Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:03437/09
Secção:CT-2º JUÍZO
Data do Acordão:05/21/2015
Relator:ANA PINHOL
Descritores:MANIFESTAÇÕES DE FORTUNA
ÓNUS DA PROVA
Sumário:I. Cabe ao Contribuinte a comprovação de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou o acréscimo de património ou o consumo evidenciados (cfr. artigo n.º 3 do artigo 89.ºA, redacção, introduzida pela Lei n.º 55-B/2004, de 30 de Dezembro).
II. A título de suporte documental, o contribuinte juntou cópias das escrituras de compra e venda dos imóveis que efectuou e que segundo diz geraram rendimentos.
III. Tais documentos não têm potencialidade de provar que os rendimentos obtidos com as vendas nelas reportadas foram utilizados nos actos de consumo evidenciados. Porque, não permitem apurar se os rendimentos auferidos pelas vendas dos imoveis foram utilizados naqueles consumos. Nesta circunstância, seguro é de concluir que o Recorrente não logrou provar a relação causal de afectação desses rendimentos (não sujeito a tributação) aos actos de consumo evidenciados.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL


I.RELATÓRIO

JOÃO ……………………… e mulher Ana……………………, não se conformando com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco datada de 8 de Julho de 2009, que julgou procedente o recurso judicial interposto ao abrigo do disposto nos artigos 89°-A, n.° 7 da Lei Geral Tributária (LGT) e 146°-B, n.° 5 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), da decisão do DIRECTOR-GERAL DA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, que procedeu à avaliação indirecta (artigo 89.º-A da LGT) dos seus rendimentos respeitantes ao ano de 2007, corrigindo-os em € 25.167,12, dela recorrem para este Tribunal Central Administrativo.

