Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:507/18.3BEBJA
Secção:CA
Data do Acordão:06/06/2019
Relator:PEDRO MARCHÃO MARQUES
Descritores:ACIDENTE;
ENTIDADE PÚBLICA EMPRESARIAL;
JUNTA MÉDICA;
CGA;
SECTOR DA SAÚDE
Sumário:i) Aos acidentes de trabalho ocorridos com trabalhadores em funções públicas que prestem serviço em entidades públicas empresariais aplica-se o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho e legislação complementar e não no Decreto-Lei nº 503/99, de 20 de Novembro.

ii) Este regime geral é, no entanto, afastado pelo regime especial que se encontra previsto para as entidades públicas empresariais no sector da saúde.

iii) É à Junta Médica da CGA, IP que competirá verificar se ocorre incapacidade permanente em resultado de acidente, qualificado como “acidente em serviço”, ocorrido 6.06.2012 com uma enfermeira com contrato de trabalho em funções públicas, enquanto prestava serviço nas instalações da ULSLA, e fixar o grau dessa incapacidade quando existente (cfr. artigo 38.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11), com vista a estabelecer a pensão devida, a qual consubstanciará reparação do dano sofrido em resultado do acidente de trabalho (cfr. artigo 34.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11).
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. Relatório

Anabela ............... intentou a presente acção administrativa ao abrigo do disposto no artigo 48.º, n.º 1 in fine, do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, contra a UNIDADE LOCAL DE SAÚDE DO LITORAL ALENTEJANO, EPE e contra a CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, IP, mediante a qual peticionou a condenação destas a liquidarem-lhe:

A) A pensão correspondente à incapacidade (que vier a ser fixada, em qualquer caso, com incapacidade permanente total para todo o trabalho) nos termos previstos nos artigos 48.º, n.º 3 alínea a), e 50.º, n.º 2, da Lei n.º 98/2009, de 04.09 (regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais, incluindo a reabilitação e reintegração profissionais, nos termos do artigo 284.º do Código do Trabalho);

B) O subsídio por elevada incapacidade (cfr. artigo 67.º, n.º 2, da Lei n.º 98/2009, de 04.09);

C) A prestação suplementar para assistência de terceira pessoa (cfr. artigos 53.º e 54.º, n.º 2, da Lei n.º 98/2009, de 04.09);

D) O valor de consultas e deslocações por liquidar, no valor total de € 13.412,41, e, ainda, de todas as despesas com tratamentos de fisioterapia de ATM, consultas e exames da disfunção têmpora-mandibular, adaptações (goteira), tratamento de acupunctura a que se encontra sujeita; medicação analgésica, consultas a otorrinolaringologia e tratamentos de reabilitação vestibular ou outros que venham a ser prescritos pelos médicos assistentes das especialidades, enquanto deles necessitar (necessitando de ser acompanhada de terceira pessoa, fazendo as deslocações a consultas e tratamentos em viatura ligeira de passageiros e, quando efectuadas a Lisboa, no dia anterior, com reserva de alojamento perto do local das consultas ou tratamentos);

E) As remunerações que se vençam até à fixação do valor da pensão definitiva;

F) Juros legais sobre as quantias devidas e custas processuais e, ainda, as taxas moderadoras relativas a tratamentos decorrentes do acidente ou, em alternativa, a anular as correspondentes notas de débito.

Por despacho de 29.01.2019 foi admitido o pedido reconvencional deduzido pela Unidade Local de Saúde do Litoral Alentejano, EPE. contra a A.. Pediu: “condenar-se a Autora “e1) (…) a proceder à reposição aos cofres da Instituição, [d]o montante que lhe foi pago em excesso, entre 20.11.2012 e 20.05.2015, no valor de € 14.146,58 (…) que, poderá / deverá ser compensado com eventual valor a pagar pela Ré à Autora, a título de indemnização pela “incapacidade permanente” que vier a ser-lhe fixada; e2) (…) a proceder à reposição aos cofres da Instituição, [d]o montante que lhe foi pago, entre 21.05.2015 e a data em que for determinada e liquidada a eventual indemnização a fixar pela incapacidade permanente que vier a ser apurada, em montante a liquidar oportunamente, valor esse que poderá / deverá ser compensado com eventual valor a pagar pela Ré à Autora, a título de indemnização pela incapacidade permanente que vier a ser-lhe fixada”.

Por sentença do TAF de Beja, da mesma data, a acção foi julgada parcialmente procedente, tendo sido fixado o seguinte dispositivo:

A) Condeno a Caixa Geral de Aposentações, IP a realizar, no prazo de 30 (trinta) dias, a Junta Médica a que se reporta o artigo 38.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11, de molde a confirmar o grau de Incapacidade da ora Autora decorrente do «acidente de serviço» ocorrido - em 20 de Novembro de 2012 -, nas instalações da Unidade Local de Saúde do Litoral Alentejano, EPE;

B) Julgo procedente, desde que observado o pressuposto legal decorrente dos n.ºs 1 e 2 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11, o pedido de liquidação das remunerações devidas à Autora até à eventual fixação de incapacidade permanente, nos termos determinados em A);

C) Julgo improcedentes, por prejudicado o respectivo conhecimento, de todos os demais pedidos formulados pela ora Autora e, como tal, absolvo as Entidades Demandadas dos mesmos, com as legais consequências.

O pedido reconvencional foi julgado improcedente.

A Caixa Geral de Aposentações vem interpor recurso da mesma decisão, concluindo a sua alegação como segue:

A- Por força do disposto no n.º 4 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, exercendo a Autor funções numa entidade pública empresarial, o regime de proteção em caso de acidente de trabalho que lhe é aplicável é o previsto no Código de Trabalho.

B- Sendo a Unidade Local de Saúde do Litoral Alentejano, EPE, uma entidade pública empresarial, sempre se terá de considerar que os seus trabalhadores, independentemente de lhes ser aplicável o regime de proteção social convergente ou o regime geral de segurança social, não se encontram abrangidos por tal diploma, sendo-lhes aplicável o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho.

C- Decorre do regime previsto no Código de Trabalho, designadamente dos seus artigos 281.º e seguintes, que, aplicando-se tal regime, não existe qualquer intervenção da Caixa Geral de Aposentações na qualificação da lesão como acidente de trabalho ou na fixação da incapacidade permanente.

D- Pelo que, a responsabilidade pela reparação do acidente em causa não compete, por conseguinte, à Caixa Geral de Aposentações, mas sim à entidade empregadora ou à entidade seguradora para a qual tenha sido transferida a responsabilidade do risco decorrente de acidentes de trabalho, nos termos do Código do Trabalho.

E- A solução consagrada na lei traduz a intenção do legislador de tratar por igual os trabalhadores que exerçam funções em entidades de natureza empresarial, independentemente da natureza do vínculo de que sejam titulares.

F- O n.º 3 do artigo 31.º do Decreto-Lei n.º 18/2017, de 10 de fevereiro, veio alterar o regime, determinando que aos trabalhadores das entidades públicas empresariais do SNS que mantenham o regime de proteção social convergente é aplicável o regime previsto no Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, que apenas poderá ser aplicado aos acidentes ocorridos após a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 18/2017, de 10 de fevereiro.

G- Pelo que ao decidir de modo diferente, violou a sentença Recorrida o disposto no n.º 4 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro.

