Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:730/18.0BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:02/27/2020
Relator:PEDRO NUNO FIGUEIREDO
Descritores:CONTRATAÇÃO PÚBLICA
PRINCÍPIO DA INTANGIBILIDADE DA PROPOSTA
ESCLARECIMENTOS A PEDIDO DO JÚRI
Sumário:I. Decorre do artigo 72.º do CCP, conjugado com os artigos 56.º e 70.º do mesmo diploma legal, um dos princípios da contratação pública, que é o da intangibilidade, indisponibilidade ou imutabilidade das propostas, significando que com a sua apresentação o apresentante fica vinculado à proposta, sem que a possa retirar ou alterar.
II. Tal princípio tem óbvias implicações na amplitude dos esclarecimentos a prestar pelos proponentes, a pedido do júri, na medida em que a proposta apenas pode ser clarificada e não modificada.
III. Se a proposta da contrainteressada não cumpria com o exigido em cláusula do Caderno de Encargos, quanto à disponibilização de determinado produto e serviço, não podia ter lugar o pedido de esclarecimentos previsto no artigo 72.º, n.º 2, do CCP, na medida em que a falta de cumprimento da apontada exigência deveria ter conduzido à exclusão da proposta.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Central Administrativo Sul

I. RELATÓRIO
F..... Medical Care Portugal, SA, instaurou ação administrativa de contencioso pré-contratual, tramitada sob a forma de processo urgente, contra o Instituto Português de Oncologia do Porto Francisco Gentil, EPE, indicando como contrainteressada B. ....., Lda., sindicando o ato de adjudicação da proposta apresentada pela contrainteressada no âmbito do concurso público internacional n.º …../18, lançado pelo Instituto Português de Oncologia do Porto Francisco Gentil, EPE., para a celebração de um contrato para aquisição de serviços que assegurem a realização de sessões de hemodiálise no IPO - Porto através da disponibilização de equipamentos, fornecimento de consumíveis e assistência técnica.
A autora pede a anulação da decisão de adjudicação, a condenação da entidade demandada a praticar o ato de exclusão da proposta apresentada pela contrainteressada e a praticar o ato de adjudicação da proposta apresentada pela autora.
Alega, em síntese, que o ato de adjudicação padece de falta de fundamentação, que a contrainteressada não está em condições de cumprir as prestações (de assistência técnica e manutenção preventiva ou corretiva) previstas no Caderno de Encargos relativamente à manutenção da Central de Tratamento de Águas e a sua proposta não observa o exigido na cláusula 4.2 do Caderno de Encargos, implicando a sua exclusão, ocorrendo erro sobre os pressupostos de facto e violação de lei, e que o ato de adjudicação incorre em erro grosseiro e manifesto sobre os pressupostos de facto, quanto aos subfactores B1.1 e B1.2.
Citada, a entidade demandada apresentou contestação, invocando que o júri do concurso ponderou as razões aduzidas pela autora, sendo certo que se deve levar em linha de conta o princípio do aproveitamento do ato administrativo, a posição da autora quanto à impossibilidade da contrainteressada cumprir as prestações constitui uma ameaça de imposição de posição dominante de mercado, atentatória do princípio da concorrência, e que foi acertada a avaliação levada a cabo pelo júri.
Igualmente contestou a contrainteressada, invocando que a proposta por si apresentada cumpre com todas as exigências do procedimento e que a avaliação do júri do concurso está conforme às peças do procedimento.
Por sentença de 25/06/2019, o TAC de Lisboa julgou a ação procedente, anulou o ato impugnado e condenou a entidade demandada a adjudicar o contrato em causa à proposta apresentada pela autora.
Inconformada, a entidade demandada interpôs recurso desta decisão, terminando as alegações com a formulação das conclusões que de seguida se transcrevem:
“1ª
A interpretação da norma do artigo 70º nº 2 alínea b), 2ª parte “in fine”, do CCP exige que se distinga entre propostas que «apresentem quaisquer termos ou condições que violem aspetos da execução do contrato a celebrar por aquele não submetidos à concorrência» em sentido direto e propostas que apresentem apenas omissões e incompletudes quanto aos termos e condições;

Tais deficiências são supríveis pelo conteúdo da ‘declaração’ de aceitação do Caderno de Encargos, a que se refere a norma do artigo 57º do CCP e passíveis de superação por prestação de esclarecimentos, legalmente prevista;

Essa distinção tem apoio literal – e assim possível, como a jurisprudência tem admitido – a qual se retira da conjugação das normas dos artigos 70º/2/b) 2ª parte e 57º/1/a) pelo que apenas uma violação ‘positiva’ implicará a exclusão da proposta;

Uma menor clareza ou incompletude das especificações técnicas, que não contenda, violando-a, com exigência do caderno de encargos abrangida pela ‘declaração’ de aceitação a que se refere a norma do artigo 57º e o Anexo I do CCP, não só é passível de superação por via da prestação de esclarecimentos como obsta à consideração de estar em aplicação a norma do artigo 70º nº 2 alínea a), afastando-se o efeito da exclusão da proposta;

A não ser assim, uma proposta «pior» (no confronto dos atributos submetidos à concorrência, sobre os quais incidirá a aplicação do critério de adjudicação), e a mais onerosa, poderia vir a ser adjudicada por uma deficiente apresentação – em aspetos meramente formais – ainda que inócuos do ponto de vista da execução contratual futura, por confronto com uma melhor proposta, incluindo uma mais vantajosa economicamente, prejudicando a prossecução do interesse público;

Sendo que «neste particular, estão em cima da mesa o princípio da prossecução do interesse público ─ que ditará que não devem promover-se as «exclusões desproporcionadas e prejudiciais para o interesse público»;

Ora, o desvio da sentença recorrida, o âmago da sua inconsistência é o de fazer equivaler uma omissão de uma especificação, e de uma especificação técnica, assimilando-a a uma violação; porque a haver violação, esta teria de ser frontal e não por simples omissão, porque esta estaria sempre suprida pela ‘declaração’ do artigo 57º/1/a) (e Anexo I) do CCP perante e relativo a conteúdo da proposta extrínseco à aplicação do critério de adjudicação;

Não cabe ao Tribunal estabelecer, contra a ponderação do Júri do concurso, constituído por médicos especialistas da área de nefrologia, com décadas de prática de atos médicos de diálise, bem como de enfermeiros e técnicos, fixar judicialmente que no ‘catálogo’ ou no ‘manual’ de um equipamento consta esta ou aquela função, este ou aquele requisito técnico específico, áreas que escapam ao ‘direito’, sobretudo quando o júri constituído por especialistas, conclui em sentido contrário, não se apresentando a matéria como nem se tratando de «erro grosseiro»;

