Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:363/08.0BELRA
Secção:CT
Data do Acordão:04/28/2022
Relator:VITAL LOPES
Descritores:IRS
FACTURAS FALSAS
ÓNUS DE PROVA
Sumário:I - Quando a Administração Tributária desconsidera facturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do artigo 74.º da LGT, competindo à Administração fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da factura não corresponde à realidade. Feita esta prova, passa a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transacção.
II - No que concerne à prova que compete à Administração, o que é imprescindível é que aquela a faça de factos suficientes indiciadores a que o Tribunal possa concluir, “em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência”, pela elevada probabilidade (ou até certeza) de que o negócio declarado por aquelas partes não corresponde à realidade materializada naquela factura”.
III - Nesta tarefa, poderá a Administração Tributária lançar mão de elementos obtidos com recurso à fiscalização cruzada, junto de outros contribuintes, para obter os referidos indícios, pelo que tais indicadores de falsidade das facturas não têm necessariamente que advir de elementos do próprio contribuinte fiscalizado.
IV - Limitando-se a AT a apoiar as correcções efectuadas ao impugnante/Recorrido unicamente nas acções de inspecção efectuadas aos fornecedores, pretendendo extrapolar as conclusões a que chegou nessas acções de inspecção às facturas referentes ao Recorrido, sem que tenha recolhido um único indício concreto relacionado com aquele, não cumpre o ónus probatório que lhe incumbe na recolha de indícios sérios de que as operações facturadas não têm subjacente a realidade que reflectem.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2.ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I. RELATÓRIO


O Exmo. Representante da Fazenda Pública, recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por P… visando a anulação da liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) relativa ao ano de 2001 e dos respectivos juros compensatórios (JC).

O Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes e doutas conclusões:
«
A. Aponta-se à sentença recorrida vício notório de apreciação, ao omitir qualquer espécie de pronúncia, explícita ou apenas implícita, quanto à valia e teor dos depoimentos prestados em Juízo pelas testemunhas arroladas pela Fazenda Pública.
B. Sendo certa a relevância de tais testemunhos para infirmar a veracidade das compras de mercadoria protestadas pelo impugnante, pois deram de viva voz conta das irregularidades que detectaram nos seus fornecedores L…, Lda., R…, Lda. e F...
C. Não é de aceitar a citação selectiva do RIT feita na sentença ora impugnada, na medida em que omite as conclusões mais significativas das acções inspectivas efectuadas aos citados fornecedores do impugnante, vindo depois a acusá-lo de falta de fundamentação substancial, quando na realidade aquele se encontra legal e adequadamente fundamentado.
D. Tal equivaleria a cercear a possibilidade de o RIT estar expressamente fundamentado por remissão, fazendo seus o teor e conclusões de informações oficiais da Inspecção Tributária tocantes aos fornecedores do impugnante, nos termos admitidos pelos artigos 77º, n.º 1 da LGT e 125º, n.º 1 do CPA.
E. Padece do vício de errónea apreciação da prova a sentença recorrida, ao concluir que os depoimentos produzidos pelas testemunhas indicadas pelo impugnante lograram demonstrar a veracidade das operações comerciais sub judice, quando é certo que as testemunhas em causa demonstraram possuir com o impugnante relação profissional, mercantil e laboral, em todos os casos carecendo de isenção, distanciamento e objectividade bastantes.
F. A que acresce a deficiência justificadamente apontada a tal meio probatório para confirmar, de modo rigoroso e convincente, concretas transacções comerciais cuja veracidade foi colocada em causa pela acção da inspecção tributária.
G. Como bem resulta do sumário do Acórdão proferido nesse TCA (processo n.º 05244/11): “(…)
2. Não logra fazer tal prova a impugnante que, através dos depoimentos das testemunhas inquiridas, não conseguem identificar concretamente quais os serviços prestados por esse invocado prestador de serviços nas obras em causa (…) desta forma não colocando em dúvida séria, fundada, os indícios recolhidos pela AT e que apontavam para que a mesma não tivesse aderência com a realidade e logo o bem fundado da liquidação adicional”
H. Todos os elementos necessários para cimentar a convicção da falta de adesão à realidade das transacções de sucata em causa estão contidos nas informações oficiais da Inspecção Tributária e, de igual modo no RIT que as avoca (art.º 76º, n.º 1 da LGT), merecendo corroboração suplementar pelos testemunhos que foram, sem justificação, não conhecidos pelo Tribunal a quo.
I. Razões que estribam o pedido formulado ao Tribunal ad quem, de revogar a sentença recorrida e, no judicioso uso dos poderes de cognição, alterar o elenco probatório com os factos pertinentes mais acima apontados, de modo a ficar habilitado a, em substituição, julgar totalmente improcedente a impugnação judicial tributária deduzida pelo recorrido.

