Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:2365/13.5BELRS
Secção:CT
Data do Acordão:06/25/2020
Relator:BENJAMIM BARBOSA
Descritores:IMI
Sumário:A incidência em sede da verba 28 da TGIS do IS deve ser determinada, não pelo somatório dos VPT de todas as fracções de um prédio em regime de propriedade vertical mas susceptíveis de utilização independente (evidenciada na matriz), mas pelo VPT atribuído a cada uma dessas fracções, sendo cada fracção havida como um prédio autónomo.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:ACORDAM EM CONFERÊNCIA NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO TRIBUTÁRIO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL:

1 - Relatório

1.1. As partes

A recorrente FAZENDA PÚBLICA, não se conformando com a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa que considerou procedente a impugnação judicial deduzida por A…., contra as liquidações, referentes a Imposto de Selo de 2012, emitidas para cobrança da verba 28 da Tabela Geral do Imposto de Selo (TGIS), introduzida pela Lei nº 55-A/2012 de 29/10, incidente sobre 7 unidades habitacionais de um prédio urbano em regime de propriedade total, sito em Lisboa, na sequência do indeferimento da reclamação graciosa, veio apresentar recurso jurisdicional.


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1.2. O objeto do recurso

1.2.1. Alegações da recorrente

Nas suas alegações a recorrente concluiu como segue:

1.ª Visa o presente recurso reagir contra a douta decisão que julgou a impugnação judicial procedente, devendo a Administração Tributária (doravante A.T.) anular as liquidações de Imposto de Selo, referentes a cada uma das divisões susceptíveis de utilização independente afectas à habitação, que compõem o imóvel em causa, referentes ao ano de 2012, com todas as consequências legais.

2.ª O prédio está registado em propriedade total;

3.ª Juridicamente, este prédio constitui uma única unidade;

4.ª O prédio corresponde a uma e uma só inscrição na matriz;

5.ª A sua titularidade pertence a um único sujeito passivo;

6.ª As unidades susceptíveis de utilização independentes não são fracções autónomas;

7.ª Em caso de alienação, o proprietário não pode vender cada uma das unidades/andares de per si;

8.ª A liquidação em separado das várias unidades/andares permite distinguir as unidades afectas à habitação das demais;

9.ª A tributação em separado em IS incidiu sobre as unidades / andares com afectação habitacional, cujo VPT global é superior a €1.000.000,00;

10.ª Não foi violada qualquer norma de incidência tributária e o IS foi liquidado nos termos da lei. XI - Do exposto, resulta que não andou bem o Tribunal a quo neste âmbito, ao proferir a sua decisão baseada na errada interpretação dos factos, violando o direito aplicável, no caso concreto a verba nº 28.º aditada pelo art. 4.º da Lei 55-A/2012 de 29/10 (à Lei 150/99 de 11/09).


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1.2.1. Alegações do recorrido

O recorrido apresentou as suas contra-alegações, formulando conclusões nas quais, em síntese, defende a manutenção da sentença


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1.3. Parecer do Ministério Público

O EMMP junto deste Tribunal emitiu, nos termos do artigo 289.º, n.º 1 do CPPT, douto parecer no sentido da improcedência do recurso.


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Colhidos os vistos legais vem o processo à conferência.

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1.2. Questões a decidir

Saber se a norma de incidência constante da verba 28 da TGIS é aplicável ao somatório de todos os VPT de cada uma das fracções susceptíveis de utilização independente de um prédio urbano em regime de propriedade vertical.


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2 - Fundamentação

2.1. De facto

2.1.1. Factos provados na sentença

1. O impugnante é proprietário do prédio urbano, sito no concelho de ….., em regime de propriedade total, constituído por 8 andares ou divisões susceptíveis de utilização independente, inscrito na respectiva matriz urbana da freguesia de Avenidas Novas, sob o artigo ….. (cfr. fls. 13 a 19 dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido para todos os legais efeitos).

