Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:05371/12
Secção:CT-2ºJUÍZO
Data do Acordão:11/27/2012
Relator:PEDRO VERGUEIRO
Descritores:IRC.
INCOMPETÊNCIA EM RAZÃO DA HIERARQUIA.
PROVISÕES PARA DEPRECIAÇÃO DE TÍTULOS E IMOBILIZAÇÕES FINANCEIRAS.
CUSTOS COM REFORMAS ANTECIPADAS.
Sumário:I) Nos termos do art. 280º nº 1 do C.P.P.T., das decisões dos Tribunais Tributários de 1.ª Instância cabe recurso a interpor, em primeira linha, para os Tribunais Centrais Administrativos, salvo quando a matéria for exclusivamente de direito, caso em que tal recurso tem de ser interposto para a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, sendo que, no caso presente, as conclusões 3ª e 6ª envolvem a consideração de elementos de facto que obstam à conclusão de que a apreciação e decisão do recurso passa, em exclusivo, pelo tratamento de conceitos jurídicos, de matéria jurídica ou de direito.

II) A provisão para menos valias de títulos e imobilizações financeiras é de constituição obrigatória, devendo corresponder ao total das menos valias latentes dos respectivos activos ( artigo 10º do referido Aviso nº 3/95 ), sendo que se considera que existem menos valias latentes quando “o preço de mercado ou, em condições específicas a definir pelo Banco de Portugal, o valor de referência de um activo, forem inferiores ao seu valor de inscrição no balanço” e que “na ausência de preço de mercado, será considerado o valor presumível de transacção em função, nomeadamente, das características do activo e da situação financeira da entidade emitente, com base em critérios prudentes de avaliação” ( artigo 10º nº 3 do Aviso nº 3/95 ).

III) Considerando o momento em que a provisão se constitui (31-12), é manifesto que a mesma tem de ser enquadrada em função dos elementos disponíveis e conhecidos nessa data, impondo-se ter presente que a provisão visa obviar a uma menos-valia potencial ou latente cujo quantitativo é por definição incerto e apenas estimado aquando da constituição da provisão, sendo que a posição da AT coloca em crise a própria figura da provisão, na medida em que teria de corrigir-se toda e qualquer provisão, por excessiva ou insuficiente, em função do efectivo valor de transacção dos activos só conhecido a posteriori.

IV) O Código do IRC não prevê qualquer ajustamento ao valor das provisões constituídas no âmbito da disciplina definida pelo Banco de Portugal, como resulta, desde logo, do disposto no artigo 34º, nº 1, alínea d) daquele Código, não podendo a Administração Fiscal, sem qualquer suporte legal, impor ajustamentos no Quadro 07 da Declaração de Rendimentos IRC - Modelo 22.

V) O corpo do n.º 1 do art. 23º do CIRC apenas permite a desconsideração fiscal dos custos extra-empresariais, isto é, daqueles que não apresentam qualquer afinidade com a actividade da empresa, como os encargos com despesas privadas dos sócio ou com terceiros, estranhos à empresa. A sua aplicação para desconsiderar fiscalmente um custo efectivamente suportado está, portanto, circunscrita às situações de confusão entre o património empresarial e o património pessoal dos sócios, bem como àquelas em que a empresa, em detrimento do seu património, pretende beneficiar terceiro.

VI) A Recorrida apenas suporta os referidos encargos com reformas antecipadas aquando da passagem à situação de reforma antecipada, sendo que é indiscutível que a dotação realizada pela Recorrida para o Fundo de Pensões é calculada tendo por referência, estritamente, o período temporal iniciado com a passagem à situação de reforma e os encargos a suportar com pensões daí adiante.

VII) Assim sendo, perante o que fica exposto, em função do enquadramento legal da matéria em apreço e da realidade apontada no âmbito da actuação da AT, tem de reconhecer-se que a actuação desta tem cobertura legal, pois que só o enquadramento da matéria nos termos apontados pela AF traduz a consideração desta realidade nos termos dos elementos alinhados nos autos, não podendo ser considerado neste âmbito o valor correspondente ao desfasamento entre o montante correspondente a um décimo dos encargos com a dotação global (tal como pretende a Recorrida), caso o mesmo se revele (como sucede no caso presente) superior ao montante total pago pelo Fundo aos trabalhadores reformados antecipadamente, dando melhor expressão ao comando do art. 23º do CIRC.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário (2.ª Secção) do Tribunal Central Administrativo Sul:

1. RELATÓRIO
O Excelentíssimo Representante da Fazenda Pública, devidamente identificado nos autos, inconformado veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, datada de 28-10-2011, que julgou procedente a pretensão deduzida por “Banco …………………., S.A.” na presente instância de IMPUGNAÇÃO relacionada com a liquidação adicional de IRC de 2001 n.º ……………………… e respectivos juros compensatórios e demonstração de acerto de contas n.º …………………., anulando a liquidação adicional de IRC impugnada, nomeadamente, com referência às correcções efectuadas relativamente às provisões para depreciação de títulos e imobilizações financeiras e aos custos com reformas antecipadas.

Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 490-497), as seguintes conclusões que se reproduzem:
“ (…)
1) A sentença em apreço anulou a liquidação adicional de IRC, referente ao ano de 2001, na parte em que a mesma resulta, designadamente, das correcções efectuadas relativamente às provisões para depreciação de títulos e imobilizações financeiras e aos custos com reformas antecipadas.
2) Tendo-se concluído na decisão recorrida que “ (…), não prevendo o Código do IRC qualquer ajustamento ao valor das provisões constituídas no âmbito da disciplina definida pelo Banco de Portugal, (…), não pode a Administração Fiscal, sem qualquer suporte legal, impor ajustamentos no Quadro 07 da Declaração de Rendimentos de IRC – Modelo 22.” e sendo certo que a al. d) do nº 1 do Aviso nº 3/95 do Banco de Portugal determina a constituição obrigatória da provisão para menos-valias de títulos e imobilizações financeiras, dedutível nos termos do art. 34º, nº 1, al. d) do CIRC, pelos limites mínimos, tal como decorre do referido Aviso, conclui-se a pp. 11 do relatório de inspecção tributária (sendo esse o fundamento essencial da presente correcção), perante os elementos apresentados pela impugnante, que a mesma contrariou o disposto no art. 34º, nº 1, al. d) do CIRC, conjugado com o estabelecido no nº 3 do nº 10º do Aviso nº 3/95 do Banco de Portugal, de acordo com o qual, na ausência de preço de mercado, será considerado o valor presumível de transacção em função, nomeadamente, das características do activo e da situação financeira da entidade emitente, com base em critérios prudentes de avaliação.
3) Constando de pp. 25 e ss. do relatório de inspecção as razões adicionais que fundamentam a efectivação da correcção em causa, anteriormente reproduzidas, impõe-se, contudo, face ao seu carácter elucidativo, salientar o seguinte excerto:
“ (…) Como os títulos em questão não estão cotados na Bolsa de Valores, o sujeito passivo determinou o preço de mercado ou de referência com base no valor dos capitais próprios das empresas participadas utilizando como referência os balanços reportados a 31/12/2000 e comparou-o com o valor registado na contabilidade em 31/12/2001, para efeitos da constituição da provisão para menos-valias.
Desta forma, a menos-valia apurada tem associado um valor de referência e um valor contabilístico respeitantes a diferentes períodos de tempo, sendo por consequência incomparáveis atendendo ao conceito estabelecido no nº 3 do nº 10 do já citado Aviso.
Tendo presente que o sujeito passivo na determinação do presumível preço de mercado se socorreu do valor contabilístico da participação, apurado com base nos capitais próprios das sociedades participadas, (…), o mesmo só é comparável com os valores do balanço a 31/12/2001 se for calculado a partir das demonstrações financeiras das participadas referenciadas àquela data”, sendo certo, por outro lado, que, na data da entrega da declaração mod. 22, a ora impugnante já poderia dispor da informação relativa às demonstrações financeiras das participadas, com referência a 31/12/2001, sendo-lhe possível proceder aos ajustamentos necessários no Quadro 07 da referida declaração de forma a respeitar a exigência contida no nº 3 do nº 10º do Aviso nº 3/95 do Banco de Portugal, bem como o estabelecido no art. 34º, nº 1, al. d) do CIRC no respeitante à dedutibilidade fiscal da provisão em causa.