Nestes termos, e nos demais que esse douto Colectivo entenda por bem invocar, defende a Fazenda Pública que seja julgado procedente este recurso jurisdicional e seja revogada a sentença do Tribunal a quo, com o que farão V.
Ex.as a pretendida
Justiça!».

O Recorrido apresentou contra-alegações, que culmina com as seguintes e doutas conclusões:
«
a) O recurso interposto da douta sentença pela Fazenda Nacional deverá ser rejeitado uma vez que a recorrente não cumpriu o ónus da especificação obrigatória imposta pelo disposto no artigo 640.º n.º 1 e 2 do CPC de especificar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados e os concretos meios probatórios que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
b) Sem prejuízo do alegado sempre se dirá que a douta sentença recorrida não padece dos vícios de nulidade invocados pela Fazenda Nacional porquanto, especifica de forma clara os fundamentos de facto e de direito da decisão, concluindo, em síntese, e como questão essencial, que a "não resta senão concluir que a AT não logrou demonstrar a existência de indícios sérios e fundados de que os custos com a aquisição de mercadorias em causa têm por base operações simuladas. Efectivamente, no RIT que está na génese das liquidações impugnadas nada é dito a respeito da fiabilidade dos registos contabilísticos do Impugnante, nem a respeito das compras que realizou em 2001com esses fornecedores. Também nada é dito no RIT relativamente aos meios de pagamento utilizados pelo Impugnante para pagamento das mercadorias. Ou seja, a AT não recolheu junto do Impugnante indícios sérios, coerentes e objetivos de que os custos que foram corrigidos não têm por base operações reais.
c) Do teor da decisão recorrida poderá constatar-se o sentido e o alcance da decisão: que a Administração Tributária não demonstrou a existência de indícios sérios e objetivos de que as transações do impugnante são simuladas.
d) Como também se retira do sentido da decisão recorrida o meritíssimo juiz a quo constatou que as liquidações impugnadas estão mal fundamentadas porquanto o relatório de inspecção tributária não permite concluir que factos ou indícios são apontados ao impugnante que permitam provar e demonstrar que as compras tituladas pelas facturas dos fornecedores em questão são falsas, não bastando, pois, transcrever conclusões relativamente a outros fornecedores objecto de inspecções que não são do conhecimento do impugnante.
e) Da decisão recorrida conclui-se que a Administração Tributária apenas se baseou em meros indícios e conclusões provenientes de informações de outras Direcções de Finanças, que não analisaram a escrita nem a realidade do negócio do recorrido, mas apenas a escrita de sujeitos passivos terceiros.
f) E, transcrevendo-se a "transcrição" dos fundamentos vertidos no do venerando Acórdão do TCA Sul (proc. n.0 07169/13 de 18.06.2015, disponível in www.dgsi.pt em que as partes são as mesmas, a "AT não escreve uma única linha sobre a forma como o Recorrido desenvolve a sua atividade, ou como se relaciona com aqueles fornecedores que são reputados com emitentes de facturas falsas" e, "ainda que resultasse provado que um determinado fornecedor emite facturas falsas, tal não significa necessariamente que o tenha feito de todas as vezes que emitiu facturas falsas, com todos os seus clientes' (...)
"Os indícios recolhidos relativamente a um fornecedor não podem ser usados de forma generalizada e indiscriminada sem a devida cominação de quem recebe a fatura”.

E de que "O Juízo subjacente à desconsideração das operações por falsas reside única e exclusivamente em inspeções efectuadas aos fornecedores, com caráter genérico e sem confronto com a situação concreta do Recorrido”.


