Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06579/13
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:05/07/2013
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:APLICAÇÃO DA LEI TRIBUTÁRIA NO ESPAÇO. PRINCÍPIO DA TERRITORIALIDADE.
I.R.S. ELEMENTO DE CONEXÃO PESSOAL “RESIDÊNCIA”. ARTº.16, Nº.1, ALS.A) E B), DO C.I.R.S.
REGIME DE TRIBUTAÇÃO DAS MANIFESTAÇÕES DE FORTUNA.
ARTº.89-A, DA L. G. TRIBUTÁRIA, NA REDACÇÃO RESULTANTE DA LEI 94/2009, DE 1/9.
ÓNUS DA PROVA.
I.R.S. JUSTIFICAÇÃO PARCIAL DE RENDIMENTOS.
ARTº.104, Nº.1, DA C.R.PORTUGUESA.
PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PROPORCIONALIDADE. ARTº.18, Nº.2, DA C.R.PORTUGUESA.
Sumário:1. A evolução dos sistemas tributários, com reflexos nas normas de aplicação da lei tributária no espaço, ditou a conceptualização do princípio da territorialidade, presentemente consagrado no artº.13, da L.G.Tributária, em acepções que importam, designadamente, na consideração de elementos de conexão pessoal e real.
2. Em sede de I.R.S., o elemento de conexão pessoal “residência” assume predominante importância, ao qualificar como sujeito passivo do imposto as pessoas singulares que, alternativamente, tenham permanecido no território português por mais de 183 dias, seguidos ou interpolados, ou aquelas que, tendo permanecido menos tempo, disponham no território português, em 31 de Dezembro, de habitação em condições que façam supor a intenção de a manter e ocupar como residência habitual (artº.16, nº.1, als.a) e b), do C.I.R.S.).
3. A Lei 30-G/2000, de 29/12, com o aditamento à L. G. Tributária da al.d), do nº.2, do artº.75, e do artº.89-A, excluiu da presunção de veracidade das declarações do contribuinte os casos em que os rendimentos declarados para efeitos de I.R.S. se revelem desproporcionados, para menos, sem razão justificativa, dos padrões de rendimento indiciados por determinadas manifestações de fortuna.
4. Neste caso, em que as manifestações exteriores de riqueza estejam em desproporção com os rendimentos declarados, passou a permitir-se à Fazenda Pública que proceda à avaliação indirecta da matéria tributável (cfr.artº.87, al. d), da L.G.Tributária - normativo aditado pela referida Lei nº.30-G/2000, de 29/12), a menos que o contribuinte prove que os rendimentos declarados correspondem à realidade (inversão do ónus da prova) e que a fonte dos rendimentos necessários para assegurar as manifestações de fortuna evidenciadas é outra (cfr.artº.89-A, nº.3, da L.G. Tributária). A prova exigida ao sujeito passivo (para efeitos de ilisão da presunção em causa) cinge-se apenas quanto à fonte das manifestações de fortuna evidenciadas, por forma a determinar se as mesmas foram omitidas à declaração de rendimentos para efeitos de I.R.S.
5. Nos termos do nº.4, do artº.89-A, da L. G. Tributária (normativo inspirado no direito fiscal francês, nomeadamente no disposto no artº.168 do “Code Général des Impôts”), se o sujeito passivo não fizer a prova acima referida, considera-se como rendimento tributável em sede de I.R.S., categoria G (incrementos patrimoniais), o rendimento padrão apurado nos termos da tabela consagrada naquele preceito legal (para as aquisições de imóveis de valor superior a € 250.000,00, o rendimento padrão é de 20% do valor da aquisição), a menos que existam indícios fundados, de acordo com os critérios previstos no artº.90, da L. G. Tributária, que permitam à A. Fiscal fixar rendimento superior.
6. Para além do requisito do valor de aquisição, é ainda necessário, para se aplicar o artº.89-A, da L. G. Tributária (na redacção resultante da Lei 94/2009, de 1/9), que se verifiquem, em alternativa, alguma das seguintes condições:
a-Falta de entrega da declaração de rendimentos;
b-O rendimento líquido declarado em sede de I.R.S., no ano em causa, mostre uma desproporção superior a 50%, para menos, em relação ao rendimento padrão a que se refere a tabela prevista no nº.4, do mesmo normativo.
7. É à A. Fiscal que compete comprovar a existência de aquisições de valor superior ao definido na tabela do nº.4, do artº.89-A, da L. G. Tributária, em cada ano, para que possa fixar o rendimento tributável por avaliação indirecta. Por sua vez, ao contribuinte compete demonstrar perante a Administração Tributária, ou perante o Tribunal, quais as fontes de rendimento que lhe permitiram efectuar as aquisições de bens referidas no artº.89-A, da L. G. Tributária. Mais concretamente, a prova exigida ao contribuinte é apenas quanto à fonte das manifestações de fortuna evidenciadas, por forma a determinar se as mesmas foram omitidas à declaração para efeitos de I.R.S. Se ela não for efectuada, está-se perante uma situação de omissão da declaração de rendimentos, pois o contribuinte despendeu mais do que os rendimentos declarados, pelo que é legítimo o uso de avaliação indirecta da matéria tributável. Já se o contribuinte provar que a fortuna foi obtida em anos anteriores, emerge a presunção de que a sua declaração de rendimentos do ano em causa corresponde à verdade
8. Admite a doutrina e a jurisprudência mais recentes a possibilidade do afastamento parcial da presunção de rendimento consagrada no examinado artº.89-A, da L.G.T., no que respeita à fixação do rendimento sujeito a tributação como “incremento patrimonial” em sede de I.R.S., nas situações em que o sujeito passivo somente faz prova parcial da fonte dos seus sinais exteriores de riqueza (v.g.celebração de empréstimo bancário para adquirir imóvel). Nestes termos, embora só a justificação total do montante que permitiu a verificação da “manifestação de fortuna”, tenha a virtualidade de afastar a aplicabilidade da determinação indirecta dos rendimentos que permitiram tais sinais exteriores de riqueza, já assim não é, contudo, no que respeita à fixação do rendimento sujeito a tributação como “incremento patrimonial” em sede de I.R.S., onde a justificação parcial há-de relevar para a fixação presuntiva do montante do “acréscimo patrimonial não justificado” sujeito a imposto. Pelo que, tendo o contribuinte demonstrado que recorreu a empréstimos bancários para adquirir imóveis cujo valor determinou a avaliação indirecta da matéria colectável, nos termos do artº.89-A, da L.G.T., a quantificação do rendimento tributável assim operado deve ser igual a 20% do valor de aquisição, mas deduzindo-se a este valor de aquisição o montante de tais empréstimos bancários, já que o respectivo montante destes não está, nem pode estar, sujeito a I.R.S., não podendo, consequentemente, ser presumido ou considerado como rendimento sujeito a tributação.
9. O artº.104, nº.1, da C.R.Portuguesa, consagra as características a que deve estar sujeito o imposto sobre o rendimento pessoal, o qual deve ser único e progressivo, mais devendo visar a diminuição das desigualdades económicas dos cidadãos. A unicidade do imposto quer dizer que todos os rendimentos pessoais devem ser englobados num único imposto, de forma a tomar em conta o seu montante global. A progressividade quer dizer que a taxa deve ser tanto maior quanto mais elevado for o rendimento global do contribuinte.
10. O princípio da proporcionalidade, consagrado no artº.18, nº.2, da C.R.Portuguesa, como pressuposto material para que se verifique uma restrição legítima de direitos, liberdades e garantias (também chamado princípio da proibição do excesso) desdobra-se em três subprincípios: (a) princípio da adequação (também designado por princípio da idoneidade), isto é, as medidas restritivas legalmente previstas devem revelar-se como meio adequado para a prossecução dos fins visados pela lei (salvaguarda de outros direitos ou bens constitucionalmente protegidos); (b) princípio da exigibilidade (também chamado princípio da necessidade ou da indispensabilidade), ou seja, as medidas restritivas previstas na lei devem revelar-se necessárias (tornaram-se exigíveis), porque os fins visados pela lei não podiam ser obtidos por outros meios menos onerosos para os direitos, liberdades e garantias; (c) princípio da proporcionalidade em sentido restrito, que significa que os meios legais restritivos e os fins obtidos devem situar-se numa “justa medida”, impedindo-se a adopção de medidas legais restritivas desproporcionadas, excessivas, em relação aos fins obtidos. Em qualquer caso, há um limite absoluto para a restrição de “direitos, liberdades e garantias”, que consiste no respeito do “conteúdo essencial” dos respectivos preceitos.


