Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2921/10.3BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:06/09/2021
Relator:VITAL LOPES
Descritores:RECURSOS;
PRAZOS JUDICIAIS;
SUSPENSÃO;
CONTAGEM;
MULTA;
OPOSIÇÃO;
GERENTE;
RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA.
Sumário:1. O prazo de recurso jurisdicional é um prazo processual sendo de aplicar o disposto nos artigos 138/1 e 2 e 139/5 do CPC, ex vi do 281.º do CPPT.
2. Nos termos dos artigos 23.º, nº. 2 da L.G.T., e 153º, nº. 2 do C.P.P.T., a reversão do processo de execução fiscal contra o responsável subsidiário depende de verificação da inexistência ou da fundada insuficiência de bens penhoráveis do devedor originário para pagamento da dívida exequenda e acrescido.
3. Incumbe à Administração tributária demonstrar que não existiam, à data da reversão, bens penhoráveis do devedor originário ou, existindo, que eles eram fundadamente insuficientes para solver a dívida.
4. No domínio da vigência da LGT, para afastar a responsabilidade subsidiária pelas dívidas de impostos cujo termo do prazo para pagamento ou entrega terminou durante o período da sua gerência, é necessária a demonstração de que não é imputável aos gerentes ou administradores das sociedades a falta de pagamento ou de entrega do imposto (artigo 24.º, n.º 1, alínea b), da LGT).
5. Assim, sendo as dívidas provenientes de IVA, ao gerente que exercia funções na data em que deveria ter sido pago o imposto incumbe demonstrar, mediante prova positiva e concludente, que a falta desse pagamento não lhe foi imputável, o que passa pela demonstração da falta de fundos da sociedade originária devedora para efectuar o pagamento e que tal falta se não deve a qualquer omissão ou comportamento censuráveis do gestor.
6. A dúvida relativamente à verificação da culpa dos gestores pela falta de pagamento dos impostos cujo pagamento ou entrega devesse ter sido feito durante o período em que exerceram funções de gestão, sempre terá de ser valorada contra o revertido/ oponente.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA 2.ª SUBSECÇÃO DO CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

1 – RELATÓRIO

P......., recorre da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou improcedente a oposição deduzida à execução fiscal n.º ....... contra si revertida e originariamente instaurada contra a sociedade “P......., LDA.” pela quantia exequenda de 8.678,23 Euros proveniente de dívidas de IVA e IRC dos anos de 2004, 2005 e 2006 e IRS do ano de 2006.

O Recorrente conclui as doutas alegações assim:
«
1 - Vem o presente recurso interposto da sentença proferida nestes autos que julga a oposição improcedente e em consequência absolve a Fazenda Pública do pedido.
2 - As questões suscitadas na presente oposição resumem-se, em suma, em indagar se a AT não logrou demonstrar o pressuposto da reversão consubstanciado na fundada insuficiência de bens penhoráveis da devedora originária, e consequentemente ao julgar procedente a oposição deduzida pelo revertido;
3 - Sem prejuízo, uma vez procedente a falta do primeiro pressuposto os outros não carecem de apreciação, no entanto, sempre se demonstra que também não pode ser imputada culpa ao oponente pelo alegado incumprimento da obrigação tributária.
4 – Impugna-se a decisão proferida sobre a matéria de facto com reapreciação da prova gravada, cumprindo-se o disposto no artº 640º nº 1 e 2 do CPC, identificando-se os concretos pontos de facto que se consideram incorrectamente julgados: Os pontos 1 – 2- 3- 4 por referência à identificação da factualidade considerada não provada na sentença recorrida:
1 – Não foi provada a concreta existência de dívidas de clientes da devedora originária nos anos de 2003 e 2004, bem como os seus valores;
2 – Não foi provada a realização de qualquer diligência por parte do Oponente, enquanto gerente da devedora originária, para tentativa de recuperação de quaisquer créditos detidos por esta sobre seus clientes;
3 – Não foi provada a data em que a relação comercial entre a “E.......” e a “L......., Lda” terminou.
4 – Não foi provada a existência de bens penhoráveis da sociedade devedora originária à data do despacho de reversão.
Indicam-se os concretos meios probatórios que constantes do processo e do registo ou gravação nele realizada, que impõe decisão diversa sobre os pontos de facto impugnados diversa da recorrida e que consistem nos depoimentos das testemunhas C....... e Z......., cujas passagens para reapreciação da prova gravada se indicam supra e se dão aqui por reproduzidas por economia processual; e a decisão que no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de factos impugnadas que consiste na modificação da referida factualidade considerada na sentença como não provada, que deve passar a considerar-se como provada.

5 – Na sentença recorrida não se encontram fundamentos suficientes que determinaram para que através das regras da lógica e da experiência se possa controlar a sua razoabilidade sobre os factos provados e não provados.
6 – O carácter subsidiário da responsabilidade tributária, imposto no nº 3 do artigo 22º da LGT, decorre que a execução fiscal só pode ser revertida contra o responsável subsidiário depois de excutidos os bens do devedor originário.
7 – Ora, dos autos não resulta demonstrado pela Fazenda Pública a impossibilidade de cobrar o imposto em falta pela sociedade originária devedora, sendo insuficiente a mera e insustentável informação prestada pelo funcionário da Fazenda Pública de que a sociedade não dispõe de património. Aquele não se deslocou às instalações da sociedade nem procedeu á análise da declaração de rendimentos e IES.
8 – Reportando-se o imposto ao período de 2002, em 2020 a sociedade originária ainda se mantém com ativos inscritos na sua contabilidade, que a AT não pode ignorar por ter conhecimento direto sobre a situação contabilista. Ativos estes de valor muito superior ao da quantia exequenda.
9 – O órgão de execução fiscal está vinculado a fazer uma investigação aprofundada sobre a existência de bens no património do devedor originário ou dos eventuais responsáveis solidários, o que não se verificou nos autos em apreço.
10 - Por isso, se outro argumento não existisse, sempre o facto de não se encontrarem excutidos os bens da originária devedora, são suficientes para fazer proceder a presente oposição.
11 – Sem prescindir das antecedentes conclusões, além de se considerar provado que o oponente foi gerente da sociedade originária devedora não se pode retirar que a falta de pagamento do imposto se ficou a dever a culpa do oponente;
12 - Não estamos perante uma situação de presunção de culpa do responsável subsidiário, aqui oponente.
13 - Culpa que, deve aqui ser determinada em termos reais e concretos – artigo 487º nº 2 , 799º nº 2 do Código Civil .
14 - Ao oponente não pode ser imputada qualquer violação culposa quer das disposições legais destinadas à proteção dos credores sociais, entre eles se contando a AT, quer de malbaratar ou dissipar o património social.
15 – E, a AT nenhuma prova faz relativamente à eventual culpa do oponente.
16 – Encontrando-se provada a factualidade constante das alíneas N), O) e P) que afasta qualquer responsabilidade do oponente pela alegada falta de pagamento do imposto. Pois a inesperada quebra contratual do principal fornecedor não pode ser imputada ao aqui recorrente.
17- Quanto à repartição do ónus da prova, é bem de ver que se mantém as suas regras gerais, de modo que, a AT tenha de provar o preenchimento dos pressupostos da culpa, o que não fez nestes autos.
18 – Competia assim a prova da AT que a falta de pagamento do imposto se ficou a dever a culpa do oponente, o que não faz;
19 – Demonstrando o oponente pela factualidade provada que manteve sempre uma atuação diligente que impede a imputação de qualquer culpa e que apenas vicissitudes comerciais a que é alheio impediram o cumprimento da obrigação.
20 - Face a tudo que atrás se alegou, não era exigível do oponente um comportamento diferente.
21 - Pelo que, o oponente é parte ilegítima - artigo 286º nº 1 al. b) e 237º do Código de Processo Tributário e 204º nº 1 al. b) do C.P.P.T. .
22 – A sentença recorrida não faz um correta aplicação da lei aplicável ao tempo dos factos e faz errada interpretação e aplicação do disposto nos artºs 22º, 23º, da LGT
e 153 nºs 2 e 3 do CPPT.
23- Deve assim proceder o presente recurso e consequentemente revogada a sentença recorrida.
Termos em que, nos melhores de Direito que V. Exªs doutamente suprirão, deve o presente recurso merecer total provimento e, por via disso, revogada a sentença recorrida e substituída por decisão que julgue a presente oposição totalmente procedente, por provada com todas as demais consequências legais, como é de inteira
J U S T I Ç A!».

Contra-alegações, não houve.

O recurso foi admitido com subida imediata nos próprios autos e efeito devolutivo – despacho de 18/01/2021, inserto a págs.416 do SITAF.

O Exmo. Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu douta pronúncia no sentido do não conhecimento do objecto do recurso por extemporaneidade.

Ouvidas as partes sobre a excepção suscitada, diz o recorrente que se deverá ter em conta na contagem dos prazos os períodos de suspensão legalmente determinados no ano de 2020 e o período de férias judiciais (pág.438 do SITAF).

Com dispensa dos vistos legais dada a simplicidade das questões a resolver e nada mais obstando, vêm os autos à conferência para decisão.

2 – DO OBJECTO DO RECURSO

Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões da alegação do Recorrente (cf. artigos 634.º, n.º4 e 639.º, n.º1 do CPC), a questão central controvertida reconduz-se a indagar se a sentença incorreu em erro de julgamento de facto e de direito ao dar por verificados os pressupostos da responsabilidade subsidiária dos gerentes, sem olvidar a questão prévia suscitada pelo Ministério Público.

3 – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Em sede factual, deixou-se consignado na sentença recorrida:
«
1. Dos Factos
Compulsados os autos e analisada a prova produzida, dão-se como provados, com interesse para a decisão, os factos infra indicados:
A) O Oponente foi gerente de direito e de facto da sociedade “P…….., Lda.”, desde a sua constituição em 2001 (cfr. fls. 12 a 16 e 29 a 42 do PEF apenso).

B) Por escritura de cessão de quotas celebrada em 27.02.2003, junto do 1º Cartório Notarial de Vila do Conde, o Oponente e os restantes dois outros sócios da “P.......”, cederam as suas quotas à sociedade representada pelo Oponente, “L....... – Comércio de Produtos Congelados, Lda”, sociedade da qual O Oponente era também gerente desde pelo menos o ano de 2003 (cfr. fls. 33 e 38 a 41 do PEF apenso).

C) Em 18.07.2004 foi instaurado pelo Serviço de Finanças de Lisboa 12, contra a sociedade identificada em A), o processo de execução fiscal nº ......., por dívida de IVA do período de 0312T, no montante a pagar de 12.248,68€ (cfr. fls. 1 e 2 do PEF apenso).
D) Em 08.11.2004 foi preenchido o Boletim de Alteração Oficioso referente à P......., Lda”, passando do regime normal trimestral de IVA para o regime normal mensal de IVA, por ter tido como volume de negócios referente aos 12 meses de 2003 o valor total de 603.928,00€ (cfr. fls. 42 a 44 do PEF apenso).

E) Em 01.01.2006 foi preenchido o Boletim de Alteração Oficioso referente à “P......., Lda”, passando do regime normal mensal de IVA para o regime normal trimestral de IVA, por ter tido como volume de negócios referente aos 12 meses de 2004 o valor total de 9.977,00€ (cfr. fls. 49 e 50 do PEF apenso).

F) Em 30.12.2004 a sociedade devedora originária efetuou um pagamento por conta da execução referida na alínea antecedente, o montante de 5.000,00€, sendo imputado à dívida exequenda o montante de 3.570,45€ (cfr. fls. 3 do PEF apenso).

G) Em 03.08.2006, na sequência da notificação da penhora de créditos no âmbito do PEF referido em C), a sociedade “L......., Lda” informou o SF de Lisboa 12 de que à data inexistia qualquer crédito sobre a “P......., Lda” (cfr. fls. 6 e 7 do PEF apenso).

H) A sociedade “P......., Lda” apresentou junto da AT, declaração para cessação de atividade em sede de IVA, com efeitos a 31-12-2007, sendo o Oponente indicado como o seu Representante de cessação (cfr. fls. 12 a 16 do PEF apenso).

I) Em 30.04.2010 foi elaborado auto de diligências por funcionário do SF de Lisboa 5, atestando não ser possível cumprir o mandado de penhora de bens da “P......., Lda” por a mesma não se encontrar no local nem possuir bens da sua propriedade suscetíveis de ser penhorados (cfr. fls. 49 e 50 dos autos e fls. 58 do PEF apenso).


(cfr. fls. 59 do PEF apenso).

K) Também em 04.08.2010 foi proferido o “Projecto de despacho de reversão” contra o Oponente (cfr. fls. 51 dos autos e 60 do PEF apenso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido).

L) Após notificação para exercício do direito de audição e não exercício do mesmo, foi proferido em 25.08.2010 despacho definitivo de reversão com o seguinte teor:
“FUNDAMENTOS DA REVERSÃO
Dos administradores, directores, ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entidades fiscalmente equiparadas, por não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da dívida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período de exercício do cargo [art. 24°/n° 1/b) LGT]” (cfr. fls. 53 dos autos).

M) Citado para a execução fiscal em 02.09.2010, no seu domicílio fiscal sito na Maia, o Oponente apresentou a presente oposição em 06.10.2010 (cfr. fls. 55 e 73 dos autos).

N) A sociedade “L......., Lda” tinha como principal fornecedora a empresa espanhola “E.......”, sendo a distribuidora exclusiva dos seus produtos em Portugal.

O) Em data não concretamente apurada, a sociedade “E.......” deixou de ser fornecedora da “L......., Lda”.

P) A sociedade “L......., Lda” era a principal fornecedora da “P......., Lda, que atuava como a distribuidora dos produtos daquela na zona de Lisboa e arredores.
Q) O Oponente era o gerente das sociedades “L......., Lda”, “P......., Lda” e “P......., Lda.” nos anos de 2003 e seguintes.
****
Factos Não Provados:
1 – Não foi provada a concreta existência de dívidas de clientes da devedora originária nos anos de 2003 e 2004, bem como os seus valores;
2 – Não foi provada a realização de qualquer diligência por parte do Oponente, enquanto gerente da devedora originária, para tentativa de recuperação de quaisquer créditos detidos por esta sobre seus clientes;
3 – Não foi provada a data em que a relação comercial entre a “E.......” e a “L......., Lda” terminou.
4 – Não foi provada a existência de bens penhoráveis da sociedade devedora originária à data do despacho de reversão.
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Não se provaram outros factos com interesse para a decisão da causa.
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A decisão da matéria de facto fundou-se na prova documental junta aos autos e no processo executivo apenso e ainda na prova testemunhal produzida.
Em concreto os factos dados como assentes em N), O), P) e Q), resultaram também dos depoimentos prestados pelas testemunhas que, apesar de terem tido alguma envolvência na vida da sociedade devedora originária, raras vezes conseguiram indicar factos objetivos e concretizados temporalmente, resultando do seu depoimento uma permanente confusão entre o que era o papel do Oponente na gestão da devedora originária, e da “L......., Lda”, sendo notório o seu esforço permanente em quererem evidenciar que o Oponente sempre foi um gerente que pautou a sua atuação pelo cumprimento das obrigações fiscais das suas empresas, sendo por isso diligente, bem como em pretenderem demonstrar que a dívida exequenda tem como causa direta o incumprimento de clientes da devedora originária. No entanto, fizeram-no sempre sem qualquer suporte em termos de factualidade concreta.
Finalmente, os factos dados como não provados resultam de quanto aos mesmos entender o Tribunal nenhuma prova ter sido realizada.
****

Com interesse para a apreciação da excepção de extemporaneidade do recurso, aditam-se ao probatório os seguintes factos, provados como se indica:

R) Foi efectuada notificação da sentença recorrida por ofício dirigido ao Ilustre Mandatário do oponente em 04/05/2020 – págs.366 do SITAF;

S) Em 01/09/2020 foi interposto o presente recurso, acompanhado de alegações – págs. 378 do SITAF;

T) Por despacho do Mmo. juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, de 18/01/2021, foi o recurso admitido e ordenada a sua subida ao TCA – págs.416 do SITAF.

4 – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

A intempestividade do recurso jurisdicional consubstancia questão prévia na medida em que, a verificar-se, obsta ao conhecimento do objecto do recurso.

Dispunha o art.º 7.º, n.º1 da Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março (Medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença COVID-19):
«Artigo 7.º
Prazos e diligências

1 - Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, aos atos processuais e procedimentais que devam ser praticados no âmbito dos processos e procedimentos, que corram termos nos tribunais judiciais, tribunais administrativos e fiscais, Tribunal Constitucional, Tribunal de Contas e demais órgãos jurisdicionais, tribunais arbitrais, Ministério Público, julgados de paz, entidades de resolução alternativa de litígios e órgãos de execução fiscal, aplica-se o regime das férias judiciais até à cessação da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, conforme determinada pela autoridade nacional de saúde pública.
2 – (…)»

Conforme o disposto no seu art.º 11.º, tal lei entrou em vigor no dia seguinte ao da sua publicação, ou seja, em 20/03/2020.

Com a Lei n.º 4-A/2020, publicada em 06/04/2020, que veio introduzir a 1.ª alteração à Lei n.º 1-A/2020, aquele art.º 7.º passou a ter a seguinte redacção:
«Artigo 7.º
[...]
1 - Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, todos os prazos para a prática de atos processuais e procedimentais que devam ser praticados no âmbito dos processos e procedimentos que corram termos nos tribunais judiciais, tribunais administrativos e fiscais, Tribunal Constitucional, Tribunal de Contas e demais órgãos jurisdicionais, tribunais arbitrais, Ministério Público, julgados de paz, entidades de resolução alternativa de litígios e órgãos de execução fiscal ficam suspensos até à cessação da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, a decretar nos termos do número seguinte.
(…)

5 - O disposto no n.º 1 não obsta:

a) À tramitação dos processos e à prática de atos presenciais e não presenciais não urgentes quando todas as partes entendam ter condições para assegurar a sua prática através das plataformas informáticas que possibilitam a sua realização por via eletrónica ou através de meios de comunicação à distância adequados, designadamente teleconferência, videochamada ou outro equivalente;

b) A que seja proferida decisão final nos processos em relação aos quais o tribunal e demais entidades entendam não ser necessária a realização de novas diligências.

6- (…)»

A Lei n.º 16/2020, de 29 de Maio, que procedeu à 4.ª alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março, revogou o seu art.º 7.º, dispondo o art.º 10.º que «A presente lei entra em vigor no quinto dia seguinte ao da sua publicação», ou seja, em 03/06/2020.

Dispõe o art.º 282/1 do CPPT que «O prazo para a interposição de recurso é de 30 dias e conta-se a partir da notificação da decisão recorrida». E nos termos do seu n.º 4, «Se o recurso tiver por objeto a reapreciação da prova gravada, ao prazo de interposição e de resposta acrescem 10 dias».


Tendo a Lei n.º 16/2020, de 29 de Maio, que revogou o art.º 7.º da Lei n.º 1-A/2020 (suspensão dos prazos judiciais), entrado em vigor em 03/06/2020, se contados 30 dias a partir daquela data (inclusive), constata-se que o prazo terminaria em 02/07/2020.

Como o recorrente requer a apreciação da prova gravada, àquele prazo de 30 dias acrescem 10 dias, pelo que, o prazo de interposição do recurso, no caso, termina em 13/07/2020 (12 corresponde a um Domingo) – cf. artigos 281.º do CPPT e 138.º, n.ºs 1 e 2 do CPC.

As férias judiciais de Verão iniciaram-se em 16/07/2020 (corresponde a uma quinta-feira) e terminaram em 31/08/2020 (uma segunda-feira).

Tudo visto, é manifesto que assiste inteira razão ao Exmo. Senhor PGA quando conclui que o recurso foi apresentado fora de prazo.

No entanto, tratando-se de prazo processual, haverá que ter em conta o disposto no art.º 139.º do CPC, que dispõe:
«Artigo 139.º
Modalidades do prazo
1 - O prazo é dilatório ou perentório.
2 - O prazo dilatório difere para certo momento a possibilidade de realização de um ato ou o início da contagem de um outro prazo.
3 - O decurso do prazo perentório extingue o direito de praticar o ato.
4 - O ato pode, porém, ser praticado fora do prazo em caso de justo impedimento, nos termos regulados no artigo seguinte.
5 - Independentemente de justo impedimento, pode o ato ser praticado dentro dos três primeiros dias úteis subsequentes ao termo do prazo, ficando a sua validade dependente do pagamento imediato de uma multa, fixada nos seguintes termos:
a) Se o ato for praticado no 1.º dia, a multa é fixada em 10 % da taxa de justiça correspondente ao processo ou ato, com o limite máximo de 1/2 UC;
b) Se o ato for praticado no 2.º dia, a multa é fixada em 25 % da taxa de justiça correspondente ao processo ou ato, com o limite máximo de 3 UC;
c) Se o ato for praticado no 3.º dia, a multa é fixada em 40 % da taxa de justiça correspondente ao processo ou ato, com o limite máximo de 7 UC.
6 - Praticado o ato em qualquer dos três dias úteis seguintes sem ter sido paga imediatamente a multa devida, logo que a falta seja verificada, a secretaria, independentemente de despacho, notifica o interessado para pagar a multa, acrescida de uma penalização de 25 % do valor da multa, desde que se trate de ato praticado por mandatário.
7 – (…)».

Ora, constata-se que tendo o acto sido praticado e 01/09/2020, tal corresponde ao 3.º dia útil seguinte ao termo do prazo de interposição do recurso, correspondendo os 1.º e 2.º dias, a 14 e 15 de Julho e o 3.º, precisamente a 01 de Setembro (ou seja, 1.º dia útil após férias) – art.º 138/1 do CPC.

Outrossim, mostram os autos que foi emitido pela secretaria e regularizado o DUC relativo à cobrança da multa processual (inserto a pág.412 do SITAF).

Nessa medida, o acto considera-se validamente praticado, havendo que conhecer do objecto do recurso.

Vejamos então o que se nos oferece dizer sobre o tema.

O recorrente impugna a decisão de facto, pretendendo que sejam dados como provados os factos considerados “não provados”.

Foram ouvidos integralmente os depoimentos prestados pelas duas testemunhas do oponente, C....... e Z........

Porém, entendemos que não se impõe decisão de facto diferente da que foi proferida. Com efeito, C...... era escriturária da empresa L......, que estava sediada no Porto, nunca tendo trabalhado para a executada P......., sediada em Sintra, embora assegurasse a ponte na relação contabilística entre as duas empresas. Refere a testemunha que a executada P....... tinha bens, armazém com dois andares, estando instalado o escritório no 1.º andar, carrinhas de distribuição, equipamentos, como camara frigorífica, computadores, impressora…; Refere a E....... como principal fornecedor da L......., fazendo depois a executada P....... a comercialização dos produtos fornecidos. E que a quebra do contrato entre a E....... e a L....... teria ocorrido em 2003 sem aviso prévio, ficando a executada P....... sem produtos para comercializar. Diz ainda que na sequência da quebra do contrato, alguns clientes deixaram de pagar porque já não precisavam da P......., passando a comprar directamente à E........

No entanto, nada refere de concreto e assertivo. Quando lhe foi perguntado que iniciativas de cobrança foram feitas pela P....... junto dos clientes devedores, respondeu que não sabe e que em 2005 se desligou da empresa em que trabalhava.

Z......, trabalhava no gabinete de contabilidade que fazia a escrita, nomeadamente da executada P......., mas só no fim de 2014, por falecimento do Dr. M......, passou ela própria, técnica oficial de contas, a tratar directamente da contabilidade da empresa, inactiva embora, dando continuidade às obrigações fiscais, nomeadamente com a entrega da mod.22 e IES. Menciona que a executada tem activos tangíveis no valor de 12.000,00 Euros, referindo material de escritório, equipamento administrativo, camara frigorífica, e ainda créditos sobre clientes, no valor de 100.000,00 Euros. Refere também que a executada P....... tem passivo, de que constam débitos a sócios, dívidas ao Estado e dívidas a fornecedores, estas no valor aproximado de 26.000,00 Euros. Perguntado à testemunha se tinha conhecimento de diligências da AT visando a penhora de bens à sociedade executada, ou se a sociedade foi contactada para esse fim, respondeu “que saiba, não”. Perguntado sobre quais eram os clientes devedores e se foram feitas diligências de cobrança e quais, o que sabe é de “ouvir dizer”, nada adiantando de concreto.

Os depoimentos prestados não são de modo a impor a alteração da decisão de facto no sentido preconizado pelo recorrente. Se por um lado o depoimento das testemunhas é vago, nada referindo de concreto e decisivo, salienta-se a circunstância de nenhum elemento documental corroborar as suas declarações, nomeadamente no que respeita, a diligências de cobrança de créditos sobre clientes, nem a quanto ascendiam os valores em incumprimento e se tais valores eram significativos no volume global de negócios da empresa executada.

No que em particular respeita à existência de activo à data de reversão, salienta-se que C...... diz ter-se desligado da empresa L....... em 2005, o que torna o seu depoimento imprestável para factos ocorridos em época posterior. Z......, assumiu funções de TOC em finais de 2014, sendo o seu depoimento sobre a existência de bens penhoráveis da sociedade e respectivo valor assente unicamente naquilo que a contabilidade reflecte, mas nada refere que permita concluir quanto à correspondência da contabilidade com a realidade, salientando-se que o seu gabinete de contabilidade é no Porto e as instalações da executada em Sintra.

Quanto ao momento da cessação da relação comercial entre a E....... e a L......., embora a testemunha C...... refira vagamente ruptura que situa temporalmente no fim do Verão de 2003, a verdade é que não é possível afirmar unicamente com base no seu depoimento e à falta de melhor prova, o momento em que cessaram as relações comerciais entre aquelas duas empresas e que alegadamente privaram a executada P....... de prosseguir a sua actividade.

Improcede in totum a impugnação da matéria de facto, pelo que é com o probatório da sentença que temos de avançar no conhecimento das demais questões do recurso.

Alega o recorrente que a execução fiscal só pode ser revertida contra o responsável subsidiário depois de excutidos os bens do devedor originário, não resultando, porém, dos autos a comprovada impossibilidade de a Administração tributária cobrar da sociedade originária devedora a quantia revertida.

Nos termos dos artigos 23.º, nº. 2 da L.G.T., e 153º, nº. 2 do C.P.P.T., a reversão do processo de execução fiscal contra o responsável subsidiário depende de verificação da inexistência ou da fundada insuficiência de bens penhoráveis do devedor originário para pagamento da dívida exequenda e acrescido.

Incumbe à Administração tributária demonstrar que não existiam, à data da reversão, bens penhoráveis do devedor originário ou, existindo, que eles eram fundadamente insuficientes para solver a dívida.

Precedendo a reversão e como consta da alínea J) da matéria assente, foi prestada informação executiva de que “a executada cessou actividade em IVA em 31/12/2007 (…); não se encontra no local indicado como sede (…); não tendo sido localizados bens penhoráveis nesse espaço, conforme auto de diligências lavrado pelo funcionário do serviço externo (…); consultados os sistemas informáticos da DGCI não se localizaram quaisquer bens penhoráveis”.

Essa informação do processo é suficiente para satisfazer a exigida demonstração da inexistência/ insuficiência de bens penhoráveis e tendo sido prestada antes do projecto de reversão, ao revertido cabia, em audição prévia, infirmar os respectivos pressupostos, sugerindo à AT as pertinentes diligências de apreensão de bens da devedora originária.

Ora, a verdade é que os autos e apenso de execução não revelam terem sido indicados à AT bens penhoráveis da devedora originária, nem sugeridas diligências de apreensão.

O revertido, em sede oposição, insiste na suficiência de bens da sociedade devedora originária. Mas não é isso que sobressai da matéria assente. De facto, sendo certo que as testemunhas referem a existência de bens tangíveis e créditos sobre clientes, o depoimento de C...... não convence dado que a própria refere que se afastou da L....... em 2005 e do que aqui se trata é de apurar se existiam bens à época das diligências de penhora, cujo auto a fls.58 do apenso, tem data de 30/04/2010. Também não resulta convincente o depoimento de Z......, a TOC que passou a dar continuidade às obrigações contabilísticas e fiscais da sociedade executada em finais de 2014, na medida em que no seu depoimento não identificou quaisquer clientes devedores, não se ficando a saber se ainda operavam no mercado e em condições de solvabilidade, o mesmo é dizer de cobrabilidade. No que respeita aos bens tangíveis, o que esta testemunha diz é o que a contabilidade revela a sociedade ter no seu activo, mas se tais bens à época existiam de facto, se encontravam no local da sede e em condições funcionais ou de obsolescência, nada disse.

Improcede o alegado vício substantivo da reversão por indemonstrada inexistência/ insuficiência de bens da sociedade devedora originária.

Prosseguindo, a questão que subsiste por apreciar reconduz-se a indagar se o revertido oponente logrou fazer prova de que a falta de pagamento do imposto exequendo não lhe é imputável, não se questionando a sua gerência no período de pagamento da dívida, reportada a IVA do período de 0312T (cf. alínea C) da matéria assente).

Aplica-se o regime de responsabilidade subsidiária previsto na Lei Geral Tributária, cujo art.º 24.º, n.º 1, dispõe:

«1 - Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entes fiscalmente equiparados são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si:
a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período de exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando, em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento».

Como a jurisprudência do STA e dos TCAS o tem vindo a salientar em inúmeros arestos (cf. Acórdão do STA, de 10/16/2013, tirado no proc.º 0458/13), de acordo com as regras de repartição do ónus da prova aplicáveis às distintas situações daquelas previsões legais (i) incumbe em qualquer dos casos à AT comprovar a alegação de exercício efectivo do cargo e a culpa do revertido na insuficiência do património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado para a satisfação da dívida tributária, quando esta se tenha constituído no período de exercício do cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado após aquele exercício (al. a) do nº 1 do art. 24º da LGT); (ii) incumbe ao revertido comprovar que não lhe é imputável a falta de pagamento pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período de exercício do cargo (al. b) do nº 1 do art. 24º da LGT).

Tendo-se a reversão concretizado nos termos da alínea b) do art.º 24.º da LGT (cf. fls.64 do apenso de execução), cabia ao revertido ilidir a presunção legal de culpa na falta de pagamento do imposto exequendo, demonstrando que essa falta de pagamento não lhe é imputável. Se tal prova não tiver sido feita, ou se subsistirem dúvidas quanto à não imputabilidade da falta de pagamento do imposto, a oposição não poderá proceder.

O acto ilícito culposo que se presume praticado pelo gestor não se fica pela omissão de pagamento do imposto vencido. O que se presume é que o gestor não actuou com a diligência de um “bonus pater familiae”, com a observância das disposições legais aplicáveis aos gestores, em especial a do art.º 64.º do Código das Sociedades Comerciais, que lhe impõe a observância de deveres de cuidado, de disponibilidade, de competência técnica, de gestão criteriosa e ordenada, de lealdade, no interesse da sociedade e dos sócios, que sejam relevantes para a sustentabilidade da sociedade – cf., entre muitos, o Acórdão do TCA Norte, de 23/11/2011, proferido no proc.º 00972/09.0 BEVIS.

Apesar da dificuldade que existe na prova de um facto negativo, como é o caso da ausência de culpa, a oponente, aqui recorrida, não podia deixar de alegar e provar factos concretos de onde se possa inferir que a insuficiência patrimonial da empresa se deveu a circunstâncias que são alheias à revertida e que não lhe podem ser imputadas. Para afastar a responsabilidade subsidiária por dívidas de impostos cujo prazo de pagamento terminou durante a gestão, o gestor tem, pois, que demonstrar que a devedora originária não tinha fundos para pagar os impostos e que a falta de meios financeiros não se deveu a qualquer conduta que lhe possa ser censurável.

Realmente, o normativo que subjaz à nossa análise faz recair sobre o gestor o ónus da prova de que não lhe é imputável a falta de pagamento ou de entrega da prestação tributária, pois tal imputabilidade presume-se. Note-se que, embora esta alínea b) se refira meramente a imputação, e não a culpa, a jurisprudência tem vindo a interpretá-la reiteradamente no sentido de que é sempre exigível a culpa do gestor, entendida esta como a inobservância ou violação de uma regra de conduta previamente estabelecida.

Assim, demonstrada que seja a falta de pagamento ou de entrega da dívida tributária por parte da sociedade originária devedora, recairá sobre o gestor o ónus da prova da falta de culpa por tal facto, sendo certo que a lei impõe a quem exerça funções de administração em pessoas colectivas ou entes fiscalmente equiparados «o cumprimento dos deveres tributários das entidades por si representadas» (art.º 32.º da LGT).

Feitos os considerandos pertinentes e descendo aos autos, não constam do probatório quaisquer factos que permitam concluir que a ausência de meios conducente à falta de pagamento ou entrega do imposto se ficou a dever a factores externos e fortuitos, nomeadamente, à alegada quebra repentina do contrato de fornecimento entre a E....... e a L....... e que o gestor, nas circunstâncias concretas, fez o exigível para prevenir o incumprimento e acautelar o interesse dos credores sociais.

Ou seja, os factos constantes do probatório não são de modo a poder afirmar-se que a actuação do oponente à frente dos destinos sociais em nada contribuiu para a situação de falta de meios da devedora originária para solver os créditos, nomeadamente os fiscais.

O oponente não logrou, por conseguinte, demonstrar que a sociedade não tinha meios para pagar a dívida exequenda e que essa situação de falta de meios não lhe é culposamente imputável, ou seja, não ilidiu a presunção de imputabilidade consignada na alínea b) do n.º 1 do art.º 24.º da LGT, tornando-se responsável pelas dívidas tributárias da sociedade devedora originária e parte legítima na execução.

É, pois, de confirmar a sentença recorrida que no mesmo sentido decidiu, e negar provimento ao recurso.

5 - DECISÃO

Por todo o exposto, acordam em conferência os juízes da 2.ª Subsecção do Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Condena-se o Recorrente em custas, em ambas as instâncias.

Lisboa, 09 de Junho de 2021

[O Relator consigna e atesta, que nos termos do disposto no artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo artigo 3.º do DL n.º 20/2020, de 01.05, têm voto de conformidade com o presente Acórdão os restantes Juízes–Desembargadores integrantes da formação de julgamento, Luísa Soares e CRISTINA FLORA].

Vital Lopes