Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:12627/15
Secção:CA- 2º JUÍZO
Data do Acordão:06/16/2016
Relator:PAULO PEREIRA GOUVEIA
Descritores:CARREIRA DOCENTE, OMISSÃO ADMINISTRATIVA
Sumário:I - A omissão administrativa (ilegal) da Ré não era e não é um ato administrativo, mas uma mera omissão.

II - Por isso, não há ali caso resolvido.

III - Tendo presente o artigo 11º do Decreto-Lei nº 312/99, a subida de escalão da Autora para o 10º escalão deu-se ope legis (sem base pretensiva), não estando a mesma e seus efeitos dependentes de pedido da docente.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Sul:

I. RELATÓRIO

· MARIA …………………………, melhor identificada a fls. 5 dos autos, intentou em 2009 no Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada

ação administrativa especial contra

SECRETARIA REGIONAL DA EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO DA REGIÃO AUTÓNOMA DOS AÇORES.

Pediu o seguinte:

- Anulação do despacho da Senhora Diretora Regional da Educação e Formação, datado de 24.1 .2009, notificado à A. em 10.2.2009, que indeferiu a sua pretensão de lhe ser reconhecida a passagem para o 10° escalão docente com efeitos a 1.7.2005;

- Condenação da R. à prática do ato devido, consubstanciado na expurgação de todos os vícios que inquinam o ato impugnado e, consequentemente a sua passagem para o 1Oº escalão docente com efeitos a 1.7.2005, para todos os efeitos legais, nomeadamente contagem de tempo de serviço e abono das diferenças salariais correspondentes.

*

Por decisão de 30-04-15, o referido tribunal decidiu julgar procedente a ação e, consequentemente:

a) Declarar nulo o despacho da Senhora Diretora Regional da Educação e Formação, datado de 24.1.2009, notificado à A. em 10.2.2009, que indeferiu a sua pretensão de lhe ser reconhecida a passagem para o 10° (8° atual, DLR 21/2007/A, de 30.8) escalão docente com efeitos a 1.7.2005;

b) Condenar o R. a concretizar a passagem da A. para o escalão 10° (8° atual, DLR 2112007/A, de 30.8) com efeitos a 1.7.2005, para todos os efeitos legais, nomeadamente contagem de tempo de serviço e abono das diferenças salariais correspondentes.

*

Inconformada, a Ré recorre de apelação para este Tribunal Central Administrativo Sul, formulando na sua alegação as seguintes conclusões:

1. Consta na matéria de facto dada como provada da decisão judicial ora objeto de recurso, designadamente no ponto 3, que a A. (recorrida) requereu à Escola Básica e Secundária da …………………….., em 29.6.2005, a progressão para o 10.º escalão que se impunha a partir de 1.7.2005, e que não foi tido em consideração de imediato.

2. Não se conforma a R. (recorrente) com o ponto 3 da matéria de facto dada como provada, pois o meio de prova para sustentar tal factualidade é o documento n.º 2 junto à Petição Inicial.

3. Este documento n.º 2 junto à Petição Inicial referido foi impugnado em sede de contestação pela Recorrente, designadamente no artigo 3º, apesar de ter sido dado como facto assente pelo Tribunal na parte da matéria de facto provada.

4. O teor do documento n.º 2 junto à petição inicial pela A. (recorrida), não nos permite concluir que a mesma requereu, a 29.7.2005, a progressão do seu posicionamento para o 10.º escalão da estrutura e escala indiciária aprovada pelo Decreto­ Lei n.º 312/99, de 10 de agosto.

5. O documento nº 2 trata-se de um recurso hierárquico dirigido ao Sr. Secretário Regional da Educação e Ciência. datado de 4 de dezembro de 2008.

6. Os documentos em anexo ao referido recurso hierárquico mais não são do que o comprovativo de que a A. (recorrida) entregou na secretaria da Escola Básica e Integrada da ……………………….., a 29.6.2005, o relatório crítico!

7. Salvo douta opinião, um comprovativo de entrega de um relatório crítico não implica a reunião dos requisitos de avaliação do desempenho com a menção mínima exigida para progressão na carreira, mas antes o cumprimento de uma obrigação - um requisito- que os docentes necessitavam para poderem ser avaliados e, assim, progredir, nos termos do n.º1 do artigo 10.º do DL 312/99,de 10 de agosto.

8. Requisito, este, que carecia de verificação, nos termos do n.º 2, do artigo 10.º, do DL 312/99, de 10 de agosto.

9. Entendeu o Tribunal Administrativo e Fiscal de Ponta Delgada julgar procedente a ação, por entender que o direito da A. (recorrida) a progredir para o 10.º escalão consolidou-se ope legis na altura em que reuniu as condições legais, pois a progressão não depende de qualquer ato do interessado e antes deve ser praticado ex oficio pela entidade administrativa, que o deve fazer em momento oportuno, sendo que, se a oportunidade for depois da data devida, a esse deve fazer retroagir os efeitos.

10. Concluiu que o ato da R. (recorrente) é nulo e deve ser anulado - O despacho da Senhora Diretora Regional e Formação, de 24.1.2009.