O relator

Joaquim Condesso
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
A...E B..., com os demais sinais dos autos, deduziram recurso dirigido a este Tribunal da sentença proferida pela Mmª. Juíza do T.A.F. de Sintra, exarada a fls.252 a 262 do presente processo, através da qual julgou totalmente improcedente salvatério de decisão de avaliação da matéria colectável, por métodos indirectos, em sede de I.R.S., relativa ao ano de 2009 e interposto nos termos do artº.89-A, nºs.7 e 8, da L. G. Tributária.
X
O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.282 a 291 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:
1-O recorrente marido exerceu a sua actividade na Rússia onde os recorrentes pagaram o seu I.R.S., entre 2004 e 2010. Conforme documentação constante dos autos emitida pelas autoridades fiscais russas;
2-Em matéria de residência fiscal, os recorrentes foram residentes na Rússia nos anos de 2004, 2005 e 2006;
3-E foram considerados como residentes fiscais no Brasil no período entre 1/01/2007 e 31/12/2011, conforme atestado de residência fiscal emitido pela Autoridade Tributária Brasileira;
4-Sem embargo, o recorrente marido obteve, também em 2008 e 2010, rendimentos na Rússia onde foram declarados e tributados, conforme documentos juntos aos autos;
5-Os pedidos de inscrição dos recorrentes como residentes não habituais em Portugal, com efeitos ao ano de 2011, ainda não se encontram decididos definitivamente pela DSRC porque aqueles serviços fiscais decidiram que o seu deferimento deverá aguardar o trânsito em julgado da decisão final a proferir nos presentes autos;
6-A aquisição do imóvel em causa ocorreu em 22/12/2009. Ou seja a 9 dias de terminar o ano de 2009. Mesmo que se pretendesse concluir que a partir daquela aquisição, os recorrentes passaram a ser residentes em Portugal em 2009, tal não seria legalmente possível, porque eles não teriam residido em Portugal, nesse ano, os 183 dias legalmente requeridos;
7-A aquisição em causa respeita a um terreno com uma casa em ruínas que foi de imediato demolida. A reconstrução da casa ainda hoje não se encontra sequer concluída. Por isso, de facto, seria objectivamente impossível tratar-se de uma aquisição para habitação permanente imediata. Mas, antes, de uma aquisição de um terreno para construção de uma futura habitação própria dos recorrentes. A prova é que a residência actual dos recorrentes que consta dos autos e aquela que consta do cadastro dos serviços fiscais e para onde foi remetida a liquidação em causa é outra e não aquela onde se situa o imóvel adquirido em 2009;
8-Por essa mesma razão, tal como diz a sentença recorrida: “(T)... não está registada nenhuma isenção referente a IMI”. Pela simples razão de que tal isenção não foi nem poderia ter sido legalmente requerida por não se tratar da residência efectiva dos recorrentes;
9-A fonte da manifestação de fortuna em causa nos autos, evidenciada pela aquisição ocorrida em 2009, proveio de recurso ao crédito e de poupanças próprias dos recorrentes, acumuladas em anos anteriores, no estrangeiro, onde eram residentes e onde os respectivos rendimentos foram tributados, pelo que não existiu qualquer omissão de rendimentos tributáveis em Portugal, por parte dos ora recorrentes;
10-Uma vez que, contrariamente ao decidido na douta sentença recorrida, os recorrentes não só não foram residentes em Portugal em 2009 como demonstraram que a fonte da manifestação de fortuna evidenciada foi o recurso ao crédito bancário e às poupanças acumuladas pelo casal nos anos anteriores, não poderia ter sido julgado improcedente o recurso, pelo que a sentença recorrida está inquinada do vício de erro de julgamento;
11-Pelo que deve ser revogada e substituída por outra que, reformulando o probatório em face da prova documental constante dos autos, julgue que a decisão de tributação por avaliação indirecta, não cumpre o disposto no artº.89-A, nºs.1 e 3, da L.G.T., e no artº.16, do Código do I.R.S.;
12-Ao considerar verificados os pressupostos legais exigidos pelas referidas normas e não considerar ilegal a decisão de tributação recorrida, a douta sentença recorrida retira daquelas normas uma interpretação que viola o disposto no artº.104, nº.1, da C.R.P., e incorre em violação do princípio constitucional da proporcionalidade ou da proibição do excesso, consagrado no artº.18, nº.2, da C.R.P.;
13-Normas jurídicas violadas: artº.89-A, nºs.1 e 3, da L.G.T., Artº.16, do Código do I.R.S., e artºs.26, nº.1, e 104, nº.1, da C.R.P.;
14-Nos termos sobreditos e noutros que V.Exas, doutamente, suprirão, deverá ser concedido provimento ao presente recurso por provado, revogando-se a decisão recorrida, que enferma de ilegalidade, por vício de violação de lei, por não se verificarem os pressupostos legais enunciados no artº.89-A, nº.1, da L.G.T., bem como no artº.16, do Código do I.R.S.
X
Contra-alegou o recorrido, o qual pugna pela confirmação do julgado, sustentando nas conclusões o seguinte (cfr.fls.321 a 331 dos autos):
1-A douta sentença “a quo”, ao decidir que “a Administração Tributária provou os pressupostos legais vinculativos da sua actuação, que justificaram a fixação da matéria tributável de acordo com o estabelecido no artigo 89-A da LGT e não tendo os Recorrentes demonstrado, como lhes competia quer perante a Administração Tributária, ou perante o Tribunal, quais as fontes da manifestação evidenciada que lhe permitiram a aquisição do bem, forçoso é de concluir que o acto de fixação da matéria tributável ora sindicado é legal.”, procedeu a uma fundamentada e correcta fixação dos factos provados e subsunção dos mesmos aos pressupostos do artº.89-A, da L.G.T., e do artº.16, do C.I.R.S.;
2-Razão por que deve ser mantida;
3-Nos termos do artº.19, da Lei Geral Tributária, a mudança de domicílio fiscal é ineficaz enquanto não for comunicada à Autoridade Tributária, o que significa que o contribuinte registado fiscalmente em Portugal como residente continua a ser tributado como residente até comunicar a sua residência fiscal para o estrangeiro;
4-A não se entender assim, aliás, não teria qualquer eficácia a consagração legal do dever de comunicação de residência;
5-In casu, os contribuintes, ora recorrentes, não fizeram prova de que não eram residentes em Portugal, uma vez que, para o fazer, deveriam, pelo menos, ter demonstrado, no que respeita aos rendimentos, que tinham permanecido em Portugal menos de 183 dias;
6-Para que pudessem ser considerados como não residentes em Portugal durante o período de tributação em causa, cabia aos contribuintes fazerem essa prova, como refere a sentença recorrida, por força do artº.343, do Código Civil, como pressuposto de que essa prova pudesse ser feita;
7-Na verdade, nenhum facto foi apresentado pelos contribuintes que demonstre que permaneceram em Portugal no período de tributação em causa por período superior a 183 dias;
8-Acresce que o facto de o contribuinte ser considerado fiscalmente residente no estrangeiro no período de tributação em crise, não significa que não possa ter sido residente em Portugal durante o mesmo período;
9-Só assim não aconteceria se as normas sobre a qualificação de residência fossem as mesmas em Portugal e no Brasil e que fossem as mesmas entidades que as interpretassem e aplicassem;
10-Se do facto de os recorrentes serem considerados fiscalmente residentes no Brasil resultasse automaticamente que não residiam em Portugal, não seriam então necessários, como é óbvio, os Acordos de Dupla Tributação Internacional que, precisamente, têm por função evitar conflitos de competência entre os Estados Contratantes;
11-As autoridades fiscais portuguesas, não obstante o Brasil considerar o recorrente marido fiscalmente residente nesse período, não estão vinculadas a qualificá-lo como não residente em Portugal no período em causa;
12-Essa qualificação só será possível, dada a presunção de residência que resulta da inscrição no registo dos contribuintes, se os recorrentes demonstrarem a inexistência de qualquer dos pressupostos de que depende a sua qualificação como não residente de acordo com o artº.16, do C.I.R.S.;
13-Refira-se, aliás, que o artº.4, nº.1, da Convenção entre a Portugal e o Brasil para Evitar a Dupla Tributação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Impostos Sobre o Rendimento, prever a possibilidade de um contribuinte ser considerado residente nos dois Estados;
14-Havendo conflito de residências, caberia, ainda assim, aos contribuintes proceder à sua resolução nos termos da Convenção, designadamente nos termos do artº.15, o que não fizeram;
15-A verdade é que os contribuintes não fizeram prova de que não residiram permanentemente em Portugal entre 2007 e 2011, motivo pelo qual a A.T. agiu bem quando os considerou fiscalmente residentes em Portugal;
16-A documentação apresentada na pendência dos presentes autos limitou-se a comprovar que os recorrentes residiam no Brasil durante determinado período de tempo, mas não faz prova que não residiam em Portugal;
17-Independentemente de que a argumentação ora articulada pelos recorrentes bem como a documentação posteriormente junta aos autos, mostra-se, no mínimo, incongruente com o articulado no artº.11 da petição de recurso, em que se diz que “A partir de 2004 e até 2010, inclusive, os requerentes foram residentes na Rússia, onde o recorrente exerceu a sua actividade, auferindo rendimentos e foi tributado”, como bem nota a sentença recorrida;
18-Ora, os recorrentes não fizeram prova de que no ano de 2009 não eram residentes em Portugal, nem que reuniam os requisitos do Estatuto de Não Residentes;
19-Ao que acresce o facto de não terem entregue a declaração Modelo 3 de l.R.S. referente àquele ano;
20-Pelo que, tal como se entendeu na douta sentença recorrida, “os Recorrentes não demonstraram a fonte dos rendimentos com que, nesse mesmo período, adquiriram o prédio urbano inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Cascais sob o artigo n° 7492 pelo valor de 1.830.000,00”, nos termos do artº.89-A, L.G.T., nº.1, e Tabela Anexa ao nº.2, e como impõe, quanto ao ónus probatório, o nº.3, do mesmo preceito legal;
21-Assim, a sentença “a quo” não merece qualquer censura, porquanto, face à lei e aos factos, a decisão recorrida é legal por se mostrarem verificados os pressupostos legais do artº.89-A, da L.G.T., e 16, nº.1, do C.l.R.S., devendo ser mantida;
22-Nestes termos e nos mais de Direito que V. Exas. Doutamente suprirão, deve negado provimento ao recurso jurisdicional interposto pelos ora recorrentes, mantendo-se a sentença sob recurso, com todas as legais consequências.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido do não provimento do presente recurso e consequente confirmação da sentença recorrida (cfr.fls.340 dos autos).
X
Sem vistos, atenta a natureza urgente do processo (cfr.artº.707, nº.4, do C.P.Civil; artº.36, nº.2, do C.P.T.A.), vêm os autos à conferência para decisão.
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FUNDAMENTAÇÃO
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DE FACTO
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A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.253 a 259 dos autos):
1-No dia 08/11/2011, os recorrentes apresentaram junto da Direcção de Serviços de Registos de Contribuintes um pedido de inscrição no cadastro fiscal como “Residentes Não Habituais” com o código 802 com efeitos desde o ano de 2010, onde fizeram constar designadamente o seguinte: “Nos últimos cinco anos não auferiram qualquer rendimento em Portugal nem mantiveram, com relação ao território e jurisdição Portuguesa, nomeadamente Fiscal, qualquer estado de residência.” (cfr.documento junto a fls.27 a 37 do processo administrativo apenso);
2-Em 21/11/2011, por despacho do Director de Serviços de Registo de Contribuintes o pedido de inscrição a que alude o nº.1 do probatório foi indeferido por extemporaneidade (cfr.documento junto a fls.113 a 115 do processo administrativo apenso);
3-No âmbito pedido de inscrição no cadastro fiscal como “Residente Não Habitual” (ano de 2011) apresentado em 28/12/2011 pela recorrente, foi emitida a informação nº.91/2012 de 03/02/2012 da qual se destaca:
“1. A contribuinte solicita a inscrição com o código 802 - Quadro Superior de Empresa, que esta actividade esta incluída na lista das actividades de elevado valor acrescentado, de acordo com o previsto na Portaria nº. 12/2010, de 7 de janeiro. No entanto não junta a declaração, onde comprova que é um cargo superior de empresa, isto é que é uma pessoa com cargo de direcção e poderes de vinculação de pessoa colectiva, juntando a necessária declaração ou procuração;
2. A inscrição em cadastro foi efectuada em 2000-11-21, na Loja do Cidadão de Lisboa 1, como residente, situação que se mantém até à presente data;
3. Não apresenta comprovativo da anterior residência e tributação no estrangeiro nos anos de 2006 a 2010, através do Certificado de Residência, de acordo com a alínea b) do nº.3 da Circular 2/2010, de 6 de maio, da DSIRS;
4. A contribuinte nunca apresentou qualquer declaração de rendimentos de IRS relativamente aos anos de 2006 a 2010;
5. No requerimento apresentado, solicita a opção por este regime desde 2011.
Pelo exposto, afigura-se ser de indeferir o pedido apresentado pela contribuinte B..., tendo em conta que a interessada não reúne os requisitos legalmente estabelecidos, a que se refere o ponto 3 da presente informação." (cfr.documento junto a fls. 127 a 129 do processo administrativo apenso);