g) Já no que respeita ao teor do Relatório de Inspecção Tributária, que se encontra junto ao Processo Administrativo, do seu teor (Cfr. ALÍNEA q da fundamentação de facto) só poderia chegar-se à conclusão da FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO da liquidação de IRS e JC impugnadas.
h) A falta ou insuficiência de inspecção directa aos elementos do impugnante, permitiram uma má fundamentação do acto, como bem se conclui na douta sentença recorrida, e pelas seguintes razões e que se pode constatar do "teor" do relatório de inspecção tributária:
- A Administração Tributária, não analisou os fluxos financeiros, nomeadamente, os meios de pagamento (cheques) que o impugnante utilizou para aquisição de sucata. quer durante o procedimento de inspecção quer em sede de reclamação graciosa;
- A Administração Tributária também não analisou os recebimentos, correspondentes à sucata que o impugnante vendeu aos seus clientes (espelhados na sua contabilidade), quer durante o procedimento de inspecção, quer em sede de reclamação graciosa;
- A Administração Tributária desprezou a estrutura organizacional do impugnante, composta por estaleiro, máquinas, viaturas e cerca de 16 empregados (estes comprováveis na Segurança Social apesar de terem estado nas instalações do impugnante vários Inspectores Tributários, em operações de surpresa, por diversas vezes (facto que se omite no relatório), onde puderam constatar a realidade da actividade exercida pelo impugnante.
- A Administração Tributária desconsiderou que sem as compras o impugnante não poderia ter feito as vendas, declaradas, como ficou provado pelo Relatório Pericial.

i) De todo o exposto resulta que a actuação da Administração Tributária, i.e., no que respeita à liquidação adicional de IRS do ano de 2001, é ilegal e carece de fundamentação, como obriga o disposto no artigo 77.º n.º 1 da LGT e 125.º do CPA, e foi este o rumo levado pela douta decisão recorrida;

j) Mas mesmo que não fosse este o entendimento, sempre se dirá que o impugnante logrou provar a veracidade das transacções.

NESTES TERMOS deverá improceder o Recurso interposto pelo ilustre Representante da Fazenda Nacional, mantendo-se a douta decisão recorrida ou outra que julgue totalmente procedente a impugnação da liquidação adicional de IRS e respetivos Juros Compensatórios do ano de 2001
Assim se fazendo a costumada JUSTIÇA !!!

A Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso, mantendo-se o julgado.

Colhidos os vistos legais e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.

II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.

Assim, analisadas as conclusões das alegações do recurso, a questão nuclear que importa resolver reconduz-se a indagar se a sentença incorreu em erro de julgamento, de facto e de direito, ao concluir que a Administração tributária não recolheu indícios bastantes de que as facturas contabilizadas pelo impugnante, no ano de 2001, dos emitentes L…, Lda., F… e R…– Comércio por Grosso de S..., Lda., não titulam reais e efectivas operações económicas.
***

III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Na sentença recorrida deixou-se factualmente consignado:
«
A. Em 15.09.2005, a AT iniciou uma ação de inspeção ao Impugnante relativamente ao exercício de 2001, com incidência no IRS e no Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA), a qual terminou em 13.10.2005 – cf. pág. 3 do RIT que consta de fls. 53 a 325 do PRG, que se dão por integralmente reproduzidas;

B. A ação de inspeção referida no ponto A. que antecede foi motivada por informações recebidas relativamente aos fornecedores L…, F… Garcia e R…, que apontam para indícios de emissão de faturação falsa – cf. pág. 3 do RIT que consta de fls. 53 a 325 do PRG, que se dão por integralmente reproduzidas;

C. Em 07.11.2005, foi concluído o RIT elaborado no seguimento da realização pela AT da ação de inspeção referida no ponto A. supra, no qual, além do mais, consta o seguinte:

“(…)
1. Fornecedores com indícios de emissão de facturação falsa
Foram recebidas informações relativamente a fornecedores de compras de sucatas que apontam para a não confirmação das transacções, conforme pontos seguintes:

1.1 - L…, Lda. – NIF 5…
(…)
Pelo que consideramos que existem indícios fundados das facturas emitidas pela Lisbarte, Lda. serem “falsas”, no sentido de não reflectirem operações reais, uma vez que não tinha capacidade e estrutura organizacional para realizar as operações declaradas.

1.2 F…– NIF 1…
(…)
concluíram que, existem fortes indícios de que no essencial a actividade declarada pelo sujeito passivo em 2001 é fictícia, tendo como objectivo titular transacções para as quais não foi emitido o respectivo documento ou transacções inexistentes, com o intuito de conferir a montante o direito à dedução do IVA liquidado que não foi entregue nos cofres do Estado, por via de documentos de compras consideradas falsas que foram contabilizadas.

1.3 R… – Comércio por Grosso de S…, Lda. – NIF 5…
(…)
Verificou-se que se trata de uma empresa constituída com fins fraudulentos para servir interesses do sócio fundador F… que, não tendo uma estrutura empresarial apropriada, não poderia gerar o volume de negócios declarado pelo que se considera que as facturas emitidas pela firma R…, Lda. não têm subjacente qualquer transacção comercial.