Os Recorrentes terminaram as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
«1- Na douta sentença sob recurso, não se identifica nem se discrimina quais os factos que se consideram provados.
2- Em vez disso é feita uma dissertação com o título de "Matéria de facto" que levanta sérias dúvidas ao intérprete se deve ser vista no sentido da discriminação dos factos que são considerados provados, com relevância para a decisão.
3- É nula a sentença que não especifique os fundamentos de facto que justificam a decisão. (Artº 668° n° 1 b) do CPC). Nulidade que aqui e desde já se invoca.
4- Conforme os recorrentes evidenciaram e provaram perante o Tribunal a quo, nos anos de 1992 a 2007 declararam rendimentos á Administração Fiscal que lhe permitiriam efectuar as poupanças necessárias para os consumos evidenciados no ano de 2007, poupanças essas ascendem a € 494.957.54.
5- Uma das fontes do rendimento foi os rendimentos das mais­ valias (Categoria G) que foram declarados nos vários anos, conforme resulta do mapa da poupança acumulada - documento 2 junto com a p.i.
6- Rendimentos esses derivados da alienação do património pessoal que os recorrentes foram construindo ao longo de uma vida de trabalho.
7- No âmbito do presente processo judicial, os recorrentes juntaram cópia das escrituras públicas referentes às vendas dos imóveis que efectuaram e que geraram esses rendimentos. (Cfr. Doc. 3 a Doc. 20 junto com a p.i.)
8- Não pode o Tribunal a quo afastar esse meio de prova com o argumento de que não ficou convencido quanto ao referido valor, pois tais documentos têm força probatória plena, fazem prova plena dos factos neles constantes.
9- A escritura pública é um documento autêntico (art. 369°, 371º e 377° do CC) e tem força probatória plena (artº 358° do C.C.)
10- Nenhuns dos documentos foram impugnados pela Fazenda Pública, pelo que têm de ser considerados como prova plena o que deles consta.
11- O Meritíssimo Juiz desconsidera as referidas escrituras com o argumento de que foram juntas sem qualquer forma de "legendagem" de molde a que o Tribunal não ficou apto a delas conhecer.
12- No caso em apreço, o Tribunal a quo veio invocar a necessidade de "legendagem" das escrituras para apreender de forma mais fácil qual o valor do património alienado pelos autores.
13- A esta questão os recorrentes pretendem dar resposta mediante a junção de dois documentos que elaboraram que visam esclarecer o solicitado.
14- No documento 1 que aqui juntam identifica-se sumariamente as escrituras públicas que titulam as alienações dos imóveis,com a indicação da proporção que os recorrentes receberam no preço da venda.
15- No documento 2 que aqui juntam faz-se uma lista das escrituras públicas com a discriminação do valor total das alienações e do valor do preço recebido pelos recorrentes e o valor do preço recebido pelos outros comproprietários, o José ................. e a mulher.
16- Invocam ainda que a necessidade de juntar documentação adicional decorre directamente do teor da sentença proferida e da necessidade de efectuar prova adicional face aos argumentos invocados pelo Tribunal a quo.
17- Assim os recorrentes vêm apresentar com o presente recurso, ao abrigo dos artigos 524° n° 1 e 693°-B do CPC, documentação superveniente, requerendo-se, assim, a sua junção com o presente recurso em função da sentença proferida em 1a instância uma vez que permitem demonstrar e comprovar uma das origens dos rendimentos que permitiram a aquisição do consumo no ano de 2007.
18- Não se afigura legitimo o indeferimento da pretensão da recorrente com fundamento no alegado deficit probatório, quando podia e devia o Meritíssimo Juiz ordenar as diligências probatórias que reputasse convenientes, o que se invoca para os devidos efeitos, nomeadamente a anulação da sentença e a remessa do processo ao Tribunal recorrido para produção de nova decisão, ao abrigo do artº 712° do CPC.
19- Nesse sentido já se pronunciou o TCA -Norte ao determinar no acórdão de 25/01/2007, in processo n° 00636/06.6BECBR "(...) o Tribunal pode e deve diligenciar (oficiosamente, a requerimento, ou por sugestão das partes) pela obtenção de todos os elementos probatórios que revelem ter interesse para a boa decisão da causa"
20- A que acresce que, ficou a ser do conhecimento funcional do Meritíssimo Juiz a identidade de ambos os vendedores, porquanto os recorrentes possuíam em compropriedade os prédios alienados com os autores do processo n° 203/09.2BECTB o José ............ e mulher Isabel.............., e ambos os processos foram apreciados e decididos pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo, conforme documento 3 que aqui junta. (Artº 664°, 264° n° 2, 514° n° 2 do CPC)
21- O Tribunal coloca a dúvida se os rendimentos derivados dos preços recebidos, com origem em tais vendas, foram ou não declarados á administração fiscal.
22- Ora também nesta parte a sentença recorrida deve ser revogada, por erro na apreciação das provas apresentadas.
23- O mapa referente á poupança acumulada, junto com a p.i. como documento 2, para além dos outros rendimentos (Categoria A e categoria F) indica os valores que foram declarados á administração fiscal, derivados de tais vendas, na coluna referente aos rendimentos da Categoria G.
24- E também nesse mapa é mencionado o imposto originado pelos rendimentos declarados que foi pago pelos recorrentes ao longo dos vários anos.
25- O documento 2 junto com a p.i. demonstra estes factos.
26- Este sempre foi um facto aceite pela Fazenda Pública, que não impugnou os valores da poupança acumulada com esse fundamento, aliás a própria Fazenda Pública assume expressamente "que a soma dos rendimentos declarados nesses anos foi de € 528.739.78". (Cfr. Artº 22° da contestação)
27- E se a Administração Fiscal aceitou sem quaisquer reservas as declarações de rendimentos apresentadas pelos contribuintes, nos termos do artº 57° n° 1 do CIRS referente a esses anos.
28- E uma vez que o artº 75° n° 1 da LGT consagra a presunção da verdade das declarações dos contribuintes, apresentadas nos termos da lei.
29- Os recorrentes beneficiam da referida presunção legal, devendo dar-se como provado que os recorrentes auferiram os rendimentos nelas mencionado, incluído os rendimentos da categoria G (Mais Valias)
30- Por outro lado, entenderam os recorrentes que não tinham que juntar as cópias dessas declarações, pois segundo a lei, concretamente o artº 74° n° 2 da LGT, está dispensada a sua apresentação uma vez que esses documentos estão na posse da administração fiscal.
31- Contudo caso o tribunal entendesse necessário produzir prova em como os rendimentos obtidos pelos sujeitos passivos referentes á alienação dos imóveis foram declarados, nomeadamente com a junção de cópias das declarações de rendimentos, sempre poderia requerê-lo tanto á Administração Fiscal, como aos recorrentes (Arte 13° do CPPT)
32- Assim o que é dito na sentença recorrida, sobre esta matéria, terá de ser revogado, pois é uma interpretação errada da realidade.
33- O Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo, não fez uma correcta aplicação do direito aos factos.
34- Invoca o artº 87° al. f) da LGT como fundamento legal para a correcção efectuada. Sucede que a norma invocada, contém uma presunção legal.
35- A Lei Geral Tributária estabelece que as presunções consagradas em normas de incidência tributária admitem sempre prova em contrário. (Artº 73° da LGT)
36- Por isso o legislador institui, concomitantemente, no artº 89° A n° 3 da LGT, um procedimento próprio de elisão da presunção estabelecida no artº 87º f) da LGT.
37- Tal norma não é indicada na douta sentença recorrida, contudo ela tem aplicação ao caso.
38- E a mesma deve ser interpretada com o sentido de que para afastar a presunção do arte 87° al. f) da LGT o contribuinte tem que provar que corresponde á realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou o acréscimo de património ou o consumo evidenciado. (Artº 89° - A n° 3 da LGT)
39- O ano que foi objecto de correcção foi o ano de 2007. A inversão do ónus da prova ocorre apenas nesse ano. A inversão do ónus da prova não se aplica a rendimentos declarados referentes a anos anteriores.
40- E é inequívoco que para efeitos de elidir a presunção, o contribuinte apenas tem que provar a fonte das manifestações de fortuna evidenciadas, mas não lhe é exigido que demonstre a forma como as adquiriu (a menos que estivesse demonstrado que as fontes foram geradas no próprio ano), pois o que está em causa é apenas averiguar se foram ou não omitidos rendimentos ou não no próprio ano.
41- Conforme foi decidido no Acórdão do Tribunal - Sul de 05/07/2005 in processo n° 00649/05 "fazendo o contribuinte prova de que mobilizou, no ano a que respeita a aquisição e no ano imediatamente anterior, capitais que detinha em contas de depósito a prazo, de montante suficiente para efectuar a aquisição em causa, cujo pagamento foi efectuado ao longo daqueles dois anos, tal prova é suficiente para elidir a presunção de evasão fiscal relativamente aos rendimentos declarados naquele ano."
42- E na mesma linha ainda no Acórdão do TCA - Sul de 23/09/2008 in processo n° 02605/08 "Tendo o contribuinte feito prova de que mobilizou, no ano a que respeita a aquisição, capital mutuado que aplicou na aquisição do imóvel em causa, tal prova é suficiente para elidir a presunção de evasão fiscal relativamente aos rendimentos declarados nesse ano".
43- Os recorrentes entendem que provaram a fonte de rendimento com a poupança acumulada gerada por rendimentos de anos anteriores.
44- Rendimentos esses onde se incluem os rendimentos de mais valias que foram provados com as cópias das escrituras públicas referentes às vendas dos imóveis que efectuaram e ás quantias referentes ao preço que receberam.
45- E que é inequívoco que esses rendimentos foram declarados á Administração Fiscal.
46- E consequentemente, entendem que fizeram prova suficiente para elidir a presunção, conforme o prescrito no artº 89° A n° 3 da LGT, pois demonstraram que os consumos evidenciados (no ano de 2007) foram pagos com meios gerados por rendimentos que foram declarados em anos anteriores.
47- E como o que está em causa nos presentes autos é apenas a determinação da matéria tributável para efeitos de IRS do ano de 2007 e só relativamente a este ano funciona a inversão do ónus da prova.
48- O Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo critica o facto de os recorrentes insistirem em demonstrar que tiveram uma poupança acumulada, invocando um consumo padrão com referência ao rendimento mínimo mensal estabelecido por Portaria, quando na sua perspectiva este não se coaduna em nada com os movimentos financeiros que apresentam com as vendas dos imóveis que trouxeram ao processo, e ainda os consumos apresentados pela Administração Tributária.
49 - Quanto ao consumo padrão que foi invocado, resultou da opção de um critério, entre muitos outros que poderia ser usado.
50 - O consumo padrão é um conceito que tem de ser concretizado.
51- Devendo ser permitido ao contribuinte apresentar um critério, tal como da mesma forma é permitido á Administração Tributária a possibilidade de concretizar os conceitos do artº 87° f) da LGT, de "consumo" e "acréscimos ao consumo".
52- Quanto á referência aos movimentos financeiros derivados das vendas dos imóveis, tal significa que o Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo, ao se referir a eles está a reconhecer que eles existiram, devendo dar como provado que os recorrentes auferiram os invocados rendimentos derivados das alienações dos imóveis.
53- Quanto aos consumos apresentados pela Administração Tributária, não pode ser exigido aos recorrentes, para efeitos de elidir a presunção do artº 87° f) da LGT, que demonstrem se e como efectuaram os consumos que lhe são apresentados pela Administração Tributária relativamente a anos anteriores a 2007.
54- Pois tanto a norma que define o facto gerador (Artº 87° al. f) da LGT) como a norma que decreta a quantificação (Artº 89° - A n° 5 da LGT) elegem expressamente o mesmo período de tributação, como limite temporal para efectuar a comparação entre os rendimentos declarados e os incrementos patrimoniais não justificados.
55- E se o que está em causa é apenas averiguar se foram ou não omitidos rendimentos na declaração respeitante ao ano de 2007, e não a outros não é exigível ao contribuinte que comprove se efectuou e como efectuou consumos de anos anteriores a 2007.
56- A prova exigida aos recorrentes não se pode transformar numa prova diabólica, na medida em que os recorrentes estariam obrigados a justificar factos que supostamente ocorreram entre 1992 e 2007, prova essa que nenhum contribuinte está em condições de efectuar, nem tão pouco lhe é exigível.
57- Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo, violou os princípios da tributação de rendimentos reais, da capacidade contributiva, da descoberta da verdade material (Artºs 104° n° 1 e n° 2 da CRP, e 13° CPPT)
58- A douta sentença recorrida fez uma incorrecta apreciação da prova e violou os art0s 73°, 74° n° 2, 75° n°1, 87° ai. F), 89° A n° 3 e n° 5 da LGT, artºs 264° n° 2, 514° n° 2, 653°, 655°, 659° n° 2, e n° 3, 664°, 668° n°1 alínea d), do CPC, artº 13° do CPPT, artº 358°, 364°, 369°, 371° e 377° do CC, Artº s 104° n° 1 e n° 2 e artº 205° n° 1 da CRP

TERMOS EM QUE, deve ser dado provimento ao recurso e anular-se a decisão de que se recorre, COMO É DE LEI E JUSTIÇA”

