Acórdãos TCAS

Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul
Processo:06524/13
Secção:CT
Data do Acordão:03/22/2018
Relator:ANA PINHOL
Descritores:IVA
FATURAS FALSAS
ÓNUS DA PROVA
Sumário:I. Quando a liquidação adicional de IVA tenha por fundamento o não reconhecimento do direito às deduções declaradas pelo contribuinte, compete à administração tributária fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, constantes do artigo 82º, nº 1 do CIVA.
II. Isto porque, não é a Administração Tributária que afirma um facto positivo com consequências tributárias - é o contribuinte que invoca o seu direito à dedução do IVA pago a montante. Por isso, é ele quem deve provar a verificação dos pressupostos em que assenta tal direito.
Aditamento:
1
Decisão Texto Integral:I.RELATÓRIO
A FAZENDA PÚBLICA recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que julgou procedente a impugnação judicial que a sociedade “TRANSPORTE ..., LDA”, deduziu contra os actos de liquidação adicional de IVA e respectivos juros compensatórios, dos anos de 2004 a 2007, no valor total de 286.621,81€.
Juntamente com ele, subiu o recurso que a “TRANSPORTE ..., LDA” interpôs do despacho de 09.12.2010, na parte em que desatendeu o pedido formulado na petição inicial, [ no sentido de ordenar à DF de Setúbal para vir aos autos juntar cópia integral dos processos inspectivos e findos e aí descriminados] e o recurso que a FAZENDA PÚBLICA interpôs de despacho de 21.01.2011, na parte que em que admitiu a inquirição da testemunha Mário ....

A sociedade “TRANSPORTE ..., LDA” no recurso que interpôs do despacho de 09.12.2010 fez constar no final as seguintes conclusões:
«I-A impugnante, ora recorrente, requereu, a fls. 74 da P. I. por si apresentada, que fosse ordenado à Direcção de Finanças de Setúbal faça juntar aos autos cópia integral dos processos inspectivos entretanto findos ou em curso, neste último caso no estado em que se encontrem, respeitantes aos exercícios de 2004 a 2007 e aos contribuintes R..., Lda. (NIPC ...) e C..., Lda. (NIPC ...).
II-Este pedido foi reiterado no requerimento de fls. 351 a 353.
III-Notificada para tal (fls. 356), a recorrente esclareceu, pelo seu requerimento de fls. 392 a 396, o que pretende demonstrar com os elementos requeridos.
IV-Foi proferido despacho que indeferiu o requerido pela recorrente tendo como base "nada disse"- fls. 391.
V-O despacho ora recorrido foi proferido em 09/12/2010, antes de decorrido o termo do prazo normal dos 10 dias (que se completava às 24:00 horas desse mesmo dia) e, também, antes de decorrido todo o período suplementar que a lei reconhece para a prática do acto independentemente de justo impedimento.
VI-O Douto despacho violou o disposto nos artigos 143° n°4, 145° n°5 e 6 e 147° do CPC.
VII-O Tribunal indeferindo actos requeridos que contribuiriam, decisivamente, para a descoberta da verdade e, consequentemente, para a boa decisão da causa, violou o disposto no art°513° do CPC.
VIII-O que constitui uma infracção que tem influência no exame e decisão da causa, uma vez que, a produzir-se tal prova, poderá ser diferente a decisão sobre a matéria de facto e, consequentemente, outro o sentido da sentença final.
IX-Tal configura a existência da nulidade prevista no art°201° n°1 do CPC, que tem como consequência a anulação dos actos subsequentes que dependam absolutamente do acto nulo, conforme disposto n°2 do mesmo artigo e no n°3 do art°98° do CPPT.
X-Pois que neste mesmo sentido o abonam, precisamente, os artigos 13° do CPPT e 99° da LGT, igualmente violados pelo Douto despacho.
XI-Entende ainda a recorrente que a interpretação feita pelo despacho, padece de inconstitucionalidade material por violação do artigo 20°, n°4 da CRP uma vez que lhe está a ser vedado o direito a um processo justo e equitativo.
XII-A sua validade, põe em causa o direito de a recorrente organizar a produção de prova nos termos que entender mais convenientes, designadamente determinando a que quesitos deve responder cada uma das suas testemunhas, agora em maior número, de forma a respeitar os limites impostos no n°1 do art°118° do CPPT.
XIII-Ao decidir como decidiu no despacho ora recorrido, o Tribunal a quo violou os artigos 143° n°4, 145° n° 5 e 6, 147° e 513° do CPC, 13° n°1 do CPPT, 99° da LGT e 20° n°4 da CRP, pelo que, nos termos que se deixam alegados, deverá decretar-se a revogação do despacho recorrido, admitindo-se a produção da prova requerida.
Termos em que, e nos demais de Direito que V. Exas. superiormente suprirão, deverá o presente recurso merecer provimento e em consequência ser substituído o despacho recorrido, proferido pelo Tribunal a quo, por outro que defira e ordene a junção aos autos de cópia integral dos processos inspectivos entretanto findos ou em curso, neste último caso no estado em que se encontrem, respeitantes aos exercícios de 2004 a 2007 e aos contribuintes R..., Lda. (NIPC ...) e C..., Lda. (NIPC ...), tal como requerido pela ora recorrente, anulando-se os actos posteriores que não possam ser aproveitados, incluindo todos os praticados em audiência de julgamento, a decisão sobre a matéria de facto e a sentença, com as legais consequências.
Fazendo-se, assim, a habitual e necessária JUSTIÇA

Não foram apresentadas contra alegações.
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A FAZENDA PÚBLICA no recurso que interpôs do despacho de 21.01.2011 formulou as seguintes conclusões:
«1. Argui a Fazenda Pública a inutilidade do despacho interlocutório de fls.487 dos autos, porquanto a diligência promovida pela Impugnante, relativa à produção de prova testemunhal requerida em aditamento ao rol inicialmente apresentado, e relativo à audição da testemunha Mário ..., Director de Finanças, falece de efeito útil.
2. A referida testemunha era Director de Finanças de ... à data dos factos tributários que deram origem às liquidações adicionais de IVA, impugnados nos presentes autos, e exerce actualmente as mesmas funções na Direcção de Finanças de Lisboa.
3. A testemunha arrolada pela Impugnante não tem conhecimento directo dos factos.
4. Donde o incómodo da sua deslocação, atento o cargo que ocupa, bem como o facto de lhe estar vedado opinar ou concluir o que quer que seja por razão de ciência que eventualmente se pretendesse que depusesse, em nada contribuiria para observância do cumprimento do princípio da descoberta da verdade material, do princípio da economia processual e do princípio da proibição da prática de actos inúteis nos autos.
5. As suas competências próprias e delegadas são as que constam no ponto 7 do Despacho n°20717/2008, publicado do DR, II série, 152, de 7/8/2008, pelo qual o Director-Geral dos Impostos procedeu à delegação e subdelegação na sua pessoa, que por sua vez, foram delegadas no Chefe de Divisão da Div. Inspecção II o Dr. Alexandre ....
6. Consagra o art°27 do DL 135/99 de 22/4, que todos os serviços deverão adoptar mecanismos de delegação de competências que propiciem respostas céleres às solicitações dos utentes, através de "... pronto cumprimento de obrigações e uma gestão mais célere e desburocratizada."
7. In casu, as liquidações de imposto impugnadas derivaram de correcções à matéria colectável efectuadas no âmbito de procedimento inspectivo, realizado a coberto das Ordens de Serviço N°OI200801488, OI200801489, OI200900523, em que intervieram, o Inspector Tributário, credenciado para o efeito, coordenador de equipa e Director de Finanças Adjunto.
8. A testemunha arrolada pela parte, Mário ..., não interveio em qualquer acto praticado pelos serviços de inspecção, pelo que, não tem conhecimento directo ou indirecto dos actos praticados pelos mesmos.
9. Donde, em nada pode contribuir a presença nem o eventual depoimento da testemunha Mário ... arrolada pela Impugnante, quer em termos de colaboração com o Tribunal, quer no que respeita à descoberta da verdade material dos factos em discussão no presente pleito.
10. Sendo a sindicância da inspecção do coordenador do inspector tributário que efectua a acção de inspecção.
11. Ainda que assim não se entenda, e sem conceder, sempre se dirá, que nem sequer foi indicada pela Impugnante a matéria de facto a que eventualmente a testemunha arrolada teria de depor em sede de audiência de julgamento - entenda-se inquirição.
12. Assim, atendendo ao disposto no artº99°, n°1 da LGT, art°13°, n°1 do CPPT, não pode deixar de se considerar tal diligência inútil ao apuramento da verdade, e por conseguinte, inócua a qualquer tentativa de aferimento à convicção do Tribunal.
13. No domínio fiscal, a admissibilidade da prova por via testemunhal é ainda mais circunscrita, porquanto a maioria dos factos tributários assentam numa base formal elevada, acentuada no caso vertente uma vez que estão em causa liquidações adicionais de IVA.
14. Assim, atendendo à factualidade alegada na petição inicial, não se vislumbra em que medida o depoimento da testemunha Mário ..., servisse à descoberta da verdade, quando todo o procedimento foi efectuado por inspector tributário credenciado para o efeito, com supervisão do seu coordenador directo a quem incumbe, entre outras, as funções de fiscalização da correcta aplicação dos métodos e correcções efectuadas no âmbito fiscal.
15. Por todo o exposto, o seu depoimento será inábil e inútil para o esclarecimento dos eventuais factos sobre os quais a parte - Impugnante -, e/ou o Tribunal, pretendessem demonstrar nos autos, e que eventualmente, servissem ao apuramento da descoberta material com vista à aferição da convicção do Tribunal.
16. Sem conceder, a ser mantido o ordenado no despacho recorrido, também a Impugnante não logrou identificar os factos sobre os quais era sua intenção proceder à inquirição da mesma.
17. Assim, promove-se a inadmissibilidade da prova testemunhal de Mário ... em observância do princípio da economia processual e da proibição de prática de actos inúteis.
Nestes termos deve o presente recurso ser julgado procedente, e revogado o despacho recorrido.
Com o que, V.Exas. farão a costumada JUSTIÇA!»
Não foram apresentadas contra alegações.
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A FAZENDA PÚBLICA no recurso que interpôs da sentença formulou as seguintes conclusões:
«A. Em devido tempo, foi apresentado pela Representação da Fazenda Pública recurso do despacho que admitiu o aditamento ao rol de testemunhas inicialmente apresentado pela impugnante, de um dirigente da AT.
B. Tendo ocorrido a audiência de inquirição da testemunha, mas não tendo sido relevado na sentença o teor do seu depoimento, apesar de não se prescindir do recurso da decisão interlocutória, reputa-se que a sua apreciação não influirá no juízo a incidir sobre a valia da decisão final, ora sindicada.
C. A sentença recorrida, ao dar como factos provados os constantes no RIT e que nela são extensamente transcritos, está devida e bastamente fundamentada, pela apropriação de tal circunstancialismo.
D. Pois, como já se entendeu nesse Tribuna! Superior, «O relatório da acção inspectiva é um documento autêntico, com força probatória plena, apenas ilidível nos termos da lei no que concerne às circunstâncias objectivas, nele atestadas, com base na percepção directa do seu autor.» (Processo n°02800/08).
E. Padece do vício de errónea apreciação da prova a sentença recorrida, ao concluir, ao arrepio de todas as valorações até aí feitas, que "face à prova testemunhal produzida, conclui-se que a impugnante logrou provar a efectividade das operações em causa".
F. Sendo bem certo que tal prova testemunhal é apenas apta a comprovar a efectividade das transacções comerciais tidas pela impugnante com os seus clientes, mas já não as que alegadamente teria com os seus dois fornecedores referenciados.
G. Com efeito, não lograram os testemunhos evidenciados no probatório da decisão recorrida estabelecer qualquer nexo rigoroso - especificando o tempo, o lugar, o modo e os intervenientes -, entre os serviços prestados pela Transportes ..., Lda. e os serviços que as firmas emitentes das facturas desconsideradas pela AT (‘R..., Lda.' e 'C..., Lda.’) teriam prestado àquela.
H. Também neste conspecto já se pronunciou o Tribunal ad quem:
«1. Tendo a AT coligido para os autos, indícios, sérios, da prova da não aderência com a realidade das facturas desconsideradas (...), cabia por sua vez à contribuinte, infirmá-los e efectuar a prova da efectiva aderência da mesma com a realidade, no que consistiam "os factos e as razões de direito que fundamentam o pedido", eu sejam as razões que podiam levar à almejada anulação, ou ainda, criar a fundada dúvida sobre os mesmos; 2. Não logra fazer tal prova a impugnante que, através dos depoimentos das testemunhas inquiridas, não conseguem identificar concretamente quais os serviços prestados por esse invocado prestador de serviços nas obras em causa, tanto mais que as mesmas se reportam a valores elevados, e nem junta documentos aptos a esse fim, desta forma não colocando em dúvida séria, fundada, os indícios recolhidos pela AT e que apontavam para que a mesma não tivesse aderência com a realidade e logo o bem fundado da liquidação adicional» (processo nº05244/11).
l. Sendo na fundamentação da sentença, por mais de uma vez, atestadas a procedência e a suficiência dos elementos reunidos em sede de Inspecção Tributária, destinados a questionar a legitimidade do direito da contribuinte à dedução do SVA mencionado em 29 (vinte e nove) facturas emitidas nos anos de 2004, 2005, 2006 e 2007, seria imperioso que o Tribunal revelasse o elemento essencial que firmou uma decisão proferida em sentido contrário.
J. As contradições salientes na sentença, ao dar por provada determinada factualidade, para a final considerar que a mesma não possui o alcance inicialmente intimado e, ao invés, acabar por vir dar como provada matéria decorrente de raciocínios dedutivos, motivados pelos depoimentos das testemunhas, traduzem vício notório de erro na apreciação da matéria de facto.
K. Outrossim, postula-se que os factos apurados no RIT e expressamente apropriados e sancionados pela sentença sindicada, deveriam conformar e fundamentar a conclusão de que as operações em causa nos autos não tinham aderência à realidade, sendo indevida a dedução do IVA mencionado nas facturas que as titulavam.
L. Decidir em sentido diverso vai contra a matéria que se considerou provada e relevante para a apreciação da causa, ao arrepio da Lei no que respeita à repartição do ónus da prova, contida nos artigos 74° e 75° da LGT, e quanto ao direito à dedução do IVA, estatuído no art°19° do Código do IVA, bem como da jurisprudência firmada nos Tribunais Superiores.
M. Tudo razões que se reputam determinantes para a prolação dum juízo que determine a revogação da decisão aqui recorrida e, do mesmo passo, venha confirmar a valia dos actos tributários impugnados, indevidamente anulados pelo Tribunal a quo.
Nestes termos e nos restantes de Direito que o distinto Tribunal entender por bem suprir, advoga a Representação da Fazenda Pública a procedência do presente recurso jurisdicional, determinando-se a revogação da sentença do Tribunal a quo e, desse modo, julgar totalmente improcedente a impugnação judicial interposta pela recorrida, a pessoa colectiva Transportes ..., Unipessoal Lda., com c que V. Ex.as. farão a almejada Justiça!».

