Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1729/14.1BELRA
Secção:CT
Data do Acordão:10/31/2019
Relator:CATARINA ALMEIDA E SOUSA
Descritores:FACTURAS FALSAS;
IVA
Sumário:1. Quando a Administração Tributária desconsidera facturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do artigo 74.º da LGT, competindo à Administração fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da factura não corresponde à realidade. Feita esta prova, passa a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transacção.

2. No que concerne à prova que compete à Administração, o que é imprescindível é que aquela a faça de factos suficientes indiciadores a que o Tribunal possa concluir, “em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência”, pela elevada probabilidade (ou até certeza) de que o negócio declarado por aquelas partes não corresponde à realidade materializada naquela factura”.

3. Nesta tarefa, poderá a Administração Tributária lançar mão de elementos obtidos com recurso à fiscalização cruzada, junto de outros contribuintes, para obter os referidos indícios, pelo que tais indicadores de falsidade das facturas não têm necessariamente que advir de elementos do próprio contribuinte fiscalizado.

Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam, em conferência, os juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

l – RELATÓRIO

B.........., Lda, veio deduzir impugnação judicial contra o acto tributário de liquidação adicional de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e respectivos juros compensatórios, respeitante ao ano de 2009, no montante de € 87.423,87.

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, por sentença de 28 de Fevereiro de 2017, julgou improcedente a impugnação judicial.

Inconformada, a impugnante, B.........., Lda., interpôs recurso jurisdicional de tal decisão, tendo apresentado as suas alegações e formulado as seguintes conclusões:

«A) – Salvo o devido respeito, a Recorrente discorda do julgamento da matéria de facto contido na douta sentença recorrida, ou seja, o Tribunal “a quo” efetuou um errado e incorreto julgamento da matéria de facto.

B) - A Recorrente efetuou prova das datas em que a sociedade A.........., Lda.. efetuou as cargas de madeira, os metros cúbicos de madeira de cada carga e o valor de venda de cada carga, as respetivas guias de transporte, as matrículas das viaturas que efetuaram o transporte, as respetivas guias de fábrica e os locais de descarga da madeira nas fábricas de celulose, e consta dos vinte e três “espelhos”, conforme facto provado da alínea R) do probatório e no relatório de auditoria, cujo teor foi dado como facto provado na alínea JJ), e ainda do depoimento da testemunha Vítor .......... ao minuto 13 e 56 segundos, minuto 16 e 50 segundos, minuto 22 e 13 segundos

C) – Dos factos provados resulta o modus operandi do negócio de compra e venda de madeiras a que se dedica a Recorrente, que foi dado como provado quanto a todos os fornecedores da Recorrente (quadro de fornecedores incluído no facto provado na alínea P) e dos factos provados alínea JJ) na parte de explicação do negócio e na conclusão 4.3.).

D) – O modus operandi que ficou melhor descrito no depoimento da testemunha Vítor .........., aos minutos 6 e seguintes.

E) – Pelo que, deve ser dado como provado que o fornecedor A.........., Lda. operou como os restantes fornecedores da Recorrente, ou seja, efetuou as cargas de madeira até às empresas de celulose, as quais emitiram as respetivas guias de fábrica nos locais de descarga da madeira, por conta do contrato de fornecimento que a Impugnante detinha com as ditas fábricas de celuloses.

F) – Resulta da conjugação da análise crítica dos factos provados nas alíneas L. a T. e JJ. (parte relativa à explicação do negócio e conclusões do relatório) e do depoimento referido na conclusão D) supra, que:

i) a Impugnante/Recorrente recorria a terceiros para cumprir o contrato de fornecimento de madeira com as empresas de celulose;

ii) esses fornecedores (terceiros relativamente ao contrato de fornecimento de madeira às empresas de celuloses), a expensas próprias, procediam ao abate, corte, desbaste, rechega de madeira e transportavam-na para as empresas de celulose;

iii) esses fornecedores no exercício da atividade de abate, corte, desbaste, rechega e transporte de madeira podem ou não usar equipamento e mão-de-obra próprio e recorrem também a subcontratação de terceiros;

iv) a madeira transportada pelos fornecedores da Impugnante/Recorrente até às referidas fábricas de celulose apenas aí dava entrada com uma “guia de entrada” onde constava como fornecedora da madeira a Impugnante e não os fornecedores/ transportadores;

v) a impugnante sabia que quantidade de madeira entrava na fábrica de celulose em seu nome, porque cada um dos fornecedores ficavam com o duplicado da “guia de entrada” e porque as empresas de celulose emitiam um, documento denominado “espelho” equivalente à informação constante nas guias de entrada.

G) – Do Relatório de auditoria do Revisor Oficial de Contas, cujo teor foi dado como facto provado na alínea JJ), constam as seguintes conclusões:

“4.1 – Para a generalidade das situações, foi possível ligar as várias entregas aos clientes com as faturas dos fornecedores intermediários

4.2 - Para a generalidade das situações foi possível obter evidência nos extratos bancários dos pagamentos das facturas dos fornecedores

4.3 - Dos 4 fornecedores: C.........., C.........., A.........., e A.........., não se verificou a existência de qualquer desvio face ao padrão existente das compras a intermediários”.

H) - Relatório pericial do Revisor Oficial de Contas que merece toda a credibilidade na medida em que se fundamentou no designado ”espelho” e em função de cada uma das entregas, à identificação do fornecedor e respetiva factura que suportavam essas entregas.”

I) – Acresce ainda referir que a prova da propriedade das matrículas das viaturas que efetuaram o transporte da madeira fornecida pela sociedade A.........., Lda., (alíneas U) a II) do probatório) foi efetuada pela Recorrente, não podendo ser imposta a obrigação de saber de antemão a propriedade registada ou não em nome do seu fornecedor.

J) - Donde, a conclusão extraída para improceder o pedido de anulação das liquidações que não consideraram devida a dedução do imposto suportado nas compras de madeira efetuadas à A.........., Lda., está em contradição com os factos dados como provados e com os demais elementos de prova documental carreados para o processo, e ainda pelo depoimento da testemunha Vítor ...........

K) – Pois, a única prova de que a madeira comprada aos fornecedores, onde se inclui a A.........., Lda., pela Recorrente foi efetiva é que a mesma foi comprada para efeitos de cumprimento do contrato de fornecimento às empresas de celulose é a sua entrada nestas, através das “guias de entrada”, que o permite confirmar.

L) – Sendo certo que aquando da entrada da madeira nas fábricas o respetivo documento não contém o nome da empresa que entrega efetivamente a madeira, porquanto a madeira entra como sendo fornecida pela B.........., Lda., embora entregue por terceiros, e esta não tinha como aceder a documentação própria dos seus fornecedores.

M) – Controle da madeira que era adquirida pela Impugnante/Recorrente que era feita, como descrito nos pontos S. e T. dados como factos provados, através quer dos duplicados “das guias de entrada” apresentados pelos fornecedores, quer pelos espelhos emitidos pelas empresas de celulose.

N) – Daí que, se conclua, a partir dos indícios constantes dos autos, a prova dos factos já acima elencados, e de que as faturas das compras de madeira aos fornecedores da Recorrente (incluindo a A..........) eram emitidas apenas na presença destes dois documentos externos à Recorrente (os duplicados das “guias de entrada” apresentados pelos fornecedores e os “espelhos” emitidos pelas empresas de celulose).

O) – Do exposto resulta que, para além dos factos provados, deve ser dado como provado o seguinte:

A empresa A.........., Lda., forneceu às fábricas de celulose a madeira, em nome e através do contrato existente em nome da Recorrente, pelo preço e quantidades constantes das suas faturas pelo preço e demais condições descritos na p.i., mais concretamente as suas faturas n.ºs 3, 5, 6, 7, 8, 9, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 43 e 46.

P) – Por outro lado, na douta sentença recorrida não foi dado como provado o pagamento das referidas faturas, o qual se encontra comprovado documentalmente nos autos, através da saída dos cheques/transferências emitidos a favor do identificado fornecedor, conforme documento quatro junto à p.i. (extrato da conta bancária da Recorrente), em conjugação com o relatório de auditoria realizado pelo ROC (facto provado na alínea JJ), no seguinte excerto: “Por fim, no mapa abaixo consta o resumo dos pagamentos que foi possível cruzar com os extratos bancários no total do período de 2009 a 2011, sendo que nas fichas anexas por fornecedor poderão ser identificados os valores pagos por fatura e, naturalmente por ano.”).

Q) – Além do mais, a Recorrente juntou aos autos, através de requerimento enviado pelo SITAF em 21/01/2016, os documentos doze e treze, com o mapa e cópia dos cheques constantes do extrato de conta da Caixa .........., resultando da sua análise critica que a Recorrente efetuou prova de que um ou mais determinado cheque ou transferência pagou uma determinada fatura e que determinados cheques ou transferências foram para pagamento da conta corrente entre as duas empresas.

R) – Assim, nos documentos doze e treze supra identificados constam, nomeadamente, a data, o montante, o número do cheque e o beneficiário do cheque e constam a cópia dos canhotos dos cheques emitidos e sacados pela Recorrente sob a conta da Caixa .......... de Caldas da Rainha e dos quais se verifica que foram todos emitidos de forma nominativa, ou seja, a Recorrente não entregava, por regra cheques, ao portador.

S) – Ora, tendo em conta que, segundo o relatório de inspeção que constitui o documento um junto com a p.i., o montante global das compras feitas pela Recorrente à A.........., nos exercícios de 2009, 2010 e 2011, ascendeu a € 2.145.884,69, significa que a Recorrente, em 31 de dezembro de 2011, era credora da A.........., Lda., do montante de € 20.210,62, uma vez que lhe tinha pago até essa data a quantia de € 2.166.095,31, conforme assim melhor resulta do teor do relatório de auditoria dado como provado na alínea JJ).

T) – Além disso, no extrato de conta corrente com a sociedade A.........., Lda. que foi junto como documento 3.1 da reclamação graciosa, a qual faz parte do processo administrativo junto pela Fazenda Pública, verifica-se existir uma correspondência entre o valor da fatura e o valor do recibo.

U) – A prova dos supra referidos factos resulta ainda do depoimento da testemunha arrolada Vítor .......... ao minuto 31 e 2 segundos e minuto 32 e 28 segundos.

V) - Ora, a prova produzida permite demonstrar que se encontram provados os factos alegados nos artigos 194º a 251º da p.i.

W) – A omissão da valoração dos meios de prova documental acima identificados faz incorrer a doutra sentença recorrida em omissão na apreciação da prova produzida e consequente erro de julgamento da matéria de facto.

X) – Além disso, a douta sentença recorrida fez errónea valoração da prova apresentada pela Fazenda Pública, porquanto a AT não incorporou no relatório de inspeção tributária factos e motivos suficientes para que o Tribunal a quo pudesse dar como provado a fraude ou simulação das transações entre a Recorrente e a A.........., Lda.

Y) – Assim, o facto de a inspeção tributária, na deslocação que efetuou à Q.........., n º 5, em Alvorninha, não ter encontrado ninguém e não ter encontrado elemento que possa identificar a existência da empresa não constitui nada de anormal nem especial tanto mais que a mesma morada serve de residência para os sócios da Recorrente e por outro lado, o facto de não lá ter sido encontrado nenhum dos sócios e de não existir na referida morada, publicidade da sede da empresa não permite concluir que a sede da Recorrente e a morada dos seus sócios não seja na referida morada.

Z) - Por sua vez, a informação recolhida no gabinete de contabilidade do TOC da Recorrente e que consta no relatório de inspeção é em si mesma muito insuficiente e incompleta pois a informação recolhida no TOC da Recorrente diz respeito às faturas relativas à aquisição de mercadorias e serviços, de corte e desbaste de madeira nomeadamente as relativas a quatro fornecedores entre os quais a A.........., Lda..

AA) - Ou seja, os Serviços de Inspeção satisfizeram-se apenas com a cópia das faturas de compra por parte dos quatro fornecedores, entre os quais a A.........., Lda., sendo que no gabinete de contabilidade estavam também os meios de pagamento das referidas faturas e além disso, a Recorrente tinha em seu poder nomeadamente a cópia das guias de transporte, das matrículas das viaturas para o transporte de madeira, as datas de entrega da madeira na fábrica, as guias de fábrica.

BB) - Verifica-se assim que o procedimento dos Serviços de Inspeção limitou-se a relatar o valor e as datas das faturas emitidas pela A.......... à Recorrente sendo que toda a restante materialidade das operações ocorridas entre a A.........., Lda. e a Recorrente foi simplesmente ignorada.

CC) - Ignorância da restante materialidade das operações ocorridas entre a A.......... e a Recorrente que impediu que a Autoridade Tributária tivesse tomado conhecimento do valor de € 2.166.095,31 que a Recorrente lhe pagou nos exercícios de 2009, 2010 e 2011, pagamento efetuado ou por cheques nominativos ou por transferências bancárias e caso a Autoridade Tributária tivesse averiguado na esfera da A.......... o destino do valor que lhe foi pago pela Recorrente nos exercícios de 2009, 2010 e 2011 ter-lhe-ia exigido quer o IVA quer o IRC que está a ser exigido à Recorrente.

DD) - Ignorância da restante materialidade das operações ocorridas entre a A.......... e a Recorrente que levou a Autoridade Tributária a aceitar, em sede de procedimento inspetivo levado a efeito àquela, a entrega de declarações sem qualquer movimento.

EE) - Sucede, porém e conforme já se demonstra nestas alegações, que a A.......... Lda. efetuou à Recorrente, vendas de madeira que nos exercícios de 2009, 2010 e 2011 perfizeram € 2.145.884,69.

FF) – Situação diversa é da regularidade fiscal em que se encontrava, ou não, o indicado fornecedor, e se a Recorrente sabia ou deveria saber a forma como atuava face à administração tributária, ou se participou ativamente numa operação que consistia numa fraude ao IVA cometida por esse fornecedor, sendo que no entender da douta sentença recorrida, a prova testemunhal prestada não foi suficiente para afastar os indícios apresentados pela AT de fraude ao IVA praticado pelo referido fornecedor e entendeu que a Recorrente, sabia ou devia saber a situação irregular em que se encontrava o sobredito fornecedor, designadamente das faltas declarativas e de entrega do IVA liquidado na faturas, da falta de estrutura empresarial e porque existia uma relação de familiaridade entre o gerente da “A.........., Lda.” e a gerente da Recorrente.