Foram apresentadas Contra-alegações, com as seguintes Conclusões:
«1. A sentença não está ferida de nulidade por não estar discriminada e fundamentada a matéria provada e a matéria não provada.
2. Os recorrentes não discriminam os factos que consideram não terem sido fundamentadamente incluídos (ou excluídos) da base instrutória.
3. Nenhum dos elementos do processo impõe decisão diversa daquela que foi tomada e a matéria que consta da sentença sob a epígrafe "matéria de facto", que contém os factos efectivamente dados como provados, permite sustentar a decisão tomada, ao comunicar eficazmente aos destinatários quais os fundamentos que a alicerçaram.
4. Não existe uma total ausência de menção dos factos provados e não provados, que justifique a nulidade da sentença.
5. Também não é inválida a sentença por omissão do dever legal de fundamentar, já que a factualidade que sustenta a decisão é dada como assente na sentença recorrida, devendo considerar-se estarem suficientemente especificados e fundamentados os factos que conduziram à decisão final e em total coerência com o seu sentido.
6. Foi também feita uma correcta interpretação e aplicação da lei, tendo em conta os factos provados, não sendo nenhuma outra solução legal possível, senão a aplicação tout court do normativo que levou à fixação de rendimentos líquidos por métodos indirectos para o ano de 2007, no montante de €25.167.12, de acordo com a alínea f) do artº 87° da LGT.
7. Isto porque os contribuintes relativamente ao exercício de 2007, evidenciaram gastos incompatíveis com o seu rendimento, verificando-se por isso a existência de uma divergência não justificada de, pelo menos, um terço entre os rendimentos declarados e o acréscimo de património ou o consumo evidenciados pelo sujeito passivo no mesmo período de tributação.
8. O rendimento líquido declarado pelos recorrentes para o ano de 2007 (€29.021,09), foi considerado insuficiente para permitir evidenciar um consumo de €54.188.21.
9. Os recorrentes, uma vez invertido o ónus da prova, não provaram que os rendimentos declarados correspondiam à realidade e que seria outra a fonte das manifestações de fortuna evidenciadas, não sujeita a tributação no ano de 2007, e que tivesse sido canalizada para aquele destino em concreto.
10. Não comprovaram, apenas alegaram, que de 1992 a 2007, auferiram rendimentos, através de lucros obtidos em virtude da venda de imóveis, que lhes permitiram efectuar as poupanças que dizem ascender a €494.957,54.
11. De rendimentos declarados nestes anos, num total apurado de €528.739,78, considerou a sentença recorrida, não resultar provado que tivessem acumulado poupanças no valor de €494. 957.54.
12. Mais, nos exercícios de 1992 a 2007, o consumo evidenciado foi certamente muito superior à retribuição mínima mensal, tal como foi considerado provado pela Douta sentença recorrida em "matéria de facto": ascende aliás, daquilo que se sabe e mesmo sem os encargos decorrentes da construção de imóveis, a €553.390.84.
13. O que é superior ao montante de rendimentos declarado pelos recorrentes de €528. 739.78.
14. O que por si só indica que os rendimentos auferidos foram muito superiores àqueles declarados para aqueles anos, e confirma a impossibilidade de recorrer a poupança acumulada para efectuar os consumos em que incorreram no exercício de 2007, tal como não deixou de considerar, e bem, a sentença recorrida.
15. Não deram cumprimento ao disposto no n°3 do art. 89°-A da LGT, já que para o efeito não lhes bastava alegar que fizeram poupanças, ou sequer que detinham em depósitos bancários ou de outra natureza (o que não fazem sequer) a quantia necessária ao consumo: tinham também que comprovar a «fonte de origem desse capital».
16. Com efeito, quando se diz que a fonte é outra, não basta provar que existem outros rendimentos não sujeitos a tributação no exercício em causa. É também necessário provar que esses rendimentos foram canalizados para os consumos em causa, para um determinado destino, estabelecendo um nexo de causalidade entre fonte e consumo efectivo.
17. O que é certo, é que os rendimentos declarados para 2007 não lhe permitiriam efectuar nem os suprimentos nem as aquisições em causa, atendendo ao seu diminuto valor.
18. É também certo que não conseguiram até à data comprovar que tenham feito quaisquer poupanças nos exercícios de 1992 a 2006.
19. Deverá por isso concluir-se, que apesar de invertido o ónus da prova, os recorrentes não diligenciaram no sentido de trazer aos autos qualquer suporte documental que sustentasse aquilo que alegam.
20. É este juízo de lógica inabalável que está concretizado na Douta sentença, à qual nada há, nesta matéria a apontar, já que todas as provas recolhidas pela entidade recorrida (e na ausência de melhor prova por parte dos recorrentes), não permitiriam uma decisão no sentido pretendido pelos contribuintes, justificando por isso o recurso a métodos indirectos.
21. Face ao exposto, a situação dos recorrentes continua a enquadrar-se na previsão da alínea f) do artº 87 da LGT, e tendo resultado da avaliação indirecta o valor tributável de €25.167,12 para o exercício de 2007, deverá este valor manter-se, como bem considerou a sentença ora recorrida, que não merece qualquer reparo.

Nestes termos e nos mais de direito que V.a Ex.a doutamente suprirá, deve ser negado provimento ao presente recurso, pois que a sentença recorrida não sofre de qualquer vício gerador de nulidade, tendo feito uma correcta interpretação e aplicação da lei aos factos trazidos a juízo.
***
Na fase do recurso, os Recorrentes foram convidados, conforme despacho, de 08.09.2009 (fls. 248), para apresentação da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, com a observância do nº 1 do art. 685º-B do CPC, sob pena de não se conhecer dessa impugnação.

Os Recorrentes corresponderam ao convite de aperfeiçoamento da peça processual, e terminaram as suas alegações, formulando as seguintes conclusões:

«CONCLUSÕES: (Tendo em vista esclarecer e complementar as anteriormente apresentadas com as alegações de recurso)
1) O ponto 5 parágrafos 9 a 15 da douta sentença, em que se indicam as razões para dar como não provada a matéria de facto alegada pelos recorrentes, constituem uma reprodução do que é dito pela Administração Fiscal no despacho sindicado.
2) O Meritíssimo Juiz do Tribunal a quo ao proferir a decisão, ignorou pura e simplesmente a prova produzida nos autos, pelos recorrentes, baseando-se apenas na posição da Administração Fiscal.
3) Os recorrentes invocam no presente recurso que a sentença recorrida fez errado julgamento da matéria de facto ao não ter dado como provado que os recorrentes efectuaram uma poupança durante os anos de 1992 a 2007, que lhe permitiu suportar os consumos evidenciados no ano de 2007. (Veja-se parágrafo 9 do ponto 5 da sentença)
4) Para prova deste facto os recorrentes juntaram um documento que evidencia os rendimentos líquidos auferidos e declarados á Administração Fiscal donde resulta a invocada poupança. (Doc. 2 junto com a p.i.)
5) Não se concorda com a douta sentença sob recurso ao não ter dado como provado que uma das fontes dessa poupança foram os rendimentos derivados da alienação do património pessoal. (Veja-se parágrafo 13 do ponto 5 da sentença)
6) Os recorrentes para provar os rendimentos derivados de tais alienações juntaram cópia das escrituras públicas referentes às vendas dos imóveis que efectuaram. (Doc. 3 a Doc. 20 junto com a p.i.)
7) A sentença sob recurso fez um errado julgamento das provas apresentadas, ao não dar como provado, que os rendimentos auferidos pelos recorrentes de 1992 a 2007, e que geraram a poupança acumulada, foram declarados á administração fiscal, e que consequentemente foram pagos os impostos a que eles respeitam.
8) O documento n° 2 junto com a p.i. demonstra este facto, ao indicar as várias espécies de rendimentos auferidos nas colunas "categoria A, G e F" e na coluna com o título "Imposto" o valor do imposto que foi pago.
9) E este sempre foi um facto aceite pela Administração Fiscal.
10) A sentença sob recurso fez um errado julgamento das provas apresentadas, ao não dar como provado que os recorrentes tiveram uma poupança acumulada, invocando um consumo padrão com referência ao rendimento mínimo mensal estabelecido por Portaria, (veja-se ponto 5 da Sentença parágrafos 12, 14, 15 e 16)
11) Tal resposta baseia-se segundo o Meritíssimo Juiz do tribunal a quo, em que o consumo invocado não se coaduna em nada com os movimentos financeiros que apresentam com as vendas de imóveis que os recorrentes trouxeram ao processo, e ainda os consumos apresentados pela Administração Tributária.
12) Quanto ao consumo padrão que foi invocado, está sustentado no documento 2 junto com a p.i. e resultou da opção de um critério, entre muitos outros que podia ser usado.
Devendo ser permitido ao contribuinte apresentar um critério, tal como da mesma forma é permitido á Administração Tributária a possibilidade de concretizar os conceitos do art° 87° f) e art° 89° A da LGT, de "consumo", "acréscimos ao consumo" e "manifestações de fortuna".
13) Quanto á referência aos movimentos financeiros derivados das vendas dos imóveis, tal significa que o Meritíssimo Juiz do tribunal a quo, ao se referir a eles está a reconhecer que eles existiram, devendo dar como provado que os recorrentes auferiram os invocados rendimentos derivados das alienações dos imóveis.
14) Quanto aos consumos apresentados pela Administração Tributária, não pode ser exigido aos recorrentes, para efeitos de elidir a presunção do art° 89° A n°1 da LGT, que demonstrem se e como efectuaram os consumos que lhe são apresentados pela Administração tributária relativamente a anos anteriores a 2007.
15) Os recorrentes entendem que todos os documentos em conjunto aqui indicados, interpretados com o sentido aqui referido, são idóneos para demonstrar integralmente a fonte do capital que permitiu a manifestação de fortuna evidenciadas.
16) Razão pela qual pretendem que o Venerando Tribunal Superior se digne apreciar os concretos pontos de facto que no seu entender consideram controvertidos.
17) Quanto às demais questões que foram invocadas nas alegações de recurso, e que os recorrentes pretendem ver discutidas no Tribunal Superior, os recorrentes aqui mantém, e reafirmam e dão por reproduzido todo o por si alegado nesse articulado.