1.4.1 Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares
Assim, nos termos do artigo 23º do CIRC por remissão do artigo 32º do CIRS, não são aceites como custo de compras do ano de 2001 no montante de 274.463,47€.
(…)” - cf. RIT que consta de fls. 53 a 325 do PRG, que se dão por integralmente reproduzidas;

D. Em data não concretamente determinada, o Impugnante foi notificado da “Demonstração de acerto de contas” com o número de identificação de documento 2005 0001276141, com o valor a pagar de € 128.892,41, assim como dos atos tributários impugnados – cf. fls. 41 a 45 do PRG, que se dão por integralmente reproduzidas;

E. Em 17.04.2006, o Impugnante apresentou reclamação graciosa contra as liquidações referidas no ponto D. que antecede, a qual foi indeferida na totalidade – cf. fls. 2 a 587 do PRG, que se dão por integralmente reproduzidas;

F. No ano de 2001, o Impugnante não poderia ter realizado o volume de vendas que evidenciou na sua contabilidade sem as compras (quantidades de mercadorias) registadas na contabilidade – cf. resposta ao quesito 1 do relatório pericial que consta de fls. 640 a 643 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidas;

G. Através da contabilidade do Impugnante e demais documentos bancários é possível concluir-se que as compras e as vendas foram acompanhadas dos respetivos fluxos financeiros (pagamentos e recebimentos) – cf. resposta ao quesito 3 do relatório pericial que consta de fls. 640 a 643 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidas;

H. A contabilidade do Impugnante reflete o desenvolvimento de uma atividade económica – cf. resposta ao quesito 4 do relatório pericial que consta de fls. 640 a 643 dos autos, que se dão por integralmente reproduzidas;

I. Em 27.03.2008, foi apresentada a presente impugnação judicial – cf. carimbo aposto a fls. 1 dos autos.
*
Factos não provados

Não se vislumbram outros factos alegados cuja não prova seja relevante para a decisão dos autos.
*

Motivação da decisão da matéria de facto

Prova documental


Os meios de prova documental que serviram para a formação da convicção do Tribunal estão referidos no “probatório” com remissão para as folhas do processo onde se encontram.

Nesta sede ainda, cumpre sublinhar que a ERFP desenvolveu uma laboriosa investigação junto dos autos de inquérito n.º 266/07.5TATNV, apresentando várias conclusões, que por não terem sido julgadas, e se referirem, fundamentalmente, aos fornecedores do Impugnante, têm um valor probatório escasso.

Da parte relacionada diretamente com o Impugnante, diz-se, além do mais, que alguns cheques que alegadamente titulam os pagamentos acabaram por retornar à sua conta via “conta da sua mulher”. É possível que este procedimento tenha existido e que daí se possa concluir que nem todas as compras foram “reais”, mas tal não permite extrapolar para a totalidade das compras. E mesmo em relação às compras cujo dinheiro retornou à posse do Impugnante, não foi matéria incluída no RIT, ou seja, não fundamentou os atos tributários ora impugnados judicialmente.

Prova pericial

No relatório pericial são confirmadas, fundamentalmente, as alegações do Impugnante no tocante à necessidade dos custos para realizar os proveitos, bem como a correção formal da contabilidade e o adequado registo dos meios monetários utilizados».

FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

O Recorrente começa por imputar à sentença erro de julgamento de facto, ora por omissão ao probatório de factos relevantes para a decisão, nomeadamente, a transcrição das passagens do relatório de inspecção tributária em que está vertida a fundamentação das correcções levadas a efeito, ora por uma deficiente apreciação e valoração da prova testemunhal, em que se limitou a relevar erroneamente os depoimentos prestados pelas testemunhas do impugnante, desconsiderando os depoimentos das testemunhas arroladas pela Fazenda Pública.

A impugnação da decisão da matéria de facto tem regras traduzidas em ónus para o impugnante cujo incumprimento acarreta a sua rejeição e cujos termos constam do art.º 640º do CPC.

Estabelece aquele preceito:
«Artigo 640.º
Ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto
1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.»

Ora, constata-se que o Recorrente apenas impugnou eficazmente a matéria de facto na parte relativa aos factos omitidos do probatório, pois concretiza as passagens do RIT que pretende ver contempladas no probatório, por a seu ver, nelas estar vertido o essencial da fundamentação das correcções.

