Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:07022/10
Secção:CA - 2.º JUÍZO
Data do Acordão:09/20/2012
Relator:CRISTINA DOS SANTOS
Descritores:EDIFICAÇÕES EXISTENTES - DIREITO DE UTILIZAÇÃO -
EDIFICADO ANTERIOR AO RGEU - DOCUMENTOS AUTÊNTICOS
FORÇA PROBATÓRIA DAS PERCEPÇÕES DOCUMENTADAS
Sumário:1. A garantia de existência na vertente activa consagrada no artº 60º nº 2 RJUE abrange também o direito de utilização do edifício legalmente existente em razão da construção anterior à aplicação do RGEU (1951).

2. A escritura pública na parte em que o notário atesta que lhe “foi exibida a caderneta predial urbana com a menção de que “o prédio foi inscrito na matriz antes de 1951” beneficia da força probatória plena dos documentos autênticos quanto ao facto de o texto transposto para a escritura ter sido por si percepcionado – cfr. artº 371º nº 1, 1ª parte, do Código Civil.

3. Agindo o notário fora “do círculo de actividade que lhe é atribuído”, não pode atestar que os prédios em causa foram efectivamente inscritos na matriz antes de 1951, matéria das atribuições da Direcção Geral das Contribuições e Impostos em sede de IMI, pelo que, nesta parte, a menção é apreciada livremente pelo tribunal, nos termos do artº 366º CC, se, junta aos autos a caderneta predial na forma do original, fotocópia certificada ou simples, não for suscitada a falsidade do documento.


A Relatora,
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:A..., Comércio e Reparação de Pneus, Lda, com os sinais nos autos, inconformada com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa dela vem recorrer, concluindo como segue:

A. Tribunal a quo efectuou uma errada apreciação da matéria de facto, designadamente, no confronto da prova testemunhal com a prova documental produzida nos autos.
B. A conclusão alcançada pelo Tribunal relativamente ao carácter posterior a 1951 dos materiais construtivos existentes no armazém da Recorrente é errada e sem qualquer fundamento, porquanto assenta num raciocínio indutivo não decorrendo de qualquer elemento de prova constante dos presentes autos.
C. Errou o Tribunal a quo no julgamento da matéria de facto e aplicou de forma incorrecta o artigo 371.°, nºs l e 2, do Código Civil, ao considerar não provada a existência do armazém da Recorrente, naquele preciso local, previamente a 1951, ao, erradamente, desconsiderar o teor dos vários documentos autênticos com força probatória plena, bem como dos depoimentos das testemunhas com conhecimento pessoal do local, que declaram a existência do referido armazém naquele local previamente a 1951, em favor de testemunhos prestados por pessoas sem conhecimento directo dos factos e cujos depoimentos assentaram em documentos particulares cuja origem e veracidade do respectivo conteúdo não foi demonstrado nos autos.
D. Ao recorrer à prova testemunhal produzida para afastar o efeito probatório dos documentos apresentados, o Tribunal recorrido violou o disposto no artigo 393º, nº 2, do Código Civil.
E. Errou o Tribunal a quo, em violação do disposto no artigo 391º do Código Civil, ao considerar provado que o prédio no qual se localiza o armazém da Recorrente se encontra integrado em AUGI, pois nenhum outro elemento de prova, para além da testemunhal, foi trazida aos autos para demonstração deste facto, que, assim, deveria ter sido julgado não provado.
F. Errou a Sentença recorrida, em violação do disposto no artigo 60.a do RJUE, ao considerar válido o acto administrativo de indeferimento praticado pela CM de Loures com base na aplicação do PDM de Loures, entrado em vigor em 14 de Julho de 1994, a uma construção que, como o próprio Tribunal reconhece, existia desde 1951.
G. Errou também a Sentença recorrida, em violação do disposto no artigo 60º do RJUE, ao considerar válido o acto administrativo de indeferimento praticado pela CM de Loures com fundamento na existência de uma servidão legal de não construção, referida em parecer emitido pela ANA, pois tal servidão não existia no momento em que a edificação foi erigida.
H. A Sentença recorrida viola o princípio do dispositivo (artigo 264º do Código de Processo Civil) e o princípio da igualdade das partes (artigo 6º do CPTA), ao considerar na sentença uma suposta transformação no armazém da Recorrente, não alegada nem provada pela Recorrida.
I. Sem prejuízo da ilegal consideração de factos não alegados pela Recorrida, sempre seria ilegal a decisão do Tribunal a quo ao considerar válida a decisão municipal impugnada, pois, conforme resulta do número dois do referido artigo 60º do RJUE, "a licença ou admissão de comunicação prévia de obras de reconstrução ou de alteração das edificações não pode ser recusada com fundamento em normas legais ou regulamentares supervenientes à construção originária, desde que tais obras não originem ou agravem desconformidade com as normas em vigor ou tenham como resultado a melhoria das condições de segurança e salubridade da edificação".
J. Contrariamente ao que se decide na Sentença impugnada a entidade administrativa aqui Recorrida violou o princípio da protecção da confiança e da boa fé, pois não podia deixar de atender ao que previamente ela mesma havia declarado perante a Recorrente, errando o Tribunal a quo ao aplicar a este caso o disposto no artigo 371º, n.a 2, do Código Civil, e não o artigo 6º-A do Código do Procedimento Administrativo.
K. A decisão do Tribunal a quo no sentido de não conhecer a alegada ilegalidade da aplicação do RGEU por inexistência de obrigação de obtenção de licença de utilização de construções situadas fora do perímetro urbano ou de zona rural de protecção fixada para as sedes do concelho e para demais localidades sujeitas por lei a plano de urbanização e expansão, relativamente a construções anteriores a 1991, de por considerar que tais factos não foram alegados pela Recorrente é violadora dos artigos 6º e 7º do CPTA.
NESTES TERMOS, Requer-se a V. Exas., se dignem julgar procedente o presente recurso, e, consequência, seja revogada a Sentença recorrida e substituída por decisão condenatória do Recorrido, conforme peticionado.

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O Município de Loures, ora Recorrido, não contra-alegou.

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Colhidos os vistos legais e entregues as competentes cópias aos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, vem para decisão em conferência.

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Pelo Senhor Juiz foi julgada provada a seguinte factualidade:

1. Em 04.06.2002 B...apresentou na CML o requerimento constante de fls. 244 e 245 do PA, que aqui se dá por integralmente reproduzido, pedindo para efeitos de registo na Conservatória do Registo Predial, que fosse certificado que o prédio sito na Quinta do Galvão, Azinhaga de Fetais, da freguesia de Camarate, inscrito na matriz sob o n.° 1830 e descrito na 2° Conservatória do Registo Predial de Loures e assinalado na planta que anexava, era anterior a 1951 (acordo; cf. também o doe. de fls. 52 e 53 dos autos).
2. Em 22.07.2002 foi elaborada pela CML a Informação constante de fls. 243 do PA, que aqui se dá por integralmente reproduzida, que informa que a construção assinalada no pedido acima referido era anterior a 1951 (acordo; cf. também o doe. de fls. 51 dos autos).
3. Em 30.07.2002 sobre a supra referida Informação foi exarado o despacho do Presidente CML de «De acordo. Certifique-se», conforme doe. de fls. 243 do PA que aqui se dá por integralmente reproduzido (acordo; cf. também o doe. de fls. 51 dos autos).
4. A A. é uma sociedade comercial, constituída em 13.12.2005 que tem por objecto o "comércio e reparação de pneus" (acordo; cf. doe. de fls. 32 a 35 e de fls. 84 e 85 dos autos).
5. C...é sócio detentor da maioria do capital social da A...e e é dono de dois prédios contíguos situados na freguesia de Camarate, Município de Loures - inscritos na matriz predial urbana sob os artigos nº 5435, anterior n.° 1829 e 5436 antigo n.° 1830 nos quais a A. exerce a actividade que constitui o seu objecto social (acordo; cf. doc.s de lis. 32 a 46).
6. Em 24.04.2006 a A. requereu a emissão de documento que titule o direito de utilização do armazém no qual exerce a actividade de comércio e montagem de pneus e acessórios que constitui o seu objecto social, dando origem ao Processo n.° 48779/LA/E(acordo; cf. PA apenso, designadamente doe. de fls. 41).
7. Entre outros documentos o A. juntou ao seu pedido a certidão de fls. 44 a 47 do PA que aqui se dá por integralmente reproduzida, relativa à escritura de compra e venda do prédio urbano composto por dois pisos para armazém descrito na 2° Conservatória do Registo Predial de Camarate sob o número 3427, datada de 2004.02.13, que afirma que o «prédio» inscrito na matriz sob o nº 1830 é anterior a 1951 (cf. de fls. 44 a 47 do PA e doe, de fls. 43 a 46 e de fls. 146 a 148 dos autos).
8. O armazém construído no prédio situado na freguesia de Camarate, Município de Loures, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo n.° 5435, anterior n.° 1829, que deu origem ao pedido de licenciamento relativo ao Processo n.° 48779/LA/E, não foi licenciado e está a ser utilizado como armazém pelo ora A. (acordo).
9. Na memória descritiva e justificativa entregue pelo A. no Processo n.° 48779/LA/E, relativo ao armazém sito no prédio da freguesia de Camarate. Município de Loures inscrito na matriz predial urbana sob o artigo n.° 5435 anterior n.° 1829 é referido que o «edifício industrial de armazém com piso único» ali construído «é constituído por estrutura de betão armado formada por pilares e vigas, sendo a cobertura formada por estrutura metálica, revestida a chapa ondulada», conforme does. de fls. 29 a 30 do PA, que aqui se dá por integralmente reproduzidos.
10. Com data de 16.10.2006 a Direcção de Projecto Áreas Urbanas de Génese ilegal (DPAU GD da CML produziu a informação constante de fls. 83 e 83 A. do PA, que aqui se dá por integralmente reproduzida, no âmbito do Processo n.° 48779/LA/E, nos termos da qual referia, designadamente o seguinte: «PRETENSÃO legalização actividade
1. Sumário da Pretensão:
[1.1] Vem o titular, com requerimento a fls. 2 e 3, efectuar o pedido de alvará de licença de utilização para uma oficina de reparação de veículos automóveis, actualmente a laborar. A pretensão, insere-se no bairro Quinta de St. Rosa, delimitado como Área Urbana de Génese Ilegal (AUGI) nos termos e para os efeitos do n°4 do art.1 da Lei 91/95 de 2 de Setembro, sem o respectivo alvará de licença de loteamento.
[1.2] Para esta área, está em causa uma operação de loteamento da iniciativa dos proprietários de acordo com a referida Lei, com o objectivo de emissão de alvará de loteamento.
[1.3] O PDM classifica o solo como Espaço Urbano de Indústrias a Reconverter, a Recuperar e a Legalizar e Espaços Urbanizáveis de Verde Urbano de Protecção e Enquadramento.
2. Fundamentação:
[2.1] Verifica-se, através de contrato de sociedade e das certidões de teor constantes de fls. 10 a 18, que a propriedade está em nome de C...e que o requerente do presente processo é a empresa A... - Comércio Reparação de Pneus Lda.
[2.2] A fls. 10, verifica-se que o cartão de identificação de pessoa colectiva e entidade equiparada da empresa supra identificada, já caducou face ao seu carácter provisório (válido por três meses - até 2006/02/22).
[2.3] Para o local, existe o processo antecedente n,° 46857/LA/E/OR, em nome de D... - Importação e Comércio de Pneus, Lda., que não teve prosseguimento administrativo e foi arquivado em 2005/03/16. artº 1829
[2.4] De referir, que para o mesmo local, existe também o processo n.° 49016/CP/E/OR, em nome do mesmo titular do presente processo (A... - Comércio Reparação de Pneus Lda.), cuja pretensão traduzia-se na substituição da cobertura da referida construção. Através de uma consulta promovida à ANA — Aeroportos verificou-se que a pretensão não era viável, pelo que foi dado parecer desfavorável. artº 1829
[2.5] Existe ainda a fls. 59, um parecer desfavorável à pretensão, prestado pelo Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil. As peças rectificativas entregues, constantes no processo de fls. 69 a 73 não contemplam parecer actualizado [2.6] Na sequência do atravessamento do eixo Norte/Sul - Nó de Camarate - Nó de ligação da CRIL, foi promovida consulta à Estradas de Portugal, EPE., pelo que a mesma indica que a referida pretensão está fora do limite de área expropriada, apesar da mesma ter implicado na área do lote em questão,
[2-7] A nível urbano e em consequência do ponto anterior, considera-se ainda que a referida oficina não está dotada das melhores condições para laborar no local. O lote está localizado junto à Estrada de Fetais, esta com bastante tráfego automóvel e considerada uma das estradas principais da zona de Camarate, e não dispõe de qualquer tipo de espaço/estacionamento público junto do mesmo. De referir também que o acesso à respectiva actividade é posto em causa, uma vez que existe apenas uma única entrada/saída de viaturas e esta está localizada em cima da rotunda/nó de ligação, actualmente existente na zona a norte do lote, conforme se pode constatar na planta apresentada a fls. 80 e nas fotografias a fls. 82 do presente processo.
3. Proposta:
À Consideração Superior,
[3.1] Verifica-se que, com os elementos de Estudo, constantes do processo de reconversão, não é possível viabilizar qualquer construção ou obras de qualquer natureza para a área em causa, aguardando-se a entrega do projecto de loteamento/reconversão com a definição das regras de construção para o local.
[3.2] Assim, julga-se de indeferir a pretensão com base na alínea a) do n°.1 do artigo 24° do D. L. n.° 555/99 na redacção vigente, e ainda, no incumprimento do art. 1º da Lei 91/95 de 2 de Setembro, na redacção vigente, por inexistência de alvará de licença de loteamento.
[3.3] Contudo e uma vez que a actividade comercial já se encontra a laborar no local, sugere-se que seja promovida consulta aos SMAS no intuito de se saber se a drenagem das águas residuais é efectuada para a rede pública e se possui colector/recolhedor para os resíduos líquidos inerentes à actividade (óleos, solventes, tintas, etc), de acordo com o RDARI (Regulamento de Descarga de Águas Residuais Industriais nas Redes de Colectores Municipais).
O Técnico E...» (acordo; cf. doe. de fls. 83 e 83- A do PA e de fls. 1 5 1 a 1 52 dos autos).
11. Em 20.10.2006 sob a referida Informação foi elaborada a seguinte Proposta do Chefe de Divisão da CM L: «Informação do Chefe de Divisão Ao Sr. Vereador F...- Concordo com a informação técnica e com a proposta de indeferimento da pretensão relativa à emissão de uma licença de utilização para oficina de reparação de veículos automóveis.
Em causa está o facto de se tratar de uma construção clandestina localizada em AUGI, sem alvará de licença de loteamento, em área que o PDM determina como espaço Canal Rodoviário e de Protecção e Enquadramento, estando ainda sujeita à servidão aeronáutica do aeroporto de Lisboa. Aquando do processo de licenciamento das obras nesta construção, entretanto indeferido, foi emitido um parecer desfavorável da ANA-SA, relativa à servidão aeronáutica, como referido na informação técnica.
Acresce ainda referir que em relação à localização da actividade o parecer técnico é igualmente desfavorável em ordem a critérios de correcta inserção urbanística e dos impactos com a envolvente.
Assim, propõe-se notificar o titular do processo para dizer o que se lhe oferece, no prazo de 10 dias a contar da notificação, nos termos e para os efeitos do art.101° do CPA, remetendo-se cópia da informação dos serviços com a qual se concorda. Findo este prazo considera-se a pretensão formalmente indeferida e irá proceder-se ao arquivo do processo.
Propõe-se igualmente informar a Div. Jurídica do exposto nesta informação para actuação em conformidade.
20-10-2006 G...” (acordo: cf. doe. de fls. 84 do PA e de fls. 1 5 1 a 1 52 dos autos).
12. Em 24.10.2006 sob a referida Informação e Proposta é exarado o seguinte despacho do Vereador da CML: « Proposta de decisão contida na informação nc 60 a folhas 83 do processo acima mencionado, com data de 16-10-2006 e elaborada pelo técnico E...: DESPACHO do VEREADOR Concordo, nos termos propostos pelos Serviços, O VEREADOR, com competência delegada pelos despachos 62/PRES de 03.11/2005 e 69/PRES de 17:11/2005 do Sr. Presidente, 24.10.2006 F...» (acordo; cf.. doe. de fls. 85 do PA).
13. Em 08.11.2006 foi produzida uma informação pela I... da CML sobre o pedido formulado pela A. na qual se afirmava, designadamente que se julga "de indeferir a pretensão com base na alínea a) do nº 1 do artigo 24º do DL nº 555/99 na redacção vigente, e ainda, no incumprimento do artº 7º da Lei 91/95 de 2 de Setembro, na redacção vigente, por inexistência de alvará de licença de loteamento " (acordo).
14. Em 08.11.2006 o A. apresentou na CML o requerimento de tis. 91 e ss do PA c documentos de fls. 96 a 119, que aqui se dão por integralmente reproduzidos, dos quais consta uma fotocópia da escritura de compra e venda, celebrada em 15.01.1998. relativa ao prédio urbano sito na Quinta do Galvão, Azinhaga dos Fetais, Freguesia de Camarate Conselho de Loures, descrito na 2° Conservatória do Registo Predial de Loures sob o número 1408 inscrito na matriz sob o n.° 1829; cópia de auto de expropriação relativo a parcela a destacar do prédio inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Camarate, artigo 1829, descrito na 2° Conservatória do Registo Predial de Loures c extracto da planta parcelar, que assinala a parcela expropriada e fotografias.
15. Em 08.11.2006 o A. entregou na CML juntando ao processo n.° 48779/LA/E./OR as fotografias constantes de fls. 117 a 119 do PA que aqui se dão por integralmente reproduzidas, relativas ao armazém construído no prédio situado na freguesia de Camarate, Município de Loures, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo n.° 5435, anterior n.° 1829 (cf. também fotografias de fls. 82 do PA).
16. Em 13.11.2006 o A. apresentou na CML o requerimento de fls. 88A do PA e documento de fls. 89, que aqui se dão por integralmente reproduzidos, dizendo no requerimento que já eram observáveis «os edifícios» nos prédios urbanos correspondentes as artigos 1829 e 1830 de acordo com a planta do local que era anterior a 1951, que junta fotocópia.
17. Em 19.11.2006 a CML produziu uma informação na qual se afirmava que a A. exercia a sua actividade "numas instalações sitas na Estrada dos Fetais, lote 6, em Camarate sem que para o efeito as referidas instalações possuam a necessária licença de utilização o que viola a conjugação do artigo 11ºdo DL 370/99 de 18 de Setembro com o anexo III da Portaria 33/01 de 28 de Janeiro" e que tal conduta indiciaria, na opinião do R., '"a prática de uma contra-ordenação prevista pela al. a) do n.° l do artº 37º do DL 370/99 de 18 de Setembro e punida pelo nº 2 do mesmo artigo " (acordo: cf. doe. de fls. 1 53 dos autos).
18. Por carta datada de 06.12.2006 a CML comunicou à A. o teor das informações antes descritas e para se pronunciar sobre a alegada contra-ordenação (acordo: cf. doe. de fls. 149 dos autos).
19. Em 17.12.2006 o A. apresentou na CML o requerimento de fls. 121 e ss do PA e documentos de fls. 122 a 133 que aqui se dão por integralmente reproduzidos, dos quais consta designadamente a fotocópia certificada da caderneta predial urbana relativa ao artigo 1829.°da freguesia de Camarate que indica ser relativa a «prédio urbano de l piso», para armazém, que foi construído antes do ano de 1951; fotocópia certificada da caderneta predial urbana relativa ao artigo 1830.° da freguesia de Camarate. que indica ser relativa a prédio urbano de 2 pisos, para armazém, que foi construído antes do ano de 1951: fotocópia e uma planta da CML.
20. Em 11.01.2007 o A. apresentou na CML o requerimento de fls. 135 do PA e documentos de fls. 136 e 137, que aqui se dão por integralmente reproduzidos, dos quais consta designadamente duas fotocópias de duas fotografias aéreas, indicando-se datarem de 1944 e de 1982.
21. Em 12.02.2007 o A. voltou a entregar na CML um requerimento anexando fotocópia das duas fotografias aéreas acima referidas, conforme does. de fls.160a 162 do PA.
22. A I... produziu em 29.05.2007 a informação constante de fls. 187 e 188 do PA. que aqui se dá por integralmente reproduzida, que refere designadamente o seguinte:« PRETENSÃO legalização actividade
1. Sumário da Pretensão;
[1.1] De acordo com o requerimento em nome de A... - Comércio e Reparação de Pneus, Lda., apresentado a fls 2 e 3, a pretensão baseia-se na obtenção do alvará de licença de utilização para o estabelecimento comercial, denominado por "A..." - Oficina de manutenção e reparação de veículos Automóveis - CAE 50200 sita no bairro Quinta de Santa Rosa em Camarate. No decorrer do processo verifica-se que houve um lapso por parte do requerente na identificação da empresa, a qual será então A... - Comércio e Reparação de Pneus, Lda.
[1.2] A referida pretensão foi objecto de proposta de indeferimento, a qual mereceu despacho de concordância a fls. 84 e 85. por inexistência de alvará de licença de loteamento, conforme o disposto na alínea a) do n.° 1 do artigo 24° do D.L, n.° 555/99 na redacção vigente.
[1.3] Nesse seguimento, no âmbito da resposta ao indeferimento, têm havido várias reuniões nestes serviços, entre o requerente. Sr Armando Vaz e o seu representante legal, Sr. Dr. António Correia e Vale, o Dr. Fernando Vicente e a signatária. A refutação baseia-se em comprovar o facto de a edificação, onde labora a empresa em causa, ser anterior a 1951, afim de se definir o estatuto jurídico da mesma nos termos do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação.
2. Fundamentação:
[2.1] De acordo com os elementos entregues a fls, 93. a empresa está a laborar no concelho desde 1986/09/20.
[2,2] Relativamente à edificação, ou seja, o prédio urbano com o artigo matricial 1829°, foram entregues vários elementos, nomeadamente:
[2.2.1] Registo na Conservatória Registo Predial, de fls. 7 a 9 - criação da descrição do prédio em questão, autónoma, data de Março de 1992. Verifica-se também que a aquisição do mesmo data de 1998/01/15 e que era composto por um R/C – armazém com uma área de 1000 m2 de superfície coberta.
0[2.2.2] Cópia da escritura pública de compra e venda, constante no processo de fls. 96 a 99 _ celebrada no Cartório Notarial de Tomar e onde é referido que a Inscrição na matriz foi antes de 1951;
[2.2,3] Cópia da Certidão do Ministério das Finanças, de fls. 122 a 124 - menciona que a construção é anterior a 1951 conforme documento arquivado na referida Repartição de Finanças;
[2.2.4] Caderneta Predial Urbana, constante a fls, 19 e 20, e a respectiva avaliação do Ministério das Finanças, datada de 2005/07/06 - a descrição do prédio identifica a afectação para armazéns e actividade industrial, com 2 pisos e 3 divisões. A área total do terreno é de 660 m2. com uma área de implantação igual e com uma área bruta de construção de 685 m2;
[2.2.5] Contrato de constituição da sociedade comercia afecta à empresa em causa; de fls. 11 a 14, celebrado em 2005/12/13, cujos sócios gerentes são o Sr, C...e a Sra D. H....
[2.3] Uma vez que foi considerado não estar devidamente justificado o estatuto jurídico do prédio, face às plantas correspondentes ao levantamento referente a 1951 constantes nestes serviços, foram solicitados então, elementos ao Instituto Geográfico Português comprovativos do mesmo, nomeadamente, certidão negativa ou elemento gráfico representativo do levantamento do ano em causa. Na sequência do referido foram passadas duas certidões, ambas inconclusivas e constantes do presente processo a fls. 169 e 186.
[2.4] A parcela em causa foi. ainda, objecto de expropriação no âmbito da execução do traçado do Eixo Norte/Sul - Nó de Camarate - Nó de ligação à CRIL. Expropriação essa, que acabou por não ter efeitos físicos no local. Assim, através de algumas reuniões bem como de carta enviada para as Estradas de Portugal, EPE o titular da mesma procedeu ao pedido de reversão da mesma, conforme documento constante a fls. 112 e 113. Desconhece-se, actualmente, se o referido processo já está concluído.
[2.5] No seguimento das várias reuniões tidas nestes serviços e da proposta de indeferimento à pretensão face ao facto da parcela integrar uma AUGI, foi mencionada a possibilidade de analisar a pretensão no âmbito de uma autorização de funcionamento da empresa a título precário. Para isso, seria necessário reunir as condições mencionadas no ponto 2.7. da informação n.° 60, constante a fls. 83 e 83A, que reflectem as condicionantes urbanas do local.
[2.6] No seguimento do ponto anterior, foram entregues de fls. 172 a 174, elementos que retratam as áreas expropriadas, bem como a reversão das mesmas, e a possibilidade de resolver o estacionamento e a segurança rodoviária imposta e necessária para a análise da pretensão.
3. Proposta:
[3.1] Face ao exposto anteriormente, submete-se à Consideração Superior a aceitação dos elementos entregues pelo requerente afim de comprovar o ano de construção do prédio.
[3.2] Caso se considere que não existem elementos comprovativos do ano de construção da referida edificação, poder-se-á proceder à análise da pretensão no âmbito de uma autorização de funcionamento da empresa a título precário, como anteriormente referido. Julga-se contudo, ser primordial, a conclusão do processo de reversão das áreas expropriadas. Outros aspectos também serão objecto de análise mais aprofundada, como os projectos e soluções apresentadas, tendo em conta o Plano de Urbanização de Camarate » (acordo).
23. Em 04.06.2007 o Chefe de Divisão, Arq. G..., emitiu sob a informação antecedente o seguinte despacho" Informação do Chefe de Divisão Ao Sr. Vereador F...
Do exposto nas informações que constam deste processo a fls. 187/187-A, não é possível concluir que a edificação é anterior a 1951, pelo que, propõe-se, em definitivo, o indeferimento da emissão de uma licença de utilização para oficina de reparação de veículos automóveis.
Quanto ao referido, no ponto 3.2 da informação técnica, em relação ao facto da Câmara poder vir a autorizar o funcionamento da actividade a título precário, nos termos de definido no Regulamento Municipal, por estar em causa uma AUGI, tal autorização precária, está dependente de um parecer favorável da ANA. SÁ, bem como, da resolução das condicionantes que se referem à falta de estacionamento e de segurança rodoviária com a entrada e saída de veículos do local. Sem prejuízo da entrega, em tempo, de outros elementos que assegurem o cumprimento das normas legais e regulamentares relativas ao funcionamento da actividade.
Caso se concorde com o acima proposto, deverá o titular do processo, num prazo máximo de 60 dias, entregar proposta que vise dar resposta às questões colocadas. Findo este prazo: caso as questões não se encontrem ultrapassadas de forma definitiva, propõe-se remeter este processo à Div. Jurídica/Fiscalização Municipal, para actuação em conformidade por inexistência da respectiva licença de utilização.
04-06-2007 G... ». (acordo: cf. doe. de fls. 188 do PA).
24. Em 05.06.2007 o Vereador da CML proferiu despacho de concordância com a proposta dos serviços (acordo; cf. doe. de fls. 189 do PA).
25. Em 27.07.2007 deu entrada, na CML. o recurso hierárquico impróprio interposto pela A., do despacho de 05.06.2007 do Vereador da CML, conforme doe, de tis. 195 a 222 do PA e de tis. 60 a 81 dos autos (acordo).
26. Em 07.08.2007 foi produzida pela I... a Informação constante de fls. 224 a 227 do PA. que aqui se dá por integralmente reproduzida, incidindo sobre o recurso hierárquico interposto pela A. onde propunha a rejeição do mesmo por extemporaneidade e na qual se refere designadamente o seguinte: «assunto: Recurso Hierárquico Impróprio para revogação de decisão., apresentado pela empresa A... - Comércio e Reparação de Pneus, Ld.a - Quinta de Santa Rosa - Camarate.
Face ao solicitado pelo Sr. Director da I..., na sequência da recurso hierárquico, referido supra, apresentado pela ilustre advogada, Dra. J..., na qualidade de mandatária legal da recorrente, a empresa A... - Comércio e Reparação de Pneus, Ld.a, informa-se que:
1. O recurso não foi apresentado em tempo, nos temos conjugados do disposto no nº 1 do artº 168° e da alínea b) do artº 162°, ambos do Código do Procedimento Administrativo (CPA),
2.O facto de o recurso em apreço ser extemporâneo, por ter sido interposto fora do prazo legalmente previsto para o efeito, constitui fundamento para a rejeição do mesmo, nos termos do disposto na alínea d) do art.° 173° do CPA.
3. Ainda assim e porque o relacionamento desta Câmara com os particulares/munícipes sempre se tem pautado pelo respeito por princípios consagrados como princípios gerais do direito administrativo, como são o da legalidade, justiça, proporcionalidade e boa-fé, actuando sempre com transparência, se considera que se impõe a clarificação de alguns dos factos suscitados pela recorrente,
4. Impõe-se primeiramente, em jeito de questão prévia, clarificar que o recurso apresentado é erroneamente classificado como recurso hierárquico impróprio, pois esse é um tipo de recurso administrativo mediante o qual se impugna um acto praticado por um órgão de certa pessoa colectiva pública perante outro órgão da mesma pessoa colectiva, que não sendo superior do primeiro, exerça sobre ele poderes de supervisão (art. 176° CPA), o que não é o caso.
5. Poderia suscitar-se a questão de os actos praticados pelo Sr. Vereador João Pedro Domingues, que em regra o são no uso de competências delegadas e subdelegadas, serem ou não definitivos? Entre nós a regra geral é de que os actos do delegado/subdelegado são definitivos e executórios nos mesmos termos em que o seriam se tivessem sido praticados pelo delegante. Esta regra decorre para a administração local do art. 65°/6 da Lei das Autarquia Locais (LAL), bem como dos arts. 83°, §§1° e 4°, 105°, §§1°, 2° e 3°, e 404°, §2° do Código Administrativo (CA), entre outros.
6. Estamos então perante um recurso hierárquico facultativo, uma vez que respeita a um acto verticalmente definitivo, do qual já cabe recurso contencioso, hipótese esta em que o recurso hierárquico é apenas uma tentativa de resolver o caso fora dos Tribunais, mas sem constituir um passo intermédio indispensável para atingir a via contenciosa.
7.Clarificado este facto, passa-se então à questão central do valor probatório dos diferentes documentos, referenciados no articulado do recurso em apreço.
8.Nesta matéria, relativa aos documentos autênticos e respectivo valor probatório, salienta-se o disposto no Decreto-Lei nº 47 344 de 25 de Novembro de 1966, na sua redacção actual, que consagra o Código Civil Português (doravante designado como CC), mais concretamente nos seus artigos 369,° e seguintes, que de seguida se transcrevem:
(...)
13. Rapidamente se afirmou a necessidade de ser apresentada certidão, emitida pelo IGP e atestando ter a edificação em questão sido erigida em data anterior ao ano de 1951, como única solução adequada à resolução da situação, a contento da recorrente, com a definição de um estatuto jurídico da edificação, em enquadramento com a legislação aplicável.
14. Inicialmente foram apresentados extractos de levantamentos fotográficos aéreos, um datado de 1944 e outro datado de 1982, que começam por constar de fls. 160 a 163, que, pelas datas em que foram realizados, não permitem concluir ter a edificação em questão sido erigida em data anterior ao ano de 1951.
15. Por parte da recorrente, foi então, dada nota aos técnicos dos serviços da Câmara de que o IGP não disporia de um levantamento cartográfico de 1951 ou de outra cartografia que pudesse comprovar o pretendido, facto que muito se estranhou em virtude de, como já referido, a cartografia digitalizada que o Município possui foi constituída e é actualizada com dados provenientes do IGP, tanto em suporte de papel como em suporte digital, mas, ainda assim, não se colocou em causa a sua boa-fé.
16. À recorrente solicitou-se, então, que apresentasse declaração emitida pelo IGP, atestando a inexistência de um levantamento cadastral datado de 1951.
17. Nessa sequência declarações foram apresentadas, mas todas com um texto inconclusivo (fls. 169 e 186), mesmo após lhe ter sido dada, de forma expressa, conta do teor que a necessária declaração deveria ter (informação a fls. 171 e notificação a fls. 175).
18. Nem o facto de ter sido entregue pela recorrente, cópia do requerimento por ela efectuado ao IGP (constante de fls. 181), estar em dissonância com a certidão emitida por aquela entidade (constante de fls. 186), tanto em no que respeita ao conteúdo, como no que respeita à pessoa a favor de que a mesma certidão é emitida, indiciando uma clara irregularidade e quebra de boa-fé, levou a uma alteração da postura dos serviços camarários, retractada no ponto 11 da presente informação.
19. Assim, considera-se de actuar nos termos propostos no ponto 2 da presente informação, rejeitando o recurso em apreço por extemporâneo, nos termos do disposto na alínea d) do art.º 173° do CPA, devendo desse facto ser dado conhecimento à ilustre advogada. Dra. J... na qualidade de mandatária legal da recorrente, e à recorrente, a empresa A... sua representada.
À consideração superior,
Fernando Vicente» (acordo: ef. também doe. de fls. 90 a 94 dos autos).
27. A informação acima referida foi comunicada ao A. (acordo).
28. Em 14.08.2007 o Vereador da CML F...proferiu uma decisão sobre o mencionado recurso hierárquico, conforme doe. de fls. 229 do PA, que quanto ao teor e fundamentação adere a informações emitidas pelos serviços camarários (acordo; cf. também doe. de fls. 90 a 95 dos autos).
29. Em 16.08.2007 o A. juntou ao processo n.° 48.779/LA/E/OR diversos documentos, conforme does. de fls. 231 a 246 do PA. que aqui se dão por reproduzidos, designadamente fotocópia certificada de uma certidão dos Serviços de Finanças que reproduz a certidão da Junta de Freguesia de Camarate emitida em 10.05.1993 da qual consta que «o imóvel» relativo ao artigo 1829 (propriedade de Armando dos Santos» foi construído antes de 1951: fotocópia certificada de uma planta; fotocópia certificada de uma certidão dos Serviços de Finanças que reproduz a certidão da CML n.° 226/02, emitida em 01.08.2002. que indica que conforme despacho exarado sobre a petição de B..., a construção no prédio integrado no artigo 45, secção C, da Freguesia de Camarate, Conselho de Loures é anterior a 1951, de acordo com a planta cadastral da campanha de 1951, fotocópia certificada da referida certidão CML n.° 226/02, da qual consta a indicação manuscrita «an.1830 Camarate» e cópia do pedido, informação e despachos referidos nos pontos L, 2. e 3, da matéria assente (cf. os documentos a fls. 48 a 58 dos autos).
30. Com data de 30.08.2007 foi emitida pelos Serviços de Finanças a certidão de teor constante de fls. 37 e 38, relativa ao prédio urbano com o artigo 1829.° da freguesia de Camarate, que indica ser relativa a prédio sem andares, para armazém (cf.doc.de fls. 37 e 38).
31. O prédio situado na freguesia de Camarate. Município de Loures inscrito na matriz predial urbana sob o artigo n.° 5435, anterior n.º 1829, está integrado numa área classificada pelo Plano Director Municipal de Loures (de ora em diante abreviadamente designado de PDM) como Espaço Urbano de Industrias a Reconverter, a Recuperar e Legalizar e Espaços Urbanizáveis de Verde Urbano de Protecção e Enquadramento (acordo: cf. docs 26 a 28 do PA).
32. Nem a A. nem K...participaram em nenhuma iniciativa tendente à delimitação de uma AUG1 que incluísse o prédio situado na freguesia de Camarate. Município de Loures, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo n.° 5435, anterior n.° 1829, nem foi aos mesmos comunicada qualquer iniciativa oficiosa da CML nesse sentido (acordo).
33. Com data de 01.08.2007 foi emitida pelos Serviços de Finanças a certidão constante de fls. 48 c 49 dos autos, relativa ao prédio urbano sito em Camarate, inscrito na matriz sob o artigo 1830, que reproduz a certidão da CML emitida cm 01.08.2002 a requerimento de B..., da qual consta que o prédio relativo ao artigo 1830 foi construído antes de 1951 de acordo com a planta cadastral da campanha de 1951.
34. O armazém construído no prédio situado na freguesia de Camarate. Município de Loures, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo n.° 5435, anterior n.° 1829, estava implementado em área que está incluída em área qualificada como espaço canal rodoviário (cf. resposta de fls. 383 e ss).
35. O armazém a licenciar e edificado no prédio situado na freguesia de Camarate. Município de Loures, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo nº 5435, anterior nº 1829, está implementado em área sujeita a servidão aeronáutica (cf. Resposta de fls. 383 e ss).
36. A ANA emitiu parecer desfavorável à construção na área que abrange o prédio situado na freguesia de Camarate, Município de Loures, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo n.° 5435, anterior n.° 1829 (c f. resposta de lis. 383 e ss).
37. As áreas integrantes da Quinta de Santa Rosa, antiga Quinta do Galvão, inserem-se em Area Urbana de Génese Ilegal (AUGI) (cf. resposta de fls. 383 e ss).


Nos termos do artº 712º nº 1 b) CPC ex vi artº 140º nº 1 CPTA adita-se o probatório do item 38 com o teor da alínea D. do elenco de factos dados por não provados em 1ª Instância, pelas razões da fundamentação de direito do presente acórdão.

38. O armazém construído no prédio situado na freguesia de Camarate, Conselho de Loures, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 5435, anterior 1829, que deu origem ao pedido de licenciamento relativo ao Processo n° 48779/LA/E, é anterior a 1951 (cf. resposta de fis. 383 e ss).


Factos não provados
A. Antes de 29.05.2007 a A. juntou ao Processo n.° 48779/LA/E uma planta de data anterior a 1951, obtida junto dos Serviços da CML que indica que o armazém a licenciar e construído no prédio situado na freguesia de Camarate, Município de Loures, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo n.° 5435, anterior nº 1829, Processo n.° 48779/LA/E, já se encontrava nessa data edificado (cf. resposta de fls. 383 e ss).
B. Antes de 29.05.2007. a data da Informação da I..., a A. juntou ao Processo n.° 48779/LA/E as certidões emitidas pela Junta de Freguesia de Camarate e pela CML, que indicam que o armazém a licenciar e construído no prédio situado na freguesia de Camarate, Município de Loures, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo nº 5435, anterior nº 1829, Processo n.° 48779/LA/E, foi edificado antes de 1951 (cf. resposta de fls. 383 c ss).
C. A delimitação da AUGI verificou-se após 15.01.1998 (cf. resposta de fls. 383 e ss).
D. O armazém construído no prédio situado na freguesia de Camarate, Conselho de Loures, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 5435, anterior 1829, que deu origem ao pedido de licenciamento relativo ao Processo n° 48779/LA/E, é anterior a 1951 (cf. resposta de fis. 383 e ss) – a factualidade a seguir referida passa para o elenco do probatório, sob o item nº 38..




DO DIREITO



No caso dos autos temos dois prédios urbanos, um, descrito sob o nº 3427 na Conservatória do Registo Predial de Loures e inscrito na matriz da freguesia de Camarate sob o artº 5436, antigo artº 1830, nele edificado um armazém de 2 pisos (itens 1, 5, 7, 16 e 19 do probatório); o outro, descrito sob o nº 1408 na mesma CR Predial e levado à matriz da mesma freguesia sob o artº 5435, antigo artº 1829, nele edificado um armazém de 1piso (itens 5, 14, 15, 16,19 e 22).
Tais prédios são contíguos (item 5 do probatório) e nos armazéns edificados a Recorrente exerce a sua actividade de comércio, montagem de pneus e acessórios e oficina de reparação de veículos automóveis (itens 4, 5 e 6 do probatório).
O cerne do litígio reside na data da construção dos ditos armazéns, se antes se depois de 1951, isto porque “(..) às edificações que foram construídas anteriormente ao DL 38382 de 7 de Agosto de 1951, (RGEU), não é exigível qualquer tipo de licenciamento, nem de obras, nem de utilização, dado que não existia na época nenhum diploma legal que exigisse o licenciamento de obras.
Efectivamente, o RGEU veio exigir, pela primeira vez, licenciamento municipal nas “novas edificações ou em quaisquer obras de construção civil, reconstrução, ampliação, alteração, reparação ou demolição de edificações de obras já existentes, e bem assim os trabalhos que impliquem alteração da topografia local, dentro do perímetro urbano e das zonas rurais de protecção fixadas para as sebes de concelho e para as demais localidades sujeitas por lei a plano de urbanização e expansão.” Fora das sedes do concelho era exigido licenciamento municipal em todas as edificações de carácter industrial ou de utilização colectiva; nas restantes edificações fora da sede do concelho só seria aplicável o RGEU de houvesse deliberação Municipal nesse sentido (artº 1º do RGEU, com a redacção dada pelo DL nº 44258 de 31 de Março de 1962). (..)” (1)
Não estando a edificação dos ditos armazéns licenciada, importa, num primeiro momento, analisar da bondade da base probatória documental e testemunhal que suporta a resposta dada aos quesitos, de acordo com as questões suscitadas nos itens C e D das conclusões de recurso.
Sustenta a Recorrente que a sentença desconsiderou a força probatória plena de que beneficiam os documentos autênticos juntos aos autos, assim como desvalorizou a razão de ciência dos depoimentos testemunhais em favor de documentos particulares e depoimentos indirectos, sobrepondo a prova livre, própria dos depoimentos, à prova legal tabelada quanto aos documentos apresentados.

a. prova documental - autenticidade e força probatória;

De acordo com o probatório, itens 2, 7, 19, 29 e 33 e o ponto 16 do corpo alegatório, o meio de prova documental que expressamente refere o edificado nos prédios inscritos na matriz sob os artºs. 5435, ex 1829 e 5436 ex 1830, são os seguintes
§ Item 2: fls. 243 do PA e fls. 51 dos autos: certidão nº 226/02 de 01.08.2002 do Departamento de Administração Urbanística da Câmara Municipal de Loures - informa que a construção (artº 1830) é anterior a 1951de acordo com a planta cadastral da campanha de 1951;
§ Item 7: fls. 44 a 47 do PA e fls. 43 a 46 e 146 a 148 dos autos: fotocópia da escritura de compra e venda de 13.02.2004 (artº 1830) do “o prédio urbano composto de por dois pisos para armazém” referindo que foi exibida a caderneta predial urbana com a menção de que “o prédio foi inscrito na matriz antes de mil novecentos e cinquenta e um”; fotocópia da escritura de compra e venda de 15.01.1998 (artº 1829) do “prédio urbano .. devoluto a contar de Fevereiro próximo” referindo que foi exibida a caderneta predial urbana com a menção de que “o prédio foi inscrito na matriz antes de mil novecentos e cinquenta e um”;
§ Item 19: fls. 122 a 133 do PA: fotocópia certificada das cadernetas prediais urbanas com menção de “prédio urbano de 1 piso para armazém” (artº 1829) e “prédio urbano de 2 pisos para armazém” que foram construídos antes de 1951 (artº 1830);
§ Item 29: fls. 231 a 246 do PA e fls. 48 a 49 e 50 a 58 dos autos: fotocópia certificada de pedidos de 16.07.2007, junto do Serviço de Finanças de Loures 4 – Sacavém de certidão do IMI relativo aos prédios inscrito na matriz nos artºs 1829 e 1830, requerendo a passagem de “fotocópia certificada do documento comprovativo da construção anterior a 1951, arquivado neste Serv. Finanças” satisfeitos por despacho de 01.08.2007, sendo quanto ao artº 1830,“a reprodução exacta da certidão nº 226/92 da Câmara Municipal de Loures emitida em 01.08.2002 … e que atesta que a construção é anterior a 1951 de acordo com a planta cadastral da campanha de 1951 e integrado no artigo 45 secção C, freguesia de Camarata e Concelho de Loures” e, quanto ao artº 1829, “a reprodução exacta da Certidão da Junta de Freguesia de Camarata emitida a 10.05.1993, onde consta que o artigo 1829 foi construído antes de 1951. Mais certifico que o referido artigo encontra-se actualmente eliminado da matriz predial urbana da freguesia de Camarata, deste Concelho de Loures”;
§ Item 33: fls. 48 a 49 dos autos: fotocópia da certidão de reprodução da certidão nº 226/02 de 01.08.2002 da CM de Loures (artº 1830) “que atesta que a construção é anterior a 1951 de acordo com a planta cadastral da campanha de 1951”;

*
Cabe esclarecer que o processo que subiu em recurso a este Tribunal Superior não contém nenhuns originais dos documentos autênticos ou particulares mencionados pelas partes e levados a suporte do probatório, nem sequer os originais das certidões, tudo se resumindo a fotocópias equivalentes das certidões, pelo que, quanto às fotocópias que constituem os autos é aplicável o regime dos artºs. 387º nº 1, 383º nº 1 e 385º nº 1 todos do Código Civil.
A circunstância de não ter sido suscitada, segundo o novo figurino processual constante dos artºs. 546 e ss. do CPC, a falsidade dos documentos de que as fotocópias foram extraídas, isto é, falsidade no tocante à autenticidade dos documentos autênticos e força probatória das atestações de documentos formados por autoridade publica, nem sequer, no plano das relações entre as fotocópias e os originais, a invalidação da força probatória das fotocópias equivalentes às certidões, tal significa que a qualidade dos documentos juntos para prova da questionada anterioridade de edificação à data de 1951 será apreciada segundo o regime dos artºs. 363º nº 2, 369º nº 1, 366º, 370º nº 1e 371º nº 1, todos do Código Civil.
De modo que não estando posta em causa a autenticidade dos documentos autênticos originais nem as fotocópias deles extraídas que as partes trouxeram aos autos, rege o disposto no artº 370º nº 1, 371º nº 1, 387º nº 1, 383º nº 1 e 385º nº 1 todos do Código.

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No tocante à força probatória das escrituras públicas exaradas por notário em que este atesta que lhe “foi exibida a caderneta predial urbana com a menção de que “o prédio foi inscrito na matriz antes de mil novecentos e cinquenta e um”, segundo o regime do artº 363º nº 2 C. Civil trata-se de documentos autênticos que documentam o negócio jurídico de compra e venda (e consequente transferência do direito de propriedade) em conformidade com a norma que confere o poder de atestação ao notário, cfr. artºs. 1º nº 1 e 35º nº 2 do Código do Notariado.
E também têm tais escrituras públicas a qualidade de documento autêntico na parte em que o notário atesta que lhe foram exibidas as cadernetas prediais com a menção de anterioridade a 1951 – as cadernetas prediais são documentos formados nos serviços da Direcção Geral das Contribuições e Impostos com o histórico matricial da classificação e atributos do prédio para efeitos de incidência da extinta contribuição predial, entretanto denominada de contribuição autárquica e, hoje, IMI, imposto municipal sobre imóveis, cfr. 12º nº 1 do Código do IMI.
Só que, nesta parte, agindo o notário fora das atribuições do Notariado, isto é, para usar a terminologia legal do artº 363º nº 2 CC, fora “do círculo de actividade que lhe é atribuído”, não pode atestar que os prédios em causa foram efectivamente inscritos na matriz antes de 1951, porque esta é matéria incluído no acervo de atribuições da Direcção Geral das Contribuições e Impostos em sede de IMI.
Mas o notário já pode atestar que lhe foi exibida a caderneta predial e que nela estava exarado o texto transposto para a escritura como tendo sido por si percepcionado, ou seja nesta parte de que percepcionou o que as cadernetas mencionavam, as escrituras também beneficiam da força probatória plena dos documentos autênticos conforme disposto no artº 371º nº 1, 1ª parte, CC.
Afastamo-nos, pois, do enquadramento dado pelo Tribunal a quo de que se trata de juízos pessoais sujeitos à livre apreciação do julgador nos termos do artº 371º nº 1, in fine, CC.
Não se trata de juízos pessoais do notário, mas de percepções do notário do que estava escrito nas cadernetas prediais que lhe foram exibidas e, como tal, percepcionou, cabendo ao Tribunal apreciar livremente o segmento do texto das escrituras públicas respeitante ao conteúdo das cadernetas, nos termos do artº 366º CC.
Ou seja, presume-se a sua autenticidade e no tocante à parte em que nas escrituras refere o conteúdo da inscrição na matriz anterior a 1951 (não a parte em que o notário afirma que tenha percepcionado as cadernetas e o que lá estava escrito) a força probatória “é apreciada livremente pelo tribunal”, nos termos do artº 366º CC.

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Tal como nos diz a doutrina especializada, “(..) Um documento formado por autoridade pública competente, mas fora do âmbito das suas atribuições, é, a nosso ver, um documento autêntico, mas sujeito, tal como o documento exarado sem as formalidades legais, ao regime do artº 366º [(48) Em nossa opinião, por aplicação directa do preceito, como resulta do texto: o caso consubstancia a falta de um requisito legalmente exigido]: o tribunal será livre de lhe atribuir força probatória – o que não exclui que o documento nestas condições goze da presunção de autenticidade do artº 370º nº 1.
Conclui-se que, tal como a observância das formalidades legais, a formação do documento dentro dos limites do poder de atestação conferido ao oficial público ou das atribuições da pessoa colectiva representada pela autoridade pública é um requisito de eficácia probatória legal do documento autêntico, mas não um requisito da sua autenticidade. (..)” (2)

*
Aplicando o exposto ao caso dos autos, conclui-se que as escrituras públicas de 13.02.2004 (artº 1830) e 15.01.1998 (artº 1829) que substanciam o probatório do item 7 em sede de sentença, além de assumirem a natureza de documentos autênticos, na economia dos autos e na parte em que relatam o conteúdo das cadernetas prediais por exibição das mesmas, são juridicamente idóneos a provar que o edificado nos prédios inscritos na matriz sob os artºs. 5436 e 5435, antigos 1830 e 1829 é anterior a 1951, sendo que à data, isto é, antes de 1951 estava em vigor a contribuição predial (hoje, IMI) e de acordo com o respectivo regime de classificação predial para efeitos fiscais, diferente do conceito de prédio no domínio do Código Civil, só por causa do edificado foi classificado de urbano, caso contrário seria rústico ou misto.
Acresce que as exibidas cadernetas prediais urbanas, dado que se trata de documentos emitidos pela Direcção Geral das Contribuições e Impostos no domínios das atribuições a esta cometidas por lei e de acordo com a competência funcional do agente ou funcionário público que nelas exarou aquelas menções, cfr. artº 93º nº 1 do Código do IMI, assumem a qualidade de documentos autênticos, sendo que a respectiva autenticidade não foi posta em causa nos presentes autos, pelo que as fotocópias equivalentes às certidões respectivas, juntas aos autos, beneficiam da força probatória dos originais nos termos já expostos dos artºs. 387º nº 1, 383º nº 1 e 385º nº 1 CC.

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Daqui se conclui que se mostra provada a matéria de facto constante do quesito nº 9 aditado à base instrutória – vd. despacho de aditamento de fls. 239/241 e menção a fls. 217 dos autos – que em sede de sentença de 1ª Instância foi levado ao elenco dos factos não provados sob a letra D, passando o respectivo conteúdo a constituir o item 38 do probatório, acima transcrito e devidamente assinalado nos termos do artº 712º nº 1 b) CPC.

b. princípio da garantia do existente; vertente activa – artº 62º nº 2 RJUE;

Assente a anterioridade a 1951 do edificado no prédio levado à matriz sob o artº 1829, actual artº 5435 - ou seja, anterior à aplicação do RGEU -, importa levar em conta o disposto no artº 60º nº 1 RJUE.
Dispõe este normativo que “As edificações construídas ao abrigo do direito anterior e as utilizações respectivas não são afectadas por normas legais e regulamentares supervenientes”, vertente passiva do princípio geral da garantia do existente – criado e desenvolvido pelo Tribunal Administrativo Federal Alemão -, significando que as condicionantes legais a exigir aos particulares aquando do exercício municipal das competências de controlo preventivo das operações urbanísticas de utilização dos solos são as vigentes no momento da respectiva construção, pelo que se a esta data for exigido licenciamento prévio que não foi obtido, “(..) o pedido para obter a licença em falta (e regularizar, deste modo, a situação ilegal) apenas for apresentado num momento em que se encontra em vigor um novo instrumento de planeamento que não admite já aquela edificação, não se encontra esta abrangida pelo regime de garantia instituído neste normativo. (..)”. (3)
A vertente activa do princípio da existência, consagrado no nº 2 do mesmo artigo, garante ao particular, desde que permaneça intacta a identidade originária do edifício, “(..) obter autorização para a realização de obras de reparação e restauração (..) e pode fundamentar também um alargamento limitado da construção, desde que uma utilização adequada ao tempo e ajustada à função o exija … Já não é, porém, abrangida por este tipo de garantia … uma ampliação da construção.
A mais recente jurisprudência do Bundesverwaltungsgericht alemão admite, no entanto, uma garantia de existência excepcional (uberwirkender Bestandsschutz), que possibilita a adopção de medidas de alteração e de ampliação de edifícios, bem como a realização de certas alterações de utilização, desde que elas sejam indispensáveis para garantir a capacidade funcional (Funktionesfahigkeit) de uma instalação industrial ou comercial. Esta garantia de existência extensiva ou excepcional é reconhecida pelo Tribunal Administrativo Federal apenas dentro de limites estritos. Exige que entre a edificação existente e o projecto de modificação ou de alargamento necessário para a sua garantia exista uma indissolúvel conexão funcional, de tal modo que a protecção da construção existente ficaria “simplesmente sem objecto”, se não fossem autorizadas as medidas de alargamento ou de modificação. (..)” (4)

*
Sabido que a existência do edificado construído legalmente é o pressuposto constitutivo do direito à sua manutenção e utilização, importa saber qual o âmbito de extensão da vertente activa do princípio da existência; dito de outro modo, saber se a garantia da existência activa tal como consagrada no artº 60º nº 2 RJUE deve ser interpretada no sentido de a utilização ter de se reportar à materialidade construída quando o edifício foi erigido, excluindo qualquer hipótese de o edificado original apresentar modificações face ao projecto original, o que, a ser assim, imporá ao interessado a prova – o ónus de prova dos pressupostos da garantia do existente compete ao sujeito que beneficia deste princípio – de que o pedido relativo à utilização tem por objecto o edificado existente à data da construção e não um edificado que já apresenta alterações.

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A nosso ver, a questão de saber qual o alcance da garantia da existência activa passa pela subsunção da matéria de facto julgada provada no regime que resulta da conjugação dos artºs. 60º e 62º do RJUE.
Primeiro, pelas razões de direito decorrentes da doutrina citada, a garantia do existente abarca no seu âmbito as “obras de reconstrução ou de alteração das edificações … desde que tais obras não originem ou agravem desconformidade com as normas em vigor, ou tenham como resultado a melhoria das condições de segurança e de salubridade das edificações”, requisitos positivo e negativo constantes do artº 60º nº 2 RJUE nesta matéria inalterado ao longo de todas as diversas formulações deste Diploma.
Como já referido, o que não se tem admitido é a ampliação do edificado pré-existente no local, salvo, segundo o entendimento doutrinário acima transcrito, se provado que essa ampliação é “indispensável para garantir a capacidade funcional de uma instalação industrial ou comercial”, para além do especificamente disposto em legislação especial.
Em segundo lugar, o procedimento que tem por objecto a emissão de um acto administrativo sobre a utilização de edifícios reporta-se ao exercício da competência administrativa de controlo preventivo de uma operação urbanística com existência autónoma relativamente às demais operações urbanísticas como tal previstas no artº 4º do RJUE e, tanto assim, que o artº 62º do RJUE, nas suas diversas formulações, sempre considerou o controlo preventivo do uso independentemente deste se seguir, ou não, à realização de obras, seja porque a elas não houve lugar, seja por se tratar de obras legalmente isentas de controlo administrativo.
Em terceiro lugar, o controlo preventivo da utilização de edifícios em que não haja lugar à realização de obras tem por objecto “verificar a conformidade do uso previsto com as normas legais e regulamentares aplicáveis e a idoneidade do edifício … para o fim pretendido.” – cfr. artº 62º nº 2 RJUE, nº 3 na redacção anterior à Lei 60/2007 de 4.9, e não “verificar a conformidade da obra concluída com o projecto aprovado e com as condições do licenciamento ou autorização” ou da comunicação prévia, esta última na versão do artº 62º nº 1 RJUE via Lei 60/2007 que introduziu esta forma procedimental.
O que significa que nas hipóteses em que o controlo preventivo da utilização não sucede à realização de obras ou estas estão legalmente isentas, a apreciação municipal tem como objecto, exclusivamente,questões de uso e não de projecto” – vd. RJUE/Comentado, que vem sendo citado, pág. 471.
Também nesta matéria, apenas o RGEU, no artº 8º, veio dispor sobre o licenciamento municipal da utilização de “qualquer edificação nova, reconstruída, ampliada ou alterada quando da alteração resultem modificações importantes nas suas características” na medida em que, segundo o artº 6º, o projecto deveria indicar “o destino da edificação e a utilização prevista para os diferentes compartimentos.”

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Na circunstância do caso concreto não resulta do probatório que o edificado preexistente a 1951, constituído pelo armazém de 1 piso sito no prédio urbano inscrito na matriz sob o artº 5435, anterior artº 1829, tenha sido objecto de obras de ampliação, caso que, salvaguardadas situações excepcionais, ultrapassa o âmbito de protecção da garantia de existência.
Pelas razões expostas, a circunstância de o edificado que é utilizado pela Recorrente como armazém em que exerce a actividade de comércio, montagem de pneus e acessórios e oficina de reparação de veículos automóveis (itens 4, 5 e 6 do probatório) não se mostrar exactamente igual ao que seria quando foi erigido em razão de obras de reconstrução ou de alteração do edificado, nomeadamente de acordo com a memória descritiva levada ao probatório no item 9, não importa a sua exclusão do âmbito de garantia do existente na vertente activa consagrada no artº 60º nº 2 RJUE, pois, como nos diz a doutrina especializada, “(..) tratando-se de uma edificação existente relativamente à qual o interessado pretenda promover obras de reconstrução ou de alteração, poderá não ser exigido, na medida em que não seja possível, o cumprimento de novas exigências legais e regulamentares entradas em vigor supervenientemente à construção originária.
Admite-se, deste modo, que possam ser licenciadas ou admitidas obras de reconstrução ou de alteração que não cumpram as regras em vigor no momento da decisão, desde que tais obras se refiram a edificações legalmente existentes anteriores à entrada em vigor dessas normas e estas edificações não originem ou agravem a desconformidade com as normas em vigor ou tenham como resultado a melhoria das condições de segurança ou salubridade da edificação. (..)”, inclusivamente aceitando a “(..) reconstrução de edifícios que não passam de meras ruínas (..)” (5) No que respeita à pretendida licença de utilização do armazém, do ponto de vista jurídico o raciocínio que compete é exactamente o mesmo pois, como já referido, o controlo preventivo da utilização tem por objecto uma edificação legalmente existente, não relevando para efeito de apreciação do uso as restrições normativas, legais ou regulamentares, supervenientes.
Por esta razão, a garantia do existente na vertente activa consagrada no artº 60º nº 2 RJUE abrange também o direito de utilização do edifício legalmente existente em razão da construção anterior à aplicação do RGEU (1951).
Atendendo a que a apreciação administrativa da adequação do uso proposto se faz em função do projecto de obras (projecto de arquitectura), a inexistência de previsão legal de controlo preventivo da operação urbanística por se tratar de construção anterior a 1951 - questão diversa da isenção, que pressupõe a pronúncia expressa de lei nesse sentido - tem implícita a inexistência de controlo do uso, o que retira fundamento legal a que a utilização tenha de se reportar à materialidade construída quando o edifício foi erigido, sendo-lhe inaplicáveis quaisquer inovações normativas, salvo se a nova lei dispuser expressamente em contrário, conforme previsto no artº 60º nº 3 RJUE, o que não é o caso.
Todavia, para afastar dúvidas de aplicação do regime do artº 60º nº 2 RJUE, no caso do arrendamento urbano a nova lei veio expressamente afastar a exigência da licença de utilização no edificado anterior ao RGEU, cfr. artº 5º nºs. 1 e 2 DL 160/2006 de 08.09.

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Por todo o exposto, assiste razão à Recorrente relativamente às questões trazidas a recurso nas conclusões sob os itens A, B, C, D, F e G.
Efectivamente, incorre em violação de lei por erro sobre os pressupostos de facto e de direito, vício gerador da anulabilidade nos termos do artº 135º CPA, o despacho de 05.06.2007 do Vereador do Município de Loures em que de acordo com a informação de 04.06.2007 que lhe serve de fundamentação, vd. itens 23 e 24 do probatório, se pronuncia no sentido de que “não é possível concluir que a edificação é anterior a 1951” e, com este fundamento, determina “o indeferimento da emissão de uma licença de utilização para oficina de reparação de veículos automóveis” no prédio urbano inscrito na matriz sob o artº 5435, anterior artº 1829, cumprindo condenar o Município Recorrido a, pelo órgão competente, providenciar no sentido da substituição do despacho em causa por outro que observe as vinculações legais decorrentes de se tratar de um edificado anterior a 1951 que ao abrigo da garantia do existente não carece de licença de utilização.

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Na medida da anulabilidade do despacho de 05.06.2007 perde sustentação jurídica o despacho de 22.08.2007 a que se reporta o probatório no item 28, com referência aos itens 25 a 27, proferido em sede de recurso hierárquico impróprio e facultativo interposto pela ora Recorrente do citado despacho de 05.06.2007.
Neste enquadramento e em face da solução adoptada mostra-se prejudicado o conhecimento das demais questões suscitadas nas conclusões de recurso.



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Termos em que acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul em, na procedência do recurso,
a. revogar a sentença proferida,
b. anular o despacho de 05.06.2007 e
c. condenar o Município de Loures a, pelo órgão competente, substituir o despacho em causa por outro que, relativamente ao prédio urbano descrito sob o nº 1408 na Conservatória do Registo Predial de Loures e inscrito na matriz da freguesia de Camarate sob o artº 5435, antigo artº 1829, observe as vinculações legais decorrentes de o edificado nele construído ser anterior ao RGEU, aprovado pelo DL 38382 de 07.09.1951, pelo que ao abrigo da garantia do existente não carece de licença de utilização.


Custas a cargo do Recorrido.
Lisboa, 20.SET.20121


(Cristina dos Santos) .......................................................................................................................


(António Vasconcelos) ……………………………………………………………………………


(Paulo Carvalho) …………………………………………………………………………………..





1- Fernanda Paula Oliveira, Maria José Castanheira Neves, Dulce Lopes, Fernanda Maçãs, Regime Jurídico da Urbanização e Edificação – Comentado, 3ª ed. Almedina/2011, pág.124.
2- Lebre de Freitas, A falsidade no direito probatório, Almedina/1984, pág. 32.
3- Fernanda Paula Oliveira, Maria José Castanheira Neves, Dulce Lopes, Fernanda Maçãs, RJUE … 4ª ed. Almedina/2011, pág.462.
4- Alves Correia, Manual de direito do urbanismo, Vol. I, 4ª ed. Almedina/2008, págs. 678/679, nota (377); AA e Obra citadas na nota antecedente, págs. 465/466.
5- AA e Obra citadas na nota antecedente, págs. 464/465.