Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:655/22.5BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:09/15/2022
Relator:VITAL LOPES
Descritores:PRESCRIÇÃO
CITAÇÃO
EFEITO INTERRUPTIVO
IRS
AGREGADO FAMILIAR
Sumário:I - Determina o n.º 2 do art.º 13.º do CIRS que, existindo agregado familiar o imposto é devido pelo conjunto dos rendimentos das pessoas que o constituem, considerando sujeito passivo aquelas a quem incumbe a sua direcção, sendo o agregado familiar constituído pelos cônjuges não separados de pessoas e bens e os seus dependentes (alínea a) do n.º 3 do art.º 13.º do CIRS).
II - Com a citação do cônjuge da oponente, o prazo de prescrição interrompe-se relativamente a ambos os cônjuges, ou seja, também relativamente à oponente, na qualidade de responsável solidária pela dívida exequenda (art.º 48º, nº 2 da LGT).
III - A citação, para além de um efeito instantâneo, qual seja a eliminação do tempo decorrido anteriormente, tem ainda um efeito duradouro, que consiste em obviar ao início de um novo prazo durante o tempo em que estiver pendente o processo de execução fiscal.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA OS JUIZES DESEMBARGADORES DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I. RELATÓRIO

A Autoridade Tributária e Aduaneira recorre da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a reclamação deduzida por C… contra o acto do Sr. Chefe do Serviço de Finanças de Mafra de indeferimento do pedido de reconhecimento de prescrição da dívida em cobrança no processo de execução fiscal n.º 1546200701088254.

Termina as alegações de recurso, formulando as seguintes e doutas conclusões:
«

44- Visa o presente recurso reagir contra a douta Sentença proferida nos autos à margem melhor identificados, que julgou procedente a presente reclamação judicial apresentada por C…, concluindo pela anulação do ato reclamado e declarando prescrita a dívida subjacente ao processo de execução fiscal n.º 1546200701088254.
45- Neste âmbito, o thema decidendum, assenta em saber se a dívida em questão se encontra ou não prescrita.
46- Discorda a Fazenda Publica, com o devido respeito, do entendimento sufragado na douta sentença, e com o mesmo não se conforma, porquanto padece a douta sentença, por não ter feito uma correta interpretação e aplicação das normas estabelecidas mormente da Lei 1A/2020, da Lei 4B/2021 e da Lei 6E/2021, [que determinaram a suspensão de prazos no âmbito do contexto pandémico vivido no país], artigos 48º e 49º da LGT e artigo 239º do CPPT.
47- O PEF nº 1546200701088254 foi instaurado contra a reclamante em 03/11/2007 por dividas referente a IRS do ano de 2006, no montante de € 8.493.63.
48- Na origem do PEF está a declaração de IRS, entregue em 24/05/2007, através do Portal da Finanças assinada por ambos os sujeitos passivos, ou seja, por C… e J….
49- A ora recorrida apresentou requerimento onde peticionava a prescrição da divida exequenda sendo que tal pedido foi indeferido pelo SF, nos termos dos art.º 48.º e 49º da Lei Geral Tributária (LGT) conjugado com os artigos 326.º e 327.º do Código Civil (CC).
50- Pois, sendo o processo de execução referente a dívida de IRS de 2006, o início da contagem do prazo de prescrição começaria em 01/01/2007, pelo que, a prescrição ocorreria em 01/01/2015.
51- Todavia, existiu um facto interruptivo, a saber, a citação de J… que ocorreu em 21/04/2008, que veio obstar ao reinicio de novo prazo de prescrição, [Ref. ao Acórdão STA, Processo n.º 01300/17, de 06/12/2017].
52- Ou seja, em 21/04/2008, ao abrigo do disposto no art.º 49º n.º 1 da LGT, o prazo prescricional foi interrompido.
53- A Lei nº 53-A/2006, de 29/12, que entrou em vigor em 2007-01-01, revogou o nº 2 no art.º 49.º da LGT.
54- Nessa sequência, eventos interruptivos do prazo de prescrição terão sempre como efeito próprio o de inutilizar todo o tempo até aí decorrido, não cessando o efeito por eventual paragem do processo por período superior a um ano por facto não imputável ao sujeito passivo.
55- Com a revogação do nº 2 do art.º 49.º da LGT, deixou de haver norma que defina os efeitos dos atos interruptivos, entende-se que deverá recorrer-se à aplicação subsidiária, das normas contidas nos arts. 326.º e 327.º, ambos do Cód. Civil, ex vi do art.º 2.º al. d) da LGT.
56- Assim, iniciada a contagem do prazo de prescrição quanto à dívida de IRS de 2006 nos termos do art.º 48.º n.º 1 da LGT, em 01-01-2007, tal contagem ter-se-á interrompido em 21/04/2008, data em que foi citado J… da instauração do processo executivo.
57- Interrupção esta que inutilizou para efeitos da prescrição todo o tempo anteriormente decorrido, e ainda determinou que o novo prazo de prescrição não começasse a correr enquanto não findar o processo executivo.
58- Nesta senda acompanhamos o Ilustre Parecer da Magistrada do Ministério Publico quando refere que: “Ora, neste caso concreto não documentam os autos que o processo de execução fiscal, a que os presentes autos se referem, se encontre extinto, pelo que ainda não se iniciou novo prazo de prescrição, não estando, consequentemente, a dívida exequenda prescrita.”
59- E que,