A A., Anabela ............... veio, igualmente, interpor recurso da sentença proferida, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões (por nós reordenadas):

A) A R. alegou, na contestação, a incompetência absoluta do Tribunal de Trabalho e a aplicabilidade ao caso dos autos do regime do Dec.-Lei nº 503/99, de 20 de novembro – acidentes em serviço;

B) Porém, deduz reconvenção cujo fundamento só pode ter relação com o pedido da A. se lido à luz da Lei nº 98/2009 – acidentes de trabalho;

C) A reconvenção assenta numa construção que é contraditória com a defesa da R. ULSLA, quer quando alega a incompetência absoluta do Tribunal de Trabalho, quer quando se defende invocando o regime dos acidentes em serviço (Dec.-Lei nº 503/99);

D) Pelo que a douta sentença, ao decidir admitir a reconvenção, atenta a referida contradição, é nula nos termos do art. 615º, nº 1, al. c) do C.P.C

E) Não se verificando os requisitos de que o art. 266º do C.P.C. faz depender a admissibilidade da reconvenção;

F) Ainda que processualmente admitida, face ao regime julgado aplicável – aplicabilidade sustentada pela R. ULSLA – o pedido reconvencional deve ser julgado improcedente e não provado, a título definitivo, porquanto,

G) Nos termos do art. 15º do Dec.-Lei nº 503/99, de 20/11, a retribuição, incluindo todas as prestações que a integram, como se a A. estivesse ao serviço, é devida até à submissão do trabalhador acidentado à junta médica da CGA;

H) Sendo certo que, embora a R. tenha enviado o processo para a CGA, esta recusou submeter a A. a junta médica alegando que o regime do DL 503/99 não é aplicável à R. ULSLA, por se tratar de E.P.E.;

I) Sendo o regime aplicável o do DL 503/99, e não tendo a A. sido submetida à junta médica prevista no art. 20º, não haverá lugar a reembolso de qualquer quantia recebida a título de remuneração pela A. até à data da decisão da junta médica da CGA a que vai ser submetida;

J) Sob pena de violação do disposto no art. 15º do DL 503/99, que estabelece a responsabilidade do empregador pelo pagamento da retribuição enquanto não houver transferência para a CGA, em virtude da fixação de incapacidade permanente;

K) Termos em que deve ser julgado procedente, sem a condição constante da decisão, o pedido a que se refere a al. B) do decisório;

L) Os factos documentados no processo administrativo consideram-se adquiridos para efeitos processuais, dispensando a duplicação de documentos;

M) Não cabe, por isso, à A. juntar prova das despesas que alega, na medida em que as mesmas constam do processo administrativo junto pela R. ULSLA, ainda que possam carecer de operações aritméticas para determinação dos valores exatos;

N) Pelo que devem ser considerados provados os seguintes factos:

i) Até à data da dedução da Contestação da ULSLA, EPE, a ora Autora mantém-se ausente por, alegadamente, se encontrar “incapaz” de exercer as suas funções;

ii) Entre Fevereiro de 2013 e 1 de Março de 2018, a Autora apresentou despesas correspondentes a consultas, exames deslocações alojamento em Lisboa e tratamentos diversos - no montante global a apurar face aos documentos constantes do processo administrativo - junto da ULSLA, EPE;

iii) A Autora foi reembolsada, pela ULSLA, EPE, a título das despesas correspondentes a consultas, exames deslocações alojamento em Lisboa e tratamentos diversos mencionados B) [ii)] no montante global a apurar por consulta dos documentos que integram o processo administrativo;

iv) A Autora percorreu os quilómetros registados no processo administrativo mas apenas foi reembolsada dos que também constam desse processo administrativo;

O) Devendo a R. ULSLA ser condenada a pagar à A. as despesas realizadas com tratamentos e deslocações, até à decisão da junta médica da CGA, cuja realização a douta sentença determina, nos termos dos nº 1 e 2 do art. 5º do DL 503/99, incondicionalmente, ainda que a liquidar em execução de sentença, nos termos do art. 609º, nº 2 do C.P.C.;

P) De igual modo, deve a CGA ser condenada a liquidar (calcular) a pensão e os subsídios pedidos e a fixar o grau de desvalorização, em função da decisão arbitral da junta médica, dando sentido e utilidade à realização desta;

Q) Termos em que deve a douta sentença em recurso ser revogada, nos termos das conclusões precedentes, lavrando-se acórdão que, atendendo ao requerido, faça a costumada Justiça.

A Unidade Local de Saúde do Litoral Alentejano, EPE., veio responder aos recursos interpostos, pugnando pela sua improcedência.

A Caixa Geral de Aposentações contra-alegou no recurso interposto pela A., pugnando pela sua improcedência.



Neste Tribunal Central Administrativo o Exmo. Procurador-Geral Adjunto não se pronunciou.


Com dispensa dos vistos legais, importa apreciar e decidir.


I. 2. Questões a apreciar e decidir:

As questões suscitadas pelos Recorrentes, delimitadas pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, traduzem-se em apreciar:

1.2.1. Do recurso da Autora

- Se o tribunal a quo errou ao admitir a reconvenção;

- Se o tribunal a quo errou de facto e de direito ao ter condenado as RR. de modo condicional, devendo antes remeter o apuramento do montante exacto a pagar para incidente de liquidação.

1.2.2. Do recurso da Caixa Geral de Aposentações

- Se o tribunal a quo errou no julgamento de direito ao não ter concluído que a responsabilidade pela reparação do acidente em causa não competia à Caixa Geral de Aposentações, mas sim à entidade empregadora ou à entidade seguradora para a qual tenha sido transferida a responsabilidade do risco decorrente de acidentes de trabalho, nos termos do Código do Trabalho.



II. Fundamentação

II.1. De facto

É a seguinte a decisão sobre a matéria de facto proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, a qual se reproduz ipsis verbis:

A) A Autora nasceu em 30.04.1968 _ cfr. documento n.º 2 junto com a petição inicial;

B) Desde 06.06.1995, mediante nomeação definitiva, a Autora ocupa cargo / categoria de Enfermeira do mapa de pessoal na (hoje denominada) Unidade Local de Saúde do Litoral Alentejano, EPE (ULSLA) _ cfr. documento n.º 1 junto com a petição inicial; fls. 391 a 397 e 399 dos autos e, ainda, artigo 1.º da contestação da ULSLA, EPE;

C) Em 20.12.2012, enquanto se encontrava em exercício de funções nas instalações da ULSLA, EPE, a Autora foi vítima do seguinte acidente: “(…) cerca das 9.30h ao sair da sala 16 da UC [unidade de convalescença], virando-me para a direita da mesma bati com a região nasal na região temporal da Carla ..............., que ia a sair do quarto da UC virando-se para a esquerda” _ cfr. documento n.º 2 junto com a petição inicial e, ainda, fls. 339 a 355 dos autos;

D) Em 21.11.2012, pelas 09:31 horas, a Autora deu entrada no serviço de urgências do Hospital do Litoral Alentejano, apresentando o quadro clínico: “Ontem à tarde, acidente de trabalho com traumatismo da face e nariz, seguida de epistaxis. Foi observada pela ORL, tendo sido medicada com anti-inflamatório. Vem hoje (…) por manter dor intensa na pirâmide nasal e região malar direita. Rx da face e ossos próprios do nariz sem sinais de solução de continuidade.” _ cfr. documento n.º 3 junto com a petição inicial;

E) O acidente mencionado em C) teve como consequência, para a Autora, o “traumatismo da face e do nariz, seguida de epistaxis” _ cfr. documento n.º 3 junto com a petição inicial;

F) À data do acidente, a trabalhadora auferia a seguinte retribuição: a título de “remuneração base”, € 1.386,92 (14 meses) e, a título de “subsídio de refeição”, € 85,40 (11 meses) _ por acordo;

G) Em 06.12.2012, por deliberação do Conselho de Administração da ULSLA, EPE, o acidente que a Autora sofreu - em 20.12.2012 - foi considerado como “de trabalho” _ cfr. fls. 113 e 340 dos autos;

H) Em 25.03.2013, a Junta Médica da Direcção-Geral de Protecção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE) deliberou, por unanimidade, que a Autora padecia de “incapacidade temporária absoluta” _ cfr. documento n.º 10 junto com a petição inicial;

I) Em 18.04.2013, a Junta Médica da Direcção-Geral de Protecção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE) deliberou, por unanimidade, que a Autora padecia de “incapacidade temporária absoluta” _ cfr. documentos n.ºs 12 e 15 juntos com a petição inicial;

J) Em 20.05.2013, a Junta Médica da Direcção-Geral de Protecção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE) deliberou, por unanimidade, que a Autora padecia de “incapacidade temporária absoluta” _ cfr. documentos n.ºs 16 e 18 juntos com a petição inicial;

K) Em 19.06.2013, a Junta Médica da Direcção-Geral de Protecção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE) deliberou, por unanimidade, que a Autora padecia de “incapacidade temporária absoluta” _ cfr. documentos n.ºs 19 e 21 juntos com a petição inicial;

