Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1970/11.9BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:12/13/2019
Relator:ANA PINHOL
Descritores:RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA;
GERÊNCIA DE FACTO;
PRESUNÇÃO JUDICIAL
Sumário:I.A responsabilização subsidiária ao abrigo do artigo 24.º, nº 1 da LGT exige a prova da gerência efectiva ou de facto, o efectivo exercício de funções de gerência, não se bastando com a mera titularidade do cargo, a gerência nominal ou de direito.
II. É sobre a administração tributária, enquanto exequente e como titular do direito de reversão, que recai o ónus de alegar e provar os factos integradores do efectivo exercício da gerência.
III. Não há uma presunção legal que imponha a conclusão de que quem tem a qualidade de gerente de direito exerceu a gerência de facto.
IV. A circunstância de a Oponente ter agido em representação da executada originária em momento concreto, não é viável, à luz das regras de experiência comum, extrair a conclusão de que a mesma exerceu, de facto, a gerência na dita sociedade, no período temporalmente relevante no caso.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACÓRDÃO

I.RELATÓRIO
A FAZENDA PÚBLICA veio interpor recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a OPOSIÇÃO à execução fiscal n.º ..........35 e apenso, deduzida por ARMANDINA .........., por reversão de dívidas da sociedade «B.........., Lda.», relativas a IRS dos anos de 2002 e 2007 e IRC do ano de 2003, no valor total de 145.990,59 EUR.
A Recorrente terminou as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
«A. A decisão ora recorrida, não faz, salvo o devido respeito, uma correta apreciação da matéria de facto relevante e, bem assim, total e acertada interpretação e aplicação das normas legais aplicáveis ao caso sub-judice.
B. Não se conforma a Fazenda Pública com a douta decisão recorrida, porquanto considera que da prova produzida se não podem extrair as conclusões que lhe serviram de base, determinando que se julgasse pela ilegitimidade da oponente por falta de prova, por parte da Fazenda Pública, da gerência de facto.
Senão vejamos:
C. Como se afere da leitura da Certidão Permanente do NIPC a forma de obrigar da devedora originária consistia na assinatura do gerente Delfim .......... e outro dos gerentes, incumbindo a gerente a todos os sócios, incluindo a oponente.
D. Dos autos consta escritura de Dação em Pagamento de imóveis para liquidação de dívida, junto da Caixa ..........”, da sociedade P.........., LDA., da qual a oponente também sócia.
E. Pelo que, a oponente ao assinar tal escritura na qualidade de gerente da sociedade exteriorizou, face a terceiros, a vontade da sociedade e viabilizou a atividade da sociedade.
F. Daqui decorre que a oponente tinha uma intervenção pessoal e ativa na vinculação da sociedade.
G. Neste pendor o acórdão proferido no processo n.º 01953/07 do TCA Sul, acima melhor identificado, “porque a sociedade se obrigava com a assinatura da oponente, era naturalmente de presumir, ainda que não estivesse demonstrada, a prática de alguns atos em representação da sociedade, como forma de assegurar o giro comercial. E, o facto de a oponente ter assinado documentos, mesmo que eles eventualmente constituíam os únicos documentos em que ela apôs a assinatura como representante legal da sociedade, é o suficiente para que se considere que praticou atos de gerência pois, tal como se expende no acórdão deste Tribunal Central Administrativo de 20 de Junho de 2000, proferido no recurso nº 3468/00, «Não explicitando a lei no que consiste a gerência, vem a doutrina e a Jurisprudência referindo que, como tal, se deve considerar aquela em que os gerentes praticam actos de disposição ou de administração, de acordo com o objecto social da sociedade, em nome e representação desta, vinculando-a perante terceiros.” (sublinhados nossos).
H. O legislador limita-se, na instituição da obrigação de responsabilidade, a relevar apenas o cargo de gerente, sem entrar em linha de conta se este abarca a totalidade da capacidade jurídica da sociedade ou apenas certa parcela, estando quanto a este aspeto arredada qualquer restrição da obrigação de responsabilidade.
I. Face ao exposto e contrariamente ao expendido na douta sentença, não se vislumbra qualquer ilegalidade praticada pela AT, antes se denotando o exercício da sua atividade dentro dos limites estritos da lei.
Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que julgue a oposição judicial totalmente improcedente.

PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA»

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Não foram apresentadas contra-alegações.

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O Exmo. Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal Central Administrativo, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
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Colhidos os vistos legais, cumpre agora apreciar e decidir.

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II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
Do teor das alegações do presente recurso resulta que a questão a decidir é a de saber se sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao ter considerado que não tendo a Recorrente (Fazenda Pública) feito a prova que legalmente lhe competia, quanto ao exercício de gerência de facto, concluiu pela ilegitimidade da Oponente para ser responsabilizada pelas dívidas exequendas.

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III. FUNDAMENTAÇÃO
A. DOS FACTOS
Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto e indicou-se a respectiva fundamentação nos seguintes termos:
«A) Foi registada na Conservatória de Registo Comercial de Lisboa a constituição da sociedade por quotas denominada “B.........., Lda.”, bem como a designação da ora Oponente como gerente da referida sociedade (cfr. certidão junta a fls. 101 a 105 do processo de execução apenso aos autos);
B) A partir de 24.11.2000, a sociedade identificada em A) supra obrigava-se com a assinatura conjunta do gerente Delfim .......... e de outro dos gerentes, incumbindo a gerência a todos os sócios, a saber, Delfim .........., Carlos .........., Jorge .......... e a aqui Oponente (cfr. certidão junta a fls. 101 a 105 do processo de execução fiscal apenso e escritura pública de “Divisões e Cessões de Quotas, e Alteração do contrato”, a fls. 50 a 58 dos autos);
C) Em 08.09.2003, o Oponente, em conjunto com outros sócios da sociedade identificada em A) supra, outorgou, em nome desta, escritura de “Dação em Pagamento”, nela se declarando que “deliberam, por unanimidade, proceder à Dação em Pagamento dos imóveis a seguir identificados para liquidação da dívida que a sociedade “P.........., LDA” contraiu junto da Caixa (…)”(cfr. documento junto a fls. 69 a 74 do processo de execução apenso aos autos);
D) Foram instaurados contra a sociedade identificada em A), pelo Serviço de Finanças de Loures …, os seguintes processos de execução fiscal, entretanto apensos:
1. Processo n.º .........., instaurado em 26.07.2006, por dívida de IRS (retenções na fonte) do ano de 2002 e IRC do ano de 2003, no valor total de 145.942,59 EUR;
2. Processo n.º ..........20, instaurado em 07.08.2007, por dívida de IRS do ano de 2008, no valor de 48,00 EUR.
(cfr. documentos de fls. 3 dos autos e fls. 1 a 4 do processo de execução apenso);
E) Em 01.10.2010, foi proferido despacho pelo Chefe do Serviço de Finanças de Loures …, denominado de “despacho para audição (reversão)”, no qual determinou a notificação da ora Oponente para efeitos de exercício do direito de audição prévia à reversão da execução identificada em D), constando do mesmo o seguinte:
“(…)

