Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:05392/12
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:05/08/2012
Relator:JOAQUIM CONDESSO
Descritores:REGIME NORMATIVO APLICÁVEL À DECISÃO DE REVERSÃO.
ACTOS DE GERÊNCIA.
O GERENTE GOZA DE PODERES REPRESENTATIVOS E DE PODERES ADMINISTRATIVOS FACE À SOCIEDADE.
REGIME DE RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA PREVISTO NO ARTº.24, Nº.1, DA L.G.TRIBUTÁRIA.
MÉTODO DE AFERIÇÃO DA CULPA PREVISTA NO ARTº.24, Nº.1, DA L.G.TRIBUTÁRIA.
Sumário:1. Para o efeito da definição de qual o regime normativo aplicável à decisão de reversão do processo de execução fiscal contra responsáveis subsidiários, no que respeita aos requisitos para a respectiva efectivação, importa o momento em que a citada reversão é decretada.
2. A lei não define, precisamente, em que é que se consubstanciam os poderes de gerência, mas, em face do preceituado nos artºs.259 e 260, do Código das Sociedades Comerciais, parece dever entender-se que serão típicos actos de gerência aqueles que se consubstanciam na representação da sociedade perante terceiros, tal como aqueles através dos quais a sociedade fique juridicamente vinculada e que estejam de acordo com o objecto social.
3. O gerente/ administrador goza de poderes representativos e de poderes administrativos face à sociedade. A distinção entre ambos radica no seguinte: se o acto em causa respeita às relações internas entre a sociedade e quem a administra, situamo-nos no campo dos poderes administrativos do gerente. Pelo contrário, se o acto respeita às relações da sociedade com terceiros, estamos no campo dos poderes representativos. Por outras palavras, se o acto em causa tem apenas eficácia interna, estamos perante poderes de administração ou gestão. Se o acto tem eficácia sobre terceiros, verifica-se o exercício de poderes de representação.
4. Na previsão da al.a), do artº.24, nº.1, da L.G.Tributária, pretendem-se isolar as situações em que o gerente/administrador culpado pela diminuição do património societário será responsável pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou de entrega tenha terminado depois deste, competindo à Administração Fiscal fazer a prova de que foi por culpa sua que o património se tornou insuficiente. Já na al.b), do preceito o gerente é responsável pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou de entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, recaindo sobre o mesmo o ónus da prova de que não foi por culpa sua que o pagamento não se efectuou. Por outras palavras, nas situações em que o gestor exerce, efectivamente, as suas funções e é no decurso desse exercício que se forma o facto tributário ou se inicia o prazo para o pagamento, mas antes que tal prazo se esgote, o gestor cessa as suas funções, o ónus da prova, de que o património da sociedade se tornou insuficiente para a satisfação da dívida por acto culposo do gestor, corre por conta da Fazenda Pública (cfr.alínea a), do artigo 24, da L.G.T.). Se é no decurso do exercício efectivo do cargo societário de gerente que se esgota o prazo para o pagamento do imposto, não vindo ele a acontecer (o pagamento não se efectuou no prazo devido), o ónus da prova inverte-se contra o gerente, sendo ele quem tem de provar que não lhe foi imputável a falta de pagamento (o gestor está obrigado a fazer prova de um facto negativo, poupando-se a Fazenda Pública a qualquer esforço probatório - cfr.al.b), do normativo em exame). Na alínea b), do nº.1, do artº.24, da L. G. Tributária, consagra-se, portanto, uma presunção de culpa, pelo que a Administração Fiscal está dispensada de a provar.
5. A culpa em causa no artº.24, nº.1, da L.G.Tributária, deve aferir-se pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias do caso concreto - isto, quer se entenda que a responsabilidade em causa tem natureza contratual ou extra-contratual (cfr.artºs.487, nº.2, e 799, nº.2, do C.Civil) - e em termos de causalidade adequada, a qual não se refere ao facto e ao dano isoladamente considerados, mas ao processo factual que, em concreto, conduziu ao dano. Sabido que são os administradores ou gerentes quem exterioriza a vontade da sociedade nos mais diversos negócios jurídicos, através dos quais se manifesta a sua capacidade de exercício de direitos, a responsabilidade subsidiária assenta na ideia de que os poderes de que estavam investidos lhes permitiam uma actuação determinante na condução da sociedade. Assim, há que verificar, operando com a teoria da causalidade, se a actuação do gestor da sociedade originária devedora, concretizada quer em actos positivos quer em omissões, foi adequada à insuficiência do património societário para a satisfação dos créditos exequendos. E, nesse juízo, haverá que seguir-se o processo lógico da prognose póstuma. Ou seja, de um juízo de idoneidade, referido ao momento em que a acção se realiza ou a omissão ocorre, como se a produção do resultado se não tivesse ainda verificado, isto é, de um juízo “ex ante”. É que a causalidade não se refere ao facto e ao dano isoladamente considerados, mas ao processo factual que, em concreto, conduziu ao dano, não podendo existir causalidade adequada quando o dano se verificou apenas por virtude de circunstâncias excepcionais ou anómalas que, no caso concreto, se registaram e que interferiram no processo de causalidade, considerado este no seu conjunto.

O relator

Joaquim Condesso
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO
X
RELATÓRIO
X
O DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mmo. Juiz do T.A.F. de Sintra, exarada a fls.172 a 193 do presente processo, através da qual julgou totalmente procedente a oposição intentada por A... visando a execução fiscal nº.1554-2005/103266.6, a qual corre seus termos no 1º. Serviço de Finanças de Oeiras, contra este revertida e instaurada para a cobrança de dívida de I.R.C. de 2000, no montante total de € 4.004.833,51.
