Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06392/02
Secção:CT - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:06/01/2011
Relator:JOSÉ CORREIA
Descritores:IRC-INDEMNIZAÇÃO POR BENFEITORIAS AO ANTERIOR LOCATÁRIO
AMORTIZAÇÃO-MAIS VALIAS E MENOS VALIAS
VALOR DE AQUISIÇÃO-CLIPS-BENEFÍCIO FISCAL TEMPORÁRIO
Sumário:I.- Em regra, deve ter-se por documento válido em forma legal o que obedeça aos requisitos do artº 35º do CIVA.

II.- E, de acordo com o disposto no artº 23º nº l do CIRC , devem-se consideram custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora. De sorte que os custos terão de ser comprovados por documentos válidos ou por outro meio admissível.

III.- Mas na eventualidade de se provar que a recorrente efectuou o pagamento de serviços efectivamente realizados e indispensáveis para a obtenção de proveitos, tem de aceitar-se que os respectivos custos não estão documentados por aquelas facturas, mas sim provados por outro meio admissível, nomeadamente através da prova testemunhal.

IV. Não são considerados custos fiscais para efeitos do disposto no artº 23º do CIRC, as despesas efectuadas pelo recorrente com o pagamento de benfeitorias aos anteriores locatários de locais que este tomou de arrendamento com a finalidade de que estes cessassem os seus contratos de arrendamento, uma vez que as mesmas não são indispensáveis para a obtenção de proveitos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.

V. Tendo o recorrente cedido a sua posição contratual em contratos de arrendamento, não pode ser considerado como valor de aquisição para efeito de mais valias, aquele que inclua benfeitorias pagas pelo cessionário aos anteriores locatários a fim de estes cessarem os seus contratos de arrendamento com o locador e este celebrar contrato com o mesmo cessionário, porque não constituem despesas impostas por lei ao novo locatário e não são indispensáveis para a obtenção de proveitos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.

VI. Atento o disposto no artº 2º do DL nº 143-A/89, de 3 de Maio, só contam para efeitos de IRS e IRC 80% dos rendimentos da dívida pública interna emitida, sendo, neste caso, de considerar a data da autorização da emissão da dívida pública, irrelevando a data da emissão dos títulos ou certificados.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acorda-se, em conferência, no 1º Juízo –Liquidatário - da Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo:

I. - RELATÓRIO

BANCO A...PORTUGAL, S.A. (anteriormente A...– A..., SA), com os sinais identificadores dos autos, veio recorrer da decisão do Mmº Juiz do (então) Tribunal Tributário de 1ª Instância do Porto que julgou improcedente a impugnação por si deduzida contra a liquidação adicional do IRC do exercício do ano de 1992, no montante de 1.337.281$00, apresentando, para o efeito, alegações nas quais conclui:
“A) O valor de IRC a pagar fixado na liquidação impugnada compreendia não só o apuramento de colecta sobre o valor da matéria colectável corrigida, como ainda a liquidação de imposto sobre despesas confidenciais no montante de 54.777,700$ resultante da aplicação ao valor de correcções à matéria colectável respeitantes a determinados custos indevidamente documentados, no montante de 547.777.000$, da taxa de tributação autónoma de 10% nos termos do artigo 4° do Decreto-Lei n° 192/90, de 9 de Junho;
B) A revogação parcial do acto operada pelo Director Distrital de Finanças do Porto ao abrigo do artigo 130° do CPT, não anulou, por completo, a totalidade das correcções acima referidas.
C) Foram apenas objecto de anulação em resultado daquele acto administrativo parte das correcções à matéria colectável, no montante de 38.449.000$, por se entender respeitarem as mesmas a custos fiscalmente dedutíveis, e o imposto sobre despesas confidenciais inicialmente liquidado sobre as mesmas, por se entender que, não obstante continuarem a configurar, em substância, custos não dedutíveis na determinação do lucro tributável, os mesmos se encontravam devidamente documentados;
D) Tendo sido mantidas pelo Director de Finanças, subsistiram assim como objecto da impugnação, não obstante a anulação da tributação autónoma sobre elas incidente, correcções à matéria colectável no montante de 509.328.000$ resultantes da não aceitação, como custo fiscal, de custos com amortizações praticadas sobre determinadas despesas consideradas como trespasses e da não aceitação, como custo fiscal, das amortizações de despesas contabilizadas na rubrica "despesas com edifícios arrendados";
E) Pelo que ao omitir, sem qualquer razão justificativa, a decisão quanto à ilegalidade destas correcções incorre a sentença recorrida em manifesta nulidade por omissão de pronúncia;
F) O recorrente alienou à B..., em 1992, os direitos de arrendamento que detinha sobre vários imóveis onde se encontravam instaladas as suas agências bancárias, a par dos activos (obras de beneficiação) neles incorporados;
G) Em resultado daquela transmissão o recorrente reconheceu uma mais-valia fiscal de 879.463.059$ correspondente à diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição dos activos transmitidos, compreendendo este o valor das benfeitorias igualmente transmitidas;
H) Conforme dispõe o artigo 42°, n° 2, do Código do IRC (actual artigo 43°, n° 2), as mais e menos -valias fiscais são dadas pela diferença entre o valor de realização, líquido dos encargos que lhe sejam inerentes, e o valor de aquisição deduzido das reintegrações ou amortizações praticadas;
I)Ao corrigir o valor das mais e menos -valias fiscais apuradas pelo recorrente com fundamento em que o custo de aquisição das benfeitorias realizadas nos locados cedidos não deve concorrer para a determinação do valor de aquisição, viola a sentença recorrida o citado artigo 42° do CIRC.
J) Ao desconsiderar, por último, o benefício de dedução à matéria colectável de 20% dos rendimentos de CLIP's cujos leilões se realizaram após 2/02/91, mas emitidos em data anterior, viola ainda a sentença recorrida o disposto no artigo 2° do Decreto-Lei n° 143-A/89, de 3 de Maio.
Por todo o exposto, e o mais que o ilustrado juízo desse Venerando Tribunal suprirá, deve o presente recurso ser julgado procedente, anulando-se a douta sentença recorrida, assim se cumprindo com o DIREITO e a JUSTIÇA.
O EMMP emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso (v. fls. 364).
Satisfeitos os vistos legais, cumpre decidir.
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2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1 DOS FACTOS

Com interesse para a decisão foram dados como provados em 1ª instância os seguintes factos:
1º) - O Banco impugnante foi objecto de fiscalização por parte da Direcção de Serviços de Fiscalização de Empresas (DSPIT), relativamente ao exercício de 1992; em consequência, foram efectuadas diversas correcções ao resultado apurado na declaração modelo 22 de IRC apresentada pelo impugnante, com referência àquele ano;
-tais correcções encontram-se resumidas no mapa modelo DC-22, cujo teor aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos;
-dessas correcções resultou o apuramento da matéria colectável de Esc. 2.442.952.941 $00;
2-Em consequência daquela correcção à matéria colectável, o impugnante passou a apresentar uma colecta de 879.463.059$00, de que resultou IRC a pagar de 1.337.281.560$00, bem como derrama no valor de 87.946.306$00;
3º) -Entre outros fundamentos de tais correcções, ressalta, na parte que ora interessa, o seguinte:
-correcção das mais-valias fiscais no montante de 1.984.596.000$00 decorrente da não aceitação como componente do valor de aquisição dos activos alienados, dos encargos suportados pelo banco com a adaptação dos espaços por este arrendados para o exercício da sua actividade;
-não consideração do benefício fiscal, contido no DL n° 143-A/89, de 03 de Maio, de dedução à matéria colectável de 20 % dos rendimentos de CLIPs emitidos após 02/02/91, no valor de 251.474.000$00;
4º) -O impugnante efectuou já o pagamento por conta de parte do imposto liquidado o montante de 337.415.316$00, correspondendo 263.895.901$00 a imposto e 73.519.415$00 a juros compensatórios;
5º) -O Banco impugnante, por volta de 1990, propôs-se aumentar (quadriplicar) o número de balcões;
6º) -A concretização dessa medida teve lugar por volta de 1991;
-para isso comprava ou tomava de arrendamento imóveis distribuídos por todo o país, com maior incidência na grande Lisboa e no grande Porto;
7º) -A este Banco o que interessava era o espaço em si;
-a realização das obras de adaptação esteve a cargo de vários empreiteiros, mormente, a "C...";
8º) -O Banco impugnante celebrou diversos contratos de cessão onerosa do direito ao arrendamento e autorização de subarrendamento e fiança com a sociedade "B... -Imobiliária, SA" -cfr. o teor das escrituras públicas juntas a fls. 106 e segs., que aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos-
9º) -O impugnante considerou estas operações que efectuou com a "B... -Imobiliária, SA" como venda de activos, e procedeu ao seu registo como tal;
10º) -O aqui peticionante considerou na base de cálculo do benefício dedução ao rendimento, o saldo da conta A-807 200 004-66 (Juros) que apresentava o montante de Esc. 1.257.369.000$00, correspondente aos juros dos CLIPs auferidos no exercício de 1992, e emitidos após 02/02/91.