4) Por sua vez, no respeitante à correcção relativa a reformas antecipadas, concluiu a decisão recorrida que o critério utilizado pela AF carece de apoio legal, sendo que, tal como resulta de pp. 14 do relatório de inspecção, foi considerado que tais situações não se revelam susceptíveis de enquadramento no disposto no art. 40º do CIRC, havendo, antes, lugar à aplicação do regime constante do art. 23º do CIRC, facto que determina que apenas seja considerada como custo fiscal a parte proporcional das contribuições para o Fundo de Pensões correspondente aos encargos que seriam suportados pela impugnante na eventualidade de ser esta a proceder, de forma directa, ao pagamento das pensões.
5) Acresce que, na medida em que a transferência das responsabilidades com reformas antecipadas para o fundo de pensões implica a efectivação de dotações no exercício em que aquelas se verificam, as quais representam encargos suportados pela ora impugnante até que ocorram os pressupostos para a reforma plena dos trabalhadores, a dotação efectuada num determinado exercício deverá, para efeitos de determinação do resultado fiscal e em obediência ao princípio contabilístico da especialização dos exercícios, aplicável ex vi do disposto no art. 18º do CIRC, ser reconhecida nos exercícios aos quais respeitam os encargos que lhe estão subjacentes.
6) Por outro lado, o critério utilizado pela impugnante origina uma duplicação de custos no ano em que os trabalhadores se reformam antecipadamente, no qual se procede, também, à efectivação de uma contribuição para o fundo de pensões, considerando que, nesse mesmo ano, são reconhecidas como custo não só as remunerações pagas até à situação de reforma antecipada mas também a dotação correspondente ao exercício em que a mesma ocorre, razão pela qual, no ano em causa, a impugnante considerou como custo fiscal as remunerações de cerca de 14% dos trabalhadores que passaram à situação de reforma antecipada nos meses de Novembro e Dezembro de 2001 (relativamente aos quais não ocorreu, no questionado exercício, qualquer pagamento de reformas), bem como o valor relativo à dotação, para o fundo de pensões, correspondente à responsabilidade da impugnante relativa a todo o ano de 2001, pelo que, tendo a sentença recorrida decidido com base em entendimento contrário ao que resulta das presentes conclusões, violando os preceitos legais nelas mencionados, deverá, na parte recorrida, ser revogada, com as legais consequências.”

A recorrida “Banco ………………., S.A.” apresentou contra-alegações, nas quais apresenta as seguintes conclusões:
“…
1.ª A sentença recorrida julgou integralmente procedente a impugnação judicial deduzida pelo ora Recorrido contra a liquidação adicional de IRC referente ao exercício de 2001, anulando-a na parte respeitante à correcção das provisões para depreciação de títulos e imobilizações financeiras e à correcção relativa aos custos com reformas antecipadas.
2.ª Invoca a Recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de Direito ao anular a liquidação sub judice no segmento respeitante à correcção das provisões para depreciação de títulos e imobilizações financeiras por verificar-se de facto, no seu entender, uma violação do disposto no artigo 34.º, n.º 1, alínea d), do Código do IRC, conjugado com o disposto no n.º 10 do Aviso n.º 3/95 do Banco de Portugal;
3.ª Não assiste, porém, razão ao Ilustre Representante da Fazenda Pública, inexistindo qualquer violação do citado preceito, desde logo porque o referido Aviso do Banco de Portugal não fixa qualquer critério específico de valorização dos títulos, limitando-se a fazer apelo a “critérios prudentes de avaliação”, não impondo uma valorização dos activos de acordo com as demonstrações financeiras das entidades participadas elaboradas com referência ao mesmo exercício da constituição da provisão;
4.ª A alegação do Ilustre Representante da Fazenda Pública de que a menos-valia apurada tem associado um valor de referência e um valor contabilístico respeitantes a diferentes períodos de tempo, sendo por consequência incomparáveis, não pode proceder uma vez que, por inerência e definição, a constituição de uma provisão para a depreciação de investimentos financeiros implica a comparação de dois valores reportados a momentos distintos, sendo que a questão que cumpre apreciar é a da exigibilidade de atender às demonstrações financeiras elaboradas com referência ao exercício de 2001 apesar de as mesmas não estarem disponíveis à data da constituição das provisões;
5.ª O Ilustre Representante da Fazenda Pública não controverte o entendimento do Tribunal a quo de que as demonstrações financeiras reportadas a 31 de Dezembro do exercício em causa não estavam disponíveis à data da constituição da provisão, não se evidenciando qualquer erro de julgamento da sentença recorrida no segmento em que conclui, considerando o regime legal das demonstrações financeiras das sociedades comerciais e o prazo que as sociedades dispõem para a apresentação daqueles documentos, no sentido da inexigibilidade de atender aos valores aí contidos;
6.ª Em matéria de constituição de provisões está vedado efectuar correcções com base em juízos de prognose póstuma pelo que apenas se apenas se exigia ao Recorrido que utilizasse os elementos fidedignos que se encontram disponíveis à data da constituição das suas provisões;
7.ª Também não era exigível ao Recorrido efectuar qualquer ajustamento extra-contabilístico no Quadro 07 da Declaração de Rendimentos Modelo 22 tal como decidiu o Tribunal a quo, não só porque, atento o prazo de que as sociedades dispõem para proceder à apresentação de contas, não é inteiramente exacto afirmar que à data de entrega da declaração de rendimentos o Recorrido já poderia ter acesso às demonstrações financeiras referentes a 2001, mas sobretudo porque, não existe qualquer norma no Código do IRC que imponha o ajustamento fiscal em causa ao resultado contabilístico com base em eventual informação superveniente ao final do exercício;
8.ª Em face do exposto, o erro de julgamento imputado pelo Ilustre Representante da Fazenda Pública não se verifica, não sendo, de resto, especificados quaisquer elementos fácticos ou de Direito a impor decisão diversa neste concreto segmento da sentença recorrida, devendo concluir-se, assim, pela improcedência do recurso interposto;
9.ª No que respeita à correcção relativa aos custos com reformas antecipadas, o Ilustre Representante da Fazenda Pública invoca que decorre do artigo 23.º do Código do IRC uma limitação à dedutibilidade dos custos em apreço, no sentido de que apenas seja considerado como custo fiscal a parte proporcional das contribuições para o Fundo de Pensões correspondente aos encargos que seriam suportados pelo Recorrido na eventualidade de ser este a proceder, de forma directa, ao pagamento das pensões;
10.ª Desde logo, o artigo 23.º, na redacção à data aplicável, nada referia a este respeito, não colocando qualquer restrição ou limite à dedutibilidade dos encargos desta natureza;
11.ª Em todo o caso, não foi de acordo com esse entendimento que foi efectuada a correcção sub judice pelos serviços de inspecção tributária, que apenas aceitaram como fiscalmente dedutíveis os custos com reformas antecipadas pagos pelo Fundo de Pensões no exercício de 2001, o que é totalmente distinto de apenas aceitar como custo fiscal a parte proporcional das contribuições para o Fundo de Pensões correspondente aos encargos que seriam suportados pelo Recorrido na eventualidade de ser este a proceder, de forma directa, ao pagamento das pensões;
12.ª De nada adianta invocar aquela interpretação, veiculada pela doutrina da administração tributária nas Informações n.º 624/99 e n.º 1004/2001, pois não foi esse o critério adoptado na correcção efectuada, decidindo-se na sentença recorrida que uma vez que o Tribunal apenas pode proceder à anulação da liquidação, e já não substituir o critério utilizado pela Administração Fiscal pelo critério que julga mais adequado, impõe-se apenas proceder à anulação da liquidação na parte em que considerou como custo fiscal o valor pago pelo Fundo de Pensões a título de reformas antecipadas;
13.ª A ilegalidade da correcção em apreço afigura-se manifesta pois não decorre do artigo 23.º do Código do IRC nem de qualquer outra disposição fiscal, conforme pretende a administração tributária, que o montante aceite para efeitos fiscais a título de contribuições efectuadas ao fundo de pensões destinadas à cobertura de reformas antecipadas corresponda aos montantes pagos pelo fundo de pensões aos trabalhadores antecipadamente reformados;
14.ª Não procede a alegação do Ilustre Representante da Fazenda Pública de que a dedutibilidade dos custos em causa se encontra limitada pelo princípio da especialização dos exercícios pois se apenas deduzisse fiscalmente o montante correspondente aos pagamentos de reformas pelo Fundo de Pensões, tal como pretendido pela administração tributária, tal não representaria maior observância do princípio da especialização dos exercícios, bem pelo contrário, haveria um desfasamento entre os encargos incorridos no exercício e os deduzidos uma vez que os montantes pagos pelo Fundo de Pensões não coincidem com o montante das dotações anteriormente efectuadas pela instituição financeira;
15.ª O enquadramento contabilístico para o exercício de 2001 das contribuições extraordinárias efectuadas em virtude de reformas antecipadas encontrava-se previsto no Aviso n.º 12/2001, de 23 de Novembro, do Banco de Portugal, determinando aquele Aviso a periodização dos encargos com dotações pelo período de 10 anos;
16.ª Não fora a periodização imposta pelo normativo contabilístico aplicável ao sector bancário, nada impediria o Recorrido de reconhecer como custo fiscal a totalidade do encargo com a dotação para o Fundo de Pensões e não apenas um décimo atendendo a que, à data dos factos, nenhuma norma fiscal impunha a periodização dos referidos encargos;
17.ª Sendo assente que as importâncias reconhecidas como custo fiscal no exercício de 2001 decorrem do cumprimento das regras contabilísticas aplicáveis, não se encontrando prevista no Código do IRC qualquer derrogação a essas regras nem qualquer norma especial em matéria de especialização dos exercícios, resulta inequívoca a dedutilidade dos referidos encargos ao abrigo do artigo 23.º do Código do IRC;
18.ª Não procede, por fim, a alegação do Ilustre Representante da Fazenda Pública quanto à ocorrência de uma duplicação de custos, desde logo, porque essa não foi a fundamentação da correcção efectuada nem resulta provado nos autos, mas também porque não se pretende invocar uma verdadeira duplicação ou sobreposição de custos mas mais uma vez colocar em crise a especialização dos mesmos;
19.ª O desfasamento entre o encargo com a dotação reconhecido como custo pelo Recorrido e o montante de pensões auferido pelos trabalhadores no mesmo exercício não significa, em rigor, qualquer duplicação de custos ou violação do princípio da especialização dos exercícios porquanto nenhuma disposição fiscal, reitere-se, designadamente nem o artigo 23.º nem o artigo 18.º do Código do IRC, determina que o montante aceite para efeitos fiscais a título de contribuições efectuadas ao fundo de pensões destinadas à cobertura de reformas antecipadas corresponda aos montantes efectivamente pagos pelo fundo de pensões aos trabalhadores antecipadamente reformados;
20.ª Em face de todo o exposto, deverá manter-se a sentença recorrida a anulação do acto tributário sub judice, devendo concluir-se, in totum, pela improcedência do recurso interposto.
