Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:02329/07
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:11/24/2016
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:CONTRATO DE PROVIMENTO.- ADMISSIBILIDADE DA JUNÇÃO DE DOCUMENTOS NA FASE DE RECURSO. AMPLIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO. CADUCIDADE DO CONTRATO. OMISSÃO DE PRONÚNCIA.
Sumário:I)- Em fase de recurso, a lei processual civil (cfr.artºs.524 e 693-B, do C.P.Civil), somente possibilita a junção de documentos ao processo, sempre e só com as alegações (ou contra-alegações) e, no que diz respeito à hipótese de junção de documentos quando esta se torne necessária em virtude do julgamento efectuado em 1ª Instância, o advérbio “apenas”, usado no artº.693-B, do C. P. Civil, significa que a junção só é possível se a necessidade do documento era imprevisível antes de proferida a decisão na 1ª Instância, isto é, se a decisão da 1ª Instância criar, pela primeira vez, a necessidade de junção de determinado documento. A lei quis manifestamente cingir-se aos casos em que, pela fundamentação da sentença ou pelo objecto da condenação, se tornou necessário provar factos com cuja relevância a parte não podia razoavelmente contar antes de a decisão da 1ª. Instância ser proferida.

II) - Todavia, pode entender-se que, em vista da descoberta da verdade material que está legitimada tal junção com a própria fundamentação da sentença exarada na 1ª. Instância e, visto que o tribunal ad quem frui de ampla margem de apreciação ao ponto de poder anular a sentença para ampliar a matéria de facto e/ou renovar os meios de prova, ser-lhe-á lícito determinar a manutenção nos autos dos ditos documentos. Mas não procede a alegação do recorrente, de que os documentos juntos com as alegações de recurso visavam esclarecer as dúvidas com que a Tribunal “a quo” ficou quanto à caducidade do contrato de provimento na medida em que os documentos já juntos aos autos eram bastantes para apreciar tal questão, sendo, por isso, a junção dos documentos apresentados com as alegações e com as contra-alegações impertinentes e desnecessários, não devendo ser admitidos e devendo tributar-se os apresentantes pelo incidente gerado.

III).- Sendo a situação do Autor no que ao prazo de validade do contrato respeita, regulada pelo regime jurídico instituído pelo DL n° 219/92, de 15.10, nos termos do qual os assistentes de investigação são providos por contrato sexenal, prorrogável por um biénio (cfr art 12°, n° 1 DL n° 219/92, de 15.10 e art 62° do DL n° 124/99, de 20.4).a prorrogação para ser autorizada carecia de proposta fundamentada do organismo de investigação, ouvido o orientador, desde que o assistente de investigação tenha apresentado em fase adiantada de realização o trabalho de investigação (cfr art 12°, n° 2).

IV).- Caso fossem requeridas as provas de acesso à categoria de investigador auxiliar, o contrato era prorrogado até à realização das mesmas (cfr art 12°, n° 3) e, assim, da conjugação do art 16°, n° 2 e n° 3 do DL n° 427/89, de 7.12 com o art 12°, n° 1, n° 2 e n° 3 do DL n° 219/92, de 15.10, resulta que o contrato administrativo de provimento caducará automaticamente com o termo do período de duração máximo do contrato, de oito anos ou, se requeridas, até à realização das provas de acesso à categoria de investigador auxiliar.

V). - Pelo que, no caso, aplicando o disposto na lei à situação concreta, o contrato de provimento do Autor, com início em 4.4.1987, tendo sido prorrogado em 18.7.1995, tinha como termo o dia 18.7.1997, o que ocorreu por o Autor não ter requerido a realização das provas de acesso à categoria de investigador auxiliar.

VI).- Face à actuação da Administração em não lhe nomear um orientador, no decurso do contrato, atenta a data em que ocorreu (de 4.4.1987 a 18.7.1997), o Autor podia ter requerido a designação de um orientador e, se a Administração nada decidisse sobre o requerido no prazo legal, poderia e deveria presumir indeferido tacitamente o pedido, para assim dispor de um instrumento que lhe permitisse aceder à impugnação contenciosa correspondente (art 109° do Código de Procedimento Administrativo e art 28°, n°1, al. d), da LPTA). Em alternativa, o Autor podia ter denunciado ou rescindido o contrato, que era limitado no tempo (cfr art 30° do DL n° 427/89, de 7.12).

VII).- Não tendo lançado mão de qualquer dos mencionados mecanismos, administrativo e contencioso, o efeito do decurso do prazo do contrato em análise, nos termos da lei, só podia ter sido o da caducidade.

VIII).- O vício de omissão de pronúncia, nos termos em que o mesmo se encontra legalmente previsto e tem vindo a ser jurisprudencial e doutrinalmente conformado tem que traduzir-se, para se julgar verificado, numa violação pelo decisor do poder-dever a que está estritamente vinculado de conhecer de todas as questões que lhe sejam submetidas pelas partes, com excepção, apenas, daquelas que sejam de conhecimento oficioso ou que vejam a respectiva solução prejudicada pela que haja sido dada a outra ou outras entretanto apreciadas.

IX). - Embora numa ordem lógica se devesse conhecer em primeiro lugar deste vício, cuja verificação imporia a declaração de nulidade da sentença e a reapreciação do fundo da causa, inverteu-se essa ordem já que a solução jurídica de fundo, porque merece confirmação nos termos supra expostos, traz implicante a irrelevância do conhecimento da nulidade decisória não havendo, pois, necessidade e utilidade em conhecer dessa temática, tanto mais que para “…a efectivação do direito de acesso à justiça, as normas processuais devem ser interpretadas no sentido de promover a emissão de pronúncias sobre o mérito das pretensões formuladas” (cfr. artº 7º do CPTA).

X).- E, se é certo que da al. b), do n°1, do artigo 471° do Código de Processo Civil (redacção ao tempo),resulta ser lícito às partes formular pedidos genéricos ou ilíquidos, por não ser ainda possível determinar o montante indemnizatório ou a efectiva extensão dos prejuízos, para que assim suceda era condição sine qua non o preenchimento dos pressupostos de que depende a obrigação do Recorrido em indemnizar o Recorrente

XI). - Uma vez que tal não ocorre no caso concreto, desde logo porque a caducidade operou nos termos legais e, depois, porque o Recorrente, como era seu ónus, não logrou demonstrar que se verificavam os demais requisitos da responsabilidade civil extracontratual por factos ou actos omissos ilícitos, motivo bastante e suficiente para que tivesse improcedido, como de facto e muito bem, improcedeu o alegado pedido indemnizatório, o que vale por dizer que, afinal, a julgador conheceu de todas as questões que lhe foram submetidas pelas partes, sendo certo que, a nosso ver, a respectiva solução sempre estaria prejudicada pela que foi dada a outra ou outras entretanto apreciadas.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA 1ª SECÇÃO DO 2º JUÍZO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL


I- RELATÓRIO

MÁRIO ……………………., vem recorrer para este Tribunal Central Administrativo, da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que julgou improcedente a acção que ali instaurou contra o Instituto Nacional de Engenharia, Inovação e Tecnologia.