60- “Sendo a Reclamante responsável solidária aplica-se o disposto no nº 2, do artigo 48º, da LGT, ou seja, são-lhe aplicáveis as causas de suspensão e interrupção da prescrição, não lhe sendo, porém, aplicável o nº 3, do mesmo artigo, pelo que a dívida não se mostra prescrita.”
61- Discorda ainda, a Fazenda Publica, com o devido respeito também do entendimento sufragado pelo douto tribunal quando defende que: “A ratio legis das disposições legais em causa – [a Lei 1A/2020, a Lei 4B/2021 e a Lei 6E/2021] - que determinaram a suspensão de prazos teve como escopo essencial que os direitos dos particulares não fossem coartados.
Assim, se as pessoas se encontravam em confinamento estavam impedidas de se dirigir às entidades para consultarem processos ou pedirem informações. Por isso não faria sentido que os prazos para reagir a determinados atos e decisões continuassem a correr, considerando que as pessoas não conseguiriam, em virtude do confinamento imposto, apresentar as suas reações. (…) Ou seja, o que o legislador visou proteger foram os direitos dos particulares”
62- Uma vez que,
63- Nos termos do n.º 3 do artigo 7º da Lei 1 A/2020 “A situação excecional constitui igualmente causa de suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os tipos de processos e procedimentos”.

64- Já a Lei 4-B/2021 de 01-02-2021 que veio alterar a Lei 1-A/2020 de 19 de março veio estabelecer n.º 6 do mesmo artigo da citada norma “O disposto no presente artigo aplica-se ainda, com as necessárias adaptações, a:

(…)
c) “Prazos administrativos e tributários que corram a favor de particulares”. (sublinhado e negrito nosso).
65- Vem ainda o n.º 7 do artigo 7º estabelecer “Os prazos tributários a que se refere a alínea c) do número anterior dizem respeito apenas aos atos de interposição de impugnação judicial, reclamação graciosa, recurso hierárquico, ou outros procedimentos de idêntica natureza, bem como aos prazos para a prática de atos no âmbito dos mesmos procedimentos tributários.”
66- Ora, entende a Fazenda Pública, que o no n.º 6 não é norma especial relativamente ao n.º 3.
67- Na verdade, o n.º 6 vem acrescentar “outras situações” equiparando-as ao n.º 3.
68- Salvaguardando melhor opinião, entendemos que a disposição do o n.6 aplica-se a prazos tributários, estando este raciocínio de acordo com o n.º 7 do artigo 7º da citada norma.
69- Não se encontrando a presente dívida prescrita!
70- Caso não se concorde com a Fazenda Publica, sempre se dirá que, nunca poderia a douto tribunal a quo declarar prescrita a divida subjacente aos presentes autos, de forma geral, mas tão só declará-la prescrita em relação à ora recorrida, pois ao decretar no decisório que julga a presente reclamação procedente e em consequência, anula o ato reclamado declarando prescrita a dívida subjacente ao processo de execução fiscal n.º 1546200701088254, está a declarar prescrita a dívida exequenda prescrita igualmente para o outro executado.
71- Ora, para além de o mesmo não ser parte no presente processo, pelas razões já expostas, não pode a dívida ser declarada prescrita quanto a ele, pois que, relativamente a ele, dúvidas não sobejam que foi citado dentro do prazo de caducidade com todos as consequências daí inerentes.