Por todo o exposto, e o mais que o ilustrado juízo desse Venerando Tribunal suprirá, deve o presente recurso ser julgado improcedente, mantendo-se a douta sentença recorrida, assim se cumprindo com o DIREITO e a JUSTIÇA.”

A Exma. Magistrada do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu douto parecer ( cfr. fls. 638 dos autos ), no qual suscita a excepção da incompetência deste Tribunal para conhecer do recurso em razão da hierarquia.
Notificadas as partes da excepção alegada pelo M. P. junto deste Tribunal, nenhum delas tomou posição sobre a matéria.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO –QUESTÕES A APRECIAR
Previamente às questões que constituem o objecto do presente recurso jurisdicional o qual se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, importa apreciar da excepção suscitada nos autos no despacho de fls. 638, centrando-se o mérito do presente recurso em indagar da bondade da liquidação de IRC relativa ao anos de 2001, com referência às correcções efectuadas pela AT relacionadas com as provisões para depreciação de títulos e imobilizações financeiras e aos custos com reformas antecipadas.

3. FUNDAMENTOS
3.1 DE FACTO
Nesta matéria, consta da decisão recorrida que:
“…
A) O impugnante exerce a actividade bancária (cfr. fls. 93 a 132 dos autos);
B) Em cumprimento da Ordem de Serviço nº 01/1/139, de 5 de Maio de 2003, foi efectuada acção inspectiva externa de carácter geral ao impugnante, a qual teve início em 14 de Julho de 2003 (cfr. fls. 93 a 132 dos autos);
C) Em 30-3-2004, o impugnante foi notificado do relatório final de inspecção tributária relativo ao ano de 2001 (cfr. fls. 92 dos autos);
D) Na sequência da acção inspectiva referida em A) que antecede foram efectuadas, para o que releva nos autos, as seguintes correcções:
a) Desconsideração das provisões para créditos de cobrança duvidosa no valor de €667.311,19;
b) Desconsideração das provisões para depreciação de títulos e imobilizações financeiras no montante de €293.356,42;
c) Desconsideração das provisões de menos-valias de outras aplicações financeiras no montante de €178.177,60;
d) Desconsideração como custo fiscal das contribuições efectuadas a título de reformas antecipadas no montante de €3.023.085,75; e
e) Desconsideração do custo relativo aos juros de mora no valor de €42.357,27. (cfr. fls. 93 a 132 dos autos);
E) A Administração Fiscal procedeu a uma correcção no montante de €667.311,19 relativa à provisão para créditos de cobrança duvidosa contabilizada pelo impugnante no exercício de 2001, por ter considerado que o mesmo utilizava, para efeitos de cálculo da provisão em apreço, percentagens de cobertura superiores às que se encontram estabelecidas no nº 5 do Aviso nº 3/95, do Banco de Portugal (cfr. fls. 93 a 132 e 139 dos autos);
F) No decurso da acção inspectiva referida em B) que antecede, os Serviços de Inspecção Tributária verificaram existir um excesso nas provisões para menos-valias de outras aplicações – imóvel situado na ………………, em Lisboa – no montante de €339.265,26, pelo que foi efectuada uma correcção no valor de €178.177,60, correspondente ao valor do excesso da provisão em 2001 deduzido da correcção efectuada no exercício de 2000, no valor de €161.087,66 (cfr. fls. 93 a 132 dos autos);
G) A Administração Fiscal efectuou uma correcção no valor de €293.356,42, relativo a provisões para depreciação de títulos e imobilizações financeiras (cfr. fls. 93 a 132 dos autos);
H) Quanto à correcção referida em G) que antecede, consta do Relatório dos Serviços de Inspecção Tributária o seguinte: “Para alguns títulos de rendimento variável, sem cotação na Bolsa de Valores, referentes a empresas participadas, e relativamente aos quais o Banco facultou o Balanço, reportado a 31/12/2001, constatou-se que o valor de mercado apurado, com base na percentagem dos capitais próprios evidenciados naquelas peças contabilísticas, era superior ao considerado pelo Banco. Esta diferença, de acordo com a informação prestada pelo Banco, adveio da utilização dos balancetes das sociedades participadas reportados a 31/12/2000, para efeitos de apuramento do valor do mercado. Contudo, este facto não impossibilitou o Banco de ter efectuado os ajustamentos necessários para efeitos fiscais no Quadro 07 da declaração de rendimentos mod. 22, dado que na data da sua entrega, em 29/05/2002, já seria possível ter a informação respeitante às demonstrações financeiras das participadas, com referência a 31/12/2001. (…)” (cfr. fls. 93 a 132 dos autos);
I) A Administração Fiscal efectuou uma correcção no valor de €3.023.085,75, ao nível dos custos, relativo a contribuições para fundos de pensões (cfr. fls. 93 a 132 dos autos);
J) Quanto à correcção referida em I) que antecede, consta do Relatório dos Serviços de Inspecção Tributária, além do mais, o seguinte: “O Banco regista na conta “5578 – Despesas com custo diferido – contribuições p/ fundo de pensões” as dotações efectuadas para financiar o acréscimo das responsabilidades decorrentes das reformas antecipadas. Estas despesas são amortizadas num período aproximadamente de 10 anos, sendo que no ano 2001 o montante abatido à conta 5576 foi em contrapartida da utilização de contas de reservas (rubrica 63 do PCSB). Constatou-se que, durante o exercício de 2001, o Banco afectou o lucro tributário através de uma variação patrimonial negativa no montante de EUR. 77 624 645,85, no qual está incluída a importância de EUR. 12 001 787,53, que respeita aos duodécimos de amortização de reformas antecipadas dos anos 1995, 1996, 1998, 1999, 2000 e 2001, não tendo registado qualquer desses valores em custos na conta 7322926. As situações em causa, por se referirem a reformas antecipadas, não têm enquadramento no art.º 40º do CIRC, uma vez que estamos perante encargos efectivamente suportados pelo Banco e que constituem verdadeiros direitos adquiridos pelos trabalhadores, que geram rendimentos tributáveis em IRS na esfera do beneficiário, encontrando-se, desta forma, desprovidas de carácter de incerteza quanto à efectividade de custos que caracterizam as situações enquadráveis no citado artigo. Assim sendo, o enquadramento deve ser efectuado nos termos previstos no art.º 23º do CIRC. O facto da responsabilidade ser transferida para o Fundo de Pensões, não sendo o Banco a suportar directamente os encargos com os trabalhadores, não constitui objecção a que as contribuições efectuadas possam ter enquadramento no art.º23º do CIRC. (…) Deste modo, o Banco só poderá considerar como custo fiscalmente dedutível a parte proporcional das contribuições efectuadas para o Fundo de Pensões, que corresponda aos encargos que suportaria com os trabalhadores, caso fosse este a pagar directamente as pensões. Assim, de acordo com a informação disponibilizada pelo sujeito passivo, será aceite para efeitos fiscais o montante total pago pelo Fundo aos trabalhadores reformados antecipadamente nos anos de 2001 e 2001. (…)”(cfr. fls. 93 a 132 dos autos);
K) No exercício de 2000, foi efectuada uma correcção à provisão para menos-valias de outras aplicações, relativa ao imóvel referido em F) que antecede, no valor de €161.087,66 (cfr. fls. 93 a 132 dos autos);
L) Na acção inspectiva realizada ao exercício de 2002, não foi identificada pelos serviços de inspecção qualquer provisão para além dos limites legais quanto aos clientes identificados para efeitos do cálculo do excesso de provisão no exercício de 2001 (cfr. fls. 322 e 139 dos autos);