L) Em 17.07.2013, a Junta Médica da Direcção-Geral de Protecção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE) deliberou, por unanimidade, que a Autora padecia de “incapacidade temporária absoluta” _ cfr. documentos n.ºs 22 e 25 juntos com a petição inicial;

M) Em 07.08.2013, a Junta Médica da Direcção-Geral de Protecção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE) deliberou, por unanimidade, que a Autora padecia de “incapacidade temporária absoluta” _ cfr. documentos n.º 26 e 27 juntos com a petição inicial;

N) Em 02.09.2013, a Junta Médica da Direcção-Geral de Protecção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE) deliberou, por unanimidade, que a Autora padecia de “incapacidade temporária absoluta” _ cfr. documentos n.ºs 28 e 30 juntos com a petição inicial;

O) Em 09.10.2013, a Junta Médica da Direcção-Geral de Protecção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE) deliberou, por unanimidade, que a Autora padecia de “incapacidade temporária absoluta” _ cfr. documentos n.ºs 31 e 33 juntos com a petição inicial;

P) Em 27.11.2013, a Junta Médica da Direcção-Geral de Protecção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE) deliberou, por unanimidade, que a Autora padecia de “incapacidade temporária absoluta” _ cfr. documentos n.ºs 36 e 38 juntos com a petição inicial;

Q) Em 18.12.2013, a Junta Médica da Direcção-Geral de Protecção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE) deliberou, por unanimidade, que a Autora padecia de “incapacidade temporária absoluta” _ cfr. documentos n.ºs 39 e 41 juntos com a petição inicial;

R) Em 22.01.2014, a Junta Médica da Direcção-Geral de Protecção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE) deliberou, por unanimidade, que a Autora padecia de “incapacidade temporária absoluta” _ cfr. documentos n.ºs 42 e 43 juntos com a petição inicial;

S) Em 24.02.2014, a Junta Médica da Direcção-Geral de Protecção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE) deliberou, por unanimidade, que a Autora padecia de “incapacidade temporária absoluta” _ cfr. documentos n.ºs 44 e 46 juntos com a petição inicial;

T) Em 26.03.2014, a Junta Médica da Direcção-Geral de Protecção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE) deliberou, por unanimidade, que a Autora padecia de “incapacidade temporária absoluta” _ cfr. documentos n.ºs 47 e 49 juntos com a petição inicial;

U) Em 24.04.2014, a Junta Médica da Direcção-Geral de Protecção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE) deliberou, por unanimidade, que a Autora padecia de “incapacidade temporária absoluta” _ cfr. documentos n.ºs 50 e 52 juntos com a petição inicial;

V) Em 22.05.2014, a Junta Médica da Direcção-Geral de Protecção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE) deliberou, por unanimidade, que a Autora padecia de “incapacidade temporária absoluta” _ cfr. documentos n.ºs 53 e 55 juntos com a petição inicial;

W) Em 26.06.2014, a Junta Médica da Direcção-Geral de Protecção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE) deliberou, por unanimidade, que a Autora padecia de “incapacidade temporária absoluta” _ cfr. documentos n.ºs 57 e 58 juntos com a petição inicial;

X) Em 15.07.2014, a Junta Médica da Direcção-Geral de Protecção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE) deliberou, por unanimidade, que a Autora “tem alta do presente acidente de serviço (…) com incapacidade permanente parcial de 11%. Deve ser presente à Junta da CGA ao abrigo do n.º 5 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20/11. Apresenta-se ao serviço em 28/7/2014” _ cfr. documento n.º 59 junto com a petição inicial;

Y) Em 16.07.2014, sob o assunto “Junta Médica de Anabela ...............”, a ADSE expediu ofício n.º 2104, mediante o qual informou a ULSLA, EPE como se segue:


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_ cfr. documentos n.ºs 60 e 61 juntos com a petição inicial;

Z) Em 05.11.2014, a Autora submeteu, junto dos serviços da ULSLA, o seguinte Certificado de Incapacidade Temporária para o Trabalho por Estado de Doença de Funcionário Público:


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_ cfr. documento n.º 62 junto com a petição inicial;

AA) Em 14.11.2014, a Autora submeteu, junto dos serviços da ULSLA, o seguinte Certificado de Incapacidade Temporária para o Trabalho por Estado de Doença de Funcionário Público:


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_ cfr. documento n.º 63 junto com a petição inicial;

BB) Em 05.12.2014, por Jorge ..............., portador da cédula profissional n.º .........., emitida pela Ordem dos Médicos, foi certificada a “Incapacidade Temporária para o Trabalho”, entre 01.12.2014 e 30.12.2014, por “Estado de Doença da Autora” _ cfr. Documento n.º 64 junto com a petição inicial;

CC) Em 18.12.2014, a Junta Médica da Direcção-Geral de Protecção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE) deliberou, por unanimidade, que a Autora “tem uma incapacidade temporária absoluta” _ cfr. fls. 374 dos autos;

DD) Em 19.01.2015, a Junta Médica da Direcção-Geral de Protecção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE) deliberou, por unanimidade, que a Autora “tem uma incapacidade temporária absoluta” _ cfr. documento n.º 375 dos autos;

EE) Em 18.02.2015, sob o assunto “Recidiva - Agravamento - Recaída”, a Junta Médica da Direcção-Geral de Protecção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE) deliberou, por unanimidade, que “a sinistrada [ora Autora] tem (…) alta do presente acidente de trabalho com eventual incapacidade permanente absoluta. Deverá ser presente à Junta Médica da CGA de acordo com o n.º 5 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 503/99 (...). Existe nexo/causalidade.” _ cfr. documento n.º 65 junto com a petição inicial e, ainda, fls. 123 e 376 dos autos;

FF) Em 10.03.2015, sob o assunto “Acidente em serviço - Devolução de Processo. Anabela ...............”, a CGA, IP informou a ULSLA, EPE nos seguintes moldes:




_ cfr. Documento n.º 73 junto com a petição inicial e, ainda, fls. 121 dos autos;

GG) Entre 23.12.2015 e 28.09.2016, junto da ULSLA, EPE, a Autora solicitou reembolso de despesas - por si despendidas - a título de deslocações a consultas, tratamentos e com medicação _ cfr. fls. 204 a 338 dos autos;

HH) Entre os anos de 2013 e 2017, a título de acidente de serviço, a ULSLA, EPE liquidou à Autora o montantes pecuniário global de € 15.701,49 _ cfr. Documentos n.ºs 77 a 81 juntos com a contestação da ULSLA, EPE;

II) Em data não apurada, a Autora peticionou a sua aposentação por incapacidade junto da CGA, IP _ cfr. fls. 118 dos autos;

JJ) Datado de 14.01.2016, sob o assunto “Indeferimento do pedido de aposentação”, a CGA, IP expediu ofício mediante o qual deu a conhecer à Autora que:




_ cfr. Documento n.º 74 junto com a petição inicial;

KK) Em 26.01.2016, sob o assunto “Indeferimento do pedido de aposentação”, o Conselho de Administração da ULSLA, EPE expediu ofício n.º …/2016-RH, mediante o qual informou a Autora em como “(…) deve apresentar-se ao serviço no dia seguinte à recepção deste ofício. Deve retomar funções na UCSP Extensão Vila Nova de Santo André logo que possível, comparecer na Medicina do Trabalho da ULSLA para realização de consulta e exame de retoma” _ cfr. fls. 119 dos autos;

LL) Em data não apurada, a Autora submeteu, junto dos serviços da ULSLA, o seguinte Certificado de Incapacidade Temporária para o Trabalho por Estado de Doença de Funcionário Público:


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_ cfr. documento n.º 66 junto com a petição inicial;

MM) Em data não apurada, a Autora requereu a submissão a Junta Médica da CGA, IP “visando a confirmação da incapacidade temporária ou o reconhecimento de incapacidade permanente e a fixação do grau de desvalorização para efeitos de apuramento do montante de indemnização que lhe for devida”, à luz do acidente ocorrido em 20.11.2012 _ cfr. fls. 201 dos autos;