Não foram apresentadas contra-alegações.
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Foi dada vista ao MINISTÉRIO PÚBLICO e a Procuradora-Geral Adjunta no seu parecer de fls. 786 a 790 dos autos, pronunciou-se somente sobre o recurso interposto contra a decisão final, defendendo, à final, a sua procedência.

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Por despacho do Relator foi ordenada a notificação das partes nos termos do disposto no artigo 715º, nº2 e 3 do CPC, na versão à data vigente [hoje 665º, nº2 e 3, do CPC].

Na sequência daquela notificação, a FAZENDA PÚBLICA pronunciou-se sobre o mérito da causa, concluindo assim:

«A. A Recorrente mantém tudo quanto alegado em sede de alegações de recurso no que se refere às questões relativas ao recurso interlocutório apresentado, e que se dão por reproduzidas, para os devidos efeitos.

B. Cumpre salientar que a Sra Procuradora MP no parecer que emitiu, entendeu que a sentença sob recurso padece dos vícios que lhe são imputados, devendo ser substituída por acórdão que decida em conformidade com o entendimento da AT.

C. Assim, no que se refere à alegada Invalidade do despacho de fixação da matéria colectável por falta de indicação do despacho de delegação de competências e sua publicação oficial, sempre se dirá que a lei apenas impõe que se dê conhecimento ao contribuinte de que o acto foi praticado no uso de competência delegada (art°36° - 2, do CPPT e 123° 1, al. a) do CPA).

D. Além do que o Chefe de divisão quando praticou o respectivo acto, tinha já as suas competências atribuídas e devidamente publicadas no Diário da República II Série, de 07.08.2008, pelo despacho n°20717/2008 - Cfr. fls. 122 a 126 do PA. Pelo que não pode proceder o vício invocado pela impugnante.

E. Quanto à falta de fundamentação do despacho de fixação da matéria colectável, cumpre referir que basta atentar no teor do n°1 do art.77° da LGT para se ver que a impugnante não tem razão.

F. Acresce que, a sentença ora sindicada se apropriou dos factos apurados no Relatório de Inspecção Tributária (RIT), e que conformaram e fundamentaram a conclusão de que as operações não tinham aderência à realidade, razão suficiente para considerar que o relatório da inspecção tributária identifica devidamente os factos que fundamentam as correcções fiscais efectuadas.

G. Por outro lado, a impugnante ora Recorrida, demonstra, pelo modo como ataca os factos constantes do RIT na sua p.i, que entendeu as razões de facto e de direito que deram origem à decisão tomada.

H. Não obstante a ora impugnante invocar a falta de fundamentação, quanto a terem sido desconsideradas as facturas de compras das operações consideradas fictícias, obedeceu ao disposto no n°1 e n°6 do art.77° da LGT, pelo que a explicação fornecida é perfeitamente apta a esclarecer um destinatário normal sobre as razões a que levaram a desconsiderar fiscalmente os custos e proveitos em causa.

l. Acerca da matéria dos vícios formais vem-se entendendo que "Como é sabido, nem toda a preterição à forma legalmente prescrita para o acto a praticar, produz vício de forma invalidante e como, seguramente, não estamos perante uma qualquer formalidade absolutamente essencial ou relativamente essencial em que o interesse que ela se destinava a garantir não aparece realizado por qualquer outra via, há-de considerar-se sanada ou considerar-se como formalidade não essencial, para a validade do procedimento de inspecção.

J. A Impugnante considera ainda que o relatório e correspondente correcção em sede de IVA padecem de deficiente e errónea fundamentação.

K. Contudo, como já ficou plenamente demonstrado, a inspecção tributária reuniu, quer junto da impugnante, quer das outras empresas fornecedoras e acima identificadas, indícios sérios da inexistência de operações tituladas nas facturas de compra e venda.

L. A corroborar a acção de fiscalização e os elementos apurados, foi a acusação formulada pelo Ministério Público junto do Tribunal Judicial de ... conforme despacho de acusação de fls. 161 a 174 do PA.

M. Perante estes indícios sérios de falsas operações, a presunção de veracidade da contabilidade, plasmada no artº75° da LGT foi afastada, levando a Administração Fiscal a expurgar os seus valores ao resultado fiscal declarado.

N. Efectivamente nenhum dos factos invocados pela fiscalização foi, objectiva e inequivocamente posto em causa e em nenhum dos procedimentos tributários o contribuinte apresentou documentos que pudessem conferir autenticidade às transacções pretensamente realizadas entre si e as ditas sociedades.

O. Do mesmo modo, os depoimentos prestados pelas testemunhas, não lograram comprovar que as facturas, emitidas naqueles montantes correspondiam a trabalhos efectivamente prestados.

P. Tal como foi devidamente analisada a prova testemunhal nas alegações da RFP a folhas 660 e seguintes dos autos e que se dão por reproduzidas para os devidos efeitos, e nas alegações de recurso jurisdicional as testemunhas da Impugnantes, apenas se referiram em termos genéricos à actividade de comércio de cortiça e à actividade da impugnante enquanto mera transportadora.

Q. A Impugnante não contratava directamente trabalhadores rurais, mas apenas era contratada por empresas como as geridas pelas testemunhas, ou subcontratava quando não tinha meios para assegurar o trabalho.

R. Donde, sendo a actividade da Impugnante de mera transportadora, não tem justificação plausível para a inexistência de documentos de transporte exigidos por lei, nem para as facturas emitidas o serem em valores tão elevados, e não conterem elementos essenciais, como o local de prestação de serviços, e nalguns casos, até a data efectiva dos mesmos.

S. Pela mesma razão, também não foi possível associar os serviços que terão sido prestados à impugnante, àqueles que ela terá prestado aos seus clientes, e assim, não foi possível associar os custos aos proveitos.

T. Sendo que, no Relatório de Inspecção, foram coligidas provas da impossibilidade de realização das aquisições tituladas pelas facturas cujo o IVA se considera indevidamente deduzido, como sejam: análise das viaturas mencionadas das facturas que terão efectuado as prestações de serviço, a situação fiscal dos prestadores/fornecedores de serviços, e a inexistência de documentos de transporte.

U. E posto isto, não pode colher acolhimento a pretensão da impugnante também no que refere à invocada deficiente e errónea fundamentação do relatório e correspondente correcção em sede de IVA.

V. No que respeita ao invocado enriquecimento sem causa em benefício do Estado Português e em violação do disposto no art°437° do C.C, é de referir que a AT actua, no exercício de poderes vinculados, isto é, adstrita à observação de orientações, genéricas, estabelecidas para todo o seu organismo, e está obrigada ao cumprimento ao princípio de legalidade.

W. Na situação sub judice, não estamos sequer perante qualquer violação directa de lei, nem sequer perante uma interpretação contrária à lei, mas tão só na aferição de situações de facto apuradas pela AT que consubstanciam indícios sérios e fundados de simulação de operações comerciais relevadas como custos na contabilidade da ora impugnante e nessa medida elementos determinantes do lucro tributável apurado e declarado por esta.

X. Ora, perante esta situação, independentemente dos sujeitos passivos e do tipo de negócio jurídico/operação comercial subjacente à contabilização dos custos, a AT tem de agir e age com o mesmo critério de correcção desses custos sempre que reúna indícios de que não respeitam a efectivas transacções.

Y. Destarte, e pelo acima exposto, pode com segurança concluir-se pela legalidade da actuação da AT no procedimento inspectivo que deu azo às liquidações cuja anulação a final a impugnante pede.

Z. Não assistindo, por isso, à impugnante quaisquer razões de facto ou de direito susceptíveis de anular ou revogar o acto tributário controvertido, revelando-se isenta de reparos toda a actuação da AT nas liquidações adicionais em crise.

Pelo exposto e pelo muito que V. Ex.as doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso e consequentemente revogada a douta sentença recorrida, que deverá ser substituída por acórdão que julgue a Impugnação improcedente, assim se fazendo JUSTIÇA.»

Respondeu, igualmente Impugnante/Recorrente, nos termos constantes de fls. 828 a 846, pugnando pela procedência da impugnação, e conclui:« (…) deverá a impugnação ser julgada procedente, por provada, e, em consequência, serem as liquidações de IVA dos anos de 2004 e 2007 revogadas, declaradas nulas e destituídas de qualquer efeito/ fundamento legal, com as demais consequências jurídicas-fiscais que daí advêm, nomeadamente a consequente e inevitável anulação das liquidações dos juros compensatórios associados


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Foram colhidos os vistos aos Exmos Juízes Adjuntos, pelo que vem o processo submetido à Secção do Contencioso Tributário para julgamento do recurso já que nada obsta.
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II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO
O objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho), sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objecto do recurso.
No caso trazido a exame, as questões a decidir consistem em saber:
Do recurso interlocutório da recorrente (Transportes ..., Lda)
- saber se o despacho proferido em 9 de Dezembro de 2010 , que suporta do recurso, incorreu em erro de julgamento ao ter considerado que a recorrente não respondeu ao convite que lhe foi dirigido pelo Tribunal recorrido e, em caso afirmativo se deve ser substituído por outro que defira e ordene a junção aos autos de cópia integral dos processos inspectivos identificados na petição de impugnação, com a consequente anulação dos actos posteriores que não possam ser aproveitados, incluindo todos os praticados em audiência de julgamento, a decisão sobre a matéria de facto e a sentença.
Dos recursos da Fazenda Pública
a. recurso interlocutório
- saber se o despacho que deferiu a produção de prova testemunhal (inquirição de Mário ...) viola o princípio da economia processual e da proibição de actos inúteis;
b. recurso da sentença
- errónea apreciação da prova ao considerar que são ilegais as correcções adicionais de IVA que se basearam em correcções meramente aritméticas à matéria tributável da Impugnante por sua vez determinada pela desconsideração de facturas que a Administração Tributária entendeu não corresponderem a uma efectiva prestação de serviços.
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III. FUNDAMENTAÇÃO
DOS FACTOS
Na sentença recorrida fixou-se a matéria de facto nos seguintes termos:
«1) A impugnante tem por objeto o transporte rodoviário de mercadorias, dedicando-se ao transporte de beterraba e tomate, e também ao transporte de cortiça e rechega e ao transporte de madeiras (cfr. fls, 145 e 146, dos autos, e fls. 81 e 82, do processo administrativo).