Nas alegações que apresentou formulou as seguintes conclusões:

“a) Foi julgada como processualmente adquirida matéria efectivamente controvertida, sobre a qual deveria pois ter sido propiciada a produção de prova adicional;
b) Similarmente, quanto à matéria de facto que se desconsiderou, por se ter decidido não poder ser apurada face aos documentos constantes dos autos, devia ter sido possibilitada a sua averiguação por outras formas;
c) Foi pois infringida a regra do art. 510º/1, b) do Cód. de Proc. Civil e, em consequência, os subsequentes preceitos desse Código que pressupunham que o processo prosseguisse, como devia, para produção de prova;
d) É inaceitável a interpretação mecanicista das regras sobre contagem do tempo de duração de um contrato como o ajuizado, tendo de necessariamente relevar a impossibilidade de cumprimento de obrigações de um contraente por motivo imputável ao outro;
e) Da mesma forma que têm de relevar períodos de suspensão, total ou parcial, aceites, ou co-decididos (caso de uma nomeação como dirigente), pelo contraente público;
f) Tendo sido assim efectuada errónea interpretação das pertinentes regras do Dec. Lei nº219/92.
g) Por último, julga-se que a douta sentença não considerou o exacto pedido subsidiário que a final se formulou - que desde logo pressupunha a procedência da causa de pedir dos formulados a título principal - assim tendo ofendido o disposto na al. d) do n° 1 do art. 668° do Cód. de Proc. Civil.
Nestes termos se aguardando pois a sua revogação, com o provimento do presente recurso”.

O recorrido, contra-alegou pugnando pela manutenção do julgado ao apresentar as seguintes conclusões:

“I- A douta sentença sob recurso não violou o disposto nos artigos 510° e seguintes do Código de Processo Civil;
II- O contrato administrativo de provimento celebrado entre Recorrente e Recorrido caducou no termo da sua prorrogação, isto é, em 18.07.1997;
III- Entendendo-se como na conclusão precedente se contém, bem andou o tribunal a quo em não relevar, para efeitos de contagem do tempo de duração do contrato administrativo de provimento, os períodos de suspensão alegados pelo Recorrente;
IV- A Douta Sentença sob recurso interpretou correctamente as normas invocadas para decidir como decidiu pela caducidade do contrato administrativo de provimento, nomeadamente, as regras constantes do Decreto-Lei n° 219/92;
V - Como resulta da al. b), do n°1, do artigo 471° do CPC, é permitido às partes formular pedidos genéricos ou ilíquidos, por não ser ainda possível determinar o montante indemnizatório ou a efectiva extensão dos prejuízos, mas para que assim suceda, condição sine qua non é que se verifique o preenchimento dos pressupostos de que depende a obrigação do Recorrido em indemnizar o Recorrente, como resulta do disposto no artigo 2° do Decreto-lei n° 48.051, de 25.11.1967, o que, indubitavelmente, não se verifica no caso dos presentes autos;
VI - Acresce que o Recorrente, contrariamente, ao que lhe competia, por ser o seu ónus, não logrou demonstrar a verificação dos pressupostos da responsabilidade civil extracontratual por factos ou actos omissos ilícitos, motivo bastante e suficiente para que tivesse improcedido o pedido indemnizatório, como de facto improcedeu;
VII - Consequentemente, o tribunal a quo não violou o disposto na alínea d) do n° 1 do artigo 668° do Código de Processo Civil.
Nestes termos e nos mais de direito do douto suprimento de V.Excas, deve negar-se provimento ao presente recurso mantendo-se a douta sentença recorrida com as legais consequências.
Assim se decidindo como é de costumada e esperada JUSTIÇA”.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

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2. FUNDAMENTAÇÃO

2. 1 DOS FACTOS

A decisão recorrida, com base nos documentos juntos aos autos e por acordo deu com assente, e, com interesse para a decisão, a seguinte factualidade:

“A) Por despacho de 4.4.1987 e na sequência de concurso público, o ora Autor, já vinculado a outro título ao então LNETI, foi contratado como assistente de investigação - ver does n° l e 2 juntos com a contestação, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
B) O contrato de provimento do Autor foi feito por seis anos, prorrogável por um biénio - ver doe n° l junto com a contestação.
C) O Autor foi integrado no projecto de Metrologia Eléctrica e Óptica, tendo o Presidente do LNETI, em 3.12.1987, concordado com o plano de trabalho de investigação proposto para o Autor, sobre o estudo de novos métodos de medida, nomeadamente no «Desenvolvimento e optimização de um sistema comandado por um computador pessoal para intercomparação semi-automática de pilhas Weston» - ver does n° 4 e 5 juntos com a contestação, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
D) O Autor desenvolveu actividades que se inseriam no âmbito da investigação e desenvolvimento de técnicas e equipamentos, em concreto actividades no domínio da metrologia eléctrica, sector de potência e energia, no INETI - por acordo.
E) Em 7.7.1995 o Autor assegurou a disponibilidade de um orientador, o Professor ………….., do Instituto Superior Técnico, que se propôs ser o orientador do Autor - ver doc n° 3 junto ao doe l da petição inicial, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
F) Antes de 12.7.1995, o Autor requereu ao Presidente do INETI a prorrogação do seu contrato por um biénio - admissão por acordo.
G) Em 12.7.1995 o Director do Laboratório de Medidas Eléctricas, sobre o assunto - prorrogação de contrato por um biénio - lavrou a nota n° LME - 39/95, com o seguinte teor:
«Em resposta à Nota nº 140/312/95 da DSGA referente ao assunto em epígrafe e na sequência do ofício apresentado pelo Prof …………….. do Departamento de Engenharia Electrotécnica e de Computadores do IST, onde se propõe orientar o Eng. …………………, tendo em vista a prestação de provas para o acesso à categoria de investigador auxiliar do INETI, julgo de conceder o prazo requerido» -ver doe n° 4 junto com o doc n° 1 da petição inicial.
H) Sobre a nota antes mencionada, foi aposto no dia 18.7.1995 o seguinte despacho, com assinatura ilegível, «autorizo» - ver doc n° 4 junto com o doc n° 1 da petição inicial.
I) Em 21.11.2000, o Presidente do Conselho Directivo do INETI, sobre o assunto: Situação do Eng. ……………….., após a cessação da comissão de serviço enquanto Director de Serviços da Gestão Administrativa, proferiu o despacho n°108/2000, com o seguinte teor:
«O Eng. ………… celebrou com o INETI um contrato de provimento como assistente de investigação, em Abril de 1987. Este contrato é sexenal to é susceptível de ser prorrogado por um biénio.
O funcionário em causa requereu, em Setembro de 1994, a prorrogação do seu contrato, como assistente de investigação, por dois anos.
Tendo sido largamente ultrapassado tal período, destinado à prestação de provas para acesso à categoria de investigador auxiliar e não tendo as mesmas tido lugar, deve considerar-se caducado o contrato de provimento como assistente de investigação.
Dado que o Eng. ………… tem nomeação definitiva como técnico superior principal é, portanto, nesta categoria que está posicionado, no quadro do INETI, para os devidos efeitos.
Atento o que fica dito, determino:
Que o Eng. ………….. seja considerado, a partir da data da cessação da sua comissão de serviço como Director de Serviços da Gestão Administrativa, como regressado à categoria de técnico superior principal do quadro do INETI, seu lugar de origem, para todos os devidos e legais efeitos». - ver doc n° 5 junto com o doe n° 1 da petição inicial.
J) O Autor foi notificado do despacho que antecede, por ofício de 5.1.2001, e, por ofício de 18.1.2001, foi notificado para repor «a quantia de Esc: 148.808$00, referente a 9 dias de vencimento do mês de Outubro, mês de Novembro bem como subsídio de Natal no montante de Esc: 133.800$00 (...) abonados como assistente de investigação» - ver docs n° 7 e 8 juntos com o doe n° 1 da petição inicial.
K) Em 31.1.2001, o Autor requereu autorização para repor a quantia de Esc: 148.808$00, referente a vencimentos, e Esc: 133.800$00, relativo a subsídio de Natal, em 12 prestações mensais, o que lhe foi deferido e ele cumpriu em Agosto de 2001 -ver docs n° 10, 11 a 16 juntos com a contestação.
L) Em 20.2.2001, o Autor recorreu hierarquicamente do despacho identificado na al I) para o Ministro da Economia, que, por despacho de 5.6.2001, rejeitou o recurso, apontando ao Autor a via de elaboração de um seu requerimento ao Presidente do INETI, apresentado em 6.7.2001 e indeferido por despacho de 20.8.2001 - ver docs n° s 1, 2, 3, 4, 5 juntos com a petição inicial e por acordo.
M) O Autor interpôs recurso do despacho de indeferimento, de 20.8.2001, para o ministro da tutela, e depois intentou acção de reconhecimento de direito, na qual, por acórdão transitado em julgado, do Tribunal Central Administrativo Sul, em 2.6.2005, foi decidido dever ser proposta acção sobre contratos - ver does 8, 9, 10,11 juntos com a petição inicial.
N) O Réu não designou orientador ao Autor e nenhum Director, Coordenador ou Responsável orientou o Autor - admissão por acordo.
O) O Autor não requereu a prestação de provas de acesso à categoria de investigador auxiliar - por confissão.
P) O Autor esteve na situação de licença sem vencimento de 6.3.1989 a 4.6.1989 - prestou funções em regime de meio tempo de 22.12.1989 a 21.2.1992, exerceu as funções de Director de Serviços de Gestão Administrativa do INETI de 8.4.1999 a 25.10.2000 - admissão por acordo.
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O Tribunal não tomou em consideração os documentos juntos pelas partes, como: doc n°1 junto com o doe l da petição inicial, por não reunir os requisitos dos documentos particulares, cfr art 373°, n° 1 do Código Civil, e ter sido impugnado; doc n° 2 junto com o doc n° 1 da petição inicial - requerimento do Autor datado de 24.9.1994 - não estar completo e o próprio Autor confessar não estar correcta a data aposta no mesmo, a que acresce ainda as partes terem admitido, por acordo, o facto de o Autor ter requerido à Administração a prorrogação do contrato.
Os demais que não foram indicados nas alíneas da matéria de facto provada, por não provarem factos com relevo para a decisão da causa.
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2.2. Motivação de Direito