«…não cabe ao Tribunal controlar a boa ciência ou a boa técnica empregues pela entidade administrativa, por manifesta falta de competência nas matérias extra-jurídicas para tanto necessária,
antes cabe, repetindo, exercer o jurisdicional sobre as zonas de vinculação adjacentes, isto é, no exame da existência material dos pressupostos de facto de que depende o uso de meios técnicos e no tocante aos “(..) limites positivos de competência, de finalidade, de imparcialidade e de proporcionalidade (..) porque só existem a discricionariedade e a margem de livre apreciação de conceitos jurídicos indeterminados que a lei especificamente conceder (..)» do citado Acórdão do TCA do Sul;
10ª
Ao decidir como o fez, não obstante o seu mérito intrínseco, violou a douta sentença recorrida as indicadas normas dos artigos 70º/2/b) “in fine”, 57º/1/a) e Anexo I e ainda 72º/1 e normas conexas, ao atribuir-lhes o sentido de aceitação da argumentação da autora e para a exclusão da proposta da contra-interessada, e ainda as normas dos artigos 56º do CPA e 95º/5 do CPTA estas no sentido e por conhecer de aspetos técnicos dos documentos técnicos que, por não consubstanciarem «erros grosseiros» estão subtraídas à jurisdição.”
Igualmente inconformada, a contrainteressada interpôs recurso desta decisão, terminando as alegações com a formulação das conclusões que de seguida se transcrevem:
“A. O presente recurso vem interposto da douta Sentença, de 25.06.2019, proferida pelo Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa.
B. A douta Sentença recorrida errou relativamente à Matéria de Facto (“III. Fundamentação de Facto”, v. pág. 8 e segs. da Sentença), porquanto não deu como provados factos essenciais à decisão da causa e que resultam da prova produzida.
C. Conforme referido pela ora Recorrente nas suas Alegações Escritas (v. pontos 26. a 28.), resultou evidente, de diversos depoimentos, que o equipamento que consta da proposta da B..... assegura a monitorização da taxa de recirculação (v., nomeadamente, os depoimentos das testemunhas Engenheira Joana ..... (00:56:56), Senhor Marco ..... (03:01:22), Dra. Maria ..... (00:25:43) e Dra. Ana ..... (01:24:12), as quais confirmaram que a referida proposta cumpre o exigido no ponto 4.2 do Caderno de Encargos.
D. A testemunha Dra. Maria ..... (00:25:52), como as demais, destacou, inclusivamente, que a solução proposta pela B..... é, comparativamente à proposta da F....., melhor em termos de “comodidade para os doentes”;
E. Atendendo à manifesta relevância dos factos invocados, resulta do exposto que o Tribunal a quo tinha, nos depoimentos identificados, elementos probatórios que impunham que fossem dados como provados os seguintes factos:
a) O equipamento que consta da proposta da B..... assegura a monitorização da taxa de recirculação (v. depoimentos da Engenheira Joana ..... (00:56:56), a testemunha Senhor Marco ..... (03:01:22), a testemunha Dra. Maria ..... (00:25:43) e a testemunha Dra. Ana ..... (01:24:12));
b) A proposta da B..... cumpre o exigido no ponto 4.2 do Caderno de Encargos (v. depoimentos da Engenheira Joana ..... (00:56:56), a testemunha Senhor Marco ..... (03:01:22), a testemunha Dra. Maria ..... (00:25:43) e a testemunha Dra. Ana ..... (01:24:12));
c) A solução proposta pela B..... é, comparativamente à proposta da F....., melhor em termos de “comodidade para os doentes” (v. depoimento da Dra. Maria ..... (00:25:52)).
F. Ficou demonstrado o erro de julgamento do douto Tribunal recorrido, no que concerne à Matéria de Facto, impondo-se, perante o mesmo, que sejam dados como provados os factos elencados nas Alegações de Recurso;
G. Considerou a douta Sentença recorrida – todavia, erradamente – que o esclarecimento prestado pela B..... consubstanciou um aditamento à sua proposta e que o Exmo. Júri, ao considerar aquele esclarecimento, terá violado aquela norma;
H. Considerou ainda aquela Sentença – também erradamente - que, avaliando, o Exmo. Júri, a proposta da B..... sem considerar aquele esclarecimento - por o mesmo, no seu entendimento, ser inadmissível -, impunha-se a exclusão da proposta desta, por, no entendimento do Tribunal a quo, violar aspetos respeitantes à execução do contrato a celebrar e constantes do CE, e não submetidos à concorrência;
I. O facto de a B..... ter prestado aquele esclarecimento após a apresentação da sua proposta e a pedido expresso do Exmo. Júri, nos termos legalmente admitidos pelo artigo 72º do CCP, não comporta qualquer “aditamento” que “altera a materialidade que lhe está subjacente” (v. pág. 35 da Sentença), e que pudesse determinar a exclusão da respetiva proposta;
J. A capacidade de os monitores Dialog iQ poderem ser apresentados com o dispositivo Crit-Line é uma capacidade que o próprio equipamento tem originariamente, e que a B..... esclareceu o Exmo. Júri que iria fornecer;
K. O equipamento que consta da proposta da B..... assegura a monitorização da taxa de recirculação e a proposta por si apresentada cumpre o Caderno de Encargos (v. depoimentos das testemunhas Engenheira Joana ..... (00:56:56), Senhor Marco ..... (03:01:22), Dra. Maria ..... (00:25:43) e Dra. Ana ..... (01:24:12));
L. A solução proposta pela B..... é, comparativamente à proposta da F....., melhor em termos de “comodidade para os doentes” (v. depoimento da testemunha Dra. Maria ..... (00:25:52));
M. Tendo o procedimento concursal em crise sido publicado em 02.11.2017, nos termos do Diário da República, II Série, N.º 211, Parte L, Anúncio de procedimento n.º 9044/2017 (v. fls. 150 do Processo Instrutor), é aplicável a redação do CCP anterior ao Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31 de agosto, dado que o mesmo apenas entrou em vigor em 1 de janeiro de 2018 (v. artigo 13.º do Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31 de agosto) e “só é aplicável aos procedimentos de formação de contratos públicos iniciados após a sua data de entrada em vigor” (v. artigo 12.º/1 do CCP), ou seja, é aplicável a redação do artigo 72.º/2 do CCP aplicável ao presente caso é a conferida pelo Decreto-Lei n.º 149/2012, de 12 de julho;
N. Ora, enquanto que os “atributos” da proposta são aspetos da execução do contrato submetidos à concorrência e que, por isso, impactam na avaliação da proposta - uma vez que deles depende a pontuação atribuída à proposta -, por sua vez, os “termos ou condições” são aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência e que, por isso, não impactam na avaliação da proposta, ou seja, apenas relevam para efeitos de admissão ou exclusão da mesma;
O. Conforme refere a douta Sentença recorrida (v. págs. 23 e 36), em causa estão aspetos respeitantes à execução do contrato a celebrar constantes do CE e não submetidos à concorrência, consubstanciando, a Cláusula 4.2. do CE, um “termo ou condição”;
P. A douta Sentença recorrida erra na medida em que aplica ao caso sub judice a parte final do artigo 72.º/2 do CCP, o qual, na redação aplicável, abrange apenas “atributos” e não “termos ou condições”;
Q. A douta Sentença recorrida errou manifestamente, uma vez que considerou que os esclarecimentos prestados pela B..... não poderiam ter sido considerados pelo Exmo. Júri do procedimento por, supostamente, violarem o “limite constante da parte final art. 72.º/2 do CC” (v. pág. 35);
R. Fica manifestamente demonstrado que a referida “falta” identificada pelo Exmo. Júri na proposta da B..... ficou esclarecida e passou a fazer parte integrante daquela proposta, nos termos do artigo 72.º/2 do CCP;
S. O douto Tribunal a quo incorreu num manifesto erro de julgamento, porquanto os esclarecimentos prestados pela B..... são totalmente legais e admissíveis, tendo, por isso, integrado a sua proposta, razão pela qual nunca a proposta da ora Recorrente poderia ter sido excluída, impondo-se, por isso, a revogação da Sentença recorrida.”
A autora apresentou contra-alegações de recurso, com ampliação subsidiária do seu objeto, terminando com a formulação das conclusões que de seguida se transcrevem:
“I. A sentença proferida, nas questões que apreciou, julgou corretamente todos os factos como provados e não provados, à luz de toda a prova produzida.
II. De toda a prova produzida resultou que o equipamento que consta da proposta apresentada pela B..... viola a exigência feita no Caderno de Encargos de os monitores serem dotados de módulo de monitorização da taxa de recirculação.
III. O recurso da matéria de facto deve improceder, por a prova produzida demonstrar precisamente o contrário dos factos que a B..... pretende dar como provados.
IV. A possibilidade de medição da taxa de recirculação apenas surgiu com os esclarecimentos que a B..... prestou sobre a sua proposta, em que propôs o fornecimento de dispositivos Crit-line que não estavam previstos na proposta.
V. Os esclarecimentos prestados contrariam a proposta: na proposta, eram os Monitores Dialog iQ que mediriam a taxa de recirculação; nos esclarecimentos já não são aqueles monitores, mas dispositivos Crit-line.
VI. O esclarecimento assim prestado viola o artigo 72.º, n.º 2, do Código dos Contratos Públicos, por implicar uma contradição com o conteúdo da proposta e por implicar uma verdadeira alteração da proposta.
VII. A proposta, nos termos em que foi apresentada, deve ser excluída, por violar a exigência feita na cláusula 4.2 do Caderno de Encargos, nos termos do artigo 70.º, n.º 2, alínea b), do Código dos Contratos Públicos.
Quando assim não se entenda,
VIII. Ressalvado o máximo respeito, o Tribunal a quo parece ter incorrido em nulidade por omissão de pronúncia ou, ao menos, em erro de julgamento ao recusar a apreciação dos vícios de violação dos princípios da imparcialidade e da transparência revelados pelo depoimento das testemunhas arroladas pelo IPO, violando o disposto nos artigos 5.º, n.º 2, alínea c), e 412.º, n.º 2, do Código de Processo Civil e artigo 95.º, n.º 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, e aplicando, incorretamente, o disposto nos artigos 588.º, n.º 3, alínea c), e 589.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.
IX. Ressalvado o máximo respeito, o Tribunal a quo parece ter incorrido em erro de julgamento, com violação do disposto no artigo 70.º, n.º 2, alínea b) do Código dos Contratos Públicos, ao considerar que a impossibilidade do cumprimento, pela B....., nos termos constantes da sua proposta, das prestações exigidas pelo Caderno de Encargos a propósito da central de tratamento de águas apenas relevariam em sede de execução do contrato e que não se verificava qualquer causa de exclusão da proposta.
Em qualquer caso,
X. A decisão de adjudicação é inválida por vício de forma por falta de fundamentação, devendo ser anulada.
XI. A decisão de adjudicação é inválida por erro grosseiro e manifesto sobre os pressupostos de facto, ao considerar que a proposta continha um Plano HACCP, ainda que não detalhado ou completo, incorrendo igualmente em violação de lei, em qualquer dos casos, determinantes da anulabilidade da decisão impugnada.
XII. A decisão de adjudicação é inválida por erro grosseiro e manifesto sobre os pressupostos de facto, ao atribuir a pontuação máxima à proposta da B..... no subfactor descrição completa e detalhada dos equipamentos, incorrendo igualmente em violação de lei, em qualquer dos casos, determinantes da anulabilidade da decisão impugnada.
XIII. A presença no Júri do Concurso de trabalhadores da B..... e, no caso do respetivo Presidente, de alguém que vendeu participações sociais em empresas à B..... no decurso do procedimento, viola o artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 14/2014, de 22 de janeiro, determinando a nulidade da decisão de adjudicação, nos termos do respetivo artigo 5.º, n.º 2, sendo, em todo o caso, violadora do princípio da imparcialidade e da transparência, pelo que sempre deveria determinar a anulação da deliberação de adjudicação — que se limitou a homologar o entendimento do Júri do Concurso.
XIV. A atuação do Júri do Concurso violou o princípio da transparência e, como tal, deve a deliberação de adjudicação — que se limitou a homologar o entendimento do Júri do Concurso — ser anulada, por ficar consumida também por este vício.”
A entidade demandada apresentou contraditório à ampliação subsidiária do objeto do recurso, nos seguintes termos:
“1ª
Carece de tutela legal a pretensão de detenção de um direito exclusivo pelo produtor de manutenção dos equipamentos da sua ‘marca’ CE e, por consequência, quanto à credenciação, formação, habilitação dos técnicos credenciados para o efeito da manutenção dos mesmos;