M) No exercício de 2002, as provisões associadas aos créditos identificados pela Administração Fiscal para efeitos do cálculo do excesso de €667.311,19 sofreram uma redução no valor global de €968.069,26 (cfr. fls. 171 a 188 dos autos);
N) No exercício de 2002, o impugnante procedeu à reposição em proveitos do montante total de €6.533.983,47, referente a provisões para créditos de cobrança duvidosa (cfr. fls. 190 a 193 dos autos);
O) No exercício de 2002, na conta de custos relativa aos créditos de cobrança duvidosa constava o valor de €1.880.296,22 (cfr. fls. 190 a 193 dos autos);
P) No exercício de 2003, o impugnante procedeu à alienação do imóvel sito na Rua ……………, em Lisboa, tendo apurado uma menos-valia no valor de €512.019,19 (cfr. fls. 195 a 200 dos autos);
Q) Em consequência da alienação referida, a provisão para menos-valia de outras aplicações relativa ao imóvel foi utilizada (cfr. fls. 190 a 193 dos autos);
R) Na sequência de acção inspectiva efectuada ao impugnante ao exercício de 2000, a Administração Fiscal apurou um excesso nas provisões para créditos de cobrança duvidosa no valor total de €533.816,23 (cfr. fls. 370 a 419 dos autos);
S) No exercício de 2000, a Administração Fiscal, no cálculo do valor do excesso das provisões, deduziu o valor de €32.294,19, a título de correcção fiscal efectuada em 1999 (cfr. fls. 421 dos autos);
T) Parte dos créditos objecto de correcção no exercício de 2000 não constam do mapa de créditos de cobrança duvidosa e respectiva provisão com referência a 31 de Dezembro de 2001 (cfr. fls. 233 a 248 dos autos);
U) O valor de €558.472,01, relativo a créditos que foram tributados oficiosamente nos exercícios de 1999 e 2000, no exercício de 2001, foi transferido para a rubrica de provisões para crédito vencido (cfr. fls. 233 a 248 dos autos);
V) Em 12-11-2004, foi emitida a liquidação adicional de IRC do exercício de 2001, nº …………………, e respectivos juros compensatórios, tendo sido apurado um valor a pagar de €1.703.880,57 (cfr. fls. 247 do PAT apenso);
W) Os juros compensatórios considerados devidos nos termos do artigo 94º do Código do IRC foram calculados desde o dia 1 de Junho de 2002 até ao dia 10 de Fevereiro de 2004 (cfr. fls. 166 dos autos);
X) Em 21-7-2005, o ora impugnante apresentou reclamação graciosa do acto de liquidação referido em V) que antecede (cfr. fls. 59 a 91 dos autos);
Y) O impugnante procedeu ao pagamento por conta, nos termos do artigo 86º do CPPT, do montante do imposto e correspondentes juros compensatórios, devidos pela desconsideração, para efeitos fiscais, do custo subjacente à anulação de juros de mora (cfr. fls. 163 dos autos);
Z) Em 17-10-2006, por despacho do Director de Finanças Adjunto da Direcção de Finanças de Lisboa, o acto de liquidação que constitui o objecto da presente impugnação foi revogado parcialmente, na parte correspondente aos juros compensatórios calculados sobre os pagamentos por conta, no montante de €95.342,79 (cfr. fls. 421 do PAT apenso).
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Inexistem factos não provados com relevância para a decisão da causa.
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A decisão da matéria de facto efectuou-se, essencialmente, no teor dos documentos, não impugnados, constantes dos autos, conforme referido a propósito de cada alínea do probatório.
Cumpre, no entanto, esclarecer a motivação específica quanto a alguns dos factos considerados provados, uma vez que os documentos juntos aos autos pelo impugnante carecem da devida interpretação.
Quanto aos factos constantes das alíneas M), N), P), T) e U) do probatório, importa referir que os documentos juntos pelo impugnante para prova dos mesmos são documentos da sua contabilidade, sendo certo que os dados e apuramentos inscritos nesta, nos termos do artigo 75º, nº 1 da Lei Geral Tributária, se presumem verdadeiros e que os Serviços de Inspecção Tributária consideraram que a contabilidade do impugnante se encontrava organizada de acordo com a normalização contabilística (cfr. documento de fls. 93 a 132 dos autos).
Relativamente à redução do valor das provisões associadas aos créditos identificados pela Administração Fiscal – alínea M) dos factos provados – do documento constante de fls. 171 resulta que no ano de 2002 foi efectuada uma redução das provisões no valor global de €968.069,26.
Quanto aos factos constantes das alíneas M) e N), verifica-se, pela análise do balancete do impugnante, em 31 de Dezembro de 2002, que na conta 7900 – P/ Crédito de cobrança duvidosa – conta de custos, de acordo com o Plano de Contas do Sistema Bancário – consta o valor de 1.880.296,22, e na conta 8400 – P/ Crédito de cobrança duvidosa – conta de proveitos, de acordo com o já referido Plano de Contas, consta o valor de €6.533.983,47.
Por último, da análise dos documentos constantes de fls. 233 a 248 dos autos, resulta que os créditos objecto de correcção no exercício de 2000 não constam do mapa de créditos de cobrança duvidosa e respectiva provisão, tendo sido transferidos para a rubrica de crédito vencido.”
3.2 DE DIREITO
Assente a factualidade apurada cumpre, então, antes de mais, entrar na análise da excepção suscitada.
A competência dos tribunais administrativos, em qualquer das suas espécies, é de ordem pública e o seu conhecimento precede o de outra matéria - art. 13º do C. P. T.A., aplicável “ex vi” art. 2º, al. c), do C. P. P. Tributário.
Significa isto que é um pressuposto de conhecimento oficioso, quer se trate de incompetência absoluta (em razão da matéria ou da categoria do tribunal) quer se trate de incompetência relativa (em razão do território) e que o seu conhecimento tem prioridade sobre qualquer outro assunto.
A incompetência em razão da hierarquia determina a incompetência absoluta do tribunal, a qual é do conhecimento oficioso e pode ser arguida até ao trânsito em julgado da decisão final ( cfr. art. 16º do C.P.P. Tributário ).
A declaração de incompetência em razão da hierarquia permite que o interessado requeira a remessa do processo ao tribunal competente, que deve ser indicado na decisão que a declare, para o que dispõe do prazo de 14 dias a contar da notificação daquela decisão ( cfr. arts. 18.º, n.º 2, do C.P.P.T. ).
Ora, nos termos do art. 280º nº 1 do C.P.P.T., das decisões dos Tribunais Tributários de 1.ª Instância cabe recurso a interpor, em primeira linha, para os Tribunais Centrais Administrativos, salvo quando a matéria for exclusivamente de direito, caso em que tal recurso tem de ser interposto para a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.
Deste modo, para aferir da competência, em razão da hierarquia, do STA, há que olhar para as conclusões da alegação do recurso e verificar se, perante elas, as questões controvertidas se resolvem mediante uma exclusiva actividade de aplicação e interpretação de normas jurídicas, ou se, pelo contrário, implicam a necessidade de dirimir questões de facto - seja porque o recorrente defende que os factos levados ao probatório não estão provados, seja porque diverge das ilações de facto que deles se devam retirar, seja porque invoca factos que não vêm dados como provados e que não são, em abstracto, indiferentes para o julgamento da causa.
