Acto Ofensivo considerou o Tribunal "a quo" o não oferece dúvidas que o acto ofensivo da posse e dos direitos de propriedade invocados pela embargante, consubstanciada na penhora do veículo automóvel é passível, em abstracto, de causar a lesão de tais direitos -"Termos em que se dá este requisito por preenchido.";
23-E considerando tal facto provado, bem como, o preenchimento deste requisito não entendemos o fundamento do indeferimento dos embargos constante da decisão recorrida, pois que declarado este requisito nos termos e fundamentos em que está não pode o recorrente conformar-se com o teor do mesmo;
24-Sendo que, a final, conclui o Tribunal "a quo" pela apreciação nos termos seguintes: «Na situação sub judice, a embargante vem alegar direito de propriedade sobre o bem penhorado, por haver adquirido o veículo à empresa executada antes da sua apreensão pelas entidades competentes. Mas não logra apresentar qualquer prova do alegado.» - por tudo quanto deixámos supra exposto não pode colher a conclusão supra referida, tenhamos presente que todos pressupostos supra elencados estão verificados;
25-Tendo, todavia, o Tribunal "a quo" considerado que não ficou provado, apenas que, "direito de propriedade sobre o bem penhorado, por haver adquirido o veículo à empresa executada antes da sua apreensão pelas entidades competentes», sendo que, não se alcança o sentido com que este facto não tenha ficado provado quando, supra se decidiu provados os requisitos do acto ofensivo e a penhora como acto ofensivo da posse ou direito equiparado;
26-E provados que foram estes últimos, não se alcança com que sentido poderá o Tribunal "a quo" ter entendido não termos logrado provar o primeiro supra indicado, pugnamos assim que, efectivamente, estão verificados os pressupostos necessários ao decretamento dos embargos requeridos, pois que, a decisão judicial proferida nos presentes autos ofende a posse e propriedade do bem móvel da embargante, ora recorrente que se encontra penhorado, cfr. Arts. 237 do CPPT e 351 e 359 do C.P.C e 819 do Cód. Civil;
27-A recorrente detém a posse de forma pacífica, titulada, de boa fé, pública e ininterrupta, cfr. art. 1253 do Cód. Civil, aplicável ex vi art. 351 do CPC, do automóvel;
28-A recorrente detém a posse constituída e titulada do bem móvel que se traduz pelos elementos objectivo e subjectivo (corpus e animus) que, fundamentam os presentes embargos de terceiro, cfr. arts. 351 do CPC e 1253 do Cód. Civil, a qual se mostra ofendida pela diligência judicial de penhora e venda judicial do imóvel, ofende a posse real e efectiva (corpus e animus) da ora embargante, cfr. disposto nos arts. 237 do CPPT e 351 do CPC e 1253 do Cód. Civil;
29-Conforme resultou das declarações das testemunhas foi promovido o registo de titularidade da recorrente, após 2002, sendo que, a partir desta data, a viatura saiu da esfera patrimonial da executada, tendo numa primeira fase pertencido ao Sr. José Folque de Mendonça e posteriormente à ora embargante e recorrente, pelo que, desde 2002 que o mesmo saiu da esfera patrimonial e possessória da executada;
30-Ademais, releve-se que in casu o Tribunal "a quo", conforme supra explanado e respectiva transcrição da sentença, julgou os embargos tempestivos, isto porque, desde a data do conhecimento pela embargante, sobre as diligências ofensivas do seu direito e a dedução dos mesmos decorreu nada mais, nada menos do que o prazo peremptório para a pratica do acto, menos aliás, sendo que, tal prazo se qualifica como prazo de caducidade, findo o qual, caduca o direito de exercício do direito;