2) No exercício da atividade descrita em 1), a impugnante, entre 2004 e 2007, realizou diversos trabalhos de carga em herdades, designadamente de rechega de cortiça e transportes de madeira, que exigiam utilização de tratores ou veículos de carga pequenos (os depoimentos das testemunhas António ..., comerciante de lenha e que contratava a impugnante para trabalhos de transporte, António ..., camionista, que acompanhou, até à morte, o pai, que contratava, no âmbito do exercício da sua atividade, a impugnante para esse tipo de transportes, Francisco ..., mecânico, que declarou que a sua sociedade, F ... Lda se dedica igualmente à agricultura e que contratava a impugnante para trabalhos de transporte, e Miguel ... dos ..., que em 2007 contratou a impugnante para transporte de carga em herdade na ..., revelaram conhecimento direto dos factos, coerência e congruência. A espontaneidade dos depoimentos prestados acentua a convicção de os mesmos serem credíveis. Todos eles afirmaram ter contratado a impugnante para tais trabalhos, descrevendo, aliás, a forma como se relacionavam com ela e acertavam contas, referindo que os trabalhos em causa eram efetuados em herdades, algumas de dimensão significativa, e explicitando que, para os trabalhos em causa, os veículos tinham deter uma dimensão que lhes permitisse andar nas herdades, designadamente, no caso da cortiça, entre os sobreiros).

3) Os trabalhos de rechega e transporte de madeira referidos em 2) são trabalhos braçais, de carga e empilhamento, no caso da rechega de cortiça, ou de carga, no caso da madeira (os depoimentos, das testemunhas António ..., António ... e Francisco ..., com a razão de ciência e a credibilidade já referida supra, revelaram conhecimento direto dos factos e congruência, tendo todos eles confirmado que todos os carregamentos e empilhamentos eram feitos com a força braçal, fundamental, considerando a dimensão das herdades).

4) Os trabalhos referidos em 2) eram sazonais, sobretudo nos meses de maio e seguintes (os depoimentos das testemunhas António ..., António ... e Miguel ... dos ..., com a razão de ciência e a credibilidade já referidas, foram no sentido de os trabalhos em causa serem sazonais; aliás, este facto decorre ainda das regras da experiência, porquanto é facto corrente que só em determinadas alturas do ano se efectuam este tipo de trabalhos).

5) Os trabalhos referidos em 2) foram realizados diversas vezes através de empresas subcontratadas, sendo responsável pelas mesmas um senhor de nome Romeu (os depoimentos das testemunhas António ..., António ..., Francisco ... e Miguel ... dos ..., cem a razão de ciência e a credibilidade já referidas supra, revelaram conhecimento direto dos factos e congruência. Todas as testemunhas referiram que a impugnante recorria a empresas subcontratadas, quer para o transporte quer para carregar a mercadoria. Apesar de não saberem ao certo qual a empresa subcontratada, as testemunhas António ... e Miguel ... dos ... sabiam que os trabalhadores e os veículos eram do "Senhor Romeu", sendo que a testemunha António ... inclusivamente referiu que nos dias de pagamento chegou a ver o referido Romeu. Não foi considerado o depoimento da testemunha Romeu ..., em virtude de se entender que não continha a imparcialidade exigida para a sua valoração probatória).

6) A conferência da forma como os trabalhos ou as cargas eram efetuadas eram feita em papéis de rascunho, onde eram apontadas as horas ou as cargas, normalmente pelos encarregados das herdades, papeis esses que eram inutilizados depois de emitida a fatura (dos depoimentos das testemunhas António ..., António ..., Francisco ... e Miguel ... dos ..., com a razão de ciência e a credibilidade já referidas supra, resultou que o controlo interno dos trabalhos era feito através de rascunhos, alguns deles meros traços por carrada ou carga, que, por deixarem de ser úteis depois de emitida a fatura, eram deitados fora).

7) Alguns dos pagamentos dos trabalhos referidos em 2) eram feitos pelos clientes à impugnante em numerário, sendo usual fazer-se os pagamentos dessa forma neste tipo de atividade [dos depoimentos das testemunhas António ..., António ... e Francisco ... 'apenas Miguel ... dos ... afirmou fazer todos os pagamentos em cheque) resultou que muitos dos pagamentos eram feitos em numerário, prática que todos descreveram com sendo normal neste tipo de trabalhos; aliás, a testemunha António ... referiu inclusivamente que, no caso do seu pai, cuja actividade acompanhou, todos os pagamentos eram feitos em dinheiro, sendo usual em trabalhos do campo esse tipo de pagamento, considerando que muitos dos contratantes não gostam ou não têm habilitações literárias que lhes potencie a utilização de outros meios de pagamento).

8) Os trabalhos referidos em 2) eram pagos ou à hora / dia ou à carga / carrada (dos depoimentos das testemunhas António ... e Francisco ..., com a razão de ciência e a credibilidade já referidas supra, resultou que dependia da situação em causa a definição do preço dos trabalhos, podendo ser critério temporal ou critério de volume de carga).

9) A impugnante foi objeto de ação de fiscalização, em cumprimento das Ordens de Serviço n.°s 01200801488, 01200801489 e 01200900523 pela Direção de Finanças de ... (cfr. fls. 116,118 e 120, dos autos).

10) A ordem de serviço n°01200801488, relativa ao exercício de 2004, foi entregue à gerente da impugnante a 07.novembro.2008 e por esta assinada (cfr. fls. 116, dos autos).

11) Da ação de fiscalização referida em 9) resultou um Relatório de Inspeção Tributária, datado de 06 de maio de 2009, do qual consta designadamente o seguinte:

1.3 - CONCLUSÕES DA ACÇÃO INSPECTIVA

l – 3.1-IVA – Correcções ao imposto a entregar ao Estado

Da análise efectuada aos elementos descrita do Sujeito Passivo, exercícios económicos de 2004, 2005, 2006 e 2007, resultaram as seguintes propostos de correcção em sede de IVA - IMPOSTO DEDUTÍVEL, resultantes da dedução indevida de IVA nos termos do disposto no artigo 19º, nº3 do CIVA (Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, aprovado pelo Decreto-Lei nº394-B/84, de 26 de Dezembro de 1984 e republicado pelo D-L 102/2008 de 20 de Junho):

De notar que o direito à dedução do IVA que conste em Factura ou documento equivalente apenas poderá existir relativamente ao imposto suportado em operações económicas efectivamente realizadas.

(…)

II. OBJECTIVOS, ÂMBITO E EXTENSÃO DA ACÇÃO INSPECTIVA

II.1. Credencial e período em que decorreu a acção

As presentes acções inspectivas são dirigidas ao Sujeito Passivo (SP) "TRANSPORTAS ... LDA", NIPC ..., sociedade por quotas, tem a sede em QTA DO LAGO LT 10. 1-A ..., na área do Serviço de Finanças de ..., tem âmbito parcial em sede de IVA E IRC: tem como suporte de credenciação as Ordens de Serviço Externas nºs OI200801488, direccionada ao exercício fiscal de 2004, 01200801488 direccionada aos exercícios de 2005 e 2008, ambas classificadas sob o código PNAIT 80002 e a OI200900523 direccionada ao exercício fiscal da 2007, classificada pelo código PNAIT 12221019.

(…)

II.3.1 Caracterização do sujeito passivo

O Sujeito Passivo está registado em sede de IVA desde 2001-08-01, tendo estado enquadrado no regime normal trimestral nos períodos 2004-01-01 a 2005-12-31 e 2007-01-01 a 2007-12-31 e no regime normal mensal no período 2006-1-01 a 2006-12-31 Está inscrito sob o 049410 TRANSPORTES RODOVIÁRIOS DE MERCADORIAS, está enquadrado nos anos em apreciação, no regime geral de tributação (por opção) em sede de IRC períodos 2004-01-01 a 2006-12-31 e 2007-01-01 a 2009-12-31.

Consta como responsável de direito e de facto pela actividade da empresa nos anos em causa, praticando actos próprios de gestão a Dra. EDITE ..., NIF ..., conforme anexo A que se junta e que fica a fazer parte integrante do presente relatório

II.3.2 Actividade desenvolvida

Nos anos em análise, 2004, 2005, 2006 e 2007, o sujeito passivo desenvolveu a actividade de transporte de rodoviário de mercadorias especialmente de produtos agrícolas como beterraba e tomate, pó de cortiça e rechega e transporte de macieiras e cortiça. A empresa possui alguns meios de transporte próprio (camiões e tractor), registados nos mapas de imobilizado da empresa, que são usados na actividade da empresa. Consta também pessoal ao serviço da empresa, em número de pessoas variável de acordo com a sazonalidade que afecta a actividade da empresa (não ultrapassando mais de 12 pessoas por ano), conforme se comprova pelos registos de folhas de retribuições junto da segurança social e nas declarações de rendimentos apresentadas á Administração Fiscal.

(…)

III DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS

III. ANÁLISE A DOCUMENTOS DA CONTABILIDADE DE TRANSPORTES ..., LDA.

Na análise aos elementos contabilísticos e fiscais do sujeito passivo constatou-se a existência de registos contabilísticos referentes a facturas emitidas por, R... SOC DE CONSTRUÇÃO CIVIL LDA, NIF ... nos anos 2004 e 2005 e, também, sor C..., SOC, DE CONSTRUÇÕES UNIPESSOAL, LDA, NIF ..., nos anos de 2006 e 2007, escrituradas a crédito na conta de terceiros -Fornecedores, cujas cópias se anexam ao presente relatório no anexo B cujos movimentos contabilísticos a seguir se explanam:

- no ano 2004, na conta "Fornecedores" - conta 221027 (R..., Lda) “, As facturas deste fornecedor foram escrituradas neste ano na contabilidade a crédito da referida contas, tiveram a contrapartida de movimento contabilístico a débito das contas de IVA, "2432.2312 - IVA dedutível, outros bens s serviços, aquisições em território nacional, e de custos "6223611 - "Fornecimentos e Serviços Externos - trabalhos especializados (…) com Iva dedutível e "62111 - Fornecimentos e Serviços Externos, Sub contratos (...) com Iva dedutível” e também originaram um segundo movimento contabilístico por débito das referida conta 221027 a crédito da conta de 11.1 Caixa -Caixa A., em registo do movimento de pagamento de uma das facturas, conforme se comprova pelo lançamento contabilístico aposto na frente das referidas facturas, cuja cópia consta do anexo B;

- no ano 2005, na conta "Fornecedores" conta 22110031 (R..., Lda) As facturas fornecedor foram escrituradas neste ano na contabilidade a crédito da referida conta, tiveram a contrapartida de movimento contabilístico a débito das contas de IVA, "2432.381 - IVA dedutível, outros bens e serviços, taxa normal, mercado nacional, e de custos "621114 – “ Fornecimentos e Serviços Externos. – sub - contratos, mercado nacional" e também originaram um segundo movimento contabilístico por débito da referida conta 22110031 a crédito da conta de 11.1 - Caixa - Caixa, em registo do movimento de pagamento de cada uma das facturas, conforme se comprova pelos extractos conta-corrente, e pelo lançamento contabilístico aposto na frente das referidas facturas, cuja cópia consta do anexo B.