Já no que concerne ao alegado erro na apreciação e valoração da prova testemunhal, a verdade é que o Recorrente não concretiza quais os factos relevantes que, a seu ver, se colhem dos depoimentos prestados pelas testemunhas que arrolou e deveriam estar contemplados no probatório, ou que factos mereceriam outra leitura caso fossem ponderados os depoimentos das testemunhas por si indicadas, como também não concretiza afinal que factos foram erroneamente levados ao probatório com base no depoimento das testemunhas indicadas pelo impugnante que o Mmº juiz a quo sobrevalorou em detrimento de outros elementos probatórios de sentido contrário, documentais, testemunhais ou periciais.

Neste segmento, a impugnação da decisão de facto apresenta-se manifestamente ineficaz, por incumprimento do ónus previsto naquele n.º 1 do art.º 640.º do CPC, o que importa a sua imediata rejeição, não havendo lugar a qualquer despacho de aperfeiçoamento para o efeito (vd. Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2013, Almedina, pág.127).

No que em particular se refere aos segmentos do RIT cuja transcrição foi omitida do probatório e onde alegadamente se contém o essencial da fundamentação das correcções, dado se revelarem em abstracto pertinentes em vista das soluções plausíveis de direito, levaremos as mesmas ao probatório, alterando o seu ponto C), que passa a ter a seguinte redacção:
«
C. Em 07.11.2005, foi concluído o RIT elaborado no seguimento da realização pela AT da ação de inspeção referida no ponto A. supra, no qual, além do mais, consta o seguinte:
“(…)
1. Fornecedores com indícios de emissão de facturação falsa
Foram recebidas informações relativamente a fornecedores de compras de sucatas que apontam para a não confirmação das transacções, conforme pontos seguintes:

1.1 - L…, Lda. – NIF 5…
A informação remetida pela Direcção de Finanças de Lisboa pelo ofício nº 52869 de 19 de Agosto de 2005, que fica arquivado no processo individual do sujeito passivo, descreve no essencial as seguintes situações sobre a capacidade de realização das operações efectuadas e da facturação emitida:
• Fornecedores desconhecidos ou sem capacidade para realizar transmissões;
• Principais clientes F… e R…, Lda. com relações especiais com o sujeito passivo;
• Declaração de vendas intracomunitárias não confirmadas pelas Administrações Fiscais dos países
respectivos;
• Não movimenta conta de bancos sendo os pagamentos e os recebimentos realizados a dinheiro mesmo os mais avultados;
• Segundo os balancetes e a Segurança Social não tem pessoal ao serviço, e os custos com
Fornecimentos e Serviços Externos são muito reduzidos face ao volume de negócios declarado, o que indicia a inexistência de uma estrutura adequada e de uma capacidade organizacional capaz de sustentar a realização das operações inerentes;
• Locais indicados pelo sujeito passivo no Distrito de Braga e de Santarém onde tinha tido
estaleiros, obtiveram-se respostas das autoridades locais que indicam que os mesmos não existem;
• O local indicado pela gerente Dina Duque Garcia como estaleiro da L…, Lda no período de 01-01-2002 até Maio de 2004 - Quinta da Adega - Sobreda - não tem condições nem dimensões para o volume e tipos de sucata que o sujeito passivo diz ter vendido;
• As viaturas existentes em nome do sujeito passivo, são apenas duas viaturas em condições de
circular e tendo em conta os quilómetros percorridos pelas mesmas, bem como a capacidade de transporte de cada uma, não são suficientes para o exercício da actividade declarada;
• Não se conhecem contratos de água, luz ou telefone, que provem a existência de instalações próprias ou arrendadas, a isto junta-se o facto da sede da empresa ser no escritório do técnico oficial de contas, que alegadamente só servia para receber a correspondência, não trabalhando aí ninguém do quadro de pessoal da empresa.

Pelo que consideramos que existem indícios fundados das facturas emitidas pela L…, Lda. serem “falsas”, no sentido de não reflectirem operações reais, uma vez que não tinha capacidade e estrutura organizacional para realizar as operações declaradas.