Confrontando a matéria tratada na decisão recorrida com a matéria vertida nas conclusões, as conclusões 3ª e 6ª envolvem a consideração de elementos de facto que obstam à conclusão de que a apreciação e decisão do recurso passa, em exclusivo, pelo tratamento de conceitos jurídicos, de matéria jurídica ou de direito, de modo que, é manifesto que não procede a matéria de excepção invocada pelo Exmo. Magistrado do Ministério Público.
Pelo que somos levados a concluir, sempre com o devido respeito por contrária opinião, que o presente recurso não tem por exclusivo fundamento matéria de direito, mas, também, matéria de facto, sendo, por isso, competente para o seu conhecimento esta Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul.
Cumpre, agora, entrar na análise da realidade que envolve o presente recurso jurisdicional, impondo-se indagar da existência de suporte legal para as apontadas correcções efectuadas relativamente às provisões para depreciação de títulos e imobilizações financeiras e aos custos com reformas antecipadas.
Nas suas alegações, e quanto ao primeiro elemento, a Recorrente aponta que tendo-se concluído na decisão recorrida que “ (…), não prevendo o Código do IRC qualquer ajustamento ao valor das provisões constituídas no âmbito da disciplina definida pelo Banco de Portugal, (…), não pode a Administração Fiscal, sem qualquer suporte legal, impor ajustamentos no Quadro 07 da Declaração de Rendimentos de IRC – Modelo 22.” e sendo certo que a al. d) do nº 1 do Aviso nº 3/95 do Banco de Portugal determina a constituição obrigatória da provisão para menos-valias de títulos e imobilizações financeiras, dedutível nos termos do art. 34º, nº 1, al. d) do CIRC, pelos limites mínimos, tal como decorre do referido Aviso, conclui-se a pp. 11 do relatório de inspecção tributária (sendo esse o fundamento essencial da presente correcção), perante os elementos apresentados pela impugnante, que a mesma contrariou o disposto no art. 34º, nº 1, al. d) do CIRC, conjugado com o estabelecido no nº 3 do nº 10º do Aviso nº 3/95 do Banco de Portugal, de acordo com o qual, na ausência de preço de mercado, será considerado o valor presumível de transacção em função, nomeadamente, das características do activo e da situação financeira da entidade emitente, com base em critérios prudentes de avaliação, sendo que constando de pp. 25 e ss. do relatório de inspecção as razões adicionais que fundamentam a efectivação da correcção em causa, anteriormente reproduzidas, impõe-se, contudo, face ao seu carácter elucidativo, salientar o seguinte excerto:
“ (…) Como os títulos em questão não estão cotados na Bolsa de Valores, o sujeito passivo determinou o preço de mercado ou de referência com base no valor dos capitais próprios das empresas participadas utilizando como referência os balanços reportados a 31/12/2000 e comparou-o com o valor registado na contabilidade em 31/12/2001, para efeitos da constituição da provisão para menos-valias.
Desta forma, a menos-valia apurada tem associado um valor de referência e um valor contabilístico respeitantes a diferentes períodos de tempo, sendo por consequência incomparáveis atendendo ao conceito estabelecido no nº 3 do nº 10 do já citado Aviso.
Tendo presente que o sujeito passivo na determinação do presumível preço de mercado se socorreu do valor contabilístico da participação, apurado com base nos capitais próprios das sociedades participadas, (…), o mesmo só é comparável com os valores do balanço a 31/12/2001 se for calculado a partir das demonstrações financeiras das participadas referenciadas àquela data”, sendo certo, por outro lado, que, na data da entrega da declaração mod. 22, a ora impugnante já poderia dispor da informação relativa às demonstrações financeiras das participadas, com referência a 31/12/2001, sendo-lhe possível proceder aos ajustamentos necessários no Quadro 07 da referida declaração de forma a respeitar a exigência contida no nº 3 do nº 10º do Aviso nº 3/95 do Banco de Portugal, bem como o estabelecido no art. 34º, nº 1, al. d) do CIRC no respeitante à dedutibilidade fiscal da provisão em causa.
Para enquadrar a realidade agora apontada, diga-se como se aponta no Ac. deste Tribunal de 28-04-2009, Proc. nº 02577/08, www.dgsi.pt, também citado na decisão recorrida, que: “… Provisão é um fundo criado pela empresa, levado a custos ou encargos do exercício, e destinado a fazer face a prejuízos que se esperam, mas cujo valor não se conhece ainda com precisão.
Segundo as considerações técnicas do POC, a constituição de provisões deve respeitar apenas às situações a que estejam associados riscos e em que não se trate apenas de uma simples estimativa de um passivo certo. A constituição de provisões baseia-se nos princípios contabilísticos da especialização e da prudência. Estabelece o primeiro que os proveitos e os custos são reconhecidos quando obtidos ou incorridos independentemente do seu recebimento ou pagamento, e devendo incluir-se nas demonstrações financeiras dos períodos a que respeitam, e o segundo que é possível integrar nas contas um grau de precaução ao fazer as estimativas exigidas em condições de incerteza sem, contudo, permitir a criação de reservas ocultas ou provisões excessivas ou a deliberada quantificação de activos e proveitos por defeito ou de passivos e custos por excesso. A não constituição ou a constituição por montantes inferiores de provisões num determinado exercício poderá fazer deslocar para exercícios futuros custos ou perdas pertencentes a este e, em contrapartida, a constituição de provisões desnecessárias ou em montante excessivo difere a tributação dos resultados.
Ao enunciarem-se neste artigo taxativamente as provisões que são fiscalmente dedutíveis e os respectivos limites, adopta-se para efeitos de determinação do lucro tributável uma especialização dos exercícios, de acordo com as regras definidas pelo legislador fiscal, que poderão não coincidir com as que resultam dos critérios contabilísticos.
Face à definição de critérios objectivos de constituição ou reforço das provisões definidas nos art.ºs 33.º a 35.º e à periodização do lucro tributável definida no n.º1 do art.º 18.º, a constituição dasprovisões é obrigatória para efeitos fiscais, pelo que, quando o sujeito passivo não constitua a provisão que, de acordo com os critérios definidos, deveria ter constituído, originará a não aceitação para efeitos fiscais, no exercício em que se vier a efectivar, do custo ou perda não objecto de provisão. …
O papel das contas de provisões é importantíssimo: permitem uma maior regularidade na escrituração dos prejuízos ou apuramento dos resultados, evitando que se venha a afectar desfavorável ou desmesuradamente os eventos que conduziram anteriormente à constituição das provisões - cfr. Rogério Fernandes Ferreira, Gestão Financeira, Vol. I, Parte Geral, 4.ª Edição, págs. 353 e 354 e Manuel Henrique de Freitas Pereira, A Periodização do Lucro Tributável; Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal (152), pág. 172.
Apesar de só no futuro se conhecer o montante exacto do possível prejuízo, a empresa, de acordo com o princípio da prudência, deverá já nesse exercício criar uma provisão com tal fim.
Estamos, assim, em face de perdas, muito embora actuais, não efectivadas ainda, mas que poderão concretizar-se em exercícios futuros.
A constituição de provisões tem como finalidade essencial incluir em custos ou perdas de certo exercício uma dotação que de outro modo nele não figuraria, por lhe faltar justificação documental para a respectiva movimentação – falta de justificação que a constituição da provisão vem justamente suprir.
Nesta conformidade, diremos que as contas de provisões são aquelas onde se inscrevem as verbas destinadas a contrabalançar os encargos ou prejuízos estimados e actuais, de provável processamento futuro, ou, sendo certa a sua ocorrência futura, apenas o seu montante é actualmente incerto.
Sob a epígrafe Regime das Provisões, dispõe a norma do art.º 33.º do CIRC:
1 Podem ser deduzidas para efeitos fiscais as seguintes provisões:
a) As que tiverem por fim a cobertura de créditos resultantes da actividade normal que no fim do exercício possam ser considerados de cobrança duvidosa e sejam evidenciados como tal na contabilidade;
b) As que se destinarem a cobrir as perdas de valor que sofrerem as existências;
...
d) As que tiverem sido constituídas de harmonia com a disciplina imposta pelo Banco de Portugal e pelo Instituto de Seguros de Portugal às empresas submetidas à sua fiscalização, incluindo as provisões técnicas que as empresas seguradoras se encontram legalmente obrigadas a constituir. …
Constituindo a provisão um custo do exercício e de constituição obrigatória para efeitos fiscais, como acima se disse, não pode a sua constituição fazer-se a belo prazer do contribuinte e desta forma permitir-se manipular os resultados do exercício, tendo a sua constituição de cingir-se também, a entre outras, às regras da especialização dos exercícios, como os demais custos, nos termos do disposto nos art.ºs 17.º e 18.º do CIRC.