4-No âmbito pedido de inscrição em cadastro fiscal como “Residente Não Habitual” (ano de 2011) apresentado em 28/12/2011 pelo recorrente foi emitida informação nº.90/2012, de 03/02/2012 da qual se destaca:
“1. O contribuinte refere que exerce funções de "Director Comercial” e que esta actividade que esta incluída na lista das actividades de elevado valor acrescentada (802), de acordo com o previsto na Portaria nº. 12/2010, de 7 de janeiro;
2. A inscrição em cadastro foi efectuada em 2001-12-11, no Serviço de Finanças de Oeiras 2, como residente, situação que se mantém até à presente data;
3. Não apresenta comprovativo da anterior residência e tributação no estrangeiro nos anos de 2006 a 2010, através de Certificado de Residência, de acordo com a alínea b) do nº.3 da Circular 2/2010, de 6 de maio, da DSIRS;
4.O contribuinte nunca apresentou qualquer declaração de rendimentos de IRS relativamente aos anos de 2006 a 2010;
5. No requerimento apresentado, solicita a opção por este regime desde 2011.
Pelo exposto, afigura-se-nos ser de indeferir o pedido apresentado pelo contribuinte A..., tendo em conta que o interessado não reúne os requisitos legalmente estabelecidos, a que se refere o ponto 3 da presente informação.” (cfr.documento junto a fls. 120 e 121 do processo administrativo apenso);