72- Nestes termos, a Sentença ora recorrida, ao decidir como efetivamente o fez, estribou o seu entendimento numa inadequada valoração da matéria de direito e de facto relevante para a boa decisão da causa, por não ter feito uma correta interpretação e aplicação das normas estabelecidas mormente da Lei 1A/2020, a Lei 4B/2021 e a Lei 6E/2021, [que determinou a suspensão de prazos no âmbito do contexto pandémico vivido no país], artigos 48º e 49º da LGT e artigo 239º do CPPT.
73- Assim, face ao exposto, deve ser dado provimento ao presente recurso e consequentemente revogada a sentença recorrida.
Nestes termos e nos demais de Direito, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida.
PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO
A COSTUMADA JUSTIÇA!».


A Recorrida apresentou contra-alegações, cujo desentranhamento dos autos, por intempestivas, foi ordenado por despacho de 09/08/29022 da Mma. Juiz a quo.

A Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu mui douto parecer concluindo no sentido de que não se mostra prescrita a dívida exequenda de IRS do ano de 2006.

Com dispensa dos vistos legais dada a natureza urgente do processo e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.

II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Assim, analisadas as conclusões das alegações do recurso, a questão que importa resolver reconduz-se a indagar da prescrição da dívida.
***

III. FUNDAMENTAÇÃO
A) OS FACTOS
Na sentença recorrida, deixou-se factualmente consignado:
«
De acordo com a prova documental constante dos autos, com interesse para a decisão da causa, consideram-se provados, os seguintes factos:

A) Em 30 de Outubro de 2007 foi instaurado pelo Serviço de Finanças de Mafra, contra a Reclamante e J…, o processo de execução fiscal n.º 1546200701088254, referente a IRS do ano de 2006, no valor de € 8.493,63, com data de pagamento voluntário até 3 de Outubro de 2007.

(Cfr. certidão de dívida a fls. 40 e 41 dos autos)
B) Por ofício datado de 3 de Novembro de 2007 o Serviço de Finanças de Mafra elaborou comunicação dirigida a J…, denominada “citação pessoal”, no âmbito do processo de execução fiscal identificado na alínea anterior, identificando a dívida como IRS referente ao ano de 2006.

(Cfr. documento a fls. 42 dos autos)
C) Em 21 de Abril de 2008 foi assinado pela Reclamante, aviso de recepção respeitante a comunicação dirigida a J…, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 1546200701088254.

(Cfr. documento a fls. 43 dos autos)
D) Em 16 de Março de 2022 foi emitida informação, que mereceu despacho de concordância do Chefe do Serviço de Finanças de Mafra, da qual se extrai que a dívida em causa não se encontra prescrita, do mesmo constando, nomeadamente, o seguinte teor:

“(…) Em conclusão:
Consta como causa interruptiva, a citação que ocorreu em 2008-04-21, obstando ao reinício de novo prazo de prescrição. (Acórdão STA Processo: 01300/17, de 06-12-2017)
Constam como causas suspensivas:
- O período de pagamento em prestações entre 2008-06-09 e 2010-01-19, altura em que foi interrompido o PPP.
- O período de 2012-06-21 e 2018-03-08 consequência do processo de insolvência
16412/12.4T2SNT.
- E ainda as suspensões de COVID decretadas entre 09-03-2020 e 30-06-2020, Lei n.º 1-A/2020 alterada pela Lei n.º 4-A/2020, e cujo fim foi posteriormente definido pela Lei n.º 16/2020, e entre 22-01-2021 e 06-04-2021 conforme instituído na Lei n.º 4-B/2021 e Lei n.º 13-B/2021.”
(Cfr. documento a fls. 37 a 39 dos autos)

E) Em 17 de Março de 2022, a informação e despacho constantes na alínea anterior foram remetidos pelo Serviço de Finanças de Mafra à mandatária da Reclamante.

(Cfr. documento a fls. 23 dos autos)
*
Factos não provados:
1. O Serviço de Finanças de Mafra remeteu à Reclamante, citação, no âmbito do processo de execução fiscal n.º 1546200701088254. (Ausência de meio de prova)
*
Motivação: A decisão sobre a matéria de facto realizou-se com base na análise do teor dos documentos constantes nos autos, conforme referido a propósito de cada alínea do probatório.
O facto não provado foi assim considerado, tendo em conta que não se encontra junto do respectivo processo de execução fiscal, qualquer documento de citação remetido pelo Serviço de Finanças à Reclamante.».