No caso de provisões permitidas para o sector bancário, o legislador - citada alínea d) do n.º1 do art.º 33.º - através de lei formal, estabeleceu uma verdadeira delegação de competências em entidade não tributária – o Banco de Portugal – para definir, ele próprio, os fins e limites da constituição das provisões, apenas podendo ser consideradas verdadeiras provisões aquelas que sejam subsumíveis às normas para o efeito criadas pelo Banco de Portugal, ou que este, venha a aceitar, por posterior acto individual. …”.
A partir daqui, surge o Aviso n.º 3/95 que estabelece, de modo geral e abstracto e em função do risco associado ao crédito concedido, a obrigatoriedade de constituição de provisões, aludindo, neste domínio, de forma inequívoca às provisões para menos-valias de títulos e imobilizações financeiras (art. 1º al. d) ).
Neste ponto, cumpre ter presente o exposto no probatório, do qual se retira que a Administração Fiscal efectuou uma correcção no valor de €293.356,42, relativo a provisões para depreciação de títulos e imobilizações financeiras, sendo que, quanto à correcção agora referida, consta do Relatório dos Serviços de Inspecção Tributária o seguinte: “Para alguns títulos de rendimento variável, sem cotação na Bolsa de Valores, referentes a empresas participadas, e relativamente aos quais o Banco facultou o Balanço, reportado a 31/12/2001, constatou-se que o valor de mercado apurado, com base na percentagem dos capitais próprios evidenciados naquelas peças contabilísticas, era superior ao considerado pelo Banco. Esta diferença, de acordo com a informação prestada pelo Banco, adveio da utilização dos balancetes das sociedades participadas reportados a 31/12/2000, para efeitos de apuramento do valor do mercado. Contudo, este facto não impossibilitou o Banco de ter efectuado os ajustamentos necessários para efeitos fiscais no Quadro 07 da declaração de rendimentos mod. 22, dado que na data da sua entrega, em 29/05/2002, já seria possível ter a informação respeitante às demonstrações financeiras das participadas, com referência a 31/12/2001. (…)” (cfr. fls. 93 a 132 dos autos).
Já vimos que a provisão para menos valias de títulos e imobilizações financeiras é de constituição obrigatória, devendo corresponder ao total das menos valias latentes dos respectivos activos (artigo 10º do referido Aviso nº 3/95), sendo que se considera que existem menos valias latentes quando “o preço de mercado ou, em condições específicas a definir pelo Banco de Portugal, o valor de referência de um activo, forem inferiores ao seu valor de inscrição no balanço” e que “na ausência de preço de mercado, será considerado o valor presumível de transacção em função, nomeadamente, das características do activo e da situação financeira da entidade emitente, com base em critérios prudentes de avaliação” ( artigo 10º nº 3 do Aviso nº 3/95 ).
Nesta sequência, e como bem nota a decisão recorrida, atenta a fundamentação da correcção efectuada, a questão que se coloca é a de saber se para determinar o preço de mercado a que se refere o artigo 10º nº 3 do Aviso nº 3/95, a ora Recorrida deveria ter recorrido às demonstrações financeiras das sociedades de que detinha títulos relativas ao exercício de 2001, para o que importa ter presente o regime legal das demonstrações financeiras das sociedades comerciais.
Neste domínio, o enquadramento da matéria por parte da AT não é o melhor, dado que, com referência ao elemento eleito como fundamental nesta matéria, o relatório de inspecção aponta que “na data da sua entrega, em 29/05/2002, já seria possível ter a informação respeitante às demonstrações financeiras das participadas, com referência a 31/12/2001”.
Ora, esta formulação é inaceitável, só por si, na medida em que pretende conferir determinado relevo a um elemento que, afinal, não é um dado adquirido, matéria que se repete no âmbito do presente recurso, onde se refere que “já poderia dispor da informação relativa às demonstrações financeiras das participadas, com referência a 31-12-2001”.
Esta situação confere pertinência ao exposto na decisão recorrida quando se aponta que considerando o prazo de que as sociedades dispõem para a apresentação dos documentos referidos no nº 5 do artigo 65º do Código das Sociedades Comerciais - 3 ou 5 meses, contados da data do encerramento de cada exercício anual - resulta claro que à data do encerramento da contabilidade relativa ao exercício de 2001, ou seja, 31 de Dezembro de 2001, o impugnante não dispunha das demonstrações financeiras das participações relativas àquele exercício, o que é reconhecido pela Administração Fiscal, o que significa que, atenta a impossibilidade de o impugnante reflectir na sua contabilidade, designadamente nas contas da classe 79 – Provisões do exercício, o preço de mercado calculado com base no valor dos capitais próprios em 31 de Dezembro de 2001, resta saber se impendia sobre o impugnante a obrigação de proceder às alterações devidas no Quadro 07 da Declaração de Rendimentos - Modelo 22, relativa ao exercício de 2001, como considerou a Administração Fiscal.
Neste ponto, como se apontou, a formulação equívoca do relatório de inspecção não permite sequer considerar tal matéria, na medida em que nem sequer foi demonstrado nos autos o pressuposto de facto que poderia enquadrar tal questão.
Além disso, como sublinha a decisão recorrida, “as sociedades que devem apresentar as contas consolidadas ou que apliquem o método da equivalência patrimonial podem apresentar as suas contas até cinco meses após a data de encerramento de cada exercício anual, ou seja, até dia 31 de Maio, data que coincide com o termo do prazo de entrega da declaração de rendimentos IRC – Modelo 22. Ora, o valor dos capitais próprios das sociedades é utilizado como critério determinativo do preço de mercado do activo para proceder ao apuramento das menos-valias latentes que impõem a constituição da provisão a que se refere o artigo 10º do Aviso nº 3/95, do Banco de Portugal, pelo que não se pode deixar de considerar que o preço de mercado terá de ser apurado no momento da constituição da provisão – 31 de Dezembro - logo, com base nas demonstrações financeiras disponíveis nessa data que podem não coincidir, atentos os prazos de apresentação já referidos, com as demonstrações do final do exercício a que as provisões respeitam.
Por outro lado, e fundamental neste âmbito, considerando o momento em que a provisão se constitui (31-12), é manifesto que a mesma tem de ser enquadrada em função dos elementos disponíveis e conhecidos nessa data, impondo-se ter presente que a provisão visa obviar a uma menos-valia potencial ou latente cujo quantitativo é por definição incerto e apenas estimado aquando da constituição da provisão.
Assim, e uma vez que não se discute que as demonstrações financeiras das entidades em questão, por referência ao período em apreço apenas estariam disponíveis em momento posterior e ainda que não é posto em causa o critério utilizada pela Recorrida com referência ao disposto no art. 10º nº 3 do Aviso nº 3/95, mas apenas a expressão do mesmo com referência ao suporte utilizado, não pode acolher-se a tese da Recorrente, a qual, como bem nota a Recorrida, coloca em crise a própria figura da provisão, na medida em que teria de corrigir-se toda e qualquer provisão, por excessiva ou insuficiente, em função do efectivo valor de transacção dos activos só conhecido a posteriori.
Nesta medida, não se vislumbra que a conduta da Recorrida tenha posto em causa, quer em abstracto, quer em concreto, o disposto no nº 3 do art. 10º do Aviso nº 3/95, não lhe sendo legalmente exigível a utilização dos elementos referenciados pela AT, indisponíveis à data de constituição das provisões, além de que, como bem se conclui na decisão recorrida, não prevendo o Código do IRC qualquer ajustamento ao valor das provisões constituídas no âmbito da disciplina definida pelo Banco de Portugal, como resulta, desde logo, do disposto no artigo 34º, nº 1, alínea d) daquele Código, não pode a Administração Fiscal, sem qualquer suporte legal, impor ajustamentos no Quadro 07 da Declaração de Rendimentos IRC - Modelo 22, não podendo proceder o recurso neste âmbito.