PROJECTO DA REVERSÃO
Dos administradores, directores ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entidades fiscalmente equiparadas por ter sido feita prova da culpa destes pela insuficiência do património da pessoa colectiva e entidades fiscalmente equiparadas para o pagamento, quando o facto constitutivo da dívida se verificou no período do exercício do seu cargo [art. 24º, n.º 1/a) LGT]. Ter sido feita prova da culpa destes pela insuficiência do património da pessoa colectiva e entidades fiscalmente equiparadas para o pagamento, quando o prazo legal de pagamento/entrega terminou depois do exercício do cargo [art. 24º, n.º 1/a) LGT]. Não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da dívida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período de exercício do cargo [art. 24º, n.º 1/b) LGT].
Os elementos da contabilidade fornecidos estão desactualizados, as instalações da sede foram impossíveis de localizar, conforme Auto de Diligências. Gerente conforme certidão permanente.”
(…)” (cfr. documento de fls. 131 do processo de execução fiscal apenso);
F) Notificada para o efeito, a Oponente apresentou, em 27.10.2010, no Serviço de Finanças de Loures …, requerimento onde exerceu o direito de audição prévia à reversão (cfr. documento de fls. 134 a 138 do processo de execução fiscal apenso);
G) Em 22.10.2010, o sócio da sociedade identificada em A) supra, Delfim .........., fez declaração escrita da qual consta que, após 24.11.2000, todos os actos de gerência da referida sociedade foram assinados e realizados por ele próprio, por Carlos .........., Jorge .......... e pela ora Oponente (cfr. documento de fls. 68 dos autos a 138 do processo de execução fiscal apenso);
H) Em 29.10.2010, foi proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Loures … despacho de reversão da execução mencionada na alínea D) supra contra a Oponente, constando como fundamentos da reversão o seguinte:
“Dos administradores, directores, ou gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração ou gestão em pessoas colectivas e entidades fiscalmente equiparadas, por não ter sido feita prova da culpa destes pela insuficiência do património da pessoa colectiva e entidades fiscalmente equiparadas para o pagamento, quando o facto constitutivo da divida se verificou no período do exercício do cargo [ art.º 24º, nº 1 al. a) LGT]. ter sido feita prova da culpa destes pela insuficiência do património da pessoa colectiva e entidades fiscalmente equiparadas para o pagamento, quando o prazo legal de pagamento/entrega terminou depois do exercício do cargo [art. 24º, nº 1, al. a) LGT], não terem provado não lhes ser imputável a falta de pagamento da divida, quando o prazo legal de pagamento/entrega da mesma terminou no período de exercício do cargo [art. 24, nº 1/b) LGT].
Declaração do próprio a assumir toda e qualquer responsabilidade da firma executada, para com a Administração Fiscal.”
(cfr. documento de fls. 183 do processo de execução fiscal apenso);
I) No seguimento do despacho mencionado em H) que antecede, foi remetido à Oponente, por carta registada com aviso de recepção, o designado ofício de “CITAÇÃO (Reversão)”, recepcionado em 16.11.2010 (cfr. documentos de fls. 185 e 187 do processo de execução fiscal apenso);
J) Em 15.12.2010, foi apresentada no Serviço de Finanças de Loures … a presente oposição (cfr. documentos de fls. 4 dos autos).
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FACTOS NÃO PROVADOS: não existem factos a dar como não provados com interesse para a decisão.
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Assenta a convicção do tribunal no exame dos documentos constantes dos presentes autos e do processo de execução apenso, não impugnados, tudo conforme referido a propósito de cada uma das alíneas do probatório.».
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B. DO DIREITO
O Tribunal Tributário de Lisboa julgou procedente a oposição, por ter concluído que a Fazenda Publica não logrou provar a legitimidade substantiva da Oponente para a execução que contra si revertera para cobrança de dívidas fiscais (IRS dos anos de 2002 e 2007 e IRC do ano de 2003) da sociedade denominada «B.........., Lda.» da qual fora nomeada gerente no respectivo pacto social.
Para assim decidir, o Meritíssimo juíz a quo entendeu, em síntese, que não obstante essa gerência nominal, o único elemento recolhido respeitante à alegada gerência de facto que possa, assim, consubstanciar um acto de gestão da sociedade, consiste na outorga pela mesma, em 08.09.2003, conjuntamente com os outros sócios da sociedade devedora originária, de uma escritura de «Dação em Pagamento» não podendo inferir-se da intervenção do mesmo que Oponente no ano anterior (em 2002) ou em 2007, tenha efectivamente exercido a gerência da sociedade devedora originária.