2. O valor patrimonial tributário da totalidade do prédio referido na alínea precedente ascende a € 1.812,650,00 e o valor patrimonial tributário de cada uma das 8 fracções é o seguinte: € 224.230,00(1º), € 224.230,00 (2º), € 224.230,00 (3º), € 224.230,00 (4º), € 224.230,00 (5º), € 224.230,00 (6º), € 194.350,00 (7º), € 272.920,00 (GAR) (cfr. fls. 13 a 19 dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido para todos os legais efeitos).

3. As liquidações de Imposto do Selo foram efectuadas tendo por base o VPT de cada um dos andares/divisões, indicando-se como valor patrimonial total do prédio sujeito a imposto, o montante de € 1.539.730,00 (cfr. fls. 20 a 61 dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido para todos os legais efeitos).

4. Em 21-03-2013, a AT ao abrigo da verba 28.1 da TGIS, emitiu as liquidações de Imposto do Selo nºs ….., ….., ….., ….., ….., ….., ….., ….., ….., ….., ….., ….., ….., ….., ….., ….., ….., ….., ….., …..e ….., relativamente às fracções identificadas na alínea B), do prédio identificado na alínea A), nos montantes de € 747,44, € 747,44, € 747,44, € 747,44, € 747,44, € 747,44, € 647,84, € 747,43, € 747,43, € 747,43, € 747,43, € 747,43, € 747,43, € 747,43, € 647,83, € 747,43, € 747,43, € 747,43, € 747,43, € 747,43, € 747,43 e € 647,83, com data de pagamento voluntário até 30-04-2013, 31-07-2013 e 30-11-2013, o objecto da presente Impugnação (cfr. fls. 20 a 61 dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido).

5. As liquidações referidas na alínea anterior, foram pagas pelo impugnante em 27-11-2013 (cfr. liquidações e comprovativos de pagamento de fls. 20 a 61 dos autos, que aqui se dá por reproduzido).

6. Em 17-06-2013 o Impugnante deduziu reclamação graciosa relativamente à primeira prestação do IS, a qual indeferida (cfr. fls. 35 a 37 do processo de reclamação graciosa apensa aos autos - processo nº …..).

7. O Impugnante apresentou recurso hierárquico do indeferimento da reclamação graciosa referida na alínea anterior, o qual não foi objecto de decisão (cfr. fls. 3 a 8 do processo de recurso hierárquico nº ….. apenso.

8. O Impugnante deduziu reclamação graciosa relativamente à segunda prestação do IS, a qual indeferida (cfr. fls. fls. 45 a 48 do processo de reclamação graciosa nº ….. apensa aos autos).

9. O Impugnante apresentou recurso hierárquico do indeferimento da reclamação graciosa referida na alínea anterior, o qual não foi objecto de decisão (processo nº …..).

10. O Impugnante deduziu reclamação graciosa relativamente à terceira prestação do IS, o qual não foi objecto de decisão (cfr. fls. fls. 3 a 10 do processo de reclamação graciosa nº ….. apensa aos autos).

11. A presente impugnação foi deduzida em 20-12-2013 (cfr. fls. 2 dos autos).


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2.1.2. Factos não provados na sentença

- Nenhuns


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2.2. De Direito

Nas suas conclusões, que como é sabido, delimitam o objecto do recurso, a recorrente FP insiste que o prédio a que respeita a liquidação em crise constitui uma única unidade jurídica, com uma só inscrição na matriz, sendo que as unidades que o compõem, embora susceptíveis de utilização independente, não são fracções autónomas, pelo que em caso de alienação o proprietário nunca as poderá vender separadamente.

Esta argumentação, salvo o devido respeito, não abala os fundamentos em que se estribou a douta sentença recorrida.

É certo que, como diz a recorrente, o prédio em causa está constituído em regime de propriedade vertical. Mas também não deixa de ser verdade que as fracções que o integram são independentes entre si, com saída própria para as partes comuns e destas para o exterior.