B. DE DIREITO

Como ressalta dos autos, a sentença recorrida julgou prescrita a dívida exequenda relativamente à reclamante co-executada, no pressuposto entendimento de que, não tendo sido citada na execução, mas unicamente o seu cônjuge, inexiste causa de interrupção que lhe possa ser oposta.

Todavia e salvo o devido respeito, não concordamos com tal entendimento, aliás na linha do que tem vindo a ser defendido pela doutrina e pela jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo e decidido por este tribunal.

Factualmente, resulta dos autos e do probatório que a oponente figura no título (certidão de dívida) como co-executada no processo n.º 1546200701088254, que corre por dívida de IRS/2006.
Conforme também consta da informação executiva que suporta o despacho de 16/03/2022, de não reconhecimento da prescrição da dívida (cf. ponto D) do probatório), O processo 1546200701088254, tem a sua génese na declaração de IRS entregue pela internet, por ambos os cônjuges, em 2007-05-24, e a que foi atribuído o número 1546-2006-I7136-97.
Da referida declaração constam para além dos executados, um dependente com idade superior a 3 anos.
(…)”.

Ilustram ainda os autos e o probatório que foi citado para a execução em 21/04/2008, o cônjuge marido, J…, mas não o cônjuge co-executado, C…, reclamante e ora recorrida (cf. ponto C) dos factos provados e ponto 1 dos factos não provados).

Visto o que factualmente importa, como se deixou consignado no recente ac. deste TCAS, de 05/12/2022, tirado no proc.º351/21.0BECTB, «…tratando-se de dívida de IRS (…), esta é da responsabilidade de ambos os cônjuges desde que o agregado familiar seja integrado por cônjuges não separados de pessoas e bens, sendo que os pressupostos do facto tributário se verificam em relação a ambos e cumprindo-se a responsabilidade solidária dos cônjuges independentemente da titularidade de cada parcela do rendimento englobado para efeitos de tributação (cfr. art. 13º, nº 2 do Código do IRS, na redacção aplicável à data, Ac. TCA Sul de 31.03.2016 proc. 07966/13).

Tal como se enuncia no Acórdão deste TCA Sul de 31/03/2016 – proc. 07966/13 “Temos, assim, que o agregado familiar é a unidade económica relativamente à qual se afere a tributação, neste caso conjunta e não separada (cfr.artº.104, nº.1, da Constituição da República; artº.21, nº.1, da L.G.Tributária; artº.13, nº.2, do C.I.R.S.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 15/2/2011, proc.4407/10; Rui Duarte Morais, Sobre o I.R.S., 2ª. edição, Almedina, 2010, pág.28 e seg.). Mais, existindo agregado familiar, o cumprimento dos deveres fiscais deste e relativos à tributação do seu rendimento cabe às pessoas que exerçam a sua direcção, em regra os cônjuges, assim existindo uma titularidade plural das obrigações fiscais e uma responsabilidade solidária de ambos os cônjuges pela dívida de imposto.».

Nesta sequência e como refere Joaquim Freitas da Rocha, “Lições de Procedimento e de Processo Tributário”, 5ª Edição, Coimbra Editora, Pag.477 “No que diz respeito aos devedores solidários, a interrupção opõe-se-lhes, na medida em que estamos na presença de pessoas que figuram como sujeitos passivos desde a constituição da relação jurídica tributária (pense-se, por exemplo, nas dívidas de IRS dos cônjuges), de modo que não se justificaria qualquer regime distintivo neste ou em outros pontos.”.

Nos mesmo sentido pode ver-se o recente ac. do STA, de 06/22/2022, tirado no proc.º 02506/18.6BEPRT, de cujo sumário doutrinal se fez constar: «A citação do responsável solidário em processo de execução fiscal produz efeitos interruptivos da prescrição relativamente ao responsável originário».

E ainda o ac. deste TCAS, de 05/12/2022, já citado, de que consta: «Com a citação do cônjuge da oponente (…), o prazo de prescrição interrompeu-se, tal prazo interrompeu-se relativamente a este executado, mas também em relação à oponente, na qualidade de responsável solidária pela dívida exequenda (art. 48º, nº 2 da LGT)».