X
O recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.208 a 211 dos autos) formulando as seguintes Conclusões:
1-Salvo o devido respeito, entendemos que a douta sentença recorrida fez uma errada apreciação dos factos submetidos à sua apreciação e consequentemente uma errada interpretação do direito aplicável;
2-Resulta provado de todos os elementos constantes dos autos que o oponente era gerente de facto à data do pagamento voluntário da dívida exequenda;
3-Recaindo sobre o mesmo o ónus da prova de que não lhe era imputável a falta de pagamento;
4-O que em nosso entender, salvo o devido respeito, não logrou fazer;
5-Da análise ao depoimento das testemunhas arroladas pelo oponente, conjugada com a análise dos elementos constantes dos autos, nomeadamente da escritura de permuta celebrada entre a sociedade “B...”, a sociedade “C...2000” e a “D..., Limited” tais declarações não correspondem à realidade;
6-Não correspondendo, também, à realidade a contabilidade organizada pelo Técnico Oficial de Contas;
7-De acordo com a escritura de permuta, realizada pela devedora originária, os terrenos propriedade que a “B...” possuía em Albufeira foram objecto de permuta com créditos existentes sobre os sócios da mesma;
8-Assim, embora a “B...” não tivesse bens imóveis tinha direitos de crédito sobre os seus sócios;
9-Direitos estes que não se encontram reflectidos na contabilidade e dos quais os sócios da “E...” e seu contabilista tinham ou, pelo menos, deveriam ter conhecimento;
10-Face ao exposto, resulta que a “B...” à data do vencimento e do pagamento voluntário da dívida exequenda tinha créditos sobre terceiros e que o gerente à data, ou seja, o ora oponente, não os accionou de forma a cumprir as obrigações fiscais da sua representada;
11-Pelo que, contrariamente ao doutamente decidido, o oponente não logrou provar que a falta de pagamento não lhe é imputável;
12-Termos em que, com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente recurso ser provido e, consequentemente, deve prosseguir a reversão contra o oponente, ora recorrido, assim se fazendo a costumada Justiça.
X
Não foram apresentadas contra-alegações.
X
O Digno Magistrado do M. P. junto deste Tribunal emitiu douto parecer no sentido da total improcedência do presente recurso, dado que a sentença recorrida não padece dos vícios que lhe são assacados (cfr.fls.220 dos autos).
X
Corridos os vistos legais (cfr.fls.222 do processo), vêm os autos à conferência para decisão.
X
FUNDAMENTAÇÃO
X
DE FACTO
X
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto (cfr.fls.173 a 182 dos autos):
1-No dia 25/4/1968, foi objecto de registo a constituição da sociedade por quotas “B... - Sociedade de Comércio de Imóveis para Revenda, L.da.” (doravante B...), matriculada sob o nº.04913, na Conservatória do Registo Comercial de Oeiras, sendo nomeado gerente F...(cfr.cópia de certidão da C.R.C. junta a fls.142 a 146 dos presentes autos);
2-A referida firma alterou a sua denominação para “B... - Promoções Turísticas por Valorização Urbanística de Propriedades, L.da.”, por inscrição datada de 16/06/1993 (cfr. cópia de certidão da C.R.C. junta a fls.142 a 146 dos presentes autos);
3-Por inscrição datada de 27/2/1998, cessou funções o gerente referido no nº.1 e foi averbada a nomeação como gerente de H... (cfr.cópia de certidão da C.R.C. junta a fls.142 a 146 dos presentes autos);
4-Por deliberação de 9/9/2003, foi nomeado gerente A..., ora oponente (cfr.cópia de certidão permanente da sociedade junta a fls.20 a 23 dos presentes autos; documentos junto a fls.17 a 19 dos presentes autos);
5-Por inscrição datada de 20/2/2010, o oponente cessou funções como gerente, datando a renúncia de 18/11/2009 (cfr.cópia de certidão permanente da sociedade junta a fls.20 a 23 dos presentes autos);
6-Em cumprimento da Ordem de Serviço nº.38.887, de 14/7/2004, foi ordenada acção inspectiva referente ao exercício de 2000 da “B...”, que culminou com a elaboração do relatório de fls.230/244 do PEF apenso (2ª. pasta), datado de 19/11/2004, o qual se dá aqui por integralmente reproduzido, e de onde se destaca o seguinte:

“Em cumprimento do Despacho n.º 38.384, para o ano de 2000, emitido em 6 de Julho de 2004, pelos Serviços de Prevenção e Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Lisboa, com o Cod. PNAIT 62111, foram efectuadas diligências referentes ao sujeito passivo “B... Promoções Turísticas por Valorização Urbanística Propriedades, Ld.”, possuidor do NIPC 500909172. As diligências referidas, foram efectuadas em 12 de Julho de 2004, tendo dado posteriormente origem à Ordem de Serviço n.º 38.887, emitida em 14 de Julho do mesmo, referente ao exercício de 2000.
A acção inspectiva decorrente da referida Ordem de Serviço teve início em 21 de Julho de 2004 com a assinatura nos termos do art.º 51.º do RCPIT, tendo sido concluída em 20 de Outubro de 2004.
2 - Motivo, âmbito e incidência temporal.
O procedimento da inspecção teve como motivo averiguar a situação tributária da sociedade em causa, pois trata-se de uma empresa “não declarante”, tendo a análise incidido sobre o exercício de 2000.
II. 3. - Outras situações:
2.3.1. - Caracterização do sujeito passivo:
Quando iniciou a actividade, em 1968, o sujeito passivo exerceu a actividade de “Comércio de Imóveis para revenda”, denominando-se “B... - Sociedade de Comércio de Imóveis para Revenda, Limitada”. Posteriormente, em 16 de Junho de 1993, foi o registo rectificado, passando a ter a seguinte denominação: “B... - Promoções Turísticas por Valorização Urbanística de Propriedades, Limitada” (conforme consta do registo da Conservatória do Registo Comercial de Oeiras) Anexo II. Os livros selados, obrigatórios nos termos da Lei Comercial e Fiscal, encontram-se por escriturar desde Junho de 1991 - Anexo III. Trata-se de uma sociedade por quotas que exerce a actividade de "Mediação Imobiliária", há mais de trinta anos, com o CAE 70.310. (…)
A actividade foi cessada em 31 de Outubro de 1995, nos termos do artº 33°, nº 1, alínea b) do Código do IVA.
2.3.2. - Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Colectivas: Da consulta efectuada ao sistema informático, verifica-se que a última declaração Mod/22 de IRC entregue, corresponde ao exercício de 1993.
2.3.3. - Imposto sobre o Valor Acrescentado: Na data da cessação de actividade (em 31/10/1995), encontrava-se enquadrado no Regime de Isenção a que se refere o art.º 9.º do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado.