GG) – Ora, quanto aos dois primeiros argumentos (sobre o conhecimento ou não da Recorrente acerca das faltas declarativas e de outras obrigações fiscais e da falta de estrutura empresarial), foi transcrito supra o depoimento da testemunha Vítor .......... do qual se conclui que neste sector de atividade não é necessário que as empresas possuam uma considerável estrutura empresarial, podendo as mesmas subcontratarem, quer mão-de-obra, quer equipamento, quer o transporte, de forma a evitar os custos associados à manutenção da estrutura.

HH) - Assim, os alegados indícios de falta de estrutura empresarial não será um argumento válido a ter em conta, pois tal é uma constante neste sector de atividade, e, assim sendo, não seria de imputar à Impugnante / Recorrente um especial conhecimento relativamente à estrutura empresarial do fornecedor cujas deduções de impostos foram desconsideradas.

II) – Por outro, a Recorrente fez prova testemunhal segundo a qual a A.......... teve pessoal ao seu serviço.

JJ) – A testemunha Bruno .......... depôs de forma convincente e isenta, conforme depoimento ao minuto 41 segundo 19 e seguintes, do qual resulta não só que a A..........tinha ao seu serviço trabalhadores e que dedicava a atividade de corte e fornecimento de madeira, como também resulta que a testemunha identificou como responsável da empresa o Sr. Luís .......... até meados de 2009 e que depois quem lhe passou a dar ordens e a pagar foi o Sr. L......

KK) – Na douta sentença recorrida escreve-se que existem relações especiais entre a Recorrente e a A.........., Lda., trata-se, no entanto, dum fundamento que não permite retirar a conclusão segundo a qual as relações comerciais estabelecidas entre as duas empresas terem sido inexistentes.

LL) – O facto de existirem relações entre sócios de duas ou mais empresas não permite retirar qualquer conclusão sobre a falta de veracidade das relações entre as respetivas empresas, até porque, como acima transcrito, do depoimento resulta, quanto muito, que a partir de meados de 2009 o Sr. Luís deixou as funções que exercia na A.......... para passarem a ser exercidas pelo Sr. L......

MM) – Relativamente ao facto da sede da A.......... ser no mesmo local da Recorrente, importa ter presente o depoimento da testemunha Vítor .......... ao minuto 37 e segundo 29.

NN) - Por outro lado, durante o exercício de 2009, um dos fornecedores da Recorrente foi Luís .......... (teor do relatório de auditoria dado como facto provado), que vendeu à Recorrente € 170.229,54 de madeira.

OO) - Neste contexto chega-se à seguinte conclusão: tendo sido a A.......... gerida, em 2009, por Luís .......... é absolutamente contraditório e absurdo, por parte da Autoridade Tributária, qualificar como falsas e fictícias as compras feitas pela Recorrente àquela e aceitar como certas e verdadeiras as compras feitas a Luís .........., em nome individual.

PP) - Em suma, a prova efetuada nos autos permite aferir a não responsabilidade da Recorrente relativamente ao comportamento fiscal do seu fornecedor, não podendo, assim, ser afastado o direito à dedução dos respetivos custos quer em sede de IRC, quer as deduções de IVA.

QQ) – Atenta a posição adotada pelo Tribunal de Justiça da EU, no processo C-277/14, Acórdão de 22/10/2015, entende-se que, para ser recusado o direito à dedução, não basta que se prove que o fornecedor seja considerado inexistente, ou em situação irregular, não basta provar que não tenha a situação declarativa regularizada, e não basta provar que o fornecedor de bens ou serviços não tenha pago o imposto devido.

RR) – Com efeito, entende o TJUE que para recusar a dedução, a administração fiscal tem de demonstrar uma situação de fraude e a ausência de boa-fé por parte da empresa que adquiriu os bens em causa, o que manifestamente não se encontra demonstrado no relatório de inspeção, cujo teor não pode ser considerado meio de prova suficiente e idóneo para afastar o direito à dedução.

SS) – Como ficou provado, a impugnante adquiriu os bens (madeira) de vários fornecedores (nos quais se inclui a A.......... Lda.), a qual foi entregue diretamente por estes nas celuloses, em nome da impugnante, desconhecendo a situação fiscal daqueles fornecedores, sem que lhe fosse exigível conhecê-la.

TT) – Tanto mais que provado o facto de terem sido pagas as faturas ao referido fornecedor, provado está que foi pago pela Recorrente o valor das mercadorias transacionadas acrescido do respetivo IVA liquidado, o que foi liquidado e recebido pelo fornecedor, que não tendo sido entregue por este nos cofres do Estado, deve ser exigido a quem não o entregou, em vez da AT ir “recuperar” o imposto através da anulação das deduções feitas pela Recorrente.

UU) – Deste modo, comprovando-se que as operações entre a A.........., Lda. e a Recorrente corresponderam a operações efetivas, conclui -se ser ilegal a liquidação recorrida, o que significa que a douta decisão recorrida não poderá manter-se, devendo ser revogada e consequentemente anulada as liquidações oficiosas de IVA e juros compensatórios, relativas ao exercício de 2009.

Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente e em consequência ser revogada a douta sentença recorrida, anulando-se as liquidações oficiosas de IVA e juros compensatórios, relativas ao exercício de 2009. »


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A FAZENDA PUBLICA, devidamente notificada para o efeito, optou por não contra-alegar.

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Com o recurso da sentença subiu o recurso interposto, abrigo do artigo 285º do CPPT, do despacho judicial interlocutório proferido em 13/01/16, concretamente do despacho de indeferimento da perícia requerida.
Foram apresentadas as seguintes conclusões:
A) – O douto despacho recorrido indeferiu a produção de prova pericial, fundamentando que a matéria em causa não exige conhecimentos especiais de natureza técnica e que a mesma pode ser objecto de prova testemunhal.
B) – Contudo, a recorrente pretende demonstrar mediante a prova pericial que a sociedade desenvolveu a sua actividade de compra e venda de madeira conforme documentado nos documentos de suporte designados “espelhos”, e que estes reflectem com verdade as efectivas transacções comerciais entre a impugnante, seus clientes e fornecedores.
C) – Pretende-se ainda com a prova pericial demonstrar que tecnicamente a informação contida nos documentos de suporte contabilístico é objectiva e não contém erros com relevância contabilística e ou fiscal, bem como, demonstrar que os documentos contabilísticos e de suporte comprovam quer o valor das facturas, quer o valor dos recebimentos dos clientes e o valor dos pagamentos aos fornecedores.
D) – A recorrente entende que para a referida prova é necessário efectuar diligências de produção de prova especializada, pois apenas com a prova pericial colegial se poderão obter respostas especializadas quando à matéria de facto controvertida respeitante às compras de madeira às empresas fornecedoras, entrega da madeira às empresas de celulose, e respectivos pagamentos efectuados.
E) – Com a resposta aos quesitos propostos para a perícia, entende a recorrente que se alcançará a prova de que os impostos liquidados adicionalmente não são devidos, porquanto já haviam sido pagos todos os impostos respeitantes às operações económico-financeiras desenvolvidas pela B.........., Lda.
F) – Assim, a perícia requerida deve ser admitida e ordenada a realização da diligência por se afigurar útil para a descoberta da verdade material e por estar em causa matéria de facto controvertida que justifica a produção de prova especializada.
G) – Daí que o indeferimento da produção de prova pericial requerida pela recorrente viola o disposto no n.º 1 do artigo 90º do CPTA ex vi artigo 2º, alínea c) do CPPT.
Termos em que deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e em consequência ser o despacho ora recorrido, substituído por outro que ordene a produção de prova pericial requerida pela recorrente.
Não foram apresentadas contra-alegações.
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O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal (EMMP) emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso interposto da sentença, nada tendo referido sobre o recurso interposto ao abrigo do artigo 285º do CPPT.

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Colhidos os vistos legais, vem o processo submetido à conferência desta Secção do Contencioso Tributário para decisão.



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2 – FUNDAMENTAÇÃO

- De facto

A sentença recorrida considerou provados os seguintes factos:

«A) Em 31-08-2012 os Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Leiria concluíram ação de inspeção à ora Impugnante para efeitos de IVA e IRC aos exercícios de 2009, 2010 e 2011, em cujo relatório consta, designadamente, o seguinte:

“I.2. Descrição sucinta das conclusões da ação de inspeção

De acordo com o exposto nos capítulos seguintes, são propostas as seguintes correcções:

1.1.1. Em sede de IVA exercícios de 2009, 2010 e 2011

      Períodos
IVA deduzido indevidamente
Total de 2009
          € 78.833,69
Total de 2010
          € 188.460,41
Total de 2011
          € 351.371,48
Total dos 3 Exercícios
          € 618.665,58

1.2.1. Em sede de IRC exercícios de 2009, 2010 e 2011

(…)

II. Objectivos, âmbito e extensão da acção inspectiva

II.1. 1. Credencial e período em que decorreu a acção

A presente acção inspectiva teve por base as ordens de serviço externas n.º OI2011..... e OI2012....., datadas de 2011-07-18 e 2012-03-02, respectivamente, e tiveram o seu início em 2011- 11-11 e 2012-03-07. O seu final aconteceu em 2012-08-22.

II.2. Motivo âmbito e incidência temporal

Esta acção é despoletada, a solicitação do Director de Finanças de Leiria - Requisição n.º …/2010 -, a fim de se verificar os factos descritos no processo de inquérito n.º ...../10.1 TACLD remetido ao núcleo de Inquéritos Criminais desta Direcção de Finanças pelos Serviços do Ministério Público de Caldas da Rainha e ainda ao cruzamento de informação, análise informática dos anexos, da Declaração Anual de Informação Contabilística e Fiscal (DAICF/IES), de clientes e de fornecedores onde se detectou que o sujeito passivo (SP) tinha como principais fornecedores SP's que não cumpriam as suas obrigações declarativas em sede de IVA e IRC.

Face aos elementos em falta observados a extensão da acção foi alterada de âmbito parcial para geral (Em 23 de Abril de 2012, através de novo Despacho do Director de Finanças, referente à Ordem de Serviço OI2011.....), incidindo sobre os exercícios de 2009 e 2010 que lhe foi notificada em 2012- 05-04.

Relativamente ao exercício de 2011, OI2012....., a acção é de âmbito geral. No entanto devido à distinta complexidade deste SP a prorrogação do prazo do procedimento de inspecção, Ordem de Serviço n.º OI2012....., foi-lhe notificada em 2012-08-29.

II.3. Outras situações

a) Caracterização do SP: B.........., Lda., NIF: .........., doravante designada como B....., está registada com o CAE principal: «46731- Comércio por Grosso Madeira Bruto e Produtos Derivados»: e com o CAE secundário: «02400- Actividades de serviços relacionados com a Silvicultura e Exploração Florestal». O seu início de actividade aconteceu em 1009-05-01.

De acordo com a Publicação On-Line de Acto Societário e de outras entidades, desde 2011-05- 06, o objecto da B..... é composto por duas vertentes:

«1. Comércio por grosso de madeiras e produtos derivados e actividades de serviços relacionados com silvicultura e exploração florestal nomeadamente, cortes, rechegas e transporte de madeiras,' limpeza de matas.

2. A sociedade pode adquirir participações em sociedades com objecto diferente daquele que exerce, ou em sociedades reguladas por leis especiais, e integrar agrupamentos complementares de empresas».

Esta empresa familiar, sociedade por quotas com capital social de € 5.000,00, tem como domicílio fiscal a Q.........., n.º 5, em Alvorninha no concelho das Caldas da Rainha e efectuou o seu início de actividade em 2009-01-05. Os seus, únicos, sócios-gerentes são:

NomeNIFQualidadeQuota
João ....................Sócio-gerente€ 2.500,00
Maria ....................Sócia-gerente€ 2.500,00
Tipo de Contabilidade: Organizada por exigência legal informatizada. Tem como Técnico Oficial de Contas (TOC) Luís .........., NIF: ...........

b) Enquadramento fiscal: O SP encontra-se colectado em sede de IRC no regime Geral desde 2009-01-01 e em sede de IVA, enquadrado no regime normal mensal, desde 2011-01-01. Anteriormente, em sede de IVA, de 2009-01-5 a 2010-12-31 esteve registada no regime normal trimestral.

III. Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável

III.1. Factos e valores que indiciam a prática de crime fiscal

III.1.1. Fraude / Fraude qualificada em sede de IVA (artigos 103.º e 104.º do RGIT) - Exercícios 2009, 2010 e 2011

III.1.1.1. VA deduzido Indevidamente - Negócio Simulado (n.º 3 e n.º 4 do artigo 19.º do CIVA)

A fim de dar cumprimento às Ordens de Serviço referidas em epígrafe, deslocámo-nos ao local identificado como sede da empresa, Q.........., n.º 5 em Alvorninha, igualmente local de residência fiscal dos sócios-gerentes, porém aí não foi possível contactar com ninguém, nem se conseguiu detectar qualquer elemento que possa identificar, naquela morada, a existência da empresa.

Devido ao facto das diligências efectuadas resultarem infrutíferas recorremos ao gabinete de contabilidade - C.......... Lda., [NIF: ..........], nas Caldas da Rainha, onde se pretendia contactar com o TOC do SP.

No gabinete de contabilidade, com a colaboração do TOC, foi possível proceder à avaliação dos documentos da contabilidade, desde o início de actividade (em 2009) até ao último trimestre do exercício de 2011.

Entre os documentos da contabilidade encontram-se Facturas relativas à aquisição (por parte da B.....) de mercadorias e de serviços, de corte e desbaste de madeira, emitidas por diversos SP's entre os quais cumpre-nos destacar os seguintes:

1- A.........., Lda. (NIF: ..........);

2 - C.........., Lda. (NIF: ..........);

3 - C.........., Lda. (NIF: ..........);

4- A.........., Lda. (NIF: ..........)

III.1.1.1.1. A.........., Lda. (NIF: ..........)