31-Pelo que, suscitamos nos termos e para todos os efeitos legais que tendo o Tribunal "a quo" considerado provados todos os requisitos conforme consta da sentença, não se entende em que medida faz soçobrar o pedido por via do não reconhecimento da propriedade anterior;
32-Os embargos visam proteger que dispõe, usufrui e frui do bem detendo sobre o mesmo uma posse um conjunto de poderes e/ou faculdades materiais de disposição, in casu, reportando-se o bem sob sindicância a uma viatura, a verdade é que o recorrente detém, desde 2002, a posse do mesmo, tal como detém a propriedade, tanto mais que, resultou provada inclusivamente a alteração do registo;
33-Tal posse corporiza-se pela utilização do automóvel, desde 2002, pela posse dos documentos, pagamento dos tributos advenientes da circulação rodoviária, pagamento das despesas necessárias à respectiva circulação, posse dos documentos, entre outras;
34-E assim, os embargos de terceiro constituem meios de defesa e tutela da posse ameaçada ou violada e desempenham essa função no caso particular de a ameaça ou ofensa da posse provem de diligência judicial, circunstância plenamente verificada no caso sub judice;
35-E tal facto verifica-se por qualquer das teses doutrinariamente construídas para apreciação da tutela possessória, ou seja, considerando o pendor mais objectivista, existe in casu o poder de facto sobre a coisa - o corpus do direito romano, bem como, existe o elemento subjectivo, a actuação sobre a coisa com a intenção de se apropriar dela, com intenção de domínio, i.e., com animus;
36-Pelo que, a noção de posse constante do artigo 1251 do Código Civil e o artigo 1253, alínea a) do Código Civil expressamente exige o animus para que a situação se qualifique como posse e não como mera detenção, e este animus existe, tanto existe que do mesmo efectivamente resultou a propriedade registada;
37-A verdade é que a prova do animus in casu não pode senão resultar verificada, mercê da concludência dos actos materiais praticados pelo recorrente e pela averiguação da vontade concreta - artigo 1263, alíneas a) e d) do Código Civil, vontade essa tão concreta que se efectivou pela publicidade do acto, mediante registo;
38-In casu ocorreu um negócio jurídico translativo adequado à transmissão do direito correspondente, como de resto, referiu o próprio presidente da executada que mencionou que a viatura foi transmitida por via da partilha, isto é, a transacção ocorreu, de facto, muito além da intenção, tendo a executada transmitido a posse pela cedência do bem (artigo 1267, nº1, alínea c) do Código Civil) e a concomitante vontade do possuidor actual, recorrente, de agir como titular do direito real correspondente - o que acontece in casu;
39-Nestes termos e no mais de Direito que Vossas Excelências doutamente suprirão, deve a sentença recorrida, ser revogada e substituída por outra, que decrete os embargos, oportunamente, deduzidos, e ordene o cancelamento da penhora do bem indicado, bem com a devolução do mesmo à recorrente, assim se fazendo tão costumada justiça.
X
Não foram apresentadas contra-alegações.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do não provimento do presente recurso (cfr.fls.193 e 194 dos autos).
X
Com dispensa de vistos legais, atenta a simplicidade das questões a dirimir, vêm os autos à conferência para decisão.