2.3.4 - Cruzamento de elementos: Contudo, no dia catorze de Julho do ano dois mil, foi lavrada no 4.º Cartório Notarial de Lisboa, de fls. 13 a fls. 19, do Livro 595 - B, uma escritura de Permuta - Anexo I ao presente relatório, ficando dele a fazer parte integrante - onde a sociedade em causa efectua a permuta dos seguintes lotes de terreno para construção urbana:
Freguesia de Albufeira:
Artigo Matricial
Registo conservatória
(Anexo I)
(Anexo IX)
16.956
9.553
16.957
9.554
16.958
9.555
16.959
9.556
16.960
9.557
16.961
9.558
15.984
9.173
15.983
9.174
2.3.5. - Diligências efectuadas:
Considerando a falta de elementos disponíveis, e no sentido de averiguar o objecto, constituição, sócios, gerência e respectiva evolução da sociedade ao longo dos anos, no dia 12 de Julho de 2004, em cumprimento do Despacho n.º 38.384 já referido, efectuámos as seguintes diligências:
1. - Deslocámo-nos à Conservatória do Registo Comercial de Oeiras (Cascais), onde pertence a sede da sociedade. No Anexo II constam os registos e as alterações verificadas, ao longo dos anos.
2. - De seguida deslocámo-nos à sede da sociedade, Quinta das Palmeiras, 70 - A, Nova Oeiras, Freguesia de Oeiras, onde fomos informadas que a sociedade em causa já não exerce ali a actividade há vários anos. Contudo, informaram que talvez fosse possível encontrar alguém que nos esclarecesse na ...Oeiras. Na morada indicada, falámos com o advogado mandatário da empresa, Sr. G...(conforme Procuração - Anexo IV), tendo sido lavrado um "Termo de Declarações", que constará como Anexo V ao presente relatório, ficando dele a fazer parte integrante, onde declarou o seguinte: Que é mandatário da empresa "B..." há cerca de um mês, tendo solicitado ao Técnico Oficial de Contas a verificação da situação da empresa. Uma vez que não tem havido qualquer movimento da mesma, não deram urgência ao assunto, tendo declarado ainda que desconhecem qualquer actividade anterior da empresa. Mais declarou que “em face dos elementos conhecidos actualmente, não conhece qualquer património da B.... Por fim declarou que todos os elementos contabilísticos conhecidos se encontram em poder do Técnico Oficial de Contas (…)
3. - Em face do exposto, procedemos à notificação da empresa "B...", na pessoa do referido advogado mandatário, para no dia 14 de Julho de 2004, pelas 10 horas, exibir naquela morada, a contabilidade (livros de registo e respectiva documentação), relativos à actividade que vem exercendo de "Mediação Imobiliária", relativa aos exercícios de 2000, 2001, 2002 e 2003 - Anexo VI.
4. - Na referida Escritura de Permuta (Anexo I), H..., possuidora do N.l.F. 135.456.088, com domicílio fiscal na Rua ...fte., Carcavelos, intervém na qualidade de gerente da sociedade em causa, facto este que também se pode verificar no registo da Conservatória do Registo Comercial (Anexo II). Assim, no mesmo dia 12 de Julho de 2004, deslocámo-nos aquela morada, onde procedemos também à notificação da sociedade em causa - Anexo VII - na pessoa da gerente, à data da referida escritura para, no dia catorze de Julho de 2004, pelas catorze horas e trinta minutos, exibir no seu domicílio fiscal (já referenciado), a contabilidade (livros de registo e respectiva documentação), relativos à actividade de "Mediação Imobiliária", dos exercícios de 2000, 2001 e 2002.
5. - Em face do exposto, foi aberta a Ordem de Serviço n.º 38.887. Assim, constatou-se o seguinte: No dia e hora a que se refere a notificação constante do Anexo VII (efectuada à gerente da sociedade à data dos factos), deslocámo-nos ao seu domicílio fiscal, na Rua ...Fte, 2775 Carcavelos, mas tal diligência foi infrutífera pois não se encontrava ninguém, conforme consta da "Certidão de Diligências" que ficará a fazer parte integrante do presente relatório como Anexo VIII. Por outro lado, no dia e hora a que se refere a notificação, que consta em Anexo VI, dia 14 de Julho de 2004, pelas 11 horas e trinta minutos, deslocámo-nos à morada referida na notificação, ...Oeiras, a fim de proceder ao exame da contabilidade e demais documentos com ela relacionados. Contudo, a mesma não nos foi exibida. Assim, de imediato, notificámos o Sr. José Fernando dos Santos Pereira, na qualidade de Técnico Oficial de Contas da empresa "B..." para, de acordo com o disposto no n.º 2 do art.º 121.º do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), proceder à organização/regularização da escrita, nos termos do n.º 2 do art.º 121.° do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), no prazo de 5 (cinco) dias, a contar da data da notificação em causa, pois a mesma encontra-se por elaborar desde 30 de Junho de 1991 - Anexo IX.
6. - No dia 16 de Julho de 2004, o Técnico Oficial de Contas referido, enviou um Fax para a Direcção de Finanças de Lisboa, que também ficará a fazer parte integrante do presente relatório como Anexo X, onde refere que teve dificuldades em obter os documentos e analisá-los correctamente, vindo por aquele meio solicitar que lhe fosse concedido "algum tempo extra para uma melhor análise e respectivo enquadramento fiscal e contabilístico", solicitando que a reunião fosse adiada para a Quarta-Feira seguinte, pela mesma hora.
7. - Em resultado da notificação constante do Anexo VIl no dia 21 de Julho de 2004 deslocámo-nos a Oeiras, à ...(sede do sócio E...- Francisco da Silva Santos, Construções, S.A.), para proceder à análise da contabilidade e respectivos documentos de suporte. Contudo, nada nos foi apresentado, constituindo este facto recusa de exibição de escrita nos termos da lei.
8. - No dia 6 de Agosto de 2004, o Técnico Oficial de Contas enviou novo Fax - Anexo XI, onde refere: - “Venho por este meio, indicar à face, a impossibilidade de reunir certos elementos contabilísticos indispensáveis à feitura das Modelos 22, relativas aos anos de 2000, 2001, 2002 e 2003. Assim, optamos por não proceder à entrega dos respectivos modelos não sendo efectuado por nós, aguardamos os vossos procedimentos”.