11. Salvo o devido respeito, não se concorda com o Tribunal a quo ao assim entender e decidir.

12. O regime da nulidade dos atos administrativos, à data dos factos, encontrava-se previsto no artigo 133.º, do Código do Procedimento Administrativo, aprovado pelo Decreto-Lei 442/91, de 15 de novembro, com as sucessivas alterações que lhe foram feitas até à sua revogação (Antigo CPA), que dispõe que "são nulos os atos a que falte qualquer dos elementos essenciais ou para os quais a lei comine expressamente essa forma de invalidade".

13. O despacho da Senhora Diretora Regional da Educação, notificado à A. (recorrida) em 10.2.2009, cumpriu os desideratos legais exigíveis, designadamente a notificação da audiência dos interessados à A. (recorrida), nos termos do artigo 100º do CPA, momento em que a mesma reclamou, apesar de não acolher provimento pela Administração Pública Regional.

14. Nestes termos, carece a douta decisão judicial de fundamentação jurídica para justificar a alegada nulidade do despacho.

15. Por outro lado, não podia a R. (recorrente) proceder à audiência da A. (recorrida) em momento anterior, porquanto não conhecia a omissão da prática do ato de progressão. Ou seja, apenas no momento em que a A. (recorrida) impõe a sua transição para a nova carreira é que a R.(recorrente) deteta que -certamente por lapso- não procedeu a essa progressão quando o devia ter feito.

16. Independentemente da progressão da A. (recorrida) ter operado ope legis a 1.7.2005, nos termos do n.º 4 do artigo 10.º do DL 312/99, de 10 de agosto, o que releva é que a A. (recorrida) só em 2008.12.05 é que se manifestou sobre o seu não posicionamento no 10º escalão da estrutura e escala indiciária aprovada pelo citado normativo (8° atual), no momento em que o deveria ter sido.

17. A A. (recorrida) não impugnou o ato da não publicação da lista de progressão, responsabilidade da Escola Básica e Secundária da …………….. até 2008.12.05, desconsiderando por completo o hiato de tempo desde o dia 1.7.2005 a 31.08.2007.

18. Só no momento da reclamação da lista de transição para a nova estrutura da carreira docente, em sede de audiência dos interessados, cfr. artigo 100º, do Código do Procedimento Administrativo, e na sequência da entrada em vigor do novo Estatuto da Carreira Docente na Região, aprovado pelo Decreto Legislativo Regional n.º 21/2007/A, de 30 de agosto, é que a A. (recorrida) manifesta que não havia sido materializada a sua progressão para o 10º escalão.

19. É que a A. (recorrida), nos meses seguintes à data em que entendeu que deveria ter progredido para o 10° escalão (julho), poderia ter detetado através das remunerações auferidas e dos respetivos recibos, que essa progressão não havia sido feita ou, pelo menos, não estaria a ser considerada para efeitos remuneratórios.

20. Nestes termos, a A. (recorrida) permitiu que se esgotasse o prazo máximo para a impugnação da omissão da Escola Básica e Secundária da ……………… – 1 ano, nos termos do n.º 1, do artigo 136.º e n.º 1 do artigo 141.º, ambos do antigo Código do Procedimento Administrativo, aplicável à data dos factos.

21. O que aqui está em causa não deveria ser o despacho da Senhora Diretora Regional da Educação e Formação, datado de 24.1.2009, notificado à A. (recorrida) em 10.2.2009, que indeferiu a sua pretensão de lhe ser reconhecida a passagem para o 10.º (8° atual, DLR 21/2007/A, de 30.8) escalão docente com efeitos a 1.7.2005, porquanto, como já se referiu não fere de irregularidade que determina a declaração da sua nulidade.

22. Assim, podendo ser suscetível de ser anulado, entendeu a R. (recorrente) revogar o ato da primeira transição para a nova carreira e praticar outro ato de transição para a nova carreira, para o escalão 8.º, correspondente ao escalão em que a A. (recorrida) estaria posicionada na antiga carreira se lhe tivesse sido efetuada a progressão para o 10.º escalão no momento devido.

23. O que está verdadeiramente em causa é, portanto, a inércia da A. (recorrida) desde 01.07.2005 a 2008.12.05, em consequência da omissão da sua progressão para o 10.º escalão por parte da Escola Básica e Secundária da ……………………….

24. E a omissão desse ato administrativo consolidou-se na ordem jurídica, por não ter sido objeto de impugnação administrativa nem judicial em tempo oportuno, cfr. n.º 2 do artigo 58.º e 69.º, ambos do Código do Processo nos Tribunais Administrativos.