O presente recurso visa a sentença do TAF de Sintra que julgou improcedente a pretensão do recorrente, que pede a revogação do sentenciado, para o que alega erro de julgamento de direito e de facto, ainda que a coberto da invocação da nulidade da sentença, com fundamento em que não conheceu de pedido subsidiário, pelo menos, incorre em erro de julgamento ao desconsiderar a referida arguição na decisão da causa.
É líquido, em face do teor das alegações recursórias das partes, que a questão central a decidir (a única e relevante causa de pedir e cuja decisão no sentido da improcedência prejudica a cognição de todas as que demais se puseram ou poderiam levantar) era a de saber se o contrato administrativo de provimento celebrado entre Recorrente e Recorrido caducou no termo da sua prorrogação em 18.07.1997.
Antecipe-se que, a nosso ver, que a nulidade decisória que o recorrente assaca à decisão recorrida, nos termos do artº 668º/1, d) do CPC, não se verifica.
É que, tendo o tribunal recorrido decidido no sentido da verificação da caducidade do referido contrato, valendo-se, para o efeito, de argumentos/razões jurídicas que o recorrente considera não esgotarem o conhecimento da causa de pedir, mostra-se manifestamente prejudicada a apreciação específica daquela questão, nos termos do art. 660º/2 do CPC (aplicável ao tempo). O que a decisão pode é ter errado mas isso afectará não a sua estrutura, mas antes e eventualmente, o seu valor jurídico intrínseco que poderá não ter sido respeitado pelo tribunal a quo.
Quanto ao erro de julgamento, o mesmo não tem plausibilidade jurídica pelas razões adiante sustentadas.
Se não vejamos.
Afirma o recorrente (conclusões a) a c),) em primeiro lugar, que a sentença sob recurso violou o disposto nos artigos 510° e seguintes do Código de Processo Civil.
Para o demonstrar, alega, em síntese, que foi julgada como processualmente adquirida matéria efectivamente controvertida, sobre a qual deveria pois ter sido propiciada a produção de prova adicional, entendendo, outrossim, que quanto à matéria de facto que se desconsiderou, por se ter decidido não poder ser apurada face aos documentos constantes dos autos, deveria ter sido possibilitada a sua averiguação por outras formas, concluindo, com estes fundamentos, que o tribunal a quo infringiu a regra do artigo 510°, n° 1. b) do CPC e em consequência, os subsequentes preceitos desse Código que pressupunham que o processo prosseguisse, como devia, para produção de prova.
Afigura-se-nos, contudo, que não assiste qualquer razão ao recorrente e para o demonstrar, basta ler a motivação da decisão fáctica aduzida na sentença que é de uma clareza e inequivocidade a toda a prova:
“O Tribunal não tomou em consideração os documentos juntos pelas partes, como: doc n°1 junto com o doe l da petição inicial, por não reunir os requisitos dos documentos particulares, cfr art 373°, n° 1 do Código Civil, e ter sido impugnado; doc n° 2 junto com o doc n° 1 da petição inicial - requerimento do Autor datado de 24.9.1994 - não estar completo e o próprio Autor confessar não estar correcta a data aposta no mesmo, a que acresce ainda as partes terem admitido, por acordo, o facto de o Autor ter requerido à Administração a prorrogação do contrato.
Os demais que não foram indicados nas alíneas da matéria de facto provada, por não provarem factos com relevo para a decisão da causa. “
Donde que foi por efeito de se ter entendido não tomar em consideração alguns dos documentos juntos pelo Autor à PI, nomeadamente, aqueles que se juntaram como documentos n°s 1 e 2, o primeiro, por não preencher os requisitos do artigo 373°, n°1 do CC, e ter sido impugnado; e o segundo, por não estar completo e se atender ao facto de o próprio Autor confessar não estar correcta a data aposta no mesmo, e ainda o facto de as partes terem admitido, por acordo, o facto de o Autor ter requerido à Administração a prorrogação do contrato, que si fixou a matéria de facto que se julgou ser a relevante e suficiente para uma conscienciosa decisão.
Acresce que, perante o que resultou provado, parece que inelutavelmente operou a caducidade do contrato de provimento celebrado entre Recorrente e Recorrido, e, por virtude disso, torna-se impertinente e desnecessária a produção de prova adicional por a mesma se insusceptível de alterar o fulcro da questão que era a da efectiva caducidade do contrato de provimento, ocorrida no termo da sua prorrogação, (em 18.07.1997).
De igual modo e no que tange à responsabilidade de ambas as partes no procedimento que envolve o contrato a que se referem os autos, (“laxismo” como o apoda a decisão recorrida), o certo é que, como bem refere a Recorrido nas suas contra-alegações, tal responsabilidade é duplamente imputável ao Recorrente, que ao requerer o que requereu, ou seja, a licença sem vencimento, o exercício de funções a em regime de meio tempo, e tendo aceite, como aceitou, o cargo de Director de Serviços da DSGA, não desconheceria nem podia desconhecer, que tais períodos não suspenderiam a vigência (nela se incluindo a sua prorrogação) do contrato administrativo de provimento como assistente de investigação que havia celebrado com o Recorrente.
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No ponto em análise, importa finalmente tomar posição sobre a admissibilidade, ou não, do documento que o Recorrente junta com as suas alegações e que é, nem mais, nem menos, que o actual modelo do plano de investigação em uso no INETI.
Cumpre, pois, determinar da pertinência e admissibilidade dos mesmos neste momento atento o princípio da oportunidade da prova. e da manutenção dos referidos documentos nos autos.
Vigora no direito português o modelo de apelação restrita, de acordo com o qual o recurso não visa o reexame, sem limites, da causa julgada em 1ª. Instância, mas tão-somente a reapreciação da decisão proferida dentro dos mesmos condicionalismos em que se encontrava o Tribunal “a quo” no momento em que proferiu a sentença. Como resulta de uma jurisprudência uniforme e reiterada, os recursos são meios processuais de impugnação de anteriores decisões judiciais e não ocasião para julgar questões novas. Em princípio, não pode alegar-se matéria nova nos Tribunais Superiores, em fase de recurso, não obstante o Tribunal “ad quem” tenha o dever de apreciar as questões de conhecimento oficioso. Daí que, não devam ser juntos documentos novos na fase de recurso. A lei, porém, prevê excepções que passamos a analisar.
Dispõe o artº.523, do C. P. Civil (princípio da oportunidade da prova) que os documentos, como meios de prova, da acção ou da defesa, devem ser apresentados com o articulado em que se invoquem os factos que se destinem a demonstrar. Não sendo apresentados com o respectivo articulado, ainda e por livre iniciativa das partes litigantes, enquanto apresentantes, podem ser juntos ao processo até ao encerramento da discussão em 1ª Instância, embora com a condenação do apresentante em multa, salvo demonstração de que os não pôde oferecer com o articulado próprio.