9. - Paralelamente, e dado que os imóveis constantes da referida escritura de permuta, pertencem à Conservatória do Registo Predial de Albufeira, solicitámos a esta entidade alguns elementos sobre os mesmos - elementos estes que constam do Anexo XII ao presente relatório, ficando dele também a fazer parte integrante. Da resposta obtida constam os registos dos imóveis, bem como uma certidão de 30 de Outubro de 1968, emitida pela Secretaria Judicial de Loulé, onde consta a páginas 3, o seguinte: No dia 23 de Abril de 1968, no Tribunal Municipal de Albufeira, foi vendido em hasta pública o seguinte imóvel que se achava penhorado: "Terreno para construção urbana, com a área de 246.320 metros quadrados, nos subúrbios da Vila de Albufeira, ou sítio do Bem Parece, Freguesia e Concelho de Albufeira, denominado "Cerro", descrito na Conservatória do Registo Predial de Albufeira sob o n.º 6.417. a fls. 41 verso, do Livro B - 17, inscrito na matriz sob os artigos n.º 733 e 740º. Ainda é certificado que a firma "B... - Sociedade de Comércio de Imóveis Revenda, Ld.", arrematou os imóveis referidos, pela importância de 3.500.000$00 (três milhões e quinhentos mil escudos), tendo-lhe os mesmos sido adjudicados em 23 de Abril de 1968.
III. Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável.
Assim, em resultado das diligências acima enunciadas e por nós efectuadas, considerando ainda a impossibilidade de obter mais elementos face à inexistência de contabilidade, procedemos ao seguinte apuramento:
Como já foi referido nos pontos anteriores, a B... adquiriu em hasta pública os imóveis em causa já descritos, conforme consta de certidão emitida pela Secretaria Judicial de Loulé - Anexo XII, os quais foram transaccionados sob a forma de permuta, conforme escritura de 14 de Julho de 2000, lavrada no 4.º Cartório Notarial de Lisboa, sendo os valores das transmissões, os seguintes:

TRANSMISSÕES
DATA
VALOR ($)
VALOR (€)
Aquisição em hasta pública - Anexo XII
23-04-1968
3.500.000$00
17.457.93
Alienação sob a forma de Permuta - Anexo I
14-07-2000
1.910.000.000$00
9.527.039.83

Face à actividade da empresa - Mediação Imobiliária - os bens imóveis objecto de alienação têm enquadramento no activo circulante, na rubrica de existências.
Não obstante a sociedade ter sido notificada para apresentar os elementos de escrita e documentos de suporte, não foram exibidos quaisquer documentos contabilísticos, nomeadamente os relacionados com os custos indispensáveis para a realização dos proveitos, tal como determina o art.º 23.º do Código do IRC.
Em termos de qualificação contabilístico-fiscal dos bens em análise, tenha-se presente as disposições do Plano Oficial de Contabilidade, nomeadamente o princípio contabilístico do custo histórico. Preconiza ainda o P.O.C., no que concerne aos critérios de valorimetria, que as existências serão valorizadas ao custo de aquisição ou ao custo de produção. Tratando-se, no caso em presença de bens imóveis (sujeitos a registo na Conservatória do Registo Predial de Albufeira), foram efectuadas as diligências inerentes à obtenção do custo de aquisição de tais bens, o que consta da certidão de adjudicação dos imóveis, emitida pela Secretaria Judicial de Loulé (Anexo XII, fls. 3), cujo valor de arrematação em hasta pública, foi de 3.500.000$00 (17.457,93 €).
Face ao que precede e aos elementos disponíveis, propõe-se como apuramento do lucro tributável:
EXERCÍCIO DE 2000
Unid. Euros (€)
Proveitos
9.527.039,83
Custos
17.457,93
Lucro Tributável
I
9.509.581,90
(cfr.cópia de relatório da inspecção junta a fls.230 a 244 do processo de execução fiscal apenso - 2ª. pasta);
7-Desta inspecção resultou a liquidação de I.R.C., respeitante ao exercício de 2000 da “B...”, no montante de € 4.004.833,51, com data limite de pagamento voluntário no dia 27/1/2005 (cfr.documento junto a fls.13 dos presentes autos; informação exarada a fls.38 a 46 dos presentes autos);
8-Corre termos no 1º. Serviço de Finanças de Oeiras o processo de execução fiscal nº. 1554-2005/103266.6, no qual surge como executada originária a sociedade “B...”, por falta de pagamento da liquidação referenciada no nº.7 (cfr.documentos juntos a fls.1 a 4 do processo de execução fiscal apenso - 2ª. pasta; informação exarada a fls.38 a 46 dos presentes autos);
9-Nos dias 12/6/2006 e 22/9/2010, foram lavrados os autos de diligência que constam de fls.63/64 do PEF apenso (1ª. pasta) e de fls.377 (2ª. pasta), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, atestando não terem sido encontrados bens penhoráveis da “B...” na respectiva morada;
10-Efectuadas pesquisas das bases de dados disponíveis no dia 27/5/2010, apurou-se na execução fiscal inexistirem viaturas, valores, rendimentos, aquisições, fornecimentos ou imóveis em nome da “B...” (cfr.documentos juntos a fls.360 a 373 do PEF apenso - 2ª. pasta);
11-No dia 3/9/2010, a Chefe de Finanças proferiu o despacho que consta de fls.374 do PEF apenso (2ª. pasta), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, determinando a preparação da reversão da execução fiscal contra o oponente, por se constatar a insuficiência de bens penhoráveis da devedora originária e a sua notificação para exercício do direito de audição prévia;
12-No dia 30/9/2010, o oponente exerceu o direito de audição prévia, nos termos que constam de fls.378 e 379 do PEF apenso (2ª. pasta), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;
13-No dia 14/10/2010, a Chefe de Finanças proferiu o despacho que consta de fls.388 do PEF apenso - 2ª. pasta, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, determinando a reversão da execução fiscal contra o oponente, assim concordando com informação prévia nesse sentido (cfr.documentos juntos a fls.387 e 388 do PEF apenso - 2ª. pasta);
14-No dia 14/7/2005, o oponente assinou o aviso de recepção respeitante à citação da “B...” para o processo de execução fiscal nº.1554-2005/103266.6 (cfr.documentos juntos a fls.3 e 4 do PEF apenso - 2ª. pasta);
15-No dia 8/8/2005, o oponente, em representação da “B...”, dirigiu requerimento ao Chefe do Serviço de Finanças, peticionando a suspensão do referido processo executivo e a prestação oportuna de garantia (cfr.documentos juntos a fls.5 e 6 do PEF apenso - 2ª. pasta);
16-Nos dias 5/5/2004 e 24/9/2009, o oponente emitiu procurações em representação da “B...” (cfr.documentos juntos a fls.99 e 100 do PEF apenso - 1ª. pasta);
17-Desde o ano 2000 até 2006, a “B...” apresentou os balanços e demonstrações de resultados que constam de fls.91 a 133 dos presentes autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, donde constam a zeros as contas do activo imobilizado e do activo circulante, inexistindo bens pertencentes à sociedade (cfr.documentos juntos a fls.91 a 133 dos presentes autos);
18-No ano de 2007, a “B...” comprou a fracção autónoma designada pelas letras “DD” do prédio inscrito na matriz predial da freguesia e concelho de Oeiras sob o artigo 2311.º, com o valor patrimonial de € 3.100,00, recorrendo a fundos alheios (cfr. documentos juntos a fls.24, 25 e 91 a 133 dos presentes autos).