“quadro no original”

- no ano 2006, na conta "Fornecedores" - conta 22110059 (C..., Lda)”. As facturas deste fornecedor foram escrituradas neste ano na contabilidade a crédito da das referida conta, tiveram a contrapartida de movimento contabilístico a débito das contas de lVA, “2432.381- Iva dedutível, outros bens e serviços, taxa normal, mercado nacional, e de custos "621114 " - Fornecimentos e Serviços Externos, Sub contratos mercado nacional e também originaram um segundo movimento contabilístico por débito das referida conta 22110059 a crédito da conta de 11.1 Caixa -Caixa, em registo do movimento de pagamento de uma das facturas, conforme se comprova pelos extractos conta-corrente, e pelo lançamento contabilístico aposto na frente das referidas facturas, cuja cópia consta do anexo B;

- no ano 2007, na conta "Fornecedores" - conta 22110059 (C..., Lda)”. As facturas deste fornecedor foram escrituradas neste ano na contabilidade a crédito da das referida conta, tiveram a contrapartida de movimento contabilístico a débito das contas de lVA, “2432.381- Iva dedutível, outros bens e serviços, taxa normal, mercado nacional, e de custos "621114 " - Fornecimentos e Serviços Externos, Sub contratos mercado nacional” e também originaram um segundo movimento contabilístico por débito das referida conta 22110031 a crédito da conta de 12 Bancos-Totta, em registo do movimento de pagamento de cada uma das facturas embora sem documento bancário de suporte, conforme se comprova pelos extractos conta-correntes, pelo lançamento contabilístico aposto na frente das referidas facturas, cuja cópia consta do anexo B. O movimento anual a crédito deste fornecedor (C..., Lda.) atingiu os seguintes valores:

Analisando o teor dos documentos emitidos em nome destes fornecedores, constatamos que:

- se referem à prestação de serviços de transporte de lenha e cortiça, rechega de cortiça (amadia e falca) e com título mais residual transporte de terras e palha,

- verifica-se também, que o recibo surge por cópia a papel químico da factura;

- a unidade de medida quantitativa é a “ carga“, expecto do no caso de terras (residual) em que surge o m3 ou a hora;

- por regra, indicam as matrículas dos veículos utilizados;

- por regra, não indicam os dias ou semanas exactas dos serviços, indicando em alternativa sobretudo o mês em que foram realizadas as prestações da serviços;

- não indicam os locais da realização das operações designadamente as herdades ou propriedades ou empresas onde foram efectuados os serviços ou mesmo o cliente dos serviços a jusante;

- não consta a referência a guias de transporte utilizadas nos transpores efectuados atento o Decreto-Lei 147/2003 de 11 de Julho que regulamenta o "Regime de Bens em Circulação".

- as facturas emitidas em nome de R..., SOC DE CONSTRUÇÃO CIVIL LDA. NIF ..., são assinadas por "Romeu ...":

- as facturas emitidas em nome de C..., SOC. DE CONSTRUÇÕES UNIPESSOAL, LDA., são apenas rubricadas notando-se no entanto semelhança entre as caligrafias utilizadas no preenchimento das facturas dos dois emitentes;

- constatam-se quebras de sequência numérica e cronológica:

- as matriculas dos veículos referidas nas facturas apresentem problemas de validade uma vez que:

-uma parte significativa das matriculas indicadas não são reconhecidas como matriculas válidas de veículos automóveis (ex,° - ... e ... na factura nº355 de 31-07/2000 de C..., Lda. ou ... na factura nº637 de 30-10-2004 de R..., Lda,);

- outra parte aparece nas bases da dados da DGCI do Imposto de Circulação e Camionagem (ICICA) com a mensagem “veículo inexistente na tabela”;

- Apenas uma matricula aparece com a indicação de pertencer a veiculo pesado, activo mas registado em nome de uma sociedade que pelo CAE não parece ligada a tipo de serviços;

- Um conjunto alargado de matrículas referenciadas são identificadas na base de dados IUC (Imposto Único de Circulação) como sendo de veículos ligeiros de passageiros (na sua maioria com cilindrada inferior a 1500cc3) propriedade de sujeitos passivos de diversos pontos do país, ou seja sem aptidão para serviços de carga. Refira-se que constem indicadas nas facturas mais de 30 matrículas diferentes, cujo mapa-resumo de anomalias apresentamos de seguida:

(…)

III. ANÁLISE FISCAL DOS FORNECEDORES

III.II.I R... SOC DE CONSTRUÇÃO CIVIL, LDA

-“R... SOC DE CONSTRUÇÃO CIVIL, LDA, NIPC ..., tem domicili fiscal em Av. …

- está registada no CAE: 041200- CONSTRUÇÃO DE EDIFICIOS (RESIDENCIAIS E NÃO RESIDENC.) desde 1999-03-05;

- como se pode verificar pelo print abaixo referente à situação fiscal em 01-01-2004 a empresa encontrava-se cessada em IVA a 2001-12-31

“imagem no original”

- Recursos humanos:

- conforme informado pelo Centro Distrital de Segurança Social de Setúbal não constam declarações de remunerações em nome da empresa relativamente aos anos de 2004 e seguinte:

- nas bases da DGCI designadamente relativas ao imposto sobre o rendimento, não constam registos de declarações entregues por trabalhadores nos anos de 2000 e seguintes onde conste como entidade pagadora esta empresa;

- a empresa entregou a DECLARAÇÃO MODELO10/DA ANEXO J como entidade pagadora de rendimentos até ao ano de 1999.

- meios técnicos , veículos de transporte

- conforme as bases de dados da DGCI relativas ao imposto de Circulação e Camionagem (ICICA) e do Imposto Municipal Sobre Veículos (IMSV) não constam veículos registados em nome da empresa ou dos sócios ao tempo.

- com base na Informação constante do cruzamento dos anexos O/P (clientes / fornecedores) das Declarações Anuais de Informação Contabilística e Fiscal (DAICF) existente nas bases de dados da DGCI, apesar da empresa não ter entregue estas declarações fiscais, verificamos que em 2003 conta um total de €2.482.434,00 de aquisições declaradas como tendo sido efectuadas à empresa R..., Lda.

Nos anos seguintes, 2004 consta €1,342,098,00, em 2005 €675.757,00, em 2006 -€68.962,00 e em 2007 - €36.663,00.

- a partir da mesma fonte informativa, constatamos a inexistência de fornecedores a declararem vendas /prestações de serviços à empresa R..., Lda.

- a realidade apresentada pelos clientes da R..., Lda, nos anos 2003, 2004 e 2005 atinge um valor tal (4.500.289,00 com IVA incluído) que necessariamente implicaria uma razoável estrutura administrativa e uma maior estrutura técnico -operacional ou então um elevado montante de aquisições de serviços e materiais a terceiros cujos valores seriam evidenciados nos respectivos anexos O (clientes) (obrigatório para valores de transacções por cliente superiores a €25.000,00 ..... IVA incluído) da DAICF mesmo que a empresa Romeu &. ..., Lda. não apresentasse declaração anual. A estrutura administrativa e técnico-operacional traduzir-se-ia também em rendimentos pagos e disponibilizados a trabalhadores que obrigatoriamente identificariam a entidade pagadora na declaração modelo 3 de IRS dos anos em causa. Tal também não consta. Como também não consta registo de possuir/ter possuído alvará de construção civil conforme informação no site do Instituto de Construção e do Imobiliário, apesar de ser essa actividade o seu objecto social.

III.II.II C... SOC DE CONSTRUÇÃO CIVIL, LDA UNIPESSOAL, LDA., NIF …

- a sociedade "C... - SOCIEDADE DE CONSTRUÇÕES UNIPESSOAL LDA” NIPC - …;

- encontra-se registada sob o CAE: 041200 - CONSTRUÇÃO DE EDIFÍCIOS (RESIDENCIAIS E NÃO RÊSIDENC.);

- a empresa encontra-se registada em sede de IVA nos anos em causa no regime normal trimestral, não constando que tenha cumprido obrigações declarativas em sede de IVA desde o período 051 2T inclusive e em sede de IRC desde o ano fiscal de 2005 inclusive;

-Recursos humanos:

- conforme informado pelo Centro Distrital de Segurança Social de Setúbal não constam declarações de remunerações em nome da empresa relativamente aos períodos posteriores a 200509;

- nas bases de dados da DGCI designadamente nas relativas ao imposto sobre o rendimento, não constam registos de declarações entregues por trabalhadores em que esta empresa conste entidade pagadora de rendimentos nos exercícios de 2006 e seguintes;

- a empresa apenas entregou a DECLARAÇÃO MODELO 10/DA - ANEXO J como entidade pagadora de rendimentos até ao ano fiscal de 2004;

- meios técnicos, veículos de transporte:

- conforme as bases de dados da DGCI relativas ao imposto de Circulação e Camionagem (ICICA) e do Imposto Municipal Sobre Veículos (IMSV) não constam veículos registados em nome da empresa ou dos sócios a partir de 2006;

- em data anterior á cessão de quotas ocorrida em 2005-10-20, os meios de transporte de mercadorias (um veículo) e de passageiros de 9 lugares (2 veículos) da sociedade, foram; vendidos á empresa ..., Lda, não constando que á data da cessão de quotas a emprese detivesse meios de transporte;

- o alvará de construção civil da empresa foi cancelado em 31-01-2007, conforme informação no site do Instituto de Construção e do Imobiliário, tendo tido data de inscrição de 20-06-2001;

Gerência:

- em Outubro de 2005, após a cessão de quotas de 20-10-2005, passou a constar como gerente da sociedade C..., Lda., o Sr. LUÍS ..., NIF ..., cidadão de origem brasileira, que não consta ter cumprido obrigações fiscais no aspecto de entrega de declarações de rendimentos, apesar de constar como tendo auferido rendimentos da categoria A de IRS (trabalho dependente) de montante anual inferior ao Salário Mínimo Nacional apenas nos exercícios de 2001,2003 e 2004;

-analisando a Informação constante do cruzamento dos anexos O/P. (clientes / fornecedores) das Declarações Anuais de informação Contabilística e Fiscal (DAICF) existente nas bases de dados da DGCI, apesar da empresa não ter entregue estas declarações fiscais, verificamos que para os anos 2006 e 2007 (dadas as alterações ao pacto social) só consta um sujeito passivo a declarar fornecimentos à C..., Lda., mais propriamente no ano 2006, com o valor de €35,235,00 (cerca de 2% dos valores de aquisições apresentados por cliente), Para esses anos verifica-se a existência de valores relativamente elevados para alegadas aquisições declaradas por clientes; - em 2006 - €1.954,670,00 e em 2007 -€ 1.524.931,00;

A realidade apresentada pelos clientes da C..., Lda., para estes anos atinge um valor tal (€3.479.601,00 com lVA Incluído) que necessariamente implicaria uma razoável estrutura administrativa e uma maior estrutura técnico-operacional ou então um elevado montante da aquisições de serviços e materiais a terceiros cujos valores seriam evidenciados nos respectivos anexos O (clientes) (obrigatório para valores de transacções por cliente superiores a €25,000,00 - IVA incluído) da DAICF mesmo que a empresa não apresentasse declaração. A estrutura administrativa e técnico-operacional, traduzir-se-ia também em rendimentos pagos e disponibilizados a trabalhadores que obrigatoriamente identificariam a entidade pagadora na declaração modelo 3 de IRS dos anos em causa, situação que não ocorreu relativamente aos períodos subsequentes á cessão de quotas. Ou seja, a empresa aumentou exponencialmente os proveitos e reduziu drasticamente os custos uma vez que desapareceu como entidade pagadora de rendimentos, não tando surgido fornecedores de serviços e materiais. Note-se que a TOC (Técnica Oficial de Contas da empresa até á data da cessão de contas informou que: "2- A empresa C..., Lda. tinha cerca de 20 empregados ao serviço (...)A C..., Lda executava trabalhos de cofragem em regime de empreitada, possuindo alvará válido de construção civil para o efeito; (...) a empresa facturava cerca de 300 a quatrocentos mil euros de serviço prestados).


III.III - OS SERVIÇOS EFECTIVAMENTE PRESTADOS

Em face dos elementos aduzidos seja no aspecto do teor dos documentos encontrados, seja na vertente cadastral fiscal das empresas emitentes, para o cabal esclarecimento dá realidade das operações em causa em cada uma das facturas supra relacionadas, ao abrigo do Princípio da Colaboração notificaram-se as empresas R..., Lda. e C..., Lda., para as respectivas sede fiscais e também nas pessoas dos sócios-gerentes ao tempo para os domicílios fiscais dos próprios - ofícios 2083, 2084, 2143 e 2144 de 2009 desta Direcção de Finanças - no sentido da prestaram esclarecimentos e juntarem comprovativos das operações efectivamente realizadas e facturadas a Transportes ..., Lda., diligências que se revelaram infrutíferas uma vez que as cartas vieram devolvidas com a indicação de" não reclamado" e "mudou-se".