O SP B..... tem registado na sua contabilidade e Declarações Tributárias aquisições de madeira e de serviços a este fornecedor no montante total por exercício de:

Ano FiscalValor sem IVAIVA
2009€ 393.668,45€78.833,69
2010€ 917.970,67€ 188.460,41
2011€ 460.936,13€ 106.015,34
Total 3 anos€ 1.772.575,25€ 373.309,44
Este SP, doravante designado de A.........., já foi alvo de inspecção por parte desta Direcção de Finanças através das seguintes ordens de serviço: OI2011....., OI2011..... e OI2012...... Decorrente destas foi elaborado um Relatório de Inspecção Tributária onde é referido que o SP iniciou a actividade para efeitos fiscais em 2008-12-23, em sede de IVA e IRC, e que: «o cliente B.........., Lda tem relações especiais com o SP em análise, já que os seus dois sócios gerentes Sr. João .........., NIF: .........., e Sr.ª Maria .........., NIF: .........., são ascendentes (o Pai e a Mãe) do gerente da A.........., o Sr. Luis .........., NIF: ...........

Importa também mencionar que o Sr. João .......... e o Sr. Luís .......... são sócios-gerentes numa empresa familiar denominada M.........., Lda (NIF: ..........) que desenvolve a actividade de "Comércio de madeiras, cortes, rechegas e transportes" a que corresponde o CAE 46731 comércio por grosso madeira bruto e produtos derivados.

A sede, ou domicílio fiscal, destas empresas é a mesma da residência do sócio gerente da A.......... e dos sócios-gerentes da B......

        Nome/Designação
        Domicilio Fiscal
João ..........
    Q.........., 5, Alvorninha
Maria ..........
    Q.........., 5, Alvorninha
Luis ..........
    Q.........., 5, Alvorninha
A.........., Lda
    Q.........., 5, Alvorninha
B.........., Lda
    Q.........., 5, Alvorninha
M.........., Lda
    Q.........., 5, Alvorninha

Acresce ainda o facto do TOC responsável pela contabilidade destas três sociedades ser o Sr. João .........., NIF: .........., que em 2011-12-07 renunciou à execução da contabilidade da B...........

Por consulta ao sistema informático, em 2011-07-14, verificou-se que a A.......... não cumpria com as suas obrigações fiscais em sede de IVA e IRC. Estando em falta as Declarações Periódicas de IVA (DP's) desde 09/12T e as Declarações Modelo 22 de IRC (DM22) e Declaração Anual de Informação Contabilística e Fiscal/Informação Empresarial Simplificada (DAICF/IES) desde o ano fiscal de 2009 (inclusive). Contudo procedeu à entrega das mesmas no dia 2011-12-06, no decurso do procedimento inspectivo, porém sem qualquer base tributável em qualquer uma delas visto que foram entregues a zeros.

Ainda no relatório da inspecção tributária ao SP A.......... é referido: «Ao SP em análise não se conhecem outros fornecedores, que não a A.........., excepção feita ao fornecedor de um Tractor de Matrícula: ..-..-.. Marca: SCANIA, do qual se desconhece existir reboque, não se conhece equipamento específico para a execução dos trabalhos de corte, máquinas de medição de madeira em metros cúbicos e maquinaria de carga e transporte de madeiro, nem pessoal qualificado para a execução dessas tarefas, nem guias de remessa, nem guias de transporte, nem se conhece morada, sede ou qualquer instalação física onde, sendo necessário, pudesse armazenar os produtos mencionados nas Facturas indiciadas como falsas.

Por solicitação ao Instituto de Segurança Social, IP (Centro Distrital de Leiria) verifica-se, tendo como referência (início) o mês de Janeiro de 2009, que apenas em Abril e Maio de 2009 (2 trabalhadores), Junho e Julho (3 trabalhadores) e em Agosto e Setembro (2 trabalhadores) existiram trabalhadores na A.......... além do sócio gerente Sr. Luis ...........

Mais se informa que a entidade empregadora (A..........) não procedeu à entrega das declarações de remunerações desde Maio de 2010.

Analisadas as Facturas emitidas pela A.......... verifica-se que as mesmas serviram apenas para criar custos e proporcionar a correspondeste dedução do IVA por parte da A........... Dedução que encontra apoio no apurado pela Direcção de Finanças de Coimbra na inspecção que efectuou à A.........., Lda (NIF: ..........) ao abrigo da OI2011.....: «o sujeito passivo não possui uma estrutura adequada à execução dos serviços que mencionou nas Facturas emitidas, atendendo a que desconhecemos onde e como é exercida a actividade e não nos tendo sido exibidos quaisquer elementos da contabilidade, cabe-nos informar V.ªs Excias, que irá ser proposta a sua cessação oficiosa nos termos do n.º 6 do art.º 8.º do CIRC, e comunicada à conservatória para os efeitos consignados no art.º 83.º do CPPT, sem prejuízo das correcções que se impõem efectuar em termos de IRC e IVA.»

Face ao elevado n.º, e valores, de Facturas emitidas pelo SP A.......... em contraste com a falta de estrutura empresarial demonstrada pelos motivos já referidos, entende-se existirem fortes indícios da falta de veracidade dos serviços facturados, e mercadorias vendidas, pelo SP.

Ao emitir as Facturas em causa o SP A.......... incorreu numa conduta ilegítima, enquadrável em crime de Fraude Fiscal por negócio simulado e ocultação, previsto e punível pela alínea b) e c) do n.º 1 do artigo 103.º do RGIT.

Isto implica que não se possa deduzir o imposto (IVA), mencionado nas Facturas emitidas pelo SP A.........., uma vez que o n.º 4 do artigo 19.º do CIVA estabelece que: «Não poderá ... deduzir-se o imposto que resulte de operações em que o transmitente dos bens ou prestador dos serviços não entregar nos cofres do Estado o imposto liquidado quando o sujeito passivo tenha ou devesse ter conhecimento de que o transmitente dos bens ou prestador dos serviços não dispõe de adequada estrutura empresarial susceptível de exercer a actividade declarada» Refira-se que o n.º 3 do artigo 19.º do CIVA impõe que: «Não poderá deduzir-se Imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da factura ou documento equivalente».

Ora face às relações especiais existentes entre as duas empresas, B..... como adquirente e A.......... como transmitente, com o grau de parentesco dos sócios-gerentes (Pais e Filho), todos com o mesmo domicílio fiscal, o adquirente deveria ter conhecimento que o transmitente não possuía estrutura empresarial susceptível de exercer a actividade. Mais ainda pelo facto de a quantidade facturas, e a quantia mencionada em cada uma, conduzir a um volume de negócios anual muitíssimo elevado.

Face aos indícios recolhidos perspectiva-se que a B..... perpetrou Crime Fiscal de Fraude ao contabilizar na sua escrita, e deduzir nas DP's, o IVA incluído em facturas emitidas pela A.......... que correspondem a operações fictícias nos exercícios de 2009 e 2010 e nos dois primeiros trimestres do ano fiscal de 2011, sendo uma conduta ilegítima que visou a não entrega da prestação tributária, obtendo por essa via vantagens patrimoniais indevidas em sede deste imposto no montante de € 373.309,44, assim repartido:

As Facturas em causa (Anexo n.º 2), e o IVA deduzido, indevidamente pelo SP B..... são as que constam dos quadros seguintes.

Exercício de 2009:

Factura N.ºDataTrimestreDescriçãoB. TributávelIVA
03-05-20090906TMadeira de Eucalipto€ 30.200,00€ 6.040,00
04-05-20090906TRolos de Eucalipto€ 15.935,47€ 3.187,09
08-05-20090906TRolos de Eucalipto€ 7.276,63€ 1.455,33
18-05-20090906TRolos de Eucalipto€ 14.304,90€ 2.860,98
26-05-20090906TRolos de Eucalipto€ 14.181,08€ 2.836,22
12-06-20090906TRolos de Eucalipto€ 17.030,99€ 3.406,20
12-06-20090906TRolos de Eucalipto€ 17.921,49€ 3.584,30
28-06-20090906TRolos de Eucalipto€ 20.795,21€ 4.159,04
                      0906T Total
€ 137.645,77€ 27.529,16
09-08-20090909TRolos de Eucalipto€ 11.896,04€ 4.379,11
21-08-20090909TRolos de Eucalipto€ 19.954,49€ 3.990,90
28-08-20090909TRolos de Eucalipto€ 11.215,48€ 2.243,10
31-08-20090909TRolos de Eucalipto€ 5,439,SO€ 1.087,90
10-09-10090909TRolos de Eucalipto€ 6.453,17€ 1.290,63
25-09-20090909TRolos de Eucalipto€ 10.482,05€ 2.096,41
27-09-20090909TRolos de Eucalipto€ 8.592,00€ 1.718,40
27-09-200909091Rolos de Eucalipto€ 1.548,72€ 309,74
0909TTotal€ 85.531,45€ 17.116,29
02~10-20090912TRolos de Eucalipto€ 12.976,03€ 2.595,21
02-10-20090912TCorte, Rechega e Transporte€ 3.065,91€ 613,18
14-10-20090912TMadeira de Eucalipto€ 5.422,51€ 1.084,50
15·10-20090912TRolos de Eucalipto€ 3.690,00€ 738,00
19-10-Z0090912TRolos de Eucalipto€ 3.336,00€ 667,20
03·11-20090912TRolos de Eucalipto€ 6.426,50€ 1.385,30
06-11-20090912TRolos de Eucalipto€ 8.135,00€ 1.627,00
15-11-20090912TRolos de Eucalipto€ 13.642,00€ 2.728,40
24-10-20090912TRolos de Eucalipto€ 6.180,00€ 1.236,00
26-10-20090912TRolos de Eucalipto€ 4.171,00€ 834,20
20-11-20090912TRolos de Eucalipto€ 10.015,09€ 2.003,02
02-12-20090912TRolos de Eucalipto€ 4.430,50€ 885,10
04-12-200909121Rolos de Eucalipto€ 8.897,50€ 1.779,50
11-12-200909121Rolos de Eucalipto€ 7.701,00€ 1.540,20
12-11-200909121Raros de Eucalipto€ 7.799,07€ 1.559,81
15-12-20090912TRolos de Eucalipto€ 5.450,50€ 1.290,10
15-12-20090912TRolos de Eucalipto€ 4.239,00€ 847,80
15-12-200909121Rolos de Eucalipto€ 7.789,50€ 1.557,90
18-12-200909121Rolos de Eucalipto€ 4.030,50€ 806,10
22-12-20090912TRolos de Eucalipto€ 6.024,00€ 1.204 80
22-12-20090912TRolos de Eucalipto€ 29.847,12€ 5.969,42
23-12-20090912TRolos de Eucalipto€ 2.174,50€ 434,90
31-12-200909121Rolos de Eucalipto€ 3.998,00€ 799,60
0912T Total€ 170.441,2€ 34.188,24
Total do exercício de 2009€ 393.668,45€ 78.833,69
III.1.1.2. Observação referentes às Facturas dos quatro emitentes (fornecedores)

A última factura emitida pela A.........., a favor do SP em análise, foi em 2011-05-10. A primeira factura emitida pela C.........., a favor do SP em análise, foi em 2011-05-09. A primeira factura emitida pela C.........., a favor do SP em análise, foi em 2011-05-30.

As Facturas emitidas pela A.......... referem-se a um período inferior a um mês, Dezembro de 2011.

III.1.2. Fraude Qualificada em sede de IRC exercício de 2009, 2010 e 2011 - Custos ou Gastos indevidos

(…)

III.1.3. Vantagem Patrimonial Indevida / Fraude Fiscal / Artigo 103.º e 104.º do RGIT

As correcções propostas e descritas nos pontos III.1.1.1 e III.1.2. resumem-se nos seguintes quadros: Em sede de IVA por período de imposto e IRC por Exercício.

Em sede de IVA:

TrimestreIVA deduzido indevidamente
0906T Total€ 27.529,16
0909T Total€ 17.116,29
0912T Total€ 34.188,24
Total de 2009€ 78.833,69
(…)

Em resumo, do referido nos pontos III.1.1. e III.1.2., a celebração de negócio simulado com a utilização, na contabilidade e Declarações Tributárias, de Facturas fictícias origina a diminuição do IVA a entregar ao Estado bem como um aumento indevido de custos e consequente diminuição do Lucro Tributável e IRC a pagar, condutas que constituem infracções, aos artigos 19.º, 20.º e 27.º do CIVA e artigos 15.º, 17.º e 23.º do CIRC, integrando o conceito de crime de Fraude, previsto no artigo 103.º do RGIT com o seguinte enunciado: «as condutas ilegítimas», «que visem a não liquidação, entrega ou pagamento da prestação tributária ou a obtenção indevida de beneficias fiscais, reembolsos ou outras vantagens patrimoniais susceptíveis de causarem diminuição das receitas tributárias». A fraude fiscal terá lugar entre outros por: «Celebração de negócio simulado, quer quanto ao valor, quer quanto à natureza, quer por interposição, omissão ou substituição de pessoas».

(…)

IV. Motivos e exposição dos factos que implicam o recurso a Métodos Indirectos

(…)

IX. Direito de Audição - Fundamentação

(…)

Concluindo: os argumentos invocados pelo SP em nada alteram as correcções propostas, nem indícios detectadas para efeitos de responsabilidade criminal, descritas no projecto de relatório.

Portanto e em face do exposto, são, em nossa opinião, de manter no relatório final de inspecção, as correcções efectuadas ao sujeito passivo nos exercícios de 2009, 2010 e 2011 e que já constavam do projecto de relatório de inspecção enviado. (…).”. - (cfr. processo instrutor apenso).

B) Com data de 05-09-2012, os Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Leiria, remeteram à impugnante o oficio n.º ..... de notificação do relatório do procedimento inspetivo identificado na alínea antecedente. – (cfr. fls. 32 dos autos).

C) Com data de 13-10-2012 a Autoridade Tributária e Aduaneira emitiu em nome da Impugnante as liquidações oficiosas de IVA dos períodos de 06-09, 09-09 e 12-09 e dos respetivos juros compensatórios no montante total de € 87.423,87. – (cfr fls. 102 a 105 do processo administrativo apenso).