X
A sentença recorrida considerou como factualidade não provada a seguinte: “…Não se provaram quaisquer outros factos, com relevância para a decisão da causa …”.
X
Por sua vez, a fundamentação da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida é a seguinte: “…A decisão da matéria de facto provada resultou do exame dos documentos e informações oficiais, não impugnados, que dos autos constam, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.
No que concerne aos pontos 17 e 18, foi igualmente conjugada a prova documental com o depoimento da testemunha Maria Teresa Almeida, a trabalhar à data na sociedade “E...”, revelando conhecimento acerca da falta de actividade da “B...” e da inexistência de bens da mesma nos anos em questão, bem como com o depoimento da testemunha José Pereira, técnico oficial de contas da “B...” a partir de 2003, conhecedor da falta de actividade e de património desta, bem como de a compra em questão não ter sido suportada por fundos da “B...”, mas sim de terceiros, não sendo possível comprovar documentalmente que os mesmos pertenciam à sócia “E...”…”.
X
Dado que a decisão da matéria de facto em 1ª. Instância se baseou, por um lado, em prova documental constante dos presentes autos e, por outro, em depoimentos oralmente prestados que foram registados em gravação áudio apensa, e levando em consideração que o recorrente questiona a matéria de facto provada, este Tribunal julga provada a seguinte factualidade que se reputa relevante para a decisão e aditando-se, por isso, ao probatório nos termos do artº.712, nºs.1, al.a), e 2, do C. P. Civil (“ex vi” do artº.281, do C.P.P.Tributário):
19-Na escritura de permuta, lavrada no dia catorze de Julho do ano dois mil, no 4.º Cartório Notarial de Lisboa, identificada no nº.6 supra do probatório, surge como primeira outorgante a sociedade executada originária no processo de execução fiscal nº.1554-2005/103266.6, “B... - Promoções Turísticas por Valorização Urbanística de Propriedades, L.da.”, sendo representada no acto pela gerente H..., com poderes para o mesmo. Como segunda outorgante surge a sociedade “C...2000 - Sociedade Imobiliária, S.A.”, representada no acto pelos administradores com poderes para o mesmo, Emídio Manuel da Costa Catum e Teodoro Bartolomeu Neto Gomes Alho. Através da escritura, além do mais, a primeira outorgante, cedeu à segunda outorgante os prédios de que era proprietária sitos em Bem Parece, freguesia e concelho de Albufeira, identificados no nº.6 do probatório, imóveis aos quais foi atribuído o valor de 1.910.000.000$00 (mil novecentos e dez milhões de escudos), recebendo em troca créditos e respectivas garantias no valor global de 1.460.000.000$00 (mil quatrocentos e sessenta milhões de escudos), tal como uma garantia bancária autónoma, irrevogável, incondicional e à primeira interpelação, no valor global de 450.000.000$00 (quatrocentos e cinquenta milhões de escudos), garantia bancária essa emitida a favor da sociedade “E... - Construções e Administração, S.A.”. Mais ficou acordado que a segunda outorgante efectuava o pagamento do total dos créditos cedidos à primeira outorgante até ao pretérito dia 14/1/2001, sob pena de resolução do contrato nos termos do artº.806, do C.Civil (cfr.cópia da escritura junta a fls.245 a 258 do PEF apenso - 2ª. pasta);
20-A sociedade “E... - Construções e Administração, S.A.” é sócia maioritária da empresa executada originária no processo de execução fiscal nº.1554-2005/103266.6, “B... - Promoções Turísticas por Valorização Urbanística de Propriedades, L.da.”, desde a data da constituição desta, em 25/4/1968 (cfr.cópia de certidão da C.R.C. junta a fls.142 a 146 dos presentes autos; cópia de certidão permanente da sociedade junta a fls.20 a 23 dos presentes autos).
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Alicerçou-se a convicção do Tribunal, no que diz respeito à matéria de facto aditada, no teor dos documentos referidos em cada um dos números do probatório.
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ENQUADRAMENTO JURÍDICO
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Em sede de aplicação do direito, a sentença recorrida julgou totalmente procedente a oposição que originou o presente processo, em virtude de o oponente ter logrado demonstrar a sua ausência de culpa quanto à circunstância do património da sociedade executada originária se ter tornado insuficiente para o pagamento dos créditos fiscais objecto da execução fiscal nº.1554-2005/103266.6, em virtude do que se declarou a sua ilegitimidade e, consequentemente, se julgou extinta, quanto a ele, a mesma execução fiscal.
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Desde logo, se dirá que as conclusões das alegações do recurso definem, como é sabido, o respectivo objecto e consequente área de intervenção do Tribunal “ad quem”, ressalvando-se as questões que, sendo de conhecimento oficioso, encontrem nos autos os elementos necessários à sua integração (cfr.artºs.685-A, do C.P.Civil; artº.282, do C.P.P.Tributário).
O recorrente dissente do julgado alegando, em síntese e como supra se alude, que a douta sentença recorrida fez uma errada apreciação dos factos submetidos à sua apreciação e, consequentemente, uma errada interpretação do direito aplicável. Que resulta provado de todos os elementos constantes dos autos que o oponente era gerente de facto à data do pagamento voluntário da dívida exequenda, mais recaindo sobre o mesmo o ónus da prova de que não lhe era imputável a falta de pagamento, o que não logrou fazer. Assim é, porquanto, de acordo com a escritura de permuta, realizada pela devedora originária, os terrenos de sua propriedade que a “B...” possuía em Albufeira foram objecto de permuta com créditos existentes sobre os sócios da mesma. Nestes termos, embora a “B...” não tivesse bens imóveis tinha direitos de crédito sobre os seus sócios, direitos estes que não se encontram reflectidos na contabilidade e dos quais os sócios da “E...” e seu contabilista tinham ou, pelo menos, deveriam ter conhecimento. Face ao exposto, resulta que a “B...”, à data do vencimento e do pagamento voluntário da dívida exequenda, tinha créditos sobre terceiros e que o gerente à data, ou seja, o ora oponente, não os accionou de forma a cumprir as obrigações fiscais da sua representada (cfr.conclusões 1 a 11 do recurso). Com base em tal argumentação pretendendo, supõe-se, consubstanciar erro de julgamento de facto e de direito da sentença recorrida.