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Ao Abrigo do artº712º do CPC e em ordem ao conhecimento da questão legalidade da correcção relativa à não-aceitação como custo fiscal, das amortizações de despesas contabilizadas na rubrica "despesas com edifícios arrendados" suportada com facturas emitidas pela C..., no montante de €811.599,05, cujo conhecimento foi omitido na sentença recorrida e no acórdão anulado pelo STA, adita-se ao probatório a seguinte factualidade:
11º) A correcção relativa à não-aceitação como custo fiscal, das amortizações de despesas contabilizadas na rubrica "despesas com edifícios arrendados" suportada com facturas emitidas pela C..., no montante de €811.599,05, foi justificada com a seguinte fundamentação:
“19. No que respeita à correcção de Esc. 162 711 000$00 referida na alínea b) do ponto 6 da reclamação graciosa e inscrita na Linha 5 do Quadro 18 do Mapa de Apuramento Modelo DC-22, resultou a mesma da não aceitação como custo fiscal do exercício de amortizações praticadas à taxa de 33,33% referentes a despesas contabilizadas nos exercícios de 1988, 1990 e 1991 na rubrica " despesas com edifícios arrendados", pelo montante de Esc. 504 795 000$00 - a factura da C... de 1988 contabilizada pelo valor de Esc 19 543 000$00 foi reintegrada à taxa de 5% -.
20. Não obedecendo os documentos de suporte das despesas acima referidas - facturas emitidas pela C... - Empresa de Construção e Obras Públicas de Arnaldo de Oliveira, Lda, relacionadas no anexo n.° l fls. l a'5 -, aos requisitos legais exigidos pelo n.° 5 do artigo 35° do Código do I V A, nomeadamente por não se encontrarem numeradas, não foram as amortizações das mesmas despesas aceites como custo fiscal por infringirem o disposto na alínea h) do n.° l do artigo 41° do Código do IRC.
21. Relativamente a esta correcção, entendeu a DSPIT que estando as prestações de serviços efectuadas pela C... - trabalhos vários de electricidade e construção civil - sujeitas a I VA nos termos do artigo 4° do Código do IV A, deveria a emissão das respectivas facturas obedecer aos requisitos do artigo 35° n.° 5 do mesmo código.
22. Deste modo, entenderam estes serviços de fiscalização que não preenchendo as facturas de suporte das despesas objecto de amortização esses requisitos, nomeadamente por não se encontrarem numeradas e, como tal, indevidamente documentadas, não seria de aceitar a correspondente amortização como custo fiscal nos termos do disposto na alínea h) do n.° l do artigo 41° do CIRC.”-cfr. fls. 289 dos autos da decisão da reclamação.
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2.2.- DO DIREITO
Atentas aquelas conclusões e a factualidade fixada e que se reputa a relevante, vejamos qual a sorte do recurso em que o recorrente imputa à decisão recorrida os seguintes vícios:
a) Nulidade da sentença por omissão de pronúncia (conclusões das alíneas A) a E);
b) Erro de julgamento por interpretação errada dos artºs 42º e 43º do CIRC (conclusões das alíneas F) a I));
c) Erro de julgamento por errada interpretação do artº 2º do DL nº 143-A/89, de 3 de Maio (conclusão da alínea J)).
Assim:
Quanto à nulidade da sentença por omissão de pronúncia:
Esta questão já foi colocada ao STA por via do recurso interposto pelo impugnante que foi julgado procedente por se verificar a pretendida omissão de pronúncia consistente na falta de decisão quanto à legalidade da correcção relativa à não-aceitação como custo fiscal, das amortizações de despesas contabilizadas na rubrica "despesas com edifícios arrendados" suportada com facturas emitidas pela C..., no montante de €811.599,05.
Como se assinala no aresto do STA são estas correcções que, somadas com as relativas a amortizações praticadas sobre despesas consideradas como trespasses, perfazem o valor de 509.328.000$00, sendo de 346.617.000$ as relativas a trespasses e de 162.711.000$ as relativas a "edifícios arrendados", como é explicitado claramente nos números 17 a 27 das alegações de recurso para este Tribunal Central Administrativo (fls. 392 a 394 os autos).
Ora, sendo as conclusões do recurso que delimitam o objecto deste, constata-se que a conclusão D) das alegações de recurso sub judice compreende tanto as correcções relativas às amortizações de despesas consideradas como trespasses como as relativas às amortizações de despesas contabilizadas na rubrica "despesas com edifícios arrendados ".
Como se determinou no Acórdão do STA, o recorrente refere as amortizações praticadas sobre despesas consideradas como trespasses, que a sentença não tratou, com isto o Mº Juiz deixando de apreciar questão a cujo conhecimento estava vinculado, porque expressamente identificada na petição e que não estava prejudicada pela solução dada a outra, pois que as correcções eram autónomas entre si e tinham fundamentos diversos, o que fere a sentença proferida de nulidade por omissão de pronúncia (artigos 125°, n°1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 668°,n°1, alínea d) e 660° n°2 do Código de Processo Civil).
Todavia, o douto acórdão do STA também salienta que o Acórdão do Tribunal Central Administrativo objecto de recurso (a fls. 497 a 509 dos autos), considerou não haver, quanto àquelas questões, omissão de pronúncia, mas erro de julgamento (cfr. acórdão recorrido a fls. 500 a 502 dos autos), e, entendendo que o Tribunal está obrigado a conhecer da questão enunciada em face do disposto no art. 753 ° do CPC, conheceu-a como questão de mérito.
Sucede, contudo, que da passagem da omissão de pronúncia para o conhecimento do mérito, reduziu a uma só as duas correcções objecto de recurso, passando a designar como "correcções relativas a edifícios arrendados" as que o recorrente designara como amortizações praticadas sobre despesas consideradas como trespasses, e apenas delas, e não das outras, tratou, como se conclui claramente da leitura do Acórdão recorrido, a fls. 502 a 504 dos autos, e se confirma, se tal fosse necessário, atendendo ao que se escreveu no n.°1 do respectivo sumário entretanto disponibilizado na Internet, onde se ê: «1. Não são considerados custos fiscais para efeitos do disposto no art° 23° do CIRC, as despesas efectuadas pelo recorrente com o pagamento de benfeitorias aos anteriores locatários de locais que este tomou de arrendamento com a finalidade de que estes cessassem os seus contratos de arrendamento, uma vez que as mesmas não são indispensáveis para a obtenção de proveitos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora».