5-Em 02/04/2011, no âmbito do procedimento a que alude o nº.3 do probatório foi emitida a informação nº.198, da qual se extrai, designadamente, o seguinte:
“(…)
4. Em 2012-03-21, a contribuinte apresentou resposta com alegações, fora do prazo estabelecido dos 10 dias, para usufruir do Direito de Audição Prévia, na qual juntou cópias simples dos documentos em falta na referida informação do projecto decisão nº. 91/2012.
5. A contribuinte alegou que durante o ano de 2009, tirou um ano sabático para viajar, não tendo, preenchido os requisitos legais de tributação, deverá juntar caso não tenha residido fiscalmente, no ano de 2009, no pais supra mencionado, certificado de residência do pais, no qual foi considerado residente para efeitos fiscais (ainda que não tenha aí sido tributada).
6.(...)
Face ao exposto e de acordo com os factos constantes da informação Nº. 91/2012, proponho ser de manter, para todos os efeitos, a decisão de indeferimento relativamente ao pedido de inscrição como Residente Não Habitual de B....” (cfr.documento junto a fls.131 a 133 do processo administrativo apenso);

6-Em 02/04/2011, no âmbito do procedimento a que alude o nº.4 do probatório foi emitida a informação nº.199, da qual se extrai, designadamente, o seguinte:
“(…)
4. Em 2012-03-21, o contribuinte apresentou resposta com alegações, fora do prazo estabelecido dos 10 dias, para usufruir do Direito de Audição Prévia, na qual juntou cópias simples dos documentos em falta na referida informação do projecto decisão nº. 90/2012.
5. O contribuinte alegou que durante o ano de 2009, tirou um ano sabático para viajar, não tendo, preenchido os requisitos legais de tributação, deverá juntar caso não tenha residido fiscalmente, no ano de 2009, no país supra mencionado, certificado de residência do país, no qual foi considerado residente para efeitos fiscais (ainda que não tenha aí sido tributado).
6.(…)
Face ao exposto e de acordo com os factos constantes da informação Nº. 90/2012, proponho ser de manter, para todos os efeitos, a decisão de indeferimento relativamente ao pedido de inscrição como Residente Não Habitual de A....” (cfr.documento junto a fls.117 a 119 do processo administrativo apenso);

7-Em 13/04/2012, o Director de Serviços (em substituição) de Registo de Contribuintes exarou na informação a que aludem os nºs.5 e 6 do probatório os seguintes despachos: “Concordo, pelo que indefiro o pedido.” (cfr.documentos juntos a fls.117 a 119 e 131 a 133 do processo administrativo apenso);
8-Os recorrentes, na sequência dos despachos de indeferimento a que alude o nº.7 do probatório, deles interpuseram recurso hierárquico dirigido ao Ministro das Finanças, em cuja petição protestaram juntar documentos (cfr.documento nº.2 junto à p.i. dos presentes autos a fls.39 a 52 do processo);
9-Em 1/03/2012, a Divisão de Liquidação do Imposto Sobre Rendimento e Despesa emitiu a informação nº.663 sob o assunto:
“IRS-ANO DE 2009. MANIFESTAÇÃO DE FORTUNA, AVALIAÇÃO INDIRETA DA MATÉRIA COLECTÁVEL NOS TERMOS DA ALIENA D) DO Nº.1 DO ARTIGO 87 E DO ARTIGO 89-A AMBOS DA LEI GERAL TRIBUTARIA.
SUJ. PASSIVO: A...” da qual consta, designadamente, o seguinte:
“(...)
3. De acordo com a informação que a administração fiscal dispõe, no ano de 2009, adquiriu 1/2 indiviso do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Cascais sob o artigo 7492, pelo preço declarado de € 915.000,00, correspondente à parte indivisa transmitida.
4. O rendimento padrão referido no n.°4 do artigo 89°-A da LGT, corresponde a 20% do valor de aquisição do imóvel, ou seja, € 183.000,00.
5. Após a consulta às bases de dados da AT, constatou-se que não foi entregue declaração de rendimentos para o ano de 2009. A última declaração de rendimentos existente no sistema respeita ao ano de 2003.
6. Compulsado o SGRC verifica-se que o s.p. declarou a sua residência em Território Nacional. Na liquidação de IMT, previa à escritura de compra e venda em causa, o s.p. declarou manter a sua residência no Território Nacional.
7.Assim, conforme demonstrado, encontram-se reunidas as condições legais para, de acordo com a tabela a que se refere o n.°4 do referido artigo 89°-A, se proceder à fixação do rendimento tributável no montante de € 183.000,00, o qual, de acordo com a alínea d) do nº.1 do artº.9° do Código do IRS e nº.4 do artigo 89-A da LGT, será considerado com rendimento da categoria G.
7. Nos termos do nº.3 do referido artigo 89°-A da LGT, para obstar a avaliação indirecta da matéria colectável e ao procedimento da fixação referido no ponto anterior, o contribuinte poderá, querendo, fazer prova de que é outra das manifestações de fortuna evidenciadas e que não houve omissão de rendimentos sujeitos a tributação em sede de IRS.
8. Caso não efectue a prova referida no ponto anterior, ou venha a efectuar, mas não seja considerada válida e aceite pela administração fiscal, proceder-se-á à avaliação indirecta e afixação do rendimento tributável de acordo com o rendimento padrão referido anteriormente.” (cfr.documento junto a fls.11 a 13 do processo administrativo apenso);

10-Em 2/03/2012, a Divisão de Liquidação do Imposto Sobre Rendimento e Despesa emitiu a informação nº.664 sob o assunto:
“IRS-ANO DE 2009. MANIFESTAÇÃO DE FORTUNA. AVALIAÇÃO INDIRETA DA MATÉRIA COLECTÁVEL NOS TERMOS DA ALIENA D) DO Nº.1 DO ARTIGO 87° E DO ARTIGO 89-A AMBOS DA LEI GERAL TRIBUTÁRIA
SUJ. PASSIVO: KAREM FERREZ DALGAS FRISCH” da qual consta, designadamente, o seguinte:
“7. Assim, conforme demonstrado, encontram-se reunidas as condições legais para, de acordo com a tabela a que se refere o n.°4 do referido artigo 89°-A, se proceder à fixação do rendimento tributável no montante de € 183.000,00, o qual, de acordo com a alínea d) do nº.1 do art.9° do Código do IRS e n.°4 do artigo 89°-A da LGT, será considerado com rendimento da categoria G.
7. Nos termos do n.°3 do referido artigo 89°-A da LGT, para obstar a avaliação indirecta da matéria colectável e ao procedimento da fixação referido no ponto anterior, o contribuinte poderá, querendo, fazer prova de que é outra das manifestações de fortuna evidenciadas e que não houve omissão de rendimentos sujeitos a tributação em sede de IRS.
8. Caso não efectue a prova referida no ponto anterior, ou venha a efectuar, mas não seja considerada válida e aceite pela administração fiscal, proceder-se-á à avaliação indirecta e afixação do rendimento tributável de acordo com o rendimento padrão referido anteriormente.”
(cfr.documento junto a fls.16 e 17 do processo administrativo apenso);