X
FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.127 a 129 dos autos - numeração nossa):
1-O 8º. Serviço de Finanças de Lisboa instaurou, em 17/11/2004, contra "R. M. ………. S.A.", com sede na Av. ………. 56 1° Lisboa, o processo de execução fiscal (PEF) sob o número ………., para cobrança coerciva de dívidas de Coimas, no montante de € 19.341,50 (cfr.documentos juntos a fls.1 e 2 do processo de execução apenso);
2-Aos autos de execução supra identificados foram associados os seguintes:

Nº. do Processo
Data da instauração
Proveniência
Qtia Exequenda
……………………….16/09/2003 IVA 2002 196,86
………………………. 16/09/2003 IVA 2002 84.207,43
……………………….19/10/2002 IVA 2003 12.765,57
……………………….08/01/2004 IVA 2003 21.269,38
………………………. 09/05/2004 IVA 2003 11.866,27
……………………….05/10/2005 IVA 2003 161.814,25
(cfr.informação exarada a fls.27 a 30 dos presentes autos);

3-Em 31/10/2006 foi, no âmbito dos autos de execução supra enunciados, penhorado o veículo de passageiros de marca MERCEDES-BENZ - Cilindrada: 3199 cc Matrícula ……… - penhora ……… (cfr.informação exarada a fls.27 a 30 dos presentes autos; documentos juntos a fls.75 e 76 dos presentes autos);
4-A penhora foi registada na Conservatória do Registo Automóvel de Lisboa pela apresentação …….de 12/09/2006, para garantia da divida de € 335.744,84 (cfr. informação exarada a fls.27 a 30 dos presentes autos; documentos juntos a fls.75 e 76 dos presentes autos);
5-Em 26/06/2009, foi emitido certificado de matrícula do veículo identificado no nº.3, deste probatório em nome de "W……… H……… Limited - Sucursal em Portugal" (cfr.documento junto a fls.22 e 22-verso dos presentes autos);
6-O veículo foi apreendido pela Polícia de Segurança Publica - Comando Metropolitano de Lisboa - Divisão de Trânsito - Brigada de Prevenção Criminal em 15/04/2012 a João ……………. (cfr.documento junto a fls.21 dos presentes autos);
7-Os presentes autos de embargos foram deduzidos em 24/04/2012 (cfr.data de envio de fax aposta a fls.3 dos presentes autos).
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Dos autos não resulta provados os factos enunciados nos pontos 1.° a 4.°, 6.°, 7.° e 12.°, da petição inicial. Não se provaram outros factos passíveis de afectar a decisão de mérito, e que, por conseguinte, importe registar como não provados…”.
X
Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…No tocante aos factos provados e não provados, a convicção do Tribunal formou-se com base na prova documental, em concreto na análise crítica do teor dos documentos indicados em cada um dos pontos supra.
Foi também de importância relevante, a prova testemunhal produzida tendo os depoimentos dado a conhecer a existência de relações especiais entre as empresas aqui envolvidas, que foram ali qualificadas como sendo "um grupo ligado por interesses familiares".
As testemunhas revelaram deter relações laborais (passadas e/ou presentes) com ambas as sociedades (Embargante e Executada), situação que lhes ministra ou é susceptível de ministrar interesse e que compromete a isenção dos testemunhos.
As declarações prestadas revelaram grande falta de independência funcional e material quer entre as empresas (Embargante e Executada), quer entre aquelas e os seus administradores.
Releva neste aspeto o depoimento da 1° testemunha, José ………………………, que disse ser acionista da Embargante e ter sido Administrador da Executada e, quanto ao veículo aqui em conflito, afirmou que: "o veículo é 'seu' mas que o pôs em nome da 'sua empresa' – W…………. H……….. Limited - por volta de 2002, data em que, por ocorrências pessoais teve necessidade de pôr todos os seus bens em nome da Embargante" - conforme consta da razão de ciência (fls.107 dos autos)…”.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou totalmente improcedentes os embargos objecto dos presentes autos, tudo em virtude dos actos de disposição ou oneração do bem penhorado serem ineficazes em relação ao exequente, porquanto a penhora foi registada antes da aquisição do direito invocado pelo embargante.
X
Antes de mais, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artºs.639, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O recorrente dissente do julgado alegando, em primeiro lugar e em síntese, que laborou em erro o Tribunal "a quo" ao considerar, como factos não provados a factualidade enunciada nos artºs.1 a 4, 6, 7 e 12 da petição inicial, visto que tal matéria foi provada quer por prova documental, quer por prova testemunhal produzida em audiência. Que as testemunhas arroladas e inquiridas que foram na referida audiência, declararam ter conhecimento dos factos, tal como foram alegados pelo recorrente. Que não poderia o Tribunal "a quo" ter concluído como concluiu, pela falta de isenção da prova testemunhal produzida nos autos (cfr.conclusões 6 a 18 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo consubstanciar um erro de julgamento de facto da sentença recorrida.