Com isto, conclui-se no douto aresto do STA, o Tribunal Central Administrativo deixou de apreciar questão a cujo conhecimento estava vinculado, porque expressamente identificada nas conclusões das alegações de recurso, e que não estava prejudicada pela solução dada a outra, pois que as correcções eram autónomas entre si e tinham fundamentos diversos, o que fere o Acórdão proferido de nulidade por omissão de pronúncia (artigos 125.°, n°1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário e 668.°,n.°1, alínea d) e 660.° n.° 2 do Código de Processo Civil).
Assim sendo, a sentença recorrida não pode manter-se e, consequentemente, passa a conhecer-se do mérito do recurso interposto pela impugnante.
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Em acatamento da ordem contida no douto acórdão do STA exarado a fls. 597 e ss, como vimos, o Tribunal Supremo entende-se, definitivamente, que se verifica na sentença recorrida o vício de omissão de pronúncia no que respeita à correcção relativa a despesas contabilizadas na rubrica "despesas com edifícios arrendados", tituladas por facturas emitidas pela C..., pois o Tribunal "a quo", sem qualquer razão justificativa, nada disse quanto à legalidade da correcção relativa à não aceitação como custo fiscal, com fundamento na alegada não documentação nos termos do disposto no artigo 35. °, n. ° 5, do Código do IVA, das amortizações de despesas contabilizadas na rubrica "despesas com edifícios arrendados" suportada com facturas emitidas pela C..., no montante de €811.599,05 (Pte. 162.711.000$00), havendo, pois, que declarar nula a sentença nessa parte com fundamento em nulidade por omissão de pronúncia, prevista no artigo 125° do CPPT e dela conhecer em substituição.
Nesse sentido, foram ouvidas as partes sobre o mérito da questão omitida nos termos do n° 3 do art°715° do CPC, i. é, sobre a legalidade da correcção relativa a despesas contabilizadas na rubrica "despesas com edifícios arrendados tituladas por facturas emitidas pela C..., a ERFP veio dizer que reiterava toda a argumentação aduzida pela DSPIT para fundamentar a controvertida correcção, concluindo-se pela estrita legalidade do acto judicialmente impugnado, tal como, aliás, se preconizou em sede de indeferimento da reclamação graciosa constante dos autos de impugnação judicial. Adicionalmente, ainda referiu que, reportando-se as prestações de serviços efectuadas pela C... a trabalhos vários de electricidade e construção civil sujeitas a IVA, a violação do princípio do dever de documentação de todas as despesas, nomeadamente sob a forma da invocada falta de preenchimento dos requisitos legais fundamentadores da sua justificação (e realização), legitimam as realizadas correcções.
Por todas estas razões entende que só procedendo desse modo poderia a AF delimitar rigorosamente os custos não legitimados por documentos de suporte carecidos de forma legal válida e, consequentemente, que deve ser negado provimento ao recurso nessa parte.
Argumentação secundada pela EPGA para o efeito também ouvida.
Quid juris?
Esta questão, embora com referência ao exercício de 1991, foi já tratada no Acórdão deste TCA de 23/03/2004, tirado no Recurso nº 17103/02 e relatado pelo relator desta formação.
Aí se expendeu, em situação com plena similitude com a presente, o que se transcreve, já adaptado ao caso concreto:
Todavia, o Tribunal a quo veio a dar como provado que as despesas em questão não se podem qualificar como trespasses — fundamento adoptado pela Administração Fiscal —, não obstante haja admitido que tais despesas possibilitavam ao banco desimpedir o local que pretende arrendar, acabando por concluir que a questionada correcção se deve manter por não ter sido demonstrada a indispensabilidade do custo para a obtenção dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora.
O recorrente reconhece que não foi demonstrada essa indispensabilidade porque a tanto não estava obrigado, como também não tinha que demonstrar que cumpriu o princípio da especialização dos exercícios previsto no art. 18.° do CIRC, ou que a amortização em questão obedeceu à taxa legalmente fixada para o efeito, isso tudo porque, tal como a indispensabilidade do custo também, não eram os fundamentos em que se baseava a correcção em apreço que se pretendia ver anulada.
Ora, a AF, no exercício da sua competência fiscalizadora da conformidade da actuação dos contribuintes com a lei (artº.107° do CIRC) actua no uso de poderes vinculados, submetida ao princípio da legalidade, cabe-lhe o ónus de prova da verificação dos pressupostos que a determinaram a efectuar as correcções técnicas, cumprindo-lhe demonstrar a factualidade que a leva a desconsiderar determinada verba como custo ou proveito.
Só essa materialidade (insusceptibilidade de as despesas em causa serem amortizadas uma vez que constituíam trespasses e de serem consideradas custo fiscal por se encontrarem indevidamente documentadas) tem de ser apta a abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte (atento o princípio da declaração e da veracidade da escrita vigente no nosso direito - art. 78° do CPT), só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova de que, «in casu», as despesas em questão não constituíam um trespasse mas uma indemnização por benfeitorias e que aquelas se encontravam devidamente documentadas.
Cabe, no entanto, referir que a regularidade formal da escrita apenas constitui presunção da sua veracidade e que esta presunção de veracidade das declarações dos contribuintes só é estendida aos seus elementos de apoio (art. 78° do CPT) se estes estiverem organizados de acordo com a lei comercial e fiscal e com as regras de normalização contabilística e se aqueles mesmos elementos de apoio permitirem o apuramento e controlo da matéria tributável efectivamente obtida reflectindo correctamente o lucro líquido do exercício e as operações realizadas. Significa isto que, a verificarem-se erros ou omissões, ficará destruída a credibilidade dos próprios elementos da escrita a que digam respeito e a credibilidade da própria escrita.
Assim, visto que a presunção de veracidade de uma contabilidade formalmente bem elaborada, estabelecida no artº 78° do CPT, cede perante a inveracidade dos elementos contabilizados, impõe-se concluir que não basta que a contabilidade esteja formalmente organizada nos termos da lei, designadamente.
Como expende Vieira de Andrade, «A Justiça Administrativa» (Lições), 2ª edição, pág. 269, «há-de caber, em princípio, à Administração o ónus de prova da verificação dos pressupostos legais (vinculativos) da sua actuação, designadamente se agressiva (positiva e desfavorável); em contrapartida, caberá ao administrado apresentar prova bastante da ilegitimidade do acto, quando se mostrem verificados estes pressupostos»; e, como refere o Cons. Jorge de Sousa, (Código de Procedimento e Processo Tributário Anotado, 2ª edição, pág. 470), «o ónus de prova dos factos constitutivos dos direitos da administração tributária ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque. Embora esta regra (art. 74°/1 LGT) esteja prevista para o procedimento tributário, o seu conteúdo deve ser transposto para o processo judicial que se lhe seguir, por forma a que quem tinha o ónus da prova no procedimento tributário tenha o respectivo ónus no processo judicial tributário ...».
Ora, a matéria vertida no probatório diz-nos que, o Banco impugnante, por volta de 1990, propôs-se aumentar (quadriplicar) o número de balcões e a concretização dessa medida teve lugar por volta de 1991. Para isso comprava ou tomava de arrendamento imóveis distribuídos por todo o país, com maior incidência na grande Lisboa e no grande Porto, sendo que o que interessava ao Banco era o espaço em si, tendo a realização das obras de adaptação esteve a cargo de vários empreiteiros, mormente, a "C...".