NN) Mediante ofício datado de 29.02.2016, a CGA, IP não concedeu o pedido mencionado na alínea imediatamente antecedente, “com fundamento na circunstância de o mesmo não estar abrangido pelo regime do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, por se tratar de trabalhadora de Entidade Pública Empresarial, sendo aplicável o regime dos acidentes de trabalho do sector privado, cabendo a responsabilidade pela regularização à entidade empregadora” _ cfr. fls. 201-202 dos autos;

OO) Em data não apurada, a Autora submeteu, junto dos serviços da ULSLA, o seguinte Certificado de Incapacidade Temporária para o Trabalho por Estado de Doença de Funcionário Público:


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_ cfr. documento n.º 68 junto com a petição inicial;

PP) Em data não apurada, a Autora submeteu, junto dos serviços da ULSLA, o seguinte Certificado de Incapacidade Temporária para o Trabalho por Estado de Doença de Funcionário Público:


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_ cfr. documento n.º 70 junto com a petição inicial;

QQ) Em 21.04.2016, Inácio .............., portador da cédula profissional n.º .........., emitida pela Ordem dos Médicos, certificou a “Incapacidade Temporária para o Trabalho” entre 21.04.2016 e 20.05.2016, por “Estado de Doença”, da Autora _ cfr. Documento fls. 132-133 dos autos;

RR) Em 05.05.2016, a Junta Médica da Direcção-Geral de Protecção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE) deliberou, por unanimidade, que a Autora se encontrava “apta a regressar ao serviço (…)” na data de 09.05.2016 _ cfr. fls. 125 dos autos;

SS) Em 07.06.2016, por Rui ..............., portador da cédula profissional n.º M.........., foi certificada a “Incapacidade Temporária para o Trabalho”, entre 08.06.2016 e 07.07.2016, por motivo “doença directa” da Autora _ cfr. fls. 412 dos autos;

TT) Em 12.07.2016, por Rui ..............., portador da cédula profissional n.º M.........., foi certificada a “Incapacidade Temporária para o Trabalho”, entre 08.07.2016 e 06.08.2016, por motivo “doença directa” da Autora _ cfr. fls. 414 dos autos;

UU) Em 08.08.2016, por Rui ..............., portador da cédula profissional n.º M.........., foi certificada a “Incapacidade Temporária para o Trabalho”, entre 07.08.2016 e 05.09.2016, por motivo “doença directa” da Autora _ cfr. fls. 410-411 dos autos;

VV) Em 07.09.2016, por Luís ..............., portador da cédula profissional n.º M........., foi certificada a “Incapacidade Temporária para o Trabalho”, entre 06.09.2016 e 05.10.2016, por motivo “doença directa” da Autora _ cfr. fls. 407-408 dos autos;

WW) Em 04.04.2018, junto do Tribunal da Comarca de Setúbal - Juízos de Santiago do Cacém, a ora Autora deu entrada de acção especial para efectivação de direitos conexos com acidente de trabalho _ cfr. carimbo aposto a fls. 780 dos autos;

XX) Em 09.07.2018, a presente acção administrativa foi intentada _ cfr. fls. 1 dos autos;

FACTOS NÃO PROVADOS

Com interesse para a decisão da causa, não resulta provado que:

A) Até à data da dedução da Contestação da ULSLA, EPE, a ora Autora mantém-se ausente por, alegadamente, se encontrar “incapaz” de exercer as suas funções _ cfr. artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil “ex vi” artigo 26.º da contestação da ULSLA;

B) Entre Fevereiro de 2013 e 1 de Março de 2018, a Autora apresentou despesas correspondentes a consultas, exames deslocações alojamento em Lisboa e tratamentos diversos - no montante global de € 20.980,79 - junto da ULSLA, EPE _ cfr. artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil “ex vi” artigo 18.º 1ª parte da petição inicial;

C) A Autora foi reembolsada, pela ULSLA, EPE, a título das despesas correspondentes a consultas, exames deslocações alojamento em Lisboa e tratamentos diversos mencionados B) no montante global de € 17.950,06 _ cfr. artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil “ex vi” artigo 18.º 2ª parte da contestação da ULSLA;

D) A Autora percorreu “32.438 km”, dos quais a ULSLA, EPE apenas a reembolsou por “3.600 km” _ cfr. artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil “ex vi” artigo 19.º 1ª parte da contestação da ULSLA;

Foi exarada a seguinte motivação da decisão sobre a matéria de facto:

No que diz respeito à factualidade dada como provada, o Tribunal fundou a sua convicção na matéria alegada pelas Partes e na prova documental carreada para os autos, aqui se incluindo os dois volumes provenientes do Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal - Juízo do Trabalho de Santiago do Cacém, no âmbito do qual o presente litígio, primeiramente, correu termos sob o n.º 591/16.4T8STC, e ainda o processo administrativo incorporado a fls. 1325 - 1661 dos autos, conforme referido em cada uma das alíneas do probatório.

No que concerne aos factos não provados, os mesmos decorrem da falta de prova documental que os consubstanciem.



II.2. De direito

A título preliminar haverá que deixar estabelecido que o recurso da Autora, na parte em que imputa erro de julgamento à decisão proferida no despacho pré-sentencial que admitiu o pedido reconvencional deduzido pela Unidade Local de Saúde do Litoral Alentejano, EPE, não pode ser conhecido.

Com efeito, o pedido reconvencional veio a ser julgado improcedente conforme decorre expressamente do texto da sentença recorrida, não havendo, por conseguinte, aqui decaimento da Autora (cfr. art. 631.º, nº 1, do CPC e art. 141.º, nº 1, do CPTA).

Por outro lado, semelhante impugnação recursória seria admissível a título subordinado, caso tivesse sido interposto recurso pela Unidade Local de Saúde do Litoral Alentejano, EPE desse segmento decisório, o que não ocorre.

Pelo que não se conhecerá do objecto do recurso interposto pela Autora, nesta parte.

Posto isto, por razão de ordem, importará verificar se a sentença recorrida errou ao ter concluído que a responsabilidade pela reparação do acidente em causa competia à CGA e não à entidade empregadora ou à entidade seguradora para a qual tenha sido transferida a responsabilidade do risco decorrente de acidentes de trabalho, nos termos do Código do Trabalho. Significa isto que se conhecerá de imediato do recurso interposto pela Caixa Geral de Aposentações e, só após, do objecto válido do recurso interposto pela Autora nos autos.

A questão que cumpre nesta sede conhecer reconduz-se à interpretação dos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, na redacção dada pelo artigo 9.º da Lei n.º 59/2008, de 11 de Dezembro, concretamente em determinar se à trabalhadora – Autora nos autos – é aplicável o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho, ficando a responsabilidade pela reparação do acidente em causa atribuída à entidade empregadora ou à entidade seguradora para a qual tenha sido transferida a responsabilidade do risco decorrente de acidentes de trabalho. Ou seja, determinar qual o regime de acidentes de trabalho concretamente aplicável: o do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, ou o estabelecido no Código do Trabalho, por força do disposto no n.º 4 do art. 2.º daquele diploma.

Na verdade, como expressamente afirmado pela aqui Recorrente, esta não coloca em causa a matéria de facto julgada assente pelo tribunal a quo, considerando sim que o direito não foi correctamente aplicado.

Sustenta a Recorrente que ao contrário do que se refere na sentença, quando às entidades públicas empresariais ou outras entidades não abrangidas pelos n.ºs 1, 2 e 3 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, é indiferente que os seus trabalhadores exerçam ou não funções públicas, já que, em qualquer dos casos, é-lhes aplicável o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho. Donde, sendo a Unidade Local de Saúde do Litoral Alentejano, EPE, uma entidade pública empresarial, sempre se terá de considerar que os seus trabalhadores, independentemente de lhes ser aplicável o regime de protecção social convergente ou o regime geral de segurança social, não se encontram abrangidos por tal diploma, sendo-lhes aplicável o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho. Pelo que, haverá que concluir, a responsabilidade pela reparação do acidente em causa não compete à CGA, competindo sim à entidade empregadora ou à entidade seguradora para a qual tenha sido transferida a responsabilidade do risco decorrente de acidentes de trabalho, nos termos do Código do Trabalho. E dada essa realidade jurídica a Caixa Geral de Aposentações deveria ter sido absolvida da instância.