Dissequemos se a decisão recorrida padece de tal vício.
Segundo o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal baseia a sua decisão, em relação às provas produzidas, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei (v.g.força probatória plena dos documentos autênticos - cfr.artº.371, do C.Civil) é que não domina na apreciação das provas produzidas o princípio da livre apreciação (cfr.artº.607, nº.5, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, IV, Coimbra Editora, 1987, pág.566 e seg.; Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.660 e seg.).
Relativamente à matéria de facto, o juiz não tem o dever de pronúncia sobre toda a matéria alegada, tendo antes o dever de seleccionar apenas a que interessa para a decisão, levando em consideração a causa (ou causas) de pedir que fundamenta o pedido formulado pelo autor (cfr.artºs.596, nº.1 e 607, nºs.2 a 4, do C.P.Civil, na redacção da Lei 41/2013, de 26/6) e consignar se a considera provada ou não provada (cfr.artº.123, nº.2, do C.P.P.Tributário).
O erro de julgamento de facto ocorre quando o juiz decide mal ou contra os factos apurados. Por outras palavras, tal erro é aquele que respeita a qualquer elemento ou característica da situação “sub judice” que não revista natureza jurídica. O erro de julgamento, de direito ou de facto, somente pode ser banido pela via do recurso e, verificando-se, tem por consequência a revogação da decisão recorrida. A decisão é errada ou por padecer de “error in procedendo”, quando se infringe qualquer norma processual disciplinadora dos diversos actos processuais que integram o procedimento aplicável, ou de “error in iudicando”, quando se viola uma norma de direito substantivo ou um critério de julgamento, nomeadamente quando se escolhe indevidamente a norma aplicável ou se procede à interpretação e aplicação incorrectas da norma reguladora do caso ajuizado. A decisão é injusta quando resulta de uma inapropriada valoração das provas, da fixação imprecisa dos factos relevantes, da referência inexacta dos factos ao direito e sempre que o julgador, no âmbito do mérito do julgamento, utiliza abusivamente os poderes discricionários, mais ou menos amplos, que lhe são confiados (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/6/2013, proc.5618/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 10/4/2014, proc.7396/14; Prof. Alberto dos Reis, C.P.Civil anotado, V, Coimbra Editora, 1984, pág.130; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, Almedina, 9ª. edição, 2009, pág.72).
Ainda no que diz respeito à disciplina da impugnação da decisão de 1ª. Instância relativa à matéria de facto, a lei processual civil impõe ao recorrente um ónus rigoroso, cujo incumprimento implica a imediata rejeição do recurso, quanto ao fundamento em causa. Ele tem de especificar, obrigatoriamente, na alegação de recurso, não só os pontos de facto que considera incorrectamente julgados, mas também os concretos meios probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida (cfr.artº.685-B, nº.1, do C.P.Civil, “ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário; José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.61 e 62; Fernando Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª. edição, Almedina, 2009, pág.181; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 20/12/2012, proc.4855/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/7/2013, proc.6505/13).
Tal ónus rigoroso deve considerar-se mais vincado no actual artº.640, nº.1, do C.P.Civil, na redacção resultante da Lei 41/2013, de 26/6 (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 31/10/2013, proc.6531/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 14/11/2013, proc.5555/12; ac.T.C.A. Sul-2ª.Secção, 27/02/2014, proc.7205/13).
No caso concreto, não pode deixar de estar votado ao insucesso o fundamento do recurso em análise devido a manifesta falta de cumprimento do ónus mencionado supra, desde logo, quanto aos concretos meios probatórios (tanto relativos à prova testemunhal como à prova documental), constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizadas, que, em sua opinião, impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da adoptada pela decisão recorrida.