Esta situação adensa dúvidas sobre a realidade empresarial destes sujeitos passivos, uma vez que para o volume de facturação apresentado é de supor que tenham um mínimo de organização administrativa que dê resposta às responsabilidades societárias.

Por outro lado, registaram-se declarações do sócio da empresa Transportes ..., Lda, sr. José ..., sobre a actividade da empresa e relações comerciais com as empresas supra identificadas, o qual declarou em três de Abril de 2009:

"(...) É sócio da empresa. Nunca desempenhou funções de gerência na empresa (…) - A empresa dedicava-se sobretudo a transportes de beterraba e a alguns transportes de tomate. As actividades de rechega eram subcontratadas a outras empresas. A rechega é uma operação que consiste no transporte e empilhamento da cortiça retiradas das árvores para o estaleiro ou para o local da carga. As operações de rechega necessitam de bastante mão-de-obra, equipas sempre com mais de sete, oito pessoas por veículo, no mínimo, pontualmente poderia ser o dobro de pessoa por veículo. Normalmente os serviços seriam efectuados com quatro a cinco carros em média no terreno. Os veículos efectuados a essa actividade têm geralmente peso bruto de cerca de 14-19 toneladas e com estrado (sem taipais). São também utilizados tractores agrícolas para essa actividade. Os serviços são efectuados nas herdades, não sendo feitas guias de transporte, a não ser que haja movimento nas estradas nacionais. O transporte das pessoas afectas á rechega também era efectuado pela empresa do sr. ... em carrinhas de cerca de nove lugares. O controlo dos serviços (n.° de cargas) era feito pelo feitor da herdade e confirmados também pelos clientes de Transportes ..., Lda. O preço da mão-de-obra situava-se entre os €75,00 e os €100,00 por homem (…) - Tem conhecimento que os contactos para efeitos de sub-contratação de serviços de rechega foram efectuados através de uma amiga do Montijo da Dra. Edite. O contacto foi efectuado com o sr. Romeu .... Era a gerente – Dra. Edite - que indicava os locais de trabalho para as operações de rechega. Viu o sr. ... algumas vezes. Os trabalhos correram bem, não havia queixas dos clientes. (...) Tem noção que os pagamentos eram feitos em dinheiro na maioria das vezes, geralmente á semana, sempre entregues ao sr. R..., nos anos 2004. 2005, 2006. Os recebimentos de clientes seriam também feitos em dinheiro. A gerente Dra. Edite era a pessoa que tratava desses assuntos. Pelo conhecimento que tem da actividade da empresa, era o sr. Romeu ... a pessoa contactada para efeitos de prestação de serviços de rechega (...)

6 - Os serviços de rechega são efectuados nos meses de Junho a Setembro nas próprias herdades. A partir de Outubro os serviços de rechega consistiam na mudança das pilhas de cortiça dentro das herdades, altura em que se fazem acertos e se tomam medidas de protecção contra roubos por parte dos donos da cortiça. O sr. ... também fazia serviços de transporte de lenha na mesma sequência. Nunca conheceu outro sub-contratado além do sr. R.... Não tem conhecimento da existência de uma empresa designada por C..., Lda e que esta facturasse serviços a Transportes ... (…)”.

Também para efeitos de cabal esclarecimento da realidade subjacente às facturas já elencadas, foi notificada a sociedade Transportes ..., Lda na pessoa da sócia-gerente Dra. Edite ..., para apresentar elementos comprovativos da realidade das operações havidas com R..., Lda. e C..., Lda., de cuja resposta se dá o seu teor aqui por reproduzido:

(...)

Os elementos entregues pela gerente da sociedade concretizam-se essencialmente em alguns cheques que originaram levantamentos em numerário mas não possibilitam conhecer o(s) destinatário no pagamento(s) e, os orçamentos apresentados são simples correspondência a indicar o preço da actividade o ano/ época


III.IV. CONCLUSÃO

As facturas relacionadas nos pontos anteriores titulam prestações de serviços sobre as quais recaem fortes indícios de corresponderem a operações simuladas porquanto:

- sua descrição é omissa ou vaga relativamente aos locais (herdades) e ás datas onde foram prestados, impossibilitando sem outros meios probatórios o efectivo controlo dos proveitos em função dos custos;

- indicam meios de transporte utilizados que na sua maioria, seja pela matrícula inválida/inexistente ou por corresponderem a veículos inapropriados (veículos ligeiros de passageiros) aos serviços em causa (transporte de mercadorias em que a tonelagem deve ser superior a 12-14 toneladas), ultrapassando o mero lapso de registo de um número;

-os preços de aquisição dos serviços é extraordinariamente aproximado do preço facturado ao cliente final - exemplo, no ano 2004 o serviço de rechega de cortiça amadia é adquirido a €350,00 a carga sendo facturado a esse mesmo preço a dois clientes, Abel ..., Lda.;

- o meio de pagamento utilizado conforme informado pela sociedade e registado na contabilidade, consiste em numerário, mesmo para facturas cuja ordem de grandeza atinge os €50.000,00 e mesmo os €100.000,00, situação estranha e ao arrepio do prescrito na Lei que obsta á confirmação do pagamento e do seu efectivo destinatário. Este procedimento constitui clara violação do disposto pelo nº3 do artigo 63° C da Lei Geral Tributária (LGT, aprovada D.L n° 398/98, de 17 de Dezembro), segundo o qual "Os pagamentos respeitantes a facturas ou documentos equivalentes da valor igual ou superior a 20 vezes a retribuição mensal mínima devem ser efectuados através da melo de pagamento que permite a identificação do respectivo destinatário, designadamente transferência bancária, cheque nominativo ou débito directo”;

- os serviços foram titulados por empresas do sector da construção civil, sediadas em Setúbal, consistiram na alegada realização de serviços quase todos na área da cortiça e lenhas realizados em herdades situadas no Alentejo, o qua levanta sérias dúvidas sobre a realidade das operações tituladas pelas facturas em causa, tendo em atenção as implicações em termos organizativos e de logística dos trabalhos e mesmo nas aptidões técnicas que seriam exigíveis aos próprios trabalhadores totalmente distintas das exigidas para os serviços de construção civil;

- existem quebras entre a sequência cronológica e a sequência numérica das facturas, conforme pudemos verificar pela análise das cópias das facturas - anexo B;

- não foram apresentados pela sociedade meios probatórios que possibilitem um melhor controlo e análise dos custos incorridos e da efectivação das operações, seja quanto aos locais das operações, aos trabalhadores e máquinas/veículos -utilizados, controlo aos serviços facturados;

- as empresas emitentes das facturas não demonstram ter uma estrutura empresarial adequada aos serviços facturados uma vez que não se conhecem trabalhadores, meios de transporte e Veículos ao seu dispor fornecedores que lhes colmatem essas carências operativas nos anos em causa, demonstrando sim que os serviços que as facturas titulam não podem ter sido por elas realizados por impossibilidade técnico-humana;

- as empresas fornecedoras são também empresas não declarantes em termos de imposto sobre o rendimento e de imposto sobre o valor acrescentado, encontrando-se á margem do sistema fiscal, duvidando-se da sua existência para além do registo administrativo.

técnicos - dos sujeitos passivos prestadores dos serviços para a realização das operações económicas discriminadas nas facturas por si tituladas nos anos em causa.

Consequentemente:

- em sede de IVA. "Não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da factura ou documento equivalente." conforme prescreve o n°3 do artº19° do CIVA;

(...)".

Em face do exposto, dado que o sujeito passivo infringiu os supracitados normativos legais uma vez que considerou nas declarações fiscais apresentadas os valores titulados nos documentos já referenciados propõem-se as imperativas correcções técnicas:

(…)

- em sede de IVA, o valor do Iva deduzido indevidamente encontra-se discriminado no mapa seguinte:






(…)
(documentos juntos de fls. 142 a 185, dos autos, e fls.76 a 121 , do processo administrativo).

12) Sobre o relatório referido em 11) foi emitido o seguinte Parecer, pela coordenadora:

(cfr. fls. 142, dos autos, e 76, do processo administrativo).

13) Sobre o relatório referido em 11) e na sequência do Parecer referido em 12) foi proferido o seguinte despacho, datado de 06.05.2009:
"Concordo.
Confirmo nos termos que vêm propostos à margem..." (cfr. fls. 142, dos autos, e 76, do processo administrativo).

14) Foi emitida certidão de notificação pessoal com hora certa, relativa ao relatório referido em 11), com o seguinte teor:




“imagem no original”

15) Foi remetido ofício, pela AT, datado de 07.05.2009, dirigido à impugnante, respeitante à diligência a que respeita o documento referido em 14), com o seguinte assunto:
Assunto: ADVERTÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PESSOAL COM HORA CERTA POR AFIXAÇÃO DO
RELATÓRIO DE INSPECÇÃO TRIBUTÁRIA (ARTº241ºDO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL)
(cfr. fls. 548, autos, cujo teor se dá integralmente por reproduzido).

16) O ofício referido em 15) foi devolvido ao remetente, com a indicação "não reclamado" (cfr. fls. 549 e 550, dos autos).

17) Foram emitidas, pela Administração Fiscal, em nome da impugnante, as seguintes liquidações adicionais de IVA e de juros compensatórios, tendo como data limite para pagamento voluntário 31.08.2009:

          N.º de liquidação
Período
    Valor
09102074
Imposto
0409T42.465,00
09102075
      Juros compensatórios
0409T
    7.599,49
09102076
Imposto
0412T40.897,50
09102077
      Juros compensatórios
0412T6.906,64
09102078
Imposto
0509T21.015,75
09102079
      Juros compensatórios
0509T
    2.913,42
09102080
Imposto
0512T21.146,32
09102081
      Juros compensatórios
0512T
    2.713,68
09102082
Imposto
    0603
    7.276,50
09102083
      Juros compensatórios
    0603
    870,79
09102084
Imposto
    0605
    5.565,00
09102085
      Juros compensatórios
    0605
    628,77
09102086
Imposto
    0606
25.940,25
09102087
      Juros compensatórios
    0606
    2.842,77
09102088
Imposto
    0607
    7.334,25
09102089
      Juros compensatórios
    0607
    777,23
09102090
Imposto
    0608
14.206,50
09102091
      Juros compensatórios
    0608
    1.461,91
09102092
Imposto
    0609
    4.158,00
09102093
      Juros compensatórios
    0609
    412,38
09102094
Imposto
    0611
    5.218,50
09102095
      Juros compensatórios
    0611
    484,39
09102096
Imposto
    0612
    9.817,50
09102097
      Juros compensatórios
    0612
    875,77
09102098
Imposto
0706T13.356,00
09102099
      Juros compensatórios
0706T
    920,65
09102100
Imposto
0709T10.458,00

          N.º de liquidação
Período
    Valor
09102101
      Juros compensatórios
0709T
    616,59
09102102
Imposto
0712T26.449,50
09102103
      Juros compensatórios
0712T
    1.292,76
(documentos juntos de fls. 85 a 115, dos autos).

18) A presente impugnação deu entrada neste Tribunal a 15.10.2009,(cfr. folha de capa dos autos).»

Consta ainda da sentença recorrida que: «Não existem factos não provados, em face das possíveis soluções de direito, com interesse para a decisão da causa.» e que: «A convicção do tribunal, no que respeita aos factos provados, assentou na prova documental junta aos autos, bem como na prova testemunhal produzida, conforme indicado em cada um desses factos.»