Na sentença recorrida, neste capítulo, exarou-se o seguinte discurso fundamentador:

(…) a Unidade Local de Saúde do Litoral Alentejano, EPE (ULSLA) é uma pessoa colectiva pública integrada na administração indirecta do Estado, por conseguinte, estando os trabalhadores que nele exercem funções públicas sujeitos à disciplina do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11 (neste sentido, cfr. Acórdãos do Tribunal dos Conflitos, de 19.01.2017, in processo n.º 010/16, e de 06.02.2014, in processo n.º 024/12 e, ainda, Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 24.05.2018, in processo n.º 3326/15.5BENST, ambos disponíveis em www.dgsi.pt).

Com efeito, no que concerne ao entendimento da Caixa Geral Aposentações, IP em como todos aos trabalhadores que exercem funções em entidades públicas empresariais (EPE) ser- lhes, legalmente, aplicável o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho, independentemente de aqueles exercerem ou não funções públicas – por vínculo de nomeação ou de contrato de trabalho em funções públicas – trata-se de um entendimento que foi já - expressamente - afastado pelo Acórdão do Tribunal dos Conflitos n.º 24/12, de 06.02.2014, disponível em www.dgsi.pt, que considerou que uma EPE é uma pessoa colectiva pública integrada na administração indirecta do Estado e que, por isso, os trabalhadores que nele exerciam funções públicas - à data dos presentes factos (ou seja, 2012) - estão sujeitos à disciplina do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11 (no mesmo sentido, vide Acórdãos do Tribunal dos Conflitos, de 07.06.2016, processo n.º 04/16, e de 19.01.2017, processo 010/16, ambos disponíveis em www.dgsi.pt; refira-se, ainda, que o Acórdão do Tribunal de Conflitos n.º 24/12, de 06.02.2014, revogou o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, in processo n.º 09001/12, de 23.08.2012, depois seguido pelo Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, in processo n.º 01470/11.7BEBLS, de 11.04.2014, que tinham sufragado aquele mesmo entendimento da CGA, IP).

Em suma, por força da referida Jurisprudência do Tribunal de Conflitos, proferida no citado Acórdão n.º 24/12, de 06.02.2014, na vigência da alteração da Lei n.º 59/2008, de 11.12, ao Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11 (o mesmo raciocínio valendo aqui, “mutatis mutandis”, para o regime jurídico decorrente da Lei n.º 35/2014, de 20.06, que iniciou vigência em 01.08.2014) há que distinguir, em matéria de acidentes de trabalho nas entidades públicas empresariais, os trabalhadores que detém um vínculo de nomeação ou de contrato em funções públicas, dos restantes, que optaram pela celebração de um contrato de direito privado.

Por outras palavras, se no caso “sub judice” se se verificar que a Autora detém um contrato de trabalho em funções públicas, o regime aplicável manter-se-á o do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11. Porém, se o seu vínculo de trabalho passou a um contrato de direito privado, então, porque a mesma é trabalhadora da ULSLA, EPE (ou seja, uma entidade pública empresarial), que se integra na administração indirecta do Estado, o regime aplicável aos acidentes de trabalho é o que resulta do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27.08 [cfr. artigo 2.º, n.ºs 1 e 4, do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11, na versão revista pela Lei n.º 59/2008, de 11.12).

Neste sentido, vide Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 24 de Maio de 2018, proferido no âmbito do processo n.º 3326/15.5BESNT, disponível em www.dgsi.pt, no qual se lê - precisamente - que: “(…) III. Detendo os (…) trabalhadores um vínculo de nomeação ou de contrato em funções públicas, aplicar-se-á a estes, em matéria de acidentes de serviço, o regime do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11. Já quando os trabalhadores detiverem um contrato de direito privado, o regime para os acidentes de trabalho é o que resulta do Contrato de Trabalho e demais legislação (de direito privado) sobre a matéria”.

Detendo os referidos trabalhadores um vínculo de nomeação ou de contrato trabalho em funções públicas - como é o caso da Autora (cfr. alínea B) do probatório), aplicar-se a esta, em matéria de acidentes de serviço, o regime do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11.

(…)”

Vejamos.

Sustentou-se no acórdão do Tribunal dos Conflitos de 7.06.2016, no proc. n.º 4/16, que sendo o ali demandante “à data do acidente, titular de uma relação jurídica de emprego público no regime de contrato de trabalho em funções públicas com a Unidade Local de Saúde, na qualidade de pessoa coletiva de direito público de natureza empresarial” e como tal sujeito ao “disposto na LVCR [Lei de Vínculos, Carreiras e Remunerações, aprovada pela Lei n.º 12-A/2008 …] e RCTFP (Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas, aprovado pela Lei n.º 59/2008 …), por força da disposição relativa ao âmbito de aplicação subjetivo e, posteriormente, a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas [aprovada pela Lei n.º 35/2014 …, cuja vigência iniciou em 01.08.2014]”, e o R. “uma pessoa coletiva de direito público de natureza empresarial nos termos do regime jurídico do setor público empresarial do Estado e da Lei n.º 27/2002, de 8 de novembro (…) integrada na administração indireta do Estado e na rede de prestação de cuidados do Serviço Nacional de Saúde, para os efeitos do disposto no Regime Jurídico da Gestão Hospitalar, nos termos do qual, se regem «pelo respetivo diploma de criação, pelos seus regulamentos internos e pelas normas em vigor para os hospitais do SNS que não sejam incompatíveis com a sua natureza jurídica e subsidiariamente, pelo regime jurídico geral aplicável às entidades públicas empresariais» - n.º 1 do artigo 18.º da Lei n.º 27/2002” e que “desde a sua integração no setor público empresarial em 2002/2003, o regime jurídico relativo ao pessoal é o do contrato individual de trabalho, regulado pelo Código do Trabalho e legislação complementar (cfr. art. 12.º do DL n.º 183/2008)”, se impunha ter presente que “à data do acidente de trabalho dos autos (08.11.2012) era aplicável a previsão do Decreto-Lei n.º 503/99 (…), cujo n.º 1 do artigo 2.º dispunha «(o) disposto no presente decreto-lei é aplicável a todos os trabalhadores que exercem funções públicas, nas modalidades de nomeação ou de contrato de trabalho em funções públicas, nos serviços da administração direta e indireta do Estado»”, acautelando-se “no n.º 4 do mesmo artigo 2.º que «(a)os trabalhadores que exerçam funções em entidades públicas empresariais ou noutras entidades não abrangidas pelo disposto nos números anteriores é aplicável o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, devendo as respetivas entidades empregadoras transferir a responsabilidade pela reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho nos termos previstos naquele Código»”, e que a “lei de Vínculos, Carreiras e Remunerações (Lei n.º 12-A/2008 …) e o Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas (Lei n.º 59/2008 …), foram revogados pelas alíneas c) e e) do artigo 42.º da Lei preambular à Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (Lei n.º 35/2014, de 20 de junho), que iniciou vigência no dia 01.08.2014, doravante designada por LTFP”, pelo que, do cotejo dos arts. 1.º, 4.º, 5.º, al. b) da referida «LTFP» resulta que esta Lei “é aplicável aos trabalhadores que exercem funções públicas nas entidades públicas empresariais, e que, nos termos do disposto nos respetivos Estatutos, hajam mantido o estatuto jurídico da função pública (...) e que não tenham optado pelo regime do contrato de trabalho (…), como é o caso do trabalhador [em funções públicas] sinistrado/autor nos presentes autos” e que “nesta nova redação, o legislador pretendeu submeter as matérias de acidentes de trabalho e doenças profissionais dos trabalhadores em funções públicas, das entidades públicas empresariais, ao regime abrangido na Lei dos Acidentes de Trabalho - Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro -, regulamentado por força do disposto no artigo 284.º do Código do Trabalho (aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro com as alterações subsequentes)”, sendo que “[c]oncomitantemente, nos termos do disposto no artigo 12.º da LTFP, sob a epígrafe «Jurisdição competente», «(s)ão da competência dos tribunais administrativos e fiscais os litígios emergentes do vínculo de emprego público», como é o caso” (idem , o ac. de 19.01.2017, proc. n.º 10/16).