Em fase de recurso, a lei processual civil (cfr.artºs.524 e 693-B, do C.P.Civil), somente possibilita a junção de documentos ao processo, sempre e só com as alegações (ou contra-alegações) e não em momentos posteriores, quando ocorra alguma das seguintes circunstâncias:
1-Quando não tenha sido possível a respectiva apresentação em momento anterior (artº.524, nº.1, do C.P.Civil);
2-Quando se destinem à demonstração de factos posteriores aos articulados (artº.524, nº.2, do C.P.Civil);
3-Quando a respectiva apresentação se tenha tornado necessária em resultado de ocorrência posterior ao encerramento da discussão em 1ª Instância (artº.524, nº.2, do C.P.Civil);
4-Quando a junção de documentos se torne necessária em virtude do julgamento proferido em 1ª Instância (cfr.artº.693-B, do C.P.Civil);
5-Nos casos previstos no artº.691, nº.2, als.a) a g) e i) a n), do C. P. Civil (cfr.artº.693-B, do C.P.Civil).
A verificação das circunstâncias elencadas tem como pressuposto necessário que os factos documentados sejam relevantes/pertinentes à decisão a proferir, o que decorre, desde logo, directamente da circunstância dos documentos cuja junção se pretende terem de ter por desiderato a prova dos fundamentos da acção e/ou da defesa (citado artº.523, do C.P.Civil) e, indirectamente e como consequência do que se vem de referir, do facto de o juiz se encontrar vinculado a mandar retirar do processo os que sejam impertinentes ou desnecessários, por força do estipulado no artº.543, do mesmo compêndio legal (cfr.José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, C.P.Civil anotado, Volume 3º., Tomo I, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 2008, pág.96 e seg.; António Santos Abrantes Geraldes, Recurso em Processo Civil, Novo Regime, 2ª. Edição Revista e Actualizada, Setembro de 2008, Almedina, pág.227 e seg.).
No que diz respeito à hipótese de junção de documentos quando esta se torne necessária em virtude do julgamento efectuado em 1ª Instância (cfr.nº.4 supra), o advérbio “apenas”, usado no artº.693-B, do C. P. Civil, significa que a junção só é possível se a necessidade do documento era imprevisível antes de proferida a decisão na 1ª Instância, isto é, se a decisão da 1ª Instância criar, pela primeira vez, a necessidade de junção de determinado documento. A lei quis manifestamente cingir-se aos casos em que, pela fundamentação da sentença ou pelo objecto da condenação, se tornou necessário provar factos com cuja relevância a parte não podia razoavelmente contar antes de a decisão da 1ª. Instância ser proferida (cfr. Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 2ª. Edição, Coimbra Editora, 1985, pág.533 e 534).
Descendo ao caso dos autos, é manifesto que, atentas as datas dos factos a que os documentos juntos em fase de recurso pelo recorrente se reportam, estes podiam ter procedido à junção dos referidos documentos com a petição que iniciou o presente processo e, portanto, também antes da prolação da sentença de 1ª. Instância. Quer isto dizer que os documentos juntos pelo recorrente com as alegações do recurso não visam provar factos com natureza superveniente. Mas poder-se-ia entender, em vista da descoberta da verdade material que está legitimada tal junção com a própria fundamentação da sentença exarada na 1ª. Instância e, visto que o tribunal ad quem frui de ampla margem de apreciação ao ponto de poder anular a sentença para ampliar a matéria de facto e/ou renovar os meios de prova, ser-lhe-á lícito poder determinar a manutenção nos autos dos ditos documentos.
Mas não logra procedência a alegação do recorrente, de que os documentos juntos com as alegações de recurso visavam esclarecer as dúvidas com que a Tribunal “a quo” ficou.
É que, analisando o documento, cremos que do seu teor não se pode extrair qualquer factualidade relevante em consonância com o Recorrido quando afirma que não se vê até que ponto o documento junto agora pelo Recorrente, possa provar, ou pretender provar o que quer que seja. já que, como afirma o próprio Recorrente, trata-se do actual modelo do plano de investigação em uso no INETI. Ora, corria o ano de 2007 e o plano de investigação, ou plano de trabalho, utilizado em 1987, aquando da celebração do contrato administrativo de provimento a que se referem os autos, seria, ou, neste caso era, diferente. Afinal vão decorridos cerca de 20 anos, parecendo ao Recorrido natural a utilização de "novos" modelos de planos de investigação.
Concluindo, dada a sua impertinência e desnecessidade, deverão os não se admitem os documentos juntos que deverão ser desentranhados e remetidos à procedência com tributação, fixando-se o mínimo de taxa de justiça pelo incidente a que o Autor e ora recorrente deu causa (cfr.artº.543, nº.1, do C.P.Civil; artº.10, do R.C.Processuais).
Termos em que improcedem os fundamentos de recurso sob análise.
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Vejamos de seguida se ocorre erro de julgamento sob a matéria de direito no segmento em que a decisão recorrida entendeu que se verificava a caducidade do contrato de provimento.
Eis o que a sentença aduziu como fundamentação para não acolher a pretensão do recorrente no sentido contrário:
O Autor pede a condenação do Réu na «renovação» do seu contrato como assistente de investigação por entender que a Administração não lhe facultou as condições de que dependia o início da contagem do prazo do próprio sexénio inicial.
A saber: o Autor não realizou um trabalho de investigação para prestação de provas de acesso à categoria de investigador auxiliar porque a Administração não lhe atribuiu qualquer trabalho de investigação e nem lhe designou um orientador.
Mesmo depois de o Autor ter proposto à Administração um orientador, esta não concretizou a nomeação do orientador proposto.
Pelo que considera não ter ocorrido a caducidade do contrato.
Vejamos então.
O Autor foi provido, em 4.4.1987, por contrato administrativo de provimento, ao abrigo do disposto no artigo único do DL n° 37.881, de 11.7.1950, como assistente de investigação, deixando de exercer a função de adjunto técnico principal do quadro de pessoal do Laboratório Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial (LNETI).
Aquele diploma foi revogado pelo DL n° 427/89, de 7.12 que define o regime de constituição, modificação e extinção da relação jurídica de emprego na Administração Pública e no art 15°, sob a epígrafe noção e admissibilidade do contrato administrativo de provimento, estipula:
«1 - O contrato administrativo de provimento é o acordo bilateral pelo qual uma pessoa não integrada nos quadros assegura, a título transitório e com carácter de subordinação, o exercício de funções próprias do serviço público, com sujeição ao regime jurídico da função pública.
2 - O contrato administrativo de provimento é celebrado nos seguintes casos:
a) Quando se trate de serviços em regime de instalação, salvo se o interessado já possuir nomeação definitiva;