Termos em que se conclui como nas alegações de recurso, devendo ser dado provimento ao recurso e revogar-se a decisão de que se recorre, como é de Lei e de Justiça.»


Notificado o Recorrido, relativamente à peça processual apresentada, veio o mesmo juntar aos autos novo articulado, expendendo, em sede de conclusões, o seguinte:

« CONCLUSÕES:
1. Não existe qualquer vício imputável à fixação da matéria de facto dada como provada na Douta sentença recorrida.
2. Se não constam da matéria dada como provada os factos pretendidos pelos recorrentes, tal apenas se deve ao facto de estes não terem produzido prova alguma, e não a qualquer vício da sentença: não indicam um único facto que devesse ter sido incluído na matéria dada como provada e que contivesse em si mesmo a potencialidade de conduzir a uma decisão judicial diversa.
3. O Douto Tribunal "a quo", seleccionou apenas a matéria de facto relevante para a decisão da causa, que não era certamente os reputados "factos" alegados pelos recorrentes que nada provam
4. Não poderia ter sido dado como provado que uma das fontes de poupança foram os rendimentos derivados da alienação do património pessoal, porque não se prova nem o seu montante nem a sua afectação a aforro.
5. Os recorrentes não apresentaram quaisquer documentos comprovativos das alegadas poupanças. Muito menos da sua origem.
6. Os recorrentes não apresentaram quaisquer documentos de que essa poupança tenha depois sido aplicada concretamente em 2007, designadamente nos suprimentos em causa.
7. Mais ainda, o alegado valor das referidas poupanças não era suficiente para permitir os consumos efectuados em 2007.
8. Ficou provado que o consumo evidenciado pelos recorrentes foi certamente muito superior aos montantes alegadamente canalizados para poupança no montante de €494.957.54.
9. Com a prova produzida pelos recorrentes, era pois impossível que fosse dado como provado que:
a. Que os recorrentes auferiram, sem margem para dúvida, todos os
rendimentos constantes do Documento 2;
b. Que esses rendimentos foram canalizados para poupança;
c. Que essa poupança foi canalizada para os consumos efectuados
em 2007 e em causa no presente processo.
10. Não fica pois por provar nenhuma matéria considerada relevante para a solução da questão submetida a julgamento.
11. O novo articulado dos recorrentes que nada acrescenta ao articulado anterior, já que a matéria de facto tida como omitida da sentença, nunca dela poderia figurar, dada a sua absoluta irrelevância para a decisão e para a solução de Direito aplicável.
12. Face ao exposto, a situação dos recorrentes continua a enquadrar-se na previsão da alínea f) do art°87 da LGT, e tendo resultado da avaliação indirecta o valor tributável de €25.167.12 para o exercício de 2007, deverá este valor manter-se, como bem considerou a sentença ora recorrida, que não merece qualquer reparo.

Nestes termos e nos mais de direito que V.a Ex.a doutamente suprirá, deve ser negado provimento ao presente recurso, pois que a sentença recorrida não sofre de qualquer vício gerador de nulidade, tendo feito uma correcta interpretação e aplicação da lei aos factos trazidos a juízo.»

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A Exmª. Procuradora-Geral Adjunta junto deste Tribunal pronunciou-se no sentido de que o recurso não merece provimento.
***
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
***
II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
Importa ter em consideração que, de acordo com o disposto no artigo 635º, nº 4 do Novo Código de Processo Civil, é pelas conclusões da alegação do Recorrente que se define o objecto e se delimita o âmbito do recurso, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
No caso trazido a exame, a única questão a decidir consiste em saber:
(i) saber se a sentença recorrida incorre em erro de julgamento da matéria de facto;
(iii) saber se a sentença recorrida incorre em nulidade por falta de especificação dos factos provado e não provados e de análise crítica da prova;
(ii) saber se a sentença fez errado julgamento quando considerou que os Recorrentes não lograram ilidir a presunção do n.º 3 do art. 89.º-A da LGT.

***
III. FUNDAMENTAÇÃO
A.DOS FACTOS
Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto e indicou-se a respectiva fundamentação nos seguintes termos (com subordinação a números por nossa iniciativa):
«1. No ano de 2007 os rendimentos brutos declarados por João………………….. e Ana ………………………… são da categoria A e F.
2. Em termos líquidos o casal declarou que o agregado familiar por si composto auferiu um rendimento de 29.021,09 €.
3. No ano de 2007 João…………………. realizou aumento de capital da sociedade comercial …………………, Lda”, da qual é sócio, no montante líquido de 50.000,00 € em numerário.
4. Nesse mesmo ano, os ora impugnantes declararam no anexo H da declaração modelo 3 de IRS ter efectuado uma aquisição de um computador pessoal no valor de 1.575,00 €, despesas de saúde no valor de 953,63 € e ainda despesas de educação com os dependentes no valor de 1.659,58 €.
5. Tais movimentos financeiros foram apurados na sequência de acção de análise externa que verificou a documentação da sociedade comercial “………………………., Lda”.
6. O montante referido como rendimento líquido do ano em referência, resultante de declaração de rendimentos apresentada pelos sujeitos passivos e posteriormente objecto de liquidação evidencia que é inferior em mais do que um terço ao consumo detectado. Através da soma do consumo nesse período (50.000,00 € + 1.575,00 € + 953,63 € + 1.659,58 € = 54.188,21 €) e da divisão dos rendimentos declarados (29.021,09 € : 3 = 9.673,70 €) verifica-se uma divergência superior a um terço.
7. Em 24/04/2009 foram os sujeitos passivos em questão notificados do projecto de decisão de aplicação de métodos indirectos para efeitos de exercício de direito de audição por escrito no prazo de 10 dias.
8. Em 27/02/2009 exerceram o direito de audição discordando, em suma, com a proposta de tributação por avaliação indirecta do rendimento tributável.
9. Na sua discordância alegam que desde 1992 até 2005 apresentaram rendimentos que lhes permitiu obter poupança suficiente para os consumos em causa.
Elaboraram mapa da poupança acumulada que alcançava o valor de 494.957,54 €.
10. Efectuada análise a tal mapa verificou o Director de Finanças que não foram considerados os 6.120,68 € declarados a título de despesas e encargos relativos a tais rendimentos, designadamente os relativos à categoria F, e ainda que o valor acumulado não é aquele mas sim 649.709,00 €, descontado aquele montante.
11. Entenderam os sujeitos passivos que haveria de actualizar tal montante por via dos coeficientes de desvalorização da moeda, não aceites pelos serviços da Administração Tributária porque inaplicáveis atendendo a que somente se destinam a actualizar o valor de aquisição de bens para efeitos de determinação de mais-valias fiscais e rendimentos disponíveis aos titulares e não os rendimentos disponíveis.
11. Inexiste documentação demonstrativa de investimentos ou aplicação financeira de tal montante de poupança.
12. Definem na sua discordância os sujeitos passivos um consumo do agregado familiar situado no montante da retribuição mínima mensal, o que não demonstraram.
13. Juntam os sujeitos passivos várias cópias de escrituras públicas de venda de imóveis ao longo dos anos de 1992, 1993, 1994, 1996, 1998, 1999, 2000, 2001, 2002, 2003, 2004 nas quais nunca figuram como únicos proprietários dos imóveis alienados, sendo que o pagamento do preço não se encontra descriminado.
14. O consumo evidenciado pelos sujeitos passivos nos anos a que os próprios reportam a poupança – 1992 a 2007 – situa-se em valores muito superiores segundo demonstração efectuada pelos Serviços da Administração Tributária.
15. Assim: em 2006 – o sujeito passivo marido efectuou suprimentos no valor total de 53.893,77 €, sendo 28.893,77 € a favor da sociedade “……………………….” e 25.000,00 € à sociedade “…………………………., Lda” de que é sócio;
16. Em 2005 – o sujeito passivo marido procedeu a suprimentos a favor das sociedades supra descritas, sendo 48.666,66 € a favor da primeira e 208.125,00 €;
17. Em 2004 – o sujeito passivo efectuou suprimentos no valor total de 122.566,67 €, sendo 35.066,67 € a favor da sociedade “……………………., Lda” e 87.500,00 € a favor da sociedade “…………………………., Lda”;
18. Em 2003 – o sujeito passivo efectuou suprimentos a favor da sociedade “……………………………., Lda” no valor de 12.500,00 €;
19. Em 2003 – o sujeito passivo adquiriu uma viatura ligeira de mercadorias de marca Nissan, modelo Pick Up DC Navara, com a matrícula …………….., pelo valor de 30.823,86 €, pago e facturado ao mesmo;
20. Em 2000 – o sujeito passivo adquiriu uma viatura automóvel de matrícula ………………, pelo valor de 76.814,88 € pago através de dois cheques que emitiu;
21. Em 1998 – o sujeito passivo, conjuntamente com outro (José……………………) inscreveu na matriz um prédio urbano novo que construíram, sito na Meda, constituído por 6 fracções autónomas;
22. Em 1993 – o sujeito passivo, conjuntamente com aquele outro sujeito passivo, fizeram inscrever na matriz prédio urbano novo que construíram, cito na Cerca, constituído em propriedade horizontal e composto por 5 fracções autónomas;
23. Em 1992 – o sujeito passivo fez inscrever prédio urbano novo, que construiu, sito no Outeiro dos Gatos, composto por casa destinada a habitação com superfície coberta de 165 m2 e logradouro de 1735 m2.
24. Conjuntamente, o consumo evidenciado pelos sujeitos passivos – de 1992 a 2007 - é de 742.987,05 €, tendo invocado uma poupança nesse período de 528.739,78 € e rendimentos declarados neste último ano de 29.021,09 €.
25. Daqui excluído está o consumo dispendido com a construção conjunta com o sujeito passivo José ………………………………….
26. No exercício de audição prévia os sujeitos passivos não apresentaram extractos bancários ou declaração para acesso às contas bancárias