Isto é, e não relevando aqui a questão da competência em razão da matéria (que não se discute), afirmou-se nesse acórdão: “o legislador pretendeu submeter as matérias de acidentes de trabalho e doenças profissionais dos trabalhadores em funções públicas, das entidades públicas empresariais, ao regime abrangido na Lei dos Acidentes de Trabalho – Lei nº 98/2009, de 4 de Setembro -, regulamentado por força do disposto no artigo 284º do Código do Trabalho (aprovado pela Lei nº 7/2009, de 12 de Fevereiro com as alterações subsequentes).

Sobre esta matéria, em situação similar à presente, decidiu-se recentemente no acórdão de 9.05.2019 deste TCA, no proc, 70/18.5 BEBJA o seguinte:

“(…)

Prescreve o art. 2º, do DL 503/99, de 20/11, na redacção da Lei 59/2008, de 11/9, que:

“1 - O disposto no presente decreto-lei é aplicável a todos os trabalhadores que exercem funções públicas, nas modalidades de nomeação ou de contrato de trabalho em funções públicas, nos serviços da administração directa e indirecta do Estado.

2 - O disposto no presente decreto-lei é também aplicável aos trabalhadores que exercem funções públicas nos serviços das administrações regionais e autárquicas e nos órgãos e serviços de apoio do Presidente da República, da Assembleia da República, dos tribunais e do Ministério Público e respectivos órgãos de gestão e de outros órgãos independentes.

3 - O disposto no presente decreto-lei é ainda aplicável aos membros dos gabinetes de apoio quer dos membros do Governo quer dos titulares dos órgãos referidos no número anterior.

4 - Aos trabalhadores que exerçam funções em entidades públicas empresariais ou noutras entidades não abrangidas pelo disposto nos números anteriores é aplicável o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, devendo as respectivas entidades empregadoras transferir a responsabilidade pela reparação dos danos emergentes de acidentes de trabalho nos termos previstos naquele Código.

(…).”

Dispõe-se nas seguintes normas da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei 35/2014, de 20/6 (e na redacção anterior à dada pela Lei 25/2017, de 30/5), o seguinte:

- Art. 1º n.º 6:

“A presente lei é também aplicável, com as necessárias adaptações, a outros trabalhadores com contrato de trabalho em funções públicas que não exerçam funções nas entidades referidas nos números anteriores.”;

- Art. 2º n.º 1:

“A presente lei não é aplicável a:

(…)

b) Entidades públicas empresariais;

(…)”;

- E art. 4º n.º 4,

“O regime do Código do Trabalho e legislação complementar, em matéria de acidentes de trabalho e doenças profissionais, é aplicável aos trabalhadores que exercem funções públicas nas entidades referidas nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 2.º” (sublinhados nossos).

Das normas ora transcritas decorre que aos acidentes de trabalho ocorridos com trabalhadores em funções públicas que prestem serviço em entidades públicas empresariais aplica-se o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho e legislação complementar e não no DL 503/99, de 20/11.

Este regime geral é, no entanto, afastado pelo regime especial que se encontra previsto para as entidades públicas empresariais no sector da saúde [cfr. art. 7º n.º 3, do Código Civil (“A lei geral não revoga a lei especial, excepto se outra for a intenção inequívoca do legislador”)], como se passa a demonstrar. [sublinhado nosso]

Conforme decorre da factualidade dada como provada o autor é trabalhador do mapa de pessoal do Hospital José Joaquim Fernandes.

Este hospital, por força do art. 1º, do DL 275/2002, de 9/12, foi transformado em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, com a designação de Hospital José Joaquim Fernandes, SA, abreviadamente designado como Hospital.

Além disso, dispunha o art. 15º, do citado DL 275/2002, o seguinte:

“1 - O pessoal com relação jurídica de emprego público que se encontre a exercer funções no Hospital José Joaquim Fernandes - Beja transita para o Hospital, sendo garantida a manutenção integral do seu estatuto jurídico, sem prejuízo do disposto nos números seguintes.

2 - O pessoal a que se refere o número anterior pode optar pelo regime de contrato individual de trabalho, no prazo de um ano a contar da data da entrada em vigor do presente diploma, implicando a celebração do contrato de trabalho a exoneração do lugar de origem e a cessação do vínculo à função pública.

3 - A opção a que se refere o número anterior é exercida mediante declaração escrita, individual e irrevogável, dirigida ao presidente do conselho de administração.

4 - Os funcionários que não optem pela aplicação do regime do contrato individual de trabalho mantêm-se integrados nos lugares do quadro de pessoal existente à data da entrada em vigor do presente diploma, vigorando o referido quadro exclusivamente para esse efeito, incluindo a promoção e a progressão nas respectivas carreiras, através de concursos limitados aos funcionários do Hospital.

(…).”

O referido DL 275/2002, de 9/12, foi revogado pelo DL 207/2004, de 19/8, determinando-se neste último:

- no art. 1º:

“1 - É criado o Centro Hospitalar do Baixo Alentejo, com a natureza de sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, com a designação de Centro Hospitalar do Baixo Alentejo, S. A., adiante abreviadamente designado como Centro, titular do número de identificação de pessoa colectiva P.................

2 - O Centro integra o Hospital José Joaquim Fernandes, S. A., de Beja, e o Hospital de São Paulo, de Serpa, que, pelo presente diploma, são extintos para todos os efeitos legais e com dispensa de todas as formalidades legais.

3 - Os hospitais referidos no número anterior mantêm as designações originais de Hospital José Joaquim Fernandes e Hospital de São Paulo.”;

- e no art. 15º n.º 6:

“O pessoal que se encontre a exercer funções no Hospital José Joaquim Fernandes, S. A., transita para o Centro e mantém integralmente o seu estatuto jurídico, independentemente da natureza do respectivo vínculo.”.

Por força dos arts. 1º e 2º, do DL 93/2005, de 7/6, e respectivo Anexo, o Centro Hospitalar do Baixo Alentejo, SA, foi transformado em entidade pública empresarial, com efeitos a partir da data da entrada em vigor dos novos estatutos - passando a denominar-se Centro Hospitalar do Baixo Alentejo, EPE -, mais se determinado no art. 4º n.º 2, desse DL 93/2005, que “O pessoal em exercício de funções nas sociedades anónimas transformadas em entidades públicas empresariais mantém o respectivo estatuto jurídico.”.

Através do art. 1º n.º 1, al. b), do DL 183/2008, de 4/9, foi criada, com a natureza de entidade pública empresarial, a Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo, EPE – ré nos presentes autos -, por integração do Centro Hospitalar do Baixo Alentejo, EPE, e dos centros de saúde do distrito de Beja, com excepção do centro de saúde de Odemira.

Além disso, prescreve-se no art. 13º, do citado DL 183/2008, de 4/9, o seguinte:

“1 - O pessoal com relação jurídica de emprego público que, à data da entrada em vigor do presente decreto-lei, esteja provido em lugares dos quadros do Centro Hospitalar do Alto Minho, E. P. E., do Centro Hospitalar do Baixo Alentejo, E. P. E., do Hospital de Sousa Martins, Guarda, e do Hospital de Nossa Senhora da Assunção, Seia, bem como o respectivo pessoal com contrato administrativo de provimento, transita para a Unidade Local de Saúde do Alto Minho, E. P. E., Unidade Local de Saúde do Baixo Alentejo, E. P. E., e Unidade Local de Saúde da Guarda, E. P. E., respectivamente, sendo garantida a manutenção integral do respectivo estatuto jurídico.

(…)

3 - Mantêm -se com carácter residual os quadros de pessoal referidos no n.º 1, exclusivamente para efeitos de acesso dos funcionários, sendo os respectivos lugares a extinguir quando vagarem da base para o topo.

(…)

5 - O pessoal a que se refere o presente artigo pode optar a todo o tempo pelo regime do contrato de trabalho nos termos dos artigos seguintes.”

