Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:1678/20.4BELSB
Secção:CA
Data do Acordão:04/27/2023
Relator:LINA COSTA
Descritores:NULIDADE DA SENTENÇA
Sumário:De acordo com o disposto na alínea c) do nº 1 do artigo 615º do CPC, só ocorre nulidade da sentença quando os respectivos fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível. O que não se verifica na situação em apreciação.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

A. V., devidamente identificada nos autos, instaurou acção de intimação para prestação de informações, consulta de processos ou passagem de certidões contra o Ministério da Justiça, SHL Portugal-P. S., S. A. D. R. H., Lda. e H. E., Lda, esta na qualidade de interveniente.

Por sentença de 6.1.2022, o Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa decidiu:
«A) Julgar extinta a instância por inutilidade superveniente quanto à Interveniente;
B) Procedente o pedido de intimação para prestação de informações e passagem de certidão, intimando as Entidades Requeridas a emitir à Requerente, em 10 dias, reprodução autenticada dos seguintes elementos:
i) quanto ao ponto 1) do seu requerimento, os enunciados dos testes relativos ao Raciocínio verbal, Raciocínio lógico e Teste de personalidade OPQ;
ii) quanto ao ponto 2) do seu requerimento:
a) as folhas de resposta dos seguintes testes:
1. Raciocínio verbal;
2. Raciocínio lógico;
3. Teste de personalidade OPQ;
b) A classificação e pontuação atribuída a cada questão objeto de avaliação relativamente aos seguintes testes:
1. Raciocínio verbal;
2. Raciocínio lógico;
3. Teste de personalidade OPQ;
4. QVS 23
iii) quanto ao ponto 3) do seu requerimento: a pontuação a atribuir a cada questão efetuada em todas as provas, bem como a indicação da resposta considerada correta às questões suscitadas ou a mais favorável em todos os exames realizados (com exceção do teste PAI);
iv) o Relatório com a fundamentação da classificação atribuída à Requerente mencionado no ponto 4. do seu requerimento.
v) A deliberação do júri que considerou a requerente não apta e/ou que determinou a sua exclusão ou a não continuação das provas relativas ao presente concurso, bem como todos os documentos que fundamentam tal decisão,
advertindo-se a mesma das cominações previstas no artigo 108.º, n.º2 do CPTA, caso se verifique incumprimento injustificado da presente intimação.».

Inconformado o Ministério da Justiça interpôs recurso jurisdicional dessa sentença.

Por acórdão deste Tribunal, de 26.1.2023, foi acordado não conhecer do recurso.

Inconformada a SHL Portugal-P. S., S. A. D. R. H., Lda. interpôs recurso de revista excepcional para o Supremo Tribunal Administrativo desse acórdão, arguindo a respectiva nulidade nos termos da alínea c) do nº 1 do artigo 615º e alínea c) do nº 1 do artigo 674º, do CPC ex vi artigo 1º do CPTA, concluindo, a propósito, o seguinte:
«a) Está assente o teor da certidão de fls. 52 a 113;
b) A referida certidão é composta, entre outros, por documentos da autoria da ora recorrente;
c) Nos referidos documentos constam expressamente elementos indicadores dos direitos de propriedade científica sobre a documentação requerida pela recorrida, isto,
d) Através da aposição de expressões e símbolos adequados.
e) A decisão de fls., dando como provada a referida matéria respeitante ao direito autoral e respectivo sigilo, mas decidindo divulgá-lo em violação de segredo científico, incorre em nulidade, por erro de julgamento,
f) Nulidade que se argui, no termos da alín. c), n.º 1 do artigo 615 e alín. c), n.º 1 do artigo 674 do CPC ex vi artigo 1 do CPTA.
(…).»

Notificada para o efeito, a Recorrida contra-alegou, concluindo que “(…)
B. O acórdão recorrido não padece da nulidade invocada pela Recorrente;».

Apreciando.

Dispõe a referida alínea c) do nº 1 do artigo 615º do CPC que a sentença é nula quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.

A Recorrente não indica nas conclusões qualquer destas situações, suportando a nulidade arguida em erro de julgamento.