25. Ao ato pelo qual a administração, admitindo embora a ilegalidade do ato anterior. mas reconhecendo ter-se tal ilegalidade tornado inimpugnável por não interposição atempada dos recursos que no caso cabiam, decide revogar aquele ato, por razões de equidade, é aplicável o regime de revogação dos atos válidos, podendo ser-lhe atribuída eficácia apenas para o futuro. cfr o Acórdão do Tribunal do Supremo Tribunal Administrativo, Proc. Nº 045459, de 23.02.2000, disponível em www.dgsi.pt

26. Assim, e de acordo com o artigo 136º do Antigo CPA, aplicável à data, o ato administrativo anulável apenas pode ser revogado nos termos previstos do artigo 141º do citado normativo, ou seja, só pode ser com fundamento na sua invalidade e dentro do prazo de um ano, contabilizado nos termos do artigo 58º do CPTA, prazo esse que já há muito havia ultrapassado, pelo que carece de imposição legal, não podendo, agora a recorrida ver deferida a sua pretensão em ver-se posicionada no 10º escalão da antiga estrutura da carreira docente desde o dia 01.07.2005.

27. Daí que a A. (recorrente), através do ofício n.º S­DRE/2008/8648, de 26.09.2008, haja considerado que a recorrida transitaria para a nova estrutura da carreira docente com efeitos a 1 de setembro de 2007, para o escalão correspondente ao índice remuneratório igual ao 10.º escalão da estrutura e escala indiciária aprovada pelo Decreto-Lei n.º 312/99 (hoje 8°, índice 340), 1 de setembro de 2007 porque foi a data de produção de efeitos da nova carreira, data essa considerada para a transição de todo o pessoal decente integrados nos quadros da rede pública educativa da Região.

28. Em conclusão, não reconhecemos enquadramento legal para que seja processado e pago o diferencial entre os índices que serviram de base ao pagamento dos seus vencimentos e o índice 340 correspondente ao 10.º escalão, período anterior a 1 de setembro de 2007.

*

A recorrida contra-alegou, concluindo:

A. A Recorrente veio interpor recurso da decisão do tribunal de 1.ª instância que julgou a acção procedente, por provada, e em consequência:

a) Declarou nulo o despacho da Senhora Directora Regional da Educação e Formação, datado de 24.01.2009, notificado à Recorrida em 10.02.2009, que indeferiu a sua pretensão de lhe ser reconhecida a passagem para o 10.º (8.º actual, DLR 21/2007/A, de 30.8) escalão docente com efeitos em a 01.07.2005;

b) Condenou a Recorrente a concretizar a passagem da Recorrida para o escalão 10.º (8.º actual, DLR 21/2007/A, de 30.8) com efeitos a 01.07.2005, para todos os efeitos legais, nomeadamente contagem de tempo de serviço e abono das diferenças salariais correspondentes.

B. O Tribunal “a quo” baseou a sua decisão nos documentos juntos aos autos, bem como nos documentos juntos ao recurso hierárquico, os documentos que não foram impugnados e ainda na confissão da própria Recorrente.

C. Entende a Recorrida que a sentença decidiu bem ao considerar como provado o ponto n.º 3 da matéria de facto dada como provada a fls. 4 da sentença.

D. Pois, que o facto provado no n.º 3 foi fundamentado com prova documental, que fez prova dos fundamentos e factos alegados na acção.

E. A importância da prova documental dentre os demais meios de prova está intimamente relacionada à principal característica do documento, que é a sua estabilidade.

F. A prova documental tem a aptidão de representar um fato de modo permanente e duradouro, sendo o documento considerado uma fonte segura de prova.

G. Assim, e conforme estabelece o Código de Processo Civil nos seus artigos 444.º a 446.º, a prova documental só pode ser objecto de impugnação quanto à letra ou assinatura de documento particular, à falta de autenticidade do documento presumido por lei como autêntico, a falsidade do documento, a subscrição de documento particular por pessoa que não sabia ou não podia ler sem a intervenção notarial e a subtracção de documento particular assinado em branco e a inserção nele de declarações divergentes do ajustado com o signatário.

H. Dispõe ainda o n.º1, do artigo 376.º do Código Civil que, o documento particular cuja autoria seja reconhecida faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor.

I. A Recorrente vem somente impugnar os factos constantes do documento junto como documento n. º 2 com a petição inicial!

J. A Recorrente alega que “(…) o teor do documento n.º 2 junto à petição inicial pela A. (recorrida) não nos permite concluir que requereu, a 29.07.2005, a transição do seu posicionamento para o 10.º escalão da estrutura e escala indiciária aprovada pelo Decreto-Lei n.º 312/99, de 10 de agosto.”

K. O tribunal “a quo” entendeu que do documento junto como documento n. º 2 com a petição inicial fez prova bastante do facto alegado no artigo 4.º da petição inicial e como tal, foi considerado provado no ponto 3 da matéria de facto dada como provada a fls. 4 da sentença.

L. Assim, entende-se que não houve nem pode ter havido qualquer erro de julgamento sobre a matéria de facto, conforme alegado pela Recorrente.

M. O tribunal “a quo” decidiu bem quando considerou provado que a Recorrida pediu à entidade competente, através de requerimento que lhe apresentou em 29.06.2005 a transição que se impunha a partir de 01.07.2015, o qual não foi tido em consideração de imediato.