D) Em 09-04-2013 a ora Impugnante apresentou no Serviço de Finanças de Caldas da Rainha reclamação graciosa da liquidação adicional de IVA e respetivos juros compensatórios do ano de 2009, no valor de € 87.423,87, alegando, em síntese, a inexistência de qualquer negócio simulado, que as empresas em causa estavam registadas em sede de IVA e IRC, ausência de culpa quanto ao comportamento declarativo e de pagamento dessas empresas e que a exclusão das compras conduziria a uma rentabilidade fiscal irreal, requerendo a sua anulação. – (cfr. fls. 2 a 6 do processo de reclamação graciosa n.º .......... apenso).

E) Em 13.05.2013, a Direção de Finanças de Leiria elaborou Informação, onde consta, na parte que relava, o seguinte:

“(…) 3. Em resumo

3.1. A análise dos documentos juntos com a presente reclamação evidencia que se trata de documentos da contabilidade, balancetes e extractos e documentos que provam as vendas da reclamante para os seus clientes, por exemplo fotocópias de guias de entrada de madeiras na P.......... ou C....., facturas do s.p. emitidas aos clientes e pagamentos feitos a essas empresas de celulose e não guias de transporte do fornecedor para a cliente reclamante.

3.2. Estes documentos agora juntos, não são novos e nada acrescentam no sentido de provar a veracidade das operações, pois referem-se à relação comercial entre a reclamante e as celuloses, quando o que foi considerado como falso, foram as faturas emitidas pelos quatro transmitentes fictícios a favor do s.p. reclamante.

3.3. A reclamante em sede de reclamação graciosa, não apresentou qualquer tipo de prova que contrarie as conclusões da Inspeção Tributária, limitando-se a insistir na prova das suas transmissões para os clientes empresas de celulose, quando o que lhe competia era provar que as suas compras aos referidos fornecedores, foram reais, ou que estes têm capacidade empresarial para terem levado a cabo aquelas vendas, ou juntando documentos que completassem as faturas através de guias de transporte ou guias de remessa do fornecedor para a reclamante, por exemplo.

3.4. Nunca estiveram em causa as transmissões comerciais da reclamante para com os seus clientes, empresas de celulose, pois o negócio simulado refere-se às relações comerciais existentes entre a reclamante e quatro dos seus fornecedores considerados fictícios, pois ficou demonstrado que não apresentam qualquer estrutura empresarial suscetível de suportar aquele volume de negócios. (…).”.

- (cfr. informação de fls. 129 a 135 do processo de reclamação graciosa apenso).

F) Em 01-07-2013, o Chefe de Divisão de Justiça Tributária da Direção de Finanças de Leiria proferiu decisão final de indeferimento da reclamação graciosa, com fundamento na informação referida na alínea antecedente. – (cfr. fls. 140 do processo de reclamação graciosa apenso).

G) Na mesma data a Direção de Finanças de Leiria remeteu ao mandatário da Impugnante o oficio n.º ..... de notificação da decisão mencionada na alínea anterior, rececionado em 05-07- 2013. – (cfr. fls. 143 a 145 do processo de reclamação graciosa apenso).

H) Em 26-07-2013, a Impugnante apresentou na Direção de Finanças de Leiria recurso hierárquico da decisão de indeferimento da reclamação graciosa, invocando, em síntese, que as operações em causa foram realizadas, que as empresas em causa estavam registadas em sede de IVA e IRC, a ausência de culpa quanto ao comportamento declarativo e de pagamento dessas empresas e que a exclusão das compras conduziria a uma rentabilidade fiscal que não existe em qualquer sector de atividade, requerendo, a final, a anulação da liquidação de IVA do ano de 2009.

– (cfr. fls. 2 a 9 do recurso hierárquico n.º .........., em apenso).

I) Em 26-02-2014, o Subdiretor Geral da Direção de Serviços do IVA proferiu decisão de indeferimento do recurso hierárquico apresentado pela Impugnante, com os seguintes fundamentos:

“(…) IV.2 – APRECIAÇÃO DO RECURSO HIERÁRQUICO

15. A recorrente não traz novos elementos ao processo, para além dos já apresentados em sede de reclamação graciosa, ou ainda anteriormente, no âmbito do exercício de direito de audição sobre o projeto de relatório final.

16. Não poderemos, no entanto, deixar de tecer alguns considerandos, sobre as questões que entendemos como sendo as mais pertinentes.

17. Relativamente à fundamentação subjacente às correções que originaram as LA’s controvertidas, as questões a apreciar e a decidir são:

> A de avaliar, se os SIT recolheram indícios suficientes da falta de veracidade das vendas e serviços prestados constantes daquelas faturas, de forma a justificar a desconsideração da dedução do IVA nelas mencionado; e

> Se a recorrente logrou demonstrar a veracidade das operações.

Porque, de acordo com o estipulado no art.º 74.º n.º 1 da LGT: “O ónus da prova dos factos constitutivos dos direitos da administração fiscal ou dos contribuintes recai sobre quem os invoque”, sendo assim repartido o ónus da prova entre a AT e os contribuintes.

18. Com efeito, à AT cabe o ónus da prova da verificação dos respetivos indícios, ou seja, dos pressupostos legais da sua atuação, e à recorrente compete provar a existência dos factos tributários em que se fundou a dedução efetuada.

19. Aliás, é vasto o entendimento jurisprudencial sobre as questões em apreço, de que é exemplo o Acórdão do STA, proferido no Processo n.º 1026/02 de 2003.05.04, cujo sumário se transcreve:

“Tendo a Administração Fiscal, por considerar não se terem efetivamente realizado as operações consubstanciadas em determinadas faturas, existentes na escrita do contribuinte, obstado à dedução do IVA que daquelas faturas consta, ao abrigo do disposto no artigo 19º nº 3 do CIVA, cabe ao contribuinte, no processo em que impugne a atuação da Administração, a prova dos pressupostos de que depende o seu direito àquela dedução.“

20. Também a jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), se tem pronunciado no mesmo sentido, sobre esta matéria da fraude fiscal, nomeadamente o Acórdão de 2006.01.12, Processos C-354/03, C-355/03 e C-484/03 e o Acórdão Kittel, proferido em 2006.06.06, nos processos apensos C-439/04 e C-440/04, do qual se destacam os seguintes pontos:

“56. Um sujeito passivo que sabia ou devia saber que, com a sua aquisição, participava numa operação que fazia parte de uma fraude ao IVA, deve, para efeitos de Sexta Diretiva, ser considerada participante nessa fraude, isto independentemente da questão de saber se retira ou não benefícios da revenda dos bens.


59. Incumbe ao órgão jurisdicional nacional recusar o benefício do direito à dedução se se demonstrar, perante elementos objetivos, que o sujeito passivo sabia ou devia saber que, com a sua aquisição participava numa operação que fazia parte de uma fraude ao IVA, ainda que a operação em causa preencha os critérios objetivos em que se baseiam os conceitos.”

21. No caso sob apreço, a AT atuou, baseada na convicção de que as transações que as faturas em causa titulam não se realizaram, dado o vasto conjunto de indícios reunidos, junto do seu emitente.

22. Indícios que se encontram sobejamente explanados no relatório de inspeção, destacando-se os seguintes, como sendo os mais relevantes para a formação daquele juízo:

> Falta de declaração e subsequente falta de entrega do IVA liquidado nas faturas emitidas à recorrente;

> Ausência de estrutura empresarial deste fornecedor para o exercício da atividade declarada, pois, conforme consta do relatório de inspeção tributária levada a efeito junto deste sujeito passivo, foram constatados factos (como a ausência de instalações, falta de equipamentos específicos, falta de pessoal qualificado para a execução dessas tarefas, nenhuma capacidade financeira, inexistência de compras) que constituem indícios credíveis e sérios da falta de materialidade das operações económicas subjacentes às faturas por ele emitidas;

> Indícios de conluio entre este e a recorrente. Trata-se de sujeitos passivos cujos órgãos societários são detidos por pessoas da mesma família com o mesmo domicílio fiscal;

> A gerência de “A.......... Lda”, é exercida por familiar muito próximo “dos sócios gerentes da recorrente, pelo que tinha, ou devia ter, conhecimento que aquele não possuía estrutura empresarial capaz de suportar o volume de negócios apresentado. Facto que, por si só, nos termos do art.º 19.º, n.º 4 do CIVA e da jurisprudência do TJUE supra identificada, constitui fundamento para que a recorrente não possa deduzir o IVA;

> Por outro lado, o facto admitido pela sócia gerente de ter sido ela a responsável pelo preenchimento da quase totalidade das faturas emitidas por este fornecedor “fictício” é revelador da participação voluntária da recorrente no esquema que visou obter vantagens ilegítimas em sede de IVA.

23. Donde, face aos indícios recolhidos pelos SIT, competia à recorrente demonstrar que tais faturas correspondem a transações verdadeiras, e assim legitimar o direito à dedução do IVA nelas mencionado.

24. No entanto, limitou-se a relatar o modus operandi das relações comerciais com o seu fornecedor e clientes, exibindo documentos da contabilidade (balancetes, contas correntes de clientes e de fornecedores, documentos comprovativos das vendas, guias de entrada de madeiras nas instalações dos clientes, faturas de venda e comprovativos dos recebimentos das vendas e dos pagamentos das compras), com o objetivo de demonstrar que as compras a montante àquele fornecedor estavam justificadas pelas vendas realizadas a jusante.

25. Das alegações e dos elementos de prova apresentados, constata-se, que foi desenvolvido um esforço concertado no sentido de serem cumpridas as formalidades inerentes ao negócio em causa, designadamente quanto aos documentos de compra (faturas), meios de pagamento (cheques emitidos), etc.

26. Contudo a “legalidade formal” é apenas aparente, porquanto existe uma falsa representação da realidade consubstanciada num ilusório formalismo.

27. No que concerne à força probatória dos documentos de pagamento das faturas de aquisição, ela é questionável, porquanto, constitui atuação típica, característica comum dos casos já averiguados e em que se concluiu que houve utilização de “faturas falsas” com a intervenção dos chamados “emitentes” e “utilizadores de faturas falsas”, existindo um circuito documental com o intuito de dar consistência às compras simuladas, ocorrendo, paralelamente, no sistema financeiro uma série de movimentos bancários destinados a credibilizar as operações económicas. O que, no caso sob análise, ainda se revela mais duvidoso devido às relações familiares muito próximas existentes entre os sócios gerentes da recorrente e do fornecedor.

28. A recorrente pretendeu fazer prova da materialidade subjacente às faturas de compras, juntando documentos comprovativos das suas vendas, e não das suas compras.

29. No entanto, os indícios recolhidos junto do emitente dessas faturas vão no sentido da falta de veracidade das mesmas, donde, cabia-lhe comprovar documentalmente a sua efetividade, exibindo, nomeadamente, guias de remessa/transporte, que fornecessem informação acerca da origem e destino do transporte da madeira adquirida, bem como a identificação das viaturas onde foi feito o transporte.

30. Isto é, faltam meios de prova complementares à contabilidade, cuja não exibição já tinha sido questionada em sede de reclamação graciosa, e que a recorrente não supriu, de forma a justificar o direito à dedução de imposto.

31. Verifica-se, então, que não foi cumprindo o ónus que impendia sobre a recorrente, do que resulta a falta de legitimação do direito à dedução do IVA, nos termos dos n.ºs 3 e 4 do art.º 19.º do CIVA.

32. Por outro lado é manifestamente errado o raciocínio desenvolvido pela recorrente de que a exclusão do IVA deduzido nas compras deve ser acompanhado pela exclusão do IVA liquidado nas suas vendas, uma vez que, a factualidade que esteve subjacente às correções foi a falta de correspondência real das operações económicas realizadas a montante da sua atividade, da qual, correspondência real das operações económicas realizadas a montante da sua atividade, da qual, tinha ou devia ter consciência clara da ilicitude da sua atuação como participante e cúmplice da mesma, independentemente de retirar ou não benefícios da revenda dos bens.

33. Concluindo, face aos indícios, fortes, recolhidos pelos SIT, de que foi montado um circuito de operações com o único objetivo de criar artificialmente o direito à dedução de IVA, e não tendo sido demonstrada a veracidade das operações económicas que as faturas emitidas por aquele sujeito passivo titulam, deverá manter-se o entendimento de que o IVA nelas mencionado não confere o direito à dedução, nos termos dos n.ºs 3 e 4 do art.º 19.º do CIVA.

34. Quanto à prova testemunhal, arrolada pela recorrente, nos termos da alínea e) do art.º 69.º do CPPT, esta por si só desacompanhada de outros elementos de prova, designadamente documentais, dificilmente poderia servir para convencer da realidade das operações.

V – DIREITO DE AUDIÇÃO

35. No recurso hierárquico a recorrente não trouxe factos novos, suscetíveis de alterar a decisão final já firmada em sede de reclamação graciosa.

36. Por outro lado, verifica-se que já lhe foi facultado o direito de participação na formação da decisão sobre o processo em curso, no âmbito do projeto de relatório final da ação de inspeção e em sede de reclamação graciosa.

37. Assim e tendo em consideração o disposto no n.º 3 do art.º 60.º da LGT e as instruções sobre o direito de audição, veiculadas através da Circular n.º 13 de 08.07.1999, da Direção de Serviços de Justiça Tributária, nomeadamente nas suas alíneas a) e c) do ponto 3, entendemos ser de dispensar audição à recorrente.

VI – CONCLUSÃO

38. Atendendo ao exposto, somos de parecer que o recurso hierárquico em apreço deve ser indeferido.

(…).”. – (cfr. fls. 102 a 108 do recurso hierárquico apenso).

J) Em 05-09-2014 a Direção de Finanças de Leiria remeteu ao mandatário da Impugnante o oficio n.º ..... de notificação da decisão mencionada na alínea anterior, rececionado em 09-09- 2014. – (cfr. fls. 110 a 112 do recurso hierárquico apenso).

K) Em 09-12-2014 deu entrada neste TAF a petição inicial da presente impugnação judicial. – (cfr. fls. 1 dos autos).

Encontra-se ainda provado que:

L) Em 2009, a Impugnante detinha um contrato de fornecimento com a empresa de celulose P.........., da qual recebia prémios em função das quantidades de fornecimento de madeira efetuadas. - (facto alegado nos artigos 37.º e 60.º da p. i. e não controvertido).

M) No exercício da sua atividade de comércio de madeiras destinadas às empresas de celulose, a Impugnante compra eucaliptais e pinhais que abate, corta, desbasta, rechega e transporta para os parques das empresas de celulose, suas clientes. - (facto alegado nos artigos 28.º da p. i. e não controvertido).