1.2 F…– NIF 1…
A informação inicial datada de 14-09-2005 e a informação adicional datada 13-10-2005 relativa ao fornecedor F…, que ficam arquivadas no processo individual do sujeito passivo, apresentam as seguintes conclusões sobre a capacidade de realização das operações efectuadas e da facturação emitida:
• A contabilidade não reflecte os movimentos financeiros.
• A estrutura de custos, o reduzido activo imobilizado e a inexistência de pessoal por sua conta e de viaturas próprias, evidenciam uma estrutura organizacional e uma dimensão não compatíveis com o volume das compras e das vendas declaradas.
• Existem fortes indícios de que 99,95% das compras declaradas são fictícias.
• A inviabilização de um controlo quantitativo das mercadorias supostamente transaccionadas, devido à não discriminação dos metais comprados.
• As transacções são tituladas por guias de transporte, onde figuram como tendo efectuado o transporte viaturas da propriedade da R… (em 40% dos casos) da L… (33%), quando:
o as viaturas não percorreram os quilómetros necessários à realização das mesmas,
o as viaturas não cumpriram as obrigações legalmente impostas à sua circulação.
• Em 15% dos casos as transacções são tituladas por guias de transporte que não identificam ou não identificam correctamente a viatura.
• Nas transacções tituladas por guias de transportes, onde figuram viaturas pertencentes a empresas
transportadoras:
o não existe coincidência de clientes, locais de carga e descarga, nalguns casos não coincidem também as mercadorias e os pesos, com os documentos apresentados pelas empresas em causa,
o não foram exibidos comprovativos de algumas deslocações referidas nas guias de transporte,
o algumas das empresas supostamente responsáveis pelos transportes têm ligações ao sujeito passivo e a seus clientes.

Concluíram que, existem fortes indícios de que no essencial a actividade declarada pelo sujeito passivo em 2001 é fictícia, tendo como objectivo titular transacções para as quais não foi emitido o respectivo documento ou transacções inexistentes, com o intuito de conferir a montante o direito à dedução do IVA liquidado que não foi entregue nos cofres do Estado, por via de documentos de compras consideradas falsas que foram contabilizadas.

1.3 R… – C…, Lda. – NIF 5…

A informação remetida pela Direcção de Finanças do Porto datada de 7 de Outubro de 2005, que fica arquivada no processo individual do sujeito passivo, apresenta a seguinte conclusão sobre a capacidade de realização das operações efectuadas e da facturação emitida:

Verificou-se que se trata de uma empresa constituída com fins fraudulentos para servir interesses do sócio fundador F… que, não tendo uma estrutura empresarial apropriada, não poderia gerar o volume de negócios declarado pelo que se considera que as facturas emitidas pela firma R…, Lda. não têm subjacente qualquer transacção comercial.

1.4.1 Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares
Assim, nos termos do artigo 23º do CIRC por remissão do artigo 32º do CIRS, não são aceites como custo de compras do ano de 2001 no montante de 274.463,47€.
(…)”. - cf. RIT que consta de fls. 53 a 325 do PRG, que se dão por integralmente reproduzidas.

Estabilizado o probatório importa prosseguir na apreciação das demais questões do recurso.

Alega o Recorrente que a factualidade que se extrai da prova dos autos suporta o juízo conclusivo da AT – que a sentença não validou – de que as facturas contabilizadas pelo impugnante dos emitentes “L… – Comercial Recuperados, Lda.”, F… e “R… – Comércio por Grosso de S..., Lda.” não titulam reais e efectivas operações económicas e, nessa medida, os custos representados por tais facturas, no montante de 274.463,47€, não são dedutíveis como componente negativa do lucro tributável de 2001, à luz do disposto no art.º 23.º do Código do IRC [“Consideram-se gastos os que comprovadamente sejam indispensáveis para a realização dos rendimentos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora…”], por remissão do art.º 32.º do Código do IRS.

Como tem sido realçado, reiterada e uniformemente, pela jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores, nomeadamente por este Tribunal Central Administrativo, quando a Administração tributária desconsidera as facturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do art.º74.º da LGT, competindo à Administração fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que as operações constantes das facturas não correspondem à realidade. Feita esta prova, e só então, passa a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transacção – vd., entre muitos outros, os acórdãos do STA, de 20/11/2002, proc.º 01483/02 e do TCA Norte de 24-01-2008, processo n.º 01834/04 Viseu, de 24-01-2008, processo n.º 2887/04 Viseu, de 27-01-2011, processo n.º 455/05.7BEPNF e de 18-03-2011, processo n.º 456/05BEPNF.

Assim sendo, importa analisar se a Administração tributária fez a prova que lhe competia da verificação de indícios que permitem concluir que às facturas contabilizadas pelo impugnante, aqui recorrido, não subjazem as operações que, alegadamente, teriam implicado a respectiva emissão.