Ora, a AT procedeu à correcção relativa à não-aceitação como custo fiscal, das amortizações de despesas contabilizadas na rubrica "despesas com edifícios arrendados" suportada com facturas emitidas pela C..., no montante de €811.599,05, para oq eu fundamentou que “No que respeita à correcção de Esc. 162 711 000$00 referida na alínea b) do ponto 6 da reclamação graciosa e inscrita na Linha 5 do Quadro 18 do Mapa de Apuramento Modelo DC-22, resultou a mesma da não aceitação como custo fiscal do exercício de amortizações praticadas à taxa de 33,33% referentes a despesas contabilizadas nos exercícios de 1988, 1990 e 1991 na rubrica "despesas com edifícios arrendados", pelo montante de Esc. 504 795 000$00 - a factura da C... de 1988 contabilizada pelo valor de Esc 19 543 000$00 foi reintegrada à taxa de 5% -“ aduzindo ainda que “Não obedecendo os documentos de suporte das despesas acima referidas - facturas emitidas pela C... - Empresa de Construção e Obras Públicas de Arnaldo de Oliveira, Lda, relacionadas no anexo n.°1 fls. 1 a 5 -, aos requisitos legais exigidos pelo n.° 5 do artigo 35° do Código do IVA, nomeadamente por não se encontrarem numeradas, não foram as amortizações das mesmas despesas aceites como custo fiscal por infringirem o disposto na alínea h) do n.°1 do artigo 41° do Código do IRC” e isso porque “Relativamente a esta correcção, entendeu a DSPIT que estando as prestações de serviços efectuadas pela C... - trabalhos vários de electricidade e construção civil - sujeitas a IVA nos termos do artigo 4° do Código do IVA, deveria a emissão das respectivas facturas obedecer aos requisitos do artigo 35° n.° 5 do mesmo código.
22. Deste modo, entenderam estes serviços de fiscalização que não preenchendo as facturas de suporte das despesas objecto de amortização esses requisitos, nomeadamente por não se encontrarem numeradas e, como tal, indevidamente documentadas, não seria de aceitar a correspondente amortização como custo fiscal nos termos do disposto na alínea h) do n.° l do artigo 41° do CIRC.”
Neste ponto, há que salientar que a própria AT admite que os valores a que se reportam as facturas de C... estão documentados.
Contudo, no que concerne à amortização de 33,33%, referente ao valor das mesmas, a Administração Fiscal não aceita aquele como custo fiscal de acordo com a al. h) do n° l do art° 41° do CIRC por não estar devidamente documentado, dado que as facturas nomeadamente não se encontravam numeradas.
A Administração não questiona que os serviços a que as mesmas se reportam tenham sido prestados, nem a realidade dos valores constantes daquelas. Apenas porque não apresentam numeração entende que os custos inerentes não estão devidamente comprovados.
Porém, na fase prevista no art° 130° do CPT o acto tributário é parcialmente anulado no que concerne à liquidação da tributação autónoma sobre o referido valor, por se ter considerado que aqueles montantes estão devidamente comprovados.
Sobre a al. h) do n° l do art° 41° do CIRC diz-se no CIRC Anotado de F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, 4a Edição, pág. 346, nota n° 2.9 ao art° 41°: «Encargos não documentados e despesas de caracter confidencial. Trata-se de uma medida destinada a evitar os abusos por parte da administração das empresas a fim de reduzirem a despesa fiscal. Além disso, esta medida insere-se no princípio da clareza que toda a contabilidade deve evidenciar, procurando-se com ela tentar exercer uma certa fiscalização.».
Estabelece o art° 23° n° l do CIRC que: «Consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora, (...)".
Verifica-se assim que aquele preceito estabelece uma relação de nexo de causalidade entre os custos por um lado, e a realização dos proveitos sujeitos a imposto ou a manutenção da fonte produtora por outro.
A propósito refere-se no CIRC Anotado de F. Pinto Fernandes e Nuno Pinto Fernandes, 4a Edição, 1994, pág. 214: «Os custos ou perdas da empresa são os elementos negativos da conta de resultados, os quais são dedutíveis do ponto de vista fiscal quando, devidamente comprovados, forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou para a manutenção da fonte produtora. Abandonou-se o critério da razoabilidade que constituía um poder discricionário, da administração no regime anterior e que foi fonte de muitas injustiças e arbitrariedades, concorrendo para o cima de desconfiança entre o contribuinte e o Fisco. Hoje serão, assim, considerados todos os custos desde que devidamente documentados. A título exemplificativo indicam-se, nas diversas alíneas do n° l, os custos que ocorrem dentro de uma normalidade e com mais frequência. São dois os requisitos indispensáveis para que os custos sejam aceites para efeitos do imposto - que sejam comprovados com documentos emitidos nos termos legais e que sejam indispensáveis para a realização dos proveitos. A ausência de qualquer destes requisitos implica a sua não consideração, pelo que as respectivas importâncias deverão ser adicionadas ao resultado contabilístico."
Ora, no caso sub judice a Administração fiscal em momento algum põe em questão a necessidade de realização dos custos contabilizados com base nas facturas emitidas pela C... como necessários à manutenção da fonte produtora, e acaba por reconhecer que os mesmos estão devidamente documentados.
O facto da factura não preencher os requisitos do art° 35° n° 5 do CIVA, nomeadamente não conter uma numeração, terá apenas os efeitos subsequentes para efeitos de IVA, não podendo daí resultar, que se considere os custos inerente como não estando documentados.
Sobre esta questão veja-se o Acórdão do STA de 8/7/99, Rec. n° 23535: «Os requisitos das facturas, constantes do art° 35°, n° 5, do CIVA, não são exigências de validade formal das facturas para efeitos de IRC, mas apenas para efeitos de dedução do IVA nos termos do art° 19°, n° 2, do CIVA.»
Sobre a amortização dos custos referentes a obras em edifício arrendado por instituição de crédito, veja-se Acórdãos do STA de 24/10/01 e 28/11/01 em Rec. n° 26013 e 20197, respectivamente.
São despesas confidenciais as que não especificam a sua natureza, origem e finalidade.
Tais despesas são, por natureza, indocumentadas.
Não é confidencial a despesa, titulada por documento, do qual constam as identidades do vendedor e do adquirente e a designação do bem transmitido e respectivo preço.
Esta despesa não é susceptível de tributação autónoma nos termos do artº nº 4 do D.L. 192/90, de 9/6.
Na senda da jurisprudência e doutrina mais autorizadas sobre a matéria e que se acolhe também no Ac. S.T.A. de 23/3/94, rec. 17812 (Ap. D.R. 28/11/96, pg. 1145) despesas confidenciais são as que "como a sua própria designação indica, não são especificadas, ou identificadas, quanto à sua natureza, origem e finalidade".
Como ensina Vítor Faveiro (Noções Fundamentais de Direito Fiscal Português, Vol. II, pag. 602, nota 1) são despesas que, pela sua própria natureza, não são documentadas, ou, em equivalência de sentido são aquelas que não têm suporte documental (v. F. Pinto Fernandes e N. Pinto Fernandes, in CIRC, Anot. e Coment., 1996, pag. 347).
Todavia e como se salienta no Ac. S.T.A. de 5/7/2000, rec. 24632, as expressões despesas confidenciais e despesas não documentadas têm "um alcance equivalente".
Ora, como se disse já, as despesas em causa são relativas à amortização de 33,33% e a Administração Fiscal não aceita aquele como custo fiscal de acordo com a al. h) do n° l do art° 41° do CIRC por não estar devidamente documentado, dado que as facturas não têm numeração.
Visto que a AF, como se alcança do relatório e se levou ao probatório ampliado, nem sequer questiona que os serviços a que as mesmas se reportam tenham sido prestados, nem a realidade dos valores constantes daquelas e só porque as facturas não apresentam numeração entende que os custos inerentes não estão devidamente comprovados, impõe-se-nos concluir que as nomeadas despesas se encontram documentadas, ainda que e porventura a assinalada irregularidade tenham reflexos em sede de IVA, por se surpreender a sua natureza, origem e finalidade que não estamos perante despesas confidenciais ou não documentadas, susceptíveis de tributação autónoma, nos termos do aludido art.4º do D.L. 192/90, de 9/6.