A Recorrente discute ainda a questão dos custos com reformas antecipadas, referindo que a decisão recorrida concluiu que o critério utilizado pela AF carece de apoio legal, sendo que, tal como resulta de pp. 14 do relatório de inspecção, foi considerado que tais situações não se revelam susceptíveis de enquadramento no disposto no art. 40º do CIRC, havendo, antes, lugar à aplicação do regime constante do art. 23º do CIRC, facto que determina que apenas seja considerada como custo fiscal a parte proporcional das contribuições para o Fundo de Pensões correspondente aos encargos que seriam suportados pela impugnante na eventualidade de ser esta a proceder, de forma directa, ao pagamento das pensões e acresce que, na medida em que a transferência das responsabilidades com reformas antecipadas para o fundo de pensões implica a efectivação de dotações no exercício em que aquelas se verificam, as quais representam encargos suportados pela ora impugnante até que ocorram os pressupostos para a reforma plena dos trabalhadores, a dotação efectuada num determinado exercício deverá, para efeitos de determinação do resultado fiscal e em obediência ao princípio contabilístico da especialização dos exercícios, aplicável ex vi do disposto no art. 18º do CIRC, ser reconhecida nos exercícios aos quais respeitam os encargos que lhe estão subjacentes.
Por outro lado, o critério utilizado pela impugnante origina uma duplicação de custos no ano em que os trabalhadores se reformam antecipadamente, no qual se procede, também, à efectivação de uma contribuição para o fundo de pensões, considerando que, nesse mesmo ano, são reconhecidas como custo não só as remunerações pagas até à situação de reforma antecipada mas também a dotação correspondente ao exercício em que a mesma ocorre, razão pela qual, no ano em causa, a impugnante considerou como custo fiscal as remunerações de cerca de 14% dos trabalhadores que passaram à situação de reforma antecipada nos meses de Novembro e Dezembro de 2001 (relativamente aos quais não ocorreu, no questionado exercício, qualquer pagamento de reformas), bem como o valor relativo à dotação, para o fundo de pensões, correspondente à responsabilidade da impugnante relativa a todo o ano de 2001.
Nesta matéria, a sentença recorrida começou por considerar, de forma pertinente que:
“…
Nos termos do Aviso nº 12/2001, do Banco de Portugal, “Os bancos (…) devem, anualmente, reconhecer o acréscimo de responsabilidades por pensões de reformas e de sobrevivência (…)” (artigo 1º), sendo que estes acréscimos são registados numa conta adequada de “Exigibilidades”, tendo como contrapartidas, entre outros, os acréscimos de responsabilidades resultantes de programas de reformas antecipadas que serão registados em “Despesas com custo diferido” (artigo 2º, nº 1, alínea c), do mesmo Aviso).
De acordo com o artigo 3º do referido Aviso, “Os valores registados em “Despesas com custo diferido” e em “Receitas com proveito diferido” devem ser amortizadas nos termos das alíneas seguintes: i) Os valores relativos a acréscimos de responsabilidades resultantes de programas de reformas antecipadas, a que se refere a alínea c) do nº 1, por contrapartida de “Resultados extraordinários – Perdas relativas a exercícios anteriores”, no prazo máximo de 10 anos a contar da data efectiva da reforma, não podendo, porém, ser ultrapassado o quarto exercício seguinte ao do ano em que presumivelmente a reforma ocorreria; (…)”.
Entende a Administração Fiscal, em sede de Informação da Divisão de Justiça Contenciosa e seguindo o entendimento adoptado pelos Serviços de Inspecção Tributária, que o procedimento contabilístico adoptado pelo impugnante não respeita o princípio da especialização dos exercícios, na medida em que releva em todos os exercícios o mesmo montante, quando os valores efectivamente pagos pelo fundo de pensões aos beneficiários até à idade da reforma pode divergir do montante inicialmente calculado pelo banco como encargo futuro, mercê das várias alterações a que estão sujeitos os factores que contribuíram para o seu cálculo, razão pela qual, conclui, não pode proceder a pretensão do impugnante de ver reconhecido fiscalmente, em cada exercício económico, uma parcela constante do montante que inicialmente calculou como sendo o que iria suportar de encargos futuros com pensões.
A primeira questão que se coloca é a de saber se, prevendo o Aviso nº 12/2001, do Banco de Portugal, o reconhecimento do acréscimo de responsabilidades por pensões de reforma, bem como a amortização dos valores relativos a acréscimos de responsabilidades resultantes de programas de reformas antecipadas, no prazo máximo de 10 anos a contar da data efectiva da reforma, essa amortização assume relevância fiscal, designadamente para efeitos de dedução de custos, sendo certo que não está em causa nos autos que o enquadramento contabilístico efectuado pelo impugnante se encontra de acordo com o disposto no referido Aviso.
É a seguinte a redacção do artigo 17º, nº 1 do Código do IRC: “O lucro tributável das pessoas colectivas e outras entidades mencionadas na alínea a) do nº 1 do artigo 3º é constituído pela soma algébrica do resultado líquido do exercício e das variações patrimoniais positivas e negativas, verificadas no mesmo período e não reflectidas naquele resultado, determinados com base na contabilidade e eventualmente corrigidos nos termos deste Código”.
Considerando que só em matéria de provisões o Código do IRC [cfr. o seu artigo 34º, nº 1, alínea d)] remete expressamente para a regulamentação do Banco de Portugal, uma vez que aceita como custos as provisões constituídas ao abrigo daquela, o facto de o impugnante se encontrar obrigado, enquanto instituição bancária, a proceder à amortização dos valores relativos a acréscimos de responsabilidades no prazo máximo de 10 anos, nos termos do artigo 3º do Aviso nº 12/2001, do Banco de Portugal, não assume, por si só, relevância fiscal em sede de custos, sendo certo que o Banco de Portugal carece de competência para o efeito.
De facto, a aplicação das regras contabilísticas a que o impugnante se encontra obrigado não afasta o juízo sobre o enquadramento dos valores por si deduzidos no conceito de custo fiscal, na exacta medida em que esse juízo tem igualmente de ser efectuado quanto aos demais custos contabilísticos que não constituem custos fiscais (pense-se nas menos-valias latentes ou potenciais que, em regra, não são consideradas um custo fiscal, embora constituam um custo contabilístico). …”.
Neste domínio, importa notar que o princípio da especialização dos exercícios tem em vista não permitir ao contribuinte manipular o apuramento do lucro tributável de acordo com aquilo que for mais conveniente para a respectiva tributação, devendo as circunstâncias imprevisíveis ou manifestamente desconhecidas que não permitiram ao contribuinte determinar-se pelo cumprimento da regra da imputação dos custos ou proveitos ao exercício do ano a que diziam respeito previstas no nº 2 do mesmo artigo, serem por este invocadas e provadas.
Por outro lado, em com referência ao que ficou exposto, cabe sublinhar que, tal como se aponta na decisão recorrida, o enquadramento legal para a correcção efectuada pela AT no que concerne aos custos com reformas antecipadas situa-se ao nível do art. 23º do CIRC, sendo de notar que vigora no nosso ordenamento jurídico o princípio constitucional segundo o qual as empresas devem ser fundamentalmente tributadas de acordo com o seu lucro real. Decorre daqui que, por regra, têm relevância fiscal todos os encargos suportados pelas sociedades na prossecução dos seus objectivos estatutários.
Decerto que esta regra comporta excepções. Num sistema como o nosso, em que as regras e princípios da contabilidade funcionam como um prius em relação à regulação fiscal do balanço económico da empresa, é forçoso que a lei fiscal introduza no resultado contabilístico pontuais correcções, por forma a acautelar certos interesses fiscais autónomos a que este é alheio.
A noção de custo fiscal é porventura a que mais diverge da sua homóloga contabi­lística, existindo vários tipos de encargos que, sendo normalmente reconhecidos para efeitos da contabilidade, não são admitidos na modelação do resultado fiscal.
Ainda que de uma forma limitada, é possível que certos custos, efectivamente suportados pela empresa, não assumam - apesar disso - o relevo fiscal correspondente. Todavia, sempre estes casos excepcionais hão-de estar previstos na lei, sob pena de intolerável ofensa ao princípio da legalidade. De facto, as normas de determinação da matéria colectável que desenvolvem as regras de incidência - como claramente sucede com as que recortam a noção de custo fiscal - modelam de forma directa o resultado fiscal, pelo que onde a lei não preveja expressamente desvios ao princípio da relevância dos custos, não podem eles deixar de ser fiscalmente aceites.
Note-se, aliás, que, neste domínio, o recurso à analogia aparece vedado, quer por força do princípio da legalidade - que reserva à lei formal a definição dos elementos essenciais da vida do imposto -, quer por as normas excepcionais - como são as que recusam a relevância fiscal de certos custos - não poderem ser objecto de analogia, nos termos do art. 11° do Código Civil.