**
Alteração oficiosa, por ampliação, da decisão sobre a matéria de facto
Por se entender relevante para a decisão a proferir, na medida em que documentalmente demonstrada, adita-se, ao probatório a coberto do estatuído no artigo 662º, nº.1, do CPC aplicável ex vi artigo 2º alínea e) do CPPT, a seguinte factualidade e incidências processuais:
19) A impugnante requereu na petição inicial a junção aos autos de « [c]ópia integral dos processos inspectivos entretanto findos ou em curso, neste último caso no estado em que se encontrarem, respeitantes aos exercícios de 2004 a 2007 e aos contribuintes R..., Lda. (NIPC ...) e C..., Lda. (NIPC ...).»(fls. 1/75 dos autos)
20) Em 18 de Novembro de 2004, a impugnante renovou o pedido identificado no ponto 19 do probatório (fls.316/319 dos autos)
21) Em 24 de Novembro de 2010, foi proferido o despacho judicial com o seguinte teor: « (…) notifique o impugnante para vir aos autos esclarecer o que pretende demonstrar com os elementos requeridos para que o juiz possa ponderar nos termos do por si citado art.513º do CPC.» (fls. 320 dos autos)
22) Por ofício expedido em 25 de Novembro de 2010, o Tribunal de 1ª instância notificou mandatária da impugnante do teor do despacho identificado no ponto 21 do probatório (fls. 335 dos autos)
23) Conclusos os autos, à M.ma Juiz a quo, em 7 de Dezembro de 2010, esta, em, 9 desse mês e ano, proferiu o seguinte despacho «A Impugnante notificada para esclarecer os factos que pretende demonstrar com o requerimento de fls. 316, nada disse, pelo que se indefere, por ora, o requerido, sem prejuízo de vir a apurar a sua pertinência.» (fls 343 dos autos)
24) Em 09 de Novembro de 2010, pelas 23h18m, deu entrada via correio electrónico o articulado de resposta ao despacho identificado no ponto 21 do probatório (fls.345/348 dos autos)
25) Em 21 de Janeiro de 2011, na sequência da resposta da Fazenda Publica ao pedido de aditamento ao rol de testemunhas, apresentado pela impugnante, foi proferido despacho destacando-se o seguinte: «(…) não se vislumbra por ora razão para indeferir tal inquirição» ( Mário ...) « ou mesmo fundamento legal, sem prejuízo da valoração a fazer pelo Tribunal sobre o conhecimento ou não dos factos pela testemunha para efeitos de prova.» (fls. 487 dos autos)
26) Os Serviços do Ministério Público de ... em 20.04.2010, comunicaram aos presentes autos para, os efeitos do artigo 47º do RGIT a suspensão do processo de inquérito criminal n°43/086IDSTR instaurado em 08.09.2008. (fls. 297 dos autos)
27) Em 4 de Junho de 2009 a impugnante foi notificada da liquidação de IVA do exercício de 2004 (artigo 207º da p.i.)
28) Nos termos das notas de liquidação de IVA, referentes aos períodos de 0409Te 0412T, as respectivas liquidações adicionais foram feitas com base em correcções efectuadas pelos Serviços de Inspecção Tributária (fls. 85 e 87 dos autos)
29) Nos termos das notas de liquidação de Juros Compensatórios (quadros com a epígrafe «fundamentação») extrai-se que foram liquidados nos termos do nº 1 do artigo 86º do Código do IVA e sobre 42.465,00€ e 40.897,5000€, sendo o «Período a que se aplica a taxa de juro» de 2004/11/15 a 2009/05/06 e 2005/02/16 a 2009/05/06, à taxa dos juros legais fixada nos termos do artigo 559º do Código Cível, num total liquidado de 7.599,49€ e 6.906,64€ (fls. 86 e 88 dos autos).

**
B.DE DIREITO
A sociedade “Transportes ..., Lda”, intentou a presente impugnação judicial junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria peticionando a anulação das liquidações adicionais de IVA dos anos de 2004 a 2007 e respectivos juros compensatórios, emitidas na sequência de acção de fiscalização que conduziram a correcções técnicas por desconsideração de custos relacionados com a prestação de serviços facturados por “R... Sociedade de Construção Civil, Lda” e “ C..., Sociedade de Construções Unipessoal, Lda”.
A.Do recurso do despacho interlocutório apresentado pela «Transportes ..., Lda».
Por despacho de 9 de Dezembro de 2010, o Tribunal Administrativo de Leiria indeferiu o pedido formulado na petição de impugnação relativo à junção dos processos inspectivos findos ou em curso, respeitantes aos emitentes das facturas em causa nos autos referentes aos exercícios de 2004 a 2007.
É o seguinte o teor do referido despacho: «A Impugnante notificada para esclarecer os factos que pretende demonstrar com o requerimento de fls. 316, nada disse, pelo que se indefere, por ora, o requerido, sem prejuízo de vir a apurar a sua pertinência[ponto 23 do probatório].
Inconformada com o despacho referido, dele interpôs recurso a Impugnante (adiante recorrente), concluindo nos termos supra transcritos.
Importa começar por analisar se a resposta estruturada pela recorrente (ponto 24 do probatório) na sequência da notificação do despacho de 9 de Dezembro de 2010 (ponto 23 do probatório) foi ou não, tempestivamente, apresentada.
Apreciando.
Dúvidas não ocorrem acerca da natureza judicial do prazo de dez dias para responder ao convite, corporizado no despacho proferido em 9 de Novembro de 2010.
Tratando-se de prazo de natureza judicial, aplica-se-lhe o regime do Código Processo Civil (cfr.artigo 20.º, nº.2, do Código do Processo e Procedimento Tributário), pelo que ele corre continuamente, mas suspende-se em férias judiciais, mais se transferindo o seu termo para o primeiro dia útil seguinte quando terminar em dia em que os Tribunais estejam encerrados ou seja concedida tolerância de ponto, tudo nos termos do artigo 144º do Código do Processo Civil (actual artigo138.º, nºs.1, 2 e 3, do Código do Processo Civil).
Resulta (como já demos nota) dos factos provados que na sequência da notificação que lhe foi efectuada para «[e]sclarecer o que pretende demonstrar com os elementos requeridos para que o juiz possa ponderar nos termos do por si citado art.513º do CPC.» a recorrente apresentou em 9 de Dezembro de 2010, o articulado identificado no ponto 24 do probatório.
Ora, nesta situação, a notificação postal efectuada à Ilustre Mandatária da recorrente presume-se feita, no terceiro dia útil posterior ao do registo (cfr. artigo 254.º, n.º3 do CPC), sendo assim, o prazo para a prática do acto processual terminava a 9 de Novembro de 2010, o que significa que tendo o articulado sido apresentado naquela data, a sua apresentação é tempestiva.
De resto, nunca estaria afastada a aplicabilidade do regime contido no artigo 145.º n.º 5 do Código de Processo Civil.
Nesta sequência, o despacho recorrido que assim não entendeu enferma de erro de julgamento, o que determina que seja concedido provimento ao recurso.
O despacho recorrido deve ser, portanto, substituído por outro que aprecie da necessidade da junção dos processos inspectivos respeitantes aos exercícios de 2004 a 2007 relativos à sociedade “ R... Sociedade de Construção Civil, Lda” e “ C..., Sociedade de Construções Unipessoal, Lda”.
Relegamos o conhecimento de tal questão para momento posterior, a propósito da análise do recurso no atinente ao invocado erro de julgamento.

B.Do recurso do despacho interlocutório apresentado pela Fazenda Pública.

A questão colocada no recurso é tão-somente saber se o despacho recorrido (ponto 25 do probatório) que admitiu a diligência de prova requerida pela Impugnante, correspondente à inquirição do Director de Finanças de Mário ... viola o princípio da economia processual e da proibição de actos inúteis, conforme defende a recorrente. Tem de reconhecer-se que não lhe assiste razão, desde logo, porque o juiz só pode dispensar a fase de instrução dos autos «se a questão for apenas de direito ou, sendo também de facto, o processo fornecer os elementos necessários» (artigo 113.º do CPPT), devendo, caso contrário, ordenar as diligências de prova necessárias, nomeadamente a testemunhal, em conformidade com o disposto nos artigos 114.º, 115, n.º 1 e 119.º do CPPT.
Por outro lado, o princípio da economia processual, entendido este como a proibição da prática de actos inúteis, conforme estabelece o artigo 130.º CPC, aqui aplicável ex vi artigo 2.º alínea e) do CPPT, não se sobrepõe ao direito à tutela jurisdicional efectiva previsto no artigo 20.º, n.º 1 da CRP
Como se diz no acórdão do STA de 14.09.20111, proferido no processo n.º 215/11:« O direito à prova no procedimento e no processo tributário existe e é objecto de uma tutela muito forte, mas não constitui um direito absoluto, pois que o legislador ordinário estabeleceu limites e indicou critérios precisos de restrição do uso de meios de prova em relação a factos determinados, como acontece com o artigo 392.º do Código Civil, onde se estabelece que “A prova por testemunhas é admitida em todos os casos em que não seja directa ou indirectamente afastada”, e com o disposto nos artigos 393.º, 394.º e 395.º desse Código, que prevêem as situações em que é inadmissível a prova testemunhal.
Em suma, compete ao juiz examinar, em cada processo judicial, se é legalmente permitida a produção dos meios de prova oferecidos pelas partes, e, no caso afirmativo, aferir da necessidade da sua produção em face das questões colocadas, sabido que instrução tem por objecto os factos controvertidos e relevantes para o exame e decisão da causa tendo em conta as várias soluções plausíveis da questão de direito.».
( disponível em texto integral em www,dgsi.pt)
Por tudo isso, o recurso não logra, provimento.

B.Do recurso interposto pela Fazenda Pública da sentença

O Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria identificou como primeira questão a decidir a de saber «[a] AT logrou reunir indícios de que as operações, tituladas pelas faturas elencadas no RIT e que estiveram na base das correções aritméticas que fundaram as liquidações em crise, não correspondiam a operações reais.».

E, respondendo à questão escreveu-se na douta sentença recorrida: «Desde já se adiante que a resposta é afirmativa. De facto, sem prejuízo de ter resultado provado, na sequência da prova testemunhal efetuada, que alguns dos indícios não corresponderiam às exigências das atividades de transporte em causa (designadamente o requisito relativo à aptidão técnica dos trabalhadores, uma vez que resultou provado não ser necessária qualquer aptidão específica, dado que os trabalhos em causa apenas exigem força muscular), há que analisar os referidos indícios no seu conjunto e concluir pela suficiência dos mesmos para efeitos de abalar a presunção de veracidade já referida.
Assim, desde logo, o facto de os fornecedores em causa estarem cessados, para efeitos de IVA desde 2001 e serem empresas não declarantes (sem prejuízo de os dados coligidos pela impugnante em 2009 e alegados na petição inicial – art.º 184.º da petição
–, relativos ao facto de as empresas estarem ativas no sistema do cadastro, por eventualmente poderem ter reativado), a priori, indiciaria uma não efetividade da realização dos serviços constantes das faturas
Os pagamentos em numerário, que dificultam, necessariamente, o controlo interno, bem como o facto de não ser detetada a existência de uma estrutura consistente produtiva, associado ainda a margens pequenas de lucro, são situações que se verificam em casos efetivos de operações simuladas.
Logo, entende-se, de facto, que a AT reuniu indícios sérios de que as operações em causa eram operações simuladas [cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 14 de maio de 2002 (Processo 5650/01)].
Nessas situações, como já referido, compete à impugnante o ónus da prova de que as operações em causa foram efetivas.
Ora, face à prova testemunhal produzida, conclui-se que a impugnante logrou provar a efetividade das operações em causa.
Com efeito, como decorre da motivação da matéria de facto, a prova testemunhal, sobretudo a respeitante aos depoimentos dos clientes da impugnante, foi convincente e coerente, tendo ficado provado que, de facto, a impugnante subcontratava outras empresas, para a realização dos trabalhos de transporte de cortiça e rechega e transporte de madeiras, sendo que, apesar de não saberem concretamente o nome da empresa subcontratada, o nome “Romeu” era familiar a essas mesmas testemunhas (sublinhe-se que, como decorre do relatório de inspeção, o Senhor Romeu era quem estava “à frente” dos destinos das duas empresas em causa).
As testemunhas confirmaram que lhes foram feitos trabalhos nesses termos, muitos deles pagos em numerário, tendo aliás ficado provado que os pagamentos em numerário eram usuais no tipo de negócio em causa.
Ficou igualmente provado que o tipo de controlo das cargas transportadas é de certa forma rudimentar, sendo faturados os serviços à hora ou à carga, dependendo da opção do cliente, com um controlo em papeis / rascunhos, inutilizados com a emissão da fatura.
Resultou, pois, provado que efetivamente o “Senhor Romeu”, subcontratado pela impugnante, prestou serviços de transporte nos anos compreendidos entre 2004 e 2007.
Face ao exposto, tendo a impugnante provado a efetividade das operações em causa, as liquidações em crise terão de ser anuladas (cfr. Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 20 de abril de 2010 – Processo: 03564/09).».

Contra este entendimento, afirma a Recorrente (Fazenda Pública) que resultou provado que as operações tituladas nas facturas emitidas por “ R... Sociedade de Construção Civil, Lda” e “C..., Sociedade de Construções Unipessoal, Lda” não têm aderência à realidade.