Nos termos do artigo 76°., n°.2 do Código de Processo Tributário, o apuramento da matéria tributável é feito com base nas declarações dos contribuintes, desde que as mesmas estejam apresentadas nos termos previstos na lei e sejam fornecidos à Administração Fiscal os elementos indispensáveis à verificação da sua situação tributária. E claro que quando a contabilidade ou escrita do sujeito passivo se mostra organizada segundo a lei comercial ou fiscal, se presume a veracidade dos dados e apuramentos decorrentes, salvo se se verificarem erros, inexactidões ou outros indícios fundados de que ela não reflecte a matéria tributável efectiva do contribuinte (vide o artigo 78°. do mesmo Código — hoje o artigo 75°. da Lei Geral Tributária, aprovada pelo Decreto-lei n°.398/98, de 17 de Dezembro).
No caso das empresas, a sua capacidade contributiva é, na verdade, revelada fundamentalmente pelo seu lucro real, por opção legal e constitucional (n°9 do ) preâmbulo do CIRC e n°2 do art°104 da CR, anterior n°2 do art°107).
Ora, esse (lucro real) tributável é definido no art°17 do CIRC, como “...a soma algébrica do resultado líquido do exercido e das variações patrimoniais positivas e negativas verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos ermos deste Código”.
Trata-se de um lucro periódico, já que reportado a um determinado exercido económico, correspondente ao ano civil (cf. art°70 do CIRC).
E para não restarem dúvidas sobre a autonomia tributária de cada exercício, económico, veio o n° l do art° 18 do CIRC, precisar, em sintonia com o preceito anterior, que "Os proveitos e custos, assim como as outras componentes positivas ou negativas do lucro tributável, são imputáveis ao exercício a que digam respeito, de acordo com o princípio da especialização de exercidos".
O que demonstra que o princípio da tributação do lucro real não conflitua, antes está intimamente relacionado com o principio da especialização de exercícios e ambos estão conexionados com o princípio da anualidade, segundo o qual as empresas deverão apurar, no fim de cada ano, os resultados do exercício da actividade durante o mesmo período e decidir, desde logo, sobre o destino a dar aos mesmos resultados, quando positivos.
Ora, a não declaração de todos os custos e proveitos obtidos ou incorridos em determinado ano ou exercício económico, é que constitui não só violação do princípio da especialização de exercícios, como também viola o princípio da tributação do lucro real, porque se não forem declarados, pelo contribuinte, num determinado ano ou exercício, todos os proveitos e lucros a ele economicamente imputáveis, o lucro que vier a apurar não pode, naturalmente, corresponder ao lucro real desse ano ou exercício, e é em relação a esse período de tempo, que o lucro real, para efeitos de tributação, deve ser aferido, como vimos. Assim como também não podemos falar de lucro real de um determinado exercício, se nele se considerarem custos ou proveitos de outros anteriores. E isto é assim, independentemente de quem ficar prejudicado - o contribuinte ou o Fisco -com o cumprimento da lei.
Por isso, o legislador só excepcionalmente veio admitir a imputação a determinado exercício económico das componentes, positivas ou negativas, respeitantes a exercícios anteriores. É que tal, isso sim, é que constitui violação do princípio da tributação do lucro real, e, portanto, contrária à opção do sistema fiscal português feita no CIRC, daí o seu carácter excepcional.
Ora, sendo a matéria colectável, em regra, determinada com base na declaração do contribuinte, sem prejuízo do seu controlo pela AF ( cf. art°16 do CIRC), o desrespeito, nessa declaração, das regras apontadas pelo Fisco para justificar a liquidação, impõe-lhe o dever de comprovar que se encontra numa das situações excepcionais em que tal lhe é permitido
Cabia, pois, à impugnante o ónus dessa alegação e prova, nos termos do art°342-l do CC.
E já se viu que a impugnante apresentou nestes autos prova de que os custos não aceites pela AF se verificaram.
Chama-se desde já à colação o entendimento perfilhado pela própria A.F. que considera que, a falta de documento externo pode ser suprida por outros meios de prova que demonstrem de forma inequívoca a justeza do lançamento efectuado.
Saliente-se, pois, que a regularidade formal dos documentos de suporte de custos ou encargos assume extrema relevância no sentido de comprovar a sua realização e possibilitar o controlo, vigilância e fiscalização por forma a impedir a fuga e evasão fiscal.
Todavia, as exigências de requisitos formais das facturas são particularmente apertadas no âmbito da liquidação do IVA para efeitos do exercício do direito à dedução que só é admitido quanto às facturas ou documentos equivalentes que contenham os requisitos previstos no artº 35º nº 5 do CIVA.
Assim e em regra, deve ter-se por documento válido em forma legal o que obedeça aos requisitos do artº 35º do CIVA.
Atenta a alegação da recorrente diga-se que de acordo com o disposto no artº 23º nº l do CIRC , devem-se consideram custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.
De sorte que os custos terão de ser comprovados por documentos válidos ou por outro meio admissível.
A essa luz, não podem considerar-se como comprovados por documento válido v.g. custos titulados por facturas emitidas por terceiros relativamente aos quais não se provou que o contribuinte com eles tivesse contratado a prestação dos serviços referidos nas facturas.
Mas na eventualidade de se provar que a recorrente efectuou o pagamento de serviços efectivamente realizados e indispensáveis para a obtenção de proveitos, ou, como no caso concreto, realizou as despesas, tem de aceitar-se que os respectivos custos, ainda que não estejam documentados através de facturas emitidas regularmente, estão documentados e provados por outro meio admissível, nomeadamente através da prova testemunhal.
A ineficácia probatória da escrituração não impede, na verdade, que essa falta seja suprida por outros meios de prova admitidos em direito e adequados a fundamentar a justeza do lançamento pela comprovação da operação comercial subjacente ao deficiente registo ou suporte documental desse registo contabilístico.
É que, como se doutrina no Acórdão deste TCA de 7/11/200, tirado no Recurso nº 3046, o ónus de alegação é consequência do regime de ónus de prova, sendo este, por sua vez, aferido pelo regime substantivo inerente à relação jurídica a que se reportam os pedidos de apreciação da correspondência do acto com a lei, à data em que foi praticado, e de anulação da liquidação no caso concreto.
E, ainda segundo aquele aresto, na medida em que a reacção contra o acto tributário é da iniciativa de quem exerce o direito de acção, cabe ao impugnante exercer a actividade probatória dos factos que lhe servem de fundamento, face ao princípio estatuído no artº 342º 1º C. Civil, sob a cominação de, nos termos do artº 516º CPC, ver repelida a pretensão deduzida em juízo.
Assim, a ineficácia probatória da escrita não impede o seu suprimento através de qualquer outro meio probatório legalmente admissível e que se mostre idóneo a comprovar a existência real da operação subjacente ao documento irregular em termos formais e ao deficiente registo da contabilidade., incumbindo ao contribuinte demonstrar e comprovar quais as operações efectivamente realizadas pelo emitente do documento, o seu valor e se foram indispensáveis para a realização dos proveitos.
Ora, face à tela factual considerada na sentença, à que foi aditada e às conclusões de recurso que balizam o âmbito de um recurso concreto (artºs. 684º e 690º do CPC), na perspectiva das razões invocadas pelo recorrente, a questão que se coloca é a de saber se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento em matéria de valoração da prova.
Nesse sentido, segue-se a fundamentação do Acórdão deste TCA de 30-11-00, tirado do Recurso nº 3430/00 versando a impugnação da liquidação de IRC do ano de 1990, que, com a devida vénia, se transcreve:
“No domínio do IRC cabe ao contribuinte a prática integral dos actos tributários, desde o apuramento dos factos e respectiva qualificação e valoração segundo os tipos legais de incidência em ordem ao apuramento da matéria tributável, até ao cálculo e entrega do imposto nos cofres do Estado.
Esta função tributária a cargo do contribuinte tem por base de apuramento a respectiva contabilidade, que deve mostrar-se organizada em moldes concordantes com a normalização contabilística do POC/89, vigente desde 1.1.1990 pelo DL 410/89 de 21.11, aplicável às sociedades abrangidas pelo Código das Sociedades Comerciais; cfr. art°s. 16° n° l, 17° n.° 3, 70° a), 94° nº 1 b) , 82° n°1, 96° n°1 e 98° n°1l CIRC.