Por isso, não corresponde inteiramente à verdade que os respectivos proprietários não as possam vender separadamente: como o prédio reúne todos os requisitos para poder ser submetido ao regime da propriedade horizontal, basta que os proprietários efectivem essa alteração (cfr. artigos 1414.º e ss. do CC) para que possam vender cada uma fracção separadamente.

Portanto, o problema não pode ser encarado unicamente numa perspectiva civilista. Ele deve ser resolvido tendo em conta a situação de facto existente, o regime jurídico que é aplicável ao edifício e, sobretudo, o regime fiscal a que está sujeito.

Ora, tal como a sentença justamente considerou, para efeitos do IMI cada fracção autónoma de um prédio em regime de propriedade vertical é havida como constituindo um prédio. Isto é, para o legislador do IMI o que é relevante é a realidade factual dos edifícios em regime de propriedade vertical e a sua destinação, não a sua realidade jurídica (artigo 2.º, n.º 4, do CIMI).

Daí que “cada andar ou parte de prédio susceptível de utilização independente é considerado separadamente na inscrição matricial, a qual discrimina também o respectivo valor patrimonial tributário” (artigo 12.°, n.° 3, do CIMI).

Por isso, como acertadamente concluiu a sentença, uma vez que o artigo 67.°, n.° 2, do CIS, determina a aplicação subsidiária do CIMI no tocante à definição das matérias não especificamente nele reguladas respeitantes à verba 28 da Tabela Geral, então tem de concluir-se que a incidência do Imposto de Selo, no que concerne a essa verba, deve ser regulada pelo regime do CIMI.

Ora, se dúvidas existissem de que para o CIMI o que importa não é o regime civil relativo à propriedade horizontal ou vertical mas sim a utilidade de cada fracção de um prédio com mais de que um andar, constituído num dos dois modelos de propriedade possível (horizontal ou vertical), a Lei n.º 119/2019, de 18 de Setembro, tê-las-ia dissipado.

Nos termos do seu artigo 10.º, a redacção do artigo 112.º, n.º 1, al. b) do CIMI, passou a prever o agravamento da taxa de IMI para os prédios não constituídos em propriedade horizontal, mas “apenas sobre a parte do valor patrimonial tributário correspondente às partes devolutas”.

Embora esta norma não seja aplicável ao caso, ela serve para ilustrar (rectius, para interpretar) que as partes autónomas de um prédio urbano em regime de propriedade vertical, desde que permitam uma utilização autónoma tal qual as fracções de um prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, são tributadas separadamente para efeitos de IMI.

Donde, sendo o regime do CIMI aplicável à norma de incidência da verba 28 da TGIS (artigo 67.º, n.º 2, do CIS, na redacção do artigo 3.º da Lei n° 55-A/2012, de 29 Outubro), bem andou a douta sentença recorrida em anular as liquidação impugnadas com fundamento em vício de violação de lei.

Na verdade, e resumindo, o conceito de prédio para efeitos da verba 28 do CIS é o que é acolhido no CIMI, a matriz relativa a cada fracção susceptível de utilização independente é separada do prédio a que pertence, à semelhança do que sucede para as fracções autónomas de um prédio em regime de propriedade horizontal, prevendo um VPT específico para cada fracção, pelo que a incidência em sede da verba 28 da TGIS do IS deve ser determinada, não pelo somatório dos VPT de todas as fracções de um prédio em regime de propriedade vertical mas susceptíveis de utilização independente (evidenciada na matriz) mas pelo VPT atribuído a cada uma dessa fracções, pois para este efeito cada fracção é havida como um prédio autónomo.

Seguindo a sentença recorrida a jurisprudência do acórdão do Pleno da SCT do STA de 29-03-2017 (processo n.° 593/16), nenhuma razão há para que não subsista na ordem jurídica.

O mesmo é dizer que o recurso não merece provimento.


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3. Dispositivo

Em face de todo o exposto acordam em negar provimento ao recurso e em confirmar a douta sentença recorrida.

Custas pela recorrente.

D.n.

Lisboa, 2020-06-25

Benjamim Barbosa

Ana Pinhol

Isabel Fernandes