Examinemos se a decisão objecto do presente recurso padece de tais vícios.
Quanto ao alegado erro de julgamento de facto imputado à sentença objecto do presente recurso, este Tribunal já supra se pronunciou, tendo aditado à factualidade provada os nºs.19 e 20, para onde se remete.
Passemos ao exame do exposto erro de julgamento de direito que se reconduz à alegada ausência de culpa, por parte do opoente, quanto à circunstância do património da sociedade executada originária se ter tornado insuficiente para o pagamento dos créditos fiscais objecto da execução fiscal nº.1554-2005/103266.6.
Antes de mais, diremos que as normas com base nas quais se determina a responsabilidade subsidiária, inclusivamente aquelas que determinam as condições da sua efectivação e o ónus da prova dos factos que lhe servem de suporte, devem considerar-se como normas de carácter substantivo, pois a sua aplicação tem reflexos materiais na esfera jurídica dos revertidos. Nestes termos, a aplicação do regime previsto na L. G. Tributária aos requisitos da reversão da execução fiscal contra responsáveis subsidiários apenas tem suporte legal quando os factos que servem de fundamento à mesma reversão ocorreram depois da sua entrada em vigor (cfr.artº.12, do C.Civil; artº.12, da L.G.Tributária; ac.S.T.A.-2ª. Secção, 28/9/2006, rec.488/06; ac.S.T.A.-Pleno da 2ª. Secção, 24/3/2010, rec.58/09; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2007, pág.334 e 335).
No processo vertente, a eventual responsabilidade subsidiária do oponente e ora recorrido deve ser analisada à luz do regime previsto no artº.24, da L. G. Tributária, diploma que entrou em vigor no pretérito dia 1/1/1999, levando em consideração o período temporal a que respeita a liquidação que constitui o débito exequendo revertido (cfr.artº.6, do dec.lei 398/98, de 17/12).
Mas que responsabilidade é esta. Segundo a opinião que defendemos, a responsabilidade do gerente pela violação das normas que impõem o cumprimento da obrigação fiscal radica no instituto da responsabilidade por facto ilícito assente em culpa funcional, isto é, em responsabilidade civil extracontratual (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 9/12/2004, rec.28/04, in Revista Fiscal, Vida Económica, Fevereiro, 2006, pág.28).
O estatuto do gerente/administrador advém-lhe por virtude da sua relação negocial com a sociedade, iniciada com a sua nomeação para o exercício do cargo de gerente e consequente aceitação do mesmo, em virtude do que assume uma situação de garante das dívidas sociais, embora com direito à prévia excussão dos bens da empresa (cfr.artº.146, do C.P.C.Impostos; artº.239, nº.2, do C.P.Tributário; artº.153, nº.2, do C.P.P. Tributário).
A lei não define precisamente em que é que se consubstanciam os poderes de gerência, mas, em face do preceituado nos artºs.259 e 260, do Código das Sociedades Comerciais, parece dever entender-se que serão típicos actos de gerência aqueles que se consubstanciam na representação da sociedade perante terceiros, aqueles através dos quais a sociedade fique juridicamente vinculada e que estejam de acordo com o objecto social (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 3/5/1989, rec.10492; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P. Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2007, pág.351).
É no artº.64, do C. S. Comerciais, que se encontra consagrado o dever de diligência dos administradores/gerentes de sociedade, nos termos do qual estes devem actuar com a diligência de um gestor criterioso e ordenado, no interesse da sociedade, tendo em conta os interesses dos sócios e dos trabalhadores.
A gerência é, por força da lei e salvo casos excepcionais, o órgão da sociedade criado para lhe permitir actuar no comércio jurídico, criando, modificando, extinguindo, relações jurídicas com outros sujeitos de direito. Estes poderes não são restritos a alguma espécie de relações jurídicas; compreendem tantas quantas abranja a capacidade da sociedade (cfr.objecto social), com a simples excepção dos casos em que as deliberações dos sócios produzam efeitos externos (cfr.artºs.260, nº.1, e 409, nº.1, do C.S.Comerciais). O gerente/ administrador goza de poderes representativos e de poderes administrativos face à sociedade. A distinção entre ambos radica no seguinte: se o acto em causa respeita às relações internas entre a sociedade e quem a administra, situamo-nos no campo dos poderes administrativos do gerente. Pelo contrário, se o acto respeita às relações da sociedade com terceiros, estamos no campo dos poderes representativos. Por outras palavras, se o acto em causa tem apenas eficácia interna, estamos perante poderes de administração ou gestão. Se o acto tem eficácia sobre terceiros, verifica-se o exercício de poderes de representação (cfr.Raúl Ventura, Comentário ao Código das Sociedades Comerciais, Sociedades por Quotas, III, Almedina, 1991, pág.128 e seg.; Rui Rangel, A vinculação das sociedades anónimas, Edições Cosmos, Lisboa, 1998, pág.27 e seg.).
Analisada a plêiade de actos que o gerente/administrador pode exercer, enquanto representante da sociedade, passemos à responsabilidade subsidiária do mesmo.
No domínio do artº.16, do C. P. C. Impostos, encontrávamo-nos perante responsabilidade “ex lege”, alicerçada num critério de culpa funcional presumida, assim dispensando a imputação subjectiva (ao nível do nexo de culpa) baseada num comportamento individual do gerente, antes se ligando ao mero exercício do cargo ou funções de gerência. Verificada a gerência de direito, presumia-se a gerência de facto, incumbindo ao responsável subsidiário, em sede de oposição à execução contra si revertida, o ónus de provar que, apesar da gerência de direito, não a exerceu de facto ou, por outro lado, que não a exerceu de forma culposa no que diz respeito à verificada insuficiência do património social (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 22/9/93, C.T.F.376, pág.211 e seg.; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 11/10/95, C.T.F.381, pág.311 e seg.; A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.51 e seg.).