b) Quando se trate de pessoal médico em regime de internato geral ou complementar, docente e de investigação, nos termos dos respectivos estatutos;
c) Para frequência de estágio de ingresso na carreira, salvo se o interessado já possuir nomeação definitiva» (sublinhado nosso).
Com o DL n° 218/98, de 17.7, o art 15°, n° 2, que vimos de transcrever, passou a ter a redacção seguinte:
«2 - O contrato administrativo de provimento é celebrado nos seguintes casos:
a) Quando se trate de serviços em regime de instalação, salvo se o interessado já possuir nomeação definitiva;
b) Quando se trate de pessoal médico em regime de internato geral ou complementar, de enfermagem, docente e de investigação, nos termos e condições dos respectivos estatutos, salvo se o interessado já possuir nomeação definitiva;
c) Para frequência de estágio de ingresso na carreira, salvo se o interessado já possuir nomeação definitiva».
Ainda, o artigo 16° do DL n° 427/89, de 7.12, sob a epígrafe forma e prazo do contrato administrativo de provimento dispõe:
« 1 - O contrato administrativo de provimento é celebrado por escrito e dele consta obrigatoriamente:
a) O nome dos outorgantes;
b) A categoria, a remuneração e a data de início do contrato;
c) A data e assinatura dos outorgantes.
2- O contrato administrativo de provimento considera-se celebrado por um ano, tácita e sucessivamente renovável por iguais períodos, se não for oportunamente denunciado, nos termos previstos no presente diploma.
3- A renovação do contrato tem como limite, consoante os casos, o termo do regime de instalação, o regime em vigor sobre a contratação de pessoal médico, docente e de investigação e o termo do período de estágio, salvo o disposto no número seguinte.
4- O contrato administrativo de provimento dos estagiários aprovados no estágio para os quais existam vagas considera-se automaticamente prorrogado até à data da aceitação da nomeação» (sublinhado nosso).
Ora, à data em que o Autor foi provido o regime em vigor sobre a carreira de investigação científica constava do DL n° 415/80, de 27.9, e, nos termos do art 1°, n° 3 deste DL e do Decreto Regulamentar n° 8/81, de 20.2, aplicava-se ao pessoal do Laboratório Nacional de Engenharia e Tecnologia Industrial (LNETI).
Assim, de acordo com o art 12° do Decreto Regulamentar n° 8/81, de 20.2:
«1 - Os assistentes de investigação são providos por contrato sexenal, prorrogável por um biénio.
2 -A prorrogação só pode ser autorizada mediante proposta fundamentada do organismo, ouvido o orientador, desde que o assistente de investigação tenha em fase adiantada de realização os trabalhos de investigação, desenvolvimento experimental e demonstração conducentes à prestação das provas referidas no art 17°.
3 - Aos assistentes de investigação que, no termo dos períodos referidos no nº1, não tiverem requerido a realização das provas mencionadas no art 17° ou, tendo-as requerido, nelas não tiverem obtido aprovação, será garantida, caso o solicitem, a integração na carreira técnica superior
(...).
7 - Requeridas as provas mencionadas no nº 3, o contrato será prorrogado até à sua realização».
Tendo, por isso, a forma de provimento do Autor sido o contrato sexenal prorrogável por um biénio.
Entretanto, o DL n° 415/80, de 27.9 e o Decreto Regulamentar n° 8/81, de 20.2 foram revogados pelo DL n° 219/92, de 15.10, diploma que aprovou o estatuto da carreira de investigação científica, que, por sua vez, foi revogado pelo DL n° 124/99, de 20.4.
No art 62° do DL n° 124/99, de 20.4 consta, no entanto, a norma transitória que manteve em vigor o regime previsto no DL n° 219/92, no que concerne ao modo de progressão na carreira, ao sistema de provas de acesso e sua apreciação, às regras sobre constituição de júris e formas de provimento, relativamente aos estagiários de investigação e assistentes de investigação que se encontrem contratados ou providos numa dessas categorias à data da entrada em vigor do presente diploma. Ou seja, manteve transitoriamente em vigor o artº 2º, artº 3º, nº 1 e 2, art. 10º, nº2, parte inicial das alíneas b) e c) e al d), dos arts 11° a 21° do DL n° 219/92 de, 15.10
O que significa dizer que a situação do Autor no que ao prazo de validade do contrato respeita - cfr als A) e B) dos factos provados - é regulada pelo regime jurídico instituído pelo DL n° 219/92, de 15.10, nos termos do qual os assistentes de investigação são providos por contrato sexenal, prorrogável por um biénio - cfr art 12°, n° l DL n° 219/92, de 15.10 e art 62° do DL n° 124/99, de 20.4. A prorrogação para ser autorizada carece de proposta fundamentada do organismo de investigação, ouvido o orientador, desde que o assistente de investigação tenha em fase adiantada de realização o trabalho de investigação - cfr art 12°, n° 2.
No entanto, se requeridas as provas de acesso à categoria de investigador auxiliar, o contrato é prorrogado até à realização das mesmas - cfr art 12°, n° 3.
Pelo exposto, a conjugação do art 16°, n° 2 e n° 3 do DL n° 427/89, de 7.12 com o art 12°, n° 1, n° 2 e n° 3 do DL n° 219/92, de 15.10 permite concluir que o contrato administrativo de provimento caducará automaticamente com o termo do período de duração máximo do contrato, de oito anos ou, se requeridas, até à realização das provas de acesso à categoria de investigador auxiliar.
Pelo que, no caso, aplicando o disposto na lei à situação concreta, o contrato de provimento do Autor, com início em 4.4.1987, tendo sido prorrogado em 18.7.1995, tinha como termo o dia 18.7.1997, o que se entende ter sucedido por o Autor não ter requerido a realização das provas de acesso à categoria de investigador auxiliar.
O Autor, a tal propósito alegou que, por a Administração nunca lhe ter nomeado um orientador, mesmo depois do Autor ter proposto a identificação de um nem lhe ter atribuído um trabalho de investigação, não podia ter início a contagem do prazo do contrato.
Este argumento, alegação não colhe.
Primeiro, como resulta da matéria de facto assente na al C), a Administração integrou o Autor num projecto de estudo e aprovou-lhe o plano de trabalho de investigação, em 3.12. 1 987
Depois, concede-se que, ao abrigo do disposto no art 4°, n° 1 do Decreto Regulamentar n° 8/81, de 20.2 e do art 4°, n° 5, al a) do DL n° 219/92, de 15.10, era dever da Administração designar um orientador ao Autor. O que não fez.
Porém, tal dever, de acordo com o art 4°, n° 2 do Decreto Regulamentar n° 8/81, de 20.2 e do art 4°, n° 6 do DL n° 219/92, de 15.10, devia ter sido cumprido depois do início do contrato celebrado entre o Autor e a Administração. Pelo que, tal designação não era condição de que dependia o início da contagem do prazo do sexénio inicial do contrato em causa.
Como bem refere a Administração, no caso concreto, o início da vigência do contrato de provimento do Autor verificou-se em 4.4.1987, por acordo entre as partes, expresso pela assinatura do termo de posse.