Por outro lado, no que concretamente diz respeito à produção de prova testemunhal, refira-se que se a decisão do julgador estiver devidamente fundamentada e for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser proferida em obediência à lei que impõe o julgamento segundo a livre convicção (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/4/2013, proc.6280/12; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 7/5/2013, proc.6418/13; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 2/7/2013, proc.6505/13).
Concluindo, este Tribunal não tem obrigação de conhecer do presente esteio da apelação.
O apelante aduz, igualmente e em síntese, que detém a posse de forma pacífica, titulada, de boa fé, pública e ininterrupta do automóvel penhorado. Que estão verificados os pressupostos necessários ao decretamento dos embargos de terceiro requeridos. Que a sentença recorrida deve ser revogada e substituída por outra que decrete os embargos (cfr.conclusões 19 a 38 do recurso), com base em tal alegação pretendendo consubstanciar erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
Deslindemos se a decisão recorrida comporta tal pecha.
A essência dos direitos relacionados com as coisas - dos direitos reais de gozo e de alguns direitos reais de garantia e direitos pessoais - consiste na faculdade de sobre elas exercer poderes de retenção, de uso, de fruição e de transformação. Todos estes direitos têm por finalidade a utilização económica das coisas, das vantagens que das coisas se podem obter, sendo pelo exercício daqueles poderes que a utilização se realiza (cfr.Manuel Rodrigues, A Posse, Estudo de Direito Civil Português, 4ª.edição prefaciada por Fernando Luso Soares, Almedina, 1996, pág.7).
Nos termos da lei civil substantiva o possuidor que veja a sua posse sobre determinada coisa ofendida por diligência ordenada judicialmente pode defender a mesma mediante a proposição de embargos de terceiro (cfr.artº.1285, do C.Civil).
A posse pode ser definida como o poder que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real (cfr.artº.1251, do C.Civil), tendo como elementos constitutivos uma componente objectiva ou material (“corpus”) e outra subjectiva ou intencional (“animus”), de acordo com a melhor doutrina, assim se consagrando a concepção subjectivista do referido instituto (cfr.artº.1253, al.a), do C.Civil; Manuel Rodrigues, A Posse, Estudo de Direito Civil Português, 4ª.edição prefaciada por Fernando Luso Soares, Almedina, 1996, pág.88 e seg.; Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil anotado, Coimbra Editora, 2ª. edição, 1987, III, pág.5). Portanto, para que exista posse é necessário alguma coisa mais do que o simples poder de facto exercido sobre a coisa; tem que haver, por parte do detentor, a intenção (“animus”) de exercer, como seu titular, um direito real sobre a coisa. E só esta, a posse efectiva e causal, que se traduz pelos mencionados elementos objectivo e subjectivo, pode fundamentar, regra geral, os embargos de terceiro (cfr.ac.S.T.J., 28/11/75, B.M.J.251, pág.135; ac.R.Lisboa, 18/4/91, C.J., 1991, II, pág.180; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/6/2012, proc.5181/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 30/4/2013, proc.6544/13; Alberto dos Reis, Processos Especiais, I, Coimbra Editora, 1982, pág.406; Jorge Duarte Pinheiro, Fase Introdutória dos Embargos de Terceiro, Almedina, 1992, pág.39; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.164).
No Código de Processo Civil, a partir da reforma operada pelo dec.lei 329-A/95, de 12/12, os embargos de terceiro deixaram de ter a natureza de processo especial, passando a ser configurados como modalidade do incidente de oposição, ampliando-se os pressupostos da sua admissibilidade, assim deixando de estar ligados, necessariamente, à defesa da posse do embargante. Isto é, face a este novo regime, o embargante, através dos embargos, além da posse, pode defender qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência judicial, que se traduza num acto de agressão patrimonial (cfr.artºs.351 e seg., do C.P.Civil; relatório constante do dec.lei 329-A/95, de 12/12; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.165).