Cumpre, pois, indagar da bondade do julgamento efectuado pelo Tribunal recorrido quando entendeu que relativamente às facturas questionadas não houve indevida dedução de IVA, uma vez que correspondem às efectivas prestações dos serviços mencionados naquelas facturas.

Vejamos, então.

Como o Tribunal de Justiça declarou nos n.°s 22 e 23 do acórdão de 08.05.2013 [C-271/12, de 08.05.2013, Petroma Transports SA/ Estado Belga] o direito a dedução constitui um princípio fundamental do sistema comum do IVA « 22. (…) que não pode, em princípio, ser limitado e que se exerce imediatamente em relação à totalidade dos impostos que tenham onerado as operações efetuadas a montante (v., neste sentido, acórdão de 6 de dezembro de 2012, Bonik, C-285/11, n.os 25, 26 e jurisprudência referida).

23 .O regime das deduções assim estabelecido visa aliviar inteiramente o empresário do peso do IVA devido ou pago no quadro de todas as suas atividades económicas. O sistema comum do IVA garante dessa forma a neutralidade quanto à carga fiscal de todas as atividades económicas, independentemente do seu fim ou do seu resultado, na condição de essas atividades estarem elas mesmas, em princípio, sujeitas a IVA (v. acórdãos de 29 de abril de 2004, Faxworld, C-137/02, Colet., p. I-5547, n.° 37, e de 22 de dezembro de 2010, Dankowski, C-438/09, Colet., p. I-14009, n.° 24)(http://curia.europa.eu/juris/document/document.jsf?docid=137304&doclang=PT).

Constitui entendimento pacífico há muito estabelecido que à Administração Tributária que cabe o ónus de prova da verificação dos requisitos estabelecidos no artigo 82.º nº 1 do CIVA para que possa liquidar adicionalmente o IVA respeitante a deduções indevidas, pela apresentação de um discurso administrativo fundamentador onde os factos enunciados se mostrem aptos e adequados a concluir como ela concluiu para efectuar a liquidação adicional, isto é, pela enunciação de factos que tornem possível ter como pertinente e adequada a conclusão a que chegou sobre a existência de uma dedução superior à permitida pela lei, provando em tribunal o bem fundado da formação dessa sua convicção ( Entre muitos outros, vide os seguintes acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: acórdãos do STA (Pleno) de 16.03.2016 e 07.05.2003, proferidos respectivamente nos processos n.ºs 0587/15 e 1026/02, ambos disponíveis em texto integral em www.dgsi.pt).

No caso dos autos, não vem questionado que a Administração Tributária provou a verificação dos pressupostos legais que legitimam a sua actuação, pela enunciação de elementos fáctico-jurídicos aptos a convencerem sobre a adequação e correcção dessa sua actuação, isto é, pela enunciação de indícios sérios, forte e consistentes.

Portanto, a única questão que importa decidir é a de saber se a Impugnante cumpriu o ónus da prova da exacta dimensão dos factos tributários que alegou como fundamento do seu direito de dedução do imposto nos termos do artigo 19.º, n.º3 do CIVA.

Nesta matéria, não será de mais relembrar que o STA tem afirmado que : «Basta à AT provar a factualidade que a levou a não aceitar a respectiva dedução de imposto, factualidade essa que tem de ser susceptível de abalar a presunção de veracidade das operações constantes da escrita do contribuinte e dos respectivos documentos de suporte, só então passando a competir ao contribuinte o ónus de prova do direito de que se arroga (o de exercer o direito à dedução do IVA) e que não é reconhecido pela AT, ou seja, o ónus de prova de que as operações se realizaram efectivamente e ocorrem os pressupostos de que depende o seu direito àquela dedução(acórdão do (Pleno) de 16.03.2019, proferido no processo n.º 87/15 disponível em texto integral em www.dgsi.pt- sublinhado nosso-).

No caso em apreço, entendemos nós, que analisada criticamente toda a prova produzida nos presentes autos, a Impugnante não logrou demonstrar que as facturas em causa titulam serviços realmente prestados.

Com efeito, a prova testemunhal apresentada, não permite que se conclua pela realidade das operações a que aludem as facturas questionadas nos autos emitidas por “ R... Sociedade de Construção Civil, Lda” e “ C..., Sociedade de Construções Unipessoal, Lda”, visto que se impunha que as testemunhas conseguissem, pormenorizada e detalhadamente, dar conta dos serviços prestados e datas da sua realização.

Ora, os factos inscritos nos pontos 1 a 8 do probatório não se encontram minimamente concretizados em termos de tempo, espaço e valores envolvidos, já que, embora assente que «No exercício da atividade descrita em 1), a impugnante, entre 2004 e 2007, realizou diversos trabalhos de carga em herdades, designadamente de rechega de cortiça e transportes de madeira, que exigiam utilização de tratores ou veículos de carga pequenos» 2 e que estes trabalhos « [f]oram realizados diversas vezes através de empresas subcontratadas, sendo responsável pelas mesmas um senhor de nome Romeu( pontos 2 e 5 do probatório) continuamos a desconhecer se as concretas as prestações de serviços tituladas nas facturas questionadas foram ou não realizadas.

E, uma prova deste tipo é, como claramente demonstra o acórdão do TCA Norte de 11.11.2004, proferido no processo n.º 0143/04 « [a]bsolutamente irrelevante, já que a prova tem de ir no sentido da demonstração concreta de cada operação, referindo o vendedor, a importância recebida, a data, da transacção, etc.» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

De resto, mesmo admitindo que «Alguns dos pagamentos dos trabalhos referidos em 2) eram feitos pelos clientes à impugnante em numerário, sendo usual fazer-se os pagamentos dessa forma neste tipo de actividade» (ponto 7 do probatório) teria a Impugnante de o provar em termos contabilísticos.

Deve aliás, dizer-se, que só em circunstâncias excepcionais o Tribunal se poderá convencer da realidade de determinadas operações exclusivamente com base na prova testemunhal (neste sentido vide acórdão do TCA Norte de 11.03.2010, proferido no processo n.º 02794/04, disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

Chegados aqui, vejamos, agora a questão (cuja apreciação supra relegamos), começando por referir que decorre do disposto nos artigos 13.º, n.º 1 e 114.º do CPPT a atribuição ao juiz do poder de ordenar as diligências que entender necessárias para a descoberta da verdade.

Dentro do quadro estabelecido nestes artigos e sabendo-se que o tribunal só pode dispensar a produção de quaisquer elementos probatórios requeridos, quando já se encontre esclarecido sobre os factos controvertidos, ou quando tais elementos probatórios não sejam de alguma foram aptos para atingir a finalidade de esclarecer tais factos, cumpre ajuizar da pertinência/relevância da pretendida junção dos processos inspectivos respeitantes aos exercícios de 2004 a 2007 relativos à sociedade “ R... Sociedade de Construção Civil, Lda” e “ C..., Sociedade de Construções Unipessoal, Lda”.

Para Impugnante a junção daqueles documentos justifica-se por « tal se mostrar essencial à descoberta da verdade material e constituem elementos essenciais para a prova que se pretende produzir, contribuindo desta forma para a boa decisão da causa ( fls. 316 a 318 dos autos).

Ora, sem quebra do respeito sempre devido por opinião em contrário, tais razões genéricas, não se prefiguram como atendíveis, uma vez que, não só a Impugnante omite totalmente quais os factos que pretende provar/ou/infirmar com os processos de inspecção cuja junção peticiona, como não descrimina/identifica qual ou quais dos documentos que integram aqueles processos constituem elementos essenciais para a descoberta da verdade.

E, portanto, face do que ficou, a prova produzida é insuficiente para afastar os indícios de falsidade recolhidos pela Administração Tributária.

E, de todo o modo, no caso nem a dúvida poderia relevar como pressuposto de ilegalidade das liquidações impugnadas: é que, regime estatuído no artigo 100.º do CPPT não se aplica quando cessa a presunção legal de veracidade das declarações dos contribuintes, bem como dos dados que constam da sua contabilidade e escrita, uma vez que, nesses casos, o ónus da prova cabe ao contribuinte, e nessa medida, existindo dúvida tem de ser processualmente valorada contra este, por ser quem tem o ónus da prova. (nesse sentido, Acórdão do STA de 24.10.2007, proferido no processo n.º 0479/07 disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

Ou dito de outro modo, o ónus consagrado contra a Administração Tributária no citado apenas existe quando seja ela a afirmar a existência dos factos tributários e a respectiva quantificação e não quando esta cabe ao contribuinte.

Em consequência, revoga-se a sentença recorrida, impondo-se, por isso, apreciar as demais ilegalidades assacadas aos actos tributários sindicados.

DO CONHECIMENTO EM SUBSTITUIÇÃO

O conhecimento em substituição encontra legitimação no artigo 665. º do CPC, onde se estatui que os poderes de cognição do tribunal de recurso incluem todas as questões que ao tribunal recorrido era lícito conhecer, ainda que a decisão recorrida as não haja apreciado, designadamente por as considerar prejudicadas pela solução dada ao litígio, cumprindo ao tribunal de recurso, assegurado que seja o contraditório e prevenindo o risco de decisões-surpresa, resolvê-las sempre que disponha dos elementos necessários.
Nos presentes autos foi dado prévio cumprimento ao dever de assegurar o contraditório (fls 794) a que alude o nº 3 do artigo 665.º do CPC.
Neste contexto, nada obsta à apreciação das questões suscitadas pela Impugnante na petição inicial e não apreciadas pelo Tribunal a quo.

Considera a Impugnante verificada a caducidade do direito à liquidação do exercício de 2004, porquanto, apenas foi dela notificada em 9 de Junho de 2009 (artigo 204º a 218º da petição inicial).

Contra tal entendimento, se insurge a Fazenda Pública, alegando, desde logo, que, no caso se verificam duas causas de suspensão, a provocada pelo procedimento inspectivo e a provocada pela instauração de inquérito criminal. Sendo, assim, o decurso do prazo de caducidade iniciado em 01 de Janeiro de 2005 foi objecto de alargamento por força da instauração em 08 de Setembro de 2008 do processo de inquérito n.º 43/08.6IDSTR.

A questão da caducidade do direito à liquidação prende-se com a validade substancial do acto tributário, contendo com a sua validade e, por consequência, constitui fundamento da impugnação judicial.

Como refere Joaquim Gonçalves «(…) a obrigatoriedade da notificação da liquidação no prazo de caducidade não retira ao próprio acto da notificação a natureza do requisito de eficácia, embora para efeitos de caducidade tal notificação tenha, por força da lei, definido um regime especial, pois que releva, agora, também como pressuposto da caducidade do direito à liquidação por parte do Estado, esta, sim, uma ilegalidade concreta que afecta a validade do acto de liquidação e que, como tal, é susceptível de fundamentar a respectiva impugnação.». (“A caducidade face ao direito tributário”, in Problemas Fundamentais do Direito Tributário, p. 237).

Está em causa a liquidação adicional de IVA do exercício de 2004, pelo que, de acordo com o artigo 45.º, nº1 da LGT, o direito à liquidação do imposto «caduca se a liquidação não for validamente notificada ao contribuinte no prazo de quatro anos, quando a lei não fixar outro».

Assim, sendo o imposto em causa referente a IVA do ano de 2004, a caducidade do direito à sua liquidação (que iniciou em 1 de Janeiro de 2005) só ocorreria, se a liquidação não fosse validamente efectuada à Recorrente até 31 de Dezembro de 2008.

Para evitar a caducidade do direito de liquidar não basta que as liquidações tenham sido simplesmente operadas dentro do pertinente prazo; é necessária a ocorrência da indispensável notificação válida das liquidações ao contribuinte.

Por força da Lei n.º 60-A/2005, de 30.12.2005, que entrara em vigor em 1.1.2006, fora aditado um novo n.º 5 ao citado artigo 45.º da LGT, o qual dispõe que sempre que o direito à liquidação respeite a factos relativamente aos quais foi instaurado inquérito criminal, o prazo a que se refere o n.º 1 desse normativo é alargado até ao arquivamento ou trânsito em julgado da sentença, acrescido de um ano.

O disposto neste n.º 5 do artigo 45.º da LGT é aplicável aos prazos de caducidade em curso à data da entrada em vigor da Lei n.º 60-A/2005 (artigo 57.º, n.º 2 desta Lei).