Contra o assim decidido se insurge a Fazenda Pública, apresentando os seguintes argumentos:
- a forma de obrigar da devedora originária consistia na assinatura do gerente Delfim .......... e outro dos gerentes, incumbindo a gerente a todos os sócios, incluindo a oponente.
- a Oponente ao assinar a escritura de Dação em Pagamento de imóveis para liquidação de dívida, junto da «Caixa ..........», da sociedade P.........., LDA., na qualidade de gerente da sociedade exteriorizou, face a terceiros, a vontade da sociedade e viabilizou a actividade da sociedade.
Apreciando.
No caso não vem questionado o regime de responsabilidade aplicado na sentença recorrida (o previsto no artigo 24.º da Lei Geral Tributária - LGT-), vejamos então se assiste razão à Recorrente, analisando o regime de responsabilidade subsidiária instituído nesse preceito legal.
O regime legal da responsabilidade subsidiária aplicável é, pois, o que decorre do artigo 24.º da LGT, nos termos do qual: « a) Pelas dívidas tributárias cujo facto constitutivo se tenha verificado no período do exercício do seu cargo ou cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado depois deste, quando em qualquer dos casos, tiver sido por culpa sua que o património da pessoa colectiva ou ente fiscalmente equiparado se tornou insuficiente para a sua satisfação;
b) Pelas dívidas tributárias cujo prazo legal de pagamento ou entrega tenha terminado no período do exercício do seu cargo, quando não provem que não lhes foi imputável a falta de pagamento».
À luz do regime da responsabilidade subsidiária descrito em qualquer uma das suas alíneas a possibilidade de reversão não se basta com a gerência de direito, exigindo-se o exercício de facto da gerência (Neste sentido, entre muitos outros, vide o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 02.03.2011, proferido no processo n.º 944/10, disponível em texto integral em www.dgsi.pt).
No que respeita ao ónus da prova, como bem salienta a sentença recorrida, é ao exequente, como titular do direito de reversão da execução fiscal contra o responsável subsidiário, que compete fazer a prova da gerência como pressuposto da obrigação de responsabilidade subsidiária.
Afirmando, nesta matéria o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (Pleno da Secção do Contencioso Tributário) de 28.2.2007, proferido no processo n.º 1132/06, que a prova da gerência de direito não permite presumir, nem legal nem judicialmente, a gerência de facto, impondo-se ao exequente fazer a respectiva alegação e subsequente prova, sob pena de contra si ser valorada a falta sobre o efectivo exercício da gerência (No mesmo sentido ver também o acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário de 21.11.2012, proferido no processo n.º 0474/12)
Sabido que são os gerentes de facto quem exterioriza a vontade da sociedade nos respectivos negócios jurídicos, que são eles quem manifesta a capacidade de exercício de direitos da sociedade, quem toma decisões sobre o destino das suas receitas e quem dá ordens de pagamento em nome e no interesse dela, exteriorizando, por essa via, a vontade da sociedade e vinculando-a com a sua assinatura perante terceiros (conforme estipula o artigo 260.º nº 4 do Código das Sociedades Comerciais -CSC-).
A gerência nominal (de direito) da Oponente quer no período em que as dívidas se constituíram, quer no período em que se venceram não vem questionada, contudo, como já afirmamos, não há uma disposição legal que estabeleça que a titularidade da qualidade de gerente faz presumir o exercício efectivo do respectivo cargo. Na verdade, há presunções legais e presunções judiciais (cfr. artigos 350º e 351º do Cód. Civil). As presunções legais são as que estão previstas na própria lei.
A este propósito, escreveu-se no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 10.12.2008, proferido no processo n.º 861/08, «[o] facto de não existir uma presunção legal sobre esta matéria, não tem como corolário que o Tribunal com poderes para fixar a matéria de facto, no exercício dos seus poderes de cognição nessa área, não possa utilizar as presunções judiciais que entender, com base nas regras da experiência comum.
E, eventualmente, com base na prova de que o revertido tinha a qualidade de gerente de direito e demais circunstâncias do caso, nomeadamente as posições assumidas no processo e provas produzidas ou não pela revertida e pela Fazenda Pública, o Tribunal que julga a matéria de facto pode concluir que um gerente de direito exerceu a gerência de facto, se entender que isso, nas circunstâncias do caso, há uma probabilidade forte (certeza jurídica) de essa gerência ter ocorrido e não haver razões para duvidar que ela tenha acontecido. (Sobre esta «certeza» a que conduz a prova, pode ver-se MANUEL DE ANDRADE, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, páginas 191-192.). Mas, se o Tribunal chegar a esta conclusão, será com base num juízo de facto, baseado nas regras da experiência comum e não em qualquer norma legal.