Os requisitos da dedução dos embargos de terceiro, de acordo com a lei processual tributária, são os seguintes (cfr.artº.237, do C.P.P.Tributário; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 18/1/95, rec.18307, ap.D.R., 31/7/97, pág.175 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 12/6/2012, proc.5181/11; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 30/4/2013, proc.6544/13; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.670 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, III volume, Áreas Editora, 6ª. edição, 2011, pág.155 e seg.):
1-A tempestividade da petição de embargos;
2-A qualidade de terceiro face ao processo de execução no âmbito do qual se verificou a diligência judicial ofensiva da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da mesma diligência;
3-A ofensa da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência judicial, que se traduza num acto de agressão patrimonial.
No processo vertente é o exame do terceiro requisito que está em causa.
Deve o embargante fazer prova de que a diligência judicial em causa ofendeu a sua posse. Remetendo para as considerações acima expendidas, só a posse efectiva e causal, que se traduz pelos mencionados elementos objectivo e subjectivo (“corpus” e “animus”), pode fundamentar, regra geral, os embargos de terceiro. Por outro lado, a posse há-de ser anterior à diligência contra a qual se reage, mais se devendo chamar à colação as regras do registo.
E recorde-se que a prova de que o ora recorrente tinha a posse do veículo em data anterior à do registo da penhora cabe-lhe a ele, nos termos do disposto nos artºs.237, do C.P.P.T., 74, nº.1, da L.G.T., e 342, nº.1, do Código Civil, como facto constitutivo do direito a que se arroga.
Neste aspecto, deve levar-se em consideração as regras do registo predial (cfr.artºs.2, nº.1, als.a) e n), e 5, nº.1, do C.R.Predial), tal como o disposto no artº.819, do C.Civil, normas que consagram a ineficácia face ao exequente dos actos de disposição ou oneração dos bens penhorados registados depois da mesma penhora. É que o registo, tendo em regra valor meramente declarativo, será indispensável quando as partes quiserem tornar eficaz o seu direito contra terceiros (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 24/1/2012, proc.4657/11; J. A. Mouteira Guerreiro, Noções de Direito Registral, Coimbra Editora, 1993, pág.64).
Especificamente, no que respeita ao registo automóvel, é a certidão de direitos ónus e encargos, emitida pela Conservatória do Registo Automóvel, nos termos do disposto no artº.112, nº.1, do Código do Registo Predial, "ex vi" do artº.29, do dec.lei 54/75, de 12/2, que faz a prova da existência de todas as inscrições em vigor à data em que é emitida a mesma e incidentes sobre a viatura em causa, sendo que, tanto a aquisição de propriedade, como a penhora incidentes sobre veículos automóveis constituem factos sujeitos a registo, nos termos do artº.5, do citado dec.lei 54/75, de 12/2 (cfr.ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 8/6/2010, proc.3945/10).
Revertendo ao caso dos autos, devem os presentes embargos considerar-se improcedentes devido às regras do registo, desde logo porque a alegada data de aquisição da propriedade da viatura em causa (com a matrícula 48-16-FC) é manifestamente posterior à data do registo da penhora visada pelos presentes embargos (cfr.nºs.3 a 5 da matéria de facto provada).
Em conclusão, não fez o recorrente prova da ofensa da posse ou de qualquer outro direito incompatível com a realização ou o âmbito da diligência judicial de penhora levada a efeito no espaço da execução fiscal nº……………………… e apensos, que se traduza num acto de agressão patrimonial e seja susceptível de defesa através de embargos de terceiro, assim se devendo confirmar a decisão do Tribunal "a quo".
Atento o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, julga-se improcedente o recurso deduzido e confirma-se a decisão recorrida, ao que se provirá na parte dispositiva do presente acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA que, em consequência, se mantém na ordem jurídica.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
X
Lisboa, 27 de Novembro de 2014



(Joaquim Condesso - Relator)

(Catarina Almeida e Sousa - 1º. Adjunto)


(Bárbara Tavares Teles - 2º. Adjunto)