Com o dec.lei 68/87, de 9/2, o qual veio submeter a responsabilidade subsidiária consagrada no artº.16, do C. P. C. Impostos, ao regime previsto no artº.78, do C. S. Comerciais, de acordo com a jurisprudência dominante, passou a ser exigível a culpa dos administradores ou gerentes das sociedades para que a mesma se efectivasse. Por outro lado, onerou-se a Fazenda Pública, nos termos do artº.487, nº.1, do C. Civil, com o obrigação da alegação e prova da culpa do responsável subsidiário pela inexistência de bens do devedor originário com vista à satisfação dos créditos fiscais (cfr.ac.S.T.A.-2ª.Secção, 22/1/97, C.T.F.386, pág.379 e seg.; ac.S.T.A.-Pleno da 2ª.Secção, 9/7/97, Acórdãos Doutrinais, nº.432, pág.1467 e seg.).
Com a entrada em vigor do C. P. Tributário (1/7/91), a responsabilidade subsidiária dos administradores ou gerentes de sociedades de responsabilidade limitada passa a estar consagrada no artº.13, deste diploma. Ao abrigo deste regime, desde logo, se dirá que a responsabilidade subsidiária dos administradores ou gerentes passou a estar restrita às dívidas ao Estado por contribuições e impostos, quando anteriormente a mesma responsabilidade podia abarcar também multas e quaisquer outras dívidas que não somente as aludidas contribuições e impostos. Por outro lado, contrariamente ao regime resultante do aludido dec.lei 68/87, de 9/2, volta o ónus da prova da actuação sem culpa a pender sobre os administradores ou gerentes. E não é pequena, para os mesmos, esta diferença de perspectiva legal, já que, se era difícil para a Fazenda Pública, face ao regime resultante do dec.lei 68/87, de 9/2, fazer a prova positiva da culpa, mais difícil será para os administradores ou gerentes fazerem a prova negativa de tal factualidade (cfr.A. José de Sousa e J. da Silva Paixão, Código de Processo Tributário anotado e comentado, 3ª. edição, 1997, pág.55).
Passemos, agora, à análise do regime consagrado no artº.24, da L. G. Tributária, o aplicável ao caso concreto, conforme mencionado supra.
Do disposto no artº.22, da L. G. Tributária, retira-se que a regra geral da responsabilidade tributária originária sofre duas excepções, sendo elas a responsabilidade solidária (o responsável solidário é um condevedor solidário que, por força da lei, está em igualdade de circunstâncias com o responsável originário, o que implica que possam ser demandados ambos simultaneamente, ou qualquer um deles indistintamente, quanto ao cumprimento da prestação tributária) e a responsabilidade subsidiária (só a impossibilidade de cumprimento do responsável originário pode originar o subsequente chamamento do responsável subsidiário ao cumprimento da prestação tributária), constituindo esta última (a responsabilidade subsidiária) a regra nesta matéria, nos termos do preceituado no nº.3 do referido normativo.
A reversão contra o devedor subsidiário depende da fundada insuficiência dos bens penhoráveis do devedor principal e dos responsáveis solidários, sem prejuízo do benefício da excussão prévia (cfr.artº.23, nº.2, da L.G.T.) e é sempre precedida da audição do responsável subsidiário (cfr.nº.4 do mesmo preceito). O nº.5 da disposição legal em causa atribui um privilégio ao devedor subsidiário que, sendo citado para o pagamento da dívida tributária e o efectuar no prazo de oposição, fica isento do pagamento de juros de mora e de custas. Este pagamento, de acordo com o artº.23, nº.6, da L. G. Tributária, tem efeito suspensivo (e não extintivo) da execução fiscal, pois no caso de virem a ser encontrados bens ao devedor principal ou ao responsável solidário, ficam estes obrigados ao pagamento de juros de mora e das custas.
Preceitua o nº.1, do artº.24, da L. G. Tributária, o seguinte (redacção actual introduzida pela Lei 30-G/2000, de 29/12):

“Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento.”.

Na previsão da al.a), do normativo em análise pretendem-se isolar as situações em que o gerente/administrador culpado pela diminuição do património societário será responsável pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou de entrega tenha terminado depois deste, competindo à Administração Fiscal fazer a prova de que foi por culpa sua que o património se tornou insuficiente. Já na al.b), do preceito o gerente é responsável pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou de entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, recaindo sobre o mesmo o ónus da prova de que não foi por culpa sua que o pagamento não se efectuou.
Por outras palavras, nas situações em que o gestor exerce, efectivamente, as suas funções e é no decurso desse exercício que se forma o facto tributário ou se inicia o prazo para o pagamento, mas antes que tal prazo se esgote, o gestor cessa as suas funções, o ónus da prova, de que o património da sociedade se tornou insuficiente para a satisfação da dívida por acto culposo do gestor, corre por conta da Fazenda Pública (cfr.alínea a), do artigo 24, da L.G.T.). Se é no decurso do exercício efectivo do cargo societário de gerente que se esgota o prazo para o pagamento do imposto, não vindo ele a acontecer (o pagamento não se efectuou no prazo devido), o ónus da prova inverte-se contra o gerente, sendo ele quem tem de provar que não lhe foi imputável a falta de pagamento (o gestor está obrigado a fazer prova de um facto negativo, poupando-se a Fazenda Pública a qualquer esforço probatório - cfr.al.b), do normativo em exame). Na alínea b), do nº.1, do artº.24, da L. G. Tributária, consagra-se uma presunção de culpa, pelo que a Administração Fiscal está dispensada de a provar. Concluindo, se a gestão real ou de facto cessa antes de verificado o momento em que se esgota o prazo para pagamento do imposto, o ónus da prova recai sobre a Fazenda Pública, se a gestão coincide com ele, o ónus volta-se contra o gestor (cfr.Sérgio Vasques, A Responsabilidade dos Gestores na Lei Geral Tributária, Fiscalidade - Revista de Direito e Gestão Fiscal, nº.1, Janeiro de 2000, pág.47 e seg.; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Vislis, 2003, pág.142 e seg.; Jorge Lopes de Sousa, C.P.P.Tributário anotado e comentado, II volume, Áreas Editora, 5ª. edição, 2007, pág.342 e seg.).
A diferença de regimes, em termos de repartição do ónus da prova, prevista nas als.a) e b) do artº.24, da L. G. Tributária, decorre da distinção entre “dívidas tributárias vencidas” no período do exercício do cargo e “dívidas tributárias vencidas” posteriormente (cfr.al.c) do nº.15, do artº.2, da Lei 41/98, de 4/8 - autorização legislativa ao abrigo da qual foi aprovada a L.G.T. - ac.S.T.A.-2ª.Secção, 23/6/2010, rec.304/10; ac.S.T.A.-2ª.Secção, 6/10/2010, rec.509/10).