N. Vem a Recorrente ainda discordar da decisão do tribunal “a quo”, designadamente na parte em que aquele entendeu que o direito da Recorrida consolidou-se ope legis, na altura em que reuniu as condições legais para progredir de escalão, pois a progressão não depende de qualquer acto do interessado antes deve ser praticado ex ofício pela entidade administrativa que o deve fazer em momento oportuno, sendo que se a oportunidade for depois da data devida a esse deve fazer retroagir os efeitos.

O. Conclui, por isso, o tribunal “a quo” que o acto da Recorrente – o despacho da Senhora Directora Regional da Educação e Formação, datado de 24.01.2009 – é nulo!

P. A Recorrente alega que o despacho da Senhora Directora Regional da Educação e Formação cumpriu os desideratos legais exigíveis, designadamente a notificação da audiência dos interessados à Recorrida, nos termos do artigo 100.º do CPA, momento em que a mesma reclamou, carecendo a sentença de fundamentação jurídica para justificar a alegada nulidade do despacho.

Q. Sucede que, que o artigo 100.º do antigo CPA, estabelecia que, “(…) os interessados têm direito a ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, sobre o sentido provável desta.

R. Ora o despacho da Senhora Directora Regional da Educação e Formação, datado de 24.01.2009, não era um projecto de decisão, mas sim uma decisão, não tendo sido a Recorrida informada anteriormente do sentido provável desta, nem notificada para ser ouvida em momento anterior àquela decisão.

S. A Recorrida violou assim o direito à participação dos particulares na formação das decisões que lhes disserem respeito, conforme estabelecia o artigo 8.º e 100.º do CPA, sendo, por isso, aquele acto nulo ao abrigo do artigo 133.º do antigo CPA.

T. Aliás, a própria Recorrente faz prova deste facto ao alegar que “não podia a R. (recorrente) proceder à audiência da A. (recorrida) em momento anterior, porquanto não conhecia a omissão da prática do acto de progressão.

U. O direito da Recorrida consolidou-se ope legis na altura em que reuniu as condições legais a progredir de escalão.

V. Ora, a progressão não dependendo de qualquer acto do interessado para ocorrer, deveria ter sido praticado ex ofício pela entidade administrativa, que o deveria ter feito em momento oportuno.

W. Importa referir que a Recorrida formulou oportunamente o pedido para ser colocada no escalão 10.º.

X. E ao contrário do que a Recorrente pretende fazer crer, tal pedido teve resposta, mas num momento temporal dilatado, isto é, na altura em que foi feita a transição do velho para o novo estatuto.

Y. Não existindo, por isso, qualquer acto tácito ou omissivo que constitua caso julgado, no presente caso, como a Recorrente pretende fazer crer nas suas alegações.

Z. Porém, tendo sido o acto praticado após a data devida, a essa deve retroagir os seus efeitos sem prejudicar a Recorrida.

AA. A Recorrente ao não fazê-lo quando se impunha, na altura que decidiu fazê-lo, fê-lo mal, tendo, por isso, a Recorrida reagido.

BB. A própria Recorrente reconheceu que a Recorrida tinha direito a ver reposta a verdade na sua carreira profissional, designadamente ao nível da progressão.

CC. O despacho da Senhora Directora Regional da Educação e Formação, datado de 24.01.2009, mais não foi que acto efectivo de recusa de uma pretensão legítima da Recorrida, como a própria Recorrente reconhece.

DD. Assim, dúvidas não devem restar e em conformidade com o decidido pelo tribunal “a quo” que o acto praticado pela Recorrida é nulo, devendo ser anulado.

EE. Nestes termos, deverá a sentença do tribunal a quo manter-se e ser negado o provimento ao recurso interposto pela Recorrente, com as devidas consequências legais.

*

O MP, através da sua digna representante junto deste tribunal, foi notificado para se pronunciar em defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos, de interesses públicos especialmente relevantes ou de algum dos valores ou bens referidos no n.º 2 do artigo 9.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, como previsto no nº 1 do art. 146º, tendo emitido Parecer no sentido de não ser concedido provimento ao recurso.

Cumpridos os demais trâmites processuais, importa agora apreciar e decidir em conferência. (1)

*

II. FUNDAMENTAÇÃO

II.1. FACTOS PROVADOS

Com interesse para a decisão a proferir, está provado o seguinte quadro factual:

1. A A. é professora da Escola Básica e Secundária da ………., encontrando-se integrada na carreira docente da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário, tendo, no momento próprio, transitado para o 9° escalão da respetiva categoria;

2. Em 1.7.2005 a A. reunia as condições legalmente exigida para transitar para o 10° escalão da respetiva categoria profissional (estrutura e escala indiciária prevista no Decreto-lei nº.312/99, de 10.8); - isto consta assim do Ac. recorrido;

3. Em razão do mencionado em 2, a A. pediu à entidade competente, através de requerimento que lhe apresentou não em 29.6.2005, mas em 4.12.2008, a transição que se impunha a partir daquela data (1.7.2005), que não foi tido em consideração de imediato;