E determina-se no art. 17º, do mencionado DL 183/2008, que:

“(…)

2 - Relativamente aos funcionários e agentes que não optem pelo regime do contrato de trabalho ou que, nos termos do número anterior, mantenham o regime de protecção social da função pública, a ULS contribui para o financiamento da Caixa Geral de Aposentações, I. P., com a importância que se encontrar legalmente estabelecida para a contribuição das entidades empregadoras com autonomia administrativa e financeira.

Do exposto decorre que à data do acidente de trabalho aqui em causa (16.10.2015), a ré ULSBA, EPE, era - e actualmente continua a sê-lo - uma entidade pública empresarial e o autor nela exercia funções ao abrigo de contrato de trabalho em funções públicas - pois foi-lhe ressalvado por sucessivos diplomas legais a manutenção do respectivo estatuto jurídico de emprego público e nunca terá optado pelo regime do contrato de trabalho -, pelo que, por força do transcrito art. 17º n.º 3, do DL 183/2008, de 4/9, a ré ULSBA, EPE, tinha de observar relativamente ao autor o regime previsto no DL 503/99, de 20/11.

Nestes termos, terá de improceder o recurso jurisdicional interposto pela ré CGA, cumprindo salientar que o regime previsto no art. 31º n.º 3, do DL 18/2017, de 10/2 [dispondo-se nos n.ºs 2 e 3 deste art. 31º o seguinte: “2 - Relativamente aos trabalhadores que, nos termos do artigo 29.º, não tenham optado pelo regime do contrato de trabalho e que, mantenham o regime de proteção social convergente (RPSC), as E. P. E., integradas no SNS asseguram o pagamento das contribuições a título de entidade empregadora, para a Caixa Geral de Aposentações, I. P., e para a ADSE, quando aplicável.”; “3 - Ao pessoal previsto no número anterior integrado no RPSC é aplicável o Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de novembro, bem como no Decreto -Lei n.º 118/83, de 20 de novembro, para os organismos dotados de autonomia administrativa e financeira.” (sublinhado nosso)], e ao contrário do alegado pelo ré CGA, não se trata de um regime inovatório, dado que o mesmo limita-se a dar continuidade ao regime que vinha do passado e que se encontrava consagrado maxime no citado art. 17º n.º 3, do DL 183/2008, de 4/9, e no art. 19º n.º 3, do DL 233/2005, de 29/12 [estatuindo-se nos n.ºs 2 e 3 deste art. 19º o seguinte: “2-Relativamente aos funcionários e agentes que não optem pelo regime do contrato de trabalho ou que, nos termos do número anterior, mantenham o regime de protecção social da função pública, os hospitais E. P. E. contribuem para o financiamento da Caixa Geral de Aposentações com a importância que se encontrar legalmente estabelecida para a contribuição das entidades empregadoras com autonomia administrativa e financeira.”; “3-Os hospitais E. P. E. observam, relativamente ao pessoal referido no número anterior, o regime previsto no Decreto-Lei n.º 118/83, de 25 de Fevereiro, e no Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, para os organismos dotados de autonomia administrativa e financeira.” (sublinhado nosso)], tendo este último diploma sido expressamente revogado pelo DL 18/2017 (cfr. o respectivo art. 39º, al. c)).

Julgamos que este entendimento é de subscrever e é o que melhor salvaguarda o regime transitório, expressa e inequivocamente consagrado no artigo 15.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 233/2005, de 29 de Dezembro (divergindo-se, portanto, da posição assumida no acórdão de 19.04.2018 deste TCA, no processo 62/17.1BEBJA, subscrito pelo ora relator na qualidade de 1.º adjunto). De acordo com esse dispositivo legal:

“O pessoal com relação jurídica de emprego público que, à data da entrada em vigor do presente decreto-lei, esteja provido em lugares dos quadros das unidades de saúde abrangidas pelo artigo 1.º, bem como o respectivo pessoal com contrato administrativo de provimento, transita para os hospitais E. P. E. que lhes sucedem, sendo garantida a manutenção integral do seu estatuto jurídico, sem prejuízo do disposto no Decreto-Lei n.º 193/2002, de 25 de Setembro”.

E diz respeito a todo o estatuto jurídico destes trabalhadores, incluindo o regime jurídico dos acidentes de serviço, como a expressão “manutenção integral do estatuto jurídico”, inequivocamente consagra (neste sentido, o ac. do TCAN de 16.03.2018, proc. nº 2764/10.4BELSB).

No caso que nos ocupa, o acidente ocorreu a 20.12.2012, no exercício de funções nas instalações da ULSLA, detendo a enfermeira sinistrada contrato de trabalho em funções públicas (cfr. o provado em B) e C) supra; o que, aliás, é aceite pelas partes). Ou seja, a enfermeira sinistrada, que ingressou num serviço – desde 6.06.1995 - que hoje integra a ULSLA, é trabalhadora em funções públicas, sendo titular de lugar no mapa de pessoal com relação jurídica de emprego público na ULSLA, exercendo funções na carreira de enfermagem, aplicando-se-lhe subjectivamente a Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas (aprovada pela Lei nº 35/2014, de 20 de Junho).

Nessa data, encontrava-se em vigor, o Decreto-Lei n.º 238/2012, de 31 de Outubro, que criou a Unidade Local de Saúde do Litoral Alentejano, E.P.E., por integração do Hospital do Litoral Alentejano, E.P.E. e do Agrupamento dos Centros de Saúde do Alentejo Litoral e aprovou os Estatutos da nova Instituição. (artigo 1º do DL n.º 238/2012). Nos termos do n.º 1 do artigo 14º do mesmo diploma legal: “[o]s trabalhadores em funções públicas que, à data da entrada em vigor do presente decreto-lei, pertencem ao mapa de pessoal do Hospital do Litoral Alentejano, E. P. E., e do Agrupamento de Centros de Saúde do Alentejo Litoral transitam para a ULS do Litoral Alentejano, E. P. E., sendo garantida a manutenção integral do respetivo estatuto jurídico”.

E, como se disse já, integra-se no estatuto jurídico dos trabalhadores em funções públicas que, à data da transformação da Instituição, nela exerciam funções, o Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro, que aprovou o regime jurídico dos acidentes em serviço e das doenças profissionais no âmbito da administração pública (neste sentido, v. o ac. deste TCAS de 24.05.2018, proc. nº 3326/15.5BESNT e o ac. do STJ de 17.11.2016, proc. nº 31/14.3T8PNF.P1.S1, aí transcrito).

Pelo que, de acordo com o exposto, terá que improceder o recurso da aqui Recorrente Caixa Geral de Aposentações.

Vejamos agora do erro de julgamento que vem pela Autora imputado à sentença recorrida, ao ter nesta o tribunal a quo condenado as RR. de modo dito condicional, devendo antes remeter o apuramento do montante exacto a pagar para incidente de liquidação. Conclui a aqui Recorrente Anabela ............... que deve “a R. ULSLA ser condenada a pagar à A. as despesas realizadas com tratamentos e deslocações, até à decisão da junta médica da CGA, cuja realização a douta sentença determina, nos termos dos nº 1 e 2 do art. 5º do DL 503/99, incondicionalmente, ainda que a liquidar em execução de sentença, nos termos do art. 609º, nº 2 do C.P.C.

Neste capítulo escreveu-se na sentença recorrida:

“(…) conforme visto, que a determinação do quantum e da entidade responsável pelo pagamento das despesas originadas pelo “acidente em serviço” (de trabalho) depende, inexoravelmente, da atribuição à Autora de incapacidade permanente, a qual terá (ou não) lugar no âmbito da Junta Médica a realizar, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 38.º do diploma em apreço.

Pelo que, assim sendo e conforme visto, somente após o grau de incapacidade fixado (ou não) - em sede da Junta Médica a que alude o artigo 38.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11 -, é que a CGA (ou não) se encontrará habilitada a proceder ao cálculo das prestações a que a Autora tem direito (nos termos do disposto, v.g., do artigo 34.º do citado diploma).

Termos estes em que, à luz do presente enquadramento, há que julgar improcedentes os presentes pedidos, conforme infra se determinará.