Evidentemente que a regra da autoliquidação não preclude a revisão oficiosa do acto tributário ou por iniciativa do contribuinte, nomeadamente através de reclamação graciosa e com fundamento em quaisquer vícios do acto praticado, seja por mero erro de cálculo evidenciado na declaração mod. 22 ou por erro substantivo em matéria de pressupostos da liquidação de que resulte inexistência total ou parcial de facto tributário, cfr. art°s. 95° e 97° e sgts. do CPT e 111° CIRC.
Com a entrega do montante do imposto ao Estado, o acto praticado pelo contribuinte assume a natureza de acto tributário, pelo que a apreciação da validade e eficácia dos efeitos produzidos na situação concreta, tendencialmente de forma consistente e duradoura, passa pela correspondência entre a factualidade declarada pelo contribuinte - que beneficia da presunção de veracidade, art° 76° CPT e 16° CIRC - e a respectiva escrituração comercial, que faz fé se estiver organizada segundo a lei comercial.
Temos, pois, que o registo contabilístico dos factos patrimoniais repousa sobre a escrituração comercial, constituída por livros e registos obrigatórios, submetidos a formalidades legais, por livros facultativos a que se equiparam as folhas soltas, volantes ou avulsas, v.g. as folhas de caixa (art°s. 31° a 37° C. Com.) e por documentos justificativos, sendo que todos eles não só descrevem os ditos factos como, ainda, os comprovam.
Ainda que os registos contabilísticos não tenham carácter constitutivo, não se pode passar ao lado do valor probatório atribuído por lei à contabilidade das empresas, enquanto documento particular e com as inerentes consequências.
Do disposto no art° 44° n° l C. Comercial, não revogado pelo DL 262/86 de 2.9 que aprovou o Código das Sociedades Comerciais, conjugado com os art°s. 376° n° l e 2 e 360° C. Civil e atento o princípio da indivisibilidade da declaração, é admissível que a Administração Fiscal aceite a contabilidade apenas em parte, observadas que sejam duas circunstâncias:
a) se fizer a prova da inexactidão dos factos que lhe são desfavoráveis, quanto à parte não aceite, nos termos do art° 360° C. Civil;
b) se fizer a prova da falsidade dos documentos cuja autoria tenha sido reconhecida, nos termos do art° 376° n° l C. Civil.
Observado qualquer destes dois condicionalismos, já a Fazenda Pública pode aproveitar da contabilidade a parte que entenda por correcta e rejeitar a parte viciada por inaptidão para evidenciar o lucro real da empresa em ordem ao lançamento da tributação e à revisão por correcções técnicas.”
Ora, em regra, deve ter-se por documento válido em forma legal o que obedeça aos requisitos do artº 35º do CIVA.
E, de acordo com o disposto no artº 23º nº1 do CIRC, devem considera-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora. De sorte que os custos terão de ser comprovados por documentos válidos ou por outro meio admissível.
Mas na eventualidade de se provar que a recorrente efectuou o pagamento de serviços efectivamente realizados e indispensáveis para a obtenção de proveitos, tem de aceitar-se que os respectivos custos não estão documentados por aquelas facturas, mas sim provados por outro meio admissível.
A essa luz, na hipótese em apreço a Administração Fiscal não logrou provar que parte da contabilidade da Recorrida está em desconformidade com o suporte documental da actividade empresarial.
De resto, como se faz ressaltar na sentença recorrida, é este o entendimento da Direcção de Finanças, pois que considera que a dita tributação autónoma apenas tem lugar quando se trate de despesas confidenciais ou não documentadas, natureza que não têm as facturas em causa referentes a serviços cuja materialidade nem sequer é discutida.
Consequentemente e como bem se entendeu na sentença, no que concerne à não aceitação como custo do questionado valor, verifica-se que não assiste razão à Administração fiscal pelo que procede a conclusão de recurso sob análise relativa à correcção relativa a despesas contabilizadas na rubrica despesas com edifícios arrendados tituladas por facturas emitidas pela C....
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Conhecendo agora dos demais fundamentos da impugnação.
No despacho que indeferiu a reclamação graciosa do recorrente, escreveu-se o seguinte:
"Face às várias peças incorporadas nos autos e ao parecer infra, defiro parcialmente o pedido, nos termos definidos no item 3, a fls. 319, ou seja, anulando o imposto em 54.777.700$00 e ainda no montante que resultar da redução à matéria colectável do valor de 38.449.000$00".
Sendo assim, podemos concluir que uma das peças em que o despacho se baseou, foi a informação de fls. 286/295 onde, resumidamente, e sobre a matéria em apreciação, se escreveu o seguinte:
Quanto à importância de 60.000.000$00 despendida a título de pagamento de um trespasse não foi a amortização aceite nos termos da alínea a) do n° 3 do art° 17° do Decreto Regulamentar 2/90.
Quanto às outras despesas igualmente contabilizadas pelo reclamante na rubrica " despesas com edifícios arrendados" as mesmas também não foram aceites em face da mesma norma.
E foi entendido que em face dos art°s 1118°, n° 2 e 115°, respectivamente, do Código Civil e do RJAU que, no caso, não estamos perante trespasse em sentido técnico jurídico, antes perante pagamentos devidos a título de uma cedência de posição de locatário comercial.
Mas, ainda admitindo que se trate de compensações por benfeitorias devidas aos anteriores arrendatários, face ao disposto nos art°s 1046°, 1273° e 1275° do Código Civil, sempre as mesmas deveriam ser pagas pelos proprietários dos locais arrendados e não pelo recorrente, na sua qualidade de novo arrendatário, uma vez que entre este e os anteriores arrendatários não existiam quaisquer relações jurídicas das quais pudessem surgir direitos ou obrigações entre ambas as partes.
Por outro lado ainda, o arrendamento comercial era feito por tempo ilimitado, não estando, por isso, sujeito a deperecimento, pelo que é insusceptível de amortização.
A recorrente, por sua vez, entende que se limitou a negociar com os anteriores locatários o ressarcimento das benfeitorias por estes realizadas nos locados, não tendo existido quaisquer trespasses.
De todo o modo, mesmo que de trespasses se tratasse, sempre o valor teria de ser encontrado por dedução no valor pago pelo adquirente, do justo valor dos activos adquiridos.
Assim, porque as benfeitorias foram adquiridas pelo recorrente e porque os custos estão perfeitamente provados em face do CIRC, são os mesmos de atender.
Quid juris?
Desde já diremos que acompanhamos a fundamentação expressa na citada informação e que motivou a decisão da reclamação.
Na verdade, de acordo com o disposto no art° 23° do CIRC, só são de aceitar como custos fiscais os que comprovadamente forem tidos como indispensáveis para a obtenção de proveitos sujeitos a imposto e os que contribuam para a manutenção da fonte produtora.
No caso concreto, as despesas efectuadas com o arrendamento de imóveis são consideradas custos, sendo-o ainda outras despesas realizadas no arrendado tendo em vista o funcionamento das instalações.
Porém, o pagamento de benfeitorias a terceiros, certamente como contrapartida de estes abandonarem o locado em beneficio do recorrente, não constitui despesa indispensável para a actividade do recorrente, uma vez que, por lei, ele não estava obrigado a efectuar tal pagamento que, quando muito, caberia ao dono do arrendado.
Naturalmente que se compreende que o recorrente pretendesse os melhores locais para instalar as suas agências. Porém, todas as despesas efectuadas para esse efeito e que não se enquadrem no conceito de custo fiscal, não podem ser aceites, nem amortizadas.
No Acórdão do STA (2a Secção), de 10 de Julho de 2002 -Recurso n° 0726/02, e perante questão semelhante, escreveu-se o seguinte:
"É verdade que os recorrentes pretenderam instalar-se em determinado estabelecimento.