E a proclamação de não fornecimentos futuros à adjudicatária de consumíveis necessários ao funcionamento dos equipamentos, por violação da lei de base da concorrência a que se acha obrigada;

A proclamação de não «fornecimento» de consumíveis, de “spare parts” e de “não habilitação” dos técnicos que a adjudicatária afetaria à manutenção dos equipamentos bem como a posição processual da produtora são, em si mesmas, «indícios de práticas restritivas da concorrência» passíveis de responsabilidade;

Do regime do DL 145/2009, de 17-06 pode retirar-se com segurança que a qualidade de fabricante de um produto desta natureza, sujeito ao regime legal próprio, se estende a quem o coloca no mercado, «independentemente» de essa pessoa ser «responsável» originária pela «concepção, fabrico, acondicionamento e rotulagem» (daquele artigo 3º alínea cc) do diploma)

Improcede, pois, a alegação da produtora de um dispositivo quando pretende atribuir ao fundamento deste “mercado” um sentido que a lei e o direito não acolhem, para daí retirar uma posição de monopólio anti concorrência;

Sendo justa e fundada a posição da entidade adjudicante quando invocou, logo em fase de audiência prévia, que nesta matéria prevalecem as regras da concorrência contra qualquer direito «exclusivo» inexistente, acentuado por se reportar a um elemento de um conjunto articulado de equipamentos;

Não ocorre vício de forma por falta ou escassez de motivação, estando o relatório final do júri suficientemente motivado, como se retira i) do seu próprio enunciado, ii) da discordância com que a concorrente o discute, iii) sendo ainda intrinsecamente cognoscível no seu iter de raciocínio avaliativo e ao mesmo sempre seria aplicável a norma do artigo 163º/4 do CPA;

A recorrente pretende que o Tribunal ad quem se adentre em matérias de minúcia técnica que não apresentam dignidade intrínseca, por não se projetar como erro grosseiro a análise do Júri do concurso, uma por inócua, outra por se reportar a minudências que estão exclusivamente atribuídas aos técnicos especialistas, pretensão contra a doutrina estavelmente formada no seio da jurisprudência;

Uma relação societária da recorrente com a mesma sociedade do Senhor Presidente do júri contra cuja transmissão, em momento relevante da tramitação processual, para a contra-interessada B..... se insurgiu, detida antes e mantida até hoje, mas nunca revelada, constitui, essa sim, um fator gerador da situação grave de quebra de imparcialidade e de transparência;
10ª
A parte processual que assim procede, como sucede com a recorrente, atua com deslealdade processual, no limiar da litigância de má-fé;
11º
Não obstante as vicissitudes da instância, mantém interesse a matéria relativa ao invocado direito exclusivo do produtor detentor de marca CE em matéria de dispositivos médicos a que se refere a legislação invocada pela recorrente subordinada;
12ª
A pretensão da recorrente não encontra base legal das normas do regime do artigo 70º/2/b) quanto ao arrogado ‘direito exclusivo’ à manutenção e fornecimento de peças para a manutenção do equipamento marca CE nem da do artigo 3º do DL 14/2014 quanto à suposta relação de dependência do presidente do júri em face da contra-interessada.”
Igualmente a contrainteressada apresentou contraditório à ampliação subsidiária do objeto do recurso, nos seguintes termos:
“1) Bem andou o Tribunal a quo ao decidir que os factos invocados pela F..... para sustentar os vícios de violação dos princípios da imparcialidade e da transparência se encontravam sujeitos, grosso modo, aos artigos 588.º/1 e 3, al. c) e 589.º/2 do CPC;
2) Os factos invocados pela F..... para sustentar os vícios de violação dos princípios da imparcialidade e da transparência estavam dependentes da apresentação de novo articulado, pelo que, não tendo a F..... apresentado tal articulado, resulta que aqueles vícios não se encontravam fundados em factos supervenientes que como tal tenham sido alegados e admitidos nos autos, pelo que improcedem totalmente;
3) Improcede totalmente a alegada violação do artigo 95.º/3 do CPTA, desde logo, porque os factos que constituem os alegados vícios de violação dos princípios da imparcialidade e da transparência foram carreados ao processo em violação da lei processual, conforme anteriormente exposto;
4) O que o artigo 95.º/3 do CPTA permite é que o Tribunal conheça das causas de invalidade que decorram de factos processualmente admissíveis, o que, como se vê, não é o caso, pelo que também não se verifica a violação do artigo 95.º/3 do CPTA;
5) A proposta da B..... respeita o exigido no Caderno de Encargos quanto à obrigação de assegurar a manutenção corretiva da CTA do IPO Porto. De resto, a B..... tem pessoal que sabe fazer a manutenção corretiva da CTA do IPO Porto e detém hoje, na sequência da aquisição do grupo Unimed, várias clínicas de hemodiálise equipadas com centrais de tratamento de água da marca F..... e não tem qualquer dificuldade em assegurar a respetiva manutenção corretiva das mesmas;
6) Todas as questões colocadas pela mesma em sede de audiência prévia, foram apreciadas, analisadas e fundamentada a sua resposta, pelo que o Relatório Final não padece de falta de fundamentação nem viola a norma do n.º 1 do artigo 148º do CCP, tendo a F..... entendido perfeitamente a motivação do ato, o seu alcance, e a razão do seu conteúdo;
7) Na sua proposta a B..... apresentou expressamente o Plano HACCP (Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controlo), pelo que é manifesta a total improcedência do vício invocado pela F....., porquanto nunca poderia o IPO Porto, à luz das peças do procedimento, ser condenado a avaliar a proposta da B....., quanto àquele subfactor, com 0 pontos, na medida em que apresentou o referido Plano de HACCP;
8) A funcionalidade inerente ao Crit-Line para efeitos de avaliação da taxa de recirculação já consta inicialmente da proposta da B...... Além disso, o facto de o Exmo. Júri ter solicitado à B..... esclarecimentos sobre a sua proposta não prejudica a classificação máxima dada à B..... porquanto tais esclarecimentos incidem sobre elementos que já constam ou estão relacionados com a própria proposta, como sucede com o Crit-Line;
9) A avaliação que o Exmo. Júri fez da proposta da B..... relativamente ao subfactor B.1.2 – Descrição do equipamento técnico -, não merece qualquer censura. Com efeito, resulta da prova documental e testemunhal produzida nos presentes autos que a F..... não logrou provar, nem no plano dos factos, nem no do Direito, nenhuma das ilegalidades que imputa à deliberação do Exmo. Júri de adjudicação do concurso à B.....;
10) Sem prejuízo de a B..... entender que não cabe a este douto Tribunal, a apreciação deste vício, em virtude de o mesmo ter sido invocado em manifesta violação da lei processual, importa referir que é manifesto que não resultou provado nos autos nenhum facto que pudesse sequer remotamente consubstanciar uma violação do princípio da imparcialidade nem do princípio da transparência, sendo os mesmos totalmente improcedentes.”

*

Perante as conclusões das alegações dos recorrentes e requerimento de ampliação do âmbito do recurso apresentada pela recorrida, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso, cumpre aferir:
- do erro de julgamento de facto (recurso da contrainteressada);
- do erro de julgamento de direito da sentença ao decidir anular o ato de adjudicação da proposta da contrainteressada, por esta dever ser excluída, na medida em que não observou uma cláusula do CE relativa a aspectos da execução do contrato subtraídos à concorrência (recursos da entidade demandada e da contrainteressada);
Subsidiariamente:
- da nulidade da sentença por omissão de pronúncia, ao recusar apreciar os vícios de violação dos princípios da imparcialidade e da transparência revelados pelo depoimento das testemunhas arroladas pela entidade demandada (requerimento de ampliação do âmbito do recurso);
- do erro de julgamento de direito quanto à não exclusão da proposta da contrainteressada, ao considerar que apenas relevaria em sede de execução do contrato a impossibilidade de cumprimento das prestações exigidas pelo Caderno de Encargos quanto à central de tratamento de águas (requerimento de ampliação do âmbito do recurso);
- da falta de fundamentação da decisão de adjudicação (requerimento de ampliação do âmbito do recurso);
- da invalidade da decisão de adjudicação por erro grosseiro e manifesto sobre os pressupostos de facto, ao considerar que a proposta continha um Plano HACCP, ainda que não detalhado ou completo (requerimento de ampliação do âmbito do recurso) (requerimento de ampliação do âmbito do recurso);
- da invalidade da decisão de adjudicação por erro grosseiro e manifesto sobre os pressupostos de facto, ao atribuir a pontuação máxima à proposta da contrainteressada no subfactor descrição completa e detalhada dos equipamentos (requerimento de ampliação do âmbito do recurso);
- da nulidade da decisão de adjudicação, atenta a presença no Júri do Concurso de trabalhadores da contrainteressada e do presidente, que vendeu participações sociais em empresas à contrainteressada no decurso do procedimento, com violação dos princípios da imparcialidade e da transparência (requerimento de ampliação do âmbito do recurso);
- da violação do princípio da transparência pela decisão de adjudicação (requerimento de ampliação do âmbito do recurso).