N) Não possuindo meios humanos e materiais suficientes para o cumprimento dos contratos de fornecimento celebrados com as empresas de celulose, a Impugnante subcontrata a terceiros o abate, corte, desbaste, rechega e transporte para os parques das empresas de celulose suas clientes. - (facto alegado no artigo 29.º da p. i. e não controvertido).

O) Em 2009, o volume de negócios celebrados diretamente pela Impugnante no exercício da atividade que constitui o seu objeto social ascendeu a € 236.164,94, que corresponde a 5.114,81 m3 de madeira. - (facto alegado no artigo 30.º da p. i. e não controvertido).

P) Do volume de negócios da impugnante do ano de 2009, faz parte a quantia de € 2.319.364,68, que corresponde a 52.462,33 m3 de madeira que diz respeito a madeira de eucaliptais e pinhais comprados pelos seus fornecedores e à custa deles abatidos, cortados, desbastados, rechegados e transportados para os parques das celuloses suas clientes, respeitando às seguintes empresas:


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- (facto alegado no art.º 34.º da p. i. e não controvertido).

Q) Os fornecedores da Impugnante suportam o custo de compra de madeira e os encargos relacionados com o abate, corte, desbaste, rechega e transporte de madeira até às empresas de celulose. - (facto alegado no artigo 42.º da p. i. e não controvertido).

R) Quinzenalmente, as empresas de celulose emitem em nome da Impugnante um documento denominado “espelho”, com a identificação da data da entrega, local de entrega, guia de entrada na fábrica, guia de remessa, código do fornecedor, quantidade de madeira fornecida, valor de venda e respetivo IVA. – (facto alegado no art.º 51.º da p. i. e confirmado pelos docs. de fls. 149 e 150 e 209 e 210 dos autos).

S) Com base no “espelho” mencionado na alínea antecedente, a Impugnante emitia as faturas às empresas de celulose que, por sua vez, procedia ao seu pagamento. - (facto alegado no artigo 57.º da p. i. e não controvertido).

T) A Impugnante elaborou os mapas constantes a fls. 124 a 136, identificando a data e local de entrega, guias de fábrica, guia de transporte, matrícula da viatura, código de fornecedor, quantidade de madeira em m3, espécie, valor de venda e IVA. - (cfr. docs. de fls. 124 a 136 dos autos ).

U) A propriedade do veículo automóvel marca Scania, com a matrícula ..-..-.., encontrou- se registada a favor de A.......... a partir de 03-11-1995, a favor de A.........., Lda. a partir de 11-08-2010 e a favor de C.......... a partir de 10-11- 2011. – (cfr. fls. 318 dos autos).

V) A propriedade do veículo automóvel marca Renault, com a matrícula ..-..-.., encontrou- se registada a favor de T.........., Lda. a partir de 02-10-2002 até 23- 01-2012. – (cfr. fls. 318-v dos autos).

W) A propriedade do veículo automóvel marca Fiat, com a matrícula ..-..-.., encontra-se registada a favor de Justino .......... desde 28-06-1999. – (cfr. fls. 319 dos autos).

X) No ano de 2009, Luís .......... tinha inscrito no respetivo registo automóvel, em regime de locação financeira, o veículo marca Renault, matrícula ..-..-... - (cfr. fls. 319-v dos autos).

Y) A propriedade do veículo automóvel marca Volvo, com a matrícula ..-..-.., encontrou-se registada a favor de P.........., Lda. a partir de 23-01- 2009 e a favor de T.......... Lda. a partir de 08-10-2009. – (cfr. fls. 320 dos autos).

Z) Durante o ano de 2009 a propriedade do veículo automóvel marca Renault, com a matrícula ..-..-.. encontrou-se registada a favor de B.........., S.A.. – (cfr. fls. 320-v dos autos).

AA) A propriedade do veículo automóvel marca Renault, com a matrícula ..-..-.. encontra-se registada a favor de Carlos .......... a partir de 23-10-2008. – (cfr. fls. 321 dos autos).

BB) A propriedade do veículo automóvel marca Renault, com a matrícula ..-..-.. encontra- se registada a partir de 02-02-2009 em nome de T.........., Lda.. – (cfr. fls. 321-v dos autos).

CC) A propriedade do veículo automóvel marca Scania, com a matrícula ..-..-.. encontra-se registada a favor da ora Impugnante a partir de 16-07-2009. – (cfr. fls. 503 dos autos).

DD) A propriedade do veículo automóvel marca Scania, com a matrícula ..-..-.., encontrou- se registada a favor de Abílio .......... a partir de 17-10-1995 e a favor de M.........., Lda. a partir de 13-01-2014. – (cfr. fls. 505 dos autos).

EE) A propriedade do veículo automóvel marca Scania, com a matrícula ..-..-.., encontrou-se registada a favor de A.........., Lda. a partir de 24-09-2009 e a favor de S.......... Lda. a partir de 23-05-2011. – (cfr. fls. 322 dos autos).

FF) A propriedade do veículo automóvel marca MAN, com a matrícula ..-..-.., encontra-se registada a favor de T.........., Lda. a partir de 08-07-2004. – (cfr. fls. 322-v dos autos).

GG) No ano e 2009 a propriedade do veículo marca Scania, com a matricula ..-..-.., encontrava-se registada em nome de Auto T.........., Lda.. – (cfr. fls. 324 dos autos).

HH) A propriedade do veículo automóvel marca Scania, com a matrícula ..-..-.., encontra-se registada a favor de C.........., Lda. desde 30-04-2004. – (cfr. fls. 324-v dos autos).

II) A propriedade do veículo automóvel marca DAF, com a matrícula ..-..-.., encontra-se registada a favor de C.........., Lda. desde 29-06-2007. – (cfr. fls. 324-v dos autos).

JJ) Com data de 22-05-2015 o Revisor Oficial de Contas Luis .......... elaborou um relatório de auditoria às compras de madeira da ora Impugnante nos anos de 2009 a 2011 onde consta, designadamente, o seguinte:

“(…) Foi-nos solicitado que procedesse-mos a uma auditoria à B.......... relativamente aos exercícios de 2009, 2010 e 201, tendo nomeadamente como objetivo:

a) Determinação da origem das aquisições de madeira destinadas aos clientes da empresa com contratos de fornecimento;

b) Verificação da existência de fluxos financeiros para pagamento da madeira adquirida;

c) Verificação da existência ou não de tratamento diferenciado relativamente aos fornecedores: C..........; C.........., A.......... e A.......... face ao padrão de funcionamento da empresa e considerando as condições de fornecimento de todos os restantes fornecedores.

2- Negócio

A B.......... tem como actividade o comércio de madeiras destinadas às empresas de celulose. Para o efeito adquire árvores ainda em pé que abate, corta, desbasta, rechega e transporta para os parques das celuloses suas clientes.

Uma vez que a empresa poucos meios possui para esta actividade, subcontrata estes serviços a entidades várias.

Para o negócio é crítica a quantidade de madeira fornecida uma vez que necessitando as celuloses de enormes quantidades de madeira para o seu funcionamento, favorecem os fornecedores com capacidade para entrega de grandes quantidades remunerando também em função dessas quantidades.

Assim, as celuloses pagam ao preço de mercado diferenciando a madeira que vem com casca (mais barata) da que vem sem casca e, atribuem um rappel em função das quantidades fornecidas.

Para facilitar a capacidade de angariação de madeira as celuloses chegavam a proceder a adiantamentos de forma a aumentar a capacidade da B.......... em adquirir madeira junto de outros intermediários.

A B.........., na posse destes contratos de fornecimento, tinha assim como estratégia de negócio a intermediação do fornecimento de madeira para o que adquiria a fornecedores diversos pagando ao mesmo preço porque vendia às celuloses havendo ainda casos em que comprava ligeiramente acima do valor de venda uma vez que iria ser compensada com o rappel.

Na maior parte dos casos as situações (residuais), de compra inicial a preços superiores aos da venda acabavam por ser ajustadas por renegociação do preço junto das celuloses suas clientes que aceitavam pagar um acréscimo de preço de forma a que a margem fosse no mínimo nula.

Em resumo, sendo o principal negócio da empresa o rappel anual, a B.......... privilegiava os fornecedores com capacidade para adquirirem madeira aos agricultores/proprietários e que entregassem a madeira directamente nos parques das celuloses ao abrigo do seu contrato de fornecimento.

As entregas de madeira nas celuloses são controladas por um mapa quinzenal com indicação das gulas de entrada do cliente (celuloses) guias de transporte do fornecedor, quantidades, natureza da madeira fornecida, etc.

Com base neste mapa quinzenal, chamado de “espelho” a B.......... procedia à facturação também quinzenalmente aos seus clientes com contrato (P.........., S.......... e C.....). 3- Trabalho desenvolvido

Não sendo questionável nem estando em causa a entrega às celuloses da madeira que, conforme referido era facturado quinzenalmente e paga num prazo de 30 dias, algumas vezes com recurso a adiantamentos, procedemos com base no “espelho” e em função de cada uma das entregas, à identificação do fornecedor e respectiva factura que suportavam essas entregas.

Cada um dos “espelhos”, que se anexam, estão referenciados com um número sequencial de 1 a 156 cobrindo os anos de 2009, 2010 e 2011.

Em cada “espelho” existe um resumo com o valor da venda (suportado com a respectiva factura para o cliente) sendo a quantidade vendida distribuída por fornecedor com indicação das várias facturas dos fornecedores, fazendo-se a ligação quer dos valores de aquisição quer das quantidades fornecidas.

A cada factura dos fornecedores podem corresponder várias entregas, em quinzenas diferentes e até a clientes diferentes. Contudo, foi possível referenciar todas as facturas de todos os fornecedor aos vários “espelhos” localizando-se as suas entregas ao cliente final.

Assim, tal como se verifica nos extractos anexos das contas de compras e vendas dos anos de 2009 a 2011, todas as facturas estão referenciadas com a indicação do número dos “espelhos” onde constam as entregas que justificam a factura.

As entregas de madeira proveniente das aquisições de árvores em pé adquiridas pela própria B.......... são residuais estando referendadas com o nome da própria empresa.

No resumo das aquisições por fornecedor da madeira vendida que se encontra em cada um dos espelhos, podem-se analisar as margens por factura de fornecedor sendo que, tal como referido na descrição do negócio, na maior parte não existe qualquer margem e, nas que existem foram posteriormente compensadas com facturações adicionais de acertos de preço.

Também se identificam alguns casos pontuais de erros, sem significado, como sejam:

- quantidades de entregas sem correspondência na factura, com compensação noutras facturas;

- um fornecimento sem que tenha sido registada na contabilidade essa factura (S.......... fat 68 de 4.861,37 euros);

- uma compra registada como prestação serviço (fat 139 de Carlos ..........);

- uma factura de 2010 lançada em 2011 ( M.......... n.º 65 no valor de 6.230,07 euros);

- etc.

Estes erros não são materialmente relevantes nem afectam as conclusões que se podem extrair do trabalho.

Por fim, verificámos se as aquisições tinham adequado suporte com fluxos financeiros associados à compra.

Assim, procedemos à referenciação de todas as facturas com o respectivo meio de pagamento e verificámos a sua reflexão nos extractos bancários conforme anexos com fichas por fornecedor com identificação da factura e respectivo meio de pagamento e extractos da Caixa ...........

4- Conclusões

4.1 – Para a generalidade das situações, foi possível ligar as várias entregas aos clientes com as facturas dos fornecedores intermediários.

4.2 Para a generalidade das situações foi possível obter evidência nos extractos bancários dos pagamentos das facturas dos fornecedores.

4.3 Dos 4 fornecedores: C.........., C.........., A.......... e A.........., não se verificou a existência de qualquer desvio face ao padrão existente das compras a intermediários.

Para suportar as conclusões juntamos por ano os seguintes mapas resumo:


"Texto integral no original; imagem"


(…)

Em 2009, dos 57.777,14 mts 3/ton vendidos ao cliente P.......... no valor de 2.555 mil euros foram fornecidas através da madeira adquirida pela própria B.......... 5.114,81 mts 3/ton que representam em valor de venda 9,24%, sendo a restante madeira intermediada pela B.......... adquirida a 20 fornecedores diferentes de que a empresa A.......... contribuiu com 12,64%, identificando-se relativamente a este fornecedor uma margem residual negativa de 1.016,75 euros dentro do padrão de outros fornecedores.

Relativamente a este fornecedor, tal como a todos os outros, foi possível referenciar todas as suas faturas cruzando-as com os vários “espelhos” quer em quantidades fornecidas quer quanto a valores.

O Bónus de quantidade referente ao ano de 2009 foi registado em 2010, fat n.º 28 de 15 de janeiro 2010 no avlor de 115.154,32 euros.

(…)

Por fim, no mapa abaixo consta o resumo dos pagamentos que foi possível cruzar com os extratos bancários no total do período de 2009 a 2011, sendo que nas fichas anexas por fornecedor poderão ser identificados os valores pagos por fatura e, naturalmente por ano.


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- (cfr. doc. de fls. 375 a 379 dos autos).

**


Factos não provados

Dos factos, com interesse para a decisão da causa, constantes dos presentes autos, todos objeto de análise concreta, não se provou que as faturas identificadas no relatório de inspeção tributária respeitassem a transações efetivamente realizadas pelos operadores nelas identificados.

Não se provaram quaisquer outros factos passíveis de afetar a decisão de mérito, em face das possíveis soluções de direito, e que importe registar como não provados.


**


Motivação da Decisão de Facto

A convicção do Tribunal, no que respeita aos factos provados, efetuou-se com base no exame dos documentos, não impugnados, que constam dos autos e do processo administrativo a que se refere o artigo 111.º do CPPT, dos processos de reclamação graciosa e recurso hierárquico que se encontram em apenso e respetivos documentos anexos, bem como na prova testemunhal produzida, conforme indicado em cada uma das alíneas do probatório.