Isto assente e como também constitui jurisprudência pacífica do STA, a citação, para além de um efeito instantâneo, qual seja a eliminação do tempo decorrido anteriormente, tem ainda um efeito duradouro, que consiste em obviar ao início de um novo prazo durante o tempo em que estiver pendente o processo de execução fiscal.

Nesse sentido pode ver-se, entre muitos outros, o Ac. do alto tribunal de 05/26/2021, proc.º 0518/20.9BELLE, em que se deixou consignado: «Nas leis tributárias prevêem-se factos a que é atribuído efeito interruptivo da obrigação tributária, pelo que não há que fazer apelo às normas do C.Civil, no que concerne a determinar os factos interruptivos. Porém, os efeitos da interrupção da prescrição não estão completamente regulados, assim devendo aplicar-se, quanto a estes, subsidiariamente o regime do Código Civil.
Com estes pressupostos, é legal a aplicação do regime consagrado no artº.327, nº.1, do C.Civil (normativo aplicável "ex vi" do artº.2, al. d), da L.G.T.), face ao acto interruptivo que se consubstancia na citação em processo de execução fiscal, o qual ostenta um efeito duradouro derivado do novo prazo de prescrição não começar a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo (…)».

E ainda, o seu Ac. de 05/12/2021, proc.º 015/21.5BECTB, em que pode ler-se: «A jurisprudência reconhece à interrupção da prescrição decorrente da citação do executado (n.º 1 do artigo 49.º da Lei Geral Tributária) um duplo efeito: por um lado, a inutilização para a prescrição de todo o tempo até então decorrido (efeito instantâneo, decorrente do n.º 1 do artigo 326.º do Código Civil) e, por outro, o novo prazo de prescrição não voltar a correr enquanto não transitar em julgado a decisão que puser termo ao processo (efeito duradouro, decorrente do n.º 1 do artigo 327.º do Código Civil).
O reconhecimento desse efeito duradouro não viola os princípios constitucionais da legalidade, da certeza e da segurança jurídicas nem as garantias dos contribuintes».

Nesta linha de raciocínio, conclui-se que a citação do cônjuge da reclamante em 21/04/2008 interrompeu o prazo de prescrição (art.º 49/1 da LGT), cuja contagem não se reinicia até ao termo do processo executivo (art.º 327/1 do Cód. Civil), sendo irrelevante que tenham ocorrido outras eventuais causas de suspensão do prazo.

E tal interrupção é oponível à reclamante, aqui recorrida, por via da responsabilidade solidária (artigos 21/1 e 48/2, ambos da LGT).

Nessa medida, a dívida não está prescrita.

A sentença recorrida, ao concluir pela inoponibilidade à reclamante da causa interruptiva da citação do seu cônjuge e co-executado, incorreu em erro de julgamento, sendo de revogar e conceder provimento ao recurso.

Em vista da procedência da apelação, importaria conhecer das questões colocadas na P.I., cujo conhecimento a sentença deu por prejudicado em vista da solução dada ao litígio (cf. art.º 665/2 do CPC).

Sucede, porém, que a questão prejudicada se reconduz à ilegitimidade substantiva da reclamante para a execução (vd. artigos 30.º e ss. da douta P.I.).

Ora, como já salientado no douto parecer do Sr. Procurador da República na 1.ª instância e reiterado nesta instância pela Exma. Senhora PGA, o meio processual adequado para se discutir a ilegitimidade substantiva é a oposição à execução fiscal (art.º 204.º do CPPT), não sendo meio idóneo para essa finalidade a reclamação judicial.

Trata-se, pois, de fundamento manifestamente improcedente, não discutível em processo de reclamação, o que outrossim, impossibilita o conhecimento das questões de constitucionalidade aferidas à responsabilidade dos cônjuges, em particular da reclamante, pela dívida exequenda.


IV. DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes de turno deste Tribunal Central Administrativo Sul em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar a reclamação totalmente improcedente.

Condena-se a recorrida em custas, não sendo, porém devidas no recurso dado as contra-alegações terem sido desentranhadas em 1.ª instância (a tributação devida é pelo incidente).

Lisboa, 15 de Setembro de 2022


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Vital Lopes



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Luísa Soares



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Tânia Meireles da Cunha