“In casu”, conforme admite o próprio opoente e ora recorrido, o regime no qual se funda a sua responsabilidade pela dívida social é o previsto na alínea b), do nº.1, do artº.24, da L. G. Tributária, desde logo porque exercia funções de gerência da sociedade “B... - Promoções Turísticas por Valorização Urbanística de Propriedades, L.da.” na data (27/1/2005) em que ocorreu o termo final de pagamento da dívida tributária que constitui objecto do processo de execução fiscal nº.1554-2005/103266.6 pelo que, o ónus da prova inverte-se contra si, sendo ele quem tem de provar que não lhe foi imputável a falta de pagamento da dívida tributária em causa (cfr.4.004.833,51, relativo a dívida de I.R.C. de 2000 - nºs.3, 4 e 7 da matéria de facto provada).
A sentença recorrida conclui que o oponente logrou demonstrar a sua ausência de culpa quanto à circunstância do património da sociedade executada originária se ter tornado insuficiente para o pagamento dos créditos fiscais objecto da execução, em consequência do que julgou a oposição procedente.
A Fazenda Pública, ora recorrente, entende que não.
Examinemos quem tem razão.
Conforme mencionado supra, importa aquilatar se o oponente, ora recorrido, logrou ilidir a presunção de culpa que sobre ele recai nos termos do artº.24, nº.1, al.b), da L.G.T.
Não se discutindo que seja esse o regime da responsabilidade subsidiária aplicável e que o oponente foi gerente de direito e de facto no período relevante para a constituição da responsabilidade, resta-nos averiguar se, sim ou não, este conseguiu ilidir a presunção de culpa que sobre ele recai. A culpa aqui em causa deve aferir-se pela diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias do caso concreto - isto, quer se entenda que a responsabilidade em causa tem natureza contratual ou extra-contratual (cfr.artºs.487, nº.2, e 799, nº.2, do C.Civil) - e em termos de causalidade adequada, a qual não se refere ao facto e ao dano isoladamente considerados, mas ao processo factual que, em concreto, conduziu ao dano. Sabido que são os administradores ou gerentes quem exterioriza a vontade da sociedade nos mais diversos negócios jurídicos, através dos quais se manifesta a sua capacidade de exercício de direitos, a responsabilidade subsidiária assenta na ideia de que os poderes de que estavam investidos lhes permitiam uma actuação determinante na condução da sociedade. Assim, há que verificar, operando com a teoria da causalidade, se a actuação do ora recorrente como gestor da sociedade originária devedora, concretizada quer em actos positivos quer em omissões, foi adequada à insuficiência do património societário para a satisfação dos créditos exequendos. E, nesse juízo, haverá que seguir-se o processo lógico da prognose póstuma. Ou seja, de um juízo de idoneidade, referido ao momento em que a acção se realiza ou a omissão ocorre, como se a produção do resultado se não tivesse ainda verificado, isto é, de um juízo “ex ante”. É que a causalidade não se refere ao facto e ao dano isoladamente considerados, mas ao processo factual que, em concreto, conduziu ao dano, não podendo existir causalidade adequada quando o dano se verificou apenas por virtude de circunstâncias excepcionais ou anómalas que, no caso concreto, se registaram e que interferiram no processo de causalidade, considerado este no seu conjunto (cfr. ac.T.C.A.Sul-2ª.Secção, 6/10/2009, proc.3267/09; Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, Vislis, 2003, pág.142 e seg.; Isabel Marques da Silva, A Responsabilidade Tributária dos Corpos Sociais, em Problemas Fundamentais do Direito Tributário, Vislis, Lisboa, 1999, pág.121 e seg.).
Analisando, agora, a matéria de facto provada e aditada ao probatório (cfr.nºs.19 e 20 da matéria de facto provada), deve reconhecer-se que o opoente/recorrido não produziu prova que permita concluir que não teve culpa no acto de não pagamento da dívida exequenda (e não na insuficiência do património social com vista ao pagamento da dívida exequenda, vector este que antes se enquadra na alínea a), do preceito). É que, apesar do quadro contabilístico da empresa expresso no nº.17 da matéria de facto provada e supra exarada, o certo é que se impunha ao opoente/recorrido, enquanto único gerente da empresa executada originária, que tivesse conhecimento dos créditos de que era titular a mesma sociedade (cfr.artº.19 do probatório), créditos esses que poderiam servir como meio de pagamento da dívida exequenda, mais devendo o opoente efectuar diligências nesse sentido, nomeadamente no que diz respeito à garantia bancária autónoma, irrevogável, incondicional e à primeira interpelação, no valor global de 450.000.000$00, de que era titular a empresa em virtude da celebração do contrato de permuta. Pelo contrário, concluindo que a sociedade não teria possibilidade de cumprir as suas obrigações tributárias, deveria ter tomado medidas no sentido de obviar a esta situação, maxime, pedindo a declaração de insolvência da empresa atempadamente. Esta forma de actuação era imposta pelo citado critério do bom pai de família, do gerente competente e criterioso.
Não pode, pois, considerar-se que o oponente tenha logrado ilidir a presunção de culpa pelo não pagamento da dívida exequenda que sobre si impendia. Não fazendo tal prova, deve considerar-se procedente este fundamento do recurso e, consequentemente, julgar parte legítima para a execução fiscal nº.1554-2005/103266.6 o opoente/recorrido quanto a tais dívidas, contra si devendo prosseguir a citada execução enquanto responsável subsidiário.
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DISPOSITIVO
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Face ao exposto, ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO deste Tribunal Central Administrativo Sul em CONCEDER PROVIMENTO AO RECURSO e revogar a sentença recorrida, julgando improcedente a oposição e parte legítima o opoente A... no âmbito da execução fiscal nº.1554-2005/103266.6, no que respeita à dívida de I.R.C. de 2000, no montante de € 4.004.833,51 e contra si revertida.
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Condena-se o opoente/recorrido em custas somente na 1ª. Instância.
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Registe.
Notifique.
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Lisboa, 8 de Maio de 2012


(Joaquim Condesso - Relator)
(Lucas Martins - 1º. Adjunto)

(Aníbal Ferraz - 2º. Adjunto), em subst.

Vencido, por entender não se mostrar comprovado, por
parte da FP, que o oponente exerceu de facto, efectivamente
a gerência da sociedade originária devedora.