No que respeita à prova testemunhal, foi ponderado o depoimento de Vítor .........., filho dos sócios-gerentes da Impugnante, que demonstrou ter um conhecimento direto dos factos alegados. No entanto, o mesmo não foi prestado com a isenção, distanciamento e clareza necessários para convencer o Tribunal da sua veracidade. Não foi prestado de forma espontânea e assertiva, escolhendo palavras e termos para responder às perguntas que lhe foram formuladas. Aliás, não é crível a afirmação de não conhecer as instalações a morada do fornecedores em causa, para mais quando se trata do próprio irmão, afirmando não ter a certeza se aquele era o sócio gerente da A.........., Lda.

Foi ponderado o depoimento de Bruno .........., operador de máquinas florestais, que afirmou ter prestado alguns serviços para a empresa A.........., sendo o sr. L..... que lhe pagava. Nada mais disse com relevo.

Foi ponderado e valorado o depoimento da testemunha Paula .........., funcionária do escritório da Impugnante desde Outubro de 2011 a Dezembro de 2013, que apesar da sua ligação profissional à impugnante, revelou credibilidade e isenção, convencendo o Tribunal da sua veracidade. Todavia, do seu depoimento não resultou a prova de qualquer facto relevante para a apreciação da causa para além dos já dados por provados.

Cumpre deixar presente que, relativamente à matéria de facto, o juiz deve basear a sua decisão, de acordo com o princípio da livre apreciação da prova, na sua íntima convicção, formada a partir do exame e avaliação que faz dos meios de prova trazidos ao processo e de acordo com a sua experiência de vida e de conhecimento das pessoas e da razão de ser das coisas [cfr. artigo 607.º do Código de Processo Civil (CPC)]. Somente quando a força probatória de certos meios se encontra pré-estabelecida na lei, designadamente quanto aos documentos autênticos, que nos termos do artigo 371.º do Código Civil, têm força probatória plena, ou quando os factos estejam plenamente provados por acordo ou confissão das partes, é que não domina na apreciação das provas produzidas este princípio da livre apreciação.

Assim, no que respeita às testemunhas arroladas pela Impugnante, um filho, outro ex- funcionário e outro com ligações profissionais à Impugnante, tratando-se de pessoas ligadas ao ramo de atividade em causa e envolvidas direta ou indiretamente nas operações faturadas e consideradas simuladas pela Autoridade Tributária, ponderada a sua ligação profissional à Impugnante e o interesse na causa, com exceção da supra referida Paula .........., conclui-se que não prestaram depoimentos dos quais se pudesse retirar o distanciamento e isenção necessários por forma a convencer o Tribunal da aderência à realidade das operações objeto de faturação, quando confrontados com os elementos documentais carreados em sede de ação inspetiva, indiciadores da falta de aderência à realidade das operações comerciais, supostamente tituladas pelas faturas. Para além disso, os seus depoimentos, na identificação concreta dos serviços faturados, foram demasiado genéricos, não sendo referidos quaisquer factos concretos quanto ao conteúdo das faturas e à prova de que houve transação de mercadorias entre as empresas que correspondesse a essas faturas e não relevando, assim, para a prova de qualquer factualidade, mormente do facto dado como não assente (artigos 341.º e 396.º do Código Civil).

Apesar dos factos poderem ser comprovados por prova testemunhal (artigo 393.º do Código Civil), os depoimentos devem revelar-se coerentes, assertivos e credíveis ao ponto de corroborarem os factos alegados pelas partes e que, no caso da Impugnante, se destinavam a contrariar fortes indícios de faturação falsa, e a demonstrar que as relações materiais subjacentes, tituladas por tais documentos, correspondiam efetivamente a transações reais.

O nível de exigibilidade da verosimilhança dos depoimentos das testemunhas nestes casos tem de ser mais exigente e detalhado porque têm de substituir a força probatória dum documento cuja validade foi colocada em causa pela AT no quadro de legalidade das suas competências.

No caso em apreço, a coerência e assertividade dos depoimentos não foi suficiente para o Tribunal poder julgar provada a matéria de facto alegada pela Impugnante, designadamente o facto dado como não provado, como se referiu, sendo certo que aqui não está em causa a venda pela Impugnante da quantidade de madeira identificada, que seguramente foi vendida às empresas de celulose, mas sim que esta tenha sido efetuada por aquele fornecedor em concreto, de acordo com o expresso nas faturas emitidas e questionadas pela AT.

Os restantes factos alegados não foram julgados provados ou não provados, por não se mostrarem controvertidos, por constituírem considerações pessoais ou conclusões de facto ou de direito ou por não terem relevância para a decisão da causa.»


***

- De Direito

Cumpre a este Tribunal decidir ambos os recursos interpostos, sendo essencial que se comece pela apreciação do recurso do despacho interlocutório que dispensou a produção da prova pericial requerida, já que a sua eventual ilegalidade é susceptível de afectar/alterar a decisão de mérito proferida na sentença recorrida, na medida em que a admissão dessa prova pode, eventualmente, permitir à impugnante provar factualidade por si alegada e com relevo para a decisão da causa.

O despacho interlocutório, proferido a fls. 112, tem, na parte que para aqui importa, o seguinte teor:

“A Impugnante, na sua petição inicial, veio requerer a realização de perícia colegial indicando, desde logo, perito a nomear e os factos sobre os quais entende dever a mesma recair.

Notificada a Fazenda Pública para se pronunciar, veio aduzir que as questões suscitadas pela impugnante e designadas com vista a serem objeto de perícia não se afigura configurar matéria suscetível de perícia.

Vejamos então.

A prova pericial revela-se necessária sempre que sobre a fonte da prova se exijam conhecimentos especiais, de natureza técnica, que o julgador não tem.

No caso em apreço, atento os vícios que vêm imputados à liquidação de IVA aqui sindicada o Tribunal não vê necessidade de realização da prova pericial requerida.

Isto porque, desde logo, o objeto da perícia pretendida pode ser plenamente alcançado mediante a produção da prova testemunhal que se encontra arrolada, bem como, por a matéria controvertida nos autos não revestir uma especial complexidade que exija do Tribunal conhecimentos de natureza técnica que não possua.

Assim, sem prejuízo das diligências probatórias que o Tribunal entender úteis à descoberta da verdade material e não se vendo necessidade, por ora, de produção da prova requerida, indefiro a realização da prova pericial.

Notifique”.

Tenhamos presente que, de acordo com o articulado inicial, a perícia colegial requerida pela Impugnante, ora Recorrente, versava o seguinte:


"Texto integral no original; imagem"


Vejamos, então.

Lançando mão do acórdão do STA, de 14/09/11, proferido no processo nº 215/11, dir-se-á que “Como se sabe, o processo judicial tributário é, pelo menos desde a Lei Geral Tributária, um processo de partes, pautado pelo princípio da legalidade, do contraditório e da igualdade de partes, devendo o tribunal decidir conforme os factos e as provas que lhe são apresentados dentro das regras processuais. E, por isso, o juiz só pode dispensar a fase de instrução dos autos «se a questão for apenas de direito ou, sendo também de facto, o processo fornecer os elementos necessários» (artigo 113.º do CPPT), devendo, caso contrário, ordenar as diligências de prova necessárias, nomeadamente a testemunhal, em conformidade com o disposto nos artigos 114.º, 115, n.º 1 e 119.º do CPPT.

Assim, embora o tribunal tenha, em princípio, de admitir todos os meios de prova que as partes ofereçam – posto que em processo tributário de impugnação são, em regra, admitidos todos os meios gerais de prova (artigo 115.º do CPPT) – pode recusar a sua produção caso exista norma legal que limite ou proíba determinado meio de prova ou julgue que as provas oferecidas são manifestamente impertinentes, inúteis ou desnecessárias.

O direito à prova no procedimento e no processo tributário existe e é objecto de uma tutela muito forte, mas não constitui um direito absoluto, pois que o legislador ordinário estabeleceu limites e indicou critérios precisos de restrição do uso de meios de prova em relação a factos determinados, como acontece com o artigo 392.º do Código Civil, onde se estabelece que “A prova por testemunhas é admitida em todos os casos em que não seja directa ou indirectamente afastada”, e com o disposto nos artigos 393.º, 394.º e 395.º desse Código, que prevêem as situações em que é inadmissível a prova testemunhal.

Em suma, compete ao juiz examinar, em cada processo judicial, se é legalmente permitida a produção dos meios de prova oferecidos pelas partes, e, no caso afirmativo, aferir da necessidade da sua produção em face das questões colocadas, sabido que instrução tem por objecto os factos controvertidos e relevantes para o exame e decisão da causa tendo em conta as várias soluções plausíveis da questão de direito”.

No caso vertente, como decorre da transcrição feita, o Mmº Juiz do Tribunal “a quo” entendeu não haver “necessidade de realização da prova pericial”, esclarecendo que “o objeto da perícia pretendida pode ser plenamente alcançado mediante a produção da prova testemunhal que se encontra arrolada, bem como, por a matéria controvertida nos autos não revestir uma especial complexidade que exija do Tribunal conhecimentos de natureza técnica que não possua”.

Vejamos.

O regime jurídico da prova pericial no âmbito do processo judicial tributário vem consagrado no artigo 116º do CPPT, estabelecendo o seu nº 1 que «Poderá haver prova pericial no processo de impugnação judicial sempre que o juiz entenda necessário o parecer de técnicos especializados”. À prova pericial prevista no artigo 116º citado aplica-se o disposto nos artigos 467º a 489º do CPC (anteriores artigos 568º a 591º) - cfr. nº4 do artigo 116.º do CPPT.

Em termos conceptuais e jurídicos a perícia é um meio de prova. A finalidade da perícia é a percepção de factos ou a sua valoração de modo a constituir prova atendível.

Conforme se refere no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 11/03/10, proferido no processo n.º 949/05.4TBOVR-AL1-8, «O perito é um auxiliar do juiz, chamado a dilucidar uma determinada questão com base na sua especial aptidão técnica e científica para essa apreciação. O juízo técnico e científico inerente à prova pericial presume-se subtraído à livre apreciação do julgador; o julgador está amarrado ao juízo pericial, sendo que sempre que dele divergir deve fundamentar esse afastamento, exigindo-se um acrescido dever de fundamentação. A perícia tem como finalidade auxiliar o julgador na percepção ou apreciação dos factos a que há-de ser aplicado o direito, sempre que sejam exigidos conhecimentos especiais que só os peritos possuem.»

A este propósito, como refere J. Lopes de Sousa, in CPPT anotado e comentado, 6ª edição, 2011, Áreas Editora, Vol. II, pág, 266, “A prova pericial tem por fim a percepção ou apreciação de factos por meio de peritos, quando sejam necessários conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, ou quando os factos, relativos a pessoas, não devam ser objecto de inspecção judicial (art. 388.º do CC). O que caracteriza a prova pericial é a possibilidade de o perito não trazer ao Tribunal apenas a percepção de factos, como nos outros meios probatórios, mas poder trazer também a apreciação ou valoração de factos, ou apenas esta. Essencial, em princípio, para que haja perícia, é que a percepção desses factos assente sobre conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, seja qual for a sua natureza (científica, técnica, artística, profissional ou de mera experiência) desses conhecimentos”.

Ora, é precisamente esta apontada exigência de conhecimentos especiais/ técnicos que o juiz não possui que aqui, como o despacho recorrido assinalou, não se verifica, pois que, efectivamente, a análise dos documentos apontados (os denominados “espelhos” ou documentos bancários comprovativos de pagamentos a uma determinada entidade) e os factos alegados (e relevantes) que daí se pretendem extrair estão ao alcance do julgador, não havendo nenhuma evidência (pelo contrário) que sejam necessários especiais conhecimentos técnicos, profissionais ou outros, que o juiz não possua.

É, pois, por esta razão – e já não pela, também, invocada susceptibilidade de um facto ser demonstrável por depoimento testemunhal, como fundamento para rejeição de um pedido de prova pericial – que se confirma o despacho recorrido.

Diga-se, ainda, que o teor das alíneas C) E) e F) do requerimento de prova transcrito extravasa claramente a matéria em discussão nos autos, pois que não estão em causa outros fornecedores que não a sociedade A.........., para além de que não se suscita qualquer questão com a margem bruta, em 2009, entre as compras aos fornecedores e as vendas aos clientes.

Em suma, da lei não decorre que o juiz esteja obrigado à realização de todas as provas que sejam requeridas pelas partes; impõe-se-lhe o dever de realizar e ordenar as correspondentes diligências que o tribunal considere, no seu livre juízo de apreciação, como úteis ao apuramento da verdade. Será, pois, “o critério do juiz que prevalece no que concerne a determinar quais as diligências que são úteis para o apuramento da verdade, sendo inevitável em tal determinação uma componente subjectiva, ligada à convicção do juiz. No entanto, a necessidade da realização das diligências pode ser controlada objectivamente, em face da sua real necessidade para o apuramento da verdade, podendo, por isso, ser apreciada em recurso a correcção da decisão de recusa de realização de qualquer diligência” – cfr. J. Lopes de Sousa, obra citada, Vol. I, pág. 180.

É neste papel de controlo e reapreciação que este TCA, chamado a pronunciar-se sobre o despacho reclamado, o mantém, pelas razões expostas.

Nega-se, pois, provimento ao recurso interposto do despacho interlocutório.


*

Avancemos, agora, para o recurso interposto da sentença proferida pelo TAF de Leiria.

Como dissemos, a ora Recorrente deduziu impugnação judicial contra a liquidação adicional de IVA (e juros compensatórios), do ano de 2009, no montante de €87.423,87.

Tal acto tributário de liquidação adicional resultou, em síntese, da concretização de correcções operadas em sede inspectiva, fundadas na seguinte conclusão extraída no RIT: “Face aos indícios recolhidos perspectiva-se que a B..... perpetrou Crime Fiscal de Fraude ao contabilizar na sua escrita, e deduzir nas DP's, o IVA incluído em facturas emitidas pela A.......... que correspondem a operações fictícias nos exercícios de 2009 e 2010 e nos dois primeiros trimestres do ano fiscal de 2011, sendo uma conduta ilegítima que visou a não entrega da prestação tributária, obtendo por essa via vantagens patrimoniais indevidas em sede deste imposto no montante de € 373.309,44, assim repartido …”.

A impugnação judicial foi - já vimos - julgada improcedente no TAF de Leiria.

Perante a discordância com o decido em 1ª instância, foi interposto o presente recurso jurisdicional, sintetizado nas conclusões acima transcritas.