11-Mediante ofícios nºs.20099 e 20098, datados de 6/03/2012, emitidos pela Divisão de Liquidação do Imposto Sobre o Rendimentos e Despesa, foram os recorrentes notificados do projecto de decisão de avaliação indirecta da matéria colectável do I.R.S. de 2009, com os fundamentos constantes na informações nºs.663 e 664, de 1/03/2012, para fazer prova, da fonte de manifestação de fortuna evidenciada (cfr.documentos juntos a fls.9/10 e 14/15 do processo administrativo apenso);
12-Os recorrentes exerceram o direito de audição prévia, tendo consignado, além do mais que: “(...) a partir de 2004, auferindo os requerentes rendimentos exclusivamente no ordenamento jurídico Russo, foi naquele Estado que apresentaram declaração de rendimentos e liquidaram impostos”, e uma vez que o processo de inscrição como “Residentes Não Habituais” teve início antes do processo de manifestações de fortuna, requereram a suspensão do procedimento de avaliação indireta da matéria colectável de I.R.S. do ano de 2009 até que fosse proferida decisão do procedimento na Divisão de Registo de Contribuintes (cfr.documento junto a fls.18 a 22 do processo administrativo apenso);
13-No âmbito do recurso hierárquico a que alude o nº.8 do probatório, os recorrentes solicitaram em 21/05/2012, a prorrogação do prazo de 30 dias para apresentação da tradução dos documentos pelo órgão decisor, o que foi deferido por despacho do Director dos Serviços de Registo de Contribuintes de 6/06/2012 (cfr.documentos juntos a fls.57 a 59 dos presentes autos);
14-Em 26/06/2012, foi proferido, pelo Director de Finanças de Lisboa, despacho de fixação da matéria coletável, em sede de I.R.S., nos termos dos artºs.87, al.d), e 89-A, nº.4, da L.G.T., fixando o rendimento tributável em € 126.000,00, para o ano de 2009, tendo por base informação da qual consta o seguinte:
“(…)
Não tendo sido comprovada a residência e tributação no estrangeiro, os contribuintes consideram-se residentes em território nacional, em conformidade com a inscrição cadastral e deste modo, sujeitos ao sistema fiscal aplicável em Portugal.
Apesar de não ter sido mencionado no âmbito do exercício do direito de audição prévia, o empréstimo de mútuo com hipoteca contraído no montante de € 1.200.000,00 (escritura de mútuo com hipoteca nº.6933(2) datada de 22/12/2009) deverá o mesmo ser considerado no apuramento da matéria colectável, dado que se encontra referido na Mod.11(...)”
(cfr.documento nº.1 junto à p.i. a fls.35 a 38 dos presentes autos);
15-Em 13/07/2012, os recorrentes requereram ao Director de Serviços da DSRC, no âmbito do recurso hierárquico a que alude o nº.8 do probatório, a junção dos documentos traduzidos, certificados pela Secção Consular da Embaixada da Rússia em Portugal referindo que os mesmos comprovam que “foram tributados como residentes na Rússia desde 2004 a 2010 como se demonstra pelas respectivas declarações fiscais russas equivalentes ao nosso IRS e agora traduzidas.” (cfr.documento junto a fls.162 e seg. do processo administrativo apenso);
16-Em 17/07/2012, os recorrentes requereram ao Director de Finanças de Lisboa a reapreciação do pedido de inscrição em cadastro fiscal como “Residentes Não Habituais” com referência ao ano de 2010, por considerarem que por força do artº.5, nº.2, da Lei 20/2012, de 14/5, deve aquele ser considerado tempestivo (cfr.documento junto a fls.158 e 159 do processo administrativo apenso);
17-Em 11/09/2012, a Secretaria da Receita Federal do Brasil atestou que o recorrente entre 1/01/2007 e 31/12/2011 auferiu rendimento no montante de 1.000,00 suportando imposto sobre renda no montante de 150,00 (cfr.documento junto a fls.217 e 218 dos presentes autos);
18-Consta dos autos a fls.224 a 226, Declaração de Ajuste Anual relativa a imposto de renda com referência ao ano de 2009, emitida pela Autoridade Tributária do Brasil e respectivo recibo, em nome do Recorrente e seu cônjuge B...(cfr.documento junto a fls.224 a 226 dos presentes autos);
19-No Detalhe de Declaração de Liquidação Modelo 11 relativa à aquisição do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Cascais sob o artigo 7492 operada mediante escritura pública de compra e venda de 22/12/2009, consta para efeitos de I.M.T., o Código 78 (prédio para habitação própria e permanente), e não está registada nenhuma isenção referente a I.M.I. (cfr.documentos junto a fls.151 e 154 do processo administrativo apenso);
20-No Sistema de Gestão e Registo de Contribuintes os recorrentes estão inscritos como residentes em Portugal (cfr.documentos juntos a fls.136/140 e 144/147 do processo administrativo apenso).
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A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Dos factos, com interesse para a decisão da causa, constantes da impugnação, todos objecto de análise concreta, não se provaram os que não constam na factualidade supra descrita…”.
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Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…Alicerçou-se a convicção do Tribunal na consideração dos factos provados nos documentos conforme referido em cada uma das alíneas do probatório…”.
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Dado que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou em prova documental constante dos presentes autos e apenso, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa relevante para a decisão e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.712, nº.1, al.a), do C. P. Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P. Tributário):
21-O rendimento colectável apurado no montante de € 126.000,00, para o ano de 2009, conforme o constante do nº.14 do probatório supra, foi calculado levando em consideração o empréstimo de mútuo com hipoteca contraído na quantia de € 1.200.000,00, tudo com base na seguinte operação: € 126.000,00 = 20% x (€ 1.830.000,00 - € 1.200.000,00), sendo considerado como rendimento da categoria G da cédula de I.R.S. (cfr.documento nº.1 junto à p.i. a fls.35 a 38 dos presentes autos).
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida decidiu, em síntese, julgar improcedente o recurso deduzido, em virtude de os recorrentes não terem efectuado a prova de que à data de aquisição do imóvel teriam outros rendimentos que justificassem a aquisição do mesmo, ónus da prova que lhes pertencia.
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Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artºs.685-A, do C.P.Civil; artº.282, do C.P.P.Tributário).
Aduzem os recorrentes, em primeiro lugar e como supra se alude, que foram considerados como residentes fiscais no Brasil no período entre 1/01/2007 e 31/12/2011, conforme atestado de residência fiscal emitido pela Autoridade Tributária Brasileira. Que a aquisição do imóvel em causa ocorreu em 22/12/2009. Ou seja a 9 dias de terminar o ano de 2009. Mesmo que se pretendesse concluir que a partir daquela aquisição, os recorrentes passaram a ser residentes em Portugal em 2009, tal não seria legalmente possível, porque eles não teriam residido em Portugal, nesse ano, os 183 dias legalmente requeridos (cfr.conclusões 1 a 8 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo, segundo cremos, assacar à decisão recorrida o vício de erro de julgamento de direito.
Examinemos se a sentença recorrida comporta tal pecha.
A evolução dos sistemas tributários, com reflexos nas normas de aplicação da lei tributária no espaço, ditou a conceptualização do princípio da territorialidade, presentemente consagrado no artº.13, da L.G.Tributária, em acepções que importam, designadamente, na consideração de elementos de conexão pessoal e real (cfr.Manuel Henrique de Freitas Pereira, Fiscalidade, Almedina, 2005, pág.203 e seg.; Alberto Xavier, Direito Tributário Internacional, 2ª. edição actualizada, Almedina, Março de 2007, pág.231 e seg.).
Em sede de I.R.S., o elemento de conexão pessoal “residência” assume predominante importância, ao qualificar como sujeito passivo do imposto as pessoas singulares que, alternativamente, tenham permanecido no território português por mais de 183 dias, seguidos ou interpolados, ou aquelas que, tendo permanecido menos tempo, disponham no território português, em 31 de Dezembro, de habitação em condições que façam supor a intenção de a manter e ocupar como residência habitual (artº.16, nº.1, als.a) e b), do C.I.R.S.; Alberto Xavier, Direito Tributário Internacional, 2ª. edição actualizada, Almedina, Março de 2007, pág.285 e seg.; Rui Duarte Morais, Sobre o I.R.S., 2ª. edição, Almedina, 2010, pág.17 e seg.).
Recorde-se que a lei fiscal faz coincidir o conceito de residência habitual com o conceito de domicílio fiscal, no que se refere às pessoas singulares (cfr.artº.19, nº.1, al.a), da L.G.T.).
“In casu”, os recorrentes estavam inscritos como residentes em Portugal, mais constando da declaração mod. 11 a aquisição do imóvel para habitação própria e permanente (código 78) no ano de 2009 (cfr.nºs.3, 4 e 19 do probatório). Nestes termos, os recorrentes, no ano de 2009, tinham residência em Portugal, pelo preenchimento dos requisitos exigidos no artº.16, nº.1, al.b), do C.I.R.S.
Perante tal circunstancialismo fáctico, não contrariado pelos recorrentes, não merece censura a posição da Administração Tributária ao considerar os mesmos residentes em Portugal, assim se devendo negar provimento ao presente fundamento do recurso e confirmar a decisão recorrida neste segmento.
Mais alegam os recorrentes que a fonte da manifestação de fortuna em causa nos autos, evidenciada pela aquisição ocorrida em 2009, proveio de recurso ao crédito e de poupanças próprias dos recorrentes, acumuladas em anos anteriores, no estrangeiro, onde eram residentes e onde os respectivos rendimentos foram tributados, pelo que não existiu qualquer omissão de rendimentos tributáveis em Portugal. Que a decisão de tributação por avaliação indirecta, não cumpre o disposto no artº.89-A, nºs.1 e 3, da L.G.T., e no artº.16, do Código do I.R.S. (cfr.conclusões 9 a 11 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo assacar à decisão recorrida mais um vício de erro de julgamento de direito.
Estudemos se a decisão recorrida padece de tal vício.
Quanto à alegada violação do citado artº.16, do C.I.R.S., remete-se os apelantes para as considerações tecidas supra.
Vejamos o artº.89-A, da L.G.T.
A denominada Lei de Reforma da Tributação do Rendimento (cfr.Lei 30-G/2000, de 29/12) veio, no capítulo relativo às medidas de combate à evasão e fraude fiscais, introduzir uma importante alteração nas regras relativas ao ónus da prova e à possibilidade de recurso a métodos indirectos na determinação da matéria tributável (cfr.A Reforma Fiscal Inadiável, J. Pina Moura e R. Sá Fernandes, Revista Fisco, ano XII, nºs.95/96, Abril de 2001, pág.23 a 25).
Assim, o referido diploma excluiu da presunção de veracidade das declarações do contribuinte os casos em que os rendimentos declarados para efeitos de I.R.S. se revelem desproporcionados, para menos, sem razão justificativa, dos padrões de rendimento indiciados por determinadas manifestações de fortuna. Com o aditamento à L. G. Tributária da al.d), do nº.2, do artº.75, e do artº.89-A, efectuado pela Lei 30-G/2000, de 29/12, o legislador consagrou uma nova situação em que cessa a presunção de veracidade da declaração do contribuinte: o de existirem manifestações de fortuna em desproporção com os rendimentos declarados, tudo nos termos previstos na lei.
Neste caso, em que as manifestações exteriores de riqueza estejam em desproporção com os rendimentos declarados, passou a permitir-se à Fazenda Pública que proceda à avaliação indirecta da matéria tributável (cfr.artº.87, al. d), da L.G.Tributária - normativo aditado pela referida Lei nº.30-G/2000, de 29/12), a menos que o contribuinte prove que os rendimentos declarados correspondem à realidade (inversão do ónus da prova) e que a fonte dos rendimentos necessários para assegurar as manifestações de fortuna evidenciadas é outra (cfr.artº.89-A, nº.3, da L.G.Tributária). A prova exigida ao sujeito passivo (para efeitos de ilisão da presunção em causa) cinge-se apenas quanto à fonte das manifestações de fortuna evidenciadas, por forma a determinar se as mesmas foram omitidas à declaração de rendimentos para efeitos de I.R.S.
Nos termos do nº.4, do artº.89-A, da L. G. Tributária (normativo inspirado no direito fiscal francês, nomeadamente no disposto no artº.168 do “Code Général des Impôts”), se o sujeito passivo não fizer a prova acima referida, considera-se como rendimento tributável em sede de I.R.S., categoria G (incrementos patrimoniais), o rendimento padrão apurado nos termos da tabela consagrada naquele preceito legal (para as aquisições de imóveis de valor superior a € 250.000,00, o rendimento padrão é de 20% do valor da aquisição), a menos que existam indícios fundados, de acordo com os critérios previstos no artº.90, da L. G. Tributária, que permitam à A. Fiscal fixar rendimento superior (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 17/1/2007, rec.1225/06; ac.T.C.A. Sul-2ª.Secção, 5/7/2005, proc.649/05; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 11/12/2007, proc.2085/07; ac.T.C.A. Sul-2ª.Secção, 23/3/2011, proc.4593/11; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária anotada e comentada, 4ª. edição, Editora Encontro da Escrita, 2012, pág.778 e seg.; José Guilherme Xavier Basto, IRS: Incidência Real e Determinação dos Rendimentos Líquidos, Coimbra Editora, 2007, pág.363 e seg.).
“In casu”, haverá, portanto, que analisar se estão reunidos os pressupostos legais da decisão objecto do presente processo e que foi confirmada em 1ª. Instância, de acordo com o regime previsto no aludido artº.89-A, da L.G.Tributária, na redacção resultante da Lei 94/2009, de 1/9, a aplicável ao caso “sub judice” (cfr.artº.12, do C.Civil).
Este artigo, na dita redacção resultante da Lei 94/2009, de 1/9, estabelece o seguinte:
Artº.89-A
Manifestações de fortuna e outros acréscimos patrimoniais não justificados