Tenha-se em conta, como também é aceite, que não é imperioso que a Administração efectue uma prova directa da simulação. Como em muitos outros casos, haverá que recorrer à prova indirecta, a “factos indiciantes, dos quais se procurará extrair, com o auxílio das regras de experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém directamente, mas indirectamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova” – cfr. Alberto Xavier, “Conceito e Natureza do Acto Tributário”, pág. 154; também neste sentido, entre outros, o acórdão do TCAN, de 26/04/12 (processo nº 00964/06.0 BEPRT).

Ou seja, a Administração Tributária não tem que demonstrar a falsidade das facturas, bastando-lhe evidenciar a consistência desse juízo (Acórdão do STA de 27/10/04, Processo 810/04), invocando factos que traduzem uma probabilidade elevada de as operações referidas nas facturas serem simuladas, probabilidade elevada capaz de abalar a presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes e dos dados constantes da sua contabilidade – artigos 78.º do CPT e 75º da LGT.

Os indícios são definidos por João de Castro Mendes como aqueles factos que “permitem concluir pela verificação ou não verificação de outros factos, em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência” - citado por Saldanha Sanches, “A Quantificação da Obrigação Tributária”, 2ª edição, pág. 311.

Nesta tarefa e como é salientado no Acórdão do TCA Norte de 28/02/2013, proferido no proc.º00383/08.4BEBRG, poderá a Administração Tributária lançar mão de elementos obtidos com recurso à fiscalização cruzada, junto de outros contribuintes, para obter os referidos indícios, pelo que tais indicadores de falsidade das facturas não têm necessariamente que advir de elementos do próprio contribuinte fiscalizado, revelando-se, até, a fiscalização cruzada, um procedimento crucial no combate à fraude e evasão fiscais.

Vertendo aos autos os considerandos doutrinais e jurisprudenciais expostos, constata-se que a AT recolheu elementos indiciadores de falsidade das facturas unicamente com relação aos três emitentes em causa, mas nenhum indicador reportado à concreta relação desses emitentes com o impugnante.

A asserção – que parece ser a do Recorrente – de que estando comprovado pela AT que tais emitentes não dispõem de estrutura empresarial para os serviços facturados, fica necessariamente comprometida a possibilidade da sua prestação efectiva a todos os destinatários das facturas, aí se incluindo o impugnante, apresenta-se falaciosa. Vejamos de perto.

No caso da L…, é referido no essencial que o local indicado pela gerente como estaleiro no período de 01-01-2002 até Maio de 2004 não tem condições nem dimensões para o volume e tipos de sucata que o sujeito passivo diz ter vendido; que a contabilidade não reflecte os movimentos facturados; os seus fornecedores são desconhecidos e que não dispõe de estrutura organizacional.

No caso de F… é referido no essencial que a contabilidade não reflecte os movimentos facturados e um conjunto de irregularidades reportadas às guias de transporte da mercadoria supostamente adquirida pelo sujeito passivo, para além da falta de estrutura organizacional para os serviços facturados.

No caso da R…, o que se refere é meramente conclusivo, não estando enunciada qualquer factualidade de suporte.

Pois bem, a constatada circunstância de um emitente não dispor de estrutura empresarial ou organizacional para a globalidade dos serviços facturados em determinado período não permite descartar a possibilidade de o sujeito passivo se dedicar simultaneamente à emissão de facturas que representam reais e efectivas operações a par de outras que não têm qualquer realidade subjacente (e que até possam eventualmente representar o maior volume), destinadas estas à obtenção de vantagens fiscais indevidas ou, eventualmente, visando a cobertura de operações reais de outros sujeitos passivos não emitentes.

Por isso, reiteradamente temos entendido que a credibilidade e solidez dos indícios de falsidade dos títulos de despesa não prescinde, em regra, de elementos reportados à concreta relação estabelecida com o utilizador (no caso, o impugnante), nomeadamente no que respeita aos meios de pagamento envolvidos, sabendo-se que as anomalias detectadas no circuito do dinheiro, constitui um dos indicadores mais fiáveis da falsidade ou realidade das operações facturadas.

Serve o que acaba de ser dito para evidenciar que nem todos os utilizadores de facturas de falsos emitentes estarão necessariamente comprometidos com a falsidade das operações que estes (também, ou, até principalmente) praticam, posição que importa salvaguardar na observância do princípio da presunção de veracidade declarativa e dos dados decorrentes da contabilidade, plasmado no art.º 75/1 da Lei Geral Tributária segundo o qual, “Presumem-se verdadeiras e de boa fé as declarações dos contribuintes apresentadas nos termos previstos na lei, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade ou escrita, quando estas estiverem organizadas de acordo com a legislação comercial e fiscal”.