Ora, as nulidades previstas no referido artigo 615º respeitam aos vícios estruturais ou intrínsecos, ou de construção da decisão, sentença ou acórdão, e não a erros de julgamento de facto e/ou de direito em que o juiz ou colectivo de juízes, possa ter incorrido. O mesmo é dizer que uma nulidade de sentença não pode ter por fundamento um erro de julgamento, na indicação dos factos provados e/ou de aplicação do direito a esses factos.

Das alegações de recurso, por sua vez, extrai-se que o acórdão recorrido, que confirma a decisão da primeira instância, deu como provado o facto “D) Dá-se por integralmente reproduzido o teor da certidão de fls. 52 a 113 do SITAF; matéria que está em manifesta contradição com a decisão porque dando como assente que os testes são propriedade científica de alguém, nunca poderia julgar procedente o pedido.

Ora, o acórdão recorrido limitou-se a reproduzir os factos considerados provados da sentença do tribunal da 1ª instância por os mesmos não terem sido impugnados no recurso interposto pelo Ministério da Justiça [significando que transitaram em julgado], e acordou em não admitir o recurso, em síntese, porque:
«(…) parte do que nele vem alegado, não configura uma reacção, um ataque ao decidido na sentença – reiterando, ainda que de forma diversa nas conclusões 1ª a 3ª, o que consta do respectivo articulado -, e a restante – em que afirma que: não pode prestar ou certificar alguns dos documentos em falta por não ser detentor dos seus direitos de autor; apesar de gerir a plataforma não pode entregar documentação que não tem na sua posse; a acta nº 16 contém apreciações globais e é o único elemento que suporta a fundamentação do júri, o único que consta do processo instrutor, o único conhecido do júri; mas foi permitido aos candidatos o acesso presencial aos resultados da avaliação psicológica; o tribunal recorrido fez errada interpretação do disposto nos artigos, que indica, do Decreto-Lei nº 204/98; o relatório encontra-se bem fundamentado, permitindo à requerente conhecer os resultados e perceber o significados dos mesmos nos vários testes, v. as conclusões 4ª a 10ª - constitui matéria nova [ou não alegada por si, mas pela 2ª Entidade requerida no que respeita à referida plataforma], que não foi invocada pelo Recorrente, enquanto entidade requerida, na acção nem apreciada pelo tribunal recorrido.».

A saber, este Tribunal não julgou procedente o pedido formulado na acção de intimação, tendo reproduzido a decisão sobre a matéria de facto e parte da de direito da sentença recorrida para melhor se perceber as razões da não admissão do recurso, inexistindo, consequentemente, a alegada contradição entre os fundamentos e a decisão proferida.

Face ao que acordamos em indeferir a arguição da nulidade imputada ao acórdão deste Tribunal, de 26.1.2023.

*
Do recurso de revista excepcional:

De acordo com o disposto nos nºs 1 e 6 do artigo 150º do CPTA, com a epígrafe “Recurso de revista”, a recorribilidade do acórdão proferido nos autos depende de estar em causa a apreciação de questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou necessidade de melhor aplicação do direito, competindo ao STA aferir se estão preenchidos os referidos pressupostos.
A intervenção deste Tribunal restringe-se à pronúncia sobre a legitimidade do recorrente e a tempestividade do recurso, bem como à fixação do respectivo regime de subida e efeito.

Assim a Recorrente tem legitimidade e está em tempo - cfr. nº 1 do artigo 141º, a parte final do nº 1 do artigo 144º e o nº 1 do artigo 147º, todos do CPTA e nº 1 do artigo 634º e alínea c) do nº 5 do artigo 139º, do CPC ex vi artigo 1º do CPTA).

O recurso é processado como o de revista em matéria cível, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito suspensivo - cfr. nºs 1 a 3 do artigo 140º, nº 1 do artigo 147º e nº 1 do artigo 143º, todos do CPTA.

Foram apresentadas contra-alegações de recurso.

Subam os autos ao Colendo STA.

Notifique.

Lisboa, 27 de Abril de 2023.

(Lina Costa – relatora)

(Catarina Vasconcelos)

(Rui Pereira)