1 - Há lugar a avaliação indirecta da matéria colectável quando falte a declaração de rendimentos e o contribuinte evidencie as manifestações de fortuna constantes da tabela prevista no nº.4 ou quando declare rendimentos que mostrem uma desproporção superior a 50%, para menos, em relação ao rendimento padrão resultante da referida tabela.
2 - Na aplicação da tabela prevista no nº.4 tomam-se em consideração:
a) Os bens adquiridos no ano em causa ou nos três anos anteriores pelo sujeito passivo ou qualquer elemento do respectivo agregado familiar;
b) Os bens de que frua no ano em causa o sujeito passivo ou qualquer elemento do respectivo agregado familiar, adquiridos, nesse ano ou nos três anos anteriores, por sociedade na qual detenham, directa ou indirectamente, participação maioritária, ou por entidade sediada em território de fiscalidade privilegiada ou cujo regime não permita identificar o titular respectivo;
c) Os suprimentos e empréstimos efectuados pelo sócio à sociedade, no ano em causa, ou por qualquer elemento do seu agregado familiar.
3 - Verificadas as situações previstas no nº.1 deste artigo, bem como na alínea f), do nº.1 do artigo 87º., cabe ao sujeito passivo a comprovação de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou o acréscimo de património ou da despesa efectuada.
4 - Quando o sujeito passivo não faça a prova referida no número anterior relativamente às situações previstas no nº.1 deste artigo, considera-se como rendimento tributável em sede de IRS, a enquadrar na categoria G, no ano em causa, e no caso das alíneas a) e b) do nº.2, nos três anos seguintes, quando não existam indícios fundados, de acordo com os critérios previstos no artigo 90º., que permitam à administração tributária fixar rendimento superior, o rendimento padrão apurado nos termos da tabela seguinte:

Manifestações de fortuna
Rendimento padrão
1 – Imóveis de valor de aquisição igual ou superior a € 250.000. 20 % do valor de aquisição
2 – Automóveis ligeiros de passageiros de valor igual ou superior € 50.000 e motociclos de valor igual ou superior a € 10.000. 50 % do valor no ano de matrícula com o abatimento de 20 % por cada um dos anos seguintes
3 – Barcos de recreio de valor igual ou superior a € 25.000. Valor no ano de registo com o abatimento de
20 % por cada um dos anos seguintes
4 – Aeronaves de turismo.Valor no ano de registo com o abatimento de
20 % por cada um dos anos seguintes.
5 – Suprimentos de empréstimos feitos no ano de valor igual ou superior a € 50.000.50% do valor anual

5 - Para efeitos da alínea f), do nº.1 do artigo 87º.:
a)Considera-se como rendimento tributável em sede de IRS, a enquadrar na categoria G, quando não existam indícios fundados, de acordo com os critérios previstos no artigo 90º., que permitam à administração tributária fixar rendimento superior, a diferença entre o acréscimo de património ou a despesa efectuada, e os rendimentos declarados pelo sujeito passivo no mesmo período de tributação;
b) Os acréscimos de património consideram-se verificados no período em que se manifeste a titularidade dos bens ou direitos e a despesa quando efectuada;
c) Na determinação dos acréscimos patrimoniais, deve atender-se ao valor de aquisição e, sendo desconhecido, ao valor de mercado;
d) Consideram-se como rendimentos declarados os rendimentos líquidos das diferentes categorias de rendimentos.
6 - A decisão de avaliação da matéria colectável pelo método indirecto constante deste artigo é da competência do director de finanças da área do domicílio fiscal do sujeito passivo, sem faculdade de delegação.
7 - Da decisão de avaliação da matéria colectável pelo método indirecto constante deste artigo cabe recurso para o tribunal tributário, com efeito suspensivo, a tramitar como processo urgente, não sendo aplicável o procedimento constante dos artigos 91º. e seguintes.
8 - Ao recurso referido no número anterior aplica-se, com as necessárias adaptações, a tramitação prevista no artigo 146-B, do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
9 - Para a aplicação dos nºs.3 a 4 da tabela, atende-se ao valor médio de mercado, considerando, sempre que exista, o indicado pelas associações dos sectores em causa.
10 - A decisão de avaliação da matéria colectável com recurso ao método indirecto constante deste artigo, após tornar-se definitiva, deve ser comunicada pelo director de finanças ao Ministério Público e, tratando-se de funcionário ou titular de cargo sob tutela de entidade pública, também à tutela destes para efeitos de averiguações no âmbito da respectiva competência.
11 - A avaliação indirecta no caso da alínea f) do n.º 1 do artigo 87.º deve ser feita no âmbito de um procedimento que inclua a investigação das contas bancárias, podendo no seu decurso o contribuinte regularizar a situação tributária, identificando e justificando a natureza dos rendimentos omitidos e corrigindo as declarações dos respectivos períodos.