Avancemos, então, entrando na análise das questões que suscitam a discordância da Recorrente relativamente ao decidido pelo TAF de Leiria, sendo certo que, em termos amplos, a Recorrente não se conforma com o entendimento segundo o qual “os factos-índice recolhidos pela AT são bastantes para considerar que as transações tituladas pelas faturas emitidas pelos fornecedores em causa não correspondem à realidade, sendo legítimo presumir que os valores constantes da contabilidade da Impugnante, titulados pelas sobreditas faturas, não refletiam, naquela parte, a sua matéria tributável real”.

A Recorrente começa por apontar à sentença diversos erros de julgamento da matéria de facto.

Vejamos em detalhe.

Entende a Recorrente que, resultando dos factos provados o modus operandi quanto à generalidade dos fornecedores da Recorrente, concretamente da conjugação das alíneas R), JJ), P) e L) a T), ter-se-á que dar como provado que também aí se inclui a empresa A.........., ou seja, que também esta sociedade actuou, no caso em análise e relativamente à Recorrente, pela forma descrita nas apontadas alíneas.

Nesta parte, remete a Recorrente para os documentos indicados nas citadas alíneas do probatório e para o depoimento de Vítor ...........

Desde já se diga que a Recorrente carece de razão naquilo que pretende.

Com efeito, os elementos que permitem dar como provados os apontados factos sobre o modus operandi do negócio de compra e venda de madeiras não permitem dar como assente que, no ano de 2009, a A.......... era um dos fornecedores da Recorrente que assim actuava. Na verdade, o facto de se aceitar que uma empresa actua de uma certa forma com os seus fornecedores não leva a que aí possamos fazer incluir todo e qualquer fornecedor/emitente de facturas, concretamente aqueles cujos fornecimentos se reputam de falsos e que, como tal, não evidenciam uma actuação materialmente relevante.

Note-se que – e isto a Recorrente parece esquecer por completo ao longo do recurso por si interposto – não está em causa o facto de a B.......... vender madeira para empresas de celulose; o que se questiona é se, em concreto, a Impugnante, em 2009, adquiriu madeira à A.........., no valor de € 393.668,45 (Iva excluído).

Improcede, assim, a pretensão correspondente ao aditamento do facto incluído na conclusão E), para a qual convergem as conclusões B) a H).

Pretende a Recorrente na conclusão O) que se dê como provado que “a empresa A.........., Lda. forneceu às fábricas de celulose a madeira, em nome e através do contrato existente em nome da Recorrente, pelo preço e quantidades constantes das suas faturas pelo preço e demais condições descritos na p.i., mais concretamente as suas faturas n.ºs 3, 5, 6, 7, 8, 9, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 41, 43 e 46”.

O mesmo é dizer, como bem se percebe, que pretende a Recorrente que passe a constar dos factos provados aquilo que na sentença consta dos factos não provados.

Na verdade, a sentença recorrida consignou o seguinte a título de “factos não provados”: “Dos factos, com interesse para a decisão da causa, constantes dos presentes autos, todos objeto de análise concreta, não se provou que as faturas identificadas no relatório de inspeção tributária respeitassem a transações efetivamente realizadas pelos operadores nelas identificados”.

A este propósito fazemos remissão para o que ficou dito no processo nº 864/14.0 BELRA, no acórdão de 07/06/18, deste TCA, relativo precisamente às mesmas facturas que aqui são questionadas, embora com reflexos no IRC do mesmo ano de 2009. Tenha-se em conta, ainda, que foi determinado o aproveitamento, nestes autos, da prova testemunhal produzida no referido processo nº 864/10 (cfr. despacho de fls. 408):

“…nenhum dos elementos documentais apontados pela recorrente (doc. n°4, junto ao requerimento entrado em juízo em 18.06.2015 e Relatório Pericial) permite a pretendida alteração. Com efeito, não obstante dos "espelhos "(identificados sob os n°5 1 e 23 do doc. n°4) constem a data, local de entrega, guias de fábrica, guias de transporte, matrícula da viatura, código de fornecedor, quantidade de madeira em m3, espécie, valor de venda e IVA o certo é que dos mesmos não é possível extrair a conclusão que os fornecimentos neles identificados foram efectivamente realizados pelo fornecedor «A.........., Lda».

Com efeito, compulsados os meios probatórios invocados pela recorrente verifica-se que viatura matrícula ..-..-.. (factura n.°s 3 e 5) tal como aquela afirma «(..) durante o ano de 2009 esteve registada em nome de A.........., Lda». Já no que respeita à factura n.° 12, da guia de transporte n.° … não consta a identificação da matrícula da viatura.

Convém ainda referir que a Administração Tributaria não questionou a quantidade de madeira entrada na P.........., mas a materialidade das operações económicas que consistem em fornecimentos à recorrente pela «A.........., Lda».

De todo o modo, compulsados os meios probatórios verifica-se ainda que viatura matrícula ..-..-.. (factura n.°s 3 e 5) tal como aquela afirma «(...) durante o ano de 2009 esteve registada em nome de A.......... , Lda». Por fim, no que respeita à factura n.° 12 , da guia de transporte n.° …, nem sequer consta a identificação da matrícula da viatura.

Ademais, convirá referir que a Administração Tributária não questionou a quantidade de madeira entrada na P.........., mas a materialidade das operações económicas que consistem em fornecimentos à recorrente pela “A.........., Lda».

Em situação idêntica ou similar à destes autos e onde, aliás, figuravam as mesmas partes com matéria factual semelhante, variando apenas os exercícios a que se reportam, veio a pronunciou-se recentemente esta Secção do TCA, no acórdão proferido no dia 17 de Maio de 2018, no processo n.° 833/14.0BELRA cuja fundamentação sufragamos sem qualquer reserva de convicção. Tendo em conta a sua proficiente fundamentação jurídica, à qual nada se nos oferece acrescentar, limitar-nos-emos a acompanhar e reproduzir, o que ai ficou dito, tendo em vista uma interpretação e aplicação uniformes do direito (artigo 8°, n.° 3, do Civil)

Escreveu-se no citado acórdão:

« (...) importando ter presente que "aqueles mapas foram elaborados pela própria Impugnante, e tendo em consideração que estamos perante correcções que assentam na consideração de que estamos perante facturas falsas é manifesto que não serão documentos internos elaborados pela própria Impugnante que poderão ter a força probatória que pretende. Está em causa a concreta materialidade de cada uma das operações que as facturas titulam, e por conseguinte, importava provar o circuito material de cada uma das operações — cfr. acórdão deste TCA de 18/04/18, processo n° 1770/14.4 BELRAJ.

Nem o depoimento da testemunha Vítor .......... tem a virtualidade de afastar o que vem dito, como refere o acórdão que vimos seguindo: « (...) o sistema que a Recorrente encontrou para controlar/ comprovar os fornecimentos de madeira às suas clientes (empresas de celulose) é manifestamente insuficiente quando daí se pretende retirar a demonstração inequívoca da origem de cada fornecimento, com autonomização detalhada por factura de compra.».

E, continua o acórdão: « (..) conjugados com as guias de entrada e com os espelhos, não permitem perceber que madeira (da fornecida às empresas de celulose) foi comprada pela Impugnante à A.........., pois que, de tais documentos, apenas se retira, com segurança, que os fornecimentos têm origem na B.........., mas já não qual o concreto fornecedor que vendeu à B.........., permitindo-lhe posteriormente fornecer as empresas de celulose.” – fim de citação.

Na verdade, o sistema que a Recorrente encontrou para controlar/ comprovar os fornecimentos de madeira às suas clientes (empresas de celulose) é manifestamente insuficiente quando daí se pretende retirar a demonstração inequívoca da origem de cada fornecimento, com autonomização detalhada por factura de compra. Com efeito, os tais mapas (cfr. alínea T) do probatório), conjugados com as guias de entrada e com os espelhos, não permitem perceber que madeira (da fornecida às empresas de celulose) foi comprada pela Impugnante à A.........., pois que, de tais documentos, apenas se retira, com segurança, que os fornecimentos têm origem na B.........., mas já não qual o concreto fornecedor que vendeu à B.........., permitindo-lhe posteriormente fornecer as empresas de celulose.

Aliás, é a própria Recorrente a afirmar que “aquando da entrada da madeira nas fábricas o respetivo documento não contém o nome da empresa que entrega efetivamente a madeira, porquanto a madeira entra como sendo fornecida pela B.........., Lda., embora entregue por terceiros” e, bem assim, que “a madeira não era enviada diretamente à Recorrente, e esta não tinha como aceder a documentação própria dos seus fornecedores, …” – cfr. conclusões L e M.

Em suma, quanto aos mapas a que se reporta a alínea T) do probatório, reitera-se a sua origem interna e a pouca (ou nenhuma) valia enquanto prova da materialidade das aquisições tituladas pelas facturas postas em causa.

Avançando no erro de julgamento da matéria de facto, constata-se a discordância da Recorrente com o facto de não ter sido dado como provado o pagamento das facturas emitidas, no ano de 2009, pela A........... Importa aqui considerar as conclusões P) a W).

Ora, compulsada a sentença, verifica-se que efectivamente a mesma não fez incluir na matéria de facto a emissão de cheques e a realização de transferências bancárias, em 2009, a favor da sociedade A.........., o que resulta dos documentos juntos aos autos pela Recorrente.

Assim sendo, isso mesmo se aditará à matéria de facto, nos termos seguintes:

LL) No ano de 2009, a impugnante realizou transferências bancárias e emitiu cheques (da Caixa ..........) à ordem da sociedade A.........., operações estas m.i na listagem junta a fls. 138 e 139 dos autos, tudo conforme extractos bancários e cópias dos cheques, doc. 12, a fls. 326 dos autos, e doc. 4, a fls. 57 e ss, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.

De todo o modo, a este propósito e sobre a prova documental oferecida pela Impugnante, e não perdendo de vista o teor das conclusões indicadas supra, quanto ao pagamento das facturas emitidas pela A.........., em 2009, há que ponderar que o simples facto de existirem meios de pagamento (cheques/ transferências bancárias) pelos valores das facturas, não nos permite concluir, sem mais, pela materialidade das transacções que as facturas titulam, sendo indispensável a ponderação concatenada com outros elementos evidenciadores da realidade das operações espelhadas nas facturas ou, ao invés, retirar consequências da circunstância (como é o caso) de inexistirem (para além dos meios de pagamento) outros elementos demonstrativos da materialidade de tais operações.

De resto, “a não ser assim, bastava aos emitentes e aos receptores de “facturas falsas” o cuidado de se prevenirem com esse documento para ficarem ao abrigo da possibilidade de a operação referida na factura vir a ser considerada como não correspondente à realidade. Manifestamente, não pode ser assim. A realidade ou não das operações referidas nas facturas há-de apurar-se em face de uma série de factos, conjugados uns com os outros e ponderados à luz das regras da experiência” – cfr. neste sentido, acórdão do TCA Norte, processo nº 2794/04, de 11/03/10.

Quanto à prova testemunhal produzida, à sua apreciação crítica e, nesta medida, ao seu alcance, deve sublinhar-se que, apesar das testemunhas arroladas pela Impugnante terem vindo corroborar a tese por esta sustentada na petição inicial, a verdade é que em nossa opinião, o fizeram sem qualquer relevância, como a sentença não deixou de concluir fundamentadamente – lê-se na decisão recorrida, além do mais, que “Assim, no que respeita às testemunhas arroladas pela Impugnante, um filho, outro ex-funcionário e outro com ligações profissionais à Impugnante, tratando-se de pessoas ligadas ao ramo de atividade em causa e envolvidas direta ou indiretamente nas operações faturadas e consideradas simuladas pela Autoridade Tributária, ponderada a sua ligação profissional à Impugnante e o interesse na causa, com exceção da supra referida Paula .........., conclui-se que não prestaram depoimentos dos quais se pudesse retirar o distanciamento e isenção necessários por forma a convencer o Tribunal da aderência à realidade das operações objeto de faturação, quando confrontados com os elementos documentais carreados em sede de ação inspetiva, indiciadores da falta de aderência à realidade das operações comerciais, supostamente tituladas pelas faturas. Para além disso, os seus depoimentos, na identificação concreta dos serviços faturados, foram demasiado genéricos, não sendo referidos quaisquer factos concretos quanto ao conteúdo das faturas e à prova de que houve transação de mercadorias entre as empresas que correspondesse a essas faturas e não relevando, assim, para a prova de qualquer factualidade, mormente do facto dado como não assente (artigos 341.º e 396.º do Código Civil)”.

Mais uma vez, importa salientar que não está em causa (nem nunca esteve) que a Recorrente forneça madeira a empresas de celulose, facto que sempre é salientado pela B.......... mas – repete-se – sem o alcance que esta daí pretende extrair. Efectivamente, não é das vendas da B.......... que aqui nos ocupamos; interessava - isso sim - demonstrar as compras que a B.......... fez à sociedade A.......... no ano de 2009.

Tal demonstração não foi feita, conforme concluiu o TAF de Leiria.

Em face do exposto, e sem prejuízo do aditamento feito à matéria de facto, improcede quanto ao demais pretendido o alegado erro de julgamento da matéria de facto.


*

Estabilizada a matéria de facto, avancemos para o erro de julgamento de direito.

Prosseguindo na análise, entramos na questão de saber se a AT podia, ou não, ter corrigido o IVA em causa, cuja dedução não foi aceite, o que passa por saber se reuniu os indícios suficientes de que as facturas em causa, emitidas pela A.........., em 2009, não titulam operações reais.

Nos presentes autos, a AT convocou o regime previsto nos artigos 19.º, n.º 3 e 4 do Código do IVA para justificar a não dedutibilidade do IVA suportado pela Impugnante, com fundamento em simulação, conclusão a que chegou com base em diversos indícios que referiu expressamente no RIT e que, desde já, se destacam:

“a) Relações especiais com a Impugnante por virtude das relações de parentesco existentes;

b) A sede de ambas as empresas ser a mesma e ser também a residência dos respectivos sócios-gerentes;

c) Falta de cumprimento das obrigações fiscais e declarativas, designadamente as declarações periódicas de IVA desde 09/12T, as declarações Modelo 22 de IRC e a declaração anual de informação contabilística e fiscal/informação empresarial simplificada desde o ano fiscal de 2009 (inclusive).

d) O TOC responsável ser o mesmo;

e) Apenas ser conhecido um fornecedor A.......... e um veículo, não se conhecendo equipamento, pessoal, guias de remessa ou faturas, guias de transporte, sede ou qualquer instalação física;

f) Além do sócio gerente Sr. Luis .........., no ano de 2009, apenas em Abril e Maio tinha 2 trabalhadores, Junho e Julho 3 trabalhadores e em Agosto e Setembro 2 trabalhadores, inscritos na Segurança Social;

g) As faturas foram emitidas pela sócia gerente da Impugnante”.