5.1.
Alicerçou-se a convicção do Tribunal na consideração dos factos provados no teor dos documentos constantes dos autos e bem assim do processo administrativo, os quais não foram impugnados.

6.
FACTOS NÃO PROVADOS
Inexistem outros factos sobre que o Tribunal se deva pronunciar já que todas as asserções insertas na douta petição constituem conclusões de facto e/ou direito.»


A.1 A questão que, importa apreciar e decidir é a de saber se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento da matéria de facto por nela não ter sido dado como provadas a realização das escrituras públicas referentes as vendas dos imóveis, a que se reportam os documentos juntos à petição de impugnação sob os n.ºs 3 a 20.
Justificam os Recorrentes a pretendida ampliação da matéria de facto, pelo facto de constituírem documentos autênticos e não foram impugnados pelo Recorrido em sede de contestação, com os quais pretendem provar os rendimentos derivados das alienações.
Vejamos, se lhe assiste razão.
Antes de mais cabe esclarecer que o processo que subiu em recurso a este Tribunal não contém nenhuns originais dos documentos autênticos ou originais das certidões, tudo se resumindo a fotocópias, pelo que, quanto às fotocópias é aplicável o regime dos artigos 387º nº 1, 383º nº 1 e 385º nº 1 todos do Código Civil.
Por não ter sido suscitada, a falsidade dos documentos (artigo 546º do CPC) de que as fotocópias foram extraídas, isto é, falsidade no tocante à autenticidade dos documentos autênticos e força probatória das atestações de documentos formados por autoridade publica, nem sequer, no plano das relações entre as fotocópias e os originais, a invalidação da força probatória das fotocópias equivalentes às certidões, tal significa que a qualidade dos documentos será apreciada segundo o regime dos artigos 363º nº 2, 369º nº 1, 366º, 370º nº 1 e 371º nº 1, todos do Código Civil.
Todavia, não estando posta em causa a autenticidade dos documentos autênticos originais nem as fotocópias deles extraídas que os Recorrentes trouxeram aos autos, rege o disposto no artigo 370º nº 1, 371º nº 1, 387º nº 1, 383º nº 1 e 385º nº 1 todos do Código.
Prosseguindo.
De acordo com o disposto no artigo 640º, nº 1 do CPC (anterior artigo 685º-B nº 1), quando impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente, sob pena de rejeição do recurso, especificar:
- Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados.
- Quais os concretos meios de probatórios, constantes do processo ou do registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
- A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
Há que realçar que as alterações introduzidas no CPC com o Decreto-Lei nº 39/95, de 15/2, com o aditamento do artigo 690º-A, posterior artigo 685º-B e actual artigo 640º, nº1 do mesmo compêndio, quiseram garantir no sistema processual civil português, um duplo grau de jurisdição.
De qualquer modo, há que não esquecer que continua a vigorar entre nós o sistema da livre apreciação da prova conforme resulta do artigo 655º, do CPC, o qual dispõe que “o tribunal colectivo aprecia livremente as provas, decidindo os juízes segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto.
Dito isto, é inquestionável que, pretendendo a Recorrente que a 2ª Instância aprecie do acerto da decisão da 1ª Instância proferida sobre a matéria de facto, tem ela de observar determinadas regras e ónus processuais, a que acresce (para que a modificação da matéria de facto seja possível) a necessidade de verificação de determinados pressupostos.
Assim, como já referimos, de acordo com o disposto no artigo 640º nº 1 do CPC (anterior artigo 685º-B, nº 1), em primeiro lugar, deve o recorrente, obrigatoriamente, especificar, sob pena de rejeição:
Quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo de gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida; a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
E, no caso previsto no artigo 640º nº 1, al. b) do CPC, obriga ainda o nº 2 do mesmo preceito legal, que, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, que o recorrente deva, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição.
No caso, a simples leitura da alegação da Recorrente permite concluir, com toda a evidência, que foram integralmente cumpridos os ónus referidos nos aludidos preceitos.
A Recorrente indicou com toda a clareza os meios de prova constantes do processo (documentos) que, na sua opinião, deviam constar na matéria assente.
Por outro lado, a pretendida ampliação da matéria de facto revela-se indispensável para alcançar a justa composição do litígio.
Desde modo, defere-se a pretendida ampliação da matéria de facto, com a redacção dada por este Tribunal de recurso, procedendo-se ao respectivo aditamento, nos termos seguintes:

27. Por escritura pública celebrada em 16/07/1992, os recorrentes transmitiram, em compropriedade, pelo preço de 2.240.000.00/ € 11.173.07 o lote de terreno para construção urbana nº …. sito na Cerca, com a área de 128 m2 omisso na matriz e descrito na CRP da Meda sob o nº ……, e pelo preço de 2.240.000.00/ € 11.173.07 o lote de terreno para construção urbana nº …. sito na Cerca, com a área de 128 m2 omisso na matriz e descrito na CRP da Meda sob o nº …... (Doc. n.º 3 junto à p.i.)
28. Por escritura pública celebrada em 14/10/1992, os recorrentes transmitiram, em compropriedade, pelo preço de 27.000.000.00/ € 134.675.00 o lote de terreno para construção urbana nº ….. sito na Cerca, com a área de 2.700 m2 omisso na matriz e descrito na CRP da Meda sob o nº ………. (Doc. n.º 4 junto à p.i.)
29. Por escritura pública celebrada em 19/03/1993, os recorrentes transmitiram, em compropriedade, pelo preço de 2.500.000.00/€ 12.469.95 o lote de terreno nº …. sito na Cerca, com a área de 128 m2 omisso na matriz e descrito na CRP da Meda sob o nº …... (Doc. n.º 5, junto à p.i.)
29. Por escritura pública celebrada em 27/04/1993, os recorrentes transmitiram, em compropriedade, pelo preço de 42.000.000.00/€ 209.495.00 a fracção autónoma designada pela letra "….." destina a comércio designadamente bancário, correspondente á cave e rés do chão, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, omisso na matriz e descrito na CRP da Meda sob o nº ……... (Doc. n.º 6, junto à p.i)
30. Por escritura pública celebrada em 18/08/1994, os recorrentes transmitiram em compropriedade, pelo preço de 2.600.000.00/€ 12.968.75 o lote de terreno nº ….., sito na Cerca, com a área de 128 m2, omisso na matriz e descrito na CRP da Meda, sob o nº ……. (Doc. n.º 7, junto à p.i)
31. Por escritura pública celebrada em 01/07/1994, os recorrentes transmitiram, em compropriedade, pelo preço de 1.920.000.00/€ 9.576.92 o lote de terreno n° ……, sito na Cerca, omisso na matriz e descrito na CRP da Meda, sob o nº ……. (Doc.n.º8, junto á p.i.)
32. Por escritura pública celebrada em 02/08/1996, os recorrentes transmitiram, em compropriedade, e na proporção de 2/3 pelo preço de 2.200.000.00/10.973.55 o lote de terreno nº ….., sito na Cerca, com a área de 128 m2, inscrito na matriz sob o nº ……. e descrito na CRP da Meda, sob o nº ………. (Doc. n.º 9, junto á p.i)
33. Por escritura pública celebrada em 30/11/1998, os recorrentes transmitiram, em compropriedade, pelo preço de 2.620.800.00/€ 13.072.50 o lote de terreno nº …., sito na Cerca, com a área de 128 m2, inscrito na matriz sob o nº ……. e descrito na CRP da Meda, sob o nº ……... (Doc.n.º10, junto, á p.i.)
34. Por escritura pública celebrada em 30/11/1998, os recorrentes transmitiram, em compropriedade na proporção de 2/3, pelo preço de 3.307.500.00/€ 16.497.74 o lote de terreno nº ….., sito na Cerca, com a área de 315 m2, inscrito na matriz sob o n° ……… e descrito na CRP da Meda, sob o nº ……... (Doc.n.º 11, junto à p.i.)
35. Por escritura pública celebrada em 29/05/1998, os recorrentes transmitiram, em compropriedade, pelo preço de 8.000.000.00/€ 39.903.83 a fracção autónoma "….", 20 andar destinada a habitação, inscrita na matriz sob o artigo …….- E descrito na CRP da Meda, sob o nº …… E e a fracção autónoma inscrita na matriz sob artigo ……. e descrita na CRP da Meda sob o nº …….. (Doc. nº 12, junto á p.i.)
36. Por escritura pública celebrada em 15/06/1999, os recorrentes transmitiram, em compropriedade e na proporção de 2/3, pelo preço de 8.000.000.00/€ 39.903.83 a fracção autónoma "…", 1° andar nascente, destinada a habitação, inscrita na matriz sob o artigo ……..-E e descrito na CRP da Meda, sob o nº …….. e descrita na CRP da Meda sob o nº ………. (Doc. n.º 13, junto á p.i.)
37. Por escritura pública celebrada em 10/08/1999, os recorrentes transmitiram, em compropriedade na proporção de 2/3, pelo preço de 2.020.000.00/€ 10.075.72 o lote de terreno n° ….., com a área de 128 m2, inscrito na matriz sob o artigo ……… e descrito na CRP da Meda, sob o n° ………. (Doc. n.º 14, junto á p.i.)
38. Por escritura pública celebrada em 17/10/2000, os recorrentes transmitiram, em compropriedade, pelo preço de 4.000.000.00.00/€ € 19.951.92 o lote de terreno nº ……, inscrito na matriz sob o artigo …….. e descrito na CRP da Meda, sob o nº ……….. (Doc. n.º 15, junto á p.i.)
39. Por escritura pública celebrada em 12/07/2001, os recorrentes transmitiram, em compropriedade e na proporção de 2/3, pelo preço de 10.000.000.00/€ 49.879.78 a fracção "…" 1 ° andar esquerdo, destinada a habitação, inscrita na matriz predial sob o artigo ……… e descrito na CRP da Meda, sob o nº …………. (Doc. n.º 16, junto à p.i.)
40. Por escritura pública celebrada em 07/11/2001, os recorrentes transmitiram, em compropriedade e na proporção de 2/3, pelo preço de 12.500.000.00/€ 62.349.73 a fracção "…." 2° andar esquerdo, destinada a habitação, inscrita na matriz predial sob o artigo ………-F e descrito na CRP da Meda, sob o nº ……….-F. (Doc.n.º 17, junto à p.i.)
41. Por escritura pública celebrada em 12/09/2002, os recorrentes transmitiram, em compropriedade e na proporção de 2/3, pelo preço de € 72.349.74 a fracção "…." 1° andar poente, destinada a habitação, inscrita na matriz predial sob o artigo …….. e descrito na CRP da Meda, sob o nº ……... (Doc. n.º 18, junto à p.i.)
42. Por escritura pública celebrada em 05/03/2003, os recorrentes transmitiram, em compropriedade na proporção de 2/3, pelo preço de € 59.855.00 a fracção "….." 1 ° andar direito, destinada a habitação, inscrita na matriz predial sob o artigo …….-C e descrito na CRP da Meda, sob o nº ……... (Doc. n.º 19, junto á p.i.)
43. Por escritura pública celebrada em 27/12/2004, os recorrentes transmitiram, em compropriedade, pelo preço de € 3.000.00 o lote de terreno para construção urbana, designado por G-três, no lugar da Cerca, inscrita na matriz predial sob o artigo …….. e descrito na CRP da Meda, sob o nº …….. (Doc. n.º 20, junto, á p.i.)
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B.DE DIREITO
Assente a factualidade apurada cumpre, então, antes de mais, entrara na análise da realidade em equação nos autos, sendo que a este Tribunal, está cometida desde logo, a tarefa de indagar da nulidade da sentença sob exame, já que o seu conhecimento precede, logicamente, o das restantes questões.

Ø DA NULIDADE DA SENTENÇA
A sentença, como acto jurisdicional, pode ter atentado contra as regras próprias da sua elaboração e estruturação ou contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada e, então, torna-se passível de nulidade, nos termos do artigo 615º do NCPC (artigo 668º do anterior CPC).
O artigo 125.º do CPPT comina com a nulidade da sentença a falta de assinatura do juiz, a não especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, a oposição dos fundamentos com a decisão e a falta de pronúncia sobre questões que o juiz deva apreciar ou a pronúncia sobre questões que não deva conhecer.
Nesta perspectiva, estipula-se no apontado artigo 615º, nº 1 do NCPC (artigo 668º do anterior CPC), sob a epígrafe de «Causas de nulidade da sentença», que:
«1 - É nula a sentença:
a) Quando não contenha a assinatura do juiz;
b) Quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) Quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) Quando condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido (…) ».
Os Recorrentes assacam à sentença sob exame o vício da nulidade. Valor negativo que, radica na falta de especificação dos factos provado e não provados e de análise crítica da prova produzida nos presentes autos de impugnação, o que integraria aquele vício nos termos da al. b) do nº 1 do artigo 668º do CPC.
Decorre do nº 2 do artigo 653º do CPC (artigo 653º do NCPC) que na decisão sobre a matéria de facto o juiz declarará quais os factos que o tribunal julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas e especificando os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador.
Como é actualmente pacífico na doutrina e na jurisprudência a exigência de motivação da decisão sobre a matéria de facto não se satisfaz com a simples referência aos meios de prova que o julgador considerou decisivos para a formação da sua convicção.
Esta exigência legal de fundamentação da matéria de facto provada e não provada respeita à possibilidade de controlo da decisão do julgador, a viabilizar a exigível sindicabilidade da decisão e a reforçar a sua compreensibilidade pelos destinatários directos e da comunidade em geral, como elemento de relevo para a sua aceitação e legitimação. No fundo, na necessidade de pormenorizar o processo lógico, racional e esclarecedor, por parte do julgador, que o levou a determinada solução, por forma a tornar a sua decisão controlável.
No tocante à falta de especificação dos fundamentos de facto, prevista no artigo 125.º, n.º 1, do CPPT, e no artigo 668.º, n.º 1, alínea b), do CPC, (artigo 615º, n.º1 al.b) do NCPC) não merece controvérsia que esta nulidade abrange não apenas a falta de discriminação dos factos provados e não provados, a que se refere o artigo 123º, nº 2 do CPPT, mas também a falta de exame crítico das provas, previsto no artigo 659º, nº 3 do CPC (artigo 607º, n.º 4 do NCPC). (Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 5.ª edição, I volume, anotação 7 ao artigo 127.º, pág. 906, fonte citada no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 21.01.2010, proferido no processo n.º 00623/08.6BEBRG- disponível no endereço http://www.gde.mj.pt/)
Mais detidamente sobre o “exame crítico” das provas, disse o Supremo Tribunal de Justiça: «O exame crítico consiste na enunciação das razões de ciência reveladas ou extraídas das provas administradas, a razão de determinada opção relevante por um ou outro dos meios de prova, os motivos de credibilidade dos depoimentos, o valor de documentos e exames, que o tribunal privilegiou na formação da convicção, em ordem a que os destinatários (e um homem médio suposto pela ordem jurídica, exterior ao processo, com a experiência razoável da vida e das coisas) fiquem cientes da lógica do raciocínio seguido pelo tribunal e das razões da sua convicção» (Acórdão de 16.02.2005, proferido no processo n.º 05P662, disponível no endereço http://www.dgsi.pt/).
À luz do que vem dito, coloca-se, então, a questão de saber se a decisão recorrida padece da nulidade prevista no artigo 125.º, n.º 1, do CPPT, e no artigo 668.º, n.º 1, al.b), do CPC, tomando como assente, que a falta de discriminação dos factos não provados como a dos factos provados só será necessária relativamente a factos que possam relevar para a apreciação da causa, segundo as várias soluções plausíveis de direito (artigos 508.º-A, n.º 1, al. e), 511.º e 659.º do CPC) e que a falta do exame crítico das provas só constitui nulidade a sua omissão total. (Neste sentido vide: Jorge Lopes de Sousa, no Código de Procedimento e de Processo Anotado e comentado, I, em anotação ao artigo 125º, Vol II, 6ª Edição, página 360, e idêntico sentido, vide entre muitos outros, Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 12.11.2008, proferido no processo n.º 0546/08, disponível no endereço http://www.dgsi.pt/)
A resposta é negativa.
Da análise da decisão recorrida constata-se que a Mmª Juiz «a quo» do enquadramento que fez da questão submetida a juízo, considerou que: «Não obstante os sujeitos passivos invoquem a necessária demonstração dos factos conducentes à aplicação da avaliação indirecta ela ocorre. A Administração indicou expressamente as razões de facto e de direito da sua opção- como se pode ver da decisão.
É, contribuinte que cabe a prova – que no caso não lograram fazer- da realidade dos rendimentos declarados e que é, de outro modo, como é justificável um consumo superior em mais de um terço dos rendimentos obtidos.»
É certo que esta formulação é muito singela e que uma maior explicitação seria conveniente. Todavia, como já se salientou, a jurisprudência uniformemente entende que para que exista uma nulidade por falta de fundamentação, é necessário que a mesma seja absoluta.
Questão diferente é a de saber se ocorreu erro de julgamento de facto por o Tribunal «a quo» ter decidido mal ou contra os factos apurados.
Assim, arredada fica a invocada nulidade.

Passemos agora a conhecer das questões colocadas pelos Recorrentes são as de saber se estão, in casu, se lograram comprovar os concretos meios financeiros não sujeitos a tributação que foram causa do consumo evidenciado.
Vejamos, então.
Os Recorrentes não se conformando com a decisão de avaliação da matéria tributável em IRS por métodos indirectos, que determinou a alteração do rendimento tributável no ano de 2007, no valor de € 25.167,12, dela interpuseram recurso judicial ao abrigo do artigo 89º-A, n.º6 e 7 da LGT e artigo 146º- B, n.º5 do CPPT.
A Mmª Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, acolhendo a tese do Recorrido, julgou improcedente o recurso judicial, considerando: « Neste âmbito, apurando-se irregularidades por discrepâncias entre os valores anunciados nas declarações de rendimentos e o consumo evidenciado no mesmo período em, pelo menos, um terço daquele valor, de acordo com a al. f) do art. 87º da LGT haverá lugar a avaliação indirecta da matéria colectável de acordo com a epígrafe e prologo de tal preceito legal.
Ora, esse é o caso dos sujeitos passivos que não lograram questionar com sucesso as conclusões extraídas da análise aos rendimentos declarados e consumo evidenciado no período em questão, afastados que foram os argumentos que tentaram esgrimir do meio exposto na matéria assente.
Os impugnantes, limitaram-se a arguir a insuficiência da decisão e sua falta de conformidade com a lei, invocando um consumo padrão com referência ao rendimento mínimo mensal estabelecido por Portaria que em nada se coaduna com os movimentos financeiros que apresentam com as vendas de imóveis que trouxeram ao processo e ainda os consumos apresentados pela Administração Tributária. Note-se, ainda, no que concerne às aludidas escrituras que foram juntas sem qualquer forma de “legendagem” de molde que o Tribunal não ficou apto a delas conhecer pois se os montantes pagos a título de preço foram total ou parcialmente obtidos pelos sujeitos passivos porque não se encontram declarados enquanto rendimentos?!!!. Assim, não podem os sujeitos passivos pretender “fazer entrar pela janela o que pretenderam não entrasse pela porta”.
Não obstante os sujeitos passivos invoquem a necessária demonstração dos factos conducentes à aplicação da avaliação indirecta ela ocorre.
A Administração indicou expressamente as razões de facto e de direito da sua opção - como se pode ver da decisão.
É ao contribuinte que cabe a prova – que no caso não lograram fazer – da realidade dos rendimentos declarados e que é, de outro modo, como é justificável um consumo superior em mais de um terço dos rendimentos obtidos. Assim o decidiram recentemente o STA – veja-se Acórdão de 28/01/2009 proferido no Proc. nº 761/08 - e TCANorte – veja-se Acórdão de 19/02/2009 proferido no Proc. nº 352/08.4 BEVIS.
O pressuposto da lei é inequívoco e perante as situações descritas no referenciado art. 87º cabe lugar a avaliação de rendimentos por via de avaliação indirecta
Inconformado com essa sentença, os Recorrentes dela recorrem para este Tribunal Central Administrativo Sul. Argumentam, em síntese, que fizeram prova suficiente para elidir a presunção, conforme o prescrito mo artigo 89º- A, n.º3 da LGT, uma vez demonstraram que a fonte de rendimento para pagamento do consumo evidenciado no ano de 2007, sendo aquela fonte os rendimentos declarados nesse ano e a poupança gerada por rendimentos que foram declarados em anos anteriores.
Vejamos, se lhes assiste razão.
De acordo com o relatório de inspecção que suporta o acto posto em crise, a Administração Tributária e Aduaneira (doravante ATA) considerou patenteada uma capacidade contributiva dos impugnantes, ora Recorrentes, significativamente maior do que a declarada, ponderando que: « No ano de 2007 o sujeito passivo João…………………, NIF ………………., titular dos rendimentos da categoria A e F) , realizou em numerário o aumento do Capital Social da sociedade ……………………. Lda, da qual é socio, no montante liquido de 50.000,00€.
Para além disso, declarou no anexo H da declaração de modelo 3 de IRS, ter efectuado uma aquisição de computador pessoal no valor de 1.575,00€ ( código de beneficio 708 do quadro 7), despesas de saúde no valor de 953,63€ ( campo 801 do quadro 8) e despesas de educação com os dependentes no valor de 1.659,58€ (campo 803 do quadro 8).
Pelo que o sujeito passivo evidenciou no exercício de 2007, um consumo no valor total de 54.188,21 €, correspondentes à soma do valor do capital social com os dados indicados no anexo H da declaração modelo 3 de IRS (54.188,21€=1.575,00€ + 953,63€ + 1.659,58€)
Assim, tendo em conta, que nesse ano o agregado familiar declarou o rendimento líquido de 29.021,09€, um terço desse rendimento corresponde 9 673,70€, evidenciando de tal forma uma divergência superior a um terço entre os rendimentos declarados e o consumo evidenciado de 54.188,21€, uma vez que este valor é superior a 38.694,79€ (20.021,09 € + 9.673,70€).
Pelo que, se encontram reunidas as condições legais para, de acordo com a alínea f) do artigo 87º da LGT, se proceder à fixação do rendimento tributável no montante de 25.167,12€, o que será considerado como rendimento tributável no montante de 25.167,12€, o qual será considerado como rendimento da categoria G, de acordo com o n.º5 do artigo 89º- A da LGT (…).»
Ou seja, segundo a fundamentação que suportou a sentença recorrida, a ATA procedeu à avaliação indirecta da matéria colectável em IRS dos Recorrentes, em relação ao ano de 2007, após ter verificado que se haviam evidenciado, nesse mesmo ano, um consumo de € 54.188,21, o que representaria uma divergência não justificada superior a um terço entre os rendimentos declarados (€ 38.694,79), nos termos da alínea f) do artigo 87.º da LGT.
Pela Lei n.º 55-B/2004, de 30 de Dezembro – Lei de Orçamento do Estado para 2005 – foi introduzida no artigo 87.º, que prevê taxativamente os casos em que é admissível a avaliação indirecta, a alínea f), do seguinte teor: «Existência de uma divergência não justificada de, pelo menos, um terço entre os rendimentos declarados e o acréscimo de património ou o consumo evidenciados pelo sujeito passivo no mesmo período de tributação».
Verificada a situação inscrita no citado preceito legal, cabe ao sujeito a comprovação de que correspondem à realidade os rendimentos declarados e de que é outra a fonte das manifestações de fortuna ou o acréscimo de património ou o consumo evidenciados (cfr. artigo n.º 3 do artigo 89.ºA, redacção, introduzida pela Lei n.º 55-B/2004, de 30 de Dezembro). Ou dito de outro modo, recai sobre o sujeito passivo o ónus de comprovar que os acréscimos patrimoniais ou os consumos evidenciados têm outra fonte que não rendimentos sujeitos a declaração para efeitos de IRS.
Se o sujeito passivo não justificar os valores que permitiram evidenciar os acréscimos patrimoniais ou consumos evidenciados, a ATA, fica autorizada a proceder à avaliação indirecta do rendimento tributável, nos termos da referida alínea f) do artigo 8.º. Nesse situação, a ATA pode, nos termos do n.º 5 do artigo 89.º-A, fixar o rendimento tributável em sede de IRS em montante igual ao da diferença entre o acréscimo de património ou o consumo evidenciados, ou mesmo em montante superior, se existirem «indícios fundados, de acordo com os critérios previstos no artigo 90º que lho permitam, a enquadrar na categoria G do IRS.
Concluímos o enquadramento da questão que nos ocupa com um excerto do Acórdão do STA de 28.11.2012, proferido no processo n.º 01197/12
em que, perante os dispositivos legais supra citados se escreveu o seguinte:
« Ou seja, os arts. 87.º, alínea f), e 89.º-A, n.º 5, vieram criar mais uma possibilidade de avaliação da matéria tributável por método indirecto, com as seguintes características:
– face a um acréscimo patrimonial ou a uma manifestação de consumo que divirja em, pelo menos, um terço do rendimento declarado no ano, cessa a presunção de veracidade da declaração e inicia-se o procedimento de fixação da matéria tributável;
– depois, a menos que o contribuinte demonstre que os valores que possibilitaram o acréscimo patrimonial ou o consumo evidenciados não constituem rendimentos sujeitos a declaração para efeitos de IRS, ou seja, designadamente, que tiveram origem em capital próprio, recurso ao crédito, herança ou doação, rendimentos sujeitos a tributação autónoma, etc., a AT fica, sem mais, autorizada a fixar, de forma indirecta, como rendimento tributável em sede de IRS, categoria G, um montante igual ao da diferença entre o rendimento declarado e o valor do acréscimo patrimonial ou do consumo evidenciados.» (disponível no endereço www.dgsi.pt)
No caso vertente, é inequívoco que a prova produzida no procedimento é suficiente para que se dê como demonstrada a existência de uma divergência superior a um terço entre o consumo evidenciado ( € 54.188,21- correspondendo € 50.000.00 a aumento de capital na sociedade “ ……………….., Lda” da qual o Recorrente é sócio, € 1.575,00 - correspondente à aquisição de um computador, € 953,63 – correspondente a despesas de saúde € 1.659,58- correspondente a despesas de educação) e os rendimentos declarados pelo Recorrente no ano de 2007 ( € 29.021.09).
Demonstrados que ficaram pela ATA os pressupostos de aplicação da tributação por métodos indirectos ao abrigo do disposto na alínea f) do art. 87.º, na redacção da Lei n.º 55-B/2004, de 30 de Dezembro, compete agora, apurar se os Recorrentes não omitiram quaisquer rendimentos na sua declaração de IRS e que o valor do consumo evidenciado tem proveniência em rendimentos que não haviam de ser declarados, recaindo sobre eles o respectivo ónus (89.º-A, n.º 3), nos termos que deixámos já referidos.
Neste contexto, os Recorrentes sustentam que auferiram rendimentos declarados através da venda de imoveis, que lhes permitiu efectuar as poupanças necessárias para os consumos evidenciados, poupanças essas que alegaram ascender a € 494.957,54.
A título de suporte documental, juntaram cópias das escrituras de compra e venda dos imóveis que efectuaram e que segundo dizem geraram rendimentos.
Ora, tais documentos não têm potencialidade de provar que os rendimentos obtidos com as vendas nelas reportadas foram utilizados nos actos de consumo evidenciados. Porque, não permitem apurar se os rendimentos auferidos pelas vendas dos imoveis foram utilizados naqueles consumos. Nesta circunstância, seguro é de concluir que os Recorrentes não lograram provar a relação causal de afectação desses rendimentos (não sujeito a tributação) aos actos de consumo evidenciados.
Concordando-se com o discurso fundamentador, prolatado no Acórdão do STA de 12.04.2012, processo nº 298/12, passa-se a transcrever o mesmo na parte para o efeito aqui relevante:
«Para prova da ilegitimidade deste acto de avaliação indirecta não basta ao contribuinte demonstrar que no ano em causa detinha meios financeiros de valor superior ao dos consumos realizados, mas também quais os concretos meios financeiros que afectou à realização de tais consumos sendo a melhor interpretação do art. 89.º-A, n.º 3, da LGT, a que exige que o contribuinte prove a relação causal de afectação de certo rendimento (não sujeito a tributação) a determinada manifestação de fortuna evidenciada.
(…)
Patenteia-se que o sistema criado de controlo das manifestações de fortuna e outros acréscimos patrimoniais não justificados exige ao sujeito passivo que comprove a realidade dos rendimentos declarados e que é outra a fonte do acréscimo do património ou do consumo efectuado - cfr. art.° 89°-A n.° 3 da LGT. não lhe bastando fazer a demonstração de factos que permitam duvidar da existência do facto tributário ou da sua quantificação, antes se lhe impondo, que para além disso demonstre quais os concretos meios financeiros não sujeitos a declaração que foram afectos ao consumo evidenciado.
A demonstração de que se fala é, pois, a da afectação concreta dos recursos brotados da referida fonte (rendimentos não sujeitos a tributação) ao concreto consumo ou acréscimo patrimonial.
(…)
Tendo presente o regime da avaliação indirecta previsto no referido art. 89.º-A e a sua teleologia, parece-nos claro que a lei exige uma relação causal entre os meios financeiros não sujeitos a declaração e à sua afectação à manifestação de fortuna evidenciada. (…)» ( disponível no endereço www.dgsi.pt) .
Nesta perspectiva, de acordo com o disposto no n.º 3 do aludido 89.º-A da LGT competia aos Recorrentes fazer tal prova, nomeadamente através de cópias de cheques e de ordens de movimentação de contas bancárias, designadamente transferências interbancárias, que evidenciassem quer a origem, quer a mobilização dos recursos financeiros utilizados para efectuar quer o aumento de capital da sociedade “…………………., Lda” no montante de € 50.000,00 quer os demais consumos em causa nos autos.
E, neste contexto, impõe-se julgar improcedente o recurso e, confirmar a sentença de 1ª instância.


IV.DECISÃO
Nestes termos acordam, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, em negar provimento ao recurso, mantendo-se a decisão judicial recorrida.

Custas pelos Recorrentes.

Lisboa, 21 de Maio de 2015.


[Ana Pinhol]

[Jorge Cortês]

[Cristina Flora]