Para isso, fizeram um acordo com o então locatário, no sentido deste desocupar as respectivas instalações, pagando-lhe uma determinada importância (8.000.000$00).
Depois celebraram um novo contrato com o senhorio, ocupando tais instalações. Será que aquela importância (8.000.000$00) pode considerar-se uma despesa de instalação?
A lei não nos dá uma definição do que sejam "despesas de instalação". Mas, à míngua da pertinente disposição legal, será aceitável o entendimento do Mm°. Juiz que se está perante uma despesa de instalação?
Entendemos que não.
Pensamos que a despesa em causa está a montante da instalação.
Trata-se antes de uma despesa de pré-instalação.
Na verdade, podemos surpreender, na operação dos recorrentes, três fases:
Uma primeira fase em que os recorrentes, pretendendo instalar-se em determinado local, fazem um acordo com o anterior locatário, de molde a obter a sua saída. Para conseguir tal desiderato, oferecem-lhe 8.000.000$00.
Obtido tal acordo, desocupadas as instalações, os recorrentes entram numa segunda fase: celebram um contrato com o senhorio.
Só agora têm a disponibilidade jurídica do estabelecimento.
Só a partir de então, já numa terceira fase, estão na possibilidade de ocupar o prédio.
Só então estão reunidas as condições jurídicas para fazerem as necessárias despesas atinentes à sua instalação.
Assim sendo, como nos parece que é, estando em causa uma despesa de pré-instalação, e não uma despesa de instalação, tal despesa (8.000.000$00) não pode ser considerada como custo, por isso que não é amortizável.
E esta solução está em sintonia, aliás, com o que se passa com o trespasse.
Este, como resulta da lei (art°. 17°, 3, a) do citado Decreto Regulamentar n°. 2/90, de 12/1), não é amortizável.
O trespasse, como é sabido, traduz-se na substituição do trespassante pelo trespassário, mantendo-se inalterado o contrato. Ou seja, dá-se a transmissão da posição do locatário (comercial ou industrial), independentemente da autorização do senhorio. Ora, se a própria lei exclui o trespasse dessa amortização, não repugna que uma situação que, pela natureza das coisas, é necessariamente anterior a esta, acabe por ter uma solução idêntica".
Assim sendo, e em face da argumentação exposta, concluímos que bem andou a Administração Tributária em não aceitar a amortização dos referidos custos.
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A segunda questão prende-se com a correcção das mais-valias fiscais decorrente da não aceitação como componente do valor de aquisição dos activos alienados, dos encargos suportados com a adaptação dos espaços arrendados para o exercício da sua actividade.
Sobre esta questão escreveu-se na decisão ora anulada o seguinte:
"A este respeito apurou-se que, no decorrer do exercício de 1992 o impugnante alienou a uma sociedade sua associada, denominada "B... Imobiliária, SÁ", os direitos de arrendamento que detinha sobre vários imóveis onde se encontravam instaladas as agências bancárias -identificadas no anexo n° 4 - utilizadas no exercício da sua actividade.
Da cessão onerosa de tais direitos de arrendamento transmitidos para a sociedade acima referida, apurou o aqui impugnante uma mais-valia fiscal de Esc. 80.380.739$00 que fez acrescer na Linha 18 do Quadro 17 da declaração de rendimentos modelo 22 de IRC do exercício de 1992.
O valor das mais e menos-valias fiscais apuradas pelo contribuinte, conforme Mapa das Mais-Valias e Menos-Valias Fiscais Modelo 31, resultou da diferença entre o valor de realização - valor pago pela sociedade "B..." - e o valor de aquisição -o qual compreende os trespasses, as indemnizações pagas pelas cedências de posição de locatário e pelas benfeitorias realizadas e deixadas nos estabelecimentos pêlos cedentes e ainda, todas as demais despesas efectuadas nas agências bancárias -deduzido das amortizações praticadas.
Contudo, da análise efectuada a todos os contratos de cessão onerosa de arrendamento, constata-se que a dita sociedade "B..." celebrou, já na qualidade jurídica de arrendatária, contratos de subarrendamento com o impugnante nos quais, através da sublocação total dos locados, lhe cedia todo o arrendado mediante o pagamento de rendas previamente estipuladas.
Daqui resulta que o impugnante deixou de estar investido na qualidade jurídica de arrendatário -por força das cessões onerosas de arrendamento efectuadas entre si e a sociedade "B...-Imobiliária, SA", - para passar à posição de subarrendatário dos locados onde exercia a sua actividade, continuando, porém, a desenvolver nesses mesmos locados o exercício da actividade bancária e, consequentemente, continuando a usufruir das benfeitorias por si introduzidas nos espaços. No entanto, as despesas realizadas pelo impugnante na qualidade de arrendatário, com o intuito de adaptar os espaços arrendados ao. exercício da sua actividade, não tiveram qualquer correlação directa com a aquisição pelo mesmo dos diversos direitos de arrendamento.
Continuou a utilizar, repete-se, posteriormente à cessão onerosa dos direitos de arrendamento efectuada a favor da sociedade "B...", só que, agora, investido numa qualidade diferente - de subarrendatário.
Assim, para efeitos do cálculo das mais e menos-valias contabilísticas e fiscais e nos termos estabelecidos no art° 42° do CIRC, o custo de aquisição dos direitos de arrendamento não deveria ter incluído as despesas acima referidas, devendo corresponder, apenas, ao somatório dos custos suportados pelo impugnante com a sua obtenção, como sejam -os trespasses e as indemnizações pagas por benfeitorias deixadas pêlos cedentes da posição de locatário.
Já a inclusão, para efeitos do cálculo dessas mais e menos-valias, no valor de aquisição dos referidos direitos de arrendamento, das despesas realizadas pelo impugnante com o fim de adaptar os espaços arrendados ao exercício da sua actividade bancária, não se enquadra na previsão do artigo 42° do CIRC "consideram-se mais-valias ou menos-valias realizadas os ganhos obtidos ou as perdas sofridas relativamente imobilizado mediante transmissão onerosa, qualquer que seja o título porque se opere, e, bem assim, os derivados de sinistros ou os resultantes da afectação permanente daqueles elementos a fins alheios à actividade exercida".
Assim, o valor correspondente às despesas efectuadas pelo reclamante nos edifícios arrendados - objecto de contabilização nas respectivas rubricas de despesas com edifícios arrendados - foi expurgado do valor de aquisição dos direitos de arrendamento. Tal originou, um acréscimo ao lucro tributável no montante de Esc. l 984 596 000$00, resultante da diferença entre a mais-valia fiscal apurada pêlos serviços de fiscalização no valor de Esc. 2.064.977.000$00 e o valor de Esc. 80.380.739$00, declarado - Linha 18 do Quadro 17 da declaração de rendimentos modelo 22 do IRC, já. mencionada- cfr. a ai .f) do n° l do artigo 20° do CIRC "consideram-se proveitos ou ganhos os derivados de operações de qualquer natureza em consequência de uma acção normal ou ocasional, básica ou meramente acessória, designadamente os resultantes de mais-valias realizadas".
Este entendimento da AF, salvo melhor opinião, não merece censura, pelo que se manterá.
É certo que a impugnante aventou que, ao alienar à dita "B..." todos os activos inerentes aos balcões utilizados por si, transferiu, não só a sua posição de arrendatário, como também todos os seus pertences corpóreos, constituídos pelas melhorias introduzidas nos arrendados.
No entanto, não é isso que decorre das escrituras referidas no ponto n° 8) do probatório.
Destas extrai-se que o impugnante aliena apenas a posição contratual que lhe adveio do contrato locativo, e pelo preço aí referido à sociedade "B...".
É certo que agora o impugnante fez acompanhar essas escrituras de documentos complementares onde se declara que parte ou a totalidade do preço estipulado corresponde a obras de beneficiação realizadas no respectivo locado.