De acordo com o citado preceito legal «Sempre que o direito à liquidação respeite a factos relativamente aos quais foi instaurado inquérito criminal, o prazo a que se refere o nº 1 é alargado até ao arquivamento ou trânsito em julgado da sentença, acrescido de um ano.».

O normativo transcrito consagra um vector de alargamento do prazo de caducidade do direito à liquidação, quando ele derivar de factos relativamente aos quais foi instaurado inquérito criminal, alargamento este que tem como termo final o arquivamento ou trânsito em julgado da sentença exarada em processo criminal, acrescido de um ano (cfr. Diogo Leite de Campos e Outros, Lei Geral Tributária comentada e anotada, 4ª. edição, Lisboa, Encontro da Escrita Editora, 2012, pág.366).

E no mesmo caminho trilha a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo como se pode ver em, entre muitos outros, no Acórdão de 01.10.2014, proferido no processo n.º 0178/14 (disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

Em consequência, tem que se concluir que à data em que a Impugnante foi notificada da liquidação de IVA do exercício de 2004, isto é, 4 de Junho de 2009 [cfr. ponto 27) do probatório] não decorrera ainda o prazo de caducidade do direito à liquidação atendendo ao alargamento do prazo em virtude da instauração do processo crime que ainda se encontra pendente [cfr. ponto 26) do probatório].

Termos em que improcede a invocada caducidade do direito à liquidação de IVA do exercício de 2004.

Defende a Impugnante nos artigos 219º a 237º da douta petição inicial que os “ actos de liquidação”(referentes às liquidações de IVA de 2004 e correspondentes juros compensatórios) entregues na sequência do mandato de notificação não correspondem a verdadeiras notas de liquidação, uma vez que, não passam de meros extractos de consulta ao sistema informático da Administração Tributária nos quais foi aposta « a aberrante nota de “ está conforme o original” e deles consta “ Declarações Periódicas ( Val. Calculados), ” Data de Simulação: 2009.05,27” e não contem a indicação do respectivo autor. Por estas razões, diz a Impugnante que estamos perante liquidações inexistentes sem qualquer relevância jurídica.

Na análise destes argumentos julgamos necessário esclarecer que posteriormente a Impugnante afirma que foi notificada «[q]uanto aos mesmos períodos do ano de 2004, de novas liquidações de IVA e respectivos juros compensatórios, estas sim efectuadas pelos Serviços Centrais da DGCI, datadas de 16 de Junho de 2009 e com datas limite de pagamento de 31.08.2009.» e relativamente as estas considera que padecem de vício de falta de fundamentação, que, no seu entender, as torna nulas.

A liquidação ora em causa (como de resto as demais sindicadas) foi motivada pelas alterações à matéria tributável e estas foram alicerçadas no Relatório de Inspecção Tributária. No caso sub judice, a Administração Tributaria para fundamentar a liquidação de IVA, indicou que se trata de «Liquidação adicional feita com base em correcções efectuada pelos Serviços de Inspecção Tributária» e quando à liquidação de juros compensatórios indicou a norma legal que considerou aplicável, o montante de IVA sobre o qual incidem os juros, a taxa aplicável e o período da sua contagem (ponto 28 do probatório), o que tudo se nos afigura suficiente para que a Impugnante fique a conhecer o motivo da liquidação e lhe permite optar conscientemente entre a aceitação da legalidade do acto ou a sua impugnação. O que veio, de resto a suceder.

Ora, contrariamente ao alegado na petição inicial, os actos de liquidação de IVA e juros compensatórios do exercício de 2004 satisfazem com suficiência o dever legal de fundamentação.

Na óptica da Impugnante o despacho constante do Relatório de Inspecção Tributária (RIT) é assinado pelo Chefe de Divisão, com a menção “Por delegação do Director de Finanças”, sem identificar qual o ato de delegação (data e publicação no Diário da República), o que configura preterição de formalidade essencial [artigos 21º a 30º da petição de impugnação].

Na contestação, a Fazenda Pública veio alegar que o Chefe de Divisão, aquando do respectivo acto, tinha já as suas competências atribuídas e devidamente publicadas no Diário da Republica II Série, de 07.03.2008, pelo despacho n.º 20717/2008. E, por outro lado, a falta de menção da delegação ou subdelegação de poderes no acto praticado deve ser considerada como preterição de formalidade, que se degrada em não essencial, quando não é afectada a possibilidade de impugnação contenciosa.

A questão a decidir é a de saber se o despacho proferido pelo Chefe de Divisão lavrado no Relatório de Inspecção Tributária (RIT) por falta de menção de que o autor do acto o praticara no uso de delegação de competências constitui a preterição de formalidade essencial determinante da ilegalidade dos actos de liquidação sindicados.

Nos termos do artigo 38º e 123º nº2 al.a) do CPA (na redacção aplicável à data dos factos) deve constar do acto a menção de delegação ou subdelegação de poderes quando exista

Tal como se deixou defendido no Acórdão proferido por este TCA de 30.04.2014, proferido do processo n.º 6580/13: «Ao referir-se à circunstância de não constar do despacho qualquer referência ao órgão subdelegante e, bem assim, ao Diário da República onde se mostra publicada a subdelegação de poderes, o Recorrente reporta-se às referências que devem constar do próprio acto e não apenas da sua notificação (sabido que o acto administrativo e o acto da sua notificação são realidades diferentes).

Ora, a previsão das menções obrigatórias que devem sempre constar do acto, encontra-se consagrada no artigo 123º, nº1 do CPA. Em concreto, a alínea a) de tal norma refere a indicação da autoridade que o praticou e a menção da delegação ou subdelegação de poderes, quando exista. Trata-se de uma menção obrigatória que está em consonância com o disposto no artigo 38º do CPA, nos termos do qual o órgão delegado ou subdelegado deve mencionar essa qualidade no uso da delegação ou subdelegação.

Tal menção da qualidade em que actue o autor do acto deve, pois, assumir uma formulação do tipo “por delegação de …”, que o delegado ou subdelegado deve apor nos actos que pratique, permitindo “aos destinatários destes determinar, no caso de contra eles pretenderem reagir, quais os meios de que devem ou podem servir-se para o efeito” - Mário Esteves de Oliveira e outros, in CPA, comentado, 2ª edição, Almedina, págs. 225 e 226.

No entanto, a lei não exige, como resulta da leitura das diversas alíneas do nº1 do artigo 123º do CPA, que do acto conste a referência ao Diário da República no qual foi publicada a delegação/ subdelegação de poderes. A este propósito, refere J. Lopes de Sousa, “É requisito do acto a menção da delegação ou subdelegação de poderes e não também a indicação do Diário da República em que foi publicado o despacho de delegação ou subdelegação” in, CPPT, anotado e comentado, 6ª edição, 2011, Vol. I, pág. 344. No mesmo sentido, embora criticando a solução legal de não exigência da indicação do local da publicação do acto de delegação ou subdelegação de poderes, aponta Mário Esteves de Oliveira e outros, na obra citada, pág. 583.» (disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

Verificando-se uma substancial analogia entre o caso dos autos e o apreciado no acórdão acabado de transcrever e, em concordância, com o sentido desta jurisprudência supra exposta, que aqui também se acolhe, impõe-se dar como não verificado o arguido vício de forma.

Por último, quanto à falta de fundamentação de facto e de direito imputada pela Relatório de Inspecção Tributária (RIT) (artigo 31º a 46º da douta petição inicial) diz a Fazenda Pública em contestação que estão devidamente identificados os factos fundamento das correcções fiscais efectuadas e sobre os quais a Impugnante «esmiuçadamente se refere na sua p.i.».

Apreciando.

Como se sabe, o direito à fundamentação dos actos administrativos e tributários que afectem direitos ou interesses legalmente protegidos é princípio constitucional com assento no artigo 268.º da Constituição da República Portuguesa e encontra-se concretizado pelo legislador ordinário no artigo 77.º da LGT.

Tal fundamentação há-de ser expressa, através duma exposição sucinta dos fundamentos de facto e de direito da decisão; clara, permitindo que, através dos seus termos, se apreendam com precisão os factos e o direito com base nos quais se decide; suficiente, possibilitando ao administrado ou contribuinte, um conhecimento concreto da motivação do acto, ou seja, as razões de facto e de direito que determinaram o órgão ou agente a actuar como actuou; e congruente, de modo que a decisão constitua conclusão lógica e necessária dos motivos invocados como sua justificação, envolvendo entre eles um juízo de adequação, não podendo existir contradição entre os fundamentos e a decisão. ( Neste sentido, entre outros, o Acórdão do STA de 11.12.2002, proferido no processo n.º 01434/02, disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

Como se disse, entre outros, no acórdão do STA (Pleno das Secção do CT) de 29.11.2006, proferido no processo nº 0184/05, a chamada fundamentação por remissão que o artigo 125, n.º1, do CPA « comporta ao estatuir que “a fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituirão neste caso parte integrante do respectivo acto”(disponível em texto integral em www.dgsi.pt).

Por outro lado, a fundamentação por remissão, expressamente prevista no artigo 125.º, nº 1 do CPA (na redacção à data) consiste na remissão para os termos de uma informação, parecer ou proposta que contenha, ela mesma, a motivação do acto, de tal modo que uma declaração de concordância sobre elas exarada deve ser entendida no sentido de que o acto administrativo absorveu e se apropriou da respectiva motivação ou fundamentação, que, assim, dele ficará a fazer parte integrante.

No caso, o Relatório de Inspecção Tributária (RIT) (enquanto acto final do procedimento) espelha, em forma padronizada, os requisitos de fundamentação impostos pelo artigo 77.º, nº 2 da LGT, nomeadamente as disposições legais aplicáveis, a quantificação dos factos tributários e as operações de apuramento da matéria tributável e do tributo. Verifica-se, pois, que a Administração Tributária enunciou diversos factos indiciários que, em seu entender, seriam demonstrativos de que os emitentes das facturas não prestaram os serviços a que estas se referem, permitindo desde modo conhecer o itinerário cognoscitivo e valorativo prosseguido pela AT para a realização das correcções e consequentes liquidações adicionais.

Ora, tal fundamentação afigura-se, manifestamente, suficiente, uma vez que dá a conhecer, minimamente, de facto e de direito, as razões e os termos em que se operaram as correcções que originam as liquidações adicionais.

Por outro lado, é por demais evidente que o despacho aposto no Relatório de Inspecção Tributária (RIT) em 06.05.2009 se refere expressamente ao Parecer nele aposto pela Coordenadora da Divisão, em termos que não deixam dúvidas sobre a adesão à proposta de ali contida e aos respectivos fundamentos.

Aliás, como bem adiantou a Fazenda Pública, a Impugnante não logrou sequer identificar qualquer dúvida sobre o conteúdo do acto, pois que perfeitamente o entendeu, o que lhe permitiu, aliás, proceder à sua impugnação contenciosa, assacando-lhe diversos vícios de violação de lei que pressupõem uma clara apreensão do seu teor decisório e dos respectivos fundamentos de facto e de direito.

De tudo quanto vem de se dizer, conclui-se, pela improcedência da impugnação judicial.

IV.CONCLUSÕES
I. Quando a liquidação adicional de IVA tenha por fundamento o não reconhecimento do direito às deduções declaradas pelo contribuinte, compete à administração tributária fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, constantes do artigo 82º, nº 1 do CIVA.
II. Isto porque, não é a Administração Tributária que afirma um facto positivo com consequências tributárias - é o contribuinte que invoca o seu direito à dedução do IVA pago a montante. Por isso, é ele quem deve provar a verificação dos pressupostos em que assenta tal direito.
V. DECISÃO
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul em:
- conceder provimento ao recurso interposto pela Impugnante do despacho interlocutório de 09.12.2010;
- negar provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública do despacho interlocutório de 21.01.2011;
- conceder provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública, revogando-se a sentença recorrida e, em substituição, julgar improcedente a impugnação.

Custas nesta Instância pela Recorrente Fazenda Pública quanto ao recurso do despacho interlocutório e custas pela Recorrente Impugnante na 1ª Instância e nesta somente em taxa de justiça.

Após trânsito em julgado, remeta-se certidão do acórdão com nota de trânsito aos Serviços do Ministério Público (Processo n.º 43/08.6IDSTR) satisfazendo-se o solicitado a fls. 770.


Lisboa, 22 de Março de 2018.

[Ana Pinhol]


[Jorge Cortês]


[Cristina Flora]