4. Foi, tão só, na transição para a nova estrutura da carreira docente, preconizada no novo estatuto da carreira docente na região, aprovado pelo Decreto Legislativo Regional nº.21/2007/A, de 30 de Agosto, que a A. percebeu que não estava posicionada no novo escalão 8° (DLR 21/2007/A, de 30.8), quando deveria estar por corresponder ao escalão10º do regime anterior (DL 312/99, de 10.8);

5. A própria entidade pública reconheceu a existência de erros na transição do velho para o novo estatuto da carreira docente (oficio nº. S-DRE/2008/8648, de 26.9.2008) e, por essa razão, encetou de seguida as diligências necessárias à sua correção, fazendo publicar lista com esse fim;

6. Nessa sequência reclamou a A., em 4.12.2008, pugnado para que fosse colocado no escalão devido e com os efeitos a 1.7.2005;

7. A A. acabou por ser colocada no novo escalão 8° (DLR 21/2007/A, de 30.8) com efeito a partir de 1.9.2007, ou seja, logo após a publicação do novo estatuto da carreira docente.

*

Continuemos.

II.2. APRECIAÇÃO DO RECURSO

Aqui chegados, há condições para se compreender este recurso e para apreciar o seu mérito de acordo com os princípios estruturantes de um Estado constitucional, democrático e social de Direito material, designadamente os princípios estruturantes (i) da juridicidade e legalidade (2), (ii) da igualdade substantiva de tratamento de todas as pessoas humanas, (iii) da certeza e segurança jurídicas e (iv) da tutela jurisdicional efetiva no âmbito do direito fundamental a um processo equitativo (tudo reflexo da ordem axiológica de um Estado democrático de juridicidade). Utilizamos, por isso, um método(3) de Ciência do Direito adequado à garantia efetiva dos direitos dos cidadãos (4), cidadãos que são quem dá legitimidade jurídico-democrática a toda e qualquer atividade de exercício público de poderes de autoridade (com ou sem margem de livre decisão); ora, o acabado de referir exige do juiz uma correta argumentação jurídica, necessária aos diálogos e aos “polilogos multipartes” próprios do processo jurisdicional europeu continental, para garantir, com efetividade, o disposto nos importantes artigos 1º, 2º, 17º, 18º/2, 20º, 266º e 268º da nossa Constituição escrita e 3º ss do Código de Procedimento Administrativo.

Cabe agora sublinhar que os recursos, sendo dirigidos contra a decisão do tribunal recorrido e respetivos fundamentos, têm o seu âmbito objetivo delimitado pelo recorrente nas conclusões da sua alegação de recurso, alegação que apenas pode incidir sobre as questões que tenham sido apreciadas pelo tribunal recorrido ou que devessem ser aí oficiosamente conhecidas.

Vejamos, pois, as questões a resolver.

1ª – Do alegado erro de julgamento quanto ao facto nº 3 (artigo 4º da petição inicial), por ter sido impugnado o doc. 2 da petição inicial no artigo 3º da contestação; E da sua relevância quanto ao direito invocado pela A

1.1.

A título prévio, cabe sublinhar que o acórdão recorrido confunde anulação de ato administrativo com revogação de ato administrativo, bem como nulidade com anulabilidade.

Além disso, contém muitos lapsos de Português e não indica qualquer norma legal para fundar a natureza ope legis do direito da autora, nem para fundar a conclusão de que o ato impugnado de 24-1-2009 é nulo.

O Tribunal Administrativo de Círculo disse o seguinte: o despacho impugnado, de 24-1-2009, é ilegal (nulo), porque coloca a A no novo 8º escalão (Decreto-Lei nº 15/2007 e DLR 21/2007/A) da carreira docente (igual ao anterior escalão 10: Decreto-Lei nº 312/99) apenas desde 1-9-2007 e não desde 1-7-2005.

A data de 1-7-2005, reconhecida pela R como a correta para passar ao então 10º escalão pela A, foi posta de lado pela R pelo facto de a A não ter requerido a subida ao então 10º escalão (hoje 8º: 2007) quando tinha direito a ele (em 1-7-2005), com referência aos artigos 9º a 11º do Decreto-Lei nº 312/99.

Para a R, assim deveria ser, porque a A deixara consolidar a situação de inércia por parte da R, numa espécie de “caso decidido” em sede daquilo que a R chama de “indeferimento tácito” em 2005-2006.

1.2.

Ora, quanto a esta questão do facto nº 3, a recorrente não razão.

Com efeito, o doc. 2 da petição inicial prova o essencial do teor do artigo 4º da petição inicial, dado como provado sob o nº 3 do probatório (a A. pediu à entidade competente, através de requerimento que lhe apresentou em 29.6.2005, a transição que se impunha a partir daquela data (1.7.2005), que não foi tido em consideração de imediato).

O doc. 2 da petição inicial tem até um carimbo rececionante da ré.

Mas há, de facto, uma diferença: o pedido da A. foi feito em 4-12-2008, conforme o carimbo da própria R., tendo nele escrita pela A a data de 2-12-2008.

É o que passará a constar do facto nº 3, ao abrigo do artigo 662º/1 do Código de Processo Civil.