Foi nessa linha de entendimento que navegou o ac. deste TCA Sul de 06/18/2015, tirado no proc.º 07169/13, que sobre questão idêntica se debruçou embora ali estivesse em causa o IVA e aqui o IRS, liquidados com base no mesmo relatório inspectivo ao sujeito passivo impugnante e que acompanhamos sem reservas.

Como ali se deixou consignado, «Com efeito, o que resulta claro do relatório de inspecção é que a AT levou a cabo uma grande operação e que fiscalizando vários contribuintes chegou à conclusão que estes eram emitentes de facturas falsas.

Sucede que, o que releva para o caso dos autos é a total omissão de análise concreta da actividade do Recorrido e das respectivas operações que são consideradas fictícias. A AT não escreve uma única linha sobre a forma como o Recorrido desenvolve a sua actividade, ou como se relaciona com aqueles fornecedores que são reputados como emitentes de facturas falsas, ou seja, não recolhe um único indício directamente relacionado com o Recorrido, nem tão-pouco com as operações que em concreto foram desconsideradas.

Não basta para desconsiderar uma determinada operação, reputando-a como fictícia ou falsa, recolher indícios junto do emitente das facturas, havia também, e sobretudo, que analisar a contabilidade do Recorrido e dela evidenciar indícios que sustentassem a conclusão de que no caso concreto aquelas facturas são falsas.

Sucede que a AT limita-se a apoiar as correcções efectuadas ao Recorrido nas acções de inspecção efectuadas aos fornecedores, pretendendo extrapolar as conclusões a que chegou nessas acções de inspecção às facturas referentes ao Recorrido, sem que tenha recolhido um único indício concreto relacionado com aquele.

Ora, independentemente dos indícios que se tenha recolhido junto dos emitentes das facturas havia que se confrontar essas conclusões com a situação específica do destinatário da factura. A verdade é que, ainda que resultasse provado que um determinado fornecedor emite facturas falsas, tal não significa necessariamente que o tenha feito de todas as vezes que emitiu uma factura, com todos os seus clientes. Os indícios recolhidos relativamente a um fornecedor não podem ser usados de forma generalizada e indiscriminada sem a devida confirmação junto de quem recebe a factura.

In casu, o relatório de inspecção é completamente omisso na análise da actividade do Recorrido, nada se diz sobre as suas vendas de sucatas, sobre a sua actividade, se efectivamente a exerce ou se por ventura não haveria estrutura para o seu exercício, qual o seu volume de negócios, se há incongruências nos registos contabilísticos, nada, nem uma linha. O juízo subjacente à desconsideração das operações por falsas reside única e exclusivamente em inspecções efectuadas aos fornecedores, com carácter genérico e sem confronto com a situação concreta do Recorrido.

Assim sendo, há que concluir que, in casu, não tendo sido colocado em causa que as facturas foram emitidas na forma legal, a AT não logrou cumprir o ónus da prova da verificação dos respectivos indícios ou pressupostos da tributação que sobre si recai, nos termos do n.º 1 do art. 74.º da LGT, ou seja, dos pressupostos legais da sua actuação, face à presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes (art. 75.º da LGT). A AT não demonstrou, relativamente ao Recorrido, a existência de “indícios fundados” (objectivos, sólidos e consistentes, que traduzam uma probabilidade elevada de que os documentos não titulam operações reais)» (fim de cit.).

Rematando, concluímos que não foram recolhidos indícios sérios e credíveis de que as operações facturadas ao impugnante pelos sujeitos passivos “L… – Comercial Recuperados, Lda.”, F…e “R…– Comércio por Grosso de S…, Lda.” não consubstanciam reais e efectivas operações, o que significa que em relação às transacções em causa a AT não cumpriu os pressupostos legitimadores da sua actuação correctiva, que se mostra inquinada de ilegalidade por erro nos pressupostos, como bem decidiu a sentença recorrida, que não padece dos vícios que lhe são imputados pelo Recorrente, merecendo ser inteiramente confirmada.

O recurso não merece provimento.

IV. DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da 2.ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Condena-se o Recorrente em custas.


Lisboa, 28 de Abril de 2022



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Vital Lopes




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Luísa Soares




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Tânia Meireles da Cunha