De acordo com a formulação do art. 23° do CIRC, consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora.
Muito embora a indispensabilidade do custo constitua um conceito indeterminado, que carece de preenchimento, a verdade é que aí o poder da Administração é rigorosamente vinculado: não lhe assiste qualquer margem de livre apreciação, nem lhe cabe formular juízos de oportunidade. Da mesma forma, não está em causa qualquer especial saber técnico, juízo de mediação ou valoração pessoal. Trata-se antes de um juízo de tipo cognoscitivo - rigorosamente controlável pelo tribunal - o qual se há-de basear exclusivamente no quadro factual que consta do procedimento.
É exactamente por ser assim que o art. 23° do CIRC não pode ser usado como mecanismo de controlo da validade, consoante a correspondente rentabilidade, dos actos de gestão das empresas, pois que, num ordenamento jurídico que reconheça expressamente a liberdade de iniciativa económica e o direito de propriedade privada, a bondade das opções empresariais não pode ser sindicada pela Administração, a menos que sobre elas recaia a suspeita de que são ilegais.
Por outro lado, a indispensabilidade do custo não pode aferir-se nem função da sua aptidão para gerar, de imediato, a realização de um ganho, nem em função da sua importância para a capacidade de subsistência da empresa. Basta aliás ter em conta que muitos dos exemplos de custos fiscalmente aceites fornecidos pelo legislador não determinam a obtenção directa de proveito algum, nem se podem considerar vitais para a manutenção da fonte produtora (por exemplo, as despesas com regimes complementares de segurança social ou os encargos suportados com diferenças de câmbio).
Na verdade, o corpo do n.º 1 do art. 23º do CIRC apenas permite a desconsideração fiscal dos custos extra-empresariais, isto é, daqueles que não apresentam qualquer afinidade com a actividade da empresa, como os encargos com despesas privadas dos sócio ou com terceiros, estranhos à empresa. A sua aplicação para desconsiderar fiscalmente um custo efectivamente suportado está, portanto, circunscrita às situações de confusão entre o património empresarial e o património pessoal dos sócios, bem como àquelas em que a empresa, em detrimento do seu património, pretende beneficiar terceiro.
A partir daqui, vai sendo tempo de voltar a considerar a matéria vertida no probatório a propósito da correcção agora em análise:
I) A Administração Fiscal efectuou uma correcção no valor de €3.023.085,75, ao nível dos custos, relativo a contribuições para fundos de pensões (cfr. fls. 93 a 132 dos autos);
J) Quanto à correcção referida em I) que antecede, consta do Relatório dos Serviços de Inspecção Tributária, além do mais, o seguinte: “O Banco regista na conta “5578 – Despesas com custo diferido – contribuições p/ fundo de pensões” as dotações efectuadas para financiar o acréscimo das responsabilidades decorrentes das reformas antecipadas. Estas despesas são amortizadas num período aproximadamente de 10 anos, sendo que no ano 2001 o montante abatido à conta 5576 foi em contrapartida da utilização de contas de reservas (rubrica 63 do PCSB). Constatou-se que, durante o exercício de 2001, o Banco afectou o lucro tributário através de uma variação patrimonial negativa no montante de EUR. 77 624 645,85, no qual está incluída a importância de EUR. 12 001 787,53, que respeita aos duodécimos de amortização de reformas antecipadas dos anos 1995, 1996, 1998, 1999, 2000 e 2001, não tendo registado qualquer desses valores em custos na conta 7322926. As situações em causa, por se referirem a reformas antecipadas, não têm enquadramento no art.º 40º do CIRC, uma vez que estamos perante encargos efectivamente suportados pelo Banco e que constituem verdadeiros direitos adquiridos pelos trabalhadores, que geram rendimentos tributáveis em IRS na esfera do beneficiário, encontrando-se, desta forma, desprovidas de carácter de incerteza quanto à efectividade de custos que caracterizam as situações enquadráveis no citado artigo. Assim sendo, o enquadramento deve ser efectuado nos termos previstos no art.º 23º do CIRC. O facto da responsabilidade ser transferida para o Fundo de Pensões, não sendo o Banco a suportar directamente os encargos com os trabalhadores, não constitui objecção a que as contribuições efectuadas possam ter enquadramento no art.º23º do CIRC. (…) Deste modo, o Banco só poderá considerar como custo fiscalmente dedutível a parte proporcional das contribuições efectuadas para o Fundo de Pensões, que corresponda aos encargos que suportaria com os trabalhadores, caso fosse este a pagar directamente as pensões. Assim, de acordo com a informação disponibilizada pelo sujeito passivo, será aceite para efeitos fiscais o montante total pago pelo Fundo aos trabalhadores reformados antecipadamente nos anos de 2001 e 2001. (…)”(cfr. fls. 93 a 132 dos autos).
Com este pano de fundo, resulta claro que não pode acompanhar-se a decisão recorrida quando, depois de dizer que “tendo presente que o facto das reformas antecipadas serem pagas pelo Fundo de Pensões e não pelo impugnante não obsta a que o custo com as dotações para o Fundo assuma relevância fiscal - o que a Administração Fiscal aceita”, acaba por apontar que “não podemos deixar de concluir que o critério utilizado por aquela carece de apoio legal, uma vez que o que releva para efeitos fiscais são as dotações efectuadas ao Fundo e não o valor pago por este, já que o custo suportado pelo contribuinte corresponde ao valor daquelas dotações e não ao valor efectivamente pago pelo Fundo”.
Pois bem, na al. I) acima apontada é referido que a Administração Fiscal efectuou uma correcção no valor de €3.023.085,75, ao nível dos custos, relativo a contribuições para fundos de pensões, sendo que no relatório de inspecção é apontado que o Banco só poderá considerar como custo fiscalmente dedutível a parte proporcional das contribuições efectuadas para o Fundo de Pensões, que corresponda aos encargos que suportaria com os trabalhadores, caso fosse este a pagar directamente as pensões, dizendo-se depois que de acordo com a informação disponibilizada pelo sujeito passivo, será aceite para efeitos fiscais o montante total pago pelo Fundo aos trabalhadores reformados antecipadamente nos anos de 2001 e 2001.
Ora, a sentença recorrido isolou este elemento de forma precipitada, pois que está em causa apenas a expressão do critério definido, que corresponde à parte proporcional das contribuições efectuadas para o Fundo de Pensões, que corresponda aos encargos que suportaria com os trabalhadores, caso fosse este a pagar directamente as pensões e que se traduz no valor pago pelo Fundo nos termos descritos, de modo que, a matéria apontada na decisão recorrida traduz uma leitura incorrecta dos termos em que a AT colocou a questão.
Nesta sequência, e como bem refere a Recorrida, é assente e não vem questionado que a Recorrida apenas suporta os referidos encargos com reformas antecipadas aquando da passagem à situação de reforma antecipada, sendo que é indiscutível que a dotação realizada pela Recorrido para o Fundo de Pensões é calculada tendo por referência, estritamente, o período temporal iniciado com a passagem à situação de reforma e os encargos a suportar com pensões daí adiante.
Assim sendo, perante o que fica exposto, em função do enquadramento legal da matéria em apreço e da realidade apontada no âmbito da actuação da AT, tem de reconhecer-se que a actuação desta tem cobertura legal, pois que só o enquadramento da matéria nos termos apontados pela AF traduz a consideração desta realidade nos termos dos elementos alinhados nos autos, não podendo ser considerado neste âmbito o valor correspondente ao desfasamento entre o montante correspondente a um décimo dos encargos com a dotação global (tal como pretende a Recorrida), caso o mesmo se revele (como sucede no caso presente) superior ao montante total pago pelo Fundo aos trabalhadores reformados antecipadamente, dando melhor expressão ao comando do art. 23º do CIRC, impondo-se a procedência do recurso nesta parte.

4. DECISÃO
Nestes termos, e perante a improcedência da matéria de excepção invocada pela Exma. Magistrada do Ministério Público, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em conceder parcial provimento ao recurso jurisdicional interposto pela Recorrente, revogando-se a decisão recorrida na parte relativa à correcção efectuada quanto aos custos com reformas antecipadas, julgando-se a impugnação judicial improcedente nesta parte, mantendo-se, no mais, a decisão judicial recorrida.
Custas pela Recorrente e Recorrida, na proporção do decaimento em ambas as instâncias.
Notifique-se. D.N..
Lisboa, 27 de Novembro de 2012
Pedro Vergueiro
Pereira Gameiro
Joaquim Condesso