Mas, como veremos, isto não muda o essencial da questão que interessa à A (vd. o artigo 66º/2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos).

Aliás, no req. constante do doc. 2 citado, a A. diz expressamente o mesmo que aqui referiu na petição inicial.

1.3.

Na verdade, tendo presente o artigo 11º do Decreto-Lei nº 312/99 (aprova a estrutura da carreira do pessoal docente da educação pré-escolar e dos ensinos básico e secundário e estabelece as normas relativas ao seu estatuto remuneratório) (5), aqui aplicável, a subida de escalão da A (para o 10º) deu-se ope legis (sem base pretensiva) em 1-7-2005, como aliás a R confessou e confessa.

O Decreto-Lei nº 312/99 foi objeto de revogação pelo Decreto-Lei nº 15/2007 (Sétima alteração do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 139-A/90, de 28 de abril, e altera o regime jurídico da formação contínua de professores, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 249/92, de 9 de novembro), depois adaptado à RAA pelo DLR 21/2007/A.

Neste momento, com a entrada em vigor das novas regras do Decreto-Lei nº 15/2007, tanto a R como a A aperceberam-se de que a progressão da R para o 10º escalão à luz do Decreto-Lei nº 312/99 tinha sido esquecida.

Daí o pedido da A constante do doc. 2 da petição inicial. Ao que se seguiu o ato ora impugnado neste processo, o qual, pelo facto de a A só se ter manifestado em fev./2008, considerou que a A deixou passar o prazo para invocar a anulabilidade (?) da omissão da R (que a R, às vezes, parece confundir com o extinto indeferimento tácito).

Mas é notório que a R não tem razão, porque a omissão administrativa (ilegal) da R não era e não é um ato administrativo, mas uma mera omissão (cfr. PAULO OTERO, Direito do Procedim. Adm., I, 2016, págs. 397 ss, maxime págs. 428 e 430), à luz do Código do Procedimento Administrativo e do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (cfr. artigos 50º ss, 66º e 67º). E, por isso mesmo, nunca se consolida como “caso resolvido”.

O direito substantivo da A contra a R e que a R reconheceu à A (estar no 10º escalão no dia 1-7-2005) não caducou e não prescreveu pelo facto de a R ter ficado inerte (sem requerimento prévio da A, aliás desnecessário), contra a lei.

Mais: como a A interpelou a R em 2008, para esta cumprir o seu dever legal substantivo constituído em 1-7-2005 (confessado), eis que, com esta recusa de 24-1-2009, nasceu o direito processual de a A fazer os pedidos substantivos constantes da petição inicial (suportados pelo Decreto-Lei nº 312/99), à luz dos artigos 66º ss do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (vd. artigos 66º/2, 67º/1-b) e 69º/2/3).

Dali resulta, portanto, o seguinte:

- Não houve indeferimento tácito algum (nem houve req., nem o novo Código de Processo nos Tribunais Administrativos/2002 o permitiria), mas sim uma pura omissão ilegal por parte da R (cfr. PAULO OTERO, Direito do Procedimento Adm., I, nº 12.6.5.(ii) e nº 12.6.7) até emitir o ato de 24-1-2009;

- Os prazos para interpor esta ação contam-se desde a data da notificação do ato aqui impugnado (vd. artigos 67º/1-b e 69º/2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos) e não desde a data da ilegal inércia ou omissão administrativa (1-7-2005), não estando nunca em causa o direito substantivo da A;

- Não tem sentido algum falar-se aqui, como fez a R, em revogação, em 2009, de uma omissão desde 2005, aqui também confundida pela R com indeferimento tácito (eliminado em geral da nossa ordem jurídica desde 1-1-2004, com os novos artigos 66º ss do Código de Processo nos Tribunais Administrativos); as omissões administrativas puras não são atos administrativos (a revogar ou não).

Portanto, a A tem razão e o Tribunal Administrativo de Círculo, ainda que ao de leve, decidiu bem quanto à condenação feita, tendo por base a pretensão da A. Só errou, ao falar de rompante em nulidade (artigo 133º do Código do Procedimento Administrativo/1991) do ato de indeferimento de 2009 (artigo 66º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos), porque a situação não se enquadra em nenhuma das previsões do artigo 133º cit. É uma questão de anulabilidade (artigo 135º do Código do Procedimento Administrativo), por (confessada) violação de lei (isto é, dos artigos 9º a 11º do Decreto-Lei nº 312/99).

Mas o que interessa mesmo é a pretensão substantiva da A, como manda o artigo 66º/2 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. E esta pretensão está tutelada pelo Direito (artigos 9º a 11º do Decreto-Lei nº 312/99), como admitido pela R, não existindo motivo jurídico válido para ela valer apenas desde 1-9-2007 (com a nova legislação e “à sombra” da omissão ilegal da R), em vez da data da sua constituição no mundo jurídico, 1-7-2005.

2ª – Do erro de direito quanto à nulidade

Como já dissemos, o ato de indeferimento aqui em causa ao abrigo dos artigos 66º ss do Código de Processo nos Tribunais Administrativos é ilegal, mas não é nulo (artigos 133º e 134º do Código do Procedimento Administrativo).