Da exegese da norma conclui-se que a sua aplicação aos contribuintes está condicionada ao preenchimento de pressupostos prévios, uns relativos ao valor de aquisição e outros relativos à divergência entre a capacidade aquisitiva demonstrada e os rendimentos declarados em sede de I.R.S. Assim, para que algum contribuinte seja eventualmente tributado por esta avaliação indirecta, é necessário, antes de mais, que evidencie, alguma das seguintes manifestações de fortuna:
- aquisição de imóveis de valor igual ou superior a € 250.000,00;
- aquisição de automóveis ligeiros de passageiros de valor igual ou superior a € 50.000,00;
- aquisição de motociclos de valor igual ou superior a € 10.000,00;
- aquisição de barcos de recreio de valor igual ou superior a € 25.000,00;
- aquisição de aeronaves de turismo;
- suprimentos e empréstimos efectuados pelo sócio à sociedade, no ano em causa, ou por qualquer elemento do seu agregado familiar, de valor igual ou superior a € 50.000,00.
Para além do requisito do valor de aquisição, é ainda necessário, para se aplicar o artº.89-A, da L. G. Tributária, que se verifiquem, em alternativa, alguma das seguintes condições:
-Falta de entrega da declaração de rendimentos;
-O rendimento líquido declarado em sede de I.R.S., no ano em causa, mostre uma desproporção superior a 50%, para menos, em relação ao rendimento padrão a que se refere a tabela prevista no nº.4, do mesmo normativo.
Mais se dirá que é à A. Fiscal que compete comprovar a existência de aquisições de valor superior ao definido na tabela do nº.4, do artº.89-A, da L. G. Tributária, em cada ano, para que possa fixar o rendimento tributável por avaliação indirecta.
Por sua vez, ao contribuinte compete demonstrar perante a Administração Tributária, ou perante o Tribunal, quais as fontes de rendimento que lhe permitiram efectuar as aquisições de bens referidas no artº.89-A, da L. G. Tributária. Mais concretamente, a prova exigida ao contribuinte é apenas quanto à fonte das manifestações de fortuna evidenciadas, por forma a determinar se as mesmas foram omitidas à declaração para efeitos de I.R.S. Se ela não for efectuada, está-se perante uma situação de omissão da declaração de rendimentos, pois o contribuinte despendeu mais do que os rendimentos declarados, pelo que é legítimo o uso de avaliação indirecta da matéria tributável. Já se o contribuinte provar que a fortuna foi obtida em anos anteriores, emerge a presunção de que a sua declaração de rendimentos do ano em causa corresponde à verdade (cfr.ac.S.T.A-2ª.Secção, 27/5/2009, rec.403/09; ac.T.C.A. Sul-2ª.Secção, 23/9/2008, proc. 2605/08; ac.T.C.A. Sul-2ª.Secção, 23/3/2011, proc.4593/11; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária anotada e comentada, 4ª. edição, Editora Encontro da Escrita, 2012, pág.782; João Sérgio Ribeiro, Tributação Presuntiva do Rendimento, Um contributo para reequacionar os métodos indirectos de determinação da matéria tributável, Almedina, 2010, pág.299 e seg.; José Guilherme Xavier Basto, IRS: Incidência Real e Determinação dos Rendimentos Líquidos, Coimbra Editora, 2007, pág.371).
Por último, admite a doutrina e a jurisprudência mais recentes a possibilidade do afastamento parcial da presunção de rendimento consagrada no examinado artº.89-A, da L.G.T., no que respeita à fixação do rendimento sujeito a tributação como “incremento patrimonial” em sede de I.R.S., nas situações em que o sujeito passivo somente faz prova parcial da fonte dos seus sinais exteriores de riqueza (v.g.celebração de empréstimo bancário para adquirir imóvel). Nestes termos, embora só a justificação total do montante que permitiu a verificação da “manifestação de fortuna”, tenha a virtualidade de afastar a aplicabilidade da determinação indirecta dos rendimentos que permitiram tais sinais exteriores de riqueza, já assim não é, contudo, no que respeita à fixação do rendimento sujeito a tributação como “incremento patrimonial” em sede de I.R.S., onde a justificação parcial há-de relevar para a fixação presuntiva do montante do “acréscimo patrimonial não justificado” sujeito a imposto. Pelo que, tendo o contribuinte demonstrado que recorreu a empréstimos bancários para adquirir imóveis cujo valor determinou a avaliação indirecta da matéria colectável, nos termos do artº.89-A, da L.G.T., a quantificação do rendimento tributável assim operado deve ser igual a 20% do valor de aquisição, mas deduzindo-se a este valor de aquisição o montante de tais empréstimos bancários, já que o respectivo montante destes não está, nem pode estar, sujeito a I.R.S., não podendo, consequentemente, ser presumido ou considerado como rendimento sujeito a tributação (cfr.ac.S.T.A-Pleno da 2ª.Secção, 5/7/2012, rec.358/12; ac.S.T.A-2ª.Secção, 11/7/2012, rec.668/12; ac.S.T.A-2ª.Secção, 7/11/2012, rec.1088/12; João Sérgio Ribeiro, Tributação Presuntiva do Rendimento, Um contributo para reequacionar os métodos indirectos de determinação da matéria tributável, Almedina, 2010, pág.301 e seg.).
Voltando ao caso “sub judice”, conforme resulta da matéria de facto provada (cfr.nºs.9 e 10 da matéria de facto provada), os recorrentes não procederam à entrega da Declaração de Rendimentos Modelo 3 de I.R.S. para o ano de 2009, ano em que adquiriram o prédio urbano inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Cascais sob o artigo nº.7492, pelo valor de € 1.830.000,00, o que constitui manifestação de fortuna à luz dos preceitos legais citados, razão pela qual se impõe, assim, a avaliação indirecta. Uma vez verificados os pressupostos legais para aplicação da avaliação indireta, por força do artº.89-A, nº.3, da L.G.T., cabia aos apelantes a prova de que correspondem à realidade os rendimentos (não) declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna evidenciadas. Em sede de I.R.S., conseguiram os recorrentes fazer a justificação parcial relevante para a fixação presuntiva do montante do “acréscimo patrimonial não justificado” sujeito a imposto (cfr.nºs.14 e 21 do probatório), justificação esta que foi levada em consideração pela A. Fiscal na fixação do rendimento colectável apurado para o mesmo ano fiscal de 2009.
Atento o referido, forçoso é de concluir que o acto de fixação de matéria tributável ora sindicado é legal e não violou o examinado artº.89-A, da L.G.T., em consequência do que se recusa provimento ao presente fundamento do recurso e se confirma a decisão recorrida nesta parte.
Por último, aduzem os apelantes que ao considerar verificados os pressupostos legais exigidos pelos artºs.89-A, da L.G.T., e 16, do C.I.R.S., e não julgar ilegal a decisão de tributação recorrida, a douta sentença recorrida retira daquelas normas uma interpretação que viola o disposto no artº.104, nº.1, da C.R.P., e incorre em violação do princípio constitucional da proporcionalidade ou da proibição do excesso, consagrado no artº.18, nº.2, da C.R.P. (cfr.conclusão 12 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo assacar à sentença recorrida mais um erro de julgamento de direito.
Analisemos se a decisão recorrida sofre de tal pecha.
Encontramo-nos perante alegados vícios de inconstitucionalidade material e que buscam uma fiscalização concreta e com características oficiosas (cfr.artºs.204 e 280, nº.1, da C.R.Portuguesa; J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 4ª. Edição, 2º. Volume, Coimbra Editora, 2010, pág.940 e seg.).
No entanto, o que pode e deve ser objecto da fiscalização concreta da constitucionalidade, por parte dos Tribunais, são normas e não quaisquer decisões, sejam elas de natureza judicial ou administrativa (cfr.artº.204, da C.R.Portuguesa; J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 4ª. Edição, 2º. Volume, Coimbra Editora, 2010, pág.518 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 27/4/2006, proc.64561/96; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 16/10/2012, proc.5593/12).
Apesar disso, sempre se dirá que o artº.104, nº.1, da C.R.Portuguesa, consagra as características a que deve estar sujeito o imposto sobre o rendimento pessoal, o qual deve ser único e progressivo, mais devendo visar a diminuição das desigualdades económicas dos cidadãos. A unicidade do imposto quer dizer que todos os rendimentos pessoais devem ser englobados num único tributo, de forma a tomar em conta o seu montante global. A progressividade quer dizer que a taxa deve ser tanto maior quanto mais elevado for o rendimento global do contribuinte em causa (cfr.J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 4ª. Edição, 1º. Volume, Coimbra Editora, 2007, pág.1099; J. L. Saldanha Sanches, Manual de Direito Fiscal, 3ª.edição, Coimbra Editora, 2007, pág.229 e seg. e 287 e seg.; ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 30/10/2012, proc.5803/12).
No caso concreto, não vislumbra o Tribunal “ad quem” como pode a sentença recorrida, ao aplicar, em concreto, o procedimento consagrado nos artºs.89-A, da L.G.T., e 16, do C.I.R.S., ter violado o regime constitucional previsto no examinado artº.104, nº.1, da C.R.Portuguesa, tal alegada infracção igualmente não sendo concretizada pelos recorrentes.
Estudemos a alegada violação do princípio da proporcionalidade, consagrado no artº.18, nº.2, da C.R.Portuguesa, como pressuposto material para que se verifique uma restrição legítima de direitos, liberdades e garantias.
O princípio da proporcionalidade (também chamado princípio da proibição do excesso) desdobra-se em três subprincípios: (a) princípio da adequação (também designado por princípio da idoneidade), isto é, as medidas restritivas legalmente previstas devem revelar-se como meio adequado para a prossecução dos fins visados pela lei (salvaguarda de outros direitos ou bens constitucionalmente protegidos); (b) princípio da exigibilidade (também chamado princípio da necessidade ou da indispensabilidade), ou seja, as medidas restritivas previstas na lei devem revelar-se necessárias (tornaram-se exigíveis), porque os fins visados pela lei não podiam ser obtidos por outros meios menos onerosos para os direitos, liberdades e garantias; (c) princípio da proporcionalidade em sentido restrito, que significa que os meios legais restritivos e os fins obtidos devem situar-se numa “justa medida”, impedindo-se a adopção de medidas legais restritivas desproporcionadas, excessivas, em relação aos fins obtidos. Em qualquer caso, há um limite absoluto para a restrição de “direitos, liberdades e garantias”, que consiste no respeito do “conteúdo essencial” dos respectivos preceitos (cfr.J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 4ª. Edição, 1º. Volume, Coimbra Editora, 2007, pág.392 e seg.).
No caso “sub judice”, também não consubstancia o recorrente em que consista a violação do examinado princípio, por parte da sentença recorrida ou dos normativos constantes dos artºs.89-A, da L.G.T., e 16, do C.I.R.S. Este Tribunal igualmente não lobriga tal violação.
Atento tudo o relatado, sem necessidade de mais amplas considerações, não se concede provimento ao recurso deduzido e confirma-se a decisão recorrida, embora com a presente fundamentação, ao que se provirá na parte dispositiva do acórdão.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO E CONFIRMAR A DECISÃO RECORRIDA, embora com a fundamentação constante do presente acórdão.
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Condena-se o recorrente em custas.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 7 de Maio de 2013


(Joaquim Condesso - Relator)


(Eugénio Sequeira - 1º. Adjunto)


(Benjamim Barbosa - 2º. Adjunto)
Vencido por entender que os recorrentes demonstraram a proveniência dos meios financeiros necessários para a aquisição do imóvel que constituiu fundamento para aplicação de métodos indirectos por manifestações de fortuna – quer pelo recurso a crédito hipotecário, quer pelo rendimentos obtidos pelo impugnante no estrangeiro nos anos anteriores – e porque a aplicação do disposto no art. 16/6 do CITRS ao caso “Sub Judice” implicaria que se concluísse de forma substancialmente divergente da solução adoptada e que fez vencimento no que concerne à residência do impugnante.