Ora, para a Recorrente, contrariamente ao que foi decidido pelo TAF de Leiria, estes “factos-índice” – que desvaloriza e/ ou contraria – não são suficientes para permitir à AT desconsiderar o IVA que tem as facturas em causa como suporte documental, com o fundamento de que as operações referidas nessas facturas são simuladas.

Vejamos o que dizer a este propósito, começando por lembrar as regras de repartição do ónus da prova a ter em conta.

Como tem sido realçado, reiterada e uniformemente, pela jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores, quando a Administração Tributária desconsidera facturas que reputa de falsas, aplicam-se as regras do ónus da prova do artigo 74.º da LGT, competindo à Administração fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, ou seja, de que existem indícios sérios de que a operação constante da factura não corresponde à realidade. Feita esta prova, passa a recair sobre o sujeito passivo o ónus da prova da veracidade da transacção – vide, entre muitos outros, os acórdãos do TCA Norte de 24-01-2008, processo n.º 01834/04 Viseu, de 24-01-2008, processo n.º 2887/04 Viseu, de 27-01-2011, processo n.º 455/05.7BEPNF e de 18-03-2011, processo n.º 456/05BEPNF.

Assim sendo, importa analisar se a AT fez a prova que lhe competia da verificação de indícios que permitem concluir que às apontadas facturas contabilizadas pela Impugnante, ora Recorrente, não subjazem as operações que, alegadamente, teriam implicado a respectiva emissão.

Tenha-se em conta, como também é aceite, que não é imperioso que a Administração efectue uma prova directa da simulação. Como em muitos outros casos, haverá que recorrer à prova indirecta, a “factos indiciantes, dos quais se procurará extrair, com o auxílio das regras de experiência comum, da ciência ou da técnica, uma ilação quanto aos factos indiciados. A conclusão ou prova não se obtém directamente, mas indirectamente, através de um juízo de relacionação normal entre o indício e o tema de prova” – cfr. Alberto Xavier, Conceito e Natureza do Acto Tributário, pág. 154; também neste sentido, entre outros, o acórdão do TCAN, de 26/04/12 (processo nº 00964/06.0 BEPRT).

Ou seja, a AT não tem que demonstrar a falsidade das facturas, bastando-lhe evidenciar a consistência desse juízo (Acórdão do STA de 27/10/04, Processo 810/04), invocando factos que traduzem uma probabilidade elevada da(s) operação(ões) referida(s) na(s) factura(s) ser(em) simuladas, probabilidade elevada capaz de abalar a presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes e dos dados constantes da sua contabilidade – artigo 75º da LGT.

Como se refere no acórdão do TCAN, de 23 de Novembro de 2012 (proc. nº 1523/05.0 BEVIS-Aveiro), “no que concerne à prova que compete à Administração – (…) - o que é imprescindível é que aquela a faça de factos suficientes indiciadores a que o Tribunal possa concluir, “em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência” (expressão de Castro Mendes citado por Saldanha Sanches), pela elevada probabilidade (ou até certeza) de que o negócio declarado por aquelas partes não corresponde à realidade materializada naquela factura”.

Nesta tarefa, poderá a Administração Tributária lançar mão de elementos obtidos com recurso à fiscalização cruzada, junto de outros contribuintes, para obter os referidos indícios, pelo que tais indicadores de falsidade das facturas não têm necessariamente que advir de elementos do próprio contribuinte fiscalizado.

Vejamos, então, não perdendo de vista o enquadramento jurídico gizado relativamente ao ónus da prova e considerando os factos apurados em sede inspectiva, com vista a dar resposta à questão de saber se, como entendido pelo TAF de Leiria, resulta dos factos considerados que a AT fez prova da verificação de indícios que lhe permitiam concluir que as facturas relativamente às quais o correspondente IVA foi desconsiderado (melhor dizendo, a dedução do IVA não foi aceite) não tiveram subjacente qualquer operação económica realizada entre a Impugnante e a A...........

Só respondendo afirmativamente a esta questão é que importa saber se a Impugnante logrou demonstrar em Tribunal que, não obstante os indícios colhidos, são reais, isto é, existiram efectivamente, tais operações económicas entre estes concretos sujeitos.

E, para nós, os apontados “factos-índice”, numa análise concatenada e ponderados à luz da experiência, são suficientes para permitir à AT desconsiderar a dedução de IVA que tem as facturas em causa como suporte documental, com o fundamento de que as operações referidas nessa factura são simuladas.

Isto mesmo foi entendido, e bem, pela sentença recorrida, em moldes que merecem a nossa inteira concordância. É o seguinte o teor da decisão recorrida, na parte que aqui importa salientar:

“Ora, foi com base neste conjunto de indícios que a AT veio a entender que as faturas emitidas à Impugnante não titulam efetivas transações por parte dos mencionados fornecedores, sendo seguro que, no seu conjunto, os mesmos são suficientes para criar a convicção de que as faturas em causa não titulam operações reais, antes se tratando de um esquema articulado visando diminuir a receita tributária.

Na verdade, os factos probatórios indiciários ou indícios são aqueles factos que «permitem concluir pela verificação ou não verificação de outros factos, em virtude de leis naturais conhecidas pelos homens e que funcionam como máximas de experiência, constituindo assim uma das categorias de factos probatórios integrados nas provas indiretas»5 .

Face aos factos-índice acima descritos é de concluir que a AT demonstrou de forma coerente e sustentada a existência de indícios de que as mercadorias constantes das faturas emitidas pelos fornecedores assinalados, registadas na contabilidade da Impugnante e desconsideradas pelos serviços de inspeção tributária não foram efetivamente fornecidos pela entidade emitente.

Por conseguinte, no caso em apreço, impõe-se concluir que os factos-índice recolhidos pela AT são bastantes para considerar que as transações tituladas pelas faturas emitidas pelos fornecedores em causa não correspondem à realidade, sendo legítimo presumir que os valores constantes da contabilidade da Impugnante, titulados pelas sobreditas faturas, não refletiam, naquela parte, a sua matéria tributável real.

Daí que, o procedimento da AT neste particular não nos mereça qualquer censura pois, nestas situações, como se disse, a administração não tem de provar a existência de qualquer simulação, mas apenas recolher indícios de que a mesma ocorreu, o que, como vimos, sucedeu, parecendo-nos clara a conclusão de que foi legítimo a não aceitação das faturas em causa”.

Como fomos adiantando, estamos de acordo com tal conclusão.

Deve lembrar-se que, no ano de 2009, a A.......... foi fornecedora da B.........., pelo valor de € 393.668,45 (IVA excluído).

Note-se que tal fornecedor se apresentou, num primeiro momento, em situação não declarante, para efeitos de IRC e IVA, sendo que, no decorrer da acção de inspecção a que foi sujeito, em 2011, acabou por apresentar as declarações em falta (IVA, IRC, DAICF/ IES).

Ora, relativamente ao exercício de 2009, a A.......... entregou as suas declarações a zero, o que se mostra em clara contradição com a contabilização das compras feitas à A.........., pela ora Recorrente, no valor de € 393.668,45. Com efeito, não é possível que a B.......... evidencie compras à A.........., em 2009, no valor de € 393.668,45, e que a A.........., nesse mesmo ano, não tenha vendas a declarar à B.......... (ou outras).

Mas mais. Os elementos colhidos no RIT sobre a falta de estrutura empresarial da A.......... são esclarecedores e não foram minimamente postos em causa pela prova produzida.

Lembre-se, a este propósito, que, tal como consta do RIT, “Ao SP em análise – leia-se, A.......... - não se conhecem outros fornecedores, que não a A.........., excepção feita ao fornecedor de um Tractor de Matrícula: ..-..-.. Marca: SCANIA, do qual se desconhece existir reboque, não se conhece equipamento específico para a execução dos trabalhos de corte, máquinas de medição de madeira em metros cúbicos e maquinaria de carga e transporte de madeira, nem pessoal qualificado para a execução dessas tarefas, nem guias de remessa, nem guias de transporte, nem se conhece morada, sede ou qualquer instalação física onde, sendo necessário, pudesse armazenar os produtos mencionados nas Facturas indiciadas como falsas”; mais consta que “verifica-se, tendo como referência (início) o mês de Janeiro de 2009, que apenas em Abril e Maio de 2009 (2 trabalhadores) Junho e Julho (3 trabalhadores) e em Agosto e Setembro (2 trabalhadores) existiram trabalhadores na A.......... além do sócio gerente Sr. Luís ..........”; e, bem assim, que “a entidade empregadora (A..........) não procedeu à entrega das declarações de remunerações desde Maio de 2010”.

Em suma, estamos perante indícios que, com elevado grau de probabilidade, permitem concluir que o alegado fornecedor (A..........) não tinha a menor capacidade empresarial para vender os elevados montantes de madeira em causa, nesse ano de 2009.

Deve salientar-se, ainda, a estranheza e inconsistência que resulta do facto de ser a sócia-
-gerente da ora Recorrente a preencher as facturas emitidas pela A.........., não se vislumbrando qualquer razão imediata para tal.

Na verdade, tal forma de proceder só encontra justificação nas relações próximas existentes entre ambas as empresas, sejam os laços familiares entre os sócios de ambas as sociedades (o sócio da A.........., Luis .........., é filho dos sócios da B..........), o facto de partilharem os domicílios fiscais e até o TOC ser comum. Desta forma de actuar, e olhando aos demais sinais evidenciados, surpreende-se alguma confusão/sobreposição entre ambas empresas em causa.

Por conseguinte, e tudo isto visto, considera este Tribunal que a AT cumpriu o ónus da prova que lhe competia para efeitos de desconsideração do IVA incluído nas facturas emitidas, em 2009, pela A...........

Com efeito, e sem necessidade de considerações muito desenvolvidas, em face da evidência resultante dos elementos recolhidos pelos serviços de inspecção e aos quais deixámos expressa referência, entendemos poder concluir que, in casu, a AT recolheu, efectivamente, indícios sérios e seguros de que as facturas emitidas pela A.........., no ano em causa, não titulam reais vendas de madeira que aquela tenha efectuado à B...........

Efectivamente, os “factos-índice” evidenciados, numa análise concatenada e ponderados à luz da experiência, são suficientes para permitir à AT não aceitar a dedução do IVA que tem as apontadas facturas como suporte documental, com o fundamento de que as operações referidas nessas facturas são simuladas. Com efeito, “não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da fatura ou documento equivalente” (19º, nº3 do CIVA).

Tais factos-índice vão, inequivocamente, no sentido de que a A.......... não dispunha de capacidade (logística/ empresarial) para a realização das operações em causa, pelo que há uma probabilidade elevada de as facturas em causa não titularem operações reais, ou seja, de que o apontado fornecedor não vendeu à Recorrente os bens nelas mencionados e por esta contabilizadas.

Porque assim é, como se entende, há que dizer que a AT demonstrou os pressupostos da sua actuação, cumprindo, nos termos já expostos, o ónus da prova que, neste ponto, lhe competia – cfr. artigo 74º da LGT

Por conseguinte, isto é, tendo a Administração cumprido o ónus que sobre si impendia, competia ao Impugnante ter apresentado prova capaz de destruir esses indícios, demonstrando que a mercadoria descrita nas facturas em causa lhe foi vendida, ou seja, que aquelas facturas têm subjacentes reais e efectivas operações económicas.

Ónus que, definitivamente, não cumpriu já que não logrou, pela prova produzida, afastar os indícios ponderosos da simulação das facturas, recolhidos pela AT, tendo, no essencial, os factos por si invocados e através dos quais visava demonstrar aquela realidade obtido, como vimos, na apreciação do erro de julgamento de facto que vinha suscitado, resposta negativa.

Portanto, e retomando o que já atrás vínhamos dizendo, era à Impugnante que competia demonstrar que, apesar de todos estes indícios, eram reais - ou seja, correspondiam a operações materiais — as compras tituladas nas facturas cujo IVA não foi aceite como dedutível.

E, como o julgamento da matéria de facto mostra à saciedade, esta demonstração não foi feita, cumprindo realçar que à Impugnante não basta criar a dúvida a esse propósito, antes lhe competindo demonstrar, através de prova positiva e concludente, a materialidade das operações tituladas nas facturas.

A prova apresentada - documental e testemunhal - revelou-se manifestamente insuficiente para nos convencer da realidade das operações a que aludem as facturas em causa, sendo que, como temos vindo a concluir em casos semelhantes àquele que aqui nos ocupa, muito dificilmente o Tribunal se poderá convencer da realidade de determinadas operações exclusivamente com base na prova testemunhal.

A esta conclusão, aliás, já havia chegado este TCA relativamente às mesmas facturas de 2009, emitidas pela A.........., embora com relevância em sede de IRC. Assim foi, de facto, no acórdão proferido em 07/06/18, no processo 864/14.0 BELRA. Sobre o mesmo RIT, embora com reflexo noutros exercícios, concretamente em 2010 e 2011, foram já emitidas pronúncias por este Tribunal Superior, em linha com o agora decidido; são disso exemplo, entre outros, os acórdãos proferidos nos processos nºs 833/14.0 BELRA, 864/14.0 BELRA, 879/14.9 BELRA e 1733/14.0 BELRA.

Face ao exposto, julgam-se improcedentes as conclusões da alegação do recurso que por último vínhamos analisando, relativamente ao suposto erro de julgamento de direito. Mantém-se, assim, na ordem jurídica a sentença recorrida.

Nega-se integral provimento ao recurso.


***


III- Decisão

Nesta conformidade, acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Tribunal Central Administrativo Sul em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.

Registe e Notifique.

Oportunamente, satisfaça o requerido no ofício de fls. 576, do DIAP.

Lisboa, 31/10/19.


Catarina Almeida e Sousa

Isabel Fernandes

Jorge Cortês