(…)

DO DIREITO AO “VALOR DAS CONSULTAS E DESLOCAÇÕES NO VALOR TOTAL DE “€ 13.412,41” & DO DIREITO A SER RESSARCIDA DE “TODAS AS DESPESAS COM TRATAMENTOS DE FISIOTERAPIA DE ATM, CONSULTAS E EXAMES DA DISFUNÇÃO TEMPORO-MANDIBULAR, ADAPTAÇÕES (GOTEIRA), TRATAMENTO DE ACUPUNCTURA A QUE SE ENCONTRA SUJEITA. MEDICAÇÃO ANALGÉSICA, CONSULTAS, OTORRINOLARINGOLOGIA E TRATAMENTOS DE REABILITAÇÃO VESTIBULAR OU OUTROS QUE VENHAM A SER PRESCRITOS PELOS MÉDICOS ASSISTENTES DAS ESPECIALIDADES, ENQUANTO DELES NECESSITAR

Neste âmbito, e de igual forma, a determinação da entidade responsável pelo pagamento das despesas originadas pelo “acidente em serviço”, como as realizadas com transportes para efectuar tratamentos, medicamentos e meios auxiliares de diagnóstico, depende da atribuição à Autora de incapacidade permanente (neste sentido, cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 16 de Janeiro de 2018, in processo n.º 2694/16.6BELSB, disponível em www.dgsi.pt), a qual é neste preciso momento indeterminável.

Pelo que, à luz do presente enquadramento, há que julgar improcedentes os presentes pedidos, conforme infra se determinará.

D) DO DIREITO “ÀS REMUNERAÇÕES QUE SE VENÇAM ATÉ À FIXAÇÃO DO VALOR DA PENSÃO DEFINITIVA”

Resulta claro dos artigos 15.º e 19.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11, na sua actual redacção conferida pelo Decreto-Lei n.º 33/2018, de 15.05, que o(a) acidentado(a) tem direito a ser remunerado - exactamente - como se estivesse a trabalhar (neste sentido, vide Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 19 de Abril de 2018, processo n.º 1907/16.9BELSB, disponível em www.dgsi.pt), desde que as faltas ao serviço, motivadas por acidente em serviço, sejam “justificadas” (cfr. n.º 2 do artigo 19.º do citado diploma).

Mais se acrescenta que, quando o(a) trabalhador(a) for considerado(a) clinicamente curado (ou as lesões ou a doença se apresentarem insusceptíveis de modificação com terapêutica adequada) a junta médica prevista no artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11, dar-lhe-á alta, formalizada no boletim de acompanhamento médico, devendo o trabalhador apresentar-se ao serviço no 1.º dia útil seguinte, excepto se lhe tiver sido reconhecida uma incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual ou para todo e qualquer trabalho, caso em que se consideram justificadas as faltas dadas até à realização da Junta Médica da Caixa Geral de Aposentações (cfr. n.º 1 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11).

Acresce que, se após a alta concedida o trabalhador não se sentir em condições de retomar a sua actividade habitual, pode requerer à entidade empregadora a sua apresentação à junta médica prevista no artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11, que deverá realizar-se no prazo máximo de 15 dias úteis, considerando-se justificadas as faltas dadas até à sua realização [cfr. n.º 2 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11. A junta médica prevista no n.º 2 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11, deve declarar se o sinistrado está em condições de retomar o serviço ou indicar a data de apresentação a nova junta médica, devendo a respectiva decisão ser notificada pessoalmente ao interessado, no próprio dia, e à entidade empregadora, pela via mais expedita, no prazo de dois dias úteis (cfr. n.º 3 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11)].

Ora, decorre da factualidade dada como provada (cfr. alínea RR) do probatório) que, em 5 de Maio de 2016, a Junta Médica da Direcção-Geral de Protecção Social aos Trabalhadores em Funções Públicas (ADSE) deliberou, por unanimidade, que a Autora se encontrava “apta a regressar ao serviço (…) na data de 09.05.2016”.

Pelo que, não dispondo o presente Tribunal de adicionais elementos que o consubstanciem, deve o presente pedido ser deferido condicionalmente - ou seja, devem as mesmas ser liquidadas desde que a ora Autora preencha, designadamente, o requisito legal consagrado nos n.ºs 1 e 2 do artigo 20.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11.

Nas conclusões de recurso a aqui Recorrente Anabela ............... vem imputar de erro de julgamento à sentença recorrida, requerendo a revogação do segmento final do dispositivo, na parte em que se refere ao deferimento condicional do pedido.

Mas não lhe assiste razão.

Como referido pela Recorrida ULSLA EPE., o efeito útil da condenação na realização da junta médica é, precisamente, a determinação se, sim ou não a Recorrente se encontra incapacitada (absoluta ou parcialmente e, neste caso, fixando-se o percentual de desvalorização), de forma permanente. O demais será consequência daquela decisão, nos termos e com os limites legalmente previstos.

Por outro lado, contrariamente ao pretendido pela Recorrente, a perícia médica realizada na fase conciliatória no Tribunal o Trabalho não releva, naturalmente, para os presentes autos. O que releva, como definido na sentença recorrida, é a Junta Médica da CGA.

E assim sendo, a condenação no pagamento das remunerações devidas à aqui Recorrente só pode ser determinada/apurada, depois de se encontrar devidamente definida quer a situação real da A., quer as responsabilidades de cada interveniente. Com isto, interpretando correctamente a sentença, pretendeu-se afirmar no tribunal a quo aquilo que afinal decorre da condenação da CGA a realizar, no prazo de 30 dias, a Junta Médica a que se reporta o artigo 38.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro. Pois que nos termos do nº 1 desse artigo “[a] confirmação e a graduação da incapacidade permanente é da competência da junta médica da Caixa Geral de Aposentações.

Na verdade a possibilidade de concretização da obrigação em “incidente de liquidação de sentença” (art.s 358 e s. do CPC), está dependente da falta de elementos para fixar o objecto ou a quantidade (art. 609.º, nº 2, do CPC) e neste caso o que falta é a própria definição jurídica do direito reclamado.

Acresce que, como sempre afirmado pela Recorrida ULSLA, EPE., e reiterado em sede de contra-alegações (facto não refutado), esta vem assumindo o pagamento pontual do vencimento da A. e aqui Recorrente na totalidade, desde a data do acidente até ao momento.

Razões que determinam a improcedência do recurso interposto, devendo manter-se a sentença em conformidade.


III. Conclusões

Sumariando:

i) Aos acidentes de trabalho ocorridos com trabalhadores em funções públicas que prestem serviço em entidades públicas empresariais aplica-se o regime de acidentes de trabalho previsto no Código do Trabalho e legislação complementar e não no Decreto-Lei nº 503/99, de 20 de Novembro.

ii) Este regime geral é, no entanto, afastado pelo regime especial que se encontra previsto para as entidades públicas empresariais no sector da saúde.

iii) É à Junta Médica da CGA, IP que competirá verificar se ocorre incapacidade permanente em resultado de acidente, qualificado como “acidente em serviço”, ocorrido 6.06.2012 com uma enfermeira com contrato de trabalho em funções públicas, enquanto prestava serviço nas instalações da ULSLA, e fixar o grau dessa incapacidade quando existente (cfr. artigo 38.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11), com vista a estabelecer a pensão devida, a qual consubstanciará reparação do dano sofrido em resultado do acidente de trabalho (cfr. artigo 34.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11).



IV. Decisão

Pelo exposto, acordam os juízes da secção do contencioso administrativo deste tribunal central administrativo sul em:

- Não conhecer do objecto do recurso interposto pela Autora, na parte em que impugna a decisão que admite o pedido reconvencional formulado pela Unidade Local de Saúde do Litoral Alentejano, EPE.;

- Negar provimento ao recurso interposto pela Caixa Geral de Aposentações, IP. e confirmar a sentença recorrida que a condenou a realizar, no prazo de 30 dias, a Junta Médica a que se reporta o artigo 38.º do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20 de Novembro; e, quanto ao mais,

- Negar provimento ao recurso interposto pela Autora, confirmando a sentença recorrida.

Custas pelas Recorrentes Anabela ............... e Caixa Geral de Aposentações, IP.., no respectivo recurso.

Lisboa, 6 de Junho de 2019



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Pedro Marchão Marques


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Alda Nunes


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José Gomes Correia