Só que isso não tem importância, porque o que releva é a ilegalidade e o estabelecido nos artigos 66º ss.

E isso significa que o objeto deste processo é a pretensão da A e não o ato administrativo de 2009, pelo que não se aplicam os artigos 51º ss, mas sim os artigos 66º ss do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aqui respeitados pela A.

Mas, seja como for, não está em questão a tempestividade desta ação face ao ato (expresso) de indeferimento datado de 24-1-2009.

3ª – Do erro quanto à violação do dever de audiência prévia

Aqui, a recorrente está em equívoco.

Não ficou vencida nessa matéria, pois o Tribunal Administrativo de Círculo considerou que “não é o caso”.

*

III - DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juizes do Tribunal Central Administrativo Sul em, com fundamentação muito diferente da do acórdão recorrido, negar provimento ao recurso e, assim, anular o ato administrativo impugnado, mantendo a decisão do Tribunal Administrativo de Círculo quanto à condenação da R. à prática do ato devido, consubstanciado na expurgação de todos os vícios que inquinam o ato impugnado e, consequentemente a sua passagem para o 10º escalão docente (cfr. Decreto-Lei nº 312/99) com efeitos a 1.7.2005, para todos os efeitos legais, nomeadamente contagem de tempo de serviço e abono das diferenças salariais correspondentes.

Custas a cargo da RAA.

16-6-2016


(Paulo H. Pereira Gouveia - relator)

(Nuno Coutinho)

(Carlos Araújo)



(1) Para decidir, este tribunal superior tem omnipresente a nossa Constituição e as três dimensões do Direito como ciência do conhecimento prático que é, por referência à ação e ao dever-ser (I. KANT, Lógica, trad., Ed. Texto & Grafia, Lisboa, 2009, p. 86), isto é, a dimensão ética, a normativa e a factual social. Dali resulta, não uma economicista “output legitimacy” do Estado democrático e social de Direito, mas sim a consideração pelos aplicadores do Direito do seguinte quadro jurídico de base: I- O primado do Estado democrático e social de Direito, num contexto de uma vida socioeconómica submetida aos valores ético-jurídicos (i) da suprema dignidade de cada ser humano, (ii) da liberdade e (iii) do bem comum; II- Os princípios constitucionais estruturantes do Estado democrático e social de Direito, como (i) a juridicidade, (ii) a igualdade jurídico-material e jurídico-social de todos os seres humanos, (iii) a tutela jurisdicional efetiva e, ainda, (iv) a segurança jurídica de todas as pessoas; III- Os habituais comandos definitivos ou normas jurídicas que exigem algo de modo definitivo, dispositivo ou quase-conclusivo (i.e., as Normas-Regra, compostas por hipótese e estatuição ou consequência jurídica), sob a égide dos importantes artigos 9º a 11º do Código Civil, que se aplicam normalmente através da chamada subsunção; têm uma eficácia jurídica positiva ou simétrica; IV- Os (menos frequentes) coman­dos jurídicos gerais do sistema, quase sempre comprome­tidos axiológica e eticamente, como "razões de agir", i.e., os eventuais comandos que têm de ser otimizados no concreto (diferentes dos princípios constitucionais estruturantes ou valores constitucionais estruturantes), que exigem do aplicador a sua otimização transparente ante as possibilidades de facto e de direito existentes no caso concreto, através da ponderação ou sopesamento racional e justificado das aplicáveis normas colidentes que tenham significados não específicos ou valorativos (i.e., as Normas-Princípio, comandos quase sempre sem estatuição, normas não conclusivas, com objetiva textura aberta, ou objetiva ambiguidade semântica/sintática/pragmática, ou objetiva vagueza de linguagem no predicado ou com óbvio significado valorativo, numa exigência de fazer opções com base nos ideais de justiça, equidade ou moralidade, sendo ainda que a sua validade decorre do seu próprio conteúdo, e têm uma função explicadora e justificadora das regras concretas), ponderação pela qual se acaba por escolher a norma a concretizar adequadamente, depois, no caso de vida a resolver; estas normas-princípio têm uma eficácia jurídica negativa e têm na sua estrutura (i) uma metaregra “a se” (segundo a qual o “dever-ser ideal” ínsito na norma, decorrente do valor superior da Justiça, deve ser otimizado no concreto até ao “dever-ser real”, por causa do princípio estruturante da segurança jurídica) e (ii) a norma-princípio (o objeto da otimização, o “dever-ser ideal”); V- A máxima interpretativa da unidade e coerência atualista do sistema jurídico (importante também contra a omissão jurisdicional de controlo das chamadas “discricionariedades”); VI- E, quando for juridicamente lícito e objetivamente necessário, a máxima metódico-racional da proporcionalidade (cf. arts. 1º, 2º e 18º da Constituição Portuguesa escrita e 335º do Código Civil); afinal, com a proporcionalidade, como máxima metódica transparente e racional, o tribunal, que nunca logra fazer uma concordância prática, exerce sim um duplo “poder discricionário” com racionalidade: o juiz parece criar uma hierarquia axiológica entre as normas colidentes, a fim de escolher uma delas, e depois continua objetivamente livre para modificar os valores comparativos dos dois princípios perante uma nova controvérsia ante os mesmos princípios.