Dispensados os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

*
II. FUNDAMENTOS
II.1 DECISÃO DE FACTO
Na decisão recorrida foram considerados provados os seguintes factos:
a) O IPO lançou o Concurso Público n.º …../18 com vista a celebração de um contrato para aquisição de serviços que assegurem a realização de Sessões de Hemodiálise no IPO-Porto através da disponibilização de equipamentos, fornecimento de consumíveis e assistência técnica, de acordo com as características técnicas descritas no Caderno de Encargos ─ cfr. processo administrativo em suporte PA (PA), fls. 153 e ss.
b) Do “Programa do Procedimento” consta, designadamente, o seguinte:
— ponto «3.1 Definição de Proposta ─ Proposta é o instrumento pelo qual o concorrente indica as condições em que se pretende contratar e implica, da sua parte, o perfeito conhecimento e aceitação das condições presentes no Caderno de Encargos do procedimento.»
— ponto «3.5 Elementos da Proposta ─ A proposta deve ser elaborada tendo em conta duas componentes:
a) Componente Técnica; e
b) Componente Económica.»
— ponto «4.2 Parâmetros Base ─ No âmbito do presente procedimento são estabelecidos parâmetros base no ponto 3.1 do Caderno de Encargos. O não cumprimento dos parâmetros base determina a eliminação das propostas.»
— ponto «4.3 Modelo de Avaliação das Propostas ─ O critério de adjudicação das propostas e o da proposta economicamente mais vantajosa, aplicando os critérios descritos no Capitulo 3 do Caderno de Encargos.»
(cfr. fls. 165/166 do PA)
c) Estabelece o Caderno de Encargos, designadamente, como segue:
— cláusula 2.2 Obrigações do Adjudicatário:
«Sem prejuízo de outras obrigações previstas na legislação aplicável e no presente Caderno de Encargos, constituem obrigações principais do adjudicatário as seguintes:
a) Fornecimento e transporte dos equipamentos até às instalacões do IPOPorto;
b) Instalação do Equipamento no Serviço de Nefrologia;
c) Garantir a instalação do software informático necessário com a respetiva interligação dos equipamentos ao sistema informático de acordo com as disposições do Caderno de Encargos e qualquer outra para o IPO-Porto, sendo que a interface dos equipamentos ao sistema aplicacional HS Nefro (Glintt) deverá estar operacional na data de entrada em funcionamento dos equipamentos; (…)
e) Prestar a assistência técnica integral com peças a todo o equipamento fornecido e controlo de qualidade que inclua a realização de análises laboratoriais de acordo com o legalmente exigido, nomeadamente as instalações técnicas especiais;
f) Indicação dos técnicos ou dos órgãos técnicos integrados ou não na empresa e, mais especificadamente, daqueles que têm a seu cargo o controlo e qualidade, bem como das habilitações literárias e profissionais desses técnicos, especialmente dos afectos ao fornecimento dos bens;
g) No processo de avaliação técnica dos produtos, materiais e equipamentos, as empresas concorrentes poderão ser convidadas a fazer demonstrações técnicas na IPO-P, ou noutros locais por ela sugeridos. Será por isso um requisito obrigatório a disponibilização de amostras a título gratuito ou a organização de visitas técnicas; (…)».
— cláusula 2.5. Assistência técnica – Tempo de reposta e qualidade da assistência
«Após o fornecimento e instalação dos Equipamentos:
a) A assistência técnica deverá ter um tempo de resposta reduzido (inferior a 24h);
b) Suporte técnico especializado com recursos humanos qualificados;
c) Suporte telefónico e preferencialmente assistência técnica remota;
d) Protocolos pré-estabelecidos de manutenção preventiva;
e) Em caso de avaria irreparável, o adjudicatário deverá garantir a substituição do equipamento avariado por outro com características semelhantes.»
— 3. Avaliação das propostas cláusula 3.1. ─ Parâmetros base
«No âmbito do presente procedimento são estabelecidos os seguintes parâmetros base:
1. Preço unitário base – valor não pode ser superior ao preço base de 30,00€, sem IVA, por cada sessão de hemodiálise, de acordo com as disposições do caderno de encargos;
2. Prazo necessário de entrega dos equipamentos e implementação das adaptações necessárias para operacionalização não poderá exceder os 90 dias;
As propostas que não cumpram algum dos parâmetros base definidos serão automaticamente excluídas.»
cláusula 3.2. Modelo de Avaliação das propostas
«O critério de adjudicação é o da proposta economicamente mais vantajosa, de acordo com os critérios seguintes:


— cfr. o CE a fls. 153 e ss do PA
d) Da cláusula 3.3 do CE, que se dá por integralmente reproduzida, consta a explicação dos critérios de avaliação das propostas — cfr. o CE a fls. 153 ss. do PA.
e) O critério “qualidade técnica” foi desdobrado em dois subcritérios: B.1 – Avaliação Técnica das propostas e B.2 - Prazo de entrega; dentro daquele constam ainda dois itens de avaliação, como segue:
«- B.1.1 — Descrição do Plano HACCP (Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controlo) da empresa: 20%
a) Será atribuída a pontuação máxima se for apresentada uma descrição detalhada e completa da Analise de Perigos e Pontos Críticos de Controlo e a forma como a mesma será desenvolvida;
b) Será atribuída 50% da classificação quando não haja uma descrição detalhada e completa da Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controlo e a forma como a mesma será desenvolvida;
c) Será atribuída a classificação de 0 valores as propostas que não apresentem a Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controlo.
- B.1.2 — Descrição do equipamento técnico: 10%:
a) Será atribuída a pontuação máxima se for apresentada uma descrição detalhada e completa dos equipamentos disponibilizados;
b) Será atribuída 50% da classificação quando não haja uma descrição detalhada e completa dos equipamentos disponibilizados;
c) Será atribuída uma classificação de 0 valores às propostas que não apresentem a informação sobre os equipamentos disponibilizados.»
— cfr. CE a fls. 157 do PA.
f) A cláusula 4. do Caderno de Encargos estabelece as “Condições Técnicas”, que se dão por integralmente reproduzidas, das quais podem destacar-se as seguintes:
«(…) 4.2 Equipamentos – Monitores de Diálise
No âmbito do presente concurso o adjudicatário deverá colocar em regime de contra-c consumo 16 monitores com as seguintes caraterísticas:
Monitores para o Serviço de Nefrologia:
Produção de dialisante e soluto de substituição on-line;
• Capacidade de hemodiafiltração;
• Dupla bomba (apenas em dois monitores);
• Módulos de monitorização para avaliação da taxa de recirculação em pelo menos dois monitores;
• Módulo de monitorização do volume intravascular em pelo menos dois monitores;
• Módulo de avaliação de pressão arterial;
• Determinação do KT/V on-line; e
• Homologação/Certificação CE.
(…)
São aceites monitores novos ou usados. No caso de monitores usados estes terão de estar em perfeitas condições de utilização, não podem exceder as 30.000 horas e os dez anos de uso.
(…)
4.8 Material de Manutenção e Operação a Fornecer
O adjudicatário deverá fornecer todos os materiais e peças para o bom funcionamento do parque de máquinas de hemodiálise e da Central de Tratamento de Águas (nova ou usada). Tendo em qualquer das hipóteses nova ou usada ter a capacidade para ser um Sistema de Tratamento de Águas com produção de água final ultra-pura conforme definido nas normas europeias, obedecendo à legislação em vigor e adicionalmente deve considerar o novo Manual de Boas Práticas de Diálise Crónica da Ordem dos Médicos (edição de 2017)
4.9. Prestação de Serviços de Assistência Técnica:
O adjudicatário deverá prestar os serviços de assistência técnica associados à atividade da unidade de hemodiálise. Isto inclui: (…)
b) Monitorização Diária da Central de Tratamento de Águas (CTA):
1. Medição diária dos parâmetros da água (cloro, ph e dureza);
2. Gestão das bombas;
3. Resposta a Situações de Emergência.
c) Assistência técnica mensal à Central de Tratamento de Águas:
1. Limpeza dos depósitos de água bruta;
2. Revisão geral do equipamento;
3. Verificação de pressões e caudais;
4. Verificação e reposição dos níveis de sal e hipoclorito de sódio;
5. Verificação e substituição dos filtros de cartucho.
d) Desinfeção Mensal da Central de Tratamento de Águas:
1. Desinfeção geral da Central de Tratamento de Águas e sempre que necessário se torne por qualquer razão/incidente necessário.
e) Desinfeção da Rede de Distribuição de Águas:
1. A desinfeção da rede/instalação de distribuição de água tratada deve incluir o Serviço de Nefrologia, Bloco Operatório Central, Serviço de Cuidados Intensivos.
f) Controlo de Qualidade da Água e Fluídos:
1. Definição anual do protocolo laboratorial de análises;
2. Elaboração do mapa de colheitas periódicas e extraordinárias;
3. Recolha e entrega das amostras em laboratório de análises homologado;
4. Acompanhar o processo analítico no laboratório;
5. Realizar a interpretação analítica dos resultados e elaborar o respetivo relatório;
6. Implementar as ações corretivas sempre que necessário. (…)
h) Manutenção Corretiva da Central de Tratamento de Águas, Osmose Inversas, Central de Produção e Concentrados (em caso de opção) e Esgotos:
1. Responder de forma imediata às solicitações do Hospital;
2. Substituir gratuitamente todos os componentes necessários ao bom funcionamento das instalações em causa. (…)»
— cfr. CE, a fls. 160 do PA
g) A B..... solicitou esclarecimentos sobre as peças do procedimento ─ cfr. DOC 4 junto com a PI.
h) O júri respondeu àquele pedido de esclarecimentos nos termos que parcialmente se transcrevem:
«(…) Cláusula 3.3 (Critério B.1.1 – Qualidade Técnica) – Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controlo (…)
As sessões de hemodiálise são tratamentos clínicos que devem ser realizados em condições controladas e seguras para os doentes. Nesse sentido, os concorrentes deverão apresentar uma análise que identifique e descreva todos os perigos no sistema, assim como os pontos críticos de controlo para garantir segurança nos procedimentos. Sugere-se leitura do Manual de Boas Práticas de Diálise Crónica da Ordem dos Médicos (edição de 2017).
(…)
Cláusula 3.3 (Critério B.1.2 – Qualidade Técnica) – Descrição do Equipamento Técnico (…)
Os concorrentes deverão identificar todo o equipamento disponibilizado, descrevendo as principais características funcionais, indicando se é novo ou usado (n.º horas e/ou anos de uso), fichas/manuais técnicos, certificação CE (se aplicável), etc.
(…)
Cláusula 4.8 (Material de Manutenção e Operação a Fornecer)
(…)
a) A manutenção fica a cargo do adjudicatário que deverá zelar pelo bom e adequado do sistema, tanto dos equipamentos como da Central de Tratamento de Águas;
b) O IPOP;
c) Empresa F..... Medical Care;
d) As condições de manutenção e assistência técnica da Central de Tratamento de Águas encontram-se definidas no ponto 4.9 do caderno de encargos;
e) Conforme solicitado, envia-se em anexo a planta das instalações da Central de Tratamento de Águas. Para análise mais detalhada deverá ser realizado levantamento local.» ─ cfr. DOC. 5 junto com a PI.

i) O Júri do Concurso solicitou vários esclarecimentos aos adjudicatários tendo questionado a B....., designadamente, nos seguintes termos:
«Não encontramos na proposta qual o modo de cálculo efetivo da taxa de recirculação do acesso vascular. Como é ultrapassável a falta deste item descrito no caderno de encargos no ponto 4.2?»
— Cfr. acta da reunião do júri de 10 de Janeiro de 2018, a fls. 39 do PA.
j) A B..... respondeu nos seguintes termos:
«Resposta: A B. ..... Lda. Compromete-se a colocar dispositivos Crit-Line em pelo menos dois dos seus monitores Dialog iQ. O dispositivo Crit-Line é um instrumento externo para medição não-invasiva de diversos parâmetros do sangue através de sensores ópticos. Para realizar essa medição, um sensor apropriado (câmara de medição descartável) deve ser colocado na entrada do dialisador.
Os seguintes parâmetros são medidos e calculados:
o Hematócrito (Hct)
o Saturação de Oxigénio
o Fluxo no acesso vascular
o Recirculação no acesso vascular
o Volume de sangue relativo
O dispositivo Crit-Line é conectado à Dialog iQ através da interface localizada na porta traseira denominada DSI (Dialog Serial Interface). (…)»
— cfr. missiva datada de 17 de Janeiro de 2018, a fls. 46 do PA.
k) A proposta da B..... refere que serão colocados «à disposição durante a vigência do contrato, 16 monitores de hemodiálise Dialog iQ novos com a referência 710407A com as seguintes características abaixo descritas:
 Produção de dialisante e soluto de substituição on-line
 Capacidade de hemodiafiltração
 Dupla bomba
 Módulos de monitorização para avaliação da taxa de recirculação em pelo menos dois monitores
 Módulo de monitorização do volume intravascular em pelo menos dois monitores
 Módulo de avaliação de pressão arterial
 Determinação do KT/V on-line
 Homologação/Certificação CE»,
cujas funcionalidades se encontram descritas no manual do equipamento sob o nome de ficheiro “Descricao Tecnica Equipamento_Dialog iQ-S.pdf”, composto por 360 páginas, e constante do PA/CD, que se dá por integralmente reproduzido ─ cfr. proposta da B..... junta como DOC 3 à contestação da CI e PA/CD.
l) A porta traseira DSI (do monitor Dialog iQ) corresponde a um interface genérico ─ uma “porta” universal ─ que permite acoplar diferentes dispositivos, sendo que o Crit-Line estabelece a ligação com o dialisador, e não propriamente com o monitor, para proceder às medições ─ cfr. alínea j) e prova testemunhal.
m) Da proposta da B..... consta documento intitulado “Análise Descritiva”, que «identifica todos os pontos críticos de controlo dos equipamentos e dispositivos médicos comercializados pela B. ..... Lda. para garantir segurança dos tratamentos de hemodiálise» e se inicia pelo tópico “Descrição do Plano HACCP (Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controlo)”, cujo teor se dá por integralmente reproduzidos ─ cfr. fls. 125 a 127 do PA.
n) Da proposta da B..... constam o fornecimento e as descrições técnicas, para além da relativa aos monitores Dialog iQ [cfr. alínea k)], dos seguintes equipamentos, as quais se dão por integralmente reproduzidas:
i. Cadeira de terapia Série II;
ii. Carro de apoio modelo CR.1589.L;
iii. “medical Body Composition Analyzer” seca 525;
iv. Balança de Plataforma seca 635; e
v. Balança digital multifunções seca 685;
— cfr. proposta da B..... junta como DOC 3 à contestação da CI e proposta completa constante do PA/CD.
o) A F..... dispõe de monitores de diálise que contêm módulos internos de monitorização para avaliação da taxa de recirculação, sendo actualmente a única empresa no mercado a fornecer equipamentos em que o parâmetro/sensor é interno ao próprio monitor ─ prova testemunhal.
p) Existem no mercado outras soluções para medir a taxa de recirculação e que passam pela existência de um módulo, anexo ou externo ao monitor, que se acopla e desempenha essa função ─ prova testemunhal.
q) A 12 de Fevereiro de 2018, o júri do concurso aprovou o relatório preliminar como segue:
— cfr. DOC 6 junto com a PI.
r) A, ora, Autora apresentou resposta à audiência prévia dos interessados ─ cfr. DOC 7 junto com a PI, que se dá por integralmente reproduzido.
s) A 19 de Março de 2019, o Júri do Concurso deliberou converter o relatório preliminar em relatório final, e respondeu pontualmente às questões suscitadas pela F..... nos seguintes termos:
— Cfr. acta da Reunião do Júri de 19 de Março de 2018 e parecer jurídico anexo, juntos como DOC 8 à PI.
t) Do parecer jurídico anexo àquela acta consta, designadamente, o seguinte:
— Cfr. o mesmo DOC 8.
u) O Conselho de Administração do IPOP homologou o relatório final do júri, «com a adjudicação à empresa B.....» ─ cfr. fls. 5 e ss. do PA.
v) A Central de Tratamento de Águas (CTA) ─ ou planta de água ─ existente no IPOP é propriedade do próprio adjudicante e foi concebida e montada pela F..... ─ acordo.
w) A planta de água em causa não fornece apenas a unidade de diálise mas cada um dos pisos que compõem o Hospital IPO ─ acordo.
x) Essa CTA inclui dispositivos médicos activos da marca F..... Medical Care, como sejam os dispositivos de osmose inversa ─ cfr. prova testemunhal.
y) É a F..... quem actualmente assegura a manutenção e assistência técnica daquela CTA ─ cfr. resposta ao pedido de esclarecimento 15, cláusula 4.8, a fls. 4 do DOC 5 junto com a PI.
z) A B..... não solicitou, previamente à apresentação da proposta a concurso, o fornecimento de spare parts ou a prestação de serviços de manutenção correctiva ou reparação da CTA à F..... ─ acordo.
aa) Da proposta apresentada pela B..... consta, no tocante à CTA, designadamente, o seguinte:
«(…) condições de execução dos serviços de assistência técnica associados à atividade da unidade de hemodiálise:
(…)
B. Monitorização diária da central de tratamento de águas (CTA):
1. Medição diária dos parâmetros da água (cloro, pH e dureza),
2. Gestão das bombas,
3. Resposta a situações de emergência.
C. Assistência técnica mensal à central de tratamento de águas:
1. Limpeza dos depósitos de água bruta,
2. Revisão geral ao equipamento,
3. Verificação de pressões e caudais,
4. Verificação e reposição dos níveis de sal e hipoclorito de sódio,
5. Verificação e substituição dos filtros de cartucho.
D. Desinfeção mensal da central de tratamento de águas:
1. Desinfeção geral da central de tratamento de águas sempre que necessário.
E. Desinfeção da rede de distribuição de águas
1. Desinfeção da rede de distribuição interna de água tratada, que inclui o serviço de nefrologia, o bloco operatório central e o serviço de cuidados intensivos.
F. Controlo de qualidade da água e fluidos:
1. Definição anual do protocolo laboratorial de análises em conjunto com a unidade de hemodialise,
2. Elaboração do mapa de colheitas periódicas e extraordinárias,
3. Recolha e entrega das amostras em laboratório de analises homologado,
4. Acompanhar o processo analítico no laboratório,
5. Realizar a interpretação analítica dos resultados e elaborar respetivo relatório,
6. Implementar as ações corretivas necessárias sempre que necessário.
G. Manutenção corretiva da central de tratamento de águas, osmose inversa e esgotos
1. Responder de forma imediata às solicitações do hospital,
2. Substituir gratuitamente todos os componentes necessários ao bom funcionamento das instalações em causa.
H. Manutenção preventiva semestral aos esgotos:
1. Efetuar semestralmente a manutenção preventiva dos esgotos provenientes das salas de tratamentos e da central de tratamentos de águas.»
— cfr. fls. 118 do PA.
bb) A B..... é responsável pela manutenção da planta de água do serviço de nefrologia da U..... ─ uma unidade privada de diálise adquirida pelo grupo B..... ─ cuja concepção coube à F....., a qual integra igualmente dispositivos médicos activos da marca F..... Medical Care ─ DOC. 2 junto com a contestação da CI e prova testemunhal.
cc) A manutenção da planta de água mencionada na alínea anterior foi contratada entre a B..... e a F..... cujos técnicos asseguram os respectivos serviços de manutenção ─ cfr. o mesmo DOC e prova testemunhal.
dd) A 9 de Abril de 2018, o IPOP remeteu à F..... uma comunicação sob mensagem de correio electrónico subordinado ao assunto “Visita Central de Tratamento de Água” ─ cujo teor se dá por integralmente reproduzido ─ em que, entre o mais e na sequência da adjudicação, solicitava a presença de técnicos do F..... para acompanhar a visita de Técnicos da firma B..... àquela Central ─ cfr. DOC 9 junto com a PI.
Analisando agora criticamente o resultado probatório (art.º 607.º/4 CPC), importa referir que a convicção do Tribunal quanto aos factos vertidos se formou com base na análise do teor dos documentos pontualmente invocados ─ por adequados à prova dos factos em causa e não impugnados ─, na posição expressa pelas partes nos respectivos articulados, bem como nos depoimentos produzidos pelas testemunhas ouvidas na audiência final.
Em particular, quanto aos factos vertidos em l), o) e p) atendeu-se aos depoimentos das seguintes testemunhas:
1. Joana ..... – formada em engenharia na área dos polímeros, a desempenhar funções de Directora de Marketing e Vendas na F..... Medical Care, sendo responsável pela elaboração das propostas comerciais para a área da hemodiálise, tendo acompanhado o procedimento lançado pelo IPOP — que depôs de forma espontânea e credível; afirmou conhecer o Crit-Line pois a empresa P....., para a qual já havia trabalhado, chegou a comercializar o dispositivo, que é um dispositivo médico autónomo com certificação própria. Mais acrescentou que se trata de um módulo externo e explicou que a solução de avaliação da taxa de recirculação através de um módulo interno é uma solução da F...... Acrescentou ainda que a funcionalidade “avaliação da taxa de recirculação”, a ser oferecida por um monitor de diálise, sendo um parâmetro relevante, deverá constar do manual do dispositivo. Mais acrescentou que, do ponto de vista técnico, o monitor Dialog iQ associado ao dispositivo Crit-Line permite a efectiva avaliação da taxa de recirculação.
2. Aurélio ..... — enfermeiro de formação, a trabalhar actualmente para a F..... como gestor de produto, equipamentos de hemodiálise —, tendo dado formação aos profissionais que lidam com equipamento da marca F..... no IPOP, que se mostrou espontâneo e credível no seu depoimento; afirmou conhecer os monitores Dialog iQ bem como o Crit-Line, que qualificou como um dispositivo médico autónomo; explicou ainda que, no caso do equipamento F....., os monitores de diálise dispõem de um módulo interno que procede ao cálculo da taxa de recirculação (esse módulo está incorporado no próprio monitor) e que existem no mercado módulos externos, isto é dispositivos médicos à parte, com a mesma função; foi confrontado, designadamente, com fls. 46 do PA; referiu conhecer o Crit-Line, que utilizou como enfermeiro há muitos anos atrás, o qual faz medições da taxa de recirculação através de consumíveis próprios do dispositivo (câmara de medição descartável que é acoplada ao dialisador); quanto à porta DSI referiu ser uma porta universal, não tendo conhecimento de para que serve e explicou que o Crit-Line se acopla ao dialisador não sendo necessária qualquer ligação ao monitor propriamente dito.
3. Maria ..... — enfermeira desde 1983, a trabalhar no IPOP, e que fez parte do júri do concurso — que se mostrou espontânea e credível no seu depoimento; afirmou que a referência ao monitor externo não constava da proposta da B..... e que a referência ao Crit-Line veio apenas no pedido de esclarecimentos, sendo este, de facto, um dispositivo externo; mais esclareceu que o Crit-Line é um equipamento específico, dessa marca, que foi até usado no IPOP com os monitores antigos da F....., que não dispunham de módulo interno para avaliação da taxa de recirculação.
4. Ana ..... — médica nefrologista a trabalhar actualmente no Serviço de Nefrologia ao IPOP, trabalhando ainda para os Centros de diálise ....., detidos pela B..... desde final de 2018, também membro do júri — que também se mostrou espontânea e credível no seu depoimento; afirmou peremptoriamente que «os monitores da B..... não têm incluída a avaliação do débito do acesso como nós tínhamos pedido» e o júri perguntou explicitamente à concorrente como se proponha proceder a essa medidção; e a B..... propôs-se, no esclarecimento, fornecer monitores externos Crit-Line; explicou ainda que os monitores Crit-Line medem cerca de 20X20, se colocam em cima dos monitores de diálise e se acoplam às linhas de diálise para fazer a leitura; explicou ainda que todos os monitores B..... lêem a dose de diálise em cada sessão de diálise e isso pode permitir suspeitar que há uma grande taxa de recirculação mas o monitor não mede por si só o débito no acesso. Por fim, confirmou que a CTA do IPOP inclui dispositivos médicos certificados, que são os dispositivos de osmose inversa [cfr. factualidade em x)].
Ainda, e em particular, quanto aos factos vertidos em x), bb) e cc) atendeu-se aos depoimentos das seguintes testemunhas:
5. Rui ..... — actualmente é Director Regional de Marketing da Western Europe da F..... Medical Care, antes de Janeiro de 2017 trabalhava na F..... Portugal e era um dos directores na Direcção de Gestão de Fluidos e indicou ao tribunal que tinha sido o Autor da projecto da CTA do IPOP; explicou ao tribunal, sumariamente, que a CTA utiliza a água da companhia de modo a que, através de etapas de purificação (das quais a fase principal é a da filtração por osmose inversa) se obtenha água ultra pura que é encaminhada para os pontos de consumo, sendo essencial à produção da solução dialisante utilizada nas salas de diálise; relativamente à CTA do IPOP, explicou que os dispositivos médicos osmoses inversas inseridos naquela CTA são da marca F..... Medical Care.
Questionado sobre a U....., explicou que é uma unidade de diálise periférica cuja CTA havia sido projectada pela testemunha e que havia sido recentemente adquirida pela B.....; estando a manutenção daquela CTA contratada entre a B..... e a F....., sendo assegurada por técnicos desta última.
6. Jorge ..... — Director de operações técnicas e responsável pelas áreas de manutenção da F..... — que colaborou na elaboração proposta da F..... na parte da CTA do IPOP e prestou um depoimento espontâneo e conhecedor; explicou que cada central de tratamento de águas é concebida à medida para a dimensão que abrange e respectivo regime de funcionamento, sendo que a CTA do IPOP não alimenta apenas o IPO mas também o bloco operatório e outros serviços; que a CTA do IPO intrega dispositivos médicos activos de osmose inversa da marca F..... Medical Care; questionado quanto à CTA da U....., explicou que é a F..... que assegura a manutenção mensal — mediante contrato com a B..... —, sem que haja qualquer fornecimento de spare parts à B...... E mais acrescentou que, ao contrário do que sucede no IPOP, em Viseu é a própria U..... que assegura a manutenção diária bem como a desinfecção mensal, através dos seus técnicos.
7. Alfredo ..... — assistente graduado sénior e director dos Serviços de Nefrologia, Governador Clínico do Hospital (coordenador do risco clínico do hospital em que se integra o IPOP), tendo sido presidente do júri do concurso — que explicou que a CTA do IPOP foi concebida pela F..... e incorpora osmoses inversas (redundantes) da marca F..... Medical Care e que constituem dispositivos médicos; sobre a matéria dos monitores de diálise, acrescentou que o Crit-Line é tecnicamente muito simples e se acopla aos monitores de diálise e foi até já usado pelo IPOP com monitores F..... quando estes não mediam internamente a taxa de recirculação [cfr. factualidade em o) e p)].
Não se deu por provado que a B..... tenha actualmente técnicos a dar formação à própria Autora.
Com efeito, estava em causa uma alegação a carecer de prova testemunhal e nenhuma das testemunhas ouvidas mencionou essa realidade
Quanto à demais matéria factual alegada, a mesma não carece de ser aqui tida em conta por se tratar de alegações conclusivas, de direito ou impertinentes.
*

II.2 APRECIAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO

Conforme supra enunciado, as questões a decidir cingem-se a saber:
- se ocorre erro de julgamento de facto (recurso da contrainteressada);
- se ocorre erro de julgamento de direito quanto à exclusão da proposta da contrainteressada, por violar a exigência feita no Caderno de Encargos de os monitores serem dotados de módulo de monitorização da taxa de recirculação (recursos da entidade demandada e da contrainteressada);
- se ocorre nulidade da sentença por omissão de pronúncia, ao recusar apreciar os vícios de violação dos princípios da imparcialidade e da transparência revelados pelo depoimento das testemunhas arroladas pela entidade demandada (requerimento de ampliação do âmbito do recurso);
- se ocorre erro de julgamento de direito da sentença ao decidir anular o ato de adjudicação da proposta da contrainteressada, por esta dever ser excluída, na medida em que não observou uma cláusula do CE relativa a aspectos da execução do contrato subtraídos à concorrência (requerimento de ampliação do âmbito do recurso);
Subsidiariamente:
- se ocorre falta de fundamentação da decisão de adjudicação (requerimento de ampliação do âmbito do recurso);
- se ocorre invalidade da decisão de adjudicação por erro grosseiro e manifesto sobre os pressupostos de facto, ao considerar que a proposta continha um Plano HACCP, ainda que não detalhado ou completo (requerimento de ampliação do âmbito do recurso) (requerimento de ampliação do âmbito do recurso);
- se ocorre invalidade da decisão de adjudicação por erro grosseiro e manifesto sobre os pressupostos de facto, ao atribuir a pontuação máxima à proposta da contrainteressada no subfactor descrição completa e detalhada dos equipamentos (requerimento de ampliação do âmbito do recurso);
- se ocorre nulidade da decisão de adjudicação, atenta a presença no Júri do Concurso de trabalhadores da contrainteressada e do presidente, que vendeu participações sociais em empresas à contrainteressada no decurso do procedimento, com violação dos princípios da imparcialidade e da transparência (requerimento de ampliação do âmbito do recurso);
- se ocorre violação do princípio da transparência pela decisão de adjudicação (requerimento de ampliação do âmbito do recurso).


a) do erro de julgamento de facto

Vem a recorrente / contrainteressada invocar que a sentença errou na decisão da matéria de facto, ao não dar como provados os seguintes factos essenciais à decisão da causa e que, sustenta, resultam da prova produzida:
a) O equipamento que consta da proposta da B..... assegura a monitorização da taxa de recirculação - depoimentos da Engenheira Joana ..... (00:56:56), a testemunha Senhor Marco ..... (03:01:22), a testemunha Dra. Maria ..... (00:25:43) e a testemunha Dra. Ana ..... (01:24:12);
b) A proposta da B..... cumpre o exigido no ponto 4.2 do Caderno de Encargos - depoimentos da Engenheira Joana ..... (00:56:56), a testemunha Senhor Marco ..... (03:01:22), a testemunha Dra. Maria ..... (00:25:43) e a testemunha Dra. Ana ..... (01:24:12);
c) A solução proposta pela B..... é, comparativamente à proposta da F....., melhor em termos de “comodidade para os doentes” - depoimento da Dra. Maria ..... (00:25:52).

O artigo 640.º do CPC, sob a epígrafe ‘ónus a cargo do recorrente que impugne a decisão relativa à matéria de facto’, prevê o seguinte:
“1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3 - O disposto nos n.os 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 636.º.”

No caso vertente, a recorrente / contrainteressada cumpriu o ónus que sobre si impendia, ao especificar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, os concretos meios probatórios constantes da gravação da audiência de julgamento, indicando com exatidão as passagens da gravação que impõem decisão diversa sobre aqueles pontos, e a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre tais questões de facto.
Não obstante, improcede a presente impugnação.
Vejamos porquê.
Nota-se, em primeiro lugar, que os factos agora invocados não se mostram alegados nos articulados.
No mais, quanto aos pontos a) e b), as testemunhas Joana ..... e Marco ....., nas indicadas passagens da gravação, respondem à questão de ficar claro para o júri que a proposta da B..... permite medir a taxa de recirculação, ao que ambos respondem afirmativamente, mas apenas perante o esclarecimento prestado ao júri por esta empresa e não por referência à proposta inicialmente apresentada.
Já as testemunhas Maria ..... e Ana ....., nas indicadas passagens da gravação, apenas se pronunciam afirmativamente quanto a constituir uma vantagem a colocação exterior dos monitores relativamente aos postos de diálise, na medida em que o doente não precisa de mudar de posto de tratamento.
Ou seja, à evidência não se retira daqueles depoimentos que o equipamento que consta da proposta assegura a monitorização da taxa de recirculação e que esta proposta cumpre o exigido no ponto 4.2 do Caderno de Encargos, pois tal circunstancialismo apenas se encontra demonstrado após a prestação de esclarecimento.
Conforme já decorre dos pontos i) a n) e q) da matéria de facto dada como assente.
Quanto ao ponto c), para além de não previamente alegado, afigura-se irrelevante do ponto de vista das questões a que cumpre dar resposta nos presentes autos, posto que em nada se relaciona com o invocado erro na anulação do ato de adjudicação da proposta da contrainteressada e a sua exclusão, ou com qualquer dos demais vícios imputados à decisão de adjudicação.
Como tal, improcede a impugnação da decisão de facto.


b) do erro de julgamento de direito quanto à anulação do ato de adjudicação da proposta da contrainteressada

A recorrente / entidade demandada apresenta, em síntese, o seguinte argumentário:
- decorre do artigo 70.º, n.º 2, al. b), 2.ª parte, do CCP, que as deficiências das propostas que apresentem apenas omissões e incompletudes quanto aos termos e condições são supríveis pelo conteúdo da ‘declaração’ de aceitação do CE, a que se refere a norma do artigo 57.º do CCP e passíveis de superação por prestação de esclarecimentos;
- não tem igualmente aplicação o artigo 70.º, n.º 2, al. a), pois caso contrário admite-se a adjudicação de proposta pior e mais onerosa, por confronto com melhor proposta com deficiente apresentação formal e inócua do ponto de vista da execução contratual futura, quando se devem evitar as exclusões desproporcionadas e prejudiciais para o interesse público;
- a sentença recorrida fez equivaler uma omissão de uma especificação técnica a uma violação, contra a ponderação do júri do concurso numa matéria extrajurídica, violando os artigos 70.º, n.º 2, al. b), 57.º, n.º 1, al. a), Anexo I, 72.º, n.º 1, e normas conexas, 56.º do CPA e 95.º, n.º 5, do CPTA.
Já a recorrente / contrainteressada argumenta, em síntese, o seguinte:
- o esclarecimento que prestou não comporta qualquer aditamento ou altera a materialidade da proposta, pois a capacidade dos monitores Dialog iQ serem apresentados com o dispositivo Crit-Line é originária do equipamento;
- é aplicável ao concurso a redação do artigo 72.º, n.º 2, do CCP, anterior ao Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31 de agosto, que apenas abrange os atributos da proposta, quando estão em causa termos ou condições, pelo que era admissível o esclarecimento da falta, que passou a fazer parte integrante da proposta.
Contra-argumenta a recorrida que o equipamento descrito na proposta viola a exigência feita no CE de os monitores serem dotados de módulo de monitorização da taxa de recirculação, que apenas surge com os esclarecimentos a propor o fornecimento de dispositivos Crit-line, alterando e contrariando a proposta, em violação do artigo 72.º, n.º 2, do CCP, implicando a sua exclusão por violar a exigência feita na cláusula 4.2 do CE, nos termos do artigo 70.º, n.º 2, alínea b), do CCP.
Vejamos se é de manter o decidido.
Conforme consta do probatório, a entidade demandada, ora recorrente, lançou concurso público com vista a celebração de um contrato para aquisição de serviços que assegurem a realização de Sessões de Hemodiálise no IPO-Porto através da disponibilização de equipamentos, fornecimento de consumíveis e assistência técnica, de acordo com as características técnicas descritas no Caderno de Encargos (CE).
Consta da cláusula 3.3 do CE a explicação dos critérios de avaliação das propostas, desdobrando-se o critério “qualidade técnica” em dois subcritérios, a avaliação técnica das propostas (B.1) e o prazo de entrega (B.2).
Na avaliação técnica prevê-se o seguinte:
B.1.1 - Descrição do Plano HACCP (Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controlo) da empresa: 20%
a) Será atribuída a pontuação máxima se for apresentada uma descrição detalhada e completa da Analise de Perigos e Pontos Críticos de Controlo e a forma como a mesma será desenvolvida;
b) Será atribuída 50% da classificação quando não haja uma descrição detalhada e completa da Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controlo e a forma como a mesma será desenvolvida;
c) Será atribuída a classificação de 0 valores às propostas que não apresentem a Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controlo.
B.1.2 - Descrição do equipamento técnico: 10%:
a) Será atribuída a pontuação máxima se for apresentada uma descrição detalhada e completa dos equipamentos disponibilizados;
b) Será atribuída 50% da classificação quando não haja uma descrição detalhada e completa dos equipamentos disponibilizados;
c) Será atribuída uma classificação de 0 valores às propostas que não apresentem a informação sobre os equipamentos disponibilizados.
Na cláusula 4.2 do CE, com a epígrafe ‘equipamentos – monitores de diálise’, prevê-se que o adjudicatário deverá colocar em regime de contra consumo 16 monitores com, entre as demais caraterísticas, módulos de monitorização para avaliação da taxa de recirculação em pelo menos dois monitores.
Como se equacionou na decisão sob recurso, as condições técnicas relativas aos monitores de diálise para o serviço de nefrologia, ao seu número e características, constituíam aspetos do contrato não submetidos à concorrência, pelo que as propostas teriam de identificar o equipamento a fornecer.
Ao contrário, conforme se retira do citado ponto 3.3.B.1.2 do CE, a descrição do equipamento técnico, e designadamente dos monitores de diálise, constituía um aspeto da proposta submetido à concorrência, com atribuição de pontuação em função do detalhe da informação prestada, podendo até ser omissa, sem que tal implicasse a exclusão da proposta.
Temos como assente que constava da proposta da contrainteressada, aqui recorrente, o fornecimento de 16 monitores Dialog iQ novos (com a referência 710407A), com as funcionalidades descritas no manual do equipamento, sem qualquer menção à exigida caraterística de módulos de monitorização para avaliação da taxa de recirculação em pelo menos dois monitores – ponto k) do probatório.
Mais temos como assente ter o júri do concurso solicitado à contrainteressada o seguinte esclarecimento: “Não encontramos na proposta qual o modo de cálculo efetivo da taxa de recirculação do acesso vascular. Como é ultrapassável a falta deste item descrito no caderno de encargos no ponto 4.2?” – ponto i) do probatório.
Ao que esta respondeu comprometer-se “a colocar dispositivos Crit-Line em pelo menos dois dos seus monitores Dialog iQ” – ponto j) do probatório
Repise-se, no manual do equipamento Monitor Dialog iQ não consta qualquer referência à funcionalidade de cálculo efetivo da taxa de recirculação do acesso vascular ou a módulos externos que pudessem ser acoplados com essa função, nem consta qualquer menção aos dispositivos Crit-Line, dispositivos externos acopláveis àquele monitor.
A questão é, pois, a de saber se o esclarecimento prestado pela contrainteressada é passível de enquadramento como suprimento da proposta, ao que deu resposta negativa a sentença.
A este propósito, previa o artigo 72.º do CCP (na redação aplicável, que é a anterior à conferida pelo Decreto-Lei n.º 111-B/2017, de 31 de agosto), sob a epígrafe ‘esclarecimentos sobre as propostas’:
“1 - O júri do procedimento pode pedir aos concorrentes quaisquer esclarecimentos sobre as propostas apresentadas que considere necessários para efeito da análise e da avaliação das mesmas.
2 - Os esclarecimentos prestados pelos respetivos concorrentes fazem parte integrante das mesmas, desde que não contrariem os elementos constantes dos documentos que as constituem, não alterem ou completem os respetivos atributos, nem visem suprir omissões que determinam a sua exclusão nos termos do disposto na alínea a) do n.º 2 do artigo 70.º
3 - Os esclarecimentos referidos no número anterior devem ser disponibilizados em plataforma eletrónica utilizada pela entidade adjudicante, devendo todos os concorrentes ser imediatamente notificados desse facto.”
Ao passo que o artigo 70.º, sob a epígrafe ‘análise das propostas’, previa o seguinte, para o que aqui releva:
“1 - As propostas são analisadas em todos os seus atributos, representados pelos fatores e subfatores que densificam o critério de adjudicação, e termos ou condições.
2 - São excluídas as propostas cuja análise revele:
a) Que não apresentam algum dos atributos, nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 57.º;
b) Que apresentam atributos que violem os parâmetros base fixados no caderno de encargos ou que apresentem quaisquer termos ou condições que violem aspetos da execução do contrato a celebrar por aquele não submetidos à concorrência, sem prejuízo do disposto nos n.os 4 a 6 e 8 a 11 do artigo 49.º”.
Haverá que ter ainda presente, que a proposta é a declaração pela qual o concorrente manifesta à entidade adjudicante a sua vontade de contratar e o modo pelo qual se dispõe a fazê-lo, artigo 56.º, n.º 1, do CCP.
Da leitura conjugada destes normativos ressalta um dos princípios da contratação pública, que é o da intangibilidade, indisponibilidade ou imutabilidade das propostas, significando que com a sua apresentação o apresentante fica vinculado à proposta, sem que a possa retirar ou alterar.
Nas palavras de Rodrigo Esteves de Oliveira, “o princípio da intangibilidade das propostas (ou princípio da indisponibilidade ou da imutabilidade das propostas), sendo uma refração dos princípios da concorrência e da igualdade, é um princípio fundamental da contratação pública e significa que, com a entrega da proposta (e com o termo do prazo para a sua apresentação) o concorrente fica vinculado a ela e, consequentemente, já não a pode retirar nem alterar até que seja proferido o ato de adjudicação ou até que decorra o respetivo prazo de validade. As propostas apresentadas ao procedimento adjudicatório não devem, pois, após o decurso do prazo para a sua apresentação, considerar-se na disponibilidade dos concorrentes, de ninguém, aliás, tornando-se intangíveis, documental ou materialmente, valendo pelo seu conteúdo inicial” (Os Princípios Gerais da Contratação Pública, in Estudos da Contratação Pública I, 2008, p. 77).
Tal princípio tem óbvias implicações na amplitude dos esclarecimentos a prestar pelos proponentes, a pedido do júri, posto que, conforme já assinalado, a proposta já não pode ser objeto de alteração depois de apresentada.
Assim, os esclarecimentos podem conduzir à clarificação sobre o sentido menos claro como se encontra descrito um termo, condição ou atributo, “desde que seja nítido que o que está em causa é, não alterar nem completar, mas apenas explicitar ou clarificar o sentido do enunciado que descreve ou define os termos ou condições ou o atributo e que, segundo um critério objetivo, essa explicitação tenha uma correspondência no texto da proposta” (Pedro Gonçalves, Direito dos Contratos Públicos, vol. I, 2018, p. 769).
Como se assinala no acórdão do STA de 30/01/2013, tirado no proc. n.º 0878/12, os esclarecimentos prestados passam a fazer parte integrante da proposta desde que não contrariem os elementos constantes dos documentos que as constituem, não alterem ou completem os respetivos atributos, nem visem suprir omissões que determinem a sua exclusão, cabendo-lhes “uma mera função de explicação ou de aclaração de algo menos nítido ou menos claro, não se destinando a dizer coisa diferente da que se assumira na proposta, nem para completar ou aperfeiçoar algum atributo da mesma, nem para integrar lacunas existentes nos atributos ou nos elementos da proposta (preço, prazo, produto, etc.) cuja omissão justificasse a sua exclusão” (no sentido apontado, vejam-se, vg, os acórdãos do STA de 13/01/2011, proc. n.º 839/10, de 10/07/2013, proc. n.º 498/13, e de 07/05/2015, proc. n.º 1355/14, do TCAN de 06/12/2013, proc. n.º 2363/12.6BELSB, e do TCAS de 20/02/2015, proc. n.º 1606/13.3BEBRG, todos disponíveis em www.dgsi.pt).
No caso vertente, já se assinalou que a proposta em causa apenas aludia à disponibilização dos Monitores Dialog iQ, não constando do manual do equipamento qualquer referência à funcionalidade de cálculo efetivo da taxa de recirculação do acesso vascular ou a módulos externos que pudessem ser acoplados com essa função, nem qualquer menção aos dispositivos Crit-Line, dispositivos externos acopláveis àquele monitor.
Ora, o esclarecimento da contrainteressada, que para efeito do referido cálculo iria colocar dispositivos Crit-Line em pelo menos dois dos seus monitores Dialog iQ, contém claramente uma alteração da sua proposta, que nada referia quanto a essa funcionalidade e a esse produto.
Ao contrário do sustentado pela recorrente / entidade demandada, não está em causa ir contra a ponderação do júri do concurso numa matéria extrajurídica, posto que o que este fez foi admitir a modificação de uma proposta, que na sua configuração inicial não cumpria com o exigido no CE.
Esse é o ponto inelutável, do qual necessariamente se tem de partir, a proposta da contrainteressada não cumpria com o determinado na cláusula 4.2 do CE, que exigia a colocação de pelo menos dois monitores para avaliação da taxa de recirculação.
Como tal, não podia ter aqui lugar o pedido de esclarecimentos previsto no artigo 72.º, n.º 2, do CCP, na medida em que a falta de cumprimento da apontada exigência deveria ter conduzido à exclusão da proposta da contrainteressada, tanto por força da al. a), como por força da al. b), do artigo 70.º, n.º 2, do CCP.
Não está em causa uma exclusão desproporcionada e prejudicial para o interesse público, antes uma exclusão que claramente decorre da lei, imposta pelo princípio da intangibilidade das propostas, que apenas permite a sua clarificação e não a sua modificação.
Bem andou, pois, a sentença recorrida ao decidir anular o ato impugnado e condenar a recorrente / entidade demandada a adjudicar o contrato em causa à proposta apresentada pela recorrida, sem que mereça qualquer censura.

Em suma, os recursos da entidade demandada e da contrainteressada improcedem.
Como tal, queda prejudicada a apreciação das questões invocadas no requerimento de ampliação do âmbito do recurso.
*


III. DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso interposto, confirmando a decisão recorrida.
Custas a cargo dos recorrentes.

Lisboa, 27 de fevereiro de 2020

(Pedro Nuno Figueiredo - relator)

(Ana Cristina Lameira)

(Cristina dos Santos)