Isto é, se o Tribunal fizer tal juízo, será com base numa presunção judicial e não com base numa presunção legal.» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt).
Revertendo ao caso concreto dos presentes autos, tendo em conta a factualidade provada, não se pode concluir que assista razão à Fazenda Pública. Com efeito, não oferece dúvida que contrariamente ao que sustenta, da inscrição no registo comercial da nomeação de alguém como gerente apenas resulta a presunção legal (cfr. artigo 11.º, n.º3 do Código Do Registo Comercial - CRC-) de que é gerente de direito, não de que exerce efectivas funções de gerência. O que significa que o facto de a Oponente constar do contrato social como gerente de direito da sociedade devedora originária, por si só, nada permite concluir quanto à prática efectiva de qualquer acto em representação da sociedade.
Tal significa que o normativo legal que Fazenda Pública lançou mão (artigo 11º nº 3 do CRC) para defesa da sua tese, tem o seu efeito limitado à situação jurídica e não abrange a situação fáctica que lhe subjaz no que diz respeito ao efectivo exercício dos poderes correspondentes à detenção da posição jurídica de gerente.
Por outro lado, a circunstância da Oponente ter assinado em 08.09.2003 a escritura de Dação em Pagamento de Imóveis, não se pode inferir da prática deste acto que no ano anterior (em 2002) ou em 2007, aquela tenha efectivamente exercido a gerência da sociedade devedora originária.
Assim sendo, perante este acto isolado praticado pela Oponente, em que, terá agido em representação da executada originária em momento concreto, não é viável, à luz das regras de experiência comum, extrair a conclusão de que a mesma exerceu, de facto, a gerência da dita sociedade, relevante no caso.
É que, sendo o exercício da gerência uma actividade continuada, não vemos como seja possível, com base numa intervenção num acto pontual, temporalmente situado em Setembro de 2003, extrair que a Oponente exerceu a efectiva gerência de forma minimamente estável e continua, durante os anos de 2002, 2003 e 2007.
Por outro lado, atenta a forma de obrigar a sociedade devedora originária, a assinatura da Oponente não era imprescindível para que aquela exercesse a sua actividade (cfr. alíneas B) e C) do probatório).
Dito isto, perante o circunstancialismo fáctico provado (e não impugnado), temos assim de concluir, que a Fazenda Pública não produziu prova demonstrativa de que a Oponente exerceu a gerência de facto, sendo que, como antes já dissemos, era sobre si que recaia o ónus de provar o exercício da mesma.
Aliás, o que vem dito, em nada é abalado com a matéria inscrita na al. G) do probatório, por se tratar de uma declaração produzida por terceiro, não assinada pela Oponente e portanto incapaz dela se extrair que esta tenha admitido qualquer responsabilidade da devedora originária ou a prática de qualquer acto de gerência, com de resto, não deixou de evidenciar a sentença recorrida.
Em face de tudo o que se deixou exposto, não se provando o exercício efectivo da gerência, o qual é pressuposto da responsabilidade subsidiária que se pretende efectivar através da reversão, improcede o recurso, mantendo-se a sentença recorrida que julgou verificado o fundamento de oposição previsto no artigo 204.º, nº1, alínea b) do CPPT.

IV.CONCLUSÕES
I.A responsabilização subsidiária ao abrigo do artigo 24.º, nº 1 da LGT exige a prova da gerência efectiva ou de facto, o efectivo exercício de funções de gerência, não se bastando com a mera titularidade do cargo, a gerência nominal ou de direito.
II. É sobre a administração tributária, enquanto exequente e como titular do direito de reversão, que recai o ónus de alegar e provar os factos integradores do efectivo exercício da gerência.
III. Não há uma presunção legal que imponha a conclusão de que quem tem a qualidade de gerente de direito exerceu a gerência de facto.
IV. A circunstância de a Oponente ter agido em representação da executada originária em momento concreto, não é viável, à luz das regras de experiência comum, extrair a conclusão de que a mesma exerceu, de facto, a gerência na dita sociedade, no período temporalmente relevante no caso.
V.DECISÃO
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da 1ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.

Custas a cargo da Recorrente.

Lisboa, 13 de Dezembro de 2019


Ana Pinhol

Isabel Fernandes

Catarina Almeida e Sousa