Assim, face à actuação da Administração em não lhe nomear um orientador, no decurso do contrato, atenta a data em que ocorreu (de 4.4.1987 a 18.7.1997), o Autor podia ter requerido a designação de um orientador e, se a Administração nada decidisse sobre o requerido no prazo legal, poderia e deveria presumir indeferido tacitamente o pedido, para assim dispor de um instrumento que lhe permitisse aceder à impugnação contenciosa correspondente (art 109° do Código de Procedimento Administrativo e art 28°, n°1, al. d), da LPTA). Em alternativa, o Autor podia ter denunciado ou rescindido o contrato, que era limitado no tempo (cfr art 30° do DL n° 427/89, de 7.12).
Não tendo lançado mão de qualquer dos mencionados mecanismos, administrativo e contencioso, o efeito do decurso do prazo do contrato em análise, nos termos da lei, só podia ter sido o da caducidade, como atrás referimos.
O Autor entende ainda que a Administração devia ter-lhe contabilizado diversos períodos de suspensão, pois:
-esteve na situação de licença sem vencimento de 6.3.1989 a 4.6.1989,
-prestou funções em regime de meio tempo de 22.12.1989 a 21.2.1992,
-exerceu as funções de Director de Serviços de Gestão Administrativa do INETI de 8.4.1999 a 25.10.2000.
Ora,
Considerando que o Autor foi provido como assistente de investigação por contrato administrativo de provimento, em 4.4.1987, nos termos do art 12°, n° 1 do DL n° 415/80, de 27.9 e art 12°, n° 1 do DR n° 8/81, de 20.2.
Considerando que o Autor, antes de 12.7.1995, requereu a prorrogação, por um biénio, do seu contrato.
Considerando que a prorrogação foi autorizada por dois anos, contados da data do despacho de autorização, ou seja, de 18.7.1995.
Considerando que o contrato administrativo de provimento, apenas, legítima o exercício transitório de funções, com vista, in casu, à progressão na carreira de investigação científica.
Tendo aqui presentes os ensinamentos do Prof. Marcelo Caetano quando, em Manual de Direito Administrativo, vol II, Almedina, pág 792, refere «não se conceber o cumprimento do contrato (de provimento) senão através da prestação efectiva do serviço estipulado. Fora dos casos especialmente previstos na lei, o facto de um contratado pretender exercer cargo diferente dos correspondentes ao lugar que ocupa no quadro ou passar à inactividade, implica a rescisão do contrato».
Por fim, a situação de licença sem vencimento (de 6.3.1989 a 4.6.1989) e a prestação de funções em regime de meio tempo (de 22.12.1989 a 21.2.1992) não integram a previsão legal do art 24° do DL n° 415/80, de 27.9 e do DR n° 8/81, de 20.2.
O exercício das funções de Director de Serviços de Gestão Administrativa do INETI (de 8.4.1999 a 25.10.2000) pelo Autor, depois do termo da data da prorrogação do seu contrato administrativo de provimento como assistente de investigação, ainda assim não se integra no disposto nos arts 49° e 62° do DL n°124/99, de 20.4.
Entende o Tribunal, em conclusão, que, por não existir fundamento legal, os apontados períodos em que o Autor esteve na situação de licença sem vencimento, a prestar funções em regime de meio tempo e a exercer funções de Director de Serviços de Gestão Administrativa do INETI, não determinam a suspensão do período de vigência do contrato administrativo de provimento do Autor como assistente de investigação.
Por tudo o exposto, o Tribunal decide que o contrato administrativo de provimento do Autor como assistente de investigação, com início em 4.4.1987 caducou no termo da prorrogação, ou seja, em 18.7.1997.
Pelo que improcedem os pedidos formulados pelo Autor de condenação do Réu a:
a) «cumprir as obrigações legais que sobre os seus órgãos impendem, relativamente ao ora Autor, por força do estatuto da carreira de investigação científica,
b) contar o início do sexénio do contrato como assistente de investigação da data em que se encontrar definido o projecto de investigação a desenvolver e nomeado o respectivo orientador, renovando-se então esse contrato,
c) anular a ordem de reposição de vencimentos e repor o pagamento do vencimento como assistente de investigação desde o momento em que foi interrompido».”
A sentença não nos merece qualquer reparo pois, patenteia o probatório que, apesar da actuação do Recorrido em não nomear um orientador ao Recorrente, no decurso do contrato o Recorrente podia ter requerido a designação de um orientador e, se o Recorrente nada decidisse sobre o requerido no prazo legal para o efeito, o Recorrente poderia e deveria presumir o indeferimento tácito, e assim dispor de um instrumento que lhe permitisse aceder à impugnação contenciosa correspondente.
Ora, por não ter lançado mão deste mecanismo contencioso, o efeito do decurso do prazo do contrato em análise, nos termos da lei, só poderia ter sido o da sua caducidade.
Neste particular, sustenta o Recorrido que ainda que não tivesse designado um orientador ao Recorrente, a verdade é que à altura dos factos, vigorava um Despacho do então Presidente do LNETI, Professor Veiga Simão, de 08.06.1983, onde a determinada altura se lia:"...4. No caso de não terem sido designados os respectivos orientadores entende-se que desempenham essas funções os responsáveis pelos projectos do PIDDAC ou os Directores de Departamento ou Coordenadores de Sectores (no caso das Ciências e Técnicas Nucleares" (documento que se junta, identificado como doc. n° 1).
Cabe dar tratamento idêntico à pretendia junção deste documento pelas mesmíssimas razões aduzidas quanto ao pretendido juntar pelo Recorrente, ou seja, dada a sua impertinência e desnecessidade, não se admite o mesmo e condena-se o apresentante (recorrido) em multa correspondente ao mínimo de taxa de justiça.
Prosseguindo:
Subscrevemos inteiramente a tese do Recorrido de que o decurso do prazo de vigência do contrato de provimento a que se refere o n°1 do art. 12° do DL 219/92, determina a extinção dos seus efeitos (caducidade) das relações jurídicas que por virtude dele foram constituídas entre as respectivas partes.
E também não se antolha que, in casu, existisse algum fundamento potenciador da sua suspensão, dada a inexistência, em todo o processo administrativo, de indícios da verificação de situações que as pudessem determinar.
Improcede, pois, o fundamento recursório em análise.
*
Da omissão de pronúncia por a sentença não ter considerado o exacto pedido subsidiário que o Autor a final se formulou - que desde logo pressupunha a procedência da causa de pedir dos formulados a título principal - assim tendo ofendido o disposto na al. d) do n° 1 do art. 668° do Cód. de Proc. Civil.
Embora num ordem lógica se devesse conhecer em primeiro lugar deste vício, cuja verificação imporia a declaração de nulidade da sentença e a reapreciação do fundo da causa, inverteu-se essa ordem já que a solução jurídica de fundo, porque merece confirmação nos termos supra expostos, traz implicante a irrelevância do conhecimento da nulidade decisória não havendo, pois, necessidade e utilidade em conhecer dessa temática, tanto mais que para “…a efectivação do direito de acesso à justiça, as normas processuais devem ser interpretadas no sentido de promover a emissão de pronúncias sobre o mérito das pretensões formuladas” (cfr. artº 7º do CPTA).
O vício em causa está relacionado com a norma que disciplina a “ordem de julgamento” (cf. artigo 608º nº 2 do NCPC). Com efeito, resulta do regime previsto neste preceito que o Juiz na Sentença “deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras”.
É pacífico que o vício de omissão de pronúncia, nos termos em que o mesmo se encontra legalmente previsto e tem vindo a ser jurisprudencial e doutrinalmente conformado tem que traduzir-se, para se julgar verificado, numa violação pelo decisor do poder-dever a que está estritamente vinculado de conhecer de todas as questões que lhe sejam submetidas pelas partes, com excepção, apenas, daquelas que sejam de conhecimento oficioso ou que vejam a respectiva solução prejudicada pela que haja sido dada a outra ou outras entretanto apreciadas.
Como ensina o Prof. Alberto dos Reis (in “CPC Anotado”, Vol. V, pg. 143): «Resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação não significa considerar todos os argumentos que, segundo as várias vias, à partida plausíveis, de solução do pleito (artº 511º nº 1), as partes tenham deduzido ou o próprio juiz possa inicialmente ter admitido: por um lado, através da prova, foi feita a triagem entre as soluções que deixaram de poder ser consideradas e aquelas a que a discussão jurídica ficou reduzida ; por outro lado, o juiz não está sujeito às alegações das partes quanto à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas (artº 664º) e, uma vez motivadamente tomada determinada orientação, as restantes que as partes hajam defendido, nomeadamente nas suas alegações de direito, não têm de ser separadamente analisadas».
No caso em apreço a recorrente imputa à decisão recorrida a nulidade por omissão de pronúncia já que não se pronunciou nem decidiu sobre a condenação do ora recorrido no pagamento de pedido indemnizatório.
Ora, o que desde logo se constata é que o pedido indemnizatório formulado, subsidiariamente, pelo ora Recorrente, não se fundamenta em quaisquer prejuízos já conhecidos ou verificados, não alegando o mesmo, nem podendo alegar, quaisquer factos que revelem a respectiva existência.
É que, tendo em conta que se em virtude de o contrato ter caducado por uma causa legal, como atrás se fundamentou, o Recorrido só poderia ficar obrigado a indemnizar o Recorrente, com base no regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado, ao tempo consagrado e definido no Decreto-Lei n° 48.051, de 21.11.1967.
Ora, nos termos do n°1 do artigo 2° desse diploma legal, o Recorrido só poderia responder civilmente perante o Recorrente, pelas ofensas aos direitos deste ou das disposições legais destinadas a proteger os seus interesses, se estas forem resultantes de actos ilícitos culposamente praticados pelos respectivos órgãos ou agentes administrativos no exercício das suas funções e por causa desse exercício.
Por assim ser, não se antolha como poderia recair sobre o Recorrido a responsabilidade em indemnizar o Recorrente. tendo desde logo em conta que aquele normativo limita, imperativamente, os casos em que se verifica essa responsabilidade, onde não cabem as pretensões alegadas pelo Recorrente e cuja improcedência já foi apreciada e decidida.
Acrescente-se que, de acordo com aquele inciso legal, eram os seguintes os pressupostos da responsabilidade do Recorrido, de verificação cumulativa:
1. O facto - revelado por um comportamento activo ou omisso, praticado, ou não pelo Recorrido;
2. A ilicitude, desse mesmo facto - isto é, a efectiva ofensa de direitos do Recorrente ou de disposições legais destinadas a proteger os seus interesses;
3. A culpa - verificada através do real nexo de imputação ético-jurídico do facto ao agente ou juízo de censura pela falta de diligência aferida por um homem médio ou por um funcionário ou agente típico;
4. O dano - demonstrado na lesão de ordem patrimonial ou moral;
5. O nexo de causalidade - isto é, a existência inequívoca de causalidade entre o facto praticado ou omitido pelo Recorrido e o dano causado ao Recorrente.
Não alegando o Autor e ora Recorrente quaisquer factos que revelem a existência de prejuízos, falha um pressuposto essencial da pretendida responsabilidade do Recorrido em indemnizar o Recorrente, qual seja, a existência de um prejuízo ou dano patrimonial e ou moral para o Recorrente.
Doutra banda, afigura-se-nos mesmo que não ocorre nenhum dos apontados pressupostos pois a solução de fundo adoptada no primeiro segmento deste bloco fundamentador afasta essa possibilidade: a actuação do Recorrido não revela nenhum facto ou acto omisso ilícito e culposo capaz, de por si só e através de si, lesar os direitos do Recorrente ou as normas legais destinadas a proteger os seus interesses, e de nomeadamente, lhe causar, consequentemente, qualquer dano ou lesão de ordem patrimonial ou moral.
E, se é certo e como bem anota o Recorrido, que da al. b), do n°1, do artigo 471° do Código de Processo Civil (redacção ao tempo),resulta ser lícito às partes formular pedidos genéricos ou ilíquidos, por não ser ainda possível determinar o montante indemnizatório ou a efectiva extensão dos prejuízos, para que assim suceda será condição sine qua non o preenchimento dos pressupostos de que depende a obrigação do Recorrido em indemnizar o Recorrente
O que, manifestamente, não ocorre no caso dos presentes autos desde logo porque a caducidade operou nos termos legais e, depois, porque o Recorrente, como era seu ónus, não logrou demonstrar que se verificavam os demais requisitos da responsabilidade civil extracontratual por factos ou actos omissos ilícitos, motivo bastante e suficiente para que tivesse improcedido, como de facto e muito bem, improcedeu o alegado pedido indemnizatório, o que vale por dizer que, afinal, a julgador conheceu de todas as questões que lhe foram submetidas pelas partes, sendo certo que, a nosso ver, a respectiva solução sempre estaria prejudicada pela que foi dada a outra ou outras entretanto apreciadas.
Termos em que improcedem, in totum os fundamentos recursórios.

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3. -DECISÃO

Nesta conformidade, acordam, em conferência, os Juízes do 2º Juízo do Tribunal Central Administrativo Sul, em:
a).- Não admitir os documentos juntos pelas partes com as alegações de recurso, condenando os apresentantes no mínimo de taxa de justiça;
b).-.Negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
c)- Condenar o Recorrente. Nas custas processuais.

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Lisboa, 24 de Novembro de 2016

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[José Gomes Correia]

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[António Paulo Esteves Aguiar de Vasconcelos]

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Pedro José Marchão Marques]