(2) Com efeito, a lei é (i) o pressuposto, (ii) o fundamento e (iii) o limite das atividades de administração pública (direta, indireta, autónoma e, ainda, a novel e socialmente dispendiosa “Administração Pública independente ou de mera regulação”). A Administração Pública só pode fazer aquilo que é permitido pelas normas jurídicas, equivalendo o silêncio destas a uma regra de proibição de agir. Paradoxalmente, pode-se obter a diminuição do controlo jurisdicional e da tutela jurisdicional efetiva, através do expediente da chamada “regulação administrativa”, de desnecessária importação anglo-saxónica, normalmente aliada à perigosa autocontenção do legislador democrático defensor do bem comum e, pior ainda, aliada à expansão das chamadas autoridades administrativas independentes, correspetiva do encolhimento das direções-gerais da Administração Pública central de tipo europeu continental. Assim se consegue o domínio da “racionalidade técnica, mercantil ou funcional” sobre a racionalidade jurídica das atividades de administração pública num Estado democrático de Direito.

(3) Como exposição do modo de chegar à correção do conhecimento (cf. I. KANT, Lógica, cit., pág. 131).

(4) Previamente à diferente e menos complexa obtenção de uma das premissas do silogismo judiciário (qualificação jurídica dos factos, aplicação do Direito, ou “fact-oriented interpretation”), o juiz deve fazer a exigente interpretação em sentido próprio, ou abstrato, da fonte de Direito (“text-oriented interpretation”), atividade esta que tem de respeitar (i) a Constituição, maxime os direitos fundamentais e o princípio estruturante da segurança jurídica, e (ii) as seguintes três máximas interpretativas para se inferir, das fontes de Direito, a regra jurídica aplicável ao caso concreto (e não para o tribunal criar novas normas jurídicas): 1ª Máxima lógico-interpretativa das fontes escritas de Direito - a interpretação da lei pelo juiz (conforme o art. 9º do Código Civil) é a reconstituição do pensamento legislativo atual - “deep meaning” - (i) sempre a partir dos textos normativos (“first meaning”; ou significado literal e filológico), tendo sobretudo em conta, sem contradições, (ii) o elemento lógico-sistemático atualista da interpretação (iluminado pelas ideias de sistema, de igualdade e de coerência), (iii) o elemento histórico da interpretação (a justificação para a produção da fonte de direito) e (iv) o elemento lógico-teleológico atualista da interpretação (a finalidade que justifica a vigência da fonte de Direito, ou “ratio legis”; o juiz atende aqui aos princípios jurídicos, formais e materiais, em que se funda a regra no presente, bem como às consequências previsíveis mais compatíveis com o sistema jurídico atual); 2ª Máxima lógico-interpretativa das fontes escritas de Direito - o pensamento legislativo atual assim apurado pelo juiz (“deep meaning”) deve ter sempre um mínimo de correspondência verbal na letra da lei. Trata-se de uma importante garantia contra o arbítrio interpretativo, violador da segurança jurídica, num sistema jurídico democrático de tipo romano-germânico, como é o português, onde se descobriu há vários séculos como diminuir a insegurança jurídica; 3ª Máxima lógico-interpretativa das fontes escritas de Direito - o juiz deve presumir que o legislador democrático consagrou as soluções mais acertadas e que soube exprimir-se em termos adequados. É também uma garantia contra o arbítrio interpretativo, que tende hodiernamente a confundir o modo específico de aplicar (de sopesar para concretizar) as excecionais normas-princípio com o modo de aplicar as habituais normas-regra, normas-regra que demandam do aplicador a utilização imediata e rigorosa dos arts. 9º a 11º do Código Civil, sem recurso à chamada “ponderação racional” como 3º subexame da máxima metódica da proporcionalidade (sobre esta, PAULO OTERO, Manual…, I, pp. 444-449 e 571-585).
Note-se, ainda, que é somente depois da interpretação em sentido abstrato (“text-oriented interpretation”) que haverá lugar à subsunção, isto é, à “fact-oriented interpretation”. Também é nesse momento, posterior à interpretação da fonte, que o juiz poderá concluir que existe uma lacuna ou uma antinomia (assim R. GUASTINI, Problemi di interpretazione, in Le fonti del diritto e l´interpretazione, ed. Giuffrè, Milano, 1993, cap. XXV).

(5) Artigo 11.º
Acesso ao 10.º escalão
1 - Têm acesso ao 10.º escalão da carreira docente os docentes profissionalizados titulares do grau académico de licenciatura, mestrado ou doutoramento.
2 - Podem ainda ter acesso ao 10.º escalão da carreira os docentes profissionalizados com grau académico de bacharelato que tenham adquirido o grau académico de licenciatura em Ciências da Educação ou em domínio directamente relacionado com a docência, nos termos dos artigos 55.º e 56.º do Estatuto da Carreira Docente.