No entanto, como bem defende o Digno Magistrado do MP, nas ditas escrituras públicas não há a menor referência à existência de documentos complementares, pelo que a exibição destes não pode deixar de ser vista como um expediente para dar cobertura e credibilidade à posição do impugnante.
Contudo, este desiderato, nada verosímil, não foi conseguido. Nestes termos, bem andaram os Serviços da AF quando, na determinação das mais-valias decorrentes dos aludidos contratos, tão só atendeu ao valor (preço) atribuído ao direito cedido e não às aventadas despesas com edifícios arrendados ou obras de beneficiação realizadas nos locados.
O que ficou escrito merece a nossa inteira concordância em face do disposto no art° 42° do CIRC e do teor das escrituras de cessão da posição contratual à Sociedade Pombino - Imobiliária, SA, pelo que improcede este fundamento de impugnação.
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A última questão reporta-se à não aceitação da dedução ao resultado líquido de rendimentos (Crédito em Leilão ao Investimento Público) efectuada pelo mesmo montante, ao abrigo do disposto no art° 2° do DL n° 143-A/89, de 3 de Maio.
Sobre esta matéria, e seguindo a posição assumida pela Administração Tributária, a decisão objecto de anulação pronunciou-se nos seguintes termos:
"Urge agora apreciar a 2a questão atrás exposta, ou seja, a que tem a ver com a correcção de Esc. 251. 474.000$00, inscrita na Linha 35 do Quadro 18 do Mapa de Apuramento Modelo DC-22.
Ela resultou da não aceitação fiscal da dedução ao resultado liquido de rendimentos de CLIPs (Crédito em Leilão ao Investimento Público) efectuada pelo mesmo montante, ao abrigo do disposto no artigo 2° do DL n° 143-A/89, de 3/5.
Tal dedução não foi aceite pela DSPIT após a constatação dos seguintes factos:
O aqui peticionante considerou na base de cálculo do beneficio dedução ao rendimento, o saldo da conta A-807 200 004-66 (Juros) que apresentava o montante de Esc. 1.257.369.000$00, correspondente aos juros dos CLIP auferidos no exercício de 1992, cuja emissão dos respectivos certificados foi efectuada ao abrigo do Despacho n° 186/89-XI, de 12/8.
Só que essas emissões foram realizadas após a revogação do DL n° 143-A/89, de 3/5, pela Lei n° 65/90, de 28/12, isto é, após 02/02/91.
Daqui resulta que o contribuinte considerou para efeitos de tributação que o beneficio fiscal concedido pelo DL n° 143-A/89, já apontado, se aplica a todas as emissões de certificados ocorridas durante o prazo global do empréstimo autorizado pelo Despacho 186/89-XI, de 12/8.
Como tal, deduziu no exercício em apreço (1992) 20% dos rendimentos produzidos pelos CLIP, pese embora a colocação dos respectivos certificados pela Junta de Crédito Pública se tenha efectuado em data posterior à da referida revogação do DL n° 143-A/89, de 3/5.
Todavia, resulta do Despacho n° 186'89-XI, de 12/8, que autorizou a emissão de dívida pública a sete anos representada por certificados de dívida a 182 ou 364 dias, até ao montante de 200 milhões de contos, que ele consignou um empréstimo com montante e prazo definidos, que se contrai mediante emissões periódicas e bem individualizadas em sistema de leilão.
E, no final de cada semestre ou ano, a Junta de Crédito Público reembolsa os certificados pelo valor nominal, acrescido dos juros vencidos, sendo a taxa de juro negociada em cada saque ou emissão.
Porém, de acordo com o estabelecido no art° 2° do DL n° 143-A/89, o factor decisivo na concessão do benefício é a data de emissão dos títulos da dívida pública interna.
A circunstância de eles representarem a globalidade ou uma parcela do empréstimo autorizado é, salvo melhor entendimento, inócua e irrelevante.
Assim sendo, a dívida pública emitida no decurso da vigência do art° 2° do DL n° 143-A/89, pode beneficiar da dedução ao rendimento, do mesmo modo que as emissões anteriores a 2/2/91 contam na totalidade para fins de IRC.
Só não podem ser considerados como passíveis de usufruírem do beneficio fiscal consagrado naquele DL, os rendimentos dos CLIPs, adquiridos em leilões subsequentes a 02/02/91, conforme sustentado pelo autor, e que, no caso posto, atingiram a soma de 257.369.000$00.
Ao ter assim procedido, também se nos afigura não merecer qualquer reparo o procedimento adoptado pelo Fisco".
O impugnante, porém, entende que apesar da revogação do DL n° 143-A/89, de 3 de Maio, pela Lei n° 65/90, de 28 de Dezembro, estamos perante um empréstimo em sistema de "revolving", com um prazo global de sete anos, mas renovado de seis em seis meses, através do recurso a novas colocações por via de leilão.
Deste modo, porque estamos perante um só contrato de empréstimo, mas com sucessivas renegociações das taxas praticadas, o que conta é a data da emissão inicial da dívida.
Ora, reportando-se esta a 1989 - data anterior à revogação do DL n° 143-A/89, de 3 de Maio - os títulos adquiridos pelo recorrente beneficiam do regime consagrado no art° 2° do citado diploma.
Cabe então verificar qual destas posições corresponde ao disposto na lei.
Sobre esta questão já se pronunciou o Acórdão deste Tribunal, de 23.03.04 - Recurso nº 017103/02, também relatado pelo relator desta formação e no qual se escreveu o seguinte:
Relembre-se que o art° 2° do Dec.-Lei n° 143-A/89 de 3 de Maio estabelecia que: «Os rendimentos da divida pública interna que venha a ser emitida após a publicação do presente diploma contam apenas por 80% para fins de IRS e IRC.»
Por força do n° 3 do art° 24° da Lei n° 65/90 de 28/12 foi «revogado o artigo 2° do Decreto-Lei n° 143-A/89, de 3 de Maio, a partir da data de entrada em vigor da presente lei, sem prejuízo da manutenção do regime fiscal nele previsto, para a dívida pública interna emitida no decurso da sua vigência.» (sublinhado nosso). Da literalidade deste normativo resulta que, contrariamente ao entendimento da AF, os efeitos decorrentes da aplicação do regime fiscal previsto no revogado art° 2° do DL 143-A/89, se mantêm relativamente à «dívida pública interna emitida», o que quer dizer que, tal como o afirmou a Ma Juíza recorrida, «por emissão da dívida pública entende-se o «empréstimo» e não os certificados que a representam». Mas há um elemento lógico-sistemático e histórico que impõe esta hermenêutica jurídica dos citados preceitos e que é introduzido nessa querela pelo art° 1° do Dec.-Lei 445-A/88 de 5/12: «l - É autorizado o Ministro das finanças a recorrer à emissão de divida pública a sete anos representada por certificados de divida a seis meses, ou menos.»
Dúvidas não sobram, pois, de que o factor atendível é a data em que foi autorizada a emissão da dívida pública, irrelevando para o efeito a data de emissão dos títulos ou certificados.
Ora, tal implica a improcedência não só do fundamento do recurso da PPa que nos ocupa, como deste «in totum».
Não existem razões para agora se seguir entendimento diverso do defendido no aresto transcrito.
Em face do que ficou dito procede este fundamento impugnatório.
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3. DECISÃO
Nestes termos e pelo exposto, concede-se provimento ao recurso, anula-se a sentença e, conhecendo em substituição, julga-se a impugnação parcialmente procedente quanto à questão imediatamente antecedente e ainda quanto à correcção relativa a despesas contabilizadas na rubrica despesas com edifícios arrendados tituladas por facturas emitidas pela C..., no mais se julgando improcedente.
Custas pelo recorrente, na proporção do decaimento, fixando-se em três UC a taxa de justiça, devidas apenas na 1ª instância.
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Lisboa, 1 de Junho de 2011
(Gomes Correia)
(Lucas